Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2579/16.6 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/22/2023
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRC.
PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA
Sumário:O pagamento de royalties pela cedência de marcas, cuja criação, gestão, desenvolvimento e promoção compete à cessionária, sem qualquer contrapartida, no quadro de entidades membros de um grupo económico, consubstancia preços de transferência.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
I- Relatório
R.............., SGPS, S.A., a sociedade dominante de Grupo (empresas tributadas pelo regime especial de tributação dos grupos de sociedades), deduziu impugnação judicial contra a liquidação adicional de IRC n.º……………..898 e a liquidação nº ……….951 de juros compensatórios, do exercício de 2013, emitida na sequência de acção de inspeção tributária efectuada na sociedade individual R.............. Cash & C...., S.A, da qual resultou a pagar, após compensação, a quantia de € 1.870.020,65, pedindo a anulação dos actos tributários em causa, bem como o pagamento da indemnização prevista no artigo 171º do CPPT e 53º da LGT, caso a garantia venha a ser julgada indevida.
Na pendência da acção, a Fazenda Pública anulou a liquidação dos juros compensatórios e a Impugnante veio em requerimento apresentado em 01.02.2017, requerer a ampliação do pedido, peticionando a condenação da Fazenda Pública ao pagamento de juros indemnizatórios, pretensão que foi deferida por despacho proferido em 01.04.2019, inserto a fls.1122 e ss. (numeração do processo em formato digital-sitaf).
O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença datada de 21.06.2022, incorporada a fls. 1215 e ss. (numeração do processo em formato digital - sitaf), julgou a impugnação procedente, e, em consequência: a) declar[ou] extinta a instância quanto ao pedido de anulação da liquidação de juros compensatórios impugnada por inutilidade superveniente da lide; b) Anul[ou] [..]o acto de liquidação de IRC n.º 2016 8310032898 do período de tributação de 2013; c) Julg[ou][…] procedente o pedido de condenação da Fazenda Pública a pagar à Impugnante indemnização por prestação de garantia indevida nos termos supra expostos; e d) Julg[ou][…] procedente o pedido de condenação da Fazenda Pública a pagar à Impugnante juros indemnizatórios nos termos supra expostos;”

Inconformada com o assim decidido, a Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional, tendo nas suas alegações, insertas a fls. 1291 e ss. (numeração do processo em formato digital - sitaf), aduzido as seguintes conclusões: «
a) Entende a RFP que a douta Sentença de que se recorre sofre de erro de julgamento, quando concluiu que: “Face ao supra exposto, conclui-se que a Administração Tributária não logrou demonstrar os pressupostos legais da aplicação do artigo 63º, n.º 1, do Código do IRC, quanto ao requisito de que entre os sujeitos passivos intervenientes na operação vinculada não foram contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis, ficando prejudicado o conhecimento dos demais vícios invocados pela Impugnante quanto a esta correcção à matéria colectável.”
b) Como refere a douta Sentença: Em relação ao exercício de 2013, a Administração Tributária entendeu que a quantia global de €5.389.478,53 contabilizada como gasto referente a royalties paga pela sociedade «R.............. Cash and C...., S.A.» à entidade relacionada «O............. Mark» não deve concorrer para a formação do lucro tributável por não terem sido contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis nos termos do disposto no artigo 63º do Código do IRC e na Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro, não tendo sido observado o princípio da plena concorrência, uma vez que no «Contrato de Licenciamento» celebrado não se encontram previstas quaisquer penalidades em caso de incumprimento das obrigações assumidas, não foi clausulada qualquer assunção de responsabilidade pela «O.............», detentora das marcas, ao nível dos riscos inerentes à detenção de um activo desta natureza, quer ao nível da sua promoção, quer ao nível do seu desenvolvimento e valorização, que não foi clausulada a revisão de preços, que a sociedade «R.............. Cash and C....» continuou a suportar os encargos com a publicidade e a promoção das marcas, sendo a única responsável pela realização de investimentos para a manutenção e incremento do valor das marcas, sem que seja apropriadamente ressarcida pela entidade que detém a propriedade das mesmas, que os encargos incorridos pela «R.............. Cash and C....» relativamente a estas marcas superam os fluxos financeiros de que beneficiou na sua alienação, que se verifica uma total inexistência de investimento na valorização das marcas pela sua proprietária, nem a proprietária das marcas possui estrutura para suportar os riscos e funções de detenção legal e de facto das mesmas, que um «Contrato de Licenciamento» celebrado entre partes independentes salvaguardaria os interesses de ambas as partes, nomeadamente a possibilidade de optar por contratos de menor duração e de consagração de cláusulas de revisão de preços, bem como a assunção de encargos pela entidade detentora das marcas e que a entidade independente que pagaria os royalties pelos direitos de utilização das marcas não estaria disposta a suportar os encargos com as suas publicidade e gestão em relação a um activo que não lhe pertence sem que obtivesse uma rentabilidade apropriada, pagando, em paralelo, um royalty pela utilização dessas marcas das quais não é a proprietária legal.
c) Ocorre que, em análise entendeu a douta Sentença que: “Os serviços de inspecção tributária não identificaram as operações que, no seu entender, reúnem as condições para serem consideradas comparáveis com a operação vinculada aqui em causa e que os levaram a concluir que nenhuma entidade independente estaria disposta a celebrar um contrato com os termos e condições estipulados no contrato referente à operação vinculada.
Deste modo, se a Administração Tributária afirma que, quanto ao pagamento de royalties, no presente caso, não foram praticadas condições idênticas às que seriam praticadas entre entidades independentes, em operações comparáveis, cabia-lhe demonstrar, à luz do disposto nos artigos 74º, n.º 1, da LGT, 63º, n.º 1, do Código do IRC e 1º, n.º 1, 4º e 5º da Portaria n.º 1446-C/2001, quais foram as operações não vinculadas realizadas entre entidades independentes, nomeadamente os seus termos e condições, selecionadas para a comparação exigida, bem como o grau e os factores de comparabilidade entre a operação vinculada e uma operação não vinculada, nos termos das disposições legais supra mencionadas, o que, no presente caso, não se verificou atenta a ausência de qualquer referência aos termos e condições celebrados em que operações comparáveis e entre que entidades independentes (actuantes no mesmo ou em semelhante ramo de actividade), pelo que se terá de concluir que não logrou demonstrar os pressupostos legais da aplicação do artigo 63º do Código do IRC, quanto ao pressuposto de que entre os sujeitos passivos intervenientes na operação vinculada foram estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre entidades independentes em operações comparáveis.”
d) Salvo o devido respeito, incorreu a douta sentença em erro de julgamento, porque, resulta claramente do RIT - matéria de facto dada como provada na douta sentença – desde logo porque, não analisou a fundamentação dos serviços de inspeção tributária não tendo atribuído qualquer efeito à mesma, e,
e) E, ao contrário do doutamente decidido na Sentença de que se recorre, entendemos que, a fundamentação dos serviços de inspeção tributária é clara e suficiente para demonstrar os pressupostos legais do artigo 63º do CIRC, os serviços de inspeção tributária identificaram porquê, no caso concreto, aquela operação não seria possível de ser realizada entre entidades independentes, gerando-se nos períodos subsequentes, na sua esfera patrimonial e tributária, gastos sob a forma de royalties que não respeitam o princípio de plena concorrência.
f) Esclarecendo, entre outros fundamentos, que tal sucede porque, a alienante assume os gastos associados à gestão e desenvolvimento das marcas cedidas, bem como todos os riscos a estas inerentes, suportando adicionalmente um encargo (royalty) pelo usufruto de um bem que não é seu, não exercendo a O............. Mark, qualquer função relacionada quer com a manutenção do valor das marcas, quer com investimentos na sua valorização.
g) Ora, fazendo tábua rasa desta fundamentação, entende a douta Sentença que:
· Os SIT não identificaram as operações que, no seu entender, reúnem as condições para serem consideradas comparáveis com a operação vinculada aqui em causa e que os levaram a concluir que nenhuma entidade independente estaria disposta a celebrar um contrato com os termos e condições estipulados no contrato referente à operação vinculada;
· Deste modo, se a Administração Tributária afirma que, quanto ao pagamento de royalties, no presente caso, não foram praticadas condições idênticas às que seriam praticadas entre entidades independentes, em operações comparáveis, cabia-lhe demonstrar, quais foram as operações não vinculadas realizadas entre entidades independentes, nomeadamente os seus termos e condições, selecionadas para a comparação exigida, bem como o grau e os fatores de comparabilidade entre a operação vinculada e uma operação não vinculada, nos termos das disposições legais supra mencionadas, o que, no presente caso, não se verificou atenta a ausência de qualquer referência aos termos e condições celebrados em que operações comparáveis e entre que entidades independentes (atuantes no mesmo ou em semelhante ramo de atividade).
h) Ora, a ser assim esta que seria uma prova quase impossível para os serviços de inspeção tributária, desde logo, teriam que se conhecer todas as operações do universo empresarial para demonstrar “quais foram as operações não vinculadas realizadas entre entidades independentes, nomeadamente os seus termos e condições, selecionadas para a comparação exigida, bem como o grau e os fatores de comparabilidade entre a operação vinculada e uma operação não vinculada”, além de que, entendendo-se assim, operações realizadas entre entidades relacionadas, mas que não tenham sido nunca realizadas entre entidades independentes nunca poderiam ser consideradas como violadoras do artigo 63º do CIRC.
