Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03577/08
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:05/31/2012
Relator:RUI PEREIRA
Descritores:CONCURSO – PROFESSOR CATEDRÁTICO – ARTIGO 49º DO ECDU – APLICAÇÃO DE MÉTODOS E CRITÉRIOS OBJECTIVOS DE AVALIAÇÃO
Sumário:I – A aplicação de métodos e critérios objectivos de avaliação, exigida pelo artigo 5º, nº 2, alínea c) do DL nº 204/98, de 11/7, é aplicável aos concursos regulados pelo Estatuto da Carreira Docente Universitária, sendo que tal obrigação não é afastada pelo regime decorrente do artigo 2º daquele DL face ao teor do que se dispõe no artigo 3º do mesmo diploma.

II – A não aplicação de métodos e critérios objectivos de avaliação no concurso em causa, nomeadamente para a seriação dos candidatos, violou os princípios da imparcialidade e da igualdade de oportunidades, na medida em que impediu o júri de avaliar e comparar exactamente aquilo que lhe competia avaliar: o mérito da obra científica dos candidatos, a sua capacidade de investigação e o valor da actividade pedagógica já desenvolvida
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO
Ernesto …………………….., com os sinais dos autos, intentou no TAC de Lisboa uma Acção Administrativa Especial de impugnação de acto administrativo contra a Universidade de Lisboa, impugnando o relatório final do júri do concurso para provimento de duas vagas de professor catedrático para o 2º Grupo A – Linguística Geral e Românica, datado de 19-7-2004, imputando-lhe a violação do disposto no artigo 49º do Estatuto da Carreira Docente Universitária, dos princípios da estabilidade, da boa-fé e da igualdade entre todos os candidatos [artigos 6º e 6º-A do CPA], desrespeito do único critério estabelecido pelo júri, falta de fundamentação e, finalmente, violação do disposto no artigo 105º do CPA.
Por acórdão datado de 15-3-2007, o TAC de Lisboa julgou a acção improcedente [cfr. fls. 86/107 dos autos].
Inconformado, o autor interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões:
A – Vem o presente recurso interposto dado não poder o recorrente concordar com a decisão em dois aspectos fundamentais:
a) No que respeita ao facto de considerar não ser necessário ao júri estabelecer critérios objectivos para seriação dos candidatos;
b) Considerar que a seriação dos candidatos foi efectuada com base numa fundamentação clara e objectiva.
B – Dispõe o artigo 3º, nº 2 do DL nº 204/98, de 11 de Julho, que os concursos das carreiras do regime especial «[...] podem obedecer a processo de concurso próprio com respeito pelos princípios e garantias consagrados no artigo 5º», sem qualquer excepção para nenhum deles.
C – Ora, contam-se entre os princípios aí estabelecidos que é garantida aos candidatos a aplicação de métodos e critérios objectivos de avaliação.
D – Contudo, artigo 38º do ECDU vem dispor que o concurso documental se destina «a averiguar o mérito da obra científica dos candidatos, a sua capacidade de investigação e o valor da actividade pedagógica já desenvolvida».
E – A forma como se realiza essa «averiguação» é que tem de seguir o critério legal, ou seja, o estabelecimento de critérios de análise objectivos de avaliação.
F – Para haver uniformidade do júri na reflexão quanto ao mérito relativo dos candidatos, importava estabelecer previamente, os critérios objectivos a utilizar para fundamentar o valor científico e pedagógico do currículo vitae da cada candidato, para cumprimento o estabelecido no artigo 38º e 49º, nº 1 do ECDU.
G - Ora, no concurso em apreço nos presentes autos esses critérios objectivos não foram definidos,
H – O que teve como consequência que cada membro do júri ponderou circunstâncias diferentes do currículo dos candidatos, valorando ou depreciando aspectos diversos, de modo arbitrário.
I – Verificasse, pois, que cada membro do júri apreciou os currículos de acordo com o que reputava como mais importante para a avaliação, o que constitui inequívoca violação das exigências contidas no artigo 5º do DL nº 204/98.
J – Pelo que, também com o fundamento na violação do disposto nos artigos 2º, 5º do DL nº 204/98, e 9º, 38º e 49º do ECDU, deve a acta da 1ª reunião do júri ser anulada, nos termos do disposto no artigo 135º do CPA, com todas as legais consequências.
Acresce que, para além disso, e também em consequência disso,
K – Igualmente se verifica o vício de forma por falta de fundamentação, porque, na ausência de critérios uniformes de avaliação, cada membro do júri densificou à sua maneira e de acordo com a sua perspectiva os conceitos de mérito da obra científica, capacidade de investigação e valor de actividade pedagógica,
L – Excedendo manifestamente os limites de liberdade de avaliação conferidos pela "discricionariedade técnica" e a vinculação contida no nº 1 do artigo 52º do ECDU.
M – Houve, portanto, violação do disposto nos artigos 268º, nº 3 da CRP, 52º, nº 1 do ECDU, e 124º e 125º do CPA.
N – Todas as apreciações do júri são de uma vacuidade extrema, quanto aos elementos concretos e objectivos.
O – Os «fundamentos» apresentados pelos referidos membros do júri, para além da diversidade de métodos e critérios utilizados, são incongruentes, inexactos, insuficientes e obscuros não permitindo, assim, aquilatar das razões de facto que levaram à tomada de decisões no sentido da graduação efectuada.
P – Ora, tal conduta excede manifestamente os limites de liberdade de avaliação conferidos pela «discricionariedade técnica» e a vinculação contida no nº 1 do artigo 52º do ECDU que pretende garantir que a ponderação efectuada pelo júri externe um percurso de racionalidade visível pelos destinatários da decisão.
Q – Nesse sentido vejam-se os acórdãos do STA nos Processos 016559, de 10-3-1983, 1ª Secção, e Processo 028718, de 30-11-1994, 1ª Subsecção.
