Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1500/21.4BELSB
Secção:JUIZ PRESIDENTE
Data do Acordão:04/19/2022
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:CONFLITO
INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL
TRÂNSITO EM JULGADO
Sumário:
Votação:DECISÃO SUMÁRIA
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: DECISÃO

I. Relatório

S …………………, residente em M……………., Algés, intentou no TAC de Lisboa a presente açcão administrativa de reconhecimento de direitos, de impugnação de atcos e de consequente condenação à prática dos actos administrativos devidos contra o Ministério do Ambiente e da Ação Climática, com sede em Lisboa, peticionando, a final o seguinte:

“A) Quanto ao direito à irredutibilidade da retribuição base e considerando que antes da regularização do vínculo a autora recebia, a título de retribuição, € 1.750,73 e considerando que, desde que foi formalizada a celebração do contrato de trabalho, a 01.04.2019, a mesma vem recebendo, a título de retribuição, € 1.205,08, que o tribunal:

a) não aplique os artigos 12.º e 13.º da Lei n.º 112/2017 e 9.º do Decreto-lei n.º 34/2018, interpretados no sentido de que os mesmos preveem a possibilidade de redução da retribuição da autora no seguimento do processo de integração na função pública por via do PREVPAP, na medida em que essa interpretação viola o princípio constitucional da tutela da confiança, extraído do artigo 2.º da CRP;

b) condene o réu a reconhecer o direito da autora de manter a retribuição que vinha auferindo até 31.03.2019 e que, consequentemente, a sua remuneração, também a partir de 01.04.2019, continua a assumir o montante de, pelo menos, € 1.750,73 (sem prejuízo de até ser superior face ao procedimento de reconstituição e de progressão na carreira e dos aumentos a que, entretanto, tenha direito a partir de 01.04.2019);

c) condene o réu a reconhecer que a quantia que a autora tem recebido, desde 01.04.2019, a título de suplemento remuneratório, consubstancia retribuição base e não suplemento remuneratório;

d) condene o réu a reconhecer que a autora mantém o direito à totalidade da retribuição (ou seja, ao valor de pelo menos € 2.025,35), não perdendo o valor que vem recebendo como suplemento remuneratório, caso opte, entretanto, por mudar de serviço, através do regime da mobilidade e deixe de exercer funções nos programas operacionais, temáticos e regionais, ou nos organismos intermédios;

e) declare a nulidade, ou (subsidiariamente) anule, a cláusula 5.ª do contrato de trabalho em funções públicas, por tempo indeterminado, celebrado a 01.04.2019, por violar o disposto nos artigos 13.º e 47.º, n.º 2, da CRP e nos artigos 1.º e 13.º da Lei n.º 112/2017; e

f) condene o réu a pagar à autora a diferença entre os valores que a mesma tem recebido desde 01.04.2019 e as quantias que lhe são (ou venham a ser) devidas, considerando que a sua retribuição assume o montante de € 1.750,73;

Cumulativamente,

B) Quanto à posição e ao nível remuneratórios e face à inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 12.º e 13.º da Lei n.º 112/2017 e do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 34/2018, no sentido de que do restabelecimento do vínculo dos precários e da consequente reconstituição da carreira dos mesmos pode resultar a colocação dos trabalhadores precários numa posição remuneratória e num nível remuneratório inferior à posição remuneratória e ao nível remuneratório correspondente à remuneração que estes vinham recebendo até ao restabelecimento do vínculo, por violação do princípio da confiança previsto no artigo 2.º da CRP, que o tribunal:

a) não aplique os artigos 12.º e 13.º da Lei n.º 112/2017 e 9.º do Decreto-lei n.º 34/2018, interpretados no sentido de que, do restabelecimento do vínculo dos precários e da consequente reconstituição da carreira dos mesmos pode resultar a colocação dos trabalhadores precários numa posição remuneratória e num nível remuneratório inferior à posição remuneratória e ao nível remuneratório correspondente à retribuição que estes vinham recebendo até ao restabelecimento do vínculo, na medida em que essa interpretação viola o princípio constitucional da tutela da confiança, extraído do artigo 2.º da CRP;