i) Aquilo que os artigos 74º, n.º 1, da LGT, 63º, n.º 1, do Código do IRC e 1º, n.º 1, 4º e 5º da Portaria n.º 1446-C/2001, assim como a jurisprudência (por exemplo Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul processo n.º 1882/14.4BESNT) é que: “Cumpre à Autoridade Tributária e Aduaneira a verificação dos pressupostos de aplicação da norma relativa a preços transferências averiguando da existência de relações especiais entre o Contribuinte e as entidades envolvidas, e que as operações efetuadas se afastaram das que ocorreriam entre entidades independentes e numa situação de plena concorrência.”, ora, não se exige uma concreta comparação com uma entidade independente mas antes uma analise das circunstâncias em que, naquele caso entende a AT, aquela operação não seria realizada entre entidades independentes e porque razão, ou razões, e, como bem se retira do Relatório, a AF descreve amplamente todos os factos, fundamentos e razões para que, aquela operação, não ser realizada entre entidades independentes numa situação de plena concorrência, porque, nomeadamente a alienante assume os gastos associados à gestão e desenvolvimento das marcas cedidas, bem como todos os riscos a estas inerentes, suportando adicionalmente um encargo (royalty) pelo usufruto de um bem que não é seu, não exercendo a O............. Mark, qualquer função relacionada quer com a manutenção do valor das marcas, quer com investimentos na sua valorização., o que, em plena concorrência certamente não se verificaria.
j) Nas palavras do RIT:” (…) apenas a R.............. desenvolve, para além da atividade operacional de distribuição, todas as funções suscetíveis de valorizar a marca que utiliza, como sejam as de a publicitar e promover, bem como as inerentes à sua gestão e desenvolvimento (realização de estudos e projetos). Assim, a valorização da marca, ou a simples manutenção do seu valor, dependem integralmente de funções exercidas e dos correspondentes gastos suportados na esfera da R............... Igualmente, todos os riscos associados ao intangível são assumidos pela R.............., o que é corroborado pelo facto de o Licence Agreement celebrado entre as partes prever, na alínea b) do seu ponto 8, uma cláusula de salvaguarda para a O............. no que respeita a eventuais acontecimentos futuros desfavoráveis, mas nada prever para a empresa portuguesa. Assim, a R.............. exerce tais funções e assume tais riscos sem qualquer remuneração, não lhe sendo, sequer, reembolsados os gastos que os mesmos acarretam. Do exposto, resulta ser nulo o valor de plena concorrência para a royalty em causa, por ser igualmente nulo o montante que entidades independentes aceitariam suportar no âmbito de um contrato de licenciamento com características análogas. Por tudo o ante exposto, conclui-se que a remuneração auferida pela O............., sob a forma de rovaties pagas pela R.............., não é consentânea com o Principio de Plena Concorrência preconizado no n.º 1 do artigo 63º do Código do IRC, razão pela qual, tais encargos deverão ser desconsiderados da esfera tributária do sujeito passivo, na medida em que se traduzem na aceitação de termos e condições diferentes dos que seriam praticados, aceites e contratados entre entidades independentes, em circunstâncias normais de mercado e de plena concorrência.”
k) Pelo que, errou, a douta Sentença de que se recorre, ao não considerar as circunstâncias especificas e caracterizadoras amplamente descritas pelos serviços de inspeção tributária, assim como, exigindo a fundamentação com situações concretas o que se verificaria como uma prova impossível de obter, e que a lei não exige, já que os serviços de inspeção tributária fundamentaram devidamente a correção, devendo a liquidação em causa ser mantida na ordem jurídica.
Pede a substituição da decisão por outra que julgue improcedente a impugnação.
E, ainda pede a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça prevista no n.º7 do art.º 6º do RCP

X
A Sociedade Impugnante, ora recorrida, apresentou contra-alegações insertas a fls. 1309 e ss. (numeração do processo em formato digital-sitaf),expendendo, as seguintes conclusões: «
A. A RECORRENTE imputa à sentença recorrida um erro de julgamento da matéria de facto, consubstanciado num alegado aligeiramento na apreciação dos fundamentos que justificaram o recurso pela AT ao mecanismo dos preços de transferência no caso concreto. Ela não apresenta, no entanto, um único facto a que considera ter sido dado um valor desproporcionado ou errático, ou, ao invés, factos sobre que se imporia uma prova não realizada.
B. A RECORRENTE limita-se, não obstante, a fazer uma defesa generalizada das razões de facto e de direito invocadas pela AT no RIT que consubstancia os actos de liquidação em crise, afirmando que um maior esforço além do realizado é impossível.
C. Ora, estas “razões” estão muito longe de ser suficientes; elas são apresentadas como um dado absoluto, não sendo possível delas retirar um esboço de iter cogniscitivo, uma concretização, um detalhe a respeito do qual possa ter sido mal analisado. A RECORRENTE não pode sentir que lhe seja admitido simplesmente assegurar que, no caso concreto, os termos e condições contratualizados não são os que normalmente seriam firmados entre entidades independentes, sem que o procure fazer de forma circunstanciada e minimamente demonstrada.
D. A AT realmente nunca pretendeu discutir os valores que constituem a contrapartida da utilização das mesmas marcas e a indispensabilidade dos mesmos para a formação do lucro tributável da R.............. CASH & C..... Com efeito, é claro que a AT, podendo sempre tê-lo feito, nunca quis, nas inspeções tributárias que levou a cabo com referência aos exercícios anteriores – 2008, 2009 e 2010 –, trilhar o caminho dos preços de transferência (prevalecendo-se das possibilidades de correção concedidas pela norma do artigo 63º do CIRC), tendo sempre, ao invés, optado por convocar a norma do artigo 23º do CIRC, alegando que os custos incorridos pela R.............. CASH & C.... a título de royalties não representam qualquer valor acrescentado para esta sociedade, sendo, por isso, dispensáveis à formação dos seus proveitos.
E. Ao “abandonar” a tese de que os referidos encargos não são, afinal, “questionáveis” sob o ponto de vista da sua efetividade, oportunidade ou indispensabilidade (tendo em conta a finalidade lucrativa da entidade que neles incorre), deixando, deste modo, cair o fundamento legal que até vinha utilizando – o artigo 23.º do CIRC –, a AT aceita limitar o racional da correção a uma questão de valor, regredindo no princípio, que, no passado, tacitamente admitiu, de que o preço arbitrado pelas partes no Licence Agreement a que supra se faz referência não coincide com aquele que partes independentes, nas mesmas circunstâncias, utilizariam.
F. Sendo indisputável que as marcas R.............. e M.............. pertencem efetivamente a um terceiro e que para a R.............. CASH & C.... é absolutamente imprescindível a sua utilização, como é que é possível aceitar como conjeturável a hipótese – como hipótese normal ou mais adequada, de acordo com os usos do tráfego jurídico – de elas serem cedidas a título gratuito?
G. Nada no elenco factual supra exposto conduz à conclusão de que, entre a sociedade R.............. CASH & C.... e a sociedade O............., foram estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes, e que, do estabelecimento daquelas condições, resultaram lucros tributários diversos dos que seriam apurados na sua ausência.
H. A operação de cessão onerosa das marcas R.............. e M............. teve na sua origem razões de índole estratégica e económica perfeitamente identificadas (a satisfação imediata de determinadas necessidades de tesouraria e a facilitação da gestão profissionalizada, integrada e contextualizada daquelas marcas, por uma sociedade apenas dedicada a esse fim e melhor posicionada para a sua promoção institucional internacional), explicadas no contexto da época em que ocorreram e no contexto do desenvolvimento estrutural das sociedades do Grupo em causa.
I. Em virtude da realização das referidas operações, a sociedade R.............. CASH & C.... transferiu para a O............. todos os direitos, obrigações e riscos inerentes à detenção da propriedade daquele ativo incorpóreo.
J. Por outro lado, os termos e condições praticados no âmbito das referidas operações corresponderam àqueles que entidades independentes teriam contratado e praticado em operações comparáveis, o que acabou por ser corroborado pelos estudos de avaliação externa solicitados pela sociedade R.............. CASH & C.... às sociedades A…………………..e K…….., e, mais recentemente, pelo documento de revisão do primeiro estudo de avaliação, levado a cabo também pela A……………...
K. Além disso, os termos e condições referentes à operação por via da qual ocorreu a referida transmissão das marcas foram objeto de análise e exame por parte da AT portuguesa, que, no âmbito de um processo inspetivo levado a cabo na esfera da R.............. CASH & C...., com referência ao exercício de 2007, efetuou todas as correções que entendeu serem devidas, não estando entre elas a relativa ao valor dos objetos da transmissão.
L. Diferentemente, a operação de licenciamento para a utilização das marcas R.............. e M............. foi motivada pela necessidade de prossecução da atividade de comércio a retalho sob aquela designação e elemento distintivo, fator de diferenciação essencial para aquela sociedade.
M. Por força da celebração daquele acordo, a sociedade O............. compromete-se a licenciar a utilização das marcas de que é legítima proprietária em benefício da sociedade R.............. CASH & C...., estabelecendo-se como contrapartidas: (a) o pagamento de uma taxa de licenciamento equivalente a 0,6% do total das vendas registados por estas últimas em território português; e (b) o investimento, na proporção de 0,15% da respetiva faturação, na promoção da marca cuja utilização lhes foi cedida, através da criação de campanhas publicitárias institucionais e de outras iniciativas promocionais especiais.
N. Acresce que estes e os demais termos e condições contratados no âmbito das referidas operações corresponderam àqueles que a entidade independente A........... ……………concluiu, mais recentemente [em Dezembro de 2014] e com base nas mais recentes metodologias de apuramento das práticas de mercado em matéria de valorização de marcas, como sendo os termos e condições de mercado em operações comparáveis – a mesma conclusão é retirada de um outro estudo realizado pela mesma entidade à data da celebração do Licence Agreement.
O. Não sendo, porém, verdade que do contrato em análise não resultam quaisquer ónus ou responsabilidades para a O............. – da celebração do referido acordo resulta, para aquela sociedade, a impossibilidade de controlo direto da suscetibilidade de valorização ou desvalorização dos ativos cuja utilização licencia e ainda o ónus da sua conservação no ativo não obstante a existência de eventuais ofertas do mercado no sentido da sua aquisição – ou que do mesmo não resultam quaisquer benefícios para a sociedade R.............. CASH & C.... – da celebração do referido acordo resulta a vantagem económica inequívoca de prossecução da respetiva atividade sem alteração da respetiva insígnia –, não pode a AT corrigir o resultado económico das referidas operações com base na suspeita de que o mesmo não corresponde àquele que entidades independentes apurariam em idênticas circunstâncias, atentos os termos e condições estabelecidos pelas partes no gozo da sua liberdade de gestão.
