Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:3/20.9BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:06/25/2020
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:DERROGAÇÃO SIGILO BANCÁRIO
CDT
VALOR DA CAUSA
LEGITIMIDADE PARA RECORRER/INTERESSE EM AGIR
Sumário:I – Nos processos sobre acesso a documentação bancária estão em causa interesses não quantificáveis, pelo que será aplicável, subsidiariamente, por força do preceituado no artigo 2º, alínea c), do CPPT, o artigo 34º, nº 2, do CPTA, que estabelece que, quando o valor da causa seja indeterminável, considera-se superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo;
II – Os recursos só podem ser interpostos por quem, sendo parte principal na causa, tenha ficado vencido;
III – A legitimidade afere-se através do prejuízo que a decisão determina na esfera jurídica do recorrente; o interesse em agir está ligado à utilidade prática que emana da utilização dos meios jurisdicionais;
IV – A Convenção entre Portugal e a França para Evitar a Dupla Tributação, no seu art.°27.°, prevê mecanismos de troca de informação em matéria fiscal; e a Directiva 2011/16/EU, do Conselho, de 15/02/2011, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade, prevê (art.°5.°) a troca de informações previsivelmente relevantes para a administração e a execução da legislação interna dos Estados-Membros respeitante aos impostos a que se refere o artigo 2.°, aí se incluindo os impostos sobre o rendimento;
V - O acesso da AT à informação bancária não é irrestrito (art.°63.°, n.°3, da LGT) sendo que o legislador estabeleceu no n. °l do art.°63.°-B, da LGT as condições concretas em que tal acesso se pode verificar por acto administrativo, condições essas que têm de ser evidenciadas em procedimento inspectivo iniciado a pessoa que apresente algum elemento de conexão ao sistema fiscal português (art.°18.°, n.°3, da LGT).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

A Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira veio interpor recurso jurisdicional dirigido a este Tribunal, tendo por objecto a sentença proferida pela Mmª. Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria, proferida no âmbito do recurso apresentado por S..., ao abrigo do artigo 146º-A, nº 2 do CPPT, nos termos da qual foi anulado o despacho, de 16/12/19, da Directora-Geral da Administração Tributária e Aduaneira que, na sequência do pedido das autoridades fiscais francesas, autorizou o acesso “directo à informação bancária solicitada relacionada com a conta nº 0..., da C..., SA, Agência 0... – F... – Pombal”, no período compreendido entre 01/01/16 e 31/12/17.

A Recorrente apresentou as alegações que concluiu nos seguintes termos:


«A - A sentença proferida pelo tribunal a quo deve ser revogada porque decidiu de forma errada, pois apreciou incorretamente o alegado pelas partes nos articulados, bem como a prova documental e aplicou de forma manifestamente incorreta o direito aos factos.


B - O tribunal a quo, para além dos factos que deu como provados, deveria ter dado como provado que:

-O pedido de troca de informação da DGFP do Estado Francês à Recorrente era referente ao aqui Recorrido, enquanto pessoa singular, conforme resulta do "B1. lnformation about the natural/legal person in the sending country";
-O pedido de troca de informação da DGFP do Estado Francês à Recorrente é referente ao período de 01-01-2016 a 31-12-2017, conforme B3-3;
-Conforme "81-5. Descrição geral do caso e fins fiscais para os quais a informação é pedida",:
-o aqui Recorrido está a ser objeto de um controlo fiscal (salvo melhor opinião, equiparável ao conceito de um procedimento de inspeção tributária) em França, conforme;

-o Recorrido se declarou em França naquele período como residente em Portugal e não declarou ali qualquer rendimento;

- o Recorrido não apresentou à administração fiscal francesa qualquer prova do seu domicilio em Portugal nos anos 2016 e 2017;

-o Recorrido deu-se a conhecer (declarou-se) perante as autoridades fiscais de Franca como tendo o seu domicílio nesse Estado, tendo alterado de morada três vezes entre 2016 e 2018.

-o Recorrido dispõe de contas bancárias em nome pessoal em França;

-o Recorrido tem três filhos(as), sendo um(a) menor;

-no âmbito dos poderes parentais, o Recorrido informou que tem liberdade de visitar os seus filhos, sem qualquer tipo de restrição;

-no âmbito da sua atividade profissional (transportes), o Recorrido dispõe dum armazém em Franca, no qual uma parte da atividade da sociedade C... Lda., aparenta ser diretamente dirigida (local de direção efetiva da empresa);

- os elementos supramencionados permitiram à administração fiscal francesa estabelecer que o Recorrido foi residente fiscal francês nos anos de 2016 e 2017;

- a partir de então, o Recorrido devia ter declarado à administração francesa todas as contas bancárias abertas no estrangeiro, conforme previsto no artigo 1649A do "Code Géneral des lmpôts";

-no âmbito do procedimento de inspeção a decorrer em França, o Recorrido informou que tinha uma conta bancária aberta em Portugal e comunicou as referências relativas à sua conta;

-o Recorrido especificou às autoridades fiscais francesas que não se encontrava em condições de apresentar uma cópia dos extratos bancários referentes aos anos de 2016 e 2017, esclarecendo que em Portugal, não temos extratos bancários;

- Conforme "83-7. Para os anos sujeitos a auditoria/investigação - outros comentários", o Recorrido declarou apenas os seus rendimentos prediais em França, não tendo declarado qualquer rendimento profissional;
- Conforme "83-9. Conclusões preliminares da investigação no país requerente", o Recorrido pode ter ocultado factos, transações, rendimentos, produtos e outros elementos;
- Conforme resulta do Ponto 2 da douta sentença, de acordo com a Informação da DSRI, nomeadamente da "Análise do pedido", para "aferir se estão, ou não reunidos os pressupostos para que possa ser autorizado o levantamento do sigilo bancário":

-A Recorrente atendeu à possibilidade de troca de informações entre os Estados­ Membros da União Europeia (EU), prevista na Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e França (adiante CDT), bem como à Convenção sobre Assistência Mútua em Matéria Fiscal desenvolvida conjuntamente pelo Conselho da Europa e pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), tendo concluído que:
(1) se verificaram indícios de falta de veracidade do declarado ou estavam em falta legalmente exigível;
(2) se tratava de informações solicitadas nos termos de acordos ou convenções internacionais em matéria fiscal a que o Estado português está vinculado;
(3) o pedido formulado pelas autoridades fiscais francesas, remetido ao abrigo da CDT Portugal/França, se fundou em informação bem fundamentada e que nada obsta à recolha da informação bancária solicitada.
-Decidiu determinar a derrogação do sigilo bancário, nos termos das alíneas b) e h), do n.º1 do artigo 63º-B da LGT, de modo a permitir o acesso à informação bancária relacionada com a conta n.º 0... da C..., SA, Agência 0... F... - Pombal, para o período compreendido entre 01- 01-2016 e 31-12-2017, nomeadamente:
(1) identificação do atual titular da conta bancária;
(2) identificação da pessoa que procedeu à abertura da conta bancária e respetivo suporte documental;
(3)identificação da pessoa autorizada a movimentar a conta bancária;
(4) balanço de abertura e fecho da conta bancária;
(5) extratos bancários de todos os movimentos da conta bancária.


C- Estes factos deveriam ter sido todos dados como provados, pois resultando de informações prestadas pela administração tributária francesa ao abrigo de convenção internacional de assistência mútua a que o Estado Português está vinculado, fazem fé, cfr. artigo 76º, nº 4 da LGT.


D- Para além disso, o contribuinte não apresentou qualquer prova em sentido contrário daquelas informações.


E - O tribunal a quo errou ainda quanto à aplicação do direito aos factos quando decidiu que a AT não podia aceder aos dados bancários do Recorrido no período em causa (entre 01-01-2016 e 31-12-2017);


F - Para sustentar essa tese o tribunal a quo entende, a nosso ver mal, que " com base nos fundamentos apresentados pelo Estado requerente, a administração tributária portuguesa deve iniciar um procedimento inspectivo relativamente ao contribuinte em questão, nos termos do art.63º, nº1, da LGT, mediante o qual deve averiguar da existência de alguma das situações elencadas no art.63º-8, n.ºs 1 e 3, als. a) a g), da LGT (vide acórdãos do STA, de 23.10.2013, processo nº 01361113 e, de 28.02.2018,processo nº 0346117; e, acórdão do TCAN, de 14.01.2016, processo nº 01680115)"


G - Salvo melhor entendimento, esta interpretação é completamente desprovida de sentido, uma vez que a decisão de derrogação do sigilo bancário proferida pela AT cumpriu os pressupostos previstos no artigo 63º, n.º1, alíneas b) e h), da LGT, uma vez que ocorrem indícios de falta de veracidade quando o Recorrido declara às autoridades fiscais francesas que "em Portugal, não temos extratos bancários" e que "o Recorrido deu-se a conhecer (declarou) perante as autoridades fiscais de França como tendo o seu domicilio nesse Estado, tendo alterado de morada três vezes entre 2016 e 2018", pelo que «O Recorrido devia ter declarado à administração francesa todas as contas bancárias abertas no estrangeiro, conforme previsto no artigo 1649A do "Code Géneral des lmpôts"», estando em falta naquele Estado declaração legalmente exigível.


