Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03795/10
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:12/15/2010
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:MÉTODOS INDIRECTOS.
PRESSUPOSTOS
Sumário:1.Nos termos do art. 81.º n.º 1 LGT, “A matéria tributável é avaliada ou calculada directamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstos na lei”.

2. Este normativo, regulando, em geral e abstracto, o âmbito do procedimento de avaliação da matéria tributável, firma, inequivocamente, a natureza subsidiária da avaliação indirecta em relação à directa (explicitamente, consagrada no art. 85.º n.º 1 LGT), bem como restringe a utilização da primeira aos casos expressamente inscritos na lei, isto é, a avaliação indirecta só pode ter lugar nas hipóteses, taxativamente, previstas nas diversas alíneas do art. 87.º do mesmo diploma, entre as quais figura o caso de “impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto” – cfr. al. b), podendo esta derivar de qualquer das anomalias ou incorrecções positivadas, exclusivamente, nas quatro alíneas do art. 88.º LGT, na exigência de que e quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável.

3. Na hipótese aprecianda, os fundamentos inscritos no relatório de inspecção tributária, únicos a considerar e relevantes neste aspecto, patenteiam que, se foram detectados custos indevidamente contabilizados na escrita da sociedade impugnante, divergências no valor de aquisição, declarado na escritura e o realmente pago, de determinada fracção habitacional, bem como, a venda de duas fracções contabilizada por preços inferiores aos dos custos registados para as mesmas, impendia sobre os serviços de fiscalização a tarefa de, simplesmente, por meras operações aritméticas, desconsiderar o montante desses custos impropriamente inscritos na contabilidade e corrigir os valores dos proveitos na directa medida da diferença apurada quanto às importâncias reais e declaradas de venda das três fracções autónomas habitacionais, individualmente identificadas.

4. Quanto ao aspecto da concessão de empréstimos avultados, à impugnante, por parte do administrador e accionista maioritário, não vislumbramos, nem o relatório da inspecção concretiza, demonstra, razões para ser, legitimamente, retirada a conclusão da existência de clara omissão nos proveitos contabilizados e declarados pela sociedade inspeccionada.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I
IMOBILIÁRIA ............, S.A., contribuinte n.º ......... e com os demais sinais constantes dos autos, impugnou judicialmente liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, do ano de 2002.
Proferida, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, sentença que julgou a impugnação totalmente improcedente, não se conformando com o judiciado, a impugnante interpôs recurso jurisdicional, cuja alegação se mostra rematada pelas seguintes conclusões: «
1 - Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julga improcedente a impugnação com o fundamento de que a Administração Tributária provou a existência dos pressupostos da determinação indirecta da matéria colectável em sede de IRC do ano de 2002;
2 - E ainda que a impugnante não demonstrou que houve erro nessa determinação;
3 - No caso vertente, a impossibilidade de comprovação e determinação directa da matéria colectável foi invocada pela Administração Tributária baseada na Audição de uma compradora que veio a declarar valor superior ao indicado na escritura de aquisição;
4. - Na concessão de empréstimos pelo accionista João ............, consubstanciados em depósitos bancários em numerário de alegada proveniência desconhecida;
5. - E na venda de duas fracções, ao mesmo comprador, por preço inferior ao de custo.
6 - Porém, nenhum destes argumentos é suficiente para justificar a impossibilidade de comprovação e quantificação da matéria colectável;
7 - E muito menos da forma como a Administração Tributária o fez, que consistiu em aumentar em 36% todas as vendas efectuadas no ano de 2002!
8 - Sem qualquer referência a critérios, designadamente a valores de mercado;
9 - A Administração Tributária aceitou como verdadeiras as declarações da contribuinte Ana ......................... e como falsas as declarações da contribuinte Imobiliária ............. SA, pela simples razão de que umas dão origem a imposto e outras não!
10 - Sem apresentar qualquer meio de prova que corroborasse as declarações daquela contribuinte; sendo certo que o ónus da prova aqui impende sobre essa mesma Administração.
11 - Sendo certo que o ónus da prova aqui impende sobre essa mesma Administração Tributária;
12 - Quanto aos empréstimos (vulgo suprimentos), a situação fiscal do accionista João ............. não foi alvo de qualquer inspecção, pelo que não se pode afirmar que a proveniência dos valores por ele depositados na conta da sociedade seja desconhecida.
13 - E muito menos que este accionista careça de capacidade económica apenas porque o seu IRS dos últimos 5 anos não o demonstra;
14 - Quando estamos perante um empresário que exerce a sua actividade há quase 70 anos;
15 - Ora, a alínea d) do art. 88° da L.G.T. refere situações em que “seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada” pela contribuinte inspeccionada - não por terceiros,
16 - Pelo que esta alegação não constitui fundamento para aplicação de métodos indiciários;
17 - Quanto à venda de duas fracções por valor inferior ao de custo, nada há na Lei que o proíba e muito menos que permita corrigir o valor da venda em 38%!
18 - A Administração Tributária não enunciou factos objectivos e concretos, verificados, donde possa concluir-se pela existência dos pressupostos legais dos quais depende o apuramento do imposto pelo método presuntivo, uma vez que não pode existir qualquer discricionariedade em sede de verificação desses pressupostos.
19 - Alega a, aliás douta, sentença recorrida que a impugnante não apresenta elementos que fundamentem um apuramento distinto do apurados pelos serviços, nomeadamente margens de comercialização e condições de venda;
20 - Não apresentou esses elementos mas apresentou outros: diversa idade dos imóveis, diferente localização, diversa utilização (comércio e habitação), etc.
21 - Porém, a Administração Tributária aplicou um acréscimo de 36% em todas as vendas, indiscriminadamente, sem invocar sequer se seria esse o valor de mercado!
22 - Basta atentar no Relatório dos peritos que constituíram a Comissão de Revisão e dos quais apenas o perito das Finanças concordou com o relatório, para verificar o que se alegou.
23 - A Administração Tributária não teve em conta nenhum dos indicadores elencados no art. 90º da LGT, limitando-se a aplicar, indiscriminada e injustificadamente, um acréscimo dos já referidos 36%, sem apontar qual o critério que esteve na base desta imputação;
24 - Compete ao controlo jurisdicional evitar que a Administração Fiscal caia na tentação de trilhar o caminho que a leve mais facilmente ao aumento dos seus proventos, em detrimento dos contribuintes e da certeza jurídica indispensável ao Estado de Direito.
25 - Permitir que a Administração Fiscal corrija proveitos a seu belo prazer, desprezando os critérios legais a que está obrigada, não serve a Justiça nem dignifica os Tribunais.
26 - Ao decidir pela improcedência total da impugnação usando fundamentos de natureza formal, sem sequer se pronunciar sobre a extensa matéria de facto alegada e provada em sede de julgamento e sancionando assim uma actuação ilícita e abusiva da Administração Tributária, o Mº Juiz a quo está a pactuar com uma grave violação das garantias dos contribuintes em geral e da recorrente em particular;
27 - A douta sentença recorrida viola o disposto na alínea b) do art. 87º, as alíneas a) e d) do art. 88º e o art. 90º, todos da Lei Geral Tributária.

