Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 978/10.6BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 11/24/2022 |
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Relator: | JORGE CORTÊS |
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Descritores: | IRC. SGPS. SUPRIMENTOS. CISÃO DE SOCIEDADES. |
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Sumário: | A anulação de crédito por suprimentos concedido por uma SGPS a uma sociedade sua participada, na sequência da dissolução e da liquidação desta última, constitui custo do exercício, relacionado com a actividade económica da primeira, a qual reside na gestão de participações sociais, incluindo a concessão de crédito às participadas, nos termos legais. A neutralidade fiscal impõe a aplicação do regime do crédito em causa no âmbito da sociedade cindida em relação à sociedade beneficiária. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acórdão I- Relatório P.................... P………………, S.G.P.S., sociedade que sucedeu à C.................- SGPS, e aqui representada pelas sociedades H............... SGPS, S.A., e C............. SGPS, sociedades que lhe sucederam na sequência da sua cisão, na modalidade de cisão – dissolução, deduziu no Tribunal Tributário de Lisboa impugnação judicial contra as liquidações de IRC, dos exercícios de 2005 e de 2006, no valor global de €317.271,09. Por sentença do referido Tribunal, datada de 06/02/2019, inclusa a fls. 187 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), foi decidido nos seguintes termos: “i. Anulam-se as liquidações constantes da Demonstração de Acerto de Contas n.º ……………….849, no valor total de € 179.645,14, com data limite de pagamento em 13-01-2010, referentes a IRC do exercício de 2005; ii. Anulam-se as liquidações constantes da Demonstração de Acerto de Contas n.º ……………..444, no valor total de € 137.625,95, com data limite de pagamento em 15-01-2010, referente a IRC do exercício de 2006; iii. Condena-se a Fazenda Pública ao pagamento de juros indemnizatórios.” A Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional para este Tribunal Central Administrativo, tendo nas alegações apresentada (fls. 241 e ss., numeração em formato digital – sitaf) formulado as seguintes conclusões: “ I - A questão decidenda tal como delimitada na douta sentença, da qual se recorre, “consiste em apreciar e decidir se as liquidações de IRC referentes aos exercícios de 2005 e 2006 deverão ser anuladas por se verificarem as condições previstas na lei para os suprimentos serem considerados como custo do exercício de 2005, indispensável à obtenção de proveitos da Impugnante.” II - Ora, no que respeita à questão decidenda, saber se se verificam as condições previstas na lei para os suprimentos serem considerados como custo do exercício de 2005, indispensável à obtenção de proveitos da Impugnante, a P...................., entende-se que a Impugnante não poderia considerar como custo fiscal o crédito de suprimentos que detinha sobre a S............., contrariamente ao entendido pela decisão recorrida. III - A questão a decidir, salvo melhor opinião, não se confina ao assim delimitado porque o que está em causa não é “… verificar as condições previstas na lei para os suprimentos serem considerados como custo do exercício indispensável à obtenção de proveitos”, já que não estamos na presença de uma correção verificada na “esfera jurídica” da empresa S............. mas sim da P...................., a quem por decisão de gestão aquando da cisão-dissolução da C............... foi atribuído um crédito, resultante de partilha. IV - Ou seja, quando no ato da sua constituição à P.................... foi atribuído pela cisão da C................. um crédito, não houve aqui subjacente, na sua esfera jurídica, qualquer operação direta com vista à obtenção de proveitos. Este crédito que passou a constituir um ativo na P.................... a ser avaliado no âmbito da indispensabilidade na obtenção dos proveitos, poderia ser indispensável para a S............., mas não no que respeita à P.................... que o “herdou”, perdendo-se como tal na operação de cisão e dissolução o objeto e a finalidade pelo qual se havia inicialmente constituído. V - Aquando da cisão-dissolução verificou-se uma alteração de intervenientes e da posição e papel de cada um face à operação suprimentos. VI – Ou seja, na esfera da P.................... o crédito não é indispensável para a obtenção dos proveitos, porquanto não foi a esta quem foram efetuados os suprimentos. Até porque podendo nem haver coincidência de sócios, nunca seria possível explicar que na esfera da P.................... estávamos perante suprimentos. VII – Assim, como se pode concluir, os suprimentos que geraram o crédito, não serviram para gerar ganhos na impugnante, a P...................., mas sim na S.............. VIII - Por outro lado, estamos perante custos ou perdas suportadas por transmissão de capital entre sociedades com relações especiais sem qualquer justificação formal nos termos do artigo 39º CIRC, para efeitos de aceitação do custo. IX – Logo corrobora-se a não dedutibilidade nos termos do art.