R – Também nesse sentido se pronuncia o Prof. J. C. Vieira de Andrade: «[...] É que, ao contrário dessa ideia, a discricionariedade exige especialmente a fundamentação: [...] a fundamentação dos actos que incluem o exercício de poderes discricionários é especialmente exigível, precisamente porque estamos perante domínios de grande abertura normativa, em que há um défice de regulamentação substancial prévia, que há-de ser compensado por uma imposição de transparência capaz de garantir uma efectiva protecção».
S – Houve, portanto, violação do disposto nos artigos 268º, nº 3 da CRP e no 52º do ECDU e, ainda, violação do disposto nos artigos 6º, 124º e 125º do CPA, aplicável por força do disposto no artigo 2º.
T – Pelo que, também com o fundamento de falta de fundamentação, deve a acta da 2ª reunião do júri ser anulada, nos termos do disposto no artigo 135º do CPA, com todas as legais consequências.
E ainda,
U – Na 1ª reunião do júri do concurso foi deliberado, no que respeita à metodologia a seguir para a ordenação dos candidatos, que cada membro do júri devia apresentar uma apreciação dos currículos e os trabalhos publicados por cada candidato e apresentar, na próxima reunião, uma proposta de ordenação dos mesmos, devidamente fundamentada, a qual será projecto de debate.
V – Ora, dos sete membros do júri apenas quatro apresentaram justificações de ordenação, tendo dois dos membros do júri, limitando-se a aderir às propostas e considerações efectuadas por outros membros do júri, e um dos membros do júri, não apresentou qualquer proposta nem aderiu a nenhuma das apresentadas.
W – E a referida proposta de ordenação dos candidatos preenchida pelo Professor Atalaiba ……………. foi efectuada já na segunda fase, a de votação dos candidatos, tendo todos os restantes membros do júri também preenchido uma.
X – Assim, não pode ser considerado que o júri deu cumprimento ao método estabelecido para a seriação dos candidatos, facto que inquinou com o vício de forma a decisão final de seriação dos candidatos, sendo, consequentemente, anulável esta decisão dos termos do disposto no artigo 135º do CPA.” [cfr. fls. 115/127 dos autos].
A ré Universidade de Lisboa apresentou contra-alegações, nas quais concluiu pelo improvimento do recurso [cfr. fls. 139/147 dos autos].
Neste TCA Sul, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer, no qual sustenta que o recurso merece provimento [cfr. fls. 159/162 dos autos].
Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para julgamento.

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
O acórdão recorrido considerou assente a seguinte factualidade:
i. Em 15 de Janeiro de 2003, pelo ofício 53-21-90, dirigido ao Reitor da Universidade de Lisboa, a Presidente do Conselho Directivo da Faculdade de Letras, de acordo com proposta aprovada pelo Conselho Científico, propôs a abertura de concurso para provimento de 2 vagas de professor catedrático para o 2º Grupo A – Linguística Geral e Românica, proposta que foi autorizada por despacho do Vice-Reitor de 7 de Março de 2003, comunicado à proponente, a quem também se enviou o respectivo Edital para afixação – cfr. fls. 1 a 4 do processo instrutor.
ii. O Edital veio publicado, por extracto, sob o nºs 286/2003 [2ª série] no Diário da República – II Série, de 25 de Março de 2003 – cfr. fls. 5 do processo instrutor.
iii. Ao concurso, apresentaram-se os Doutores Ernesto ………………, João ………..s, Maria ………… e Maria ……………., que foram admitidos por despachos do Vice-Reitor da Universidade de Lisboa, proferidos em 19 de Maio de 2003 – cfr. fls. 6 a 9, do processo instrutor.
iv. Em 22 de Julho de 2003, pelo ofício 53-21-768, a Presidente do Conselho Directivo da Faculdade de Letras propôs ao Reitor da Universidade de Lisboa a constituição do Júri do Concurso, proposta que veio a ser deferida por despacho do Vice-Reitor da Universidade de Lisboa, de 5 de Dezembro de 2003, publicado sob o nº 24.789/2003 [2ª série] no Diário da República - II Série, n.9 297, de 26 de Dezembro de 2003 – cfr. fls. 11 a 13, do processo instrutor.
v. Em 4 de Fevereiro de 2004, teve lugar a primeira reunião do Júri, na qual estiveram presentes todos os seus membros, à excepção do vogal Professor Ataliba …………., que justificou a falta – cfr. acta da primeira reunião do Júri, a fls. 14-16, do processo instrutor.
vi. Nessa reunião, o Júri deliberou, por unanimidade, admitir ao concurso todos os candidatos, deliberando-se, ainda "que não seriam designados relatores específicos para cada candidato, devendo cada membro do júri apreciar o curriculum e os trabalhos publicados por cada candidato e apresentar, na próxima reunião, uma proposta de ordenação dos mesmos, devidamente fundamentada, a qual será objecto de debate" – cfr. acta da primeira reunião do Júri, a fls. 14-16, do processo instrutor.
vii. Do processo instrutor constam fichas contendo a votação nominal dos membros do júri – cfr. fls. 17 a 43, do processo instrutor.
viii. O vogal Doutor Atalaiba ……………., apresentou proposta de ordenação dos candidatos, que consta das respectivas fichas de votação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 18, 24, 31 e 37, do processo instrutor.
ix. Em 28 de Abril de 2004, o Júri reuniu, lendo-se na respectiva acta da reunião, designadamente o seguinte:
Presidiu o Vice-Reitor, Professor Doutor João ……….., por delegação do Reitor, e estiveram presentes os vogais, Professores Doutores Jorge ………… e Clarinda ………., da Universidade de Coimbra, Fernanda …………., da Universidade do Porto, Ataliba …………, da Universidade de São Paulo – Brasil, João ………., Maria ………. e Ivo …………., da Universidade de Lisboa.
[...]