H - Para além de que, perpassando o artigo 63.º-B da LGT, não encontramos qualquer referência à necessidade/obrigatoriedade de "iniciar um procedimento inspectivo relativamente ao contribuinte em questão, nos termos do art. 63º, nº1, da LGT", pelo que andou mal o tribunal a quo também nesta parte do decisório.


I - Acresce a isto que o nº3 do artigo 63.º-B da LGT, invocado na sentença se encontrava revogado à data dos factos, pelo que não vislumbramos o motivo da sua menção.


J - Para além de que não vislumbramos a justificação legal, jurisprudencial e/ou doutrinal da tese prolatada pelo douto tribunal a quo, de que a presunção de veracidade e de boa­ fé prevista no artigo 76º, nº 1 e 4 da LGT, não se aplica "ao pedido de informação formulado pelas administrações tributárias estrangeiras, com vista à tributação nos respectivos países".


K - Por último destacamos que, contrariamente ao prolatado pelo douto tribunal a quo, a dupla tributação internacional não é "proibida" pela CDT celebrada entre Portugal e França, nem por qualquer outro mecanismo internacional, o que esta Convenção pretende é criar mecanismos que evitem que tal situação ocorra e,


L - para além disso, visa obstar à evasão fiscal, o que se encontra patente no presente caso, conforme consta no pedido de troca de informações em" 83-9. Conclusões preliminares da investigação no país requerente".


M - Em face do supra exposto, salvo melhor entendimento, entendemos que o tribunal errou na interpretação dos preceitos aplicáveis ao caso concreto, isto é, os artigos 63.º­ B, nº1, alíneas b) e h), 74º e 76º, todos da LGT.


Termos em que deve ser revogada a sentença do tribunal a quo com as legais consequências,»


*

Nas contra-alegações, o recorrido S..., defendeu a confirmação do decidido, concluindo:

«A) A douta decisão proferida em primeira instância não admite recurso.

B) A parte da sentença que fixou à acção o valor de 30.000,01€ é nula por falta de fundamentação de facto e de direito.

C) O artigo 146.º-B, n.º 3 diz que para esta acção não é necessária a intervenção de advogado, pelo que à acção não pode ser atribuído valor superior a 5.000€, por ser a alçada do Tribunal de primeira instância (artigo 40.º, n.º 1 do CPC).

D) A Recorrente não tem legitimidade processual para interpor o presente recurso por falta de interesse em agir e por não ter sido mandatada para isso pela verdadeira interessada, que é a administração fiscal francesa.

E) Não houve qualquer erro na fixação da matéria de facto, porquanto no n.º 1 dos factos provados, o Sr. Juiz deu por reproduzido o requerimento enviado à Autoridade Tributária e Aduaneira pela administração fiscal francesa, onde constam todos os factos por ela elencados e que a Recorrente queria ver transcritos para o texto da sentença, o que, além do mais, seria inútil.

F) As informações fornecidas pelas Autoridades administrativas francesas fazem fé, mas admitem prova em contrário, como a Recorrente admite no artigo 15.º da sua alegação.

G) A Recorrente tinha em seu poder informação factual que lhe permitia, no mínimo, questionar a veracidade da conclusão adiantada pelo fisco francês, de que o Recorrido tem residência em França, pelo que, tinha obrigação de instaurar um procedimento de inspecção tributária, no qual permitisse ao Recorrido fazer prova contrária às afirmações da autoridade francesa requerente.

H) A decisão constante da sentença recorrida não merece, nessa parte, qualquer reparo, pelo que deve ser mantida e o recurso, se vier a ser admitido, o que se equaciona, mas não se aceita, julgado improcedente.

Assim se fará,

JUSTIÇA.»


*

Neste TCA, o Exmo. Magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.

*

Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente dos autos, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.



*




II – FUNDAMENTAÇÃO


- De facto


A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:


«1. No dia 06 de Agosto de 2019, a Direcção-Geral das Finanças Públicas, do Estado francês, efectuou um pedido de troca de informação à administração tributária portuguesa, onde se pode ler, designadamente, que “(…)



(…)

(…)

«Imagem no original»

(…)

«Imagem no original»

(…)

«Imagem no original»

(…)” (cfr. pedido da Direcção-Geral das Finanças Públicas, do Estado francês e informação da Direcção de Serviço de Relações Internacionais, da Autoridade Tributária e Aduaneira, de fls. 102 a 107 e 110 a 112 do processo administrativo tributário integrado no SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

2. No dia 12 de Dezembro de 2019, a Direcção de Serviços de Relações Internacionais, da Autoridade Tributária e Aduaneira, elaborou uma informação, onde se pode ler, designadamente, que “(…)

«Imagem no original»

(…)” (cfr. informação, de fls. 110 a 112 do processo administrativo tributário integrado no SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

3. Sobre a informação descrita no ponto antecedente recaiu um despacho da Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, datado de 16 de Dezembro de 2019, no sentido de “

(…)” (cfr. despacho, de fls. 108 do processo administrativo tributário integrado no SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

4. No dia 02 de Janeiro de 2020, o Recorrente apresentou o presente recurso junto deste Tribunal (cfr. registo do SITAF, de fls. 01 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

5. Do registo comercial português consta que, no dia 30 de Junho de 2010, foi inscrita a constituição da sociedade C..., Lda., com o nipc 5..., sede na Rua do A..., s/n, I…, 3… I…, o objecto social de “Aluguer e comércio de automóveis e máquinas industriais” e o capital social de € 50.000,00, dividido por duas quotas, a primeira, no valor de € 25.000,00, titulada por M..., e a segunda, no valor de € 25.000,00, titulada por V... (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

6. Do registo comercial português consta que, no dia 27 de Agosto de 2010, foi inscrito o aumento do capital social da sociedade C..., Lda. para € 125.000,00, dividido por duas quotas, a primeira, no valor de € 62.500,00, titulada por M..., e a segunda, no valor de €62.500,00, titulada por V... (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

7. Do registo comercial português consta que, no dia 27 de Agosto de 2010, foi inscrita a alteração do objecto social da sociedade C..., Lda. para “Transportes rodoviários de mercadorias, nacional e internacional por conta de outrem. Aluguer e comércio de veículos automóveis e máquinas industriais” (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

8. Do registo comercial português consta que, no dia 08 de Julho de 2013, foi inscrita a transmissão da totalidade das quotas da sociedade C..., Lda. por parte de M... e V... a favor do Recorrente (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

9. Do registo comercial português consta que, no dia 08 de Julho de 2013, foi inscrita a alteração da sede da sociedade C..., Lda. para a Rua Q..., lote 1, fracção A, r/c dto. 3… Pombal (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

10. Do registo comercial português consta que, no dia 08 de Julho de 2013, foi inscrita a designação do Recorrente como gerente da sociedade C..., Lda, por deliberação datada de 01 de Julho de 2013 (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

11. Do registo comercial português consta que, no dia 11 de Novembro 2013, foi inscrita a designação de C... como gerente da sociedade C..., Lda., por deliberação datada de 07 de Novembro de 2013 (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

12. Do registo comercial português consta que, no dia 03 de Dezembro de 2013, foi inscrita a transmissão de uma quota na sociedade C...., Lda., no valor de €62.500,00, por parte do Recorrente a favor de A... (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

13. Do registo comercial português consta que, no dia 20 de Janeiro de 2014, foi inscrita a cessação de funções de gerente de C... como gerente da sociedade C..., Lda., por renúncia, datada de 10 de Janeiro de 2014 (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

14. Do registo comercial português consta que, no dia 11 de Setembro de 2015, foi inscrita a transmissão de uma quota na sociedade C...., Lda., no valor de €62.500,00, por parte de A... a favor do Recorrente (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

15. Do registo comercial português consta que, no dia 11 de Setembro de 2015, foi inscrita a alteração da sede da sociedade C..., Lda. para a Rua P..., lote 19 A, Armazém 2, Z…, 3… Pombal (cfr. certidão permanente do registo comercial, de fls. 06 a 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