b) condene o réu a reconhecer à autora o direito a ser colocada, com efeitos a 01.04.2019, na posição remuneratória e no nível remuneratório correspondente à posição remuneratória e ao nível remuneratório que detinha aquando do restabelecimento do vínculo que, no caso em concreto, se traduz na colocação na 4.ª posição remuneratória e entre os níveis remuneratórios 25 e 26, da Tabela de Remuneração Única da Administração Pública (sem prejuízo de, no seguimento do processo de reconstituição, ser colocada em posição remuneratória e/ou em nível remuneratório superior);

c) no seguimento da alínea anterior, condene o réu a colocar a autora, com efeitos a 01.04.2019, na posição remuneratória e no nível remuneratório correspondente à posição remuneratória e ao nível remuneratório que detinha aquando do restabelecimento do vínculo que, no caso em concreto, se traduz na colocação na 4.ª posição remuneratória e entre os níveis remuneratórios 25 e 26, da Tabela de Remuneração Única da Administração Pública (sem prejuízo de, no seguimento do processo de reconstituição, ser colocada em posição remuneratória e/ou em nível remuneratório superior);

Cumulativamente,

C) Quanto avaliação por ponderação curricular, que o tribunal:

a) condene o réu a reconhecer o direito da autora ao tratamento igualitário entre trabalhadores e o direito à efetiva reconstituição da carreira;

Cumulativamente com a alínea anterior,

b) declare nulo, ou (subsidiariamente) anule, o ato de homologação da avaliação de desempenho por ponderação curricular, bem como a decisão de indeferimento da respetiva reclamação, tal como o ato de indeferimento tácito do recurso hierárquico, por padecerem dos seguintes vícios:

i) vício de violação de lei, por violar os artigos 6.º, 7.º e 8.º do CPA (alínea a));

ii) falta de fundamentação (alínea b1));

iii) vício de violação de lei, por violar os artigos 6.º, 7.º e 8.º do CPA (alínea b2));

iv) vício de violação de lei, por violar os artigos 7.º e 8.º do CPA (alínea b3));

v) por erro nos pressupostos de facto ou, subsidiariamente, por vício de violação de lei (alínea c))

Cumulativamente com qualquer das alíneas anteriores,

c) declare nula, ou (subsidiariamente) anule, a decisão que consta da ata n.º 2 do CA (bem como as respetivas orientações da ADC):

- na parte referente à experiência profissional, quanto aos critérios definidos e respetiva valoração, por padecer do seguinte vício;

i) vício de violação de lei, por violar os artigos 6.º, 7.º e 8.º do CPA (alínea a));

- na parte referente à valorização curricular, quanto aos critérios definidos e respetiva valoração, por padecer dos seguintes vícios:

i) falta de fundamentação (alínea b1));

ii) vício de violação de lei, por violar os artigos 6.º, 7.º e 8.º do CPA (alínea b2));

Cumulativamente com qualquer das alíneas anteriores,

d) condene o réu a aprovar novos critérios de valoração do elemento de valorização curricular, designadamente, que respeitem os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da razoabilidade, nos termos supra expostos;

Cumulativamente com qualquer das alíneas anteriores,

e) condene o réu a efetuar nova avaliação por ponderação curricular à autora, que respeite a legislação em vigor, a qual terá de incidir, necessariamente, sobre os anos em que a autora exerceu funções destinadas a suprir necessidades permanentes da Administração, no caso, terá de respeitar aos anos de 2007 a 2018, tendo ainda de corrigir as ilegalidades referidas na alínea b), donde resultará, inevitavelmente, a atribuição de menção qualitativa de desempenho relevante (sem prejuízo da posterior ponderação, no termos previstos no artigo 51.º do SIADAP, para atribuição de excelente);

Em alternativa às alíneas e),

f) caso não se entenda no sentido de ser realizada uma nova avaliação por ponderação curricular, condene o réu a corrigir a avaliação efetuada, desde logo, nos itens de coordenação de grupos e de representação do serviço, terá de atribuir a pontuação prevista nos mesmos ou, subsidiariamente, desconsiderando a respetiva ponderação); no item da valoração curricular, atribuindo-se ao trabalhador no item em causa 5 pontos; e no item cargos dirigentes ou outros cargos de interesse publico ou social, atribuindo-se ao trabalhador no item em causa 5 pontos, donde resultará a atribuição de menção qualitativa de desempenho relevante, a qual (depois da apreciação prevista no artigo 51.º da Lei 66-B/2007, para a atribuição da atribuição da menção qualitativa de desempenho excelente) será replicada para os anos de 2007 a 2018;