Nestes termos e nos de douto suprimento, deverá a presente sentença ser revogada e substituída por outra, que julgue procedente e impugnação judicial em causa nos autos.
Assim decidindo farão Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, a verdadeira e costumada
JUSTIÇA! »
*
Não há registo da apresentação de contra-alegações.
*
A Exma. Procuradora-Geral-Adjunta emitiu parecer, no sentido de que se deve negar provimento ao recurso, mantendo-se o julgado, porque, além do mais, “do ponto 5 do probatório ressaltam factos suficientes para legitimar a conduta da A.F. ao recorrer aos métodos indirectos”.
*
Colhidos os vistos legais, compete conhecer.
*******
II
Mostra-se exarado, na sentença: «
Fundamentação
x
Factos Provados
Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com interesse para a sua decisão:
1- Em 24.01.07 foi efectuada a liquidação de IRC do exercício de 2002 e de juros compensatórios, com base na matéria tributável fixada com recurso, a métodos indiciários, a qual se fundamenta no relatório elaborado pela Fiscalização Tributária, notificada à impugnante por carta registada com aviso de recepção enviada em 31.01.07 - cfr Prints Informáticos - Demonstração de Compensação e Consulta Liquidação de D.C.-22, de fls 115 e 133 e Informação de fls 316 e segs, do P. A apenso aos autos.
2- Da fixação referida em 1, veio a impugnante reclamar para a Comissão de Revisão, nos termos do disposto no artº 91º da LGT, contra a matéria tributável fixada - cfr requerimento de fls 22 e segs dos autos.
3- Não tendo havido acordo entre as partes no processo de revisão da matéria colectável, foram elaborados os laudos dos peritos indicados pela F.P. e pelo contribuinte, e do perito independente, assim como a “Acta de Reunião da Comissão de Revisão, nº 114/06”, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido - cfr fls 33 a 39 e de fls 54 a 63, dos autos.
4- Em 11.01.07 foi proferida pelo Director de Finanças da D.F. de Lisboa, a Decisão Fundamentada a que se refere o nº 6, do artº 92º da LGT, que aqui se dá por reproduzido, e no qual foi mantido o valor constante do relatório da inspecção quanto ao lucro tributável apurado. - cfr documento de fls 64 a 73, dos autos
5- Do relatório da inspecção tributária, a que se refere o nº 1, consta resumidamente, o seguinte:
a) quanto aos motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos - declaração pelo adquirente de uma fracção de um valor de compra superior ao declarado pela sujeito passivo; vendas de duas fracções por valores inferiores ao custo evidenciado; movimentos da conta 2551 do accionista, de concessão e pagamento de empréstimos, constatando-se que nas relações comerciais com duas empresas ocorreram pagamentos a essas empresas por contrapartida da conta de sócio, assim como transferências directas e cheques provenientes das duas empresas contabilizadas na mesma conta, assim como os empréstimos efectuados pelo sócio, parte em dinheiro, não demonstrando o mesmo capacidade financeira para o efeito e falta de justificação de parte dos movimentos ocorridos na conta do accionista;
b) Critérios de Cálculo dos Valores Corrigidos, a qual teve por base a declaração do valor de compra de uma fracção e apurando-­se uma percentagem de omissão às restantes fracções transaccionadas nesse ano. - cfr relatório de fls 128 a 147 e anexos 1 e 2, de fls 148 a 167, do P. A. apenso.
6- Dá-se aqui por reproduzido o contrato de cessão de créditos celebrado pelo sócio e a impugnante e o balancete geral em 12/2000 da sociedade impugnante, de fls 15 a 17, dos autos.
7- a petição de impugnação foi enviada pelo correio sob registo, em 08.06.07. - cfr carimbo aposto no rosto da p.i. a fls 3 e segs.
x
Factos Não Provados
Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
x
Motivação da decisão de facto
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório. »
*
Sem prejuízo do teor do ponto 5 dos factos provados, acima transcritos, por estar em causa matéria factual susceptível de ser, oficiosamente, apreendida por este tribunal, mostrando-se a mesma documentalmente comprovada nos autos e revestindo interesse para a conscienciosa apreciação e decisão deste apelo, ao abrigo do disposto no art. 712.º n.º 1 al. a) CPC, decide-se aditar o seguinte:
8- Do relatório aludido em 5, consta, expressamente: «
IV - Motivo e Exposição dos Factos que Implicam o Recurso a Métodos
Indirectos
A insuficiência e a manifesta discrepância dos elementos de contabilidade do sujeito passivo nos termos da alínea a) e d) do artigo 88° da L.G.T., impossibilitam a comprovação e quantificação directa e exacta da situação patrimonial e do resultado efectivamente obtido, pelo que o sujeito passivo reúne os requisitos para que o resultado tributável do exercício, tenha de ser determinado pela aplicação de métodos indirectos, de acordo com o estabelecido no artigo 54° do CIRC bem como do n.° 2 do artigo 83.° e da alínea b) do artigo 87.°, todos da L.G.T.
A impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável para efeitos da aplicação de métodos indirectos, resulta do/factos a seguir indicados:
· Com o objectivo de verificar a veracidade dos valores declarados nas transacções e proceder á confirmação dos valores declarados através de escritura pública procedeu-se à audição dos adquirentes das fracções vendidas pelo sujeito passivo. No decurso do procedimento a contribuinte Ana .............., NIF ................., efectuou, no dia 25 de Julho de 2006, uma liquidação/regularização voluntária de Imposto Municipal de SISA declarando que o valor de compra, da fracção AI do prédio urbano sito no Alto .............. inscrito na matriz sob o artigo ........ da freguesia e Concelho de Cascais, foi de € 62.349,74 e não de € 39.903,83.
· Através da análise efectuada aos movimentos da conta 2551, do accionista Sr. João ......... verificou-se que esta evidencia, ao longo do exercício de 2002, a concessão e pagamento de empréstimos, conforme quadro seguinte:
CONTA 2551 - SR. JOÃO ................. DÉBITO CRÉDITO
SALDO INICIAL 1.895.900,65
PAGAMENTO DE EMPRÉSTIMOS 1.063.646,60
EMPRÉSTIMOS EFECTUADOS 2.283.261,20
SALDO FINAL 3.115.515,25
O Sr. João .......... é accionista maioritário/administrador comum, além da IMOBILIÁRIA ..............., S.A., das seguintes empresas:
> A............. - Sociedade ................., Lda, NIPC .................. (a referida empresa tem como designação actual, desde 13/09/2006, R............. - Sociedade de Restauração, Lda);
> P................. - Sociedade Imobiliária S.A., NIPC .....................;
Verifica-se a existência de relações/transacções comerciais entre o s.p. e as duas empresas atrás referidas (conforme mencionado no Capítulo III ponto l, 3, 4 e 6 do presente relatório).
Verificou-se que ocorreram pagamentos, conforme anexo I, ás empresas indicadas por contrapartida da conta 2551 Empréstimos do Sr. João .............. assim como se constataram transferências directas e cheques provenientes das duas referidas empresas que foram contabilizadas na conta 2551 Empréstimos do Sr. João ............
Relativamente aos empréstimos efectuados, pelo Sr. João ............., verifica-se a existência de vários depósitos em numerário desconhecendo-se a sua proveniência.
Da análise efectuada, através da consulta ao sistema informático da D.G.C.I, aos rendimentos declarados, pelo administrador Sr. João .........., nos anos de 1998 a 2002, não fica demonstrada capacidade financeira para a concessão dos empréstimos evidenciados no quadro supra.
• Na sequência das situações enumeradas no ponto anterior, procedeu-se à notificação do s.p., através do ofício 60.539 de 31/07/2006, tendo em vista a justificação dos movimentos ocorridos na conta do accionista.
A resposta restringiu-se á explicação do movimento de transferência dos empréstimos do Sr. João Pimenta na empresa A.......... - Azulejos ............, Lda, NIPC ........., para a IMOBILIÁRIA ..............., S.A. referindo apenas que “A Imobiliária .......... adquiriu os créditos de suprimentos na A.......... ao Sr. João ............. (...). Houve contrato de cessão de crédito. A Imobiliária adquiriu o crédito, tal assunto analisado em processo no Tribunal de Oeiras”.
O esclarecimento prestado revela-se insuficiente e inexistente relativamente aos restantes movimentos (constantes no anexo I) na referida conta, o que evidencia a falta de colaboração do sujeito passivo no procedimento de inspecção, constituindo este facto, um dos fundamentos para a aplicação de métodos indirectos de tributação conforme disposto no artigo 10.º do RCPIT.
Ainda em relação aos esclarecimentos solicitados, o sujeito passivo, não tendo como actividade a exploração hoteleira, não explicita a forma de gestão/exploração do ApartHotel .............. não tendo sido demonstrado que qualquer das empresas – A.........- Sociedade de Restauração, Lda e/ou P.............. - Sociedade Imobiliária S.A. - registe/releve os proveitos da exploração hoteleira, sendo que há custos (conforme mencionado no Capítulo III ponto l, 2 e 6 do presente relatório) com o referido ApartHotel que são indevidamente contabilizados na IMOBILIÁRIA .................., S.A.. Acresce ainda, o facto de se verificarem custos relativamente a serviços prestados ao sujeito passivo, pela empresa P............ - Sociedade Imobiliária S.A. (com administração/gestão do Sr. João .....................), que não são relevados como proveitos (conforme descrito no Capítulo III ponto 3 e 4 do presente relatório) em virtude desta ser um sujeito passivo não declarante.
• Com base nos elementos contabilísticos disponíveis verifica-se a venda d e duas fracções por valores inferiores ao custo evidenciado pelo sujeito passivo conforme quadro seguinte:
ARTFRACLOTE COMPRADORNIFPREÇO CUSTOVALOR VENDA
...........UU---------
95.530,58
84.795,64
.........DU---------
13.739,44
12.469,95
      TOTAL
109.270,0297.265,59
      DIFERENÇA
12.004,43