º 23.º do CIRC, nos termos supra melhor explanados em sede de alegações e a inviabilidade de reporte de prejuízos no exercício subsequente. X - Em 2006-12-31 verificou-se a cessação da atividade da P...................., termos em que se finaliza a concluir que, a “cascata” de sociedades que se vão formando por força das constantes cisões são um veículo para que as operações se transformem e percam as características originais, pelo que salvo melhor entendimento, a decisão recorrida padece de erro. X A sociedade recorrida contra-alegou, (cfr. fls. 256 e ss. -numeração em formato digital – sitaf), tendo concluído assim:1ª) As liquidações impugnadas resultaram da não aceitação, por parte da Administração Fiscal, da perda ou incobrabilidade de um crédito que a recorrida detinha sobre a sociedade S.............; 2ª) O referido crédito resultou de suprimentos efectuados à S............. pela sociedade C................., que era a sua única accionista, sendo que, com tais suprimentos, a S............. adquiriu um património vultuoso, constituído por acções representativas do capital social do Banco ……………………; 3ª) As referidas “acções …………” geraram, para a S............., dividendos de elevado valor; 4ª) Para pagamento da dívida que a S............. tinha para com a sua sócia C................., ela vendeu, a esta, a preço de mercado, as “acções …………..”, mas o valor assim obtido foi inferior à dívida, pelo que a C................. continuou credora da referida S.............; 5ª) A C................. veio a ser cindida, dando origem a várias sociedades, entre as quais a recorrida, recebendo esta, como decorre de um processo de cisão, na proporção, activos e passivos da C.................; 6ª) Entre os activos recebidos pela recorrida, estavam “acções ...............”, uma participação na S............. e o crédito sobre esta; 7ª) A S............. foi dissolvida e liquidada, apurando-se, nesse processo de liquidação, zero de activos, pelo que o crédito que a recorrida detinha sobre a S............. deixou de ser cobrável; 8ª) Na não aceitação, como custo fiscal, desta impossibilidade de cobrança do crédito e, portanto, da sua perda, na contestação, a Fazenda Pública veio invocar o art° 23°, n°s 5, 6 e 7 do C.IRC, como norma fundamento para a não aceitação do referido custo; 9ª) Trata-se, porém, de uma fundamentação nova, isto é, que não constava do Relatório da Inspecção Tributária, sendo que, como é entendimento firmado da jurisprudência, a fundamentação posterior à emissão de acto não releva para a sua apreciação; 10ª) Sendo que, em qualquer caso, a referida fundamentação é ilegal, porque as normas invocadas dizem respeito à transmissão de participações sociais quando, no caso, o que está em causa é a não cobrabilidade de um crédito suprimentista; 11ª) A Administração Fiscal invocou o n° 1 do art° 23° do CIRC como fundamento para a correcção efectuada, considerando não estar provado que a concessão dos suprimentos gerou rendimentos tributáveis; 12ª) Trata-se de uma errónea concepção sobre a legal e necessária ligação entre custos e proveitos - os custos fiscalmente aceites não são aqueles que geram proveitos, mas sim aqueles que são potencialmente aptos a gerarem proveitos; 13ª) Ora, é evidente que a concessão de suprimentos permite, como permitiu, que a S............. adquirisse um relevante património (as “acções ...............”) potenciador de rendimentos, quer para si, quer para a sua sócia C................., seja por via de dividendos, seja por via de mais-valias; 14ª) Sendo certo, além do mais, que, efectivamente, as sociedades em causa obtiveram proveitos resultantes dessa participação; 15ª) É, pois, ilegal, a não aceitação do custo com base no n° 1 do art° 23° do CIRC, como bem decidiu a douta sentença recorrida; 16ª) A Administração Fiscal invocou, também, o art° 39° do CIRC, para não aceitar a incobrabilidade de crédito e o seu concomitante reflexo como custo fiscal; 17ª) Estranho e anómalo entendimento, já que a própria Administração Fiscal afirma que a S............. não tinha activos e, portanto, não