16. No dia 29 de Janeiro de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»


(…)” (cfr. recibo, de fls. 09 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

17. No dia 29 de Fevereiro de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 10 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

18. No dia 31 de Março de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 10 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

19. No dia 29 de Abril de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 11 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

20. No dia 31 de Maio de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 11 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

21. No dia 30 de Junho de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 12 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

22. No dia 29 de Julho de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 12 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

23. No dia 31 de Agosto de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 13 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

24. No dia 30 de Setembro de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 13 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

25. No dia 31 de Outubro de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»


(…)” (cfr. recibo, de fls. 14 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

26. No dia 30 de Novembro de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»




(…)” (cfr. recibo, de fls. 14 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

27. No dia 30 de Dezembro de 2016, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»




(…)” (cfr. recibo, de fls. 15 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

28. No dia 31 de Janeiro de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»


(…)” (cfr. recibo, de fls. 15 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

29. No dia 28 de Fevereiro de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»


(…)” (cfr. recibo, de fls. 16 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

30. No dia 31 de Março de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 16 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

31. No dia 30 de Abril de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 17 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

32. No dia 31 de Maio de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»


(…)” (cfr. recibo, de fls. 17 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

33. No dia 30 de Junho de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»


(…)” (cfr. recibo, de fls. 18 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

34. No dia 31 de Julho de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»


(…)” (cfr. recibo, de fls. 18 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

35. No dia 28 de Agosto de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 19 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

36. No dia 31 de Agosto de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»

(…)” (cfr. recibo, de fls. 19 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

37. No dia 30 de Setembro de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»


(…)” (cfr. recibo, de fls. 20 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

38. No dia 31 de Outubro de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


«Imagem no original»



(…)” (cfr. recibo, de fls. 20 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

39. No dia 30 de Novembro de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


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(…)” (cfr. recibo, de fls. 21 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

40. No dia 31 de Dezembro de 2017, a sociedade C..., Lda. emitiu um recibo de vencimento, em nome do Recorrente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


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(…)” (cfr. recibo, de fls. 21 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

41. Da base de dados da Segurança Social consta que, entre Janeiro de 2016 e Dezembro de 2017, a sociedade C..., Lda. entregou mensalmente a declaração de remunerações, com referência às remunerações e contribuições do Recorrente (cfr. print, de fls. 22 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

42. No dia 03 de Maio de 2017, o Recorrente entregou, via internet, a declaração modelo n.º 3 de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), relativa ao ano de 2016, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


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(…)

(…)

(…)


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(…)” (cfr. declaração, de fls. 23 a 26 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

43. No dia 23 de Maio de 2018, o Recorrente entregou, via internet, a declaração modelo n.º 3 de IRS, relativa ao ano de 2017, onde se pode ler, designadamente, que “(…)


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(…)

(…)

(…)


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(…)” (cfr. declaração, de fls. 26 a 30 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

44. Do sistema e-factura, consta que, entre 01 de Janeiro de 2016 e 31 de Dezembro de 2016, foram emitidas 12 facturas em nome do Recorrente, nomeadamente


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(…)” (cfr. print, de fls. 31 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

45. Do sistema e-factura, consta que, entre 01 de Janeiro de 2017 e 31 de Dezembro de 2017, foram emitidas 27 facturas em nome do Recorrente, nomeadamente “(…)


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(…)” (cfr. print, de fls. 32 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

46. No dia 13 de Junho de 2016, A...entregou junto dos serviços de registo de estado civil da prefeitura de Angers, em França, uma declaração de dissolução do pacto civil de solidariedade, celebrado com o Recorrente, por declaração conjunta, datada de 19 de Março de 2016 (cfr. declaração, de fls. 32 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

47. Do registo comercial francês consta que, no dia 17 de Janeiro de 2011, foi constituída a sociedade B..., sociedade civil imobiliária, com o objecto social de “Aquisição, gestão de todos os imóveis”, com sede em 4 Rue de la L..., 49290 C…, em França, e o capital de € 500,00, sendo o Recorrente o único sócio (cfr. extracto, de fls. 33 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

48. No dia 03 de Abril de 2019, a sociedade identificada no ponto antecedente entregou a declaração de rendimentos recebidos, no ano de 2018, onde se pode ler, designadamente, que “(…)

(…)


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(…)


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(…)


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(…)” (cfr. declaração, de fls. 33 a 38 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

49. No dia 16 de Dezembro de 2019, a inspectora de finanças públicas, da Direcção-Geral das Finanças Públicas, do Estado Francês, remeteu ao Recorrente, para a morada 14 A, Rua das A..., 3…, Portugal, informação sobre a resposta dada ao pedido de informação identificado no ponto n.º 1 do probatório (cfr. ofício, de fls. 38 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).


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Nada mais foi provado com relevância para a decisão em causa, atentos o pedido e a causa de pedir.

Motivação da decisão de facto

A decisão sobre a matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos juntos aos autos, tudo conforme especificado a propósito de cada um dos pontos do probatório, sendo certo que nenhum dos referidos documentos foi objecto de impugnação por qualquer uma das partes, nos termos dos arts. 444.º e 446.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi do art. 2.º, al. e), do CPPT.»


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- De Direito

A sentença recorrida, autonomizando como questão a decidir a de saber “se estão reunidos todos os pressupostos para o levantamento do sigilo bancário sobre a conta n.º 0..., da Agência 0... – F... – Pombal, do banco C..., SA, titulada pelo S..., com referência ao período compreendido entre 01/01/16 e 31/12/17, concluiu em sentido negativo e, como tal, anulou o despacho da Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, de 16/12/19, que autorizou o levantamento do sigilo bancário sobre a referida conta n.º 0....

A Recorrente, Fazenda Pública, discorda do decidido nos termos sintetizados nas conclusões transcritas.

Vejamos, então.

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Assim sendo, as questões que constituem objecto do presente recurso, são as seguintes:

(i) Saber se há erro de julgamento da matéria de facto;

(ii) Saber se a sentença errou no julgamento de direito, porquanto, contrariamente ao decidido, estão reunidos os pressupostos para a derrogação do sigilo bancário, tendo o Tribunal a quo errado na interpretação e aplicação do disposto nos artigos 63º -B, nº1, alíneas b) e h), 74º e 76º, todos da LGT.

Antes de entrarmos na análise do recurso jurisdicional interposto, há duas questões cujo conhecimento prévio se impõe e que vêm suscitadas em sede de contra-alegações.

Defende o Recorrido que a “decisão proferida em primeira instância não admite recurso”, mais sustentando que a “parte da sentença que fixou à acção o valor de 30.000,01€ é nula por falta de fundamentação de facto e de direito”. No entendimento do Recorrente, “o artigo 146.º-B, n.º 3 diz que para esta acção não é necessária a intervenção de advogado, pelo que à acção não pode ser atribuído valor superior a 5.000€, por ser a alçada do Tribunal de primeira instância (artigo 40.º, n.º 1 do CPC)”.

Vejamos, então.

Tal como consta do resumo da peça processual entregue no SITAF pelo Ilustre Mandatário que subscreveu a petição de recurso da decisão de levantamento do sigilo bancário, dirigida ao TAF de Leira (cfr. fls. 1 dos autos, em suporte de papel), aí foi indicado o valor do processo de € 5.001,00.

Na sentença agora sob recurso a Mma. Juíza a quo, com expresso apelo ao artigo 34º, nºs 1 e 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), fixou o valor da causa em € 30.000,01. Com efeito, aí se lê: “Fixo o valor da causa em € 30.000,01, nos termos do art. 34.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), aplicável ex vi do art. 2.º, al. d), do CPPT”.

Vem o Recorrido sustentar que parte da sentença que fixou à acção o valor de €30.000,01 é nula por falta de fundamentação.

Não cremos que assim seja, pois, como é genericamente entendido pela doutrina e pelos Tribunais Superiores, só a total omissão dos fundamentos, a completa ausência de motivação da decisão, pode conduzir à nulidade correspondente à falta de fundamentação.

A causa de nulidade tipificada na alínea b) do nº 1 do artigo 615º do CPC ocorre quando não se especifiquem os fundamentos de facto e de direito em que se funda a decisão. Em igual sentido, o disposto no artigo 125º, nº1 do CPPT, nos termos do qual constituem causas de nulidade da sentença, além do mais, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão.