P. Os referidos estudos concluem pela existência de, pelo menos, seis acordos de licenciamentos potencialmente comparáveis com o contrato de licenciamento em análise, através da utilização de duas diferentes metodologias, ambas genericamente aceites pelas práticas de mercado no sector da avaliação dos intangíveis; por outro lado, concluem pela adequação da taxa de royalties de 0,6% e pela adequação da transacção em análise dentro dos parâmetros de mercado.
Q. Nada tem de anormal ou censurável o estabelecimento de uma obrigação de comparticipação desta natureza nos custos promocionais das marcas licenciadas: em virtude do acordo celebrado, a R.............. CASH & C.... assume suportar um conjunto de encargos relacionados com a publicitação das mesmas, dado que dela depende o sucesso das respetivas atividades.
R. Acresce que, estes encargos, facilmente confundíveis com aqueles que se baseiam na necessidade de publicitação de determinados eventos promocionais a produtos específicos, seriam naturalmente destrinçáveis daqueles outros que só à R.............. CASH & C.... caberia suportar, relativos à promoção, não já exclusivamente da marca, mas, além disso, do produto ou produtos por cuja comercialização é responsável.
S. Mais: não foram devidamente aplicados os métodos de determinação do preço de plena concorrência previstos na lei, o que equivale a entender que é ilegal o ato de liquidação em crise, senão por força do erro sobre os pressupostos de aplicação do artigo 63º do CIRC – do que não se prescinde –, com certeza por força do erro sobre os pressupostos de aplicação dos métodos de determinação do preço de plena concorrência.
T. A AT opta pelo Método do Fracionamento do Lucro sem, para o efeito, lograr testar a aplicação (ou sequer demonstrar a não aplicação) ao caso de outros métodos de determinação dos preços de transferência das referidas operações – em clara violação da lei e das orientações propostas pela OCDE nesta matéria.
U. Sucede, porém, que, no caso em apreço, não só não é verdade que não seja possível estabelecer nexos de comparabilidade com operações não vinculadas (e, muito menos, é verdade que o estabelecimento desses nexos é impossível atento o universo da sua abrangência) – vimos, no ponto anterior da presente exposição, que, no âmbito das pesquisas efetuadas pelas empresa de consultoria, especializadas na matéria, A.............e K.........., com o objetivo de averiguar as condições de mercado associadas aos montantes pagos pela R.............. CASH & C...., a título de royalties, como contrapartida da licença de utilização das marcas R.............. e M............., foram selecionados dez contratos, no primeiro caso (benchmark realizado pela A...........), e seis contratos, no segundo caso (benchmark realizado pela K..........), cujos termos e condições foram considerados comparáveis com os dispostos nos contratos em causa –, como, ainda que o fosse, não seria esse um motivo suficiente para justificar o recurso àquele método de determinação de preços – o Método do Fraccionamento do Lucro – mediante o afastamento não fundamentado de todos os outros.
V. Para além disso, é errada a conclusão da inexistência de comparáveis de mercado aplicáveis à situação em apreço: na verdade, a AT nem diligenciou a sua verificação por recurso, como lhe seria exigível, (pelo menos) aos mesmos meios de informação recorridos pelas empresas de consultadoria independentes consultadas pela R.............. CASH & C.....
W. Finalmente, a injustiça do resultado proposto pela AT nesta matéria é ainda mais visível se atendermos à circunstância de uma correção de tal natureza provocar uma flagrante distorção quer do montante do imposto devido pelas empresas associadas quer das receitas fiscais dos países envolvidos nas operações.
X. Por isso mesmo, é exigível que as autoridades dos Estados intervenientes nas operações em crise – Portugal e Polónia – diligenciem no sentido de um ajustamento apropriado mediante a definição das condições comerciais que se observariam entre empresas independentes relativamente a operações idênticas e em circunstâncias análogas, o que, de todo, não ocorreu no presente caso e o que aqui se invoca em reforço da demonstração da ilegalidade da liquidação impugnada.
Y. Bem andou, assim, a sentença proferida pela Tribunal a quo, que deve manter-se na ordem jurídicas, com todas as consequências por ela arbitradas.
Termina pedindo a improcedência do recurso.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal notificado para o efeito, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
X
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
X
II- Fundamentação
1.De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: «
1. A Impugnante é a sociedade dominante de um grupo de sociedades sujeito, em 2013, ao regime especial de tributação de grupos de sociedades, que era composto por si e por diversas sociedades, entre as quais a «R.............. Cash and C...., S.A.» – cf. acordo (artigos 1º e 2º da petição inicial e 16º, 18º e 19º da contestação);
2. A «R.............. Cash and C...., S.A.» exerce a actividade de comércio por grosso de produtos alimentares, bebidas e tabaco - cf. factos não controvertidos (relatório de inspecção tributária a págs. 88 a 135 do processo administrativo apenso);
3. A «R.............. Cash and C...., S.A.» e a sociedade «O............. Mark Sp. Z o.o», sociedade de direito polaco encontram-se em situação de relações especiais – cf. factos não controvertidos (artigo 87º da petição inicial e relatório de inspecção tributária a fls. 88 a 135 do processo administrativo apenso);
4. Em 15/12/2007 a «R.............. Cash and C...., S.A.» e a «O............. Mark Sp. Z o.o» celebraram um «Documento de Venda» nos termos do qual a «R.............. Cash and C...., S.A.» cedeu e transferiu para a «O............. Mark Sp. Z o.o.» todos os direitos e obrigações respeitantes às Marcas (R.............. e M.............), pelas quantias de €43.000.000 e de €6.200.000 – cf. factos não controvertidos (artigo 14º da petição inicial e relatório de inspecção tributária a fls. 88 a 135 do processo administrativo apenso);
5. Em 18/12/2007 a «R.............. Cash and C...., S.A.» e a «O............. Mark Sp. Z o.o.» celebraram um «Contrato de Licença» nos termos do qual a «O............. Mark Sp. Z o.o.» cedeu à «R.............. Cash and C...., S.A.» o direito exclusivo e a licença para utilizar as Marcas (R.............. e M.............) para diferentes fins mediante o pagamento de taxas de licença correspondentes a 0,6%, das vendas líquidas totais em lojas da «R.............. Cash and C...., S.A.» no território português em troca da Marca Registada R.............., 0,6%, das vendas líquidas totais dos produtos realizadas em lojas da «R.............. Cash and C...., S.A.» no território português sob a Marca Registada M............. e da venda de todos os produtos vendidos por canais de venda distintos das lojas da «R.............. Cash and C...., S.A.», 0,6%, das vendas líquidas totais realizadas em lojas das sociedades que beneficiam da marca registada R.............. ou M............. com base no respectivo contrato celebrado com a «R.............. Cash and C...., S.A.» - cf. contrato e tradução a págs. 301 e 576 do SITAF e factos não controvertidos (artigos 25º, 26º da petição inicial e relatório de inspecção tributária a fls. 88 a 135 do processo administrativo apenso);
6. No âmbito do «Contrato de Licença» referido no ponto anterior a «R.............. Cash and C...., S.A.» obrigou-se a investir, pelo menos, 0,15% do seu volume de negócios nos termos do referido contrato na promoção das Marcas R.............. e M............. utilizando para esse fim publicidade e uma variedade de promoções especiais – cf. contrato e tradução a págs. 301 e 576 do SITAF e factos não controvertidos (artigo 28º da petição inicial e relatório de inspecção tributária a fls. 88 a 135 do processo administrativo apenso);
7. O «Contrato de Licença» referido no ponto 5. foi celebrado por tempo indeterminado e pode ser rescindo por qualquer uma das partes até ao final do ano civil, mas não antes de 17/12/2007 - cf. contrato e tradução a págs. 301 e 576 do SITAF e factos não controvertidos (artigo 27º da petição inicial e relatório de inspecção tributária a fls. 88 a 135 do processo administrativo apenso);
8. No âmbito do «Contrato de Licença» referido no ponto 5. estipulou-se que: «4. Aconselhamento – O Licenciador concederá ao Licenciado aconselhamento sobre a utilização e desenvolvimento de marcas, estratégia de qualidade, vendas, atividade de marketing, coordenação de atividade a nível internacional e oportunidades relacionadas com compras» - cf. contrato e tradução a págs. 301 e 576 do SITAF;
9. Em 17/09/2007, a «K.......... – C…………..» elaborou «Memorando de avaliação das marcas R.............. e M.............» com o seguinte teor: «1. Introdução (…) A K.......... C………….. não verificou nenhuma da informação apresentada no Memorando Factual e baseou-se nessa fonte para nos fornecer uma declaração por escrito de que a informação contida no Memorando Factual é materialmente exacta e completa, justa no seu modo de representação e, por conseguinte, forma uma base de confiança para a avaliação. 2. Sumário Executivo – O presente Memorando de Avaliação tem a finalidade de avaliar as marcas R.............. e M............. (…). A R.............. é uma empresa de produtos alimentares por grosso e um dos principais atores em Portugal, o M............. é uma marca da R.............. C&C originalmente criada para profissionais H......... que é exclusivamente vendido nas lojas R............... A avaliação da Marca baseou-se na Metodologia Royalty Relief que define o fluxo de royalties considerando contratos de licenciamento a níveis de mercado. (…). De acordo com o trabalho realizado a avaliação das marcas R.............. e M............. a 31 de Dezembro de 2007 ascende a €43,5M e €6,33M respetivamente. (…). 3. Metodologia e Abordagem (…). Metodologia Royalty Relief – A abordagem da Metodologia Royalty Relief parte do pressuposto que uma empresa não detém uma marca, tendo de pagar royalties aos proprietários da marca para o respetivo uso. O valor baseia-se no valor atual das royalties futuras após impostos, recebidas pelo proprietário da marca após deduzir os custos associados com a manutenção das marcas. Aplica-se uma abordagem de fluxo de caixa com desconto às royalties que são “dispensadas” (DCF); As royalties são calculadas sobre o rendimento especificamente como uma percentagem sobre as vendas líquidas. O parâmetro da taxa de royalty teve em consideração os comparáveis do mercado da marca, nomeadamente, englobando empresas que cobram uma taxa de royalty líquida para a propriedade da marca (todo o marketing e publicidade das marcas são da inteira responsabilidade do operador da marca). De acordo com este parâmetro apresentado no Anexo 2, foi tido em conta um intervalo da taxa de royalty entre 0,5% e 1%. (…). 4. Resultados da avaliação e interpretação – análise RRM/DCF (…). A avaliação das marcas R.............. e M............. é o resultado da taxa de desconto aplicas às vendas líquidas, portanto o valor da marca é altamente sensível à taxa de royalty. A taxa de royalty tida em conta no caso de base desta avaliação foi 0,8% que consideramos ser razoável de acordo com os comparáveis do mercado da marca (que tem um resultado num intervalo de royalty entre 0,6% e 1%) é uma taxa de royalty semelhante à que o Grupo JM tem em marcas semelhantes, nomeadamente Pingo Doce, Feira Nova e Biedronka. (…). Anexo 2 – Parâmetro de referência das royalties – (…) Anexo 4 – Memorando Factual – 31 Agosto 2007 – (…)» - cf. documento e tradução a fls. 301 e 829 do SITAF;
