Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:862/11.6BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/04/2020
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRS.
SOCIEDADES EM TRANSPARÊNCIA FISCAL.
Sumário:i) O regime da transparência fiscal caracteriza-se pela imputação aos sócios da parte do lucro que lhes corresponder, independentemente da sua distribuição.
ii) As sociedades transparentes são sujeitos passivos do imposto, pelo que estão sujeitas às obrigações declarativas e contabilísticas, prevista no CIRC.
iii) Na sua declaração periódica de rendimentos, os sócios devem indicar a matéria colectável que lhes tenha sido imputada por aquelas, que assim acrescerá ao resultado líquido extraído da contabilidade.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão


I- Relatório
A.................................... veio deduzir Impugnação Judicial contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de IRS nº ..........................., referente ao ano de 2009, no valor de € 5.991,07.
O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls. 82 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), datada de 23 de Janeiro de 2019, julgou procedente a impugnação.
A Fazenda Pública não se conforma com o decidido, pelo que interpõe recurso jurisdicional.
Nas alegações de fls. 113 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), a recorrente formula as conclusões seguintes:
«I. O presente recurso visa reagir contra a sentença que procede à anulação parcial do ato impugnado, considerou que deve ser anulada parcialmente a liquidação de IRS n.º……………, no valor de €5.991,07.
II. Com tal decisão não pode a recorrente conformar-se, porquanto, pretendendo a Fazenda Pública impugnar a douta decisão do tribunal a quo por ilegal, isto é, por contrária à Lei, e tendo constatado que a verdade material dos presentes autos já não se consubstanciava na aceitação ou não aceitação dos documentos das despesas apresentadas, convém agora envolver o cenário num outro quadro que se mostra diferente.
III. Não antes sem fundamentar que a administração fiscal está sujeita a uma massificação de processos e que em análise mais aprofundada à presente questão, em sede de recurso da decisão, constatou que no sistema informático a Impugnante já tinha apresentado uma declaração de rendimentos relativa ao ano de 2009, que veio substituir a liquidação que estava a ser sindicada nos presentes autos (doc.2).
IV. Isto para dizer que a douta decisão não se poderá manter porque na realidade a Impugnante apresentou como representante da sociedade civil A................. a declaração de rendimentos Modelo 22, tendo à posterior realizado uma nova apresentação de rendimentos na sua esfera pessoal.
V. Neste sentido já nem se coloca em questão a ilegalidade da douta sentença visto a Impugnante ter procedido à retificação e normalização de toda a situação que se impugna, nomeadamente regularizar a contabilidade ao nível da sociedade civil e depois declarando os correspondentes rendimentos na sua esfera particular.
VI. Outro facto que se desconhece em absoluto, qual o motivo que levou a Impugnante a permanecer em silêncio, não transmitindo nos autos estas alterações substanciais ao seu pedido.
VII. Visto que se tratam de factos pessoais e que todas as declarações (aqui trazidas agora) foram realizadas pela própria Impugnante, qual a razão pela qual a Impugnante não informou os autos, atempadamente, deixando o tribunal a quo tomar uma decisão marinada sobre pressupostos e circunstancias já ultrapassadas.
VIII. Neste sentido a douta decisão não se poderá manter, considerando, entretanto, os seguintes factos supervenientes:
• Apresentação do Modelo 22, por parte da sociedade civil A................., com o contribuinte ..............., cuja representante da sociedade é a ora Impugnante tendo sido calculado a matéria coletável no valor de €57.123,07 (doc. 1);
• Apresentação do Modelo 3 por parte da ora Impugnante que veio substituir a liquidação em discussão nos presentes autos e que deu origem a uma nova liquidação com o n.º ............... (doc. 2), que teve como referência a matéria coletável declarada na modelo 22 da sociedade, onde foram consideradas contabilisticamente todas os rendimentos e todas as despesas;
IX. A aqui recorrida deduziu impugnação judicial do indeferimento de reclamação graciosa que tinha como objeto a liquidação de IRS n.º ..........................., alegando que na sequência da declaração dos rendimentos relativos a 2009 e por lapso não indicou o valor correspondente às despesas relativas aos rendimentos prediais, pretendendo ver corrigida a situação.
X. Verificando-se que entretanto a liquidação em causa foi substituída pela liquidação ..............., apresentada pela Impugnante, e neste sentido foi declarado o rendimento em questão na categoria B, estando devidamente sanada todas a questões relativas às despesas pelo que se vem requerer que a decisão na douta sentença seja substituída por decisão de acordo com o circunstancialismo atual isto é por inutilidade superveniente da lide.
XI. Consequentemente, cremos que não se poderá manter o que foi fixado na douta sentença, reconhecendo que a realidade entretanto reposta, não se preconiza na realidade apresentada na douta decisão da douta sentença, nem na posição defendida na petição.
XII. Existindo falha no enquadramento quer factual, quer de direito, na decisão do douto tribunal a quo, há que apelar à intervenção das instâncias superiores, para restabelecer a ordem jurídica.
XIII. Nos termos expostos e enquadrando devidamente os factos delimitados deverá ser substituída a douta decisão por inutilidade superveniente da lide, considerando que não é exequível a decisão tomada pelo tribunal a quo.

Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser julgado procedente, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.»
X

A impugnante, devidamente notificada para o efeito, optou por não contra-alegar.
X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, notificado para o efeito, juntou aos autos parecer no sentido da improcedência do recurso.

X


Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

X

II- Fundamentação.
2.1.De Facto.
A sentença recorrida considerou provados os factos seguintes:
«A) A Impugnante é sócia da sociedade constituída sob forma civil designada Sociedade Civil A................., detendo uma participação de 50% no capital social (artigo 9º da p.i., não contestado).
B) A Sociedade Civil A................. consta do cadastro informático da AT, com inscrição oficiosa (cfr. fls. 32 do PAT).
C) A referida sociedade é proprietária do prédio sito na Freguesia S. Francisco Xavier (...............), inscrito na matriz predial sob o artigo ......º (cfr. fls. 32 do PAT).
D) Em 01.05.2010, a Impugnante, como sujeito passivo de IRS, procedeu à entrega da declaração modelo 3 do IRS, referente ao ano de 2009, declarando:
- Anexo A/ pensões: rendimento no valor de € 11.502,12, e retenções de € 238,24;
- Anexo F/Rendimentos prediais: rendas de € 31.370,84, retenções na fonte de IRS € 692,10 e despesas de € 7.080,00 (referentes ao prédio identificado na alínea antecedente);
- Anexo H/Benefícios fiscais e deduções: € 1.808,83 e despesas de saúde de € 408,32. (cfr. fls. 45 a 47 do PAT);
E) Em 07.06.2010, foi emitida a liquidação de IRS nº ..........................., com valor a pagar de € 5.991,07, nos seguintes termos:
Demonstração de Liquidação