Aberta a sessão e verificada a existência de quorum, o Presidente do Júri, recordou a metodologia aprovada na reunião anterior e que se baseou na não designação de relatores específicos para cada candidato, devendo cada membro do júri apreciar, nesta reunião, o mérito relativo dos candidatos fundamentado no mérito científico-pedagógico do currículo e dos trabalhos publicados, e apresentar uma proposta de ordenação, fundamentada.
De seguida, conforme preceitua o número dois do artigo quadragésimo nono do Estatuto da Carreira Docente, passaram de imediato todos os membros do júri a efectuar a apreciação do mérito científico-pedagógico do currículo dos candidatos, tendo sido estabelecido debate sobre essa apreciação.
No âmbito dessa apreciação, os vogais leram os documentos que elaboraram com a fundamentação da ordenação proposta, os quais ficaram a constituir parte integrante da presente acta com os seguintes registos: Doutor Ivo ………… e Maria ………, registo 1/92; Doutor João …………, registo 2/92; Doutora Fernanda ………….. e Doutora Clarinda …………… registos 3/92 e 4/92; Doutor Jorge …………….., registo 5/92.
Seguidamente, o júri passou a um período de reflexão sobre as apreciações apresentadas, tendo o Presidente, após questionar sobre a necessidade de qualquer esclarecimento suplementar, anunciado que, nos termos do disposto no artigo 49º do Estatuto da Carreira Docente Universitária, se iria proceder, à votação para cada um dos lugares a ordenar, seguindo-se o método da maioria absoluta de votos, não participando na votação o candidato já nomeado para o lugar anterior. Em caso de não ser obtida aquela maioria, proceder-se-á à repetição da votação. Nos termos legais, cada membro de júri deverá apor no documento de votação a justificação da sua proposta de ordenação.
Assim, procedeu-se à votação, com o seguinte resultado:
Para o 1º lugar: Maria ………….. – cinco votos; João …………. – dois votos.
Para o 2º lugar: João ………………… – sete votos.
Para o 3º lugar: Maria Elisabete ………… – quatro votos; Ernesto ………………– três votos.
Para o 4º lugar: Ernesto …………….. – sete votos.
Perante estes resultados, os candidatos ficaram ordenados do seguinte modo:
1º lugar: Maria …………………, por maioria;
2º lugar: João …………………….., por unanimidade;
3º lugar: Maria Elisabete ………………, por maioria.
4º lugar: Ernesto …………………, por unanimidade, face ao método de votação.
Os documentos respeitantes à votação para cada um dos lugares, elaborados nos termos do artigo 49º do Estatuto da Carreira Docente Universitária passaram a ser parte integrante do processo de concurso, onde ficaram registados com os números de 6/92 a 33/92.
O conjunto das votações ficou sintetizado num mapa que, igualmente passou a constituir parte integrante do processo de concurso, sob o número 34/92.
Em consequência, o Júri procedeu à elaboração do Relatório Final a que se refere o artigo cinquenta e dois do Estatuto da Carreira Docente Universitária, que fica arquivado no processo.
Por fim, nos termos do artigo centésimo e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, antes de ser tomada a decisão final, o Júri mandou proceder à audiência prévia escrita de todos os candidatos, informando-os sobre o sentido provável daquela deliberação, para, no prazo de dez dias úteis, a contar da recepção da respectiva notificação, dizerem o que lhes oferecer, por escrito.” – cfr. fls. 50 a 33, do processo instrutor.
x. O documento contendo a declaração de voto do Professor Doutor Ivo ………, integralmente subscrito pela Professora Doutora Isabel …………, tem o seguinte teor:
Concurso documental para preenchimento de duas vagas de Prof. Catedrático do Dep. Linguística Geral e Românica da FLUL [2004]
Reunião de 28 de Abril de 2004
Todos os candidatos apresentam currículos de grande categoria e merecem aprovação no mérito absoluto. O DLGR deve orgulhar-se de os contar entre os seus docentes.
O exame das candidaturas, feito tanto na perspectiva da qualidade científica das suas realizações como na da sua actividade de professores universitários e agentes culturais, revela pontos de excelência em todos, por vezes em posição de equilíbrio, e não é decisivo para resolver o concurso.
Para fazer a destrinça a que sou obrigado, guio-me pela manifestação nos diferentes candidatos de algumas preocupações que reputo essenciais na ordem científica e pedagógica, esperando que elas continuem a marcar a acção dos futuros titulares das vagas.
A primeira é a aposta na vital idade do Departamento a que todos pertencemos, contribuindo para que ele tenha um papel importante na estrutura global da Faculdade, na promoção do conhecimento científico e na formação das novas gerações de cientistas.
Reconheço esta preocupação em todos os candidatos, mas especialmente em Inês ……….., João …….. e Elisabete ………..
A segunda é a preocupação de que o conhecimento científico que todos geramos e devemos transmitir seja vazado em formas que revelem acessivelmente a sua utilidade para melhorar a sociedade, p ex. no ensino de línguas e na área da normativa. Nesse esforço de combinar a investigação com a sua aplicação e respectiva comunicação, demonstrando a sua relevância social, Inês ……….e e João ………. têm-se empenhado com particular êxito.
Para distinguir entre os dois, parece-me que o método quantitativo fornece uma ligeira vantagem a Inês Duarte, na área da Post-graduação [ensino, orientações, participação em júris], na participação em reuniões científicas e nas publicações.
Sendo assim, serio os candidatos pela seguinte ordem: 1. Inês ……..; 2. João ……; 3. Elisabete …….; 4. Ernesto ………..” – cfr. fls. 44 do processo instrutor.
xi. O documento contendo a declaração de voto do Professor Doutor João ……………., tem o seguinte teor:
[...]