10. Em 21/12/2007, a «A........... ……………» elaborou um «Projeto de Relatório» com o seguinte teor: «(…). Foi conduzida uma análise do negócio de forma a determinar o justo valor de mercado das marcas “R..............” e “M.............” (…). Metodologia da avaliação das marcas – (…). 2. Fase 2: Na fase 2 vamos considerar a royalty que o G……………………aplica aos contratos de royalty do P……….e do F……….. (0,63%) estabelecida no período 2001-2002. (…).» - cf. documento e tradução a págs. 734 do SITAF;
11. Em 31/10/2014, a «A........... » elaborou uma análise de revisão da metodologia e pressupostos aplicados em projecto de 2007 a respeito da avaliação das marcas R.............. e M............. com o seguinte teor: «Sumário Executivo – (…) Em 2007 a A........... …………. efetuou a avaliação das marcas para auxiliar o Cliente na transferência das marcas para uma sociedade subsidiária. Esta sociedade seria responsável pela gestão das marcas em troca de taxas de royalty. (…). Com base na informação e análise resumida neste relatório, bem como na informação fornecida pelo Cliente, concluímos que a metodologia usada para o cálculo do Projeto de 2007, e ainda dos pressupostos de royalty, estão em conformidade com as práticas correntes de mercado, dado o seguinte: O método relief-from-royalty [dispensa de pagamento de custos de licenciamento] é o método mais amplamente usado e reconhecido para avaliar as marcas, em virtude do seu alto nível de aceitação por parte das autoridades jurídicas em fiscais. Com base nos resultados da análise da repartição de lucros (…) e tendo em conta a abordagem baseado no mercado para confirmar que as royalties de marca intrínseca se enquadram na faixa do mercado, utilizando a observação máxima de royalties de mercado como limite de royalty, concluímos que o intervalo de taxa de royalty de 0,3% a 14% é razoável para o uso das Marcas. (…). Critério das empresas análogas – Foi realizada uma pesquisa por empresas comparáveis, conforme descrito na secção de Taxa de Desconto. Assim, o Anexo B mostra os resultados da aplicação do critério EBIT de empresas análogas. A análise da margem realizada no grupo de empresas análogas conclui uma taxa de royalty no intervalo entre 0,7% e 1,7%. Abordagem baseada no mercado - Procurámos provas de mercado adequadas respeitantes a marcas licenciadas no âmbito do sector. Identificámos uma lista de transações consideradas adequadas para comparação com as Marcas; estras transações são sintetizadas da seguinte forma: (…).» - cf. documento e tradução a págs. 973 e 997 do SITAF;
12. Ao abrigo da ordem de serviço n.º ……………., foi elaborado o relatório de inspeção tributária da actividade da sociedade «R.............. Cash and C...., S.A.», do exercício de 2013, constando do mesmo o seguinte: «III – Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas – (…) – Correcções ao nível do resultado fiscal - Royalties – €5.389.478,63 - 1. Introdução - No âmbito do procedimento de inspeção à sociedade “R.............. Cash & C.... SA” detetaram-se pagamentos de royalties à entidade de direito polaco, sua relacionada, “O............. Mark Sp. z.o.o.” (…), no montante de €5.389.478,63 os quais são conexos com um contrato de licenciamento para a utilização das marcas R.............. e M............., detidas por aquela entidade polaca, por um período não inferior a 20 anos. Da análise efetuada, à luz do Princípio de Plena Concorrência preconizado no n.º 1 do artigo 63º do Código do IRC, bem como as Orientações da OCDE em matéria de preços de transferência, concluiu-se que a R.............., para além de suportar os referidos gastos, detêm na sua esfera outros gastos associados à gestão e desenvolvimento das marcas R.............. e M............., bem como todos os riscos a estas inerentes, os quais em condições normais de mercado e de plena concorrência deveriam encontrar-se na esfera patrimonial e tributária da detentora das marcas. Nestes termos, e em consequência, conclui-se que não foram contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis, em condições normais de mercado e de plena concorrência, existindo uma clara violação do Principio de Plena Concorrência preconizado no n.º 1 do artigo 63º do Código do IRC. Nessa medida, caso as operações controvertidas não tivessem sido realizadas, os resultados da R.............. seriam superiores em €5.389.478,63, correspondente ao montante pago a título de royalties. (…). 2. Subordinação das operações ao Princípio de Plena Concorrência – O Princípio de Plena Concorrência tem a sua génese nas disposições contidas no artigo 9º do Modelo de Convenção Fiscal da OCDE („CMOCDE‟), (…). Dispõe o n.º 1 do artigo 9º da CMOCDE que quando uma empresa de um Estado Contratante participar, direta ou indiretamente, na direção, no controlo ou no capital de uma empresa do outro Estado Contratante, ou as mesmas pessoas participarem, direta ou indiretamente, na direção, no controlo ou no capital de uma empresa de um Estado Contratante e de uma empresa do outro Estado Contratante, e, em ambos os casos, as duas empresas, nas suas relações comerciais ou financeiras, estiverem ligadas por condições aceites ou impostas que difiram das que seriam estabelecidas entre empresas independentes, os lucros que, se não existissem essas condições, teriam sido obtidos por uma das empresas, mas não o foram por causa dessas condições, podem ser incluídos nos lucros dessa empresa e tributados em conformidade. A CMOCDE serve de base para as Convenções para Evitar a Dupla Tributação celebradas entre os Estados. Neste caso, rege a CDT celebrada entre Portugal e a Polónia, cujo artigo 9º, n.º 1 estipula que: (…). O Princípio de Plena Concorrência encontra-se transposto para o ordenamento jurídico nacional no n.º 1 do atual artigo 63º do Código do Código do IRC, o qual determina que (…). O n.º 4 do referido artigo 63.° vem explicitar as circunstâncias em que se considera existirem relações especiais entre duas entidades, o que sucede nas situações em que uma entidade tem o poder de exercer, direta ou indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente, entre duas entidades em que os mesmos titulares do capital detenham, em cada uma delas, uma participação, direta ou indireta, não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto (alínea b) do n.º 4 do artigo 63.° do Código do IRC). Ora, a R.............. pertence ao grupo de sociedades cuja sociedade dominante é a R.............. SGPS SA, a qual é detentora da totalidade do seu capital social. Por outro lado, a O............. é uma sociedade de direito polaco, cujo capital é integralmente detido pela empresa holandesa "Beleggingsmaatschappij Tand BV”, a qual, por sua vez, é integralmente detida pela R.............. SGPS. O esquema que se segue ilustra a cadeia de participações dentro do Grupo no que respeita às entidades envolvidas nas operações em análise, em 31/12/2013: (…). Nestes termos, a R.............. e a O............. encontram-se em situação de relações especiais, conforme previsto na já mencionada alínea b) do n.º 4 do artigo 63º do Código do IRC, em virtude de a R.............. SGPS SA ter o poder de exercer, ainda que de forma indireta, uma influência significativa nas decisões de gestão das referidas entidades. Assim, as supra referidas operações constituem operações financeiras vinculadas, nos termos descritos na alínea b) do número 3 do artigo 1º da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de dezembro (…), conjugado com o estatuído na alínea d) do mesmo normativo. (…). A R.............. dedica-se ao comércio por grosso de produtos alimentares, bebidas e tabaco, sendo líder no mercado nacional nesse segmento. Com 39 lojas cash & C.... e 3 plataformas de food service em Portugal Continental, 1 cash & C.... e 1 plataforma de food service na Madeira, a R.............. era em 2013 a maior cadeia alimentar grossista em Portugal. (…). No âmbito do seu modelo de negócio, a R.............. tem vindo a fazer uma aposta na diferenciação, designadamente no que respeita às seguintes vertentes: (…). Marcas Próprias: oferta de um alargado sortido de marcas próprias de qualidade, com o processo de desenvolvimento certificado e com um diferencial de preço que pode chegar a 50% face às marcas lideres de mercado. Em 2013, as marcas próprias comercializadas pela R.............. eram as seguintes: M............. - marca desenvolvida para os profissionais de indústria hoteleira e que assenta a sua proposta de valor na qualidade e preço. Conta atualmente com mais de 1.000 referências e está presente em todas as lojas da empresa; (…); (…). No que concerne aos montantes de vendas de produtos de Marca Própria, as 3 marcas comercializadas registaram, em 2013, os seguintes valores em euro (num total de vendas realizadas pela R.............. de cerca de 749.454.634,71): M.............: 96.794.543,39 (…). 3.3. O Grupo J............ - A sociedade R.............. encontra-se integrada no grupo português J............ (…), cuja sociedade holding é a “J............ SGPS, S.A.” (…). O grupo tem, atualmente, projeção internacional na área alimentar, operando nos setores da Distribuição, da Indústria e dos Serviços. (…). A principal atividade do Grupo JM é a Distribuição Alimentar através das cadeias de supermercados P……………e de cash & C.... R.............., em Portugal, e das lojas alimentares de proximidade Biedronka, na Polónia. (…). Nesse sentido, a JM SGPS (…) centraliza diversos serviços de natureza técnica e administrativa, necessários à normal atividade das suas subsidiárias operacionais, os quais visam o desenvolvimento dos negócios de cada entidade e do grupo como um todo. Assim, a JM SGPS presta serviços às várias entidades do Grupo JM, que se traduzem em aquisições de serviços intragrupo na esfera das entidades beneficiárias destes serviços (…), designadamente nas seguintes áreas: (…). Em 2013, os montantes mais relevantes no que respeita aos custos debitados pela J….. SGPS à R.............. respeitaram a management fees (€1.032.161,16), fees de gestão em processos de negociação (€2.081.000,00). No que respeita aos custos incorridos com diversos serviços técnicos de administração e gestão prestados pela J…. SGPS (management fees) os critérios de alocação, suportados por um contrato de prestação/aquisição de serviços, assentam no número de horas de trabalho afetas à R............... Aos gastos incorridos pela J… SGPS é aplicada uma margem de 10%. (…). Em 2013, o montante total dos serviços recebidos e pagos pela R.............. Cash & C...., S.A., a título de gestão dos processos de negociação, representou um gasto total de €2.081,000,00. (…). 4. Descrição da operação de risco relevante - Na análise efetuada às demonstrações financeiras e às declarações fiscais do sujeito passivo, verificou-se que este suportou em 2013 gastos com o pagamento de royalties à sociedade polaca O............., no valor de 5.389.478,53€, relativos aos direitos de utilização das marcas R.............. e M............., titulados por um contrato de licenciamento celebrado com aquela entidade. Refira-se que as insígnias em apreço, originalmente desenvolvidas e registadas pela R.............., haviam sido alienadas à O............., em 15/12/2007, com a qual foi seguidamente celebrado o referido contrato de licenciamento para utilização das marcas cedidas (Licence Agreement), com efeitos a partir de 18/12/2007. 4.1. O Licence Agreement - De acordo com o que havia sido solicitado, o sujeito passivo disponibilizou uma fotocópia do Licence Agreement, celebrado entre a O............. e a R............... O documento apresentado, em vigor a partir de 18 de dezembro de 2007 e válido por um período mínimo de 20 anos (durante o qual não pode ser revogado), descreve os termos e condições acordados entre as partes, focando os seguintes pontos: (…). Licenciamento - procede à identificação do objeto e âmbito da licença, delimitando o conteúdo dos direitos de utilização abrangidos pela licença, bem como o seu âmbito territorial e temporal. Nestes termos, a entidade licenciadora, a O............., confere à entidade licenciada, a R.............., com efeitos a partir de 18 de dezembro de 2007, o direito exclusivo de uso da licença em Portugal, o qual não pode ser alvo de sub-licenciamento sem o prévio consentimento por escrito da primeira; Marca - define as obrigações relacionadas com a salvaguarda das marcas licenciadas, bem como as formas de exploração destas (qualidade dos produtos, horários, ...). Ao abrigo desta cláusula, a entidade licenciadora compromete-se apenas a promover a proteção e defesa das marcas em Portugal, suportando os respetivos gastos; Consulta - estabelece a obrigatoriedade de a O............. consultar a R.............. no que concerne ao uso e desenvolvimento da marca, qualidade dos produtos, estratégia de vendas, marketing, coordenação internacional e oportunidades de aquisição; Pagamento de um fee - define a taxa de remuneração a pagar pelo licenciamento das marcas e a periodicidade dos pagamentos. De acordo com esta cláusula os pagamentos serão efetuados trimestralmente e serão calculados nos seguintes termos: 0,6% sobre as vendas líquidas efetuadas em todas as lojas operadas pela sociedade R.............. em Portugal como remuneração pelo uso da marca R..............; 0,6% sobre as vendas líquidas de produtos comercializados sob a marca M............., efetuadas em todas as lojas operadas pela sociedade R.............. em Portugal ou através de quaisquer outros canais de venda; e, 0,6% sobre as vendas líquidas de produtos comercializados sob as marcas R.............. e M............., efetuadas nas lojas de outras entidades autorizadas a comercializar as referidas marcas. Registo - é definida a obrigatoriedade de a R.............. manter uma contabilidade e registos completos e exatos de todas as vendas de produtos, que suportem o cálculo das taxas de licenciamento a pagar ao abrigo do Licence Agreement, os quais poderão ser examinados e confirmados pela O.............; Promocão da Marca - é estipulado que, para além do pagamento das fees definidas no contrato, a R.............. se obriga a investir 0,15% da sua faturação em publicidade institucional e promoções específicas diversas; Duração do contrato - é estabelecido que o contrato é celebrado por tempo indeterminado, não podendo contudo ser rescindido antes de 17 de dezembro de 2027 (20 anos), salvo se existir incumprimento das condições definidas no acordo e tal incumprimento exercer efeitos adversos relevantes sobre a parte que solicita a rescisão. Saliente-se que da análise às cláusulas do referido acordo constata-se que, em momento algum, se estabelece qualquer penalidade no caso de incumprimento dos termos estabelecidos e aceites por ambas as entidades. Por outro lado, também não se vislumbra a assunção de qualquer responsabilidade imputável à entidade detentora da marca - O............. - designadamente ao nível da tomada de riscos inerentes à detenção de um ativo desta natureza, quer ao nível da sua promoção, quer ao nível do seu desenvolvimento e valorização. 4.2. Os estudos de benchmark apresentados pelo sujeito passivo - Para atestar a conformidade das royalties pagas à O............. com o Princípio de Plena Concorrência o sujeito passivo incluiu na sua documentação relativa à política de preços de transferência adotada dois estudos de comparabilidade, efetuados por entidades independentes, com base nos quais concluiu que a remuneração atribuída à sociedade polaca se encontra em paridade com o mercado. Os referidos estudos, datados de 2007, foram elaborados aquando da venda das marcas R.............. e M............. à O............. e estiveram na base do cálculo do valor de transmissão dessas marcas. Para esse efeito, no primeiro estudo, elaborado pela K.......... Corporate Finance (…) e datado de 17 de setembro de 2007, foi utilizada uma metodologia denominada "Royalty Relief Methodology”, de acordo com a qual o valor de mercado de uma marca depende da sua capacidade de gerar royalties no âmbito de contratos de licenciamento a celebrar futuramente. Neste tipo de abordagem, assume-se que a entidade em causa não detém uma determinada marca que utiliza na sua atividade, pelo que tem que pagar royalties à entidade detentora dessa marca. Assim, o valor da marca em causa corresponderá ao valor capitalizado das royalties líquidas de impostos auferidas pelo detentor da marca, depois de deduzidos os gastos incorridos com a sua detenção. Para esse efeito, as royalties são apresentadas como uma percentagem sobre as vendas e capitalizadas segundo o Método dos Cash-flows Descontados. Para apurar as taxas de royalties de mercado no que respeita a um eventual licenciamento do uso das marcas R.............. e M............., a K.......... elaborou um estudo de comparabilidade do qual resultou, afirma, um intervalo de taxas que variam de 0,5% a 1%. Contudo, não constam do referido estudo os critérios introduzidos na pesquisa de comparáveis, nem quaisquer elementos adicionais sobre a atividade e grau de independência das entidades tomadas como comparáveis. Por outro lado, a K.......... remete para os resultados da pesquisa constantes do anexo 2 ao estudo apresentado, do qual constam 6 entidades selecionadas como potenciais comparáveis que praticam taxas que variam de 0,5% a 2%, sem que tenham sido dadas quaisquer indicações sobre uma eventual refinação da amostra através da rejeição manual de entidades não comparáveis. Por último, há que referir que o valor projetado para as marcas R.............. e M............. no estudo elaborado pela K.......... foi calculado com base numa taxa de royalty de 0,6% sobre as vendas, semelhante às taxas praticadas pelo Grupo J…. relativamente a marcas similares (P ……… D ……., F …………. e Biedronka). Segundo a entidade avaliadora, considerando que do estudo de benchmark realizado resultou um intervalo de taxas de royalty praticadas por entidades e para marcas comparáveis que varia entre 0,5% e 1%, a taxa de 0,6% é perfeitamente razoável e está em linha com o mercado. Nestes termos, a K.......... estimou, com referência a 31/12/2007, os seguintes valores de mercado para as marcas alienadas à O............. (muito próximos dos que foram efetivamente acordados aquando da sua venda): R.............. - 43.520.000€; M............. - 6.331.000€. No que concerne ao segundo estudo mencionado pelo sujeito passivo, elaborado pela sociedade A........... …….Consultores de Avaliação Unipessoal Lda. (…) e datado de 31 de dezembro de 2007, pretendia-se projetar o valor de avaliação das marcas R.............. e M............., aquando da sua cedência, com base na taxa de royalties que a R.............. teria de suportar para as poder utilizar na sua atividade se estas fossem detidas por uma outra entidade. De acordo com aquela metodologia, o valor de mercado do ativo resulta da quantificação dos rendimentos líquidos atribuíveis a esse ativo intangível (numa perspetiva do rendimento). Assim, a parte dos lucros da R.............. decorrente da propriedade dos referidos ativos intangíveis, bem como o benefício da poupança de royalties resultante da sua detenção (capitalizado por uma taxa de desconto apropriada), equivale a uma estimativa apropriada do valor das marcas (“Royalty Saving Approach"). Para esse efeito, a A........... ……….. efetuou um estudo assente nas demonstrações financeiras de 10 entidades potencialmente comparáveis (com referência ao período 2001-2006), recorrendo a uma metodologia denominada “Rule of Thumb” para determinar taxas de royalties hipotéticas para cada uma dessas entidades, com base em 2 cenários (um mínimo e um máximo) que são, na perspetiva da entidade avaliadora, vulgarmente utilizados pelas empresas para estimar essas taxas. De acordo com a A........... ………, publicações especializadas muito prestigiadas analisaram um elevado número de contratos desta natureza tendo concluído que, em média, as percentagens de royalties utilizadas pelas empresas são estimadas num intervalo que se situa entre 25% e 33% dos lucros esperados na sua atividade operacional. A este respeito refira-se, no entanto, que, apesar de poder ser entendida como