podia pagar as suas dívidas; 18ª) Estranho e anómalo entendimento, já que, em resultado da dissolução/liquidação da S............., “executou-se” todo o seu património, constatando-se que ele era inexistente; 19ª) A dissolução/liquidação da devedora é uma forma clara e evidente de diligência para a cobrança do crédito; 20ª) À semelhança do que acontece num processo de insolvência, através da dissolução/liquidação de uma sociedade, “executa-se” o seu património para, assim, pagar aos credores - ora, no caso, constatou-se a inexistência de qualquer activo para solver dívidas; 21ª) Essa inexistência de bens e, portanto, a indiscutível incobrabilidade do crédito está também demonstrada nas declarações fiscais entregues pela S............., em relação às quais existe, nos termos do art° 75° da LGT, a presunção de verdade; 22ª) A correcção efectuada e as concomitantes liquidações, são, assim, ilegais; 23ª) A douta sentença recorrida não merece, deste modo, qualquer censura.“ X A Digna Magistrada do M. P. junto deste Tribunal notificada para o efeito, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.X Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.X II- Fundamentação1. De Facto. A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:” 1. Em 30-06-1999, foi registada na Conservatória do Registo Comercial da Zona Franca da Madeira, sob a apresentação n.º 7, a constituição da sociedade anónima sob a denominação “S............. - COMERCIO …………………” (cf. Doc.6 junto à PI a fls. 44 a 61 dos autos); 2. Em 14-03-2000, foi registada na Conservatória do Registo Comercial da Zona Franca da Madeira, sob a apresentação n.º 27, a atualização do pacto social da sociedade referida em 1., passando a denominar-se “S............. - CONSULTORIA E …………….., S.A.”, e constando como objeto social o seguinte: 3. A sociedade S............., referida em 1. e 2., era detida em 100% pela sociedade C................. (facto não impugnado provado por acordo, cf. artigos 65º e 66º da PI e artigo 20º da informação dos serviços da AT junta com a contestação); 4. Entre 02-05-2003 e 01-11-2004, a sociedade ............... Central …………. emitiu em nome de S............., referida em 1. e 2., cinco documentos com a indicação “D………… DEL VALOR ACCS. ............... CENTRAL ………”, de acordo com a tabela seguinte:
5. Em 19-11-2004, foi outorgado um documento designado “Contrato de Compra e Venda entre C................., SGPS, S.A. e S............. - Consultaria ……………, S.A.”, do qual se extrai, nomeadamente, o seguinte: PRIMEIRA A Primeira Contratante vende, e a Segunda Contraente compra, livres de ónus ou encargos, 102.088.705 [...] acções, representativas do capital social e dos direitos de voto da sociedade Banco ............... Central ............... (BSCH).SEGUNDA As acções são vendidas pelo preço global de 980.051.568 [...], correspondendo 9,60 euros por cada acção, acordando os Contraentes que o pagamento será feito por compensação de créditos de suprimentos de igual montante actualmente detidos pela Segunda Contraente sobre a Primeira Contraente. [...]»(cf. Doc.7 junto à PI a fls. 62 a 64 dos autos); 6. Em 15-12-2004, foi outorgado um documento designado “PROJECTO DE CISÃO DA C................. SOCIEDADE ………………….., S.A.”, do qual se extrai, nomeadamente, o seguinte: 7. Em 31-01-2005, foi registada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, sob a apresentação n.º 22, a constituição da sociedade anónima sob a designação “P.................... PARTICIPAÇÕES SGPS, S.A.”, ora Impugnante (cf. Doc.1 junto à PI a fls. 33 a 36 dos autos); 8. Em 07-12-2005, constava, por extrato, o seguinte, no balanço da S............., referida em 1. e 2.:
9. Em 22-12-2005, foi elaborado um documento designado “ACTA NÚMERO TRINTA E OITO”, no qual consta, além do mais, o seguinte: 13.° Aquando da divisão do património pelos herdeiros, determinou-se que a C................. seria dissolvida e o seu património dividido em “13 partes, sendo cada uma dessas partes destinada a constituir uma nova sociedade (cisão-dissolução)”, conforme Projecto de Cisão, datado de 15 de Dezembro de 2004.14.