Nestes termos, perante os factos acima apontados, ou seja:
O registo de custos relativos a um sector de hotelaria cuja actividade carece da devida clarificação e para a qual os proveitos são completamente inexistentes;
Os valores reais de aquisição superiores aos que constam da escritura, autodenunciados pela adquirente da fracção AI do artigo 6.081;
As vendas de fracções contabilizadas por preços inferiores aos preços de custo dessas fracções;
A falta de evidência de capacidade financeira do administrador e accionista maioritário para conceder empréstimos avultados à sociedade, indiciam claramente que existem omissões de proveitos.
V - Critérios de Cálculo dos Valores Corrigidos com Recurso a Métodos
Indirectos
A determinação das vendas por métodos indirectos teve por base as anomalias referidas no ponto IV com base no disposto nas alíneas d) e h) do artigo 90.° da L.G.T.
Com base na diferença entre os valor de escritura e os valor de venda corrigido e restante informação recolhida no decorrer desta acção de inspecção, vai-se proceder ao apuramento das correcções para quatro prédios/lotes descritos no quadro infra indicado.
Tendo por base a liquidação/regularização voluntária de Imposto Municipal de SISA, efectuada pela contribuinte Ana ....................., NIF ..............., declarando que o valor de compra, da fracção AI do prédio urbano sito no Alto ............. inscrito na matriz sob o artigo ......... da freguesia e Concelho de ............, foi de € 62.349,74 e não de € 39.903,83, apurou-se uma percentagem de omissão de 36%, Com base na percentagem de omissão de 36% propõem-se as seguintes correcções aos valores de venda:
(…). »
***
Esquadrinhada a motivação deste recurso e, sobretudo, a síntese das competentes conclusões, emerge, imediata, a constatação de que a Recorrente/Rte considera ter a sentença aprecianda errado, no seu julgamento, ao entender reunidos pressupostos legais para que lhe tenha sido determinada matéria tributável, do exercício de 2002, em cédula de IRC, por via de avaliação indirecta – cfr. v.g. conclusão 6.
Com todo o respeito por diversa opinião, desde já, antecipamos que lhe assiste razão.
Nos termos do art. 81.º n.º 1 LGT (1), “A matéria tributável é avaliada ou calculada directamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstos na lei”. Este normativo, regulando, em geral e abstracto, o âmbito do procedimento de avaliação da matéria tributável, firma, inequivocamente, a natureza subsidiária da avaliação indirecta em relação à directa (2), bem como restringe a utilização da primeira aos casos expressamente previstos na lei, isto é, a avaliação indirecta só pode ter lugar nas hipóteses, taxativamente, previstas nas diversas alíneas do art. 87.º do mesmo diploma, entre as quais figura o caso de “impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto” – cfr. al. b), podendo esta derivar de qualquer das anomalias ou incorrecções positivadas, exclusivamente, nas quatro alíneas do art. 88.º LGT, na exigência de que e quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável.
Fixadas estas regras intransponíveis e incontornáveis, presente o acervo de fundamentos que transcrevemos como pertencentes ao determinante relatório de fiscalização tributária, conclui-se que a avaliação indirecta da matéria tributável, da impugnante, ocorreu a coberto do disposto no art. 88.º als. a) e d) LGT e sob o pretexto factual, em síntese, de que: «
O registo de custos relativos a um sector de hotelaria cuja actividade carece da devida clarificação e para a qual os proveitos são completamente inexistentes;
Os valores reais de aquisição superiores aos que constam da escritura, autodenunciados pela adquirente da fracção AI do artigo .........;
As vendas de fracções contabilizadas por preços inferiores aos preços de custo dessas fracções;
A falta de evidência de capacidade financeira do administrador e accionista maioritário para conceder empréstimos avultados à sociedade, indiciam claramente que existem omissões de proveitos. »
Ora, objectivamente, nenhuma destas circunstâncias se nos apresenta com solidez e determinismo suficientes para se concluir, na situação julganda, pela impossibilidade de avaliação directa decorrente da “inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração” e/ou da ocorrência de factos que patenteiem “uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada” – cfr. als. a) (parte inicial) e d) (in fine) do art. 88.º LGT. Na verdade, os fundamentos inscritos no relatório de inspecção tributária, suporte da síntese acima apresentada, únicos a considerar e relevantes neste aspecto, patenteiam que, se foram detectados custos indevidamente contabilizados na escrita da sociedade impugnante, divergências no valor de aquisição, declarado na escritura e o realmente pago, de determinada fracção habitacional, bem como, a venda de duas fracções contabilizada por preços inferiores aos dos custos registados para as mesmas, impendia sobre os serviços de fiscalização a tarefa de, simplesmente, por meras operações aritméticas, desconsiderar o montante desses custos impropriamente inscritos na contabilidade e corrigir os valores dos proveitos na directa medida da diferença apurada quanto às importâncias reais e declaradas de venda das três fracções autónomas habitacionais, individualmente identificadas. Trata-se, aqui, de realidades perfeitamente delimitadas, restritas, cujos elementos contabilísticos disponíveis e outros complementares apurados com segurança, permitem comprovar e quantificar com rigor, com objectividade, sem necessidade do recurso, derradeiro, a presunções.
Quanto ao aspecto da concessão de empréstimos avultados, à impugnante, por parte do administrador e accionista maioritário, cumprindo começar por referir que a sua alegada falta de “capacidade financeira” para o efeito é insusceptível, em medida alguma, de preencher a previsão da parte final da al. d) do art. 88.º LGT, não vislumbramos, nem o relatório da inspecção concretiza, demonstra, razões para ser, legitimamente, retirada a conclusão da existência de clara omissão nos proveitos contabilizados e declarados pela sociedade inspeccionada. Em todo caso, mesmo que fosse de assumir essa correspondência, dado ter sido possível apurar a totalidade dos montantes envolvidos nos visados suprimentos, também, nesta parcela, o apuramento da matéria tributável se podia reconduzir à simples operação de os adicionar aos valores dos proveitos declarados, pela contribuinte, para o exercício de 2002; ou seja, teria lugar avaliação directa, em vez da acontecida indirecta. Aliás, se dúvidas existissem quanto à não relevância deste fundamento para a utilização dos métodos indirectos, bastava uma superficial olhadela para os critérios de cálculo actuados pela administração tributária/AT – cfr. supra ponto V do relatório, para se constatar a total ausência de valoração da pretensa omissão de proveitos relacionada com a feitura de empréstimos de montantes consideráveis, à impugnante, por parte do seu administrador e accionista maioritário.
Em suma, merece acolhimento a crítica da Rte, no sentido de que não se mostram, in casu, reunidas as, taxativas, condições legais capazes de legitimarem a proposição, pela AT, da impossibilidade de ser, em parte, comprovada e quantificada de forma directa e exacta a matéria tributável da impugnante, relativa ao IRC de 2002, o que, sem curar de possíveis vícios afectantes da quantificação indirecta levada a cabo (3), é suficiente para se determinar a revogação da decisão do tribunal recorrido, em sentido antagónico.
Finalmente, é preciso anotar que, embora a factualidade julgada provada em 1.ª instância não dê nota expressa, como decorre impressivo de várias passagens do relatório de fiscalização (4), para o versado exercício de 2002, a AT produziu correcções técnicas/aritméticas à matéria tributável, do IRC, num total de € 187.515,07, que, não tendo sido objecto de qualquer tipo de ataque por parte da impugnante, mantêm a respectiva influência e continuam a suportar a liquidação impugnada, na parcela pertinente.
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III
Pelo exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, acorda-se:
- conceder provimento ao recurso jurisdicional e revogar a sentença recorrida;
- julgar procedente a impugnação judicial e anular a liquidação visada, na parte correspondente à matéria tributável que foi apurada com recurso a métodos indirectos.
*
Custas a cargo da recorrida/Fazenda Pública, somente em 1.ª instância.
*
(Elaborado em computador e revisto, com versos em branco)
Lisboa, 15 de Dezembro de 2010
Aníbal Ferraz (por vencimento)
Lucas Martins
Eugénio Sequeira (vencido conforme projecto de acórdão que, como primitivo relator, havíamos elaborado)
- Voto de vencido no recurso nº3795/10, de acordo com a parte pertinente do projecto de acórdão que com primitivo relator havíamos elaborado e que não logrou vencimento.