Cumulativamente

D) Quanto aos pontos sobrantes, quer considerando a inconstitucionalidade da interpretação do artigo 13.º, n.º 1, da Lei n.º 112/2017, dos artigos 18.º, n.º 6, da LOE para 2018, 16.º, n.º 2, da LOE para 2019, e 17.º, n.º 2, da LOE para 2020, tal como dos artigos 156.º e seguinte da LGTFP, no sentido de que os pontos sobrantes e acumulados na reconstituição da carreira até 2018 não relevam para futuras alterações da posição da carreira, quer atendendo à simples ilegalidade da não consideração dos pontos sobrantes, por violação do disposto nos mesmos normativos supra referidos, que o tribunal:

a) não aplique o artigo 13.º da Lei n.º 112/2017, bem como os artigos 18.º, n.º 6, da LOE para 2018, 16.º, n.º 2, da LOE para 2019, e 17.º, n.º 2, da LOE para 2020, tal como os artigos 156.º e seguinte da LGTFP, interpretados no sentido de que os pontos sobrantes e acumulados na reconstituição da carreira até 2018 não relevam para futuras alterações da posição da carreira, na medida em que essa interpretação viola os princípios da igualdade de tratamento dos trabalhadores (artigo 13.º da CRP) e de acesso à função pública (artigo 47.º, n.º 2, da CRP);

b) declare nula, ou (subsidiariamente) anule, a deliberação da Comissão de Avaliação, de 15.09.2020, na parte em que subscreve a seguinte orientação da ADC: “se o trabalhador alterar o seu posicionamento remuneratório inicia-se uma nova contagem de pontos para efeitos de futura alteração de posicionamento remuneratório – os pontos eventualmente em excesso na conclusão deste processo extraordinário, deixam de relevar”, por padecer de vício de violação de lei, na medida em que viola os princípios da igualdade de tratamento entre trabalhadores (artigo 13.º da CRP) e de acesso à função pública (artigo 47.º, n.º 2, da CRP), o artigo 13.º, n.º 1, da Lei n.º 112/2017, os artigos 18.º, n.º 6, da LOE para 2018, 16.º, n.º 2, da LOE para 2019, e 17.º, n.º 2, da LOE para 2020, tal como os artigos 156.º e seguinte da LGTFP, declarando também nula, ou (subsidiariamente) anulando, com os mesmos fundamentos, a própria orientação da ADC;

c) condene o réu a reconhecer o direito da autora a que sejam considerados os pontos sobrantes acumulados até 31.12.2018, na subsequente alteração da posição remuneratória da autora após a efetivação da reconstituição da carreira, nos termos previstos no artigo 13.º, n.º 1, da Lei n.º 112/2017, nos artigos 18.º, n.º 6, da LOE para 2018, 16.º, n.º 2, da LOE para 2019, e 17.º, n.º 2, da LOE para 2020, nos artigos 156.º e seguinte da LGTFP, bem como atendendo aos princípios da igualdade de tratamento dos trabalhadores (artigo 13.º da CRP), e de acesso à função pública (artigo 47.º, n.º 2, da CRP);

d) condene o réu a considerar os pontos sobrantes do processo de reconstituição da carreira (e acumulados até 31.12.2018), na subsequente alteração da posição remuneratória da autora após a efetivação da reconstituição da carreira, nos termos previstos no artigo 13.º, n.º 1, da Lei n.º 112/2017, nos artigos 18.º, n.º 6, da LOE para 2018, 16.º, n.º 2, da LOE para 2019, e 17.º, n.º 2, da LOE para 2020, nos artigos 156.º e seguinte da LGTFP, bem como atendendo aos princípios da igualdade de tratamento dos trabalhadores (artigo 13.º da CRP), e de acesso à função pública (artigo 47.º, n.º 2, da CRP), refazendo as posteriores alterações do posicionamento (a partir de 01.01.2019) que entretanto tenham ocorrido, em conformidade.”

Por saneador-sentença de 24.01.2022, o Senhor Juiz do TAC de Lisboa suscitou oficiosamente a incompetência do tribunal, em razão do território, para conhecer da presente acção, declarando competente para o efeito o TAF de Sintra (Secção Administrativa).