O dever de fundamentar as decisões tem consagração expressa no artigo 154º do CPC e impõe--se por razões de ordem substancial, cumprindo ao juiz demonstrar que da norma geral e abstracta soube extrair a disciplina ajustada ao caso concreto, e de ordem prática, posto que as partes precisam de conhecer os motivos da decisão, em particular a parte vencida, a fim de, sendo admissível o recurso, poder impugnar o respectivo fundamento ou fundamentos – cfr. acórdão do STJ, de 02/06/16, processo nº 781/11.6TBMTJ.L1.S1.

Não pode, porém, confundir-se a falta absoluta de fundamentação com a fundamentação insuficiente, errada ou medíocre, sendo que só a falta absoluta de motivação constitui a causa de nulidade prevista na alínea b) citada, como dão nota A. Varela, M. Bezerra e S. Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª ed. 1985, p. 670/672, ao escreverem “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”.

No caso concreto, ainda que com uma fundamentação parca, a explicitação da razão da fixação do valor da acção em 30.000,01 é absolutamente apreensível, em face dos dispositivos legais convocados.

Não se verificando a alegada nulidade, pode haver erro de julgamento, como, aliás, o Recorrido sugere.

Vejamos se assim é, importando ter presente que o processo judicial tributário compreende, além dos meios especificamente indicados nas alíneas a) a p) do artigo 97º do CPPT, os denominados “Outros meios processuais previstos na lei”, conforme alínea q), nos quais se inclui o processo especial de derrogação do dever de sigilo bancário, regulado no artigo 146º-A do CPPT.

Desde já se diga que é de afastar in casu a aplicação que a Recorrente pretende fazer do artigo 40º (Constituição obrigatória de advogado) do CPC.

A legislação processual tributária tem norma própria sobre o patrocínio judiciário e representação em juízo, como resulta do artigo 6º do CPPT, nos termos do qual é obrigatória a constituição de mandatário nos tribunais tributários, nos termos previstos na lei processual administrativa.

Por sua vez, o nº 1 do artigo 11º do CPTA dispõe que “Nos tribunais administrativos é obrigatória a constituição de mandatário, nos termos previstos no Código do Processo Civil, podendo as entidades públicas fazer-se patrocinar em todos os processos por advogado, solicitador ou licenciado em direito ou em solicitadoria com funções de apoio jurídico, sem prejuízo da possibilidade de representação do Estado pelo Ministério Público”.

Ora, o artigo 146º-B, nº3 do CPPT dispõe, no que para aqui importa, que “A petição referida no número anterior – leia-se, o recurso da decisão da administração tributária que determina o acesso directo à informação bancária – não obedece a formalidade especial, não tem de ser subscrita por advogado…”.

É com base nesta disposição que o Recorrido invoca o preceituado no artigo 40º, nº1, alínea a) do CPC, segundo a qual é obrigatória a constituição de advogado nas causas de competência de tribunais com alçada, em que seja admissível recurso ordinário. A contrario, conclui o Recorrido, não sendo obrigatória a constituição de mandatário, “então à acção não pode ser atribuído valor superior a 5.000€, por ser a alçada do Tribunal de primeira instância”.

Ora, podendo considerar-se que a não exigência de subscrição da p.i por advogado, tal como previsto no artigo 146º-B, nº3 do CPPT, é uma solução pouco razoável face à importância e melindre dos interesses em conflito na decisão de acesso à informação bancária, a verdade é que, como bem esclarece J. Lopes de Sousa, “esta dispensa de representação por advogado limita-se à subscrição da petição, pelo que, na restante tramitação de processo, serão aplicáveis a regra do n.º 1 do mesmo art. 6.º e o art. 32.º do CPC, que estabelecem as regras gerais sobre a obrigatoriedade de tal representação. Na verdade, se se pretendesse dispensar globalmente a constituição de advogado, não se incluiria a referência restritiva à subscrição da petição. Por outro lado, nem se compreenderia que num processo judicial em que podem estar em causa interesses materiais de importância fundamental (designadamente o direito à reserva da intimidade da vida privada, que é um direito fundamental, indicado no art. 26.º, n.º 1, da CRP) existisse a dispensa de constituição de advogado, quando tenham de ser discutidas questões de direito. Nesta perspectiva, mesmo a própria admissibilidade de subscrição da petição pelo próprio interessado é uma solução pouco razoável.” – in, CPPT Anotado e Comentado, Vol. II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pag. 560.

Nos processos sobre acesso a documentação bancária estão em causa interesses não quantificáveis, pelo que será aplicável, subsidiariamente, por força do preceituado no artigo 2º, alínea c), do CPPT, o artigo 34º, nº 2, do CPTA, que estabelece que, quando o valor da causa seja indeterminável, considera-se superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo, dispondo o nº1 do mesmo preceito, além do mais, que “consideram-se de valor indeterminável os processos respeitantes a bens imateriais …”. É o caso do recurso da decisão da administração tributária que determina o acesso directo à informação bancária, previsto no artigo 146º -B do CPPT. Note-se que o artigo 97º-A do CPPT respeitante aos valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as acções que decorram nos tribunais tributários, não prevê o caso dos processos em que estão em causa interesses não quantificáveis, de valor indeterminável, pelo que, por força do artigo 2º, alínea d) do CPPT, impõe-se a aplicação do CPTA.

Ora, de acordo com o nº 4 do artigo 6º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), a alçada dos tribunais centrais administrativos corresponde à que se encontra estabelecida para os tribunais da Relação, a qual corresponde a € 30.000,00 nos termos do disposto no nº 1 do artigo 44º da Lei da organização do sistema judiciário.

Quer isto dizer que o valor dos processos em que estejam em causa interesses imateriais é de € 30.000,01 – neste sentido, também, J Lopes de Sousa, obra citada, págs. 563 e 564.

Isto mesmo foi considerado na sentença e, como se vê, bem, pelo que nenhum erro de julgamento existe relativamente à fixação do valor da acção.

Improcede, pois, esta primeira questão que nos vinha dirigida e que, nos termos vistos, implicava também a apreciação de nulidade.


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O recorrido defende, ainda, que “a Recorrente não tem legitimidade processual para interpor o presente recurso por falta de interesse em agir e por não ter sido mandatada para isso pela verdadeira interessada, que é a administração fiscal francesa”.

Densificando esta alegação, invoca o Recorrido que “o procedimento tendente ao levantamento do sigilo bancário do recorrido não foi da iniciativa da Direcção Geral da ATA, mas que esta agiu a pedido e no interesse da Direcção-Geral das Finanças Públicas do Estado Francês”, o que significa que “quem tem interesse no levantamento do sigilo bancário que cobre a conta bancária do Recorrido não é a Recorrente, mas uma entidade estrangeira”.

Também aqui o Recorrido não tem razão naquilo que invoca, sendo certo que, como resulta dos autos, a decisão da Directora-Geral da ATA, proferida ao abrigo do artigo 63º-B da LGT, o foi na sequência de um pedido formulado pelas autoridades fiscais francesas, ao abrigo da Convenção para evitar a dupla Tributação (CDT) celebrada entre Portugal e França e, bem assim, da Convenção relativa a assistência mútua administrativa em matéria fiscal.

Vejamos, então.

Dispõe o artigo 631º do CPC, sob a epígrafe Quem pode recorrer, que “Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, os recursos só podem ser interpostos por quem, sendo parte principal na causa, tenha ficado vencido”.

A regra geral determina que só a parte principal que tenha ficado vencida na causa pode recorrer. Nos presentes autos, a ATA, concretamente, a Directora-Geral da ATA, contra quem foi interposto o recurso previsto no artigo 146º-A do CPPT, ficou vencida na causa, como decorre da sentença que, decidindo favoravelmente à posição de S..., anulou o despacho de 16/12/19, da autoria da Directora-Geral da ATA que, na sequência do pedido das autoridades fiscais francesas, autorizou o acesso “directo à informação bancária solicitada relacionada com a conta nº 0..., da C..., SA”.

Como refere António Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almeida, 2013, pág. 62 e 63, “Não deve confundir-se o pressuposto da legitimidade com o do interesse em agir. A legitimidade afere-se através do prejuízo que a decisão determina na esfera jurídica do recorrente. Já interesse em agir está ligado à utilidade prática que emana da utilização dos meios jurisdicionais e, concretamente, em sede de recursos, aos efeitos que decorrem da intervenção do tribunal superior, o que permite excluir casos em que, apesar de a parte ter ficado objectivamente vencida, nenhuma utilidade pode extrair da eventual revogação ou anulação da decisão”.