4. Para julgar improcedente a impugnação judicial deduzida, considerou o M. Juiz do Tribunal "a quo", em síntese e para além do mais que ao conhecimento do presente recurso desinteressa, que no caso se verificavam os pressupostos para o lucro tributável ser apurado através de métodos indirectos mercê dos erros e inexactidões verificados na contabilidade do sujeito passivo, apurados em sede de exame à escrita e não contrariados por qualquer outra prova, designadamente quanto ao valor de vendas por preço Inferior ao de custo e omissão de valor numa venda de uma fracção autónoma e processamento e movimentação dos fundos da sociedade através da conta de um sócio e bem assim não logrou a ora recorrente demonstrar que a quantificação a alcançada seja excessiva ou que houve qualquer erro na mesma.

Para a recorrente, de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, é contra esta fundamentação que se vem insurgir, continuando a pugnar que não foram apurados índices certos e objectivos que demonstrem a impossibilidade de comprovação e determinação directa da matéria colectável do IRC no exercício em causa de 2002, e bem assim que inexistiu critério da AT para proceder a essa quantificação, designadamente por referência a valores de mercado, pira além de parecer também pretender colocar em causa a matéria de facto tal como foi julgada pelo Tribunal "a quo", como parece decorrer da matéria constante das conclusões 19., 2C. e 28. das suas alegações do recurso.

Vejamos então.
Quanto ao que parece ser um invocado errado julgamento da matéria de facto, tal como foi efectuado pelo Tribunal "a quo", constante na matéria das citadas conclusões do recurso - 19.°, 20. e 28. - desde logo convém frisar que a ora recorrente não deu cumprimento ao disposto no art.° 690.°-A do Código de Processo Civil (CPC), então vigente e o aplicável (correspondente à actual norma do art.° 685.°-B do mesmo Código) , já que não procedeu a quaisquer das especificações que a citada norma impõe, no sentido de demonstrar o desacerto da sentença recorrida no que a esta matéria tange, tendo como consequência a respectiva rejeição, já que também, este Tribunal, oficiosamente, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.°1 do art.°712.° do mesmo Código, não vislumbra dos autos prova atinente aos invocados elementos que estariam mal julgados (idade dos imóveis, localização e respectiva utilização - cfr. matéria da sua conclusão 20.), no seguimento aliás, da matéria articulada nos art.°s 39.° e segs da sua petição inicial de impugnação judicial que igualmente e de forma mais desenvolvida referia tais elementos, que deveriam ter pesado e não teriam pesado nos valores de venda encontrados pela AT para as mesmas fracções, pelo que iremos manter a matéria de facto tal como foi fixada no mesmo probatório da sentença recorrida.

Nos termos do disposto no art.° 16.° n.°1 do CIRC -Métodos de determinação da matéria colectável - a matéria colectável é, em regra, determinada com base em declaração do contribuinte, sem prejuízo do seu controlo pela administração fiscal.
2 --
3 - A determinação do lucro tributável por métodos indiciários só pode verificar-se nos termos e condições previstos na secção V.

Nos termos do disposto no art.°17.° do CIRC Determinação do lucro tributável - O lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.°1 do art.°3.° é constituído pela soma algébrica do resultado liquido do exercício e das variações patrimoniais positivas ou negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código.
.....
Nos termos do art.°23.° do CIRC - Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes:
.....
1. Nos termos do disposto no art.° 51.° do CIRC - Aplicação de métodos indiciários:
l - A determinação do lucro tributável por métodos indiciários verificar-se-á sempre que ocorra qualquer dos seguintes factos:
a)inexistência de contabilidade, falta ou atraso de escrituração dos seus livros e registos e, bem assim, irregularidades na sua organização ou execução;
b) . . .
c) Existências de diversas contabilidades com propósito de dissimular a realidade perante a administração fiscal;
d) Erros e inexactidões na contabilização das operações ou indícios fundados de que a contabilidade não reflecte a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido.
2 - A aplicação de métodos indiciários em consequência de anomalias e incorrecções da contabilidade só poderá verificar-se quando não seja possível a comprovação e a quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável de harmonia com as disposições da secção II deste capítulo.
3 - ...
4 - ...
E a do art.° 98.° n.°3 a) do mesmo Código - Na execução da contabilidade deverá observar-se em especial o seguinte: Todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos, datados e susceptíveis de serem apresentados sempre que necessário.
E a do art.° 29.° do Código Comercial - Todo o comerciante é obrigado a ter livros que dêem a conhecer, fácil, clara e precisamente, as suas operações comerciais e fortuna.