(cfr. fls. 50 do PAT).
F) Em 29.11.2010, a Impugnante apresentou, junto do Serviço de Finanças de Lisboa-7, reclamação graciosa da liquidação a que se refere a alínea antecedente, pedindo a alteração da mesma, no sentido de ver incluído no valor de despesas de conservação e manutenção inscritas no Anexo F a Taxa de Conservação de Esgotos, no valor de € 387,86 e o IMI, no valor de € 1.198,81 (cfr. fls. 3 a 6 do procedimento de reclamação graciosa nº ............... apenso, e que se dá aqui por integralmente reproduzido).
G) Para efeitos de instrução do processo supracitado, a AT solicitou à Impugnante, por meio de ofício nº 012160, de 17.12.2010, a apresentação dos seguintes documentos:
“- Fotocópia dos documentos comprovativos dos rendimentos prediais auferidos
- Fotocópia dos documentos comprovativos das despesas de manutenção e Conservação
- Fotocópia dos documentos comprovativos das despesas com taxa de esgotos (…)
- Fotocópia dos documentos comprovativos do pagamento de IMI (…)”(cfr. fls. 13 do procedimento de reclamação graciosa).
H) A Impugnante procedeu à junção dos documentos solicitados, todos emitidos em nome da Sociedade Civil A................. (cfr. fls. 16 a 24 do procedimento de reclamação graciosa).
I) Em 25.11.2010, a Impugnante procedeu ao pagamento do imposto liquidado (cfr. fls. 16 e 19 do PAT).
J) Em 15.03.2011, foi remetido à Impugnante o ofício nº 002875, de 11.03.2011, sob o assunto “Notificação – Audição prévia”, concedendo-lhe a possibilidade de se pronunciar sobre o projecto de decisão da reclamação, que aqui parcialmente se reproduz:
“Proposta de Decisão
(…)
Analisados os fundamentos expostos pela contribuinte, verifica-se que:
1 - Relativamente ao ano em causa a reclamante entregou a sua declaração de rendimentos modelo 3 de IRS em 2010.05.01 (Lote n° J 0815 - 64).
2 - No respectivo anexo F referente aos rendimentos prediais foram declaradas as rendas recebidas (50%) no montante total de € 31 370.84 referentes ao artigo matricial urbano inscrito na matriz predial de S. Francisco Xavier sob o n° ......, bem como retenções na fonte no montante de € 692.10 e despesas no montante de € 7 080.00.
3 - Nos termos do art° 41° do Código do IRS aos rendimentos brutos referidos no artigo 8º deduzem-se as despesas de manutenção e de conservação que incumbam ao sujeito passivo, por ele sejam suportadas e se encontrem documentalmente provadas, bem como a contribuição autárquica que incide sobre o valor dos prédios ou parte de prédios cujo rendimento tenha sido englobado (n° 1) e no caso de fracção autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, deduzem-se também os encargos de conservação, fruição e outros que, nos termos da lei civil, o condómino deva obrigatoriamente suportar, por ele sejam suportados, e se encontrem documentalmente provados (n° 2).
4 - Analisados os elementos juntos aos autos verifica-se que não deverão as despesas declaradas bem como os documentos apresentados e juntos aos autos ser considerados uma vez que os mesmos são processados em nome da Sociedade Civil A................. e em nome de J...... e Outros.
5 - Assim, afigura-se-me que não deverá ser considerada qualquer tipo de despesa pelo que não se confirma o alegado, devendo ser processado a competente declaração oficiosa.
(…) Nesta conformidade, sou de parecer que deverá ser proferida decisão a INDEFERIR o pedido (…)”
(cfr. fls. 53 a 55 do procedimento de reclamação graciosa).
K) A Impugnante não exerceu audição prévia (cfr. fls. 57 do procedimento de reclamação graciosa).
L) Em 31.03.2011 foi exarado despacho pelo Chefe de Finanças, convertendo em definitivo o projecto de indeferimento da reclamação graciosa, referente a IRS do ano de 2009, (cfr. fls. 56 e 57 do procedimento de reclamação graciosa);.
M) Em 04.04.2011, foi remetido à Impugnante o ofício nº 003787, de 31.032011, comunicando o indeferimento da reclamação graciosa (cfr. fls. 58 a 60 do procedimento de reclamação graciosa).
N) A presente Impugnação foi remetida a este Tribunal através de correio registado, com data de expedição de 26.04.2011 (cfr. registo nº 005308451 no SITAF).

Nada mais foi provado com interesse para a decisão da causa.
*
Quanto aos factos provados, a convicção do Tribunal fundou-se na análise crítica da prova documental constante dos autos, não impugnada, conforme especificado em cada uma das alíneas supra.»