Considerando, cumulativamente, para cada candidato, no âmbito da respectiva actividade científica, a dimensão e coerência da obra científica, a capacidade de direcção e gestão científica, a dimensão da actividade produzida e bem assim a relação qualidade/quantidade;
Considerando ainda, cumulativamente, para cada candidato, a variedade de leccionação graduada e pós-graduada, a capacidade de formação de novos investigadores, a actividade fora da sua universidade, a qualidade do ensino ministrado e a sua capacidade de adaptação a novos tempos;
Proponho a seguinte ordenação:
1º - Doutor João ……………..;
2º - Doutora Maria Inês ……………………;
3º - Ernesto ………………….;
4º- Maria Elisabete ………………..
[...].” – cfr. fls. 45 do processo instrutor.
xii. O documento contendo a declaração de voto da Professora Doutora Fernanda ……………., integralmente subscrito pela Professora Doutora Clarinda………………, tem o seguinte teor:
Seriação dos candidatos ao Concurso para Professor Catedrático do 2º Grupo – A [Linguística Geral e Românica] da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa:
1º - Maria Inês ………………..
2º - João ……………………..
3º - Maria Elisabete ……………………
4º - Ernesto ……………………….
Justificação
Embora todos os candidatos possuam as qualidades necessárias para aceder ao lugar de Professor Catedrático, só dois podem ser providos nesse lugar, o que torna particularmente difícil proceder à sua seriação. Consciente desta dificuldade, fiz uma análise ponderada dos elementos de avaliação disponíveis, tomando em conta os parâmetros que a seguir enumero:
· qualidade, relevância e variedade temática dos trabalhos publicados;
· leccionação, elaboração e coordenação de Programas de disciplinas e de cursos de graduação e pós-graduação;
· capacidade de coordenação e gestão de actividades científicas e científico-pedagógicas;
· coordenação e participação de/em Projectos de investigação nacionais e internacionais;
· organização e participação de/em Encontros Científicos nacionais e internacionais;
· orientação de dissertações de mestrado e de doutoramento;
· arguição de dissertações e outras participações em júris académicos;
· iniciativas/acções de interesse geral no âmbito da política científica e pedagógica da instituição;
· organização e participação de/em acções de formação contínua ou outras acções de extensão universitária com interesse relevante para a Comunidade.
Baseei a seriação acima indicada na consideração parcelar de cada um destes critérios e numa subsequente avaliação global do maior ou menor grau em que cada um dos candidatos apresenta uma conjugação equilibrada e fecunda das vertentes que devem estar presentes de modo inseparável na actividade do professor universitário: a investigação, a docência e a extensão universitária.
Nas vertentes científica e pedagógica, considerei relevante tomar em conta não só a quantidade e qualidade dos resultados da actividade dos candidatos, mas também o modo como essa actividade tem sido explícita e conscientemente dirigida para a formação e orientação de novos investigadores e docentes-investigadores.
Nos âmbitos científico e de extensão universitária, valorizei a dimensão da internacionalização, que é hoje uma condição imprescindível de prestígio e até de sobrevivência da universidade. Mas não deixei de considerar igualmente importante a capacidade de intervenção esclarecida e empenhada no âmbito nacional, nomeadamente em áreas de interesse público em que se impõe um investimento crítico dos universitários, contribuindo para a resolução de problemas que se situem na esfera de aplicabilidade do seu domínio de investigação científica.” – cfr. fls. 46-47 do processo instrutor.
xiii. O documento contendo a declaração de voto do Professor Doutor Jorge ……………., tem o seguinte teor:
Concurso para o provimento de dois lugares de professor catedrático do 2º Grupo A [Linguística Geral e Românica]
Proposta justificada de ordenação das candidaturas
De acordo com os critérios aplicáveis, admito que, em mérito absoluto, qualquer um dos candidatos reuniria as condições necessárias e suficientes para ser provido num lugar de professor catedrático. No entanto, dado serem quatro os candidatos e apenas duas as vagas, considero que dois deles, os doutores João ……….. e Ernesto …………, se destacam dos restantes pelas razões que passo a apontar.
O doutor Andrade Peres apresenta, além de considerável número de artigos próprios e outros em colaboração, vários livros publicados. Noto o facto de grande parte dos seus trabalhos, todos de excelente qualidade, haver sido editada em revistas de renome ou por editoras de elevado prestígio internacional. Observo, por outro lado, a diversidade dos seus interesses científicos, a qual, embora centrada na semântica, não descura áreas como a sintaxe, as organizações discursivas, a tradução ou o ensino e aprendizagem da língua, domínio este onde se salienta o seu tão útil livro, que se tomou referencial, Áreas Críticas da Língua Portuguesa.
O doutor Ernesto ……….e, igualmente com muitos artigos e quatro livros publicados, um destes em colaboração com Maria ………… na Oxford University Press e alguns daqueles em livros conjuntos editados no estrangeiro, revela considerável leque de interesses científicos, que, passando pela linguística computacional e pela lexicografia, vão da área da fonologia à da crioulística, domínio onde se revela hoje um dos raros especialistas portugueses.
Quanto às duas outras candidatas, os respectivos currículos assemelham-se em vários aspectos: idêntico número de artigos publicados, temáticas restritas e repetitivas. A doutora Elisabete Ranchhod tem a tese de doutoramento editada, contrariamente à doutora Inês Duarte, que, embora autora de vários capítulos de uma gramática, não conta com qualquer livro próprio na sua bibliografia. Por outro lado, enquanto a maioria dos trabalhos da primeira destas duas candidatas é de autoria única e foi editada em publicações de prestígio internacional, a da segunda foi produzida em colaboração e editada em publicações de menor relevo, portuguesas ou estrangeiras.