Como se pode ler do preâmbulo do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas...Em qualquer caso, procura-se sempre tributar o rendimento real efectivo, que, para o caso das empresas, é mesmo um imperativo constitucional. Como corolário desse princípio, é a declaração do contribuinte, controlada pela administração fiscal, que constitui a base da determinação da matéria colectável.
A determinação do lucro tributável por métodos indiciários é, consequentemente, circunscrita aos casos expressamente enumerados na lei, que são reduzidos ao mínimo possível, apenas se verificando quando tenha lugar em resultado de anomalias e incorrecções da contabilidade, se não for de todo possível efectuar esse cálculo com base nesta. Por outro lado, enunciam-se os critérios técnicos que a administração deve, em princípio, seguir para efectuar a determinação do lucro tributável por métodos indiciários, garantindo-se ao contribuinte os adequados meios de defesa...
Dado que a tributação incide sobre a realidade económica constituída pelo lucro, é natural que a contabilidade, como instrumento de medida e informação dessa realidade, desempenhe um papel essencial como suporte da determinação do lucro tributável.
....
Resulta assim claro, que a determinação do lucro tributável com recurso a métodos indiciários, hoje chamados de indirectos, tem uma feição excepcional e apenas a lei a autoriza, para aqueles casos em que não seja possível tal apuramento tendo por base a contabilidade do sujeito passivo, como diz a norma do art.° 51.° n.°2 do CIRC.
Por outro lado, o apuramento do lucro tributável com o recurso a métodos indiciários não se encontra estabelecido em benefício do sujeito passivo do imposto, e para colmatar eventual resultado injusto para este se tal lucro fosse apurado com o recurso aos elementos da sua contabilidade, ainda que eventualmente corrigidos.
Mas desde que se verifiquem os requisitos de tal norma, não sendo possível apurar, directamente, através da contabilidade do sujeito passivo a matéria colectável desse exercício, legitimada fica pela Administração Fiscal o lançar mão dos métodos indiciários, hoje chamados de indirectos, para determinação desse lucro, em que a AT se poderá basear em todos os elementos de que disponha, nos termos do disposto no art.°52.° do CIRC e 90.° da LGT, designadamente em quaisquer elementos existentes na contabilidade do sujeito passivo, quer relativos a esse exercício, quer relativos a qualquer um outro, para os extrapolar e valorar para o exercício em causa, não constituindo por isso qualquer erro ou ilegalidade a extrapolação dos montantes conhecidos e obtidos relativamente a certo exercício para os aplicar em um outro, quando nenhuma prova se fez que entre os dois exercícios tenham ocorrido circunstâncias que tornassem desadequada essa extrapolação, designadamente não se vendo como possa violar a norma do art.°90. °, n.°1 d) da LGT, tanto mais que tal elenco constante de tais normas, quer do art.°52.° do CIRC, quer do art.°90.° da LGT, é efectuado a título meramente exemplificativo, bem podendo serem utilizados quaisquer outros índices ou meios existentes, que sejam aptos e capazes para o mesmo fim.

E no caso, ocorreram ou não tais pressupostos de aplicação dos métodos indiciários?
Pela matéria constante do ponto 5.° do probatório e do relatório da fiscalização tributária que na sua maior parte transcreve, apropriada pela decisão final do Director de Finanças (de Lisboa), em sede de Comissão de Revisão, na falta de acordo dos peritos, como consta na matéria do ponto 4. do probatório fixado na sentença recorrida, que foi apurada em sede de exame à escrita da impugnante e não contrariada por qualquer outra prova, especialmente as duas situações apuradas, de vendas de fracções autónomas por preços superiores aos declarados nas respectivas escrituras de compra e venda, tendo mesmo um desses adquirentes vindo a requerer ao Serviço de Finanças de Cascais 1 o pagamento da então sisa adicional por referência ao preço real dessa aquisição e que grande parte dos movimentos contabilísticos relativos a proveitos e transferências relativos à mesma sociedade eram efectuados, não através da sua escrita, mas sim através da conta do seu administrador João ......, matéria que a ora recorrente teve oportunidade de infirmar e nenhuma prova veio fazer neste sentido, traduzem, com um alto grau de probabilidade, que tal contabilidade ainda que formalmente organizada, não era apta para o fim em vista, de através dela apurar, sobretudo, os reais proveitos dos exercícios que a mesma terá alcançado, retirando-lhe nesta parte, toda a credibilidade, sobretudo ao nível desses proveitos, que sempre teriam de ser estimados, calculados, presumidos, afastando a possibilidade de, através dessa escrita apurar, desde logo, o real volume de negócios da impugnante obtidos por essas vendas das fracções autónomas, sobretudo dos proveitos, factualidade esta que, no seu conjunto, afectava a totalidade dos proveitos da sua actividade no exercício em causa e ora objecto desta impugnação, e não apenas uma ou outra operação, em que fosse assim possível, utilizar as correcções técnicas para esse apuramento.

Face a esta factualidade, parece-nos que poucas dúvidas possam existir que tais preços de compra e venda dessas fracções vendidas pela ora recorrente neste exercício não tenha correspondência com os seus reais montantes, e algumas que pudessem surgir terão que se considerar dissipadas, tendo em conta o conjunto da argumentação desenvolvida pela mesma ora recorrente, mas que nenhuma prova veio a fazer atinente à demonstração dessa tese por si avançada, designadamente tentando carrear para os autos os elementos mais adequados para esse fim, como sejam que os imóveis que a mesma pretende que tenham sido vendidos por preços mais baixos fossem de idade mais avançada, com pior localização comercial e bem assim que o seu destino fosse diverso que legitimasse um mais baixo preço, como articulou e ora mantém em sede da matéria das conclusões do presente recurso, bem como na parte relativa à escrituração dos movimentos na conta do referido administrador, com omissão dos mesmos na sua própria contabilidade, quando nenhuma prova veio fazer em tal sentido e nem sequer, arrolar como testemunha algum desses adquirentes, de molde a comprovar tal invocada realidade, ou pelo menos a tornar duvidosos os raciocínios e conclusões dessa factualidade extraídos pela AT, o que torna esta actuação menos compreensível e pelo contrário vem adensar a certeza da factualidade recolhida pela fiscalização e das conclusões dela extraídas de que tais preços de compra e venda, declarados em tais escrituras públicas, não corresponderam à sua realidade, bem como a sua contabilidade é falha de certeza e de realidade para através permitir apurar os reais custos e os reais proveitos da mesma ora recorrente no exercício em causa.

E/ou não tendo também a recorrente vindo a requerer a prova por parecer pericial, que a norma do art.°117.° do CPPT, vem lembrar que, no caso de impugnação com base em erro na quantificação da matéria tributável ou nos pressupostos por métodos indirectos, tais pareceres serão indispensáveis para o impugnante, com êxito, lograr infirmar a matéria constante do relatório da fiscalização tributária, directamente colhida da contabilidade do sujeito passivo por técnico para o efeito credenciado, que a mera prova só por testemunhas, em principio, dificilmente ousará destruir.

Aliás, também se dirá que, contrariamente ao invocado pela mesma na matéria da sua conclusão 3., a base da desconfiança da AT para com os montantes declarados nas escrituras públicas de compra e venda das fracções em causa, e a sua não aceitação, não se fundaram unicamente na declaração da compradora da fracção que veio a auto-denunciá-lo e a pagar a sisa adicional, resultante do valor que declarou como tendo sido o real, mas sim, também, nas declarações de outros compradores, como expressamente se invoca na matéria do ponto IV do relatório do exame à escrita (pág. 268 do PA apenso) e o perito independente, no seu laudo, igualmente assinalou (doc. n.°2) dos presentes autos] ...venda de fracções de imóveis e ao confronto entre os valores de compra e venda declarados por compradores (vários) e vendedor ...desta forma não correspondendo à realidade a matéria da apontada conclusão das alegações do recurso.

A impossibilidade do apuramento, sobretudo dos reais proveitos, directamente, através da sua contabilidade permitia ou não que se socorresse aos métodos indiciários para esse apuramento?
A nossa resposta é positiva, face às obrigações da impugnante em manter uma escrita organizada de molde a através dela se pudesse apurar e controlar o lucro tributável, quer sobretudo quanto aos proveitos por sub-avaliação dessas vendas que assim não se sabe o seu volume, bem como dos movimentos contabilísticos que a mesma omitia, que assim também não se encontram espelhados nessa mesma contabilidade, como acima se viu, desiderato que através desta não era possível alcançar.