Ora, no caso, a autoria da decisão inicialmente recorrida, proferida ao abrigo do artigo 146º-A do CPPT, é da Directora-Geral, sendo evidente que a Recorrente tem interesse no desfecho ditado pela pronúncia do TCA, pois será o Tribunal de recurso a determinar se se mantém, ou não, a sentença e, nessa medida, se considera ilegal, ou legal, a decisão da Directora-Geral da ATA, nos termos da qual as autoridades fiscais portuguesas dão cumprimento a um pedido que lhe foi dirigido por uma autoridade fiscal estrangeira, ao abrigo de convenções internacionais que vinculam o Estado Português.

Em suma, improcede a questão ora analisada, tal como foi suscitada pelo Recorrido.


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Entremos na análise do recurso jurisdicional propriamente dito.

A primeira questão que a Recorrente pretende ver apreciada prende-se com o erro de julgamento da matéria de facto, tal como resulta das conclusões B) e C).

Na conclusão B), e de forma detalhada, encontra-se descrito um extenso circunstancialismo que a Recorrente pretende ver incluído no probatório.

Sem hesitar, diremos que nenhuma razão assiste à Recorrente, pois que, como facilmente se compreende, o pretendido incluir nos factos provados é, afinal, o conteúdo da fundamentação/pedido das autoridades fiscais francesas e, bem assim, a posição assumida pelas autoridades fiscais portuguesas sobre tal pedido, sendo certo que isso mesmo já se mostra acolhido no probatório, em concreto nos pontos 1 e 2 dos factos provados.

Sem necessidade de mais delongas, indefere-se o pretendido quanto ao erro de julgamento da matéria de facto.


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Avancemos para a questão nuclear que aqui nos ocupa: saber se a sentença errou no julgamento de direito, porquanto, contrariamente ao decidido, estão reunidos os pressupostos para a derrogação do sigilo bancário, tendo o Tribunal a quo errado na interpretação e aplicação do disposto nos artigos 63º -B, nº1, alíneas b) e h), 74º e 76º, todos da LGT.

Vejamos, então.

Comecemos pelo devido enquadramento legal da questão que vem colocada, tal como a sentença o evidenciou.

De acordo com o preceituado no artigo 27º, nº1, da Convenção celebrada entre Portugal e França para Evitar a Dupla Tributação e Estabelecer as Regras de Assistência Administrativa Recíproca em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, de 14 de Janeiro de 1971, publicada no Diário da República I Série, nº 72, de 26 de Março de 1971, com entrada em vigor, em 18 de Outubro de 1972, doravante designada por CDT, “[o]s Estados Contratantes obrigam-se, mediante reciprocidade, a trocar as informações úteis para assegurar o lançamento e cobrança regulares dos impostos abrangidos por esta Convenção, bem como a aplicação, no que respeita a esses impostos, das disposições legais relativas à repressão da fraude fiscal. Todas as informações deste modo trocadas serão consideradas secretas e só poderão ser comunicadas às pessoas ou autoridades encarregadas do lançamento ou da cobrança dos impostos abrangidos por esta Convenção”, estabelecendo o nº 2 que “[o] disposto no n.º 1 nunca poderá ser interpretado no sentido de impor a um dos Estados Contratantes a obrigação: a)De tomar medidas administrativas contrárias à sua legislação ou à sua prática administrativa ou às do outro Estado Contratante; b)De fornecer informações que não possam ser obtidas com base na sua legislação ou no âmbito da sua prática administrativa normal ou das do outro Estado Contratante; c)De transmitir informações reveladoras de segredos comerciais, industriais ou profissionais ou de processos comerciais ou informações cuja comunicação seria contrária à ordem pública.”

Para além disso, em conformidade com o disposto no artigo 5.º da Directiva n.º 2011/16/EU do Conselho, de 15 de Fevereiro de 2011, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade, publicada no Jornal Oficial da União Europeia, de 11 de Março de 2011, e transposta para o direito interno português através Decreto-Lei n.º 61/2013, de 10 de Maio de 2013, com entrada em vigor no dia 11 de Maio de 2013, doravante designada por Directiva, “[a] pedido da autoridade requerente, a autoridade requerida comunica à autoridade requerente todas as informações a que se refere o n.º 1 do artigo 1.º de que disponha ou que obtenha na sequência de inquéritos administrativos.”

A isto acresce que, nos termos do artigo 6.º, n.º 1, da Directiva, “[a] autoridade requerida manda efectuar os inquéritos administrativos necessários para obter as informações a que se refere o art. 5.º”, determinando o n.º 2 que “[o] pedido a que se refere o artigo 5.º pode conter um pedido fundamentado de inquérito administrativo específico. Caso a autoridade requerida entenda que não é necessário um inquérito administrativo, informa imediatamente a autoridade requerente das razões que lhe assistem.”

Por sua vez, de harmonia com o estatuído no artigo 17.º, n.º 1, da Directiva, “[a] autoridade requerida de um Estado-Membro comunica à autoridade requerente de outro Estado-Membro as informações a que se refere o artigo 5º, desde que a autoridade requerente tenha esgotado as fontes habituais de informação a que teria podido recorrer segundo as circunstâncias para obter as informações solicitadas sem correr o risco de prejudicar a consecução dos seus objectivos”, dispondo o n.º 2 que “[a] presente directiva não impõe qualquer obrigação ao Estado-Membro requerido de proceder a inquéritos ou de comunicar informações, se a realização de tais inquéritos ou a recolha das informações pretendidas para fins próprios infringir a sua legislação”, o n.º 4 que “[a] prestação de informações pode ser recusada quando conduza à divulgação de um segredo comercial, industrial ou profissional ou de um processo comercial, ou de informações cuja divulgação seja contrária à ordem pública” e o n.º 5 que “[a] autoridade requerida informa a autoridade requerente dos motivos que obstam a que o pedido de informações seja satisfeito.”

E, nos termos do artigo 18.º, n.º 1, da Directiva, “[s]e forem solicitadas informações por um Estado-Membro nos termos da presente directiva, o Estado-Membro requerido recorre às medidas que tenha previsto em matéria de recolha de informações para a obtenção das informações solicitadas, mesmo que não necessite dessas informações para os seus próprios fins fiscais. Esta obrigação é imposta sem prejuízo dos n. os 2, 3 e 4 do artigo 17.º, cuja invocação não pode em caso algum ser entendida como autorizando um Estado-Membro requerido a não prestar informações apenas por não ter interesse nessas informações a nível interno”, acrescentando o n.º 2 que “[o] disposto nos n. os 2 e 4 do artigo 17. o não pode, em caso algum, ser entendido como autorizando a autoridade requerida de um Estado-Membro a escusar-se a prestar informações apenas pelo facto de essas informações estarem na posse de uma instituição bancária, de outra instituição financeira, de uma pessoa designada ou actuando na qualidade de agente ou de fiduciário ou pelo facto de estarem relacionadas com uma participação no capital de uma pessoa.”

No mesmo sentido, segundo o que vem previsto no artigo 4.º, n.º 1, da Convenção sobre Assistência Administrativa Mútua em Matéria Fiscal, da Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económico (OCDE), aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 80/2014 e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 68/2014, publicada no Diário da República, Série I, n.º 178, de 16 de Setembro de 2014, com entrada em vigor, em 01 de Março de 2015, doravante designada por Convenção, “[a]s Partes trocam, designadamente de acordo com o previsto nesta Secção, qualquer informação que seja previsivelmente relevante para a administração ou execução da legislação interna respeitante aos impostos abrangidos pela presente Convenção.”

Também no artigo 5.º, n.º 1, da Convenção se estabelece que “[a] pedido do Estado requerente, o Estado requerido presta-lhe qualquer informação prevista no artigo 4.° sobre determinadas pessoas ou transacções”, determinando o n.º 2 que “[s]e a informação disponível nos processos fiscais do Estado requerido for insuficiente para lhe permitir dar cumprimento ao pedido de informação, esse Estado adoptará todas as medidas necessárias a fim de prestar ao Estado requerente a informação solicitada.”

A isto acresce que, de acordo com o estipulado no artigo 20.º, n.º 2, da Convenção “[s]e o pedido for rejeitado, o Estado requerido informa, logo que possível, o Estado requerente sobre essa decisão e os motivos da mesma.”