Nestas condições, é a seguinte a minha proposta de ordenação das candidaturas:
1º doutor João …………; 2º doutor Ernesto ………..; 3º doutora Maria Elisabete ……………; 4º doutora Maria Inés ……….” – cfr. fls. 48 do processo instrutor.
xiv. Em 28 de Abril de 2004, o Júri elaborou Relatório final, “nos termos e para os efeitos dos nºs 2 e 3 do artigo 52º do Estatuto da Carreira Docente Universitária”, no qual “deliberou, por unanimidade e maioria propor a nomeação dos Doutores Maria Inês …………….. e João …………. para as vagas propostas a concurso.” – cfr. fls. 49 do processo instrutor.
xv. Em 25 de Maio de 2004, foi emitido pelos serviços da ré o ofício nº 5434, através do qual foi comunicado ao autor ter dez dias para se pronunciar em sede de audiência prévia – cfr. fls. 54 do processo instrutor.
xvi. Em 9 de Junho de 2004, deu entrada nos serviços da ré uma reclamação escrita do autor, apresentada em sede de audiência prévia, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e na qual sustenta que o júri não assentou nos elementos de facto a ponderar na valoração do currículo dos candidatos, que apenas sete dos quatro membros apresentaram justificações de ordenação, que apenas uma das fundamentações se revela fundamentada de forma clara e objectiva, sendo as restantes obscuras e inexactas, e que as justificações de ordenação propostas inicialmente não podiam ser utilizadas para fundamentar as ordenações finais – cfr. fls. 56-63 do processo instrutor.
xvii. Em 8 de Julho de 2004, a Professor Doutora Isabel …………… redigiu uma declaração de voto, com o seguinte teor:
Tendo sido convocada para a reunião do júri do concurso para provimento de dois lugares de Professor Catedrático do 2º Grupo A [Linguística Geral e Românica], da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa que terá lugar no dia 19 de Julho de 2004, pelas 15.00 horas, e na impossibilidade de comparecer nessa mesma data, solicito a V. Exª, presidente do júri em referência, bem como aos restantes membros do júri, que aceitem esta declaração como expressão da minha posição relativamente ao resultado do concurso e como fundamentação explícita desta mesma posição, em sequência da reclamação apresentada pelo candidato Ernesto da Silva de Andrade Pardal de que tive conhecimento a 18 de Junho passado.
DECLARAÇÃO
Confirmo a justificação de ordenação dos quatro candidatos que subscrevi [1º - Maria Inês …………………; 2º - João ……………; 3º - Maria Elisabete ……………; 4º - Ernesto ………….] e mantenho que a todos reconheço mérito para serem providos em lugares de Professor Catedrático. Todos os candidatos foram, em 2001, positivamente avaliados por júris de especialistas das respectivas provas de Agregação, todos eles são, de há muito, docentes e investigadores, nacional e internacionalmente reconhecidos nas suas áreas de acção, que honram o Departamento de Linguística Geral e Românica, a Faculdade de Letras e a Universidade de Lisboa.
Relativamente aos fundamentos que me levaram à ordenação do candidato Ernesto …………. em último lugar, passarei de seguida a enunciá-los, tomando como ponto de partida o Curriculum Vitae por ele apresentado. Faço-o de modo a que o candidato compreenda que me abstive inicialmente de os explicitar porque me pareceu, então como agora, que o carácter negativo dos mesmos em nada favorece a apreciação geral do candidato, pelo que a omissão assinalada por Ernesto …………….. [cfr. pontos 8, 13, 14, 15, 16 e 17 da reclamação] em nada se deve à ausência de fundamentos, mas antes à convicção de que alguns desses factores, uma vez explicitados, resultam numa marcada desvalorização do candidato.
Assim:
1. Na parte relativa à 'BIOGRAFIA', o CV de Ernesto ……………. é omisso quanto aos intervalos de tempo em que o candidato efectivamente ocupou vários dos cargos que menciona. Tratando-se de um docente com cerca de trinta anos de serviço na FLUL, não se percebe a razão que o leva a datar apenas duas das suas actividades. Nos restantes CV’s dos candidatos submetidos a concurso, tais informações são fornecidas.
2. Na parte relativa à 'ACTIVIDADE UNIVERSITÁRIA', nomeadamente no que toca ao ensino na FLUL [desde 1974-1975 até ao presente], o CV de Ernesto ………….. é omisso relativamente aos intervalos de tempo em que o candidato efectivamente leccionou e/ou regeu as cadeiras que menciona [cfr. CV 1.2]. Nos restantes CV’s dos candidatos submetidos a concurso, tais informações encontram-se disponíveis.
3. Igualmente se desconhecem os conteúdos dos cursos e a duração das visitas a outras universidades [cfr. CV 1.3, Ensino em outras instituições, depois de 1975].
4. O candidato Ernesto ………………… não participou em júris de Mestrado após 2000 [cfr. CV 1.4.1]. Só no período de 2001 a 2003, Inês Duarte participou em 6 [5 como arguente], João Peres participou em 2 [sempre como arguente] e Elisabete Ranchhod participou em 1.
5. O candidato Ernesto …………….. não participou em júris de doutoramento após 2001 [cfr. CV 1.4.2], sendo dois dos três júris em que participou nesse ano relativos a provas de doutorandos que orientou. Para o mesmo período, 2001-2003, Inês ……….. participou em 2 [1 como arguente principal] e Elisabete …………… participou em 1 [como orientadora e arguente].
6. O candidato não participou em júris de outras provas académicas, desde 1999 [cfr. CV 1.4.3, 1.4.4].
6. Ao longo da sua vida académica na FLUL, 1975-2003, o candidato Ernesto ……………. apenas orientou 3 dissertações de Mestrado, datando de 1997 a sua última orientação neste grau [cfr. CV 1.4.6.1]. Ao longo dos respectivos percursos académicos, Inês …………. orientou 17 [5 em co-orientação], João ……… orientou 8 [1 em co-orientação] e Elisabete …………. orientou 11 [7 em co-orientação].
8. Também ao longo de toda a sua vida académica na FLUL, 1975-2003, o candidato Ernesto ………….. apenas orientou 2 dissertações de Doutoramento, ambas defendidas em 2001 [cfr. CV 1.4.6.2]. Nos respectivos percursos, Inês ………. orientou 7 [2 em co-orientação], João ……. orientou 5 [1 em co-orientação] e Elisabete …………..orientou 5 [2 em co-orientação].