Assim, face à existência destes diversos índices, que se nos afiguram fundados e suficientes, aberto se encontrava o caminho para lançar mão dos métodos indiciários, por os mesmos não carecerem de ser cumulativos. Ou seja, tal contabilidade não tinha o mérito de espelhar o resultado efectivo, concreto, da realidade económica -financeira do respectivo exercício da contribuinte, aparecendo sobretudo os proveitos, ainda que apoiados em documentos idóneos -do ponto de vista fiscal e contabilístico, os mesmos não traduziam o real montante dessas operações (vendas), que dessem a conhecer a sua verdadeira existência e extensão, na medida em que declaravam um preço de venda inferior ao real, em suma, pela contabilidade da impugnante não era possível apurar os reais proveitos, assim efectivamente obtidos.

Face a tais anomalias, não permitindo através da contabilidade da impugnante apurar a verdadeira situação patrimonial da empresa e nem o resultado efectivamente obtido, não restava outro caminho à AT senão lança: mão de tais métodos indiciários, sob pena de beneficiar o infractor que não organiza a sua contabilidade de acordo com as regras legais previstas nos códigos tributários e comerciais, de molde a apurar e controlar o lucro tributável da sua actividade nesses exercícios.

Não podendo também no caso, nesta parte, apenas operar-se com correcções técnicas no apuramento da matéria colectável, quando o que se encontra em causa, é uma falta generalizada de credibilidade da sua escrita comercial ao nível dos proveitos, pelos apontados vícios supra, que não uma ou outra operação mal contabilizada ou dm outro proveito a acrescer ou um ou outro custo a não ser elegível, em que apenas haveria que os desconsiderar no apuramento da matéria colectável.

Cabia à Fazenda Pública e ora recorrida o ónus de provar os pressupostos da tributação por métodos indiciários (Como constitui jurisprudência corrente - cfr. entre muitos outros, o acórdão do STA de 3.3.2004, recurso n.°1693/03-30), cabendo-lhe demonstrar que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contribuinte e que o recurso àquele método se tornou a única forma de calcular o imposto, competindo-lhe, por isso, especificar os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável e indicar os critérios utilizados na sua determinação, fazendo assentar o volume da matéria colectável presumida em dados objectivos, racionais e fundamentados, aptos a inferir os factos tributárias, não em meras suspeitas ou suspeições, ainda que não se possa exigir o mesmo grau de certeza nessa quantificação do que aquela que é apurada através da contabilidade do sujeito passivo, por ser inerente àquela uma aproximação à realidade à qual se desconhece, através da utilização de índices como sejam as margens médias de lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras, as taxas médias de rentabilidade de capital investido, o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matéria -primas e outros custos director como hoje se exemplifica na norma do art.°90.° da LGT.

Na verdade, tendo a determinação da matéria tributável por métodos indiciários de ser feita por aproximação à realidade que se procura apurar, é necessário que se demonstre que teve por suporte elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação. E, por isso, a AT tem de utilizar elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência, pautados por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as especificidades próprias do contribuinte, conduzam à extrapolação dos factos desconhecidos ou à aproximação da realidade que se procura alcançar.

A AT tem, assim, de indicar e justificar os critérios que utiliza na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, por forma a que o contribuinte deles fique ciente e apto a discutir a valorimetria aplicada, isto é, para que possa provar que os critérios utilizados são desadequados e/ou inadmissíveis para a sua actividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributada quantificada.

Caberá, então, àquele a quem o método é oposto (no caso, a impugnante) o ónus probandi de que a realidade é completamente distinta do resultado a que conduziu a utilização das mencionadas regras, que o critério utilizado é ostensivamente desadequado e/ou inadmissível, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada.

No caso, face aos indícios supra, que se nos afiguram como fundados e seguros, carreou a AT elementos certos e determinados donde se pode extrair que a contabilidade da impugnante não reflectia a totalidade das operações realizadas, sobretudo ao nível dos proveitos, e daí, legitimada ficava, para passar ao apuramento da matéria tributável da contribuinte com o recurso aos métodos indirectos, tendo em vista encontrar o volume de negócios do exercício do ano em causa de 2002, que a contabilidade não espelhava como deveria.

Para a passagem aos métodos indiciários, entre outros requisitos, na norma da alínea b) do art.° 87.° e do art.° 88.°, ambas da LGT, que foram as concretamente aplicadas no caso (cfr. cópia do relatório da fiscalização a fls 60 e segs do PA apenso e matéria do ponto 5. do probatório), pode-se bastar com a existência de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, que pode resultar das mais diversas anomalias, não restringindo a lei a liberdade da actuação da AT no sentido dos meios aptos a demonstrá-lo, assim podendo ser utilizados quaisquer índices aptos a revelá-los e sendo no caso aplicável, já a norma do art.°88.° da LGT, sabido que esta entrou em vigor em 1.1.1999 e é de aplicação posterior aos factos tributários ocorridos desde então (cfr. art.°6.° do Dec-Lei nº398/98, de 17 de Dezembro).

É que nos termos dos art.°s 44.°, n.°1, i) e 50.° do CPPT, já vigente, os procedimentos dirigidos à declaração dos direitos dos contribuintes neles podem ser utilizados todos os elementos de que disponha a entidade competente, sem os restringir a qualquer categoria de meios.

Assim sendo, cabia agora, por sua vez à impugnante no âmbito do ónus probatório que sobre si impende, come acima se fundamentou, ter vindo trazer aos autos prova certa e segura, tendo em vista infirmar os indícios seguros em que a AF se fundou para a passagem aos métodos indiciários, designadamente quanto às apontadas anomalias da sua contabilidade relacionadas, sobretudo com os proveitos nela inscritos como contrapartida dessas vendas, e se o conseguisse, não obstante aqueles fundados indícios, não teriam a virtualidade de alterar o resultado contabilístico declarado, por devidamente explicados e justificados.

Ainda que a contribuinte e ora recorrente tenha vindo colocar em causa os pressupostos em que se fundou a AT para lançar mão dos métodos indiciários, designadamente quanto aos proveitos que lhe foram imputados, em vários artigos ao longo da sua petição inicial de impugnação judicial, a verdade é que não terá logrado qualquer prova relevante nesse sentido pela inquirição das duas testemunhas arroladas e inquiridas, como bem analisou o M. Juiz do Tribunal "a quo" na fundamentação da sentença recorrida, apenas tendo resultado a matéria de facto fixada no probatório da mesma sentença e que a recorrente nem veio colocar em causa de forma válida, nos termos do disposto no art.° 690.°-A, n.°1 do CPC, como acima se disse, encontrando-se assim longe de colocar em dúvida séria, fundada, os indícios supra referidos, fixados no mesmo probatório, centrando-se essencialmente, em invalidar os pressupostos em que se fundou a AT para a passagem a tais métodos, sem contudo apresentar outros mais adequados por mais próximos da realidade que se visa alcançar, não tendo desta forma vindo colocar de forma minimamente consistente em causa a matéria apurada pela fiscalização, não tendo por isso logrado provar que esses pressupostos são errados e/ou desajustados à realidade em causa.

Aliás, parece-nos que para a impugnante e ora recorrente não lhe seria difícil ter vindo a arrolar como testemunhas alguma/s das adquirentes das fracções em que ocorreram aqueles indícios de os preços de compra e venda serem constituídos por valor superior ao declarado nas escrituras públicas de compra e venda ou quanto à idade e à localização dos imóveis, de forma a criar uma dúvida séria, fundada, sobre a existência desses pressupostos, com possível aplicação do regime contido no art.°100.° do CPPT, o que não fez, assim sendo de manter a factualidade constante desse mesmo relatório da fiscalização tributária, como acima se analisou, não podendo a impugnação judicial deixar de improceder por este fundamento, com o improvimento do recurso e a confirmação da sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.