A decisão foi notificada às partes em 25.01.2022 e os autos foram remetidos electronicamente ao TAF de Sintra, após trânsito, como havia sido ordenado.

Em 19.02.2022 a Autora fez chegar ao TAF de Sintra requerimento no qual sustenta que o Tribunal territorialmente competente para conhecer dos presentes autos é o TAC de Lisboa e que não interporia recurso da decisão para não onerar a parte.

Por despacho de 4.03.2022, a Senhora Juíza do juízo administrativo social do TAF de Sintra, secundando o entendimento sufragado pela Autora, ordenou a remessa dos autos ao Juiz do TAC de Lisboa que proferiu a decisão de 24.01.2022.

Já nesse tribunal, o Senhor Juiz exarou despacho em 14.03.2022, no qual defende, apoiado na jurisprudência que referenciou de uma forma extensa, que o saneador sentença proferido nestes autos decidiu de forma definitiva o tribunal territorialmente competente para a instrução e conhecimento da presente ação administrativa, dado que nenhuma das partes recorreu do mesmo e determinou a remessa dos autos ao juízo administrativo do TAF de Sintra.

Por despacho de 23.03.2022, a Exma. Senhora Juíza do TAF de Sintra, em divergência de entendimento com o TAC de Lisboa, entendendo que o objecto do presente litígio se insere na previsão do art. 19.º, n.º 3, do CPTA, veio oficiosamente suscitar junto deste TCAS, a resolução do conflito negativo de competência.



II. Fundamentação

II.1. De facto

Com relevo para a decisão emergem dos autos as seguintes ocorrências processuais:

1. S …………………., residente em M…….., Algés, intentou em 31.08.2021, no TAC de Lisboa, a presente açcão administrativa contra o MINISTÉRIO DO AMBIENTE E DA AÇÃO CLIMÁTICA, com sede em Lisboa.

2. Em 24.01.2022, o Senhor Juiz do TAC de Lisboa julgou-se territorialmente incompetente para conhecer da presente acção, declarando competente para o efeito o TAF de Sintra (Secção Administrativa).

3. A decisão foi notificada às partes em 25.01.2022 e os autos foram remetidos electronicamente ao TAF de Sintra, após trânsito.

4. Por despacho de 4.03.2022, a Senhora Juíza do juízo administrativo social do TAF de Sintra, determinou o seguinte: “devolvam-se os presentes autos ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, ao Mmo. Juiz Titular do processo e autor do saneador sentença de 24.01.2022”.

5. Já nesse tribunal, o Senhor Juiz exarou despacho em 14.03.2022 pelo qual determinou a remessa dos autos ao juízo administrativo do TAF de Sintra.

6. Por despacho de 23.03.2022, a Exma. Senhora Juíza do TAF de Sintra, em divergência de entendimento com o TAC de Lisboa, entendendo que o objecto do presente litígio se insere na previsão do art. 19.º, n.º 3, do CPTA, veio oficiosamente suscitar junto deste TCAS, a resolução do conflito negativo de competência.



II.2. De Direito

Dispõe o artigo 105.º, n.º 2, do CPC - o qual está inserido na Secção II (do Capítulo V, do Título IV, do Livro I), relativa à incompetência relativa, a qual abrange a infracção das regras de competência fundadas nomeadamente na divisão judicial do território (cfr. art. 102º) - que “[a] decisão transitada em julgado resolve definitivamente a questão da competência, mesmo que esta tenha sido oficiosamente suscitada.”

E no seu nº 4 estatui-se que: “[d]a decisão que aprecie a competência cabe reclamação, com efeito suspensivo, para o presidente da Relação respetiva, o qual decide definitivamente a questão”. Reclamação a apresentar no prazo geral supletivo para os actos processuais das partes que é de 10 dias (art. 29.º, n.º 1, do CPTA).

Dessas normas legais decorre que as decisões de incompetência em razão do território não são impugnáveis através de recurso, já que das mesmas cabe (necessariamente) reclamação para o presidente da Relação respectiva (in casu para o presidente do TCA respectivo) – neste sentido, i.a., Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Volume I, 2ª Ed., 2014, p. 128.