9. Embora o candidato Ernesto …………………….. tenha desenvolvido investigação de reconhecido mérito na sua área, nunca assumiu funções de Investigador Responsável de projectos de investigação [cfr. CV 2.1]. Todos os outros candidatos assumiram, por várias vezes, essas funções, em projectos nacionais e internacionais.
10. O candidato Ernesto ……………………. integrou diversas comissões científicas de organização de eventos nacionais e internacionais, sendo de destacar que, desde 2001, fez parte de 5 destas comissões [cfr. CV 2.2.1]. Para o mesmo período, 2001-2003, registamos que Inês …………..integrou 5 comissões, João ………….. 3 e Elisabete ……….. 7.
11. Desde 2001 [inclusive], o candidato participou em 4 encontros científicos tendo, em três, apresentado comunicação [cfr. CV 2.2.2]. No mesmo período, Inês ……..participou em 17, João ……….. em 4 e Elizabete ………….em 5.
12. Relativamente a 'PUBLICAÇÕES', verificamos que o último artigo publicado de Ernesto de Andrade data de 2001 e que as suas últimas publicações em livro datam de 2000, sendo de destacar a colaboração com Maria ………… na obra The Phonology of Portuguese, publicada na Oxford University Press. Contudo, os restantes candidatos também registam publicações importantes e em maior número. Só entre 2001 e 2003, Inês ……… publicou 10 artigos e 9 capítulos de livro, João ………publicou 3 artigos e Elisabete …….. organizou 2 livros e publicou 3 capítulos de livro e 6 artigos.
Com base nestes factos, mas também em aspectos complementares que são focados nos CV’s dos restantes candidatos mas que não se encontram contemplados no CV de Ernesto ……………… [aspectos esses que fornecem ao júri uma perspectiva mais alargada da forma como cada um dos candidatos combina a investigação que desenvolve com a sua aplicação e comunicação, e também como articula a docência com as restantes actividades científicas e administrativas na Faculdade em que ensina], julgo suficiente e explicitamente justificada a atribuição do quarto lugar no concurso em referência ao candidato Ernesto …………...” – cfr. fls. 70-73 do processo instrutor.
xviii. Em 9 de Julho de 2004, foi emitida pelos serviços da ré a Informação nº 671/AJ, tendo por assunto “, argumentando-se que nenhuma norma reguladora dos concursos para professor catedrático prevê a divulgação antecipada dos critérios e métodos objectivos de selecção, e que tal seria impossível uma vez que os júris apenas são propostos e nomeados em momento posterior ao da abertura do concurso e a lei apenas impõe que na primeira reunião admitam ou excluam os candidatos e por outro lado, que a fundamentação é um conceito relativo que varia em função do tipo de acto a considerar e que no caso o que se passa é que o reclamante não concorda com a ordenação final, concluindo-se que a reclamação não tem fundamento, sem embargo de alguns vogais do júri poderem explicitar melhor as suas razões e se repetir o debate – cfr. fls. 64-69 do processo instrutor.
xix. Em 19 de Julho de 2004, foi exarado sobre a Informação referida no ponto anterior despacho com o seguinte teor:
Concordo.
Faça anexar ao processo de concurso.
assinatura ilegível
19.07.04” – cfr. fls. 64 do processo instrutor.
xx. Em 19 de Julho de 2004, o Júri reuniu, lendo-se na respectiva acta da reunião, designadamente o seguinte:
[...]
Aberta a sessão e verificada a existência de quorum, o Presidente do Júri informou que a grelha de ordenação [Doc. 34/92] elaborada na reunião realizada em 28-4-04, tinha um erro de forma que consistiu na troca da atribuição dos votos dos vogais Ivo ………… e Jorge ………. a respeito da votação do candidato a ordenar em primeiro lugar. Dada a explicação, foi a dita grelha rectificada, tendo-lhe sido atribuído o mesmo número de registo.
De seguida o Presidente do Júri comprovou que todos os vogais haviam recebido, em simultâneo com a convocatória para a presente reunião, cópia da reclamação já referida.
O Presidente do Júri leu o Parecer 34/AJ/04 da Assessoria Jurídica, sobre aquela reclamação.
Convidou, de seguida, cada vogal a pronunciar-se sobre a reclamação em análise, tendo sido feitas, por cada um, as considerações que entenderam como adequadas.
Concluída a análise da reclamação e após as intervenções de cada membro, o júri deliberou, por unanimidade, ratificar a proposta de nomeação dos Doutores Maria Inês ………………. e João ………………… para as vagas postas a concurso, deliberação provisória tomada na reunião de júri realizada em 28-4-2004, que assim se converte em definitiva.
Em consequência, o Júri procedeu à elaboração do Relatório Final a que se refere o artigo cinquenta e dois do Estatuto da Carreira Docente Universitária, que fica arquivado no processo.
[...].” – cfr. fls. 75-77 do processo instrutor.
xxi. Em 19 de Julho de 2004, o Júri elaborou Relatório final, “nos termos e para os efeitos dos nºs 2 e 3 do artigo 52º do Estatuto da Carreira Docente Universitária”, no qual “deliberou, por unanimidade, ratificar a proposta de nomeação dos Doutores Maria Inês ……………… e João ………………….. para as vagas propostas a concurso.” – cfr. fls. 74 do processo instrutor.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Como se viu, o acórdão recorrido julgou improcedente a acção administrativa especial intentada pelo autor, e ora recorrente, e manteve o relatório final do júri do concurso para provimento de duas vagas de professor catedrático para o 2º Grupo A – Linguística Geral e Românica.