Tendo embora em conta o inconveniente da possível fixação administrativa de um rendimento afastado do real por excesso ou por defeito, era indispensável que não se deixasse a Administração Fiscal manietada e na dependência absoluta do comportamento mais ou menos cumpridor dos sujeitos passivos, permitindo que esta reaja não só à negligência meramente fortuita de alguns contribuintes menos lestos no cumprimento das suas obrigações fiscais, como ainda relativamente àqueles que se esqueçam de revelar atempadamente os seus rendimentos, ou que queiram intencionalmente sonegá-los, não fornecendo elementos concretos à Administração - cfr. Direcção Geral das Contribuições e Impostos, Centro de Formação e Aperfeiçoamento Profissional, IRS, Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (Noções Fundamentais), 1990, p. 253.

Convém referir, no entanto, que a declaração de rendimentos apresentada pelo contribuinte goza da presunção de verdade, pelo que a Administração Fiscal não poderá pô-la em causa, sem que possua elementos fundados, que permitam demonstrar que a declaração reflecte omissões ou inexactidões - cfr., por exemplo, os termos dos artigos 76.° e 77.° do Código de Processo Tributário, 71º do Código do IRC e artº. 75.° da LGT.

A utilização de tais métodos dificilmente habilitará a Administração Fiscal a conhecer o verdadeiro lucro real obtido, dada a natureza e falibilidade de uma actuação norteada apenas por "índices médios" como sejam "as margens médias de lucro bruto ou líquido sobre as vendas, serviços prestados ou sobre as compras, fornecimentos e serviços de terceiros", ou atendendo a "taxas médias de rendibilidade do capital investido", "o coeficiente técnico de consumos ou utilização de matérias-primas" a "matéria tributável do ano ou anos mais próximos que se encontre determinada pela administração tributária", etc... (cfr. o artigo 52.° do Código do IRC e 90.° da LGT) .

A determinação do lucro tributável por métodos indiciários far-se-á de acordo com o disposto no artigo 52.° do Código do IRC.
Este artigo 52.° e hoje o art.°90° da LGT, diz que a determinação do lucro tributável por métodos indiciários, basear-se-á em todos os elementos de que a Administração Fiscal disponha, e, designadamente, em margens nédias de lucro bruto ou líquido sobre vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos e serviços de terceiros; taxas médias de rendibilidade do capital investido; coeficientes técnicos de consumo ou utilização de matérias-primas ou de outros custos directos; elementos e informações declarados à Administração Fiscal, incluindo os relativos a outros impostos, e, bem assim os obtidos em empresas ou entidades que tenham relações com o contribuinte.

A indicação destes elementos, como resulta inequivocamente da letra da lei, é meramente exemplificativa - pelo que outros elementos ou factores que forem pertinentes podem ser tidos em conta, e, obviamente, não se exige que, para apuramento do lucro tributável por métodos indiciários, todos aqueles elementos que a lei elenca tenham obrigatoriamente de ser considerados sempre, em todo e qualquer caso.
A avaliação fiscal, ou estimativa (recurso a métodos indiciários, ou outras designações para a mesma forma de actuação administrativa) constitui sempre uma ultima ratio fisci. A Administração Fiscal só deve recorrer às avaliações, quando estas se tomam o único método de calcular a dívida fiscal, quando a liquidação não pode assentar, como sucederá na grande maioria dos casos, nos elementos fornecidos pelo contribuinte.

Ora, é desta natureza da avaliação que necessariamente decorrem alguns dos pressupostos básicos da sua legitimidade.

O primeiro, é que a avaliação tem o claro recorte de uma medida excepcional. É um método indispensável, mas apenas perante a existência de declarações fraudulentas.
O segundo, é que o recurso a métodos indiciários constitui sempre uma sanção pela violação, que deverá ter existido, de deveres de cooperação do contribuinte, sobremaneira a violação das obrigações legais acesso rias de declaração, de facturação e de escrituração.
Uma vez que os métodos actuais de tributação assentam na cooperação dos contribuintes, as leis fiscais estabelecem necessariamente uma complexa descrição das suas obrigações acessórias. Obrigações estas que têm um carácter instrumental, na medida em que se destinam simultaneamente a permitir o cálculo da divida pelo contribuinte, e o eventual controlo destas operações pela Administração.
O recurso à avaliação tem como pressuposto que a violação destes deveres de cooperação tornem o controlo impossível. Violados estes, incorrendo o contribuinte em algum dos comportamentos omissivos ou afastados dos comandos legais, a Administração procede a uma avaliação da dívida.
E opera-se por esta forma uma verdadeira inversão material do ónus da prova. A partir daqui, é sobre o contribuinte que, materialmente, recai o ónus da prova de que a avaliação não tem bases suficientemente sólidas.
Cfr. tudo o que vem de ser dito em José Luís Saldanha Sanches, As Avaliações do IVA e os Deveres de Cooperação dos Retalhistas, na revista Fisco n.° 2 de 15.11.1988.

Às vezes, sem que haja qualquer fraude, o contribuinte é incapaz (por exemplo, por debilidade organizacional, estrutural) de reproduzir de forma satisfatória a sua história financeira/patrimonial.
Mas é preciso um comportamento culposo do contribuinte: tem que haver fraude ou negligência.
E é preciso ainda que a Administração Fiscal indique factos concretos, verificados, donde possa concluir-se pela existência dos pressupostos legais dos quais depende o apuramento do imposto pelo método presuntivo.
Pode conferir-se a este respeito, por todos, o acórdão do Tribunal Tributário de 2.a Instância de 12-5-1992, na Ciência Técnica e Fiscal n.°368, p. 234 a 247; e também os acórdãos desta Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo de 22-9-1998 e de 16-3-1999, na Antologia de Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Central Administrativo, ano II, respectivamente n.°1, pp. 300 a 302, e n.° 2, pp. 288 a 291.

Relativamente à fundamentação da decisão de tributação por métodos indiciários ou por presunções, dizia o artigo 81.° do Código de Processo Tributário e hoje o art.° 77.° da LGT, que essa decisão, para além de especificar os motivos da impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, indicará os critérios utilizados na sua determinação.

No caso sub judicio, nesta parte, está em causa apenas o critério ou os critérios com que a Administração Fiscal operou para determinar o lucro tributável tenham gerado um excesso de matéria tributável.

Não se questionam os pressupostos, que se têm por verificados, de aplicação ao caso de métodos indiciários da apuramento desse valor por a sentença recorrida, nessa parte, ter sido já confirmada com a consideração também, da existência desses pressupostos.

Consoante se deixou registado no probatório, e melhor se colhe dos autos, a Administração Fiscal, para a determinação do lucro tributável, no caso, operou com o montante de aquisição da fracção AI pela compradora Ana ..................................., em que esta procedeu à liquidação/regularização pelo preço que declarou como tendo sido o real, de € 62.349,74, que não o de 39.903,13, corro havia sido declarado na escritura pública de compra e venda, tendo sido apurada a percentagem de omissão que depois foi aplicada nos 4 prédios/fracções vendidas no exercício, que assim extrapolou para estes casos, donde apurou a totalidade dos montantes das vendas dessas fracções no exercício ora em causa, desta forma tendo encontrado o lucro tributável para o respectivo exercício - 2002 - alterando o valor do volume de negócios e outras componentes positivas e negativas do lucro tributável do exercício por € 699.359,58 através de métodos indirectos e fixado o lucro tributável em € 1.002,861,21, para o exercício em causa, mantido em sede de Comissão de Revisão, por despacho do Director Distrital de Finanças, na falta de acordo dos vogais, donde veio a resultar a liquidação adicional de IRC aqui em causa.