º “5.1 - Tratando-se de uma cisão-dissolução, todos os e todos os passivos da C................. serão transmitidos para as Novas Sociedades, pelo respectivo valor contabilistico constante do balanço especialmente elaborado para o efeito à data de 14 de Dezembro de 2009 [...] os elementos patrimoniais da serão registados nas Novas Sociedades pelos mesmos valores que tinham na C..................5-2 - Os activos existentes nesta data no património da C................. são os seguintes: a) […] b) 50 acções da S............., representativas da totalidade do capital social com custo de aquisição de 50.000 euros e respectiva provisão de 50.000 euros; c) […] d) Um crédito de suprimentos sobre a sociedade S............. no valor de 107.501.103,74 euros e respectiva provisão de 107.419.174,99 euros;” (Projecto de Cisão da C.................) [...]» (cf. Anexo II a fls. 147 a 162 do PA apenso aos autos); 12. Em 24-11-2009, os serviços da AT elaboraram um documento designado “RELATÓRIO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA”, no qual consta, por extrato, o seguinte: 13. Em 25-11-2009, o substituto legal do Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa proferiu o seguinte despacho: 14. Em 07-12-2009, os serviços da AT emitiram em nome da Impugnante a Demonstração de Acerto de Contas n.º …………………849, no valor total de €179.645,14, com data limite de pagamento em 13-01-2010, referente a IRC do exercício de 2005, na qual consta, além do mais, o seguinte:
15. Em 10-12-2009, os serviços da AT emitiram em nome da Impugnante a Demonstração de Acerto de Contas n.º …………444, no valor total de €137.625,95, com data limite de pagamento em 15-01-2010, referente a IRC do exercício de 2006, na qual consta, além do mais, o seguinte:
16. Em 12-01-2010, foi aposta uma vinheta de pagamento no valor de € 179.645,14 na Demonstração de Acerto de Contas referida em 14. (cf. Doc.2 junto à PI a fls. 37 dos autos); 17. Em 15-01-2010, foi aposta uma vinheta de pagamento no valor de € 137.625,95 na Demonstração de Acerto de Contas referida em 15. (cf. Doc.3 junto à PI a fls. 38 dos autos); 18. Em 15-04-2010, deram entrada os presentes autos (cf. carimbo aposto a fls. 1 dos autos).”. X “Não existem factos alegados e não provados com interesse para a decisão da causa.”X “A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto dada como provada resulta da análise dos documentos constantes dos autos, que não foram impugnados, assim como nos factos alegados pelas partes, corroborados pelos documentos juntos, conforme discriminado nos vários pontos do probatório, dando-se por integralmente reproduzido o teor dos mesmos bem como o do PA.”X 2.2. De Direito.2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento quanto ao direito aplicável em que terá incorrido a sentença sob recurso. A sentença julgou procedente a impugnação, determinando a anulação das liquidações adicionais de IRC de 2005 e 2006. Para tanto, estruturou, em síntese, a argumentação seguinte: «Examinando o caso concreto em função do que supra se expôs, decorre do probatório, vide pontos 5. e 6., que o crédito que a C................. detém sobre a sociedade S............. advém do facto de esta última não ter realizado valor suficiente com a venda das ações representativas do capital social do Banco ............... Central ............... para pagar os suprimentos que lhe haviam sido concedidos, pelo que, com a cisão da C................., parte dos referidos créditos foram transmitidos para a Impugnante. // Desta forma, na data da sua constituição já a Impugnante se encontrava onerada com o crédito sobre a S............., podendo, na posse do património transmitido e a par das demais sociedades, continuar a exercer a sua atividade de gestão de participações financeiras. // Dito de outra forma, os suprimentos presentes na transmissão por partilha dos ativos e passivos da C................., integraram a natureza e o objeto das novas sociedades, também gestoras de participações sociais, podendo estas prosseguir a mesma atividade da que foi cindida e partilhada, pelo que a motivação da operação se encontra demonstrada. // Quanto à indispensabilidade do custo na obtenção de proveitos ou ganhos, verifica-se que efetivamente a C................. efetuou suprimentos à S............., o que consubstancia, nos termos do artigo 1.º do Regime SGPS, uma forma indireta de exercício de atividades económicas». 2.2.2. A recorrente assaca à sentença em crise erro de julgamento quanto ao direito aplicável. Invoca que não foi demonstrado o carácter indispensável do custo associado ao crédito de suprimentos em referência, bem como não foi comprovado o preenchimento dos pressupostos do artigo 39.º do CIRC (“Créditos incobráveis”). A correcção em exame assenta na fundamentação constante do relatório inspectivo (n.º 12 do probatório). Ou seja, a correcção em exame assenta na consideração de que o custo associado à anulação do crédito de suprimentos em causa não pode ser aceite, porquanto não se mostra comprovado o pressuposto da indispensabilidade do custo, nem a ocorrência dos pressupostos relativos a créditos incobráveis. Recordem-se os normativos relevantes. Nos termos do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC (“Custos e perdas”), «[c]onsideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (…)». Estatui o artigo 39.