O que significa que, entende-se ser de referir, a Autora ao invés do que alega no seu requerimento de 19.02.2022 estava legalmente impedida de interpor recurso, pois se não se conformava com a decisão prolatada em 14.02.2022, ao ser dela notificada devia ter reagido reclamando para o presidente do TCAS, no prazo de 10 dias, conforme explicitado.

Dito isto, encontra-se assente que a decisão proferida no TAC de Lisboa em 14.02.2022 tinha transitado quando o processo foi remetido ao TAF de Sintra. Donde, deverá atender-se ao estatuído no artigo 625.º do CPC que dispõe do seguinte modo:

1- Havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumprir-se-á a que passou em julgado em primeiro lugar.

2- É aplicável o mesmo princípio à contradição existente entre duas decisões que, dentro do processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual.

Ou seja, o conflito verificado em sede de competência relativa deve ser resolvido de acordo com o princípio geral da prevalência do primeiro julgado, como decorre do artigo 105.º, n.º 2, conjugado com o artigo 625.º do CPC (neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STA de 23.11.2005, rec. n.º 1025/2005, de 30.11.2005, rec. n.º 895/2005 e n.º 974/2005, de 26.04.2012, rec. n.º 360/12, de 15.05.2012, rec. n.º 459/12, de 24.05.2012, rec. n.º 498/12, de 12.06.2012, rec. n.º 552/12, de 10.07.2012, rec. n.º 682/12 e de 29.05.2013, rec. n.º 786/13 e os Acórdãos do STJ de 02.07.1992, BMJ 419, p. 626, de 02.02.2000, P. 99S246, de 29.01.04, P.03B3747, de 17.02.2005, P. 253/05 e de 16.11.2005, Conflito nº2339/05).

No caso da competência territorial, se o tribunal onde for proposta a acção se considerar territorialmente incompetente, remete o processo para o tribunal competente, sendo a remessa vinculativa para este, como decorre do referido art. 105.º, n.ºs 2 e 3, do CPC. Donde, o segundo tribunal não é livre de apreciar a sua própria competência. De resto, o n.º 4 do art. 105.º do CPC apenas prevê que da decisão que aprecie a competência cabe reclamação; o que seguramente não é o caso.

Assim, o conflito – que verdadeiramente o não é - deve ser resolvido no sentido de que a decisão sobre competência territorial que primeiro transitou em julgado deve ser acatada pelo tribunal que aí foi declarado territorialmente competente, independentemente do mérito dessa decisão. Nos termos do n.º 2 daquele artigo 105.º do CPC, a decisão transitada quanto à competência territorial, resolvendo definitivamente a questão, deve ser acatada pelo tribunal ao qual aquela decisão atribuiu essa competência, não podendo este último, por isso, declarar-se incompetente em razão do território.

Como explica Miguel Teixeira de Sousa, em comentário a este artigo, “a procedência da excepção dilatória de incompetência relativa determina a remessa do processo para o tribunal competente (…). No tribunal remetido, não é possível voltar a discutir a competência relativa (n.º 2), ainda que com fundamento diverso do anteriormente apreciado e mesmo que a incompetência relativa tenha sido decretada no despacho saneador (art. 104.º, n.º 3). Em suma: o disposto no art. 595.º, n.º 3, é afastado pelo disposto no n.º 2. (c) Se, ainda assim, o tribunal remetido proferir uma decisão incompatível com a anterior, é esta que prevalece (art. 625.º, n.º 2). // (a) A decisão proferida sobre a competência relativa (só) pode ser impugnada através de reclamação para o presidente da Relação com competência na circunscrição territorial do tribunal de 1.ª instância” (in CPC ONLINE, art. 59.º a 114.º, Versão de 2021.04).

Como se vê, atento o quadro normativo de referência supra identificado, terá que concluir-se que o despacho da Exma. Juíza do TAF de Sintra resulta de um equívoco quanto aos seus poderes de cognição.

Face ao exposto, e sem necessidade de outros considerandos, terá que prevalecer a primeira decisão, por ser essa a decisão que transitou em primeiro lugar e resolveu definitivamente a questão.


III. Decisão

Termos em que, decidindo, declara-se o TAF de Sintra (secção administrativa) territorialmente competente para conhecer da presente acção, declarando-se, em consequência, inválida a decisão desse tribunal que recusou essa competência.

Sem tributação.

Notifique.

O Juiz Presidente do TCA Sul

Pedro Marchão Marques