X
A recorrente impugna a decisão de determinação da matéria de facto assente. Alega que devem ser considerados os invocados factos supervenientes seguintes:
• Apresentação do Modelo 22, por parte da sociedade civil A................., com o contribuinte ..............., cuja representante da sociedade é a ora Impugnante tendo sido calculado a matéria coletável no valor de €57.123,07 (doc. 1);
• Apresentação do Modelo 3 por parte da ora Impugnante que veio substituir a liquidação em discussão nos presentes autos e que deu origem a uma nova liquidação com o n.º ............... (doc. 2), que teve como referência a matéria coletável declarada na modelo 22 da sociedade, onde foram consideradas contabilisticamente todas os rendimentos e todas as despesas.
Junta a documentação de suporte dos mesmos. Cumpre apreciar da admissibilidade da junção dos documentos em epígrafe.
«As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância» (artigo 651.º do CPC). «Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento» (artigo 425.º do CPC).
Compulsados os autos, verifica-se que a recorrente pretende juntar aos mesmos uma declaração modelo 22 de IRC, apresentada pela sociedade civil A................. e uma declaração modelo 3 de IRS, apresentada pela recorrida.
A declaração modelo 22 de IRC data de 16.12.2011 e a declaração modelo 3 de IRS data de 06.01.2012. As partes foram notificadas para alegações pré-sentenciais por ofício de 16.04.2014, pelo que a apresentação dos documentos em apreço não se afigura tempestiva (artigo 651.º do CPC). A recorrente não apresenta justificação para a apresentação tardia dos documentos, pelo que os mesmos devem ser rejeitados. A invocação de que tais declarações correspondem a factos pessoais da impugnante não se oferece procedente, dado que as mesmas foram recepcionadas nas datas referidas pelos serviços da impugnada. Motivo porque se impõe determinar a devolução à apresentante dos documentos em liça.
Custas pelo incidente, pelo mínimo legal.
Notifique.
X