Quanto à prova testemunhal produzida no caso e oferecida pela impugnante, com a inquirição das duas testemunhas, nada a mesma veio pugnar que desses depoimentos resultasse no sentido da tese por si defendida, como lhe cabia - cfr. art.° 690. °-A, n.°1 , alíneas a) e b) do CPC - desta forma nada havendo de molde a infirmar a valia técnica e o valor probatório do relatório da Fiscalização Tributária constante dos autos, não permitindo infirmar os concretos factos apurados no relatório do exame à escrita e nem as conclusões para que os mesmos apontam.

Desta forma nada aponta para que o critério utilizado pela AT seja excessivo, acima referido, já que não se prova ou sequer se coloca em dúvida séria (Dúvida, que ainda assim não seria suficiente para anular a liquidação, já que a lei, nestes casos, por força do disposto no art.°74.°, n.°3 da LGT, exige que o contribuinte faça a prova do contrário), fundada, que o preço de aquisição de cada uma dessas fracções não fosse o formado pelas correcções ora operadas, resultante da percentagem de omissão do seu valor relativamente à dita fracção “AI", não provando que, aquele preço conhecido - cfr. matéria da sua conclusão 8. - não traduza o seu valor de mercado, e que por isso, quando aplicados aos demais, não traduzam o seu real volume de negócios no exercício em causa, desta forma não chegando a colocar em causa sequer, que a quantificação assim operada seja de valor inferior ao considerado e com base na qual, entre outros itens, foi alterado o montante da matéria colectável do exercício e se operou a correspondente liquidação adicional.

E, assim, a impugnante e ora recorrente, apesar de contestar o critério que serviu à quantificação administrativa da matéria tributável, não disponibilizou outro ou outros que fossem mais credíveis, por coerentes e adequados à quantificação exacta e justa, propiciando uma certeza (exigível) como meio de prova, revelando-se por isso incapaz de, justificadamente, desonerar-se do ónus da prova que nesta matéria do excesso de quantificação sobre si impendia, em ordem à anulação das liquidações em causa, nos termos do artigo 74.°, n.°3 da LGT.

Pelo que diremos, que o artigo 100, nº1(Dúvida fundada que contudo já seria relevante no que concerne aos pressupostos para a passagem aos métodos indirectos - cfr. nova redacção introduzida neste n.°1 pelo art.°68.° da Lei n.° 3-B/2000, de 4 Abril de 2000, 2.° Suplemento (Orçamento do Estado para 2000) e 2 do CPPT não tem aplicação nesta parte da situação controvertida pela mesma recorrente, mas sim a norma do n.°3 do art.°74.° da LGT e n.°3 do art.°100.° do mesmo CPPT, e nem a sentença recorrida padece de qualquer vício ao julgar tal critério como devidamente apto para o fim em vista de quantificação da matéria tributável.

Assim, as eventuais dúvidas sobre o lucro tributável no caso são apenas as co-naturais ao próprio método de apuramento de um valor por meio de métodos indiciários, onde o valor encontrado é sempre um valor probabilístico e não um valor absolutamente certo.
Aliás, a impugnante, ora recorrente, só de si pode queixar-se quanto à existência da falada falta de certeza, decorrente do emprego de métodos indiciários para apuramento do lucro tributável - pois que, por falta de credibilidade da sua escrita, é que não foi possível que a liquidação do imposto tivesse sido operada com base no lucro tributável real (declarado).

Quando se coloca o problema de apurar se existiu, ou não, determinado facto tributário, como no caso acontece, há que analisar em pormenor se a administração fiscal fez assentar os pressupostos da sua pretensão segundo juízos de probabilidade, necessariamente elevada, sem exigir uma certeza do facto tributário, resultando a legitimação do uso, pela administração fiscal, dessa mera probabilidade da violação pelo contribuinte de alguns dos seus deveres legais.

Não sendo possível, a maior parte das vezes, ter a certeza sobre a existência do facto tributário, daí não resulta que o contribuinte não seja tributado, pois, para que tal tributação não se verifique, necessário será que aquele alegue e prove factos (através de prova concludente) que ponham em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou o juízo de probabilidade elevado feito pela Administração para prova da existência do facto tributário ou da sua quantificação (Cfr. neste sentido o acórdão do então Tribunal Tributário de 2.ª Instância de 5.12.95, recurso n.°63 479).
Por outro lado, só releva para a anulação da liquidação do imposto a dúvida legítima ou fundada sobre a existência e quantificação do facto tributário, ou seja, quando aquela dúvida não seja imputável ao impugnante (Cfr. neste sentido, entre outros, o acórdão deste Tribunal de 21.12.1999, recurso n.°2417/99, de que fomos adjunto).

No caso, face aos elementos antes referidos, carreou a Administração Fiscal para os autos, dados certos e objectivos, que conduzem com um elevado grau de probabilidade, segundo juízos de causalidade usuais e normais no comércio, que nos exercícios em causa obteve aqueles proveitos e suportou aqueles custos incorridos, extraídos da extrapolação dos montantes de tais vendas e outros elementos contabilizados pela impugnante, critério que, à partida se não vislumbra que esteja errado, afigurando-se-nos antes, como razoável e adequado para o fim em vista.

Critério que, concede-se, poderia ter sido mais abrangente na base adoptada, dos montantes tidos como os preços reais dessas vendas, para depois os fazer extrapolar para os casos em que se verificavam os desvios para menos nas vendas das restantes fracções autónomas, que ainda assim, em nosso entender, se encontra dentro do limite do adequado e apto para o fim em vista, e, sobretudo, a pecar será por defeito que não por excesso, condições para que, ao seu abrigo a liquidação deva ser mantida que não anulada, ao abrigo do disposto nos art.°s 74.°, n.°3 da LHGT e 100.° do CPPT, já que só a prova do erro ou do excesso de quantificação, a cargo do contribuinte, poderia redundar nessa anulação, que no caso, como vimos não logrou alcançar.

Por sua vez, cabia à recorrente, ter alegado e provado factos certos e concludentes que pusessem em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou aquele juízo de probabilidade elevado feito pela Administração Fiscal para prova do erro na existência dos pressupostos considerados pela AT e donde resultou a quantificação por métodos indiciários ou indirectos. Ou que no caso, haviam ocorrido circunstâncias especiais que levaram a que em relação a tal exercício do ano de 2002, tal montante dessas vendas por preços declarados de montante inferior ao estimado pela AF, mercê dessas particularidades. Situação que colocava a impugnante nas melhores condições para o esclarecer e provar, o que não fez.

Na sua petição inicial de impugnação judicial, a recorrente, articula alguns factos com a virtualidade de pôr em dúvida aqueles pressupostos em que assentou a liquidação, como acima se disse - cfr. art.°s 30.° e segs. da mesma petição de impugnação. Contudo, em sede da possível impugnação da matéria de facto, nada a mesma veio a ora recorrente alegar quanto a essa prova testemunhal produzida, que fosse susceptível de vir de colocar em dúvida séria, fundada, tais pressupostos utilizados pela AT para lançar mão dos métodos indirectos, não sendo por isso caso também de aplicação do disposto no art.° 100.° do CPPT, com a anulação do acto de liquidação, como acima se disse.
Razões porque, como primitivo relator, propúnhamos a improcedência do recurso e a confirmação da sentença recorrida.
Lisboa,15 de Dezembro de 2010 Eugénio Sequeira)

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(1) A Lei Geral Tributária/LGT entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 1999 – cfr. art. 6.º DL. 398/98 de 17.12., regulando, a partir desse momento, as relações jurídico-tributárias, ou seja, as relações estabelecidas entre a administração tributária, agindo como tal, e as pessoas singulares e colectivas e outras entidades legalmente equiparadas a estas.
(2)Explicitamente, consagrada no art. 85.º n.º 1 LGT.
(3)Também, invocados pela impugnante e reiterados pela Rte.
(4)Cfr. pontos 1.3. e III.