De acordo com a conclusão A) da alegação do recorrente, as razões da sua discordância face ao decidido resumem-se aos seguintes dois aspectos fundamentais:
a) Ter entendido que não era necessário ao júri estabelecer critérios objectivos para seriação dos candidatos;
b) Ter considerado que a seriação dos candidatos foi efectuada com base numa fundamentação clara e objectiva.
São, pois, estas as questões a apreciar no presente recurso jurisdicional, e que se reconduzem, no fundo, a determinar se nos concursos para professor catedrático [a que se aplica o Estatuto da Carreira Docente Universitária, aprovado pelo DL nº 448/79, de 13/11, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei nº 19/80, de 16/7] são aplicáveis as garantias gerais que constam do artigo 5º, nº 2 do DL nº 204/98, de 11/7.
Vejamos, pois.
De acordo com o disposto no artigo 37º do ECDU, aprovado pela Lei nº 19/80, de 16/7, “os concursos documentais para recrutamento de professores catedráticos e associados são abertos para uma disciplina ou grupo de disciplinas, segundo a orgânica e as vagas existentes nos quadros de cada escola ou departamento”, esclarecendo o artigo 38º que tais concursos “destinam-se a averiguar o mérito da obra científica dos candidatos, a sua capacidade de investigação e o valor da actividade pedagógica já desenvolvida”.
Dada a sua natureza, os concursos para recrutamento de professores catedráticos obedecem a regras especiais, que divergem dos restantes concursos.
Assim, como decorre do artigo 47º do ECDU, há lugar à apreciação prévia dos elementos curriculares dos candidatos, com o envio a cada um dos membros do júri, logo que publicada no Diário da República a sua constituição, dum exemplar do curriculum vitae de cada um dos candidatos [cfr. nº 1], facultando-se ainda para exame dos membros do júri exemplares ou fotocópias de todos os trabalhos apresentados pelos candidatos [cfr. nº 2].
Após a sua constituição, o júri reúne nos trinta dias imediatos ao da publicação em DR, a fim de analisar e discutir a admissão dos candidatos, podendo, desde logo, proceder-se à exclusão daqueles cujo currículo global o júri entenda não revestir nível científico ou pedagógico compatível com a categoria a que concorrem ou não se situe na área da disciplina ou grupo de disciplinas para que foi aberto o concurso [cfr. artigo 48º, nº 1 do ECDU], devendo em tal caso o júri elaborar um relatório justificativo, que será assinado por todos os seus membros e de cujo teor se dará conhecimento ao candidato excluído [cfr. nº 2].
Finalmente, de acordo com o disposto no artigo 49º, nº 1 do ECDU, “a ordenação dos candidatos no concurso para professores catedráticos terá por fundamento o mérito científico e pedagógico do curriculum vitae de cada um deles”, norma que se afigura ser aparentemente contraditória com a constante o artigo 38º do ECDU, que dispõe que os concursos para professor catedrático se “destinam a averiguar o mérito da obra científica dos candidatos, a sua capacidade de investigação e o valor da actividade pedagógica já desenvolvida”. Ou seja, embora aqueles concursos se destinem a averiguar três parâmetros da actividade dos concorrentes – mérito da obra científica dos candidatos, a sua capacidade de investigação e o valor da actividade pedagógica já desenvolvida –, na respectiva ordenação apenas se atenderá ao mérito científico e pedagógico do curriculum vitae de cada um deles, ficando de fora a apreciação da capacidade de investigação dos concorrentes.
Muito depois da entrada em vigor do ECDU, o DL nº 204/98, de 11/7, veio estabelecer e regulamentar o regime dos concursos de recrutamento e selecção de pessoal para os quadros da Administração Pública.
Nos termos do artigo 2º deste diploma, o regime nele estabelecido aplica-se aos serviços e organismos da administração central, bem como aos institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos [cfr. nº 1] e, com as necessárias adaptações, à administração local e à administração regional, sem prejuízo da competência dos órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas [cfr. nº 2], não podendo as especialidades “ter como efeito o afastamento dos princípios e garantias consagrados no artigo 5º” [cfr. nº 3].
Embora o artigo 3º do DL nº 204/98 estabeleça que “os regimes de recrutamento e selecção de pessoal dos corpos especiais e das carreiras de regime especial podem obedecer a processo de concurso próprio com respeito pelos princípios e garantias consagrados no artigo 5º” [cfr. nº 2], o seu nº 3 excepciona que se mantêm “os regimes de recrutamento e selecção de pessoal aplicáveis aos corpos especiais e às carreiras de regime especial que deles disponham”.
Como é sabido, as carreiras docentes constituem “corpos especiais” [cfr. artigos 13º, nº 3 do DL nº 248/85, de 15/7, e 16º, nº 2, alínea d) do DL nº 184/89, de 2/6], pelo que a situação dos autos se enquadra neste artigo 3º, pelo que ao concurso em causa era aplicável o regime de recrutamento previsto no ECDU, embora sem prejuízo da aplicação dos princípios e garantias consagrados no artigo 5º do DL nº 204/98.
Ora, esses princípios e garantias são os seguintes:
1 – O concurso obedece aos princípios de liberdade de candidatura, de igualdade de condições e de igualdade de oportunidades para todos os candidatos.
2 – Para respeito dos princípios referidos no número anterior, são garantidos:
a) A neutralidade da composição do júri;
b) A divulgação atempada dos métodos de selecção a utilizar, do programa das provas de conhecimentos e do sistema de classificação final;
c) A aplicação de métodos e critérios objectivos de avaliação;
d) O direito de recurso”.
É por demais evidente que no concurso a que se reportam os autos os referidos princípios foram totalmente postergados, nomeadamente os princípios da imparcialidade e da igualdade de oportunidades, na medida em que o júri omitiu totalmente a definição, antes da apreciação do mérito dos candidatos, do sistema de classificação final.