2.2. De Direito
2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento em que terá incorrido a sentença recorrida.
A sentença julgou procedente a impugnação deduzida por A.................................... contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de IRS nº ..........................., referente ao ano de 2009, no valor de € 5.991,07, determinando a anulação parcial da liquidação em causa, «na parte em que desconsidera os encargos respeitantes ao IMI e Taxa de Conservação de Esgotos, devendo a Fazenda Pública proceder à reforma da referida liquidação, no sentido de considerar os aludidos encargos dedutíveis».
Para julgar procedente a impugnação, a sentença considerou que o facto de a impugnante ter inscrito, por engano, na sua declaração de IRS os rendimentos da sociedade civil, A................., de que é sócia, não preclude o direito à dedução à matéria colectável da sociedade dos encargos com a Taxa de Conservação de Esgotos e IMI, suportados pela mesma. No entendimento da sentença, «deveria ter sido apurado todo o rendimento de que a sociedade é titular e deduzir-se-lhe os encargos suportados; posteriormente, o valor apurado deveria ser imputado à Impugnante em 50% (i.e., na proporção da sua participação na sociedade), a declarar no âmbito do Anexo D da sua declaração modelo 3 do IRS».
2.2.2. A recorrente censura o veredicto que fez vencimento na instância. Pretende a substituição da mesma por decisão que declare a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide. Alega, em síntese, que: «8v]erificando-se que entretanto a liquidação em causa foi substituída pela liquidação ..............., apresentada pela Impugnante, e neste sentido foi declarado o rendimento em questão na categoria B, estando devidamente sanada todas a questões relativas às despesas pelo que se vem requerer que a decisão na douta sentença seja substituída por decisão de acordo com o circunstancialismo atual isto é por inutilidade superveniente da lide».
Apreciação. Está em causa a dedutibilidade dos custos incorridos (despesas de conservação e manutenção e IMI) com a administração de prédio, propriedade da sociedade civil A................., de que a recorrida é sócia, com participação social de 50% (alíneas A), B), C), do probatório). Os custos em causa foram erradamente incluídos na declaração de rendimentos da recorrida, facto que fundamenta o pedido de correcção da liquidação em exame, rejeitado pela AT (alíneas F), G), J) a L), do probatório).
«É imputada aos sócios, integrando-se, nos termos da legislação que for aplicável, no seu rendimento tributável para efeitos de IRS ou IRC, consoante o caso, a matéria colectável, determinada nos termos deste Código, das sociedades a seguir indicadas, com sede ou direcção efectiva em território português, ainda que não tenha havido distribuição de lucros: (…) // c) Sociedades de simples administração de bens, cuja maioria do capital social pertença, directa ou indirectamente, durante mais de 183 dias do exercício social, a um grupo familiar, ou cujo capital social pertença, em qualquer dia do exercício social, a um número de sócios não superior a cinco e nenhum deles seja pessoa colectiva de direito público» (artigo 6.º do CIRC “Transparência fiscal”).
«A imputação a que se referem os números anteriores é feita aos sócios ou membros nos termos que resultarem do acto constitutivo das entidades aí mencionadas ou, na falta de elementos, em partes iguais»(1).
«[C]om objectivos de neutralidade, combate à evasão fiscal e eliminação da dupla tributação económica dos lucros distribuídos aos sócios, se adopta em relação a certas sociedades um regime de transparência fiscal. O mesmo caracteriza-se pela imputação aos sócios da parte do lucro que lhes corresponder, independentemente da sua distribuição»(2).
As sociedades transparentes são sujeitos passivos do imposto, pelo que estão sujeitas às obrigações declarativas (artigos 109.º a 112.º do CIRC), à obrigação anual de informação contabilística e fiscal (artigo 113.º do CIRC), às obrigações contabilísticas (artigo 115.º do CIRC), às obrigações de documentação fiscal (artigo 121.º do CIRC), à obrigação de retenção na fonte do imposto devido pelos rendimentos que colocam à disposição (artigo 120.º do CIRC). «Na sua declaração periódica de rendimentos, os sócios (…) devem indicar a matéria colectável que lhes tenha sido imputada por aquelas»(3).
Dos elementos coligidos nos autos resulta que os proveitos e encargos incorridos pela sociedade em transparência fiscal, A................., foram inscritos pela recorrida na sua declaração de rendimentos do exercício de 2009, facto que é do conhecimento da AT, sem que tal conhecimento tenha impedido a emissão da liquidação adicional em apreço. Ao invés, devia ter sido apurado todo o rendimento de que a sociedade é titular e deduzir-se-lhe os encargos suportados; posteriormente, o valor apurado deve ser imputado à impugnante em 50% (i.e., na proporção da sua participação na sociedade). Ou seja, a impugnante, enquanto sócia, deve ser tributada pelo lucro real apurado no âmbito da sociedade, que lhe é imputável por força do regime da transparência fiscal. Os encargos em apreço devem ser considerados com vista ao apuramento do lucro da sociedade, para posterior apuramento do lucro imputável à impugnante. O acto tributário ao desconsiderar tais premissas, incorreu em erro quanto aos pressupostos de facto, pelo que deve ser anulado.
Mais se refere que a emissão de liquidação de anulação/substituição do acto tributário impugnado nada nos diz sobre se a anulação da primeira liquidação foi correctamente efectuada (ou seja, de acordo com os ditames legais). Essa questão poderá vir a ser apreciada em sede de eventual execução de julgado da sentença anulatória que agora se confirma, não podendo ser dirimida em sede de recurso, dado que constitui questão nova, pelo que extravasa a função de reexame deste tribunal de recurso. Não existe, pois, fundamento para a pretendida declaração de inutilidade superveniente da presente lide.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não enferma de erro, pelo que deve ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
DISPOSITIVO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês - Relator)


(1ª. Adjunta –Lurdes Toscano)

(2ª. Adjunta – Maria Cardoso)



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(1)Artigo 6.º/3, do CIRC.
(2) Ponto 3 do Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, que aprova o CIRC.
(3) Paulo Marques, CIRC, anotado, Almedina, 2019, pp. 82/83.