uma forma fácil de determinação da taxa de royalty a praticar, esta “regra”, se aplicada sem qualquer adaptação a cada situação em particular, não contempla quaisquer elementos específicos ou características especiais inerentes ao caso analisado, nem considera a envolvente económica em que as partes se inserem. Por outro lado, inúmeras divergências têm surgido no que respeita à base de gastos a ter em consideração na determinação dos lucros a repartir, o que pode originar situações de manipulação dos valores. Com recurso ao método descrito, a A........... Appraisal estimou, para cada uma das entidades, uma taxa mínima de royalty (correspondente à média resultante da aplicação de 25% ao EBIT/Vendas apurado em cada um dos exercícios do período 2001-2006) e uma taxa máxima de royalty (correspondente à média resultante da aplicação de 33% ao EBITA/Vendas apurado em cada um dos referidos exercícios). Com base nos resultados obtidos por esta via foram calculadas as taxas médias mínima e máxima, obtendo-se os seguintes resultados: Média 25%: 0,86%; Média 33%: 1,13%. Média 25-33%: 1,00%. Assim, a entidade avaliadora considerou que uma taxa de royalty de 1%, correspondente à média entre as taxas mínima e máxima obtidas com base na metodologia descrita, reflete adequadamente as condições de mercado, pelo que foi utilizada para efeitos do estudo de avaliação das marcas R.............. e M............. aquando da sua venda à O.............. Saliente-se, contudo, que o estudo apresentado não refere de que forma foram selecionadas as entidades tomadas como comparáveis (sendo que uma dessas entidades está mesmo identificada como “J............ Group"), não tendo sido incluídos quaisquer elementos ou informações adicionais sobre as referidas entidades e respetivas atividades. O estudo da A........... ……….. (que, recorde-se, havia sido elaborado com o objetivo de obter uma estimativa do valor das marcas que a R.............. pretendia alienar recorrendo à taxa de royalties que aquela entidade teria de suportar se não fosse a sua detentora) identifica ainda um cenário alternativo de valorização das referidas marcas. Nesta segunda hipótese, o valor das marcas R.............. e M............. é estimado com referência a uma taxa de royalty de 0,63%, correspondente à taxa contratada e praticada pelo Grupo J………. relativamente às marcas Pingo Doce e Feira Nova, a qual deverá ser também considerada dentro dos parâmetros de mercado. Isto porque, alega a entidade avaliadora, esta taxa se encontra em linha com as margens apuradas para a “J............ Group”, uma das entidades consideradas como comparáveis no estudo anteriormente descrito. Efetivamente, refere a A........... Appraisal, as taxas apuradas para a entidade em causa, calculadas com recurso à “Rule of Thumb" e com referência aos períodos de 2001 e 2002, situaram-se entre 0,43% (taxa mínima calculada para 2001) e 0,84% (taxa máxima calculada para 2002), pelo que, alega, a taxa de 0,63% praticada pelo grupo deve ser considerada de mercado. Por último, importa referir que, com base no estudo descrito, a A…………………… apresentou dois cenários de valorização para as marcas R.............. e M............., à data de 31/12/2007: (…). 4.3. Cálculo das royalties suportadas pela R.............. em 2013 - Os gastos suportados pela R.............. com royalties, pagos à O............., entidade do Grupo J……….sedeada na Polónia, no âmbito do contrato de licenciamento do uso das marcas R.............. e M............., ascenderam, como se disse anteriormente, a 5.389.478,53€ (…). (…). 5. Análise dos termos e condições praticados no licenciamento de marcas, à luz do Princípio de Plena Concorrência - Como já referido no ponto 2 do presente relatório, sendo a R.............. SGPS a detentora, ainda que de forma indireta, da totalidade do capital da R.............. e da O............., estas entidades encontram-se em situação de relações especiais, pelo que as supra referidas transações constituem operações vinculadas, nos termos descritos na alínea b) do número 3 do artigo 1º da Portaria, conjugado com o estatuído na alínea d) do mesmo normativo e com a alínea b) do n.º 4 do artigo 63º do Código do IRC. Assim, os termos e condições praticados nestas operações estão, como vimos, subordinados ao cumprimento do Princípio de Plena Concorrência preconizado no n.º 1 do ante citado normativo legal. 5.1. As orientações da OCDE em matéria de preços de transferência relativas às operações envolvendo ativos intangíveis - A já mencionada Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro, veio regulamentar no ordenamento jurídico nacional a aplicação dos métodos de determinação dos preços de transferência (quer a operações individualizadas, quer a séries de operações), o tipo, a natureza e o conteúdo da documentação comprovativa, bem como os procedimentos aplicáveis aos ajustamentos correlativos. Este normativo legal, reconhecendo a complexidade técnica das realidades que envolvem a aplicação do Princípio de Plena Concorrência e a validação do seu cumprimento, refere no seu Preâmbulo que “(...) nos casos de maior complexidade técnica, é aconselhável a consulta dos relatórios da OCDE que desenvolvem esta matéria, e cuja adoção pelos países membros é objeto de recomendações aprovadas pelo Conselho desta organização internacional. (…). Deste modo, na análise da operação em apreço, torna-se necessário recorrer à doutrina emanada por aquela entidade. Nesse sentido, refira-se que as orientações da OCDE em matéria de preços de transferência definem bem incorpóreo como abrangendo os direitos de utilização de ativos industriais, tais como as patentes, as marcas de fabrico, os nomes comerciais, os desenhos ou modelos, bem como a propriedade literária e artística, a propriedade intelectual enquanto “know-how” os segredos industriais ou comerciais, e preconiza uma distinção entre “trade intangibles” e "marketing intangibles”. (…). Já os bens incorpóreos de comercialização (marketing) compreendem as marcas de fabrico ou de comércio e os nomes comerciais que contribuem para a exploração comercial de um produto ou serviço, a clientela, as redes de distribuição e as designações, símbolos ou grafismos únicos que possuem um forte valor promocional para o produto em causa. O valor dos bens incorpóreos de comercialização (marketing) depende de numerosos fatores, incluindo a relevância e a credibilidade do nome comercial ou da marca determinados a partir da qualidade dos bens e dos serviços que foram comercializados no passado sob o nome comercial ou a marca, a importância do controle de qualidade e o esforço da I&D, a distribuição e a disponibilidade dos bens ou serviços comercializados, a amplitude e o sucesso das despesas de promoção destinadas a familiarizar os potenciais clientes com os bens ou serviços em questão (em particular as despesas de publicidade ou de distribuição expostas de modo a desenvolver a rede de relações com os distribuidores, agentes ou outros estabelecimentos auxiliares), bem como o valor do mercado ao qual estes bens permitem aceder e a natureza dos direitos que a lei confere sobre estes bens. Neste sentido, o valor de uma marca comercial é criado e mantido através da publicidade e outras atividades de marketing, dependendo, também, das despesas incorridas com o controlo da qualidade do produto de marca, da reputação da qualidade do titular da marca ao nível da produção, e da prestação de serviços e da forma como essa reputação é mantida. Ao contrário das patentes, as marcas comerciais não apresentam valor relevante até que sejam realizadas despesas de marketing para fomentar o seu valor e requerem a manutenção contínua dessas despesas de marketing. Refira-se que, em conformidade com o disposto no §1.33 das Guidelines da OCDE, a aplicação do Princípio de Plena Concorrência assenta, de um modo geral, numa comparação entre as condições praticadas numa operação vinculada e as condições praticadas numa operação entre empresas independentes. Para que essa comparação seja relevante é necessário, contudo, que as características económicas das operações consideradas sejam suficientemente comparáveis. Isto significa que não deve haver diferenças entre as operações comparadas suscetíveis de afetar, designadamente, a condição a examinar na metodologia (i.e., o preço ou a margem de lucro), ou que podem ser efetuados ajustamentos razoavelmente fiáveis a fim de eliminar o efeito dessas diferenças. Neste contexto, as características que se podem revelar importantes são as relativas aos bens ou serviços transacionados, as funções exercidas pelas partes (incluindo os ativos utilizados e os riscos assumidos), as cláusulas contratuais, a situação económica das partes e as respetivas estratégias negociais. Ora, tal como referem as Orientações da OCDE, no §6.1, as operações vinculadas que envolvem ativos intangíveis carecem de uma atenção especial, considerando que estes são muitas vezes difíceis de avaliar no plano fiscal. Assim, não obstante as linhas diretoras abstratamente definidas para a aplicação do Princípio de Plena Concorrência valerem, também, para a determinação de preços de transferência entre empresas associadas no caso de bens incorpóreos, a sua aplicação poderá revelar-se particularmente difícil quando estamos perante operações vinculadas relativas a bens incorpóreos, já que estes bens podem ter um caráter único ou especifico, o que dificulta a pesquisa de bens comparáveis. Por esse motivo, o §1.11 das Orientações da OCDE em matéria de preços de transferência refere que poderão existir problemas de ordem prática na aplicação do Princípio de Plena Concorrência, o qual pode conferir alguma artificialidade às operações. Contudo, de acordo com a doutrina internacional nesta matéria, esta artificialidade é endémica à aplicação do Princípio de Plena Concorrência e não poderá impedir a sua aplicação. (…). 