E, nos termos do artigo 21.º, n.º 1, da Convenção, “[n]ada na presente Convenção afectará os direitos e as garantias concedidos às pessoas pela legislação ou pela prática administrativa do Estado requerido”, dispondo o n.º 2 que “[à] excepeção do previsto no artigo 14º, as disposições da presente Convenção não serão interpretadas como impondo ao Estado requerido a obrigação de:

a) …;

b) …;

c) Prestar informação que não pode ser obtida ao abrigo da sua própria legislação ou de acordo com a sua prática administrativa, ou ao abrigo da legislação ou de acordo com a prática administrativa do Estado requerente;

d) Prestar informação suscetível de revelar um segredo comercial, empresarial, industrial ou profissional, ou um processo comercial, ou informação cuja divulgação seria contrária à ordem pública;

e) Prestar assistência administrativa, se e na medida em que considerar que a tributação do Estado requerente é contrária aos princípios tributários geralmente aceites ou às disposições de uma convenção para evitar a dupla tributação ou de qualquer outra convenção que ele tenha concluído com o Estado requerente;

f) Prestar assistência administrativa para efeitos de administração ou aplicação de uma disposição do Direito fiscal do Estado requerente, ou para efeitos de preenchimento de qualquer requisito conexo que seja discriminatório de um nacional do Estado requerido em relação a um nacional do Estado requerente em idênticas circunstâncias;

g) Prestar assistência administrativa, se o Estado requerente não tiver executado todas as medidas razoáveis previstas na sua legislação ou de acordo com a sua prática administrativa, exceto quando o recurso a tais medidas acarretar dificuldades desproporcionadas;

h) …”, o n.º 3 que “[s]e o Estado requerente solicitar a informação ao abrigo da presente Convenção, o Estado requerido utilizará as suas medidas de recolha de informação para obter a informação solicitada, mesmo que o Estado requerido não necessite dessa informação para os seus próprios fins tributários. A obrigação contida na frase anterior está sujeita aos limites previstos na presente Convenção, mas tais limites, designadamente os limites previstos nos números 1 e 2, em caso algum serão interpretados no sentido de permitir que o Estado requerido se recuse a prestar tal informação apenas com base no facto de ela não ter para ele interesse a nível interno ” e o n.º 4 que “[a]s disposições da presente Convenção, incluindo as dos números 1 e 2, em caso algum serão interpretadas no sentido de permitir que o Estado requerido se recuse a prestar informações apenas com base no facto delas estarem na posse de um banco, de outra instituição financeira, de um mandatário ou de uma pessoa agindo na qualidade de agente ou de fiduciário, ou de as mesmas estarem relacionadas com os direitos de propriedade de uma pessoa ”

Em contrapartida, em conformidade com o disposto no artigo 63.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT), sob a epígrafe «Inspecção», “[o]s órgãos competentes podem, nos termos da lei, desenvolver todas as diligências necessárias ao apuramento da situação tributária dos contribuintes…”, dispondo o n.º 3 que “[s]em prejuízo do número anterior, o acesso à informação protegida pelo sigilo bancário e pelo sigilo previsto no Regime Jurídico do Contrato de Seguro faz-se nos termos previstos nos artigos 63.º-A, 63.º-B e 63.º-C.”

Por último, nos termos do artigo 63.º-B, n.º 1, da LGT e com relevo para o caso concreto, “[a] administração tributária tem o poder de aceder a todas as informações ou documentos bancários, bem como a informações ou documentos de outras entidades financeiras previstas como tal no artigo 3.º da Lei n.º 25/2008, de 5 de junho, alterado pelos Decretos- Leis n.os 317/2009, de 30 de outubro, e 242/2012, de 7 de novembro, sem dependência do consentimento do titular dos elementos protegidos:

a) (…)

b) Quando se verifiquem indícios da falta de veracidade do declarado ou esteja em falta declaração legalmente exigível;

c) (…)

d) (…)

e) (…)

f) (…)

g) (…)

h) Quando se trate de informações solicitadas nos termos de acordos ou convenções internacionais em matéria fiscal a que o Estado português esteja vinculado.

Por último, de acordo com o nº4 do preceito que temos vindo a citar, “As decisões da administração tributária referidas nos números anteriores devem ser fundamentadas com expressa menção dos motivos concretos que as justificam e, salvo o disposto no número seguinte e no n.º 13, notificadas aos interessados no prazo de 30 dias após a sua emissão, sendo da competência do diretor-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, ou dos seus substitutos legais, sem possibilidade de delegação”.

Face ao enquadramento legal gizado e em que nos moveremos, a sentença discorreu nos seguintes termos que aqui adoptamos:

“Perante a leitura das disposições legais anteriormente transcritas, constata-se, antes de mais, que através do art. 27.º, n.º 1, da CDT, o Estado português e o Estado francês implementaram entre si um sistema de troca de informações em matéria fiscal, com vista a combater a fraude e evasão fiscais e a assegurar a liquidação e cobrança dos respectivos impostos.

Neste contexto, do disposto no art.27.º, n.º2, da CDT, decorre que o dever recíproco de troca de informações não é absoluto ou ilimitado, não sendo possível ao Estado requerente obter do Estado requerido informações cuja obtenção não seja lícita à luz do direito interno de cada um dos Estados contratantes ou das correspondentes práticas administrativas ou que estejam protegidas pelo segredo comercial, industrial ou profissional ou, ainda, cuja divulgação seja contrária à ordem pública.

Indo mais longe, a Directiva n.º 2011/16/EU do Conselho, que vincula todos os Estados-Membros da União Europeia, incluindo Portugal e França, estabeleceu um regime de troca de informações em matéria fiscal que comporta três modalidades distintas: a troca de informações a pedido, a troca automática de informações e a troca espontânea de informações.

A primeira modalidade encontra-se prevista nos arts. 5º a 7.º da Directiva, sendo aquela em que é efectuada com base num pedido apresentado pelo Estado-Membro requerente ao Estado-Membro requerido com referência a um caso específico, e mediante o qual a autoridade requerida comunica à autoridade requerente todas a informações que disponha ou que obtenha na sequência de inquéritos administrativos, entendendo-se como tal todos os controlos, verificações e acções empreendidos pelos Estados-Membros no desempenho das suas atribuições, com o objectivo de assegurar a correcta aplicação da legislação fiscal, conforme vem definido no art. 3.º, n.º 7, da Directiva.

(…)

No entanto, tal como foi visto relativamente à CDT, a obrigação de troca de informações entre os Estados-Membros não é aqui absoluta ou ilimitada, estando sujeita a diversos limites, mormente, os que estão enunciados no art. 17.º, n.ºs 1, 2 e 4, da Directiva.

Com efeito, na modalidade de troca de informações a pedido, a informação só pode ser facultada à autoridade requerente, desde que a mesma tenha esgotado as fontes habituais de informação a que teria podido recorrer segundo as circunstâncias, sem correr o risco de prejudicar a prossecução dos seus objectivos.

Para além disso, independentemente da modalidade de troca de informações, o Estado-Membro requerido não é obrigado a efectuar inquéritos administrativos ou a comunicar informações, se tal infringir a sua legislação.

A isto acresce que a prestação de informações pode ser recusada quando conduza à divulgação de um segredo comercial, industrial ou profissional, de um processo comercial, ou de informações cuja divulgação seja contrária à ordem pública.

Não obstante, no que se refere a informação protegida pelo sigilo bancário, o art. 18.º, n.º 2, da Directiva, estabelece que um Estado-Membro não pode recusar-se a prestar informações desse tipo apenas pelo facto de as mesmas estarem na posse de uma instituição bancária ou outra instituição financeira.

Em qualquer dos casos, o Estado-Membro requerido deve recorrer às medidas que tenha previsto em matéria de recolha de informações para a obtenção das informações solicitadas, ainda que não necessite dessas informações para os seus próprios fins fiscais, em cumprimento do disposto no art. 18.º, n.º 1, da Directiva, ficando assim salvaguardada a legalidade de todo o procedimento diante das normas internas desse Estado.

À semelhança do que vem previsto na Directiva, também a Convenção da OCDE, da qual Portugal e França são partes, estabelece um regime de troca de informações em matéria fiscal nas três modalidades anteriormente indicadas, conforme decorre do disposto nos arts. 5.º a 7.º da Convenção, de onde se destaca a troca de informações a pedido, por ser aquela que se dirige a determinados contribuintes ou transacções.

E, como já seria de esperar, o regime de troca de informações não pode, em qualquer uma das suas modalidades, afectar os direitos e garantias concedidos aos contribuintes pela legislação ou pela prática administrativa do Estado requerido, tal como vem expressamente previsto no art. 21.º, n.º 1, da Convenção.

Daí que o Estado requerido tenha a faculdade de recusar-se a prestar informações que não possa obter ao abrigo da sua própria legislação ou de acordo com a sua prática administrativa, nos termos do art. 21.º, n.º 2, al. c), da Convenção.