O artigo 3º do DL nº 204/98, ao estabelecer que “os regimes de recrutamento e selecção de pessoal dos corpos especiais e das carreiras de regime especial podem obedecer a processo de concurso próprio com respeito pelos princípios e garantias consagrados no artigo 5º”, contém uma resposta legislativa expressa para a questão que é objecto do presente recurso jurisdicional, no sentido da aplicação global destes princípios e garantias, inclusivamente, por isso, a divulgação atempada do sistema de classificação final.
Por outro lado, pela repetição da ressalva da aplicação destes princípios e garantias, que se surpreende no nº 3 do artigo 2º e no nº 2 do artigo 3º, conclui-se que houve uma especial preocupação legislativa em generalizar essa aplicação, não se admitindo excepções, mesmo nas situações em que se admite que os concursos possam ser submetidos a regimes especiais.
Como se refere no acórdão do Pleno do STA, de 13-11-2007, processo nº 01140/06, “num Estado de Direito, assente na soberania popular e no primado da Lei [artigos 2º e 3º, nºs 1 e 2, da CRP], na sua aplicação aos casos concretos têm de ser acatados os juízos de valor legislativamente formulados, quando não ofendam normas de hierarquia superior nem se demonstre violação de limitações legais de carácter geral [abuso do direito], não podendo o intérprete sobrepor à ponderação legislativa os seus próprios juízos sobre o que pensa que deveria ser regime legal, mesmo que os considere mais adequados e equilibrados que os emanados dos órgãos de soberania com competência legislativa”.
Deste modo, perante uma tão explícita intenção legislativa de não admitir excepções à aplicação daqueles princípios e garantias, não pode encontrar-se suporte, a nível da lei ordinária, para uma interpretação restritiva que afaste a sua aplicação aos concursos regulados no ECDU.
Por isso, só com fundamento em violação de norma de hierarquia superior, designadamente de natureza constitucional, poderá aventar-se a possibilidade de afastar a aplicação daqueles princípios e garantias aos concursos para professores catedráticos.
No caso presente, só com a aplicação de métodos e critérios objectivos de avaliação, seria possível garantir transparência ao recrutamento, sendo o mínimo exigível como forma de assegurar que os critérios que virão a ser utilizados para a seriação dos candidatos não são adaptados em função do perfil curricular dos candidatos, por forma a permitir beneficiar ou prejudicar algum deles, tratando-se de uma regra que é corolário do princípio constitucional da imparcialidade, cuja observância é constitucionalmente imposta à generalidade da actividade da Administração Pública [cfr. artigos 266º, nº 2 da CRP e 6º do CPA].
Ou, dito de outro modo, aquela regra corresponde ao mínimo exigível para garantir a observância do princípio da igualdade de oportunidades, proclamado no nº 1 do artigo 5º do DL nº 204/98, pelo que a sua adopção na generalidade dos concursos é postulada pela própria essência do Estado de Direito, como patenteia a repetida preocupação constitucional em afirmar esse princípio explicitamente, em várias matérias [cfr. artigos 59º, nº 2, alínea b), 73º, nº 2, 74º, nºs 1 e 2, alínea h), 76º, nº 1, 81º, alínea b), e 113º, nº 3, alínea b), todos da CRP].
Por outro lado, em qualquer concurso de recrutamento de pessoal em que haja mais que um candidato, como o demonstra ser o caso dos autos, haverá necessidade, inclusivamente para cumprimento da exigência constitucional de fundamentação, de aplicar, implícita ou explicitamente, algum sistema de classificação, pelo que não se pode justificar uma excepção à aplicação daquelas regras do artigo 5º do DL nº 204/98 com base na alegada dificuldade de determinação antecipada desses métodos e sistema, pois, antes ou depois do conhecimento do perfil dos candidatos, a dificuldade será idêntica.
Como salientou o acórdão do Pleno do STA, já citado, “a regra constitucional da autonomia das universidades de «autonomia estatutária, científica, pedagógica, administrativa e financeira» [artigo 76º, nº 2 da CRP], para além de não implicar a atribuição de poder incontrolável e arbitrário de escolha de docentes, não pode, no caso das universidades públicas, sobrepor-se à aplicação dos princípios básicos do Estado de Direito”.
No caso dos autos, essa deficiência na apreciação do mérito dos candidatos ficou patente na forma como o mérito da respectiva obra científica, a sua capacidade de investigação e o valor da actividade pedagógica já desenvolvida foram avaliados pelo júri: sem qualquer critério ou comparação crítica.
Isso mesmo o demonstram as “justificações” subscritas pelos membros do júri para fundamentar o posicionamento dos candidatos, que nada têm a ver com a finalidade do concurso – apreciação crítica do mérito relativo dos diversos candidatos –, evidenciada, após a pronúncia do recorrente em sede de audiência prévia, pela declaração subscrita pela Professora Isabel Hub Faria, membro do júri, constante de fls. 70/73 do processo instrutor apenso.
De tudo o que deixou dito, evidente se torna que a não aplicação de métodos e critérios objectivos de avaliação no concurso em causa, nomeadamente para a seriação dos candidatos, violou os princípios da imparcialidade e da igualdade de oportunidades, na medida em que impediu o júri de avaliar e comparar exactamente aquilo que lhe competia avaliar: o mérito da obra científica dos candidatos, a sua capacidade de investigação e o valor da actividade pedagógica já desenvolvida.
Procedem, deste modo, as conclusões da alegação do recorrente, pelo que o acórdão recorrido não pode manter-se.

IV. DECISÃO
Nestes termos e pelo exposto, acordam em conferência os juízes do 2º Juízo do TCA Sul em conceder provimento ao presente recurso jurisdicional, revogar o acórdão recorrido e, em consequência, julgar procedente a acção administrativa especial intentada pelo recorrente, anulando o concurso nos termos peticionados.
Custas a cargo da ré, na 1ª instância e neste TCA Sul.
Lisboa, 31 de Maio de 2012
[Rui Belfo Pereira – Relator]
[Paulo Gouveia]
[António Coelho da Cunha]