5.2. Avaliação da conformidade do preço de transferência com o que seria praticado entre entidades independentes - Considerando o ante exposto, importa analisar a conformidade com o Princípio de Plena Concorrência dos preços praticados nas operações de licenciamento supra descritas. De acordo com o disposto nos §1.33 e 1.34 das Orientações da OCDE, a aplicação do Princípio de Plena Concorrência, assenta, de um modo geral, na comparação entre as condições praticadas numa operação vinculada e as condições praticadas numa operação entre empresas independentes. Para determinar o grau de comparabilidade entre operações, refere esta fonte doutrinária, é necessário entender o modo como as sociedades independentes avaliam os termos de eventuais operações e, na ponderação das condições de uma eventual operação, dever-se-á ter presente que aquelas sociedades independentes vão comparar essa operação com outras poções que realisticamente se lhes oferecem, e só concluem uma operação se não tiverem outra alternativa mais vantajosa. Este articulado materializa o paralelismo existente entre o Princípio de Plena Concorrência e o princípio do sound business purpose que deverá assistir a uma gestão empresarial eficaz e eficiente. Relativamente às operações controvertidas é de realçar, desde logo, que a transferência/cedência deste tipo de ativos intangíveis - marcas - se traduz na assunção de um conjunto de riscos, ligados à forte incerteza que envolve a sua avaliação enquanto bem incorpóreo, bem como a avaliação do seu potencial de geração de benefícios económicos futuros. Neste contexto, e no quadro de um Licence Agreement celebrado entre empresas independentes, os termos contratuais acordados entre as partes salvaguardariam, necessariamente, os interesses de ambas, nomeadamente, preveriam a possibilidade de optar por contratos de menor duração ou contemplariam cláusulas de revisão de preços. Na situação em apreço não se verificou qualquer cláusula de salvaguarda deste tipo, permanecendo atualmente os pressupostos (qualitativos e quantitativos) do contrato originariamente celebrado. Neste sentido, é inequívoco que tal situação apenas é admissível e compreensível quando um contrato desta natureza é celebrado entre entidades relacionadas, que fazem parte integrante de um mesmo grupo económico, existindo pois uma comunhão de interesses entre as partes envolvidas. Ora, tal como anteriormente se referiu, a R.............. alienou (em 15/12/2007) à sociedade O............. as marcas R.............. e M............. pelos valores de 43.000.000,00€ e 6.200.000,00€, respetivamente, tendo sido quase de imediato (em 18/12/2007) celebrado entre as mesmas partes um contrato de Licence Agreement onde se estabeleciam as condições de utilização pela R.............. das referidas marcas. Com base nesse Licence Agreement, ainda em vigor, comprometeu-se a R.............. a remunerar a: entidade agora detentora das marcas num valor correspondente a uma taxa de licenciamento (royalties) de 0,6% sobre todas as vendas efetuadas pelas lojas R.............. e sobre todas as vendas relativas à marca M............., o que gerou, em 2013, um encargo de 5.389.478,53€ na esfera da sociedade portuguesa. Por outro lado, as condições contratuais obrigam a R.............. a investir, no mínimo, 0,15% do total da sua faturação em ações promocionais e publicidade, tendo efetuado no período de 2013 um investimento que ascendeu a €2.005.904,36 em despesas desta natureza. Este montante excede o montante mínimo disposto contratualmente, uma vez que o Volume de Negócios da R.............. ascendeu, em 2013, a 750.826.867,88 (€ 750.826.867,88 x 0,15% = €1.126.240,30). Verifica-se, assim, que mediante esta transmissão de ativos intangíveis a R.............. se vinculou ao pagamento de um licence fee pela utilização de marcas cuja criação e incremento de valor se verificaram na sua esfera patrimonial, situação que se continua a manter após a alienação, na medida em que esta sociedade é a única responsável pela realização de investimentos para a manutenção e incremento do valor das marcas em apreciação, sem que seja apropriadamente ressarcida pela entidade que detém a propriedade das mesmas. Para além disso, e perspetivando esta operação num horizonte temporal mais alargado, verifica- se que qualquer benefício adstrito á obtenção dos fluxos financeiros gerados pela alienação das marcas se dissipa num prazo reduzido, na medida em que os encargos incorridos pela R.............. relativamente a estas marcas (royalties e gastos com publicidade) superam os fluxos financeiros de que beneficiou na sua alienação. E, por esse motivo, a R.............. foi questionada para que, tendo presente o teor do Licence Agreement, nomeadamente a sua cláusula 7ª, apresentasse a razão pela qual, apesar de não deter a propriedade jurídica das marcas, suporta encargos avultados com a sua promoção, publicitação, investigação e desenvolvimento. Nesse âmbito, veio o sujeito passivo esclarecer que se limitou a cumprir o que foi contratualmente estabelecido, efetuando “publicidade e campanhas promocionais aos seus artigos (como folhetos, painéis e ações de loja)“, esclarecendo ainda que tais encargos “respeitam exclusivamente a publicidade e propaganda efetuada aos produtos comercializados nas suas lojas, na qual é efetuada referência às marcas “R..............” e “M............., cuja utilização é efetuada ao abrigo do contrato de royalties já disponibilizado anteriormente”. Contudo, há que salientar que, no caso em apreço, verifica-se uma total inexistência de investimento na valorização das marcas R.............. e M............. pela sua proprietária polaca, encontrando-se a cargo do sujeito passivo português todo esse investimento, a par da sua normal atividade de promoção de vendas que caracteriza as suas atividades de distribuição. De facto, e tal como se tem constatado, mediante as indagações efetuadas nos procedimentos inspetivos realizados, e como adiante se concretizará, á O............. competem apenas atividades inerentes á mera gestão administrativa das marcas. (…). A marca ultrapassa o conceito de produto em si mesmo, envolvendo toda a empresa e respetiva cadeia de valor, as suas estratégias e os seus objetivos e, ainda, o consumidor. Neste sentido, foi sempre a R.............. que (ao contrário da O.............) realizou, e continua a realizar, os investimentos necessários à valorização das marcas R.............. e M............., pelo que poderemos dizer que se algum benefício foi gerado o mesmo se deveu aos encargos suportados pela R............... Ora, se um negócio semelhante se realizasse entre entidades independentes, sem qualquer tipo de relação societária ou de comunhão de interesses, vemos com alguma dificuldade que a entidade licenciada acordasse em assumir um conjunto de encargos cuja responsabilidade é, inequivocamente, da entidade que detém o ativo (marca), e pelo qual a empresa já paga uma taxa de utilização (royalty). A este respeito, o §6.36 das Orientações da OCDE refere que, quando atividades de marketing são levadas a cabo pela entidade que não detém a propriedade legal da marca, esta entidade deve ser remunerada enquanto prestadora de serviços, pela prestação de serviços promocionais ou, em certos casos, deve beneficiar de uma fração dos rendimentos suplementares imputáveis ao bem incorpóreo de comercialização, o que não acontece no caso em apreciação. Isto porque a R.............. assegura, substituindo-se à entidade detentora das marcas, as atividades inerentes à sua gestão, i.e., publicidade, promoção, divulgação, prospeção, investigação, desenvolvimento, pagando, em paralelo, uma royalty pela utilização dessas marcas (R.............. e M.............), das quais não é a proprietária legal. Com efeito, mesmo após a venda das marcas, continuaram na esfera da R.............. um conjunto de atribuições que deveriam pertencer à O............., na qualidade de detentora das referidas marcas, tais como: Dar conhecimento da marca ao cliente; Desenvolver uma identidade de marca; Desenvolver uma estratégia de comunicação; Conceber e produzir campanhas de marca; Coordenar campanhas dentro do mercado; Negociar e celebrar acordos de patrocínio para melhorar o conhecimento da marca. (…). Estas atividades materializam aquilo que a moderna teoria empresarial designa por branding. Este consiste no conjunto de ações tendentes ao desenvolvimento da associação de um nome a um produto ou uma entidade, na mente dos consumidores, potenciando uma diferenciação valorizadora relativamente aos seus concorrentes. (…). Pelo ante dito, a marca e a sua gestão, e o marketing e a promoção de vendas, são realidades indissociáveis, na medida em que todo e qualquer esforço publicitário visando a promoção de vendas só terá sucesso se suportado por uma apropriada estratégia de branding que conheça o cliente alvo, influenciando-o na sua decisão de compra e, em paralelo, uma estratégia de marca só atingirá os seus propósitos, se a estratégia de marketing tiver sucesso na colocação dos produtos junto dos clientes, corroborando a imagem que estes percecionam da marca, e estimulando a perceção do seu valor. O sucesso das atividades de publicidade e promoção de vendas desenvolvidas pela R.............. encontra-se, assim, sustentado por um conhecimento prévio dos mercados e consumidores alvo, em razão da estratégia e posicionamento estabelecidos para as marcas R.............. e M............., cuja definição é da responsabilidade da R.............., não se vislumbrando na esfera patrimonial da O............. qualquer atividade conexa com esta abordagem de aproximação ao cliente e ao mercado. Deste modo, não se encontram na esfera patrimonial da O............. os riscos e funções inerentes à criação do valor destas insígnias, já que é a R.............. a responsável pela promoção das marcas e pela sua publicitação, bem como pelo seu desenvolvimento e criação de uma identidade de marca junto dos consumidores, assumindo ainda o risco comercial da sua utilização. Refira-se que, em condições de plena concorrência, todas estas funções e responsabilidades seriam atribuíveis a quem detém a propriedade do ativo intangível, neste caso, a O.............. Contudo, esta última entidade não suporta quaisquer encargos inerentes à posse e valorização das referidas insígnias, conforme foi possível constatar pela análise as suas contas, nem tão pouco possui estrutura para suportar os riscos e funções de detenção legal e de facto das mesmas. Efetivamente, analisada a Demonstração de Resultados da O............. para 2013, destacam-se os gastos contabilizados com a amortização de marcas que representaram 97,72% do total dos custos operacionais registados. Pelo contrário, os gastos com salários representaram em 2013 apenas 0,06% do total de custos operacionais da O.............. Ora, sabendo-se que a gestão de uma marca está relacionada com a criação e a manutenção da confiança nessa marca, facilmente se depreende, com base nas percentagens de gastos apresentadas, que a empresa polaca não detém um quadro de pessoal qualificado que se dedique ao desenvolvimento e gestão das marcas, tarefas que são efetuadas pela empresa portuguesa, ou por esta contratadas junto de outras empresas do Grupo J…….., como anteriormente se evidenciou. Mais acresce que, tendo o sujeito passivo sido notificado, no âmbito do procedimento inspetivo, para proceder à identificação dos investimentos efetuados pela O............. na valorização das marcas, na qualidade de proprietária das mesmas, bem como das consultas levadas a cabo pela O............. relativas ao uso e desenvolvimento da marca, à qualidade, à estratégia de vendas, ao marketing, à coordenação internacional e a oportunidades de aquisição, nos termos previstos na cláusula 4.