º do CIRC que «[o]s créditos incobráveis podem ser directamente considerados custos ou perdas do exercício na medida em que tal resulte de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência, quando relativamente aos mesmos não seja admitida a constituição de provisão ou, sendo-o, esta se mostre insuficiente». O regime das SGPS decorre do disposto no Decreto-Lei nº 495/88, de 30.12 [RSGPS]. Nos termos do artigo 1.º deste, «[a]s sociedades gestoras de participações sociais têm por único objecto contratual a gestão de participações sociais noutras sociedades, como forma indirecta de exercício de actividades económicas» (n.º 1). A participação é «considerada forma indirecta de exercício da actividade económica desta quando não tenha carácter ocasional e atinja, pelo menos, 10% do capital com direito de voto da sociedade participada, quer por si só quer através de participações de outras sociedades em que a SGPS seja dominante» (n.º 2). Nos termos do artigo 243.º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais (1), [c]onsidera-se contrato de suprimento o contrato pelo qual o sócio empresta à sociedade dinheiro ou outra coisa fungível, ficando aquela obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade, ou pelo qual o sócio convenciona com a sociedade o diferimento do vencimento de créditos seus sobre ela, desde que, em qualquer dos casos, o crédito fique tendo carácter de permanência». No caso, em exame, resultam do probatório os elementos seguintes: i) Em 14-03-2000, foi registada na Conservatória do Registo Comercial da Zona Franca da Madeira, sob a apresentação n.º 27, a atualização do pacto social da sociedade referida em 1., passando a denominar-se “S............. - CONSULTORIA E ………………, S.A.”, e constando como objeto social o seguinte: ii) «A sociedade tem por objecto social a prestação de consultadoria económica e administrativa; elaboração de estudos de desenvolvimento, gestão e marketing; gestão da sua carteira de títulos e de investimentos.» (2)» iii) A sociedade S............., referida em 1. e 2., era detida em 100% pela sociedade C................. (3) iv) Em 31-01-2005, foi registada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, sob a apresentação n.º 22, a constituição da sociedade anónima sob a designação “P.................... PARTICIPAÇÕES SGPS, S.A.”, ora Impugnante (4) v) Na sequência da cisão da C................. foram transferidos para a sociedade impugnante os elementos seguintes (5): Os seguintes activos: • 4.979.070 acções representativas do capital social do B…….., com custo de aquisição de 47.799.083,18 euros e respectiva provisão de 2.887.868,67 euros; • 2 acções representativas do capital social da S............., com custo de aquisição de 2.000 euros e respectiva provisão de 2.000 euros; • 765.191,29 euros da carteira de fundos de investimentos; • Um crédito sobre a Herança do Senhor A[...] no valor de 8.843.063,50 euros; • Um crédito de suprimentos sobre a sociedade S............. no valor de 5.243.038,72 euros e respectiva provisão de 5.239.042,90 euros; • Um crédito sobre o Estado relativo a PEC's no valor de 219,24 euros; • Depósitos bancários, aplicações de tesouraria e caixa no valor de 15.664.455,76 euros. • 4,76190476191% de eventuais bens não identificados no presente projecto de cisão e que existam na data da cisão, Aos quais se atribui o valor global de 70.188.140,13 euros. Os seguintes passivos: • Uma dívida a accionistas no valor 40.856,51 euros; • Ao Estado e Outros Entes Públicos no valor de 9.324,27 euros; • A Outros credores no valor de 237,40 euros. • 4,76190476191% de eventuais passivos que existam na data da cisão e não identificados no presente projecto de cisão, Aos quais se atribui o valor global de 50.418,17 euros. [...]» vi) Em 07/12/2005, o total do passivo da S............. era de €106.994.635,39 (6). vii) Em 22.12.2005, foi elaborado um documento designado “ACTA NÚMERO TRINTA E OITO”, no qual consta, além do mais, o seguinte: «Aos vinte e dois dias do mês de Dezembro do ano dois mil e cinco [...] reuniu [...] uma Assembleia Geral Extraordinária da sociedade comercial anónima “S............. - ………………E INVESTIMENTOS S.A.” [...] 