No mesmo sentido, o Estado requerido pode recusar-se a prestar informações que conduzam à divulgação de um segredo comercial, empresarial, industrial ou profissional ou de informações cuja divulgação seja contrária à ordem pública, nos termos do art. 21.º, n.º 2, al. d), da Convenção.

Sem prejuízo, no que se refere a informações protegidas pelo sigilo bancário, de forma idêntica ao que vem estipulado no art. 18.º, n.º 2, da Directiva, o Estado requerido não pode recusar-se a prestar informações desse tipo apenas pelo facto de as mesmas estarem na posse de uma instituição bancária ou outra instituição financeira, nos termos do art. 21.º, n.º 4, da Convenção.

Para além disso, o Estado requerido pode recusar-se a prestar informações quando a tributação do Estado requerente for contrária aos princípios tributários geralmente aceites, às disposições de uma convenção para evitar a dupla tributação ou de qualquer outra convenção que tenha concluído com o Estado requerente, quando determine a discriminação de um nacional do Estado requerido em relação a um nacional de um Estado requerente em idênticas circunstâncias ou, ainda, quando o Estado requerente não tiver executado todas as medidas razoáveis previstas na sua legislação ou de acordo com a sua prática administrativa para obter essa informação, excepto quando tal acarretar dificuldades desproporcionadas, nos termos do art. 21.º, n.º 2, als. e) a f), da Convenção.

Por fim, mais uma vez, aqui se dispõe que, se o Estado requerido não dispor de informação suficiente para lhe permitir dar cumprimento ao pedido de informação, esse Estado deve adoptar todas as medidas necessárias para esse efeito, devendo utilizar as suas próprias medidas de recolha de informação, ainda que não necessite dessa informação para os seus próprios fins tributários, nos termos dos art. 20.º, n.º 2, e 21.º, n.º 3, da Convenção”.

Posto isto, não restam dúvidas de que, sempre que um determinado Estado, incluindo o Estado francês, requeira ao Estado português informação relativa a um determinado contribuinte que se encontre protegida pelo sigilo bancário, a mesma deve ser recolhida e fornecida de acordo com a observância das regras aplicáveis e que atrás ficaram devidamente transcritas e explicadas.

Aproximemo-nos do caso concreto, dando conta, uma vez mais, do entendimento adoptado pela sentença e que ditou que o TAF de Leiria tivesse reputado ilegal a decisão sindicada.

Considerou a Mma. Juíza, no essencial, que:

“(…)

Como fundamento desse pedido, a Direcção-Geral das Finanças Públicas, do Estado francês, indicou que o Recorrente está a ser objecto de uma acção de controle fiscal em França, nos anos de 2016 e 2017, por não ter apresentado prova de ser residente em Portugal, naqueles anos, e por não ter declarado quaisquer rendimentos profissionais em França, nesses anos, não obstante ter domicílio fiscal em França, contas bancárias pessoais em França e três filhos em França, um dos quais menores, sendo que, de acordo com as informações prestadas pelo próprio, no âmbito desse procedimento, o mesmo faz visitas livres aos seus filhos, uma vez que inexiste uma decisão judicial de regulação do direito de visita e guarda (cfr. ponto n.º 1 do probatório).

Para além disso, indicou que o Recorrente, como parte da sua actividade profissional de transporte, tem um armazém em França, no qual parece que é exercida uma parte da actividade da sociedade de direito português C..., Lda. (cfr. ponto n.º 1 do probatório).

Mais, indicou que foram esgotadas todas as fontes de informação habituais passíveis de serem usadas nestas circunstâncias para obter a informação solicitada, sem correr o risco de prejudicar o resultado da investigação (cfr. ponto n.º 1 do probatório).

Assim sendo, a Direcção-Geral das Finanças Públicas, do Estado francês, considerou que ficou demonstrado que o Recorrente foi residente em França, nos anos de 2016 e 2017, devendo assim declarar à administração tributária francesa todas as contas abertas no estrangeiro, nos termos do art. 1649.º-A, do Código Geral dos Impostos francês, sendo que, apesar do mesmo ter informado que tinha uma conta bancária aberta em Portugal e fornecido a respectiva identificação, não entregou uma cópia dos extractos dessa conta, dos anos de 2016 e 2017, especificando que em Portugal não há extractos bancários (cfr. ponto n.º 1 do probatório).

Ora, diante de tal pedido, constata-se que a administração tributária portuguesa limitou-se a aceitar os fundamentos apresentados pela administração tributária francesa, autorizando o levantamento do sigilo bancário sobre a conta titulada pelo Recorrente em Portugal, sem ponderar se existia algum motivo para recusar a informação solicitada e, sobretudo, sem dar início a qualquer procedimento de inspecção com vista a aferir do preenchimento dos pressupostos do levantamento do sigilo bancário, em violação do disposto nos arts. 63.º, n.ºs 1 e 3, e 63.º-B, n.º 1, da LGT, no art. 27.º, n.º 2, al. a), da CDT, no art. 18.º, n.º 1, da Directiva e nos arts. 5.º, n.º 2, e 21.º, n.º 1, da Convenção (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 do probatório).

É certo que as informações prestadas pelas administrações tributárias estrangeiras, ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua e de outras normas de direito comunitário e internacional a que o Estado português esteja vinculado, presumem-se verdadeiras e de boa-fé, quando fundamentadas e baseadas em critérios objectivos, em conformidade com o que vem previsto no art. 76.º, n.ºs 1 e 4, da LGT.

Mas, como é bom de ver, tal presunção aplica-se apenas às informações prestadas pelas administrações tributárias estrangeiras à administração tributária portuguesa para serem por esta utilizadas na tributação de sujeitos passivos no território nacional e não ao pedido de informação formulado pelas administrações tributárias estrangeiras, com vista à tributação nos respectivos países.

Com efeito, diversamente do que parece ter sido entendido pela Autoridade Tributária e Aduaneira, aqueles normativos não possuem a virtuosidade de dispensar a administração tributária portuguesa de desencadear os procedimentos legalmente previstos para a recolha das informações que lhe são solicitadas pelas administrações tributárias estrangeiras, a começar pelo procedimento de inspecção tributária, previsto nos arts. 63.º, n.ºs 1 e 3, e 63.º-B, n.º 1, da LGT.

Do resultado desses procedimentos pode, depois, o Recorrente defender-se perante a administração tributária francesa, no caso de a mesma emitir alguma liquidação de imposto em seu nome, como, aliás, intuiu a Autoridade Tributária e Aduaneira, na respectiva oposição, ao não pretender escrutinar os factos alegados pelo Recorrente e que são controvertidos no âmbito do procedimento a decorrer em França.

Como se tal não bastasse, dos autos resulta que, nos anos de 2016 e 2017, o Recorrente auferiu rendimentos da categoria A de IRS, na qualidade de gerente da sociedade C..., Lda., sendo certo que, de acordo com as informações constantes do registo comercial, trata-se de uma sociedade que, desde a data da sua constituição, tem a sua sede em território nacional e da qual o Recorrente é o único sócio e gerente, desde 11 de Setembro de 2015 (cfr. pontos n.ºs 5 a 40 do probatório).

E, ainda, que, no dia 03 de Maio de 2017, o Recorrente apresentou uma declaração modelo n.º 3 de IRS, relativa ao ano de 2016, onde indicou o estado civil de solteiro, divorciado ou separado judicialmente, residência no continente e rendimentos auferidos no território nacional, pagos por aquela sociedade, e que, no dia 23 de Maio de 2018, apresentou uma declaração modelo n.º 3 de IRS, relativa ao ano de 2017, onde indicou, igualmente, o estado civil de solteiro, divorciado ou separado judicialmente, residência no continente e rendimentos auferidos no território nacional, pagos pela mesma sociedade (cfr. pontos n.ºs 42 e 43 do probatório).

Pelo que a administração tributária portuguesa não podia ignorar a situação tributária do Recorrente em território nacional (cfr. pontos n.ºs 5 a 40, 42 e 43 do probatório).

A isto acresce que o teor das referidas declarações modelo n.º 3 de IRS, presume-se verdadeiro e de boa-fé, ao abrigo do disposto no art. 75.º, n.º 1, da LGT, não resultando dos autos que a administração tributária portuguesa tenha apurado quaisquer factos susceptíveis de afastar essa presunção (cfr. pontos n.ºs 2, 42 e 43 do probatório).