ª (Consulting) do Licence Agreement, veio este apresentar um documento proveniente da O............. intitulado 'Activity report 2013 regarding the trademarks M............. and R.............. CASH&C....), contendo, segundo refere, “a título de exemplo, algumas das actividades específicas por si realizadas em 2013 e subjacentes às suas marcas R.............. Cash & C.... e M............., bem como um (segundo) documento (com igual titulo}, proveniente da O............., contendo “a identificação das funções por si desenvolvidas com o objectivo de proteger, promover e valorizar as marcas de que ê legitima titular, a saber. R.............. Cash & C.... e M.............". Analisando o teor de ambos os documentos, verificamos que se reportam, em suma, à mera gestão das referidas marcas, incluindo atividades como sejam: a renovação de fees inerentes a domínios na internet, o envio quadrimestral das faturas relativas âs royalties a pagar pela R.............., o envio dos formulários 21-RH, e-maits relativos a ações de oposição a intentar contra o registo e outros e-maits relativos às marcas em causa. Verifica-se, assim, que a atividade da O............. reportada neste relatório respeita a uma mera gestão (administrativa e legal) das referidas marcas, seja pela via da renovação de fees inerentes a domínios na internet, seja pela simples proteção do registo das marcas aquando da oposição por si ou contra si apresentada. Não existe um único acontecimento relativo â promoção, publicitação, investigação e desenvolvimento das marcas, ou a qualquer outra atividade suscetível de gerar valor acrescentado para as mesmas. Podemos, por isso, afirmar que a criação de valor dos ativos intangíveis em análise é conduzida pela R.............., por via das ações publicitárias e de promoção levadas a cabo, não apenas relativamente a produtos específicos, mas também relativamente às próprias marcas, sendo que a O............. apenas suporta gastos relativos à detenção dos ativos, como sejam as amortizações e o pagamento de taxas. A importância que o investimento na promoção da marca R.............. representa para a própria R.............. está, aliás, bem expressa no seu Relatório e Contas de 2012 o qual refere, designadamente, que (…). Assim, é o próprio sujeito passivo que fornece elementos sobre a forma como pretende promover a marca R.............. e desenvolver novos canais de negócio que lhe permitirão, expectavelmente, incrementar as suas vendas e aumentar a sua quota de mercado. No que respeita à campanha promocional implementada para celebrar os 40 anos da R.............. não parecem existir dúvidas de que o que se está a promover é a própria insígnia e não qualquer tipo de produto específico. (…). Efectivamente, no âmbito da sua actividade a R.............. beneficia da estrutura do grupo, aproveitando um conjunto de serviços de apoio especializado prestados pela JM SGPS ou por outras entidades do grupo (…). O valor dos serviços prestados é posteriormente debitado à R.............. (e nunca à O.............), tendo em conta o nível dos serviços prestados e o benefício obtido, atingindo valores muito expressivos, conforme identificado no já referido ponto 3.3 do presente relatório. Verifica-se assim que a O............., para além de não desempenhar quaisquer funções com vista à valorização das marcas que adquiriu, também não promove o seu desenvolvimento através de outras entidades, não suportando quaisquer importâncias a esse título, nem exerce sequer qualquer tipo de controlo sobre as políticas de investimento seguidas pelo grupo. As marcas R.............. e M............. são, pelos motivos descritos, realidades complexas que, não se circunscrevendo aos nomes comerciais a elas subiacentes. envolvem igualmente um know-how diverso associado às atividades da distribuição e de assistência ao cliente, indissociavelmente relacionados e de grande valor acrescentado, cuia criação é da exclusiva responsabilidade da R.............., e de outras entidades suas relacionadas residentes em Portugal, cujos serviços e know-how especializados constituem gasto da R.............., materializando-se num elevado investimento na criação de valor das marcas em apreciação. (…). Assim, considerando tudo o ante exposto, demonstra-se que estas operações enfermam de uma clara não conformidade com o Princípio de Plena Concorrência, uma vez que estamos perante operações que entidades independentes não estariam dispostas a viabilizar, na medida em que uma entidade está a suportar um encargo, ao contribuir ativamente para valorização de um ativo cuja propriedade não lhe pertence, sem ser por isso devidamente compensada. (…). Ora, tal como se refere nos §1.33 e 1.34 das Orientações da OCDE, na ponderação das condições de uma eventual operação, as sociedades independentes vão comparar essa operação com outras opções que realisticamente se lhes oferecem e só concluem a operação se não tiverem outra alternativa claramente mais vantajosa. Tal preocupação, notoriamente, não assistiu às entidades intervenientes nestas operações, na medida em que destas resultou uma solução claramente desvantajosa para a sociedade portuguesa. Por tudo o ante exposto, e considerando a inexistência de contributos proativos da O............. na valorização das marcas que licenciou, e consequentemente para a cadeia de valor da atividade de distribuição realizada pela R.............. com recurso a estas marcas, afigura-se-nos que a remuneração auferida sob a forma de rovalties pagas por aquela entidade portuguesa não é consentânea com o Princípio de Plena Concorrência preconizado no n.º 1 do artigo 63º do Código do IRC. 5.3. Seleção do método mais apropriado e pesquisa de operações comparáveis – (…) o Princípio de Plena Concorrência, consagrado no ordenamento jurídico nacional no n.º 1 do artigo 63.° do Código do IRC, define que nas operações comerciais efetuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis. Por outro lado, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, (…). No mesmo sentido, estipula o n.º 1 do artigo 4º da Portaria que (…). E, em conformidade com o n.º 2 do mesmo preceito legal (…). O Código do IRC e a Portaria enumeram os métodos a utilizar, em linha com as orientações do Relatório da OCDE de 1995, que se agrupam numa de duas tipologias, a saber: (…). De entre os métodos baseados nas operações são identificados os seguintes no n.º 3 do artigo 63º do Código do IRC, e no n.º 1 do artigo 4º da Portaria (…). Quanto os métodos baseados no lucro das operações referidos são identificados os seguintes, no n.º 3 do artigo 63º e no n.º 1 do artigo 4º da Portaria: (…). Em conformidade com as mais recentes Orientações da OCDE em matéria de preços de transferência (vide §2.1 e seguintes das Guidelines) a seleção de um destes métodos para a avaliação da conformidade de uma operação vinculada com o Princípio de Plena Concorrência visa encontrar o método mais apropriado para cada caso específico. Neste sentido, e considerando o disposto no §2.3. daquelas Orientações, os métodos baseados nas operações são vistos como os métodos mais diretos de estabelecer se as condições praticadas no âmbito de uma operação vinculada são arm‟s length. (…). Quanto ao grau de comparabilidade entre uma operação vinculada e uma operação não vinculada, este deve ser avaliado tendo em conta os fatores de comparabilidade que se encontram também definidos no artigo 5º da Portaria, a saber: (…). O MPCM consiste na comparação direta de operações, através da comparação dos preços praticados em operações vinculadas com os preços praticados em operações comparáveis não vinculadas (operações em mercado aberto). O preço constitui, pois, um indicador direto. De acordo com o §2.14 das Orientações da OCDE, desde que seja possível a identificação de operações comparáveis em mercado aberto, este método constitui “o meio mais direto e mais fiável de aplicação do princípio de plena concorrência”, pelo que deve ser dada preferência a este sobre os demais. (…). Conforme referido no § 2.16, à semelhança do que acontece com qualquer outro método, a fiabilidade relativa do MPCM “depende do grau de precisão dos ajustamentos que podem ser introduzidos para efeitos de comparabilidade”, em caso de necessidade dos mesmos. Os ajustamentos de comparabilidade consubstanciam-se na eliminação dos efeitos decorrentes de diferenças ao nível da qualidade dos produtos, cláusulas contratuais, mercados geográficos, intangíveis incorporados, entre outros, a menos que estas diferenças não influenciem o preço em mercado aberto (vd. §2.15 e 2.16 das Orientações da OCDE). Ora, se a aplicação do MPCM tem por condição sine qua non para a sua aplicação a existência do mais elevado grau de comparabilidade entre as operações, com incidência tanto no objeto como nos demais termos e condições das operações, como na análise funcional das entidades intervenientes, afigura-se-nos desde logo existir uma dificuldade de aplicação deste método, intrínseca aos ativos intangíveis, em conformidade com o §6.1. das Orientações da OCDE a que já se aludiu. Se não vejamos: uma marca é definida como um sinal, ou conjunto de sinais, suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente, palavras, nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, a forma do produto e a respetiva embalagem, que viabilize a distinção de um produto ou serviço no mercado, perante os demais. Em Trademarks and Unfair Competition, J. ……………….. defende que a marca desempenha quatro funções fundamentais: Identificar e distinguir um produto ou serviço; Assinalar a sua origem; Anunciar a qualidade; Instrumento chave para fins publicitários. (…). Pelo exposto, é razoável concluir que uma marca, sendo um intangível de valor importante, medido em função de fatores como a relevância e a credibilidade do nome comercial ou da marca determinados a partir da qualidade dos bens e dos serviços que foram comercializados no passado sob o nome comercial ou a marca, a importância do controle de qualidade e o esforço da I&D, a distribuição e a disponibilidade dos bens ou serviços comercializados, a amplitude e o sucesso das despesas de promoção destinadas a familiarizar os potenciais clientes com os bens ou serviços em questão