2 - Deliberar sobre e dissolução e liquidação da sociedade nos termos do Artº 141° n°1 alínea b) do Código das Sociedades Comerciais; [...] Após breve troca de impressões entre os sócios, foi deliberado por unanimidade levar à conta de resultados transitados o saldo líquido positivo apurado no exercício, no montante da 348.251.45 Euros. Foi ainda tornada igualmente a deliberação unanime de nomear qualquer Administrador para, sozinho, proceder a escritura de dissolução da sociedade [...]» (7). viii) Em face da Dissolução/Liquidação da S............., a impugnante considerou como custo do exercício de 2005, o valor do crédito de suprimentos de €5.236.537,22 que detinha sobre a referida sociedade, uma vez que o mesmo deixou de ser cobrável (8). A contestação do carácter indispensável do custo em presença ou a invocação da falta de comprovação do mesmo não procedem. Trata-se de um crédito concedido pela sociedade C................. à sua participada S............. e, posteriormente, encabeçado pela sociedade impugnante, na sequência da sucessão por esta na titularidade do património da primeira. O crédito de suprimentos foi contraído pela sociedade participante com vista a fazer face às necessidades de tesouraria da sociedade participada. Não existe, por isso, fundamento para a rejeição do seu carácter necessário ao exercício do objecto social da sociedade que o constitui, dado que se trata de uma SGPS, cuja actividade económica reside na gestão das suas participações sociais (v. artigo 5.º/1/c) e 2 do RSGPS). Por seu turno, a sociedade impugnante, enquanto sucessora na titularidade do património da sociedade C................. e enquanto SGPS, perante a extinção, por dissolução e liquidação, da sua participada S............., em 22.12.2005, procedeu à anulação do crédito de suprimentos que detinha sobre a sua participada, o qual foi levado a custo do exercício (2005). A operação em apreço não merece reparo, dado que, perante a extinção confirmada da sociedade participada S............., o crédito de suprimentos tornou-se incobrável e como tal, por anulação, foi levado a custo do exercício da sociedade impugnante, associado ao exercício normal da actividade de uma SGPS, o qual consiste na participação societária e na gestão das respectivas participações sociais (v. artigo 5.º/1/c) e 2 do RSGPS). Mais se refere que, nos termos 68.º/4, do CIRC - norma que tem em vista garantir a neutralidade fiscal, em sede de reestruturação empresarial - «[n]a determinação do lucro tributável da sociedade beneficiária deve ter-se em conta que: «[o] apuramento dos resultados respeitantes aos elementos patrimoniais transferidos é feito como se não tivesse havido fusão, cisão ou entrada de activos (alínea a) e que «[a]s provisões que foram transferidas têm, para efeitos fiscais, o regime que lhes era aplicável nas sociedades fundidas, cindidas ou na sociedade contribuidora». Determina, também, o artigo 7.º da Directiva 90/434/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990 (relativa ao regime fiscal comum aplicável às fusões, cisões, entradas de activos e permutas de acções entre sociedades de Estados-Membros diferentes), que «[o]s Estados-membros tomarão todas as medidas necessárias para que as provisões ou reservas regularmente constituídas com desagravamento parcial ou total de imposto pela sociedade contribuidora (…), sejam retomadas, nas mesmas condições de isenção de imposto, pelos estabelecimentos estáveis da sociedade beneficiária situados no Estado da sociedade contribuidora, substituindo-se então a sociedade beneficiária aos direitos e obrigações da sociedade contribuidora». Por outras palavras, a transferência do crédito de suprimentos e a sua provisão para a titularidade da sociedade impugnante não pode ter como efeito um tratamento fiscal mais gravoso para a contribuinte do que teria, sem a operação de cisão, dado que tal tratamento põe em causa o princípio da neutralidade fiscal, em sede de reorganização empresarial. A correcção em apreço ao não aceitar o custo em presença, invocando a preterição dos requisitos da indispensabilidade do custo e da falta de prova da incobrabilidade do crédito, incorre em erro nos pressupostos de direito, devendo ser anulada. A sentença recorrida, que decidiu no sentido mencionado, deve ser confirmada, dado que não incorreu em erro de julgamento. Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso. Dispositivo Custas pela recorrente. Registe. Notifique. (Jorge Cortês - Relator) (1.ª Adjunta – Patrícia Manuel Pires) (2.ª Adjunto – Vital Brito Lopes) (1) Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86 de 02.09. (2) N.º 2 do probatório. (3) N.º 3 do probatório. (4) N.º 7 do probatório. (5) N.º 6 do probatório. (6) N.º 8 do probatório. (7) N.º 9 do probatório. (8) Relatório inspectivo. |