Para além disso, sempre se impõe aqui fazer notar que tudo aponta para que o Recorrente tenha declarado os rendimentos que auferiu ao serviço da sociedade C..., Lda., com sede em Portugal, junto da administração tributária portuguesa, e que a sociedade B..., com sede em França e da qual o Recorrente é o único sócio, tenha declarado os rendimentos que auferiu pelo arrendamento de um armazém, sito nesse país, à sociedade C..., Lda., junto da administração tributária francesa, tal como vem indicado no ponto n.º B3-7, “Outros Comentários”, do pedido de troca de informações (cfr. pontos n.ºs 1, 5, 9, 15, 42, 43, 47 e 48 do probatório).

Isto porque, do simples cruzamento dessa informação, deriva que o pedido de troca de informações formulado pela administração tributária francesa poderá desembocar numa situação de dupla tributação internacional dos rendimentos auferidos pelo Recorrente ao serviço da sociedade C..., Lda., o que é proibido não só pela CDT, celebrada entre Portugal e França, como pelo art. 21.º, n.º 2, al. e), da Convenção da OCDE, da qual ambos os Estados são partes (cfr. pontos n.ºs 1, 5, 9, 15, 42, 43, 47 e 48 do probatório).

Deste modo, conclui-se que incumbia à administração tributária portuguesa não só desencadear o procedimento de inspecção tributária com o propósito de averiguar se estão reunidos todos os pressupostos necessários ao levantamento do sigilo bancário, como ainda apurar em que país é que o Recorrente deve ser considerado como residente para efeitos de tributação dos respectivos rendimentos, o que não foi feito (cfr. pontos n.ºs 1 a 46 do probatório).

Por conseguinte, andou mal a Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira quando, por despacho exarado, em 16 de Dezembro de 2019, decidiu autorizar o levantamento do sigilo bancário sobre a conta n.º 0..., de Agência 0... – F... – Pombal, do banco C..., SA, titulada pelo Recorrente, com referência ao período compreendido entre 01 de Janeiro de 2016 e 31 de Dezembro de 2017 (cfr. pontos n.ºs 2 e 3 do probatório)”.

O assim decidido é, no essencial, acolhido por este Tribunal, devendo evidenciar-se que o mesmo está de acordo com o entendimento seguido pelo TCA Norte, no acórdão nº 200/16.1 BEMDL, de 10/11/16, que se reproduz seguidamente. Em tal aresto se lê, relativamente a uma situação com diversas semelhanças com a presente, além do mais, o seguinte:

“Se bem entendemos, para o tribunal a quo se os motivos invocados pela administração fiscal estrangeira e assumidos pela AT encontrassem enquadramento numa das situações elencadas nas alíneas a) a g), do n°l do art.°63°-B da LGT, estaria legitimada a decisão da AT de aceder, por acto administrativo, à informação bancária.

Não entendemos assim. É certo que a citada Convenção entre Portugal e a França para Evitar a Dupla Tributação, no seu art.°27.°, prevê mecanismos de troca de informação em matéria fiscal; e a referida Directiva 2011/16/EU, do Conselho, de 15/02/2011, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade, prevê (art.°5.°) a troca de informações previsivelmente relevantes para a administração e a execução da legislação interna dos Estados-Membros respeitante aos impostos a que se refere o artigo 2.°, aí se incluindo os impostos sobre o rendimento (em causa nos autos).

No entanto, a informação que a AT pode disponibilizar à administração requerente restringe-se à que disponha sobre o contribuinte visado por via das obrigações acessórias dele ou declarativas de terceiros (cf. art.°63.°-A, da LGT) ou à que possa obter, na sequência dos designados «inquéritos administrativos» (artigos 3.°, n.°7 e 5.° da Directiva e art.°2.°, n.°2 alínea j), do RCPIT), sendo que, neste caso, a informação que pode fornecer à administração fiscal estrangeira se restringe à que possa obter livremente no exercício da sua acção inspectiva e fiscalizadora, genericamente previstas no n.°l do art.°63.° da LGT e art.°2.° do RCPIT, ou, em normas tributárias especiais.

Como se sabe, o acesso da AT à informação bancária não é irrestrito (art.°63.°, n.°3, da LGT) sendo que o legislador estabeleceu no n.°l do art.°63.°-B, da LGT, as condições concretas em que tal acesso se pode verificar por acto administrativo, condições essas que têm de ser evidenciadas em procedimento inspectivo iniciado a pessoa que apresente algum elemento de conexão ao sistema fiscal português (art.°18.°, n.°3, da LGT).

Como resulta do citado o n.°3 do art.°63.° da LGT, epigrafado “inspecção”, «...o acesso à informação protegida pelo sigilo bancário faz-se nos termos previstos nos artigos 63.°- A, 63.°-B e 63.°-C», o que inculca a ideia de que tal acesso só pode fazer-se no âmbito de um procedimento inspectivo, em que resulte evidenciado algum dos pressupostos elencados nas alíneas a) a g) do n.°l do art.°63.°-B da LGT, que legitime a decisão administrativa de levantamento do sigilo bancário.

Nesse sentido, pode ver-se o recente Ac. deste TCAN, de 14/01/2016, tirado no proc.°01680/15.8BEPRT, em que se deixou consignado: «Os pressupostos da derrogação do sigilo bancário a que se refere o art. 63°B da LGT são: decorra uma ação de fiscalização tributária [art. 63°, n.°3 da LGT];_nessa ação de fiscalização se recolha indícios de incumprimento dos deveres de colaboração do s.p. que decorrem das circunstâncias mencionadas nas várias alíneas do n.°l, [n.°l, do art. 63°B];_ que a derrogação do sigilo bancário seja necessária, adequada e proporcionada ao apuramento da situação tributária», visado na inspeção, [n.°l, do art. 63°-B, “diligências necessárias ao apuramento da situação tributária” em conjugação com o art. 55° (proporcionalidade) e art. T do RCIT]».

O art.º 18.°, n.°2, da Directiva não contende com o entendimento propugnado. Estatui esse preceito: «O disposto nos n.°s 2 e 4 do artigo 17.° não pode, em caso algum, ser entendido como autorizando a autoridade requerida de um Estado-Membro a escusar-se a prestar informações apenas pelo facto de essas informações estarem na posse de uma instituição bancária, de outra instituição financeira, de uma pessoa designada ou actuando na qualidade de agente ou de fiduciário ou pelo facto de estarem relacionadas com uma participação no capital de uma pessoa».

Por seu lado, estabelecem aqueles n.°s 2 e 4 do art.°17.° da Directiva:

«2. A presente directiva não impõe qualquer obrigação ao Estado-Membro requerido de proceder a inquéritos ou de comunicar informações, se a realização de tais inquéritos ou a recolha das informações pretendidas para fins próprios infringir a sua legislação.

(...)

4. A prestação de informações pode ser recusada quando conduza à divulgação de um segredo comercial, industrial ou profissional ou de um processo comercial, ou de informações cuja divulgação seja contrária à ordem pública».

Compreende-se o esforço de harmonização fiscal a nível da União Europeia através de medidas de combate coordenado à evasão fiscal. No entanto, tal norma não pode ser interpretada em sentido lato, de modo a vincular a AT a fornecer informação bancária pessoal à qual, nos termos do direito interno, não tem acesso irrestrito (mas só através do subprocedimento previsto no art.°63.°-B da LGT enxertado em procedimento inspectivo), apenas a vinculando a fornecer informação não protegida na posse das instituições financeiras sobre categorias de dados relativos a contas de clientes”.

Ora, o acabado de transcrever é aqui inteiramente aplicável e dispensa-nos de aturadas considerações para concluir que deve ser negado provimento ao recurso jurisdicional, em linha com o decidido pelo TAF de Leiria.

Realce-se, aliás, que o pedido das autoridades fiscais francesas assenta no pressuposto de o Recorrido não ser residente fiscal em Portugal (alegadamente por tal não ter sido demonstrado junto daquelas autoridades) e ser residente fiscal em França. Mas, perante tal, considerando que o Recorrido se apresentou, nos anos em causa, como residente fiscal em Portugal, aqui entregando as respectivas declarações de rendimentos, auferindo mensalmente rendimentos do trabalho dependente, não se pode aceitar que, sem mais, a ATA autorize a derrogação do sigilo bancário, numa decisão que assenta – repete-se – em pressupostos que a Recorrente está em condições de – no mínimo – questionar.

Repete-se, concluindo: improcedem as conclusões da alegação recursória e nega-se provimento ao recurso.


*




III - DECISÃO




Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.


Custas pela Recorrente.

Registe e Notifique.

Lisboa, 25/06/20


(Catarina Almeida e Sousa)

(Hélia Gameiro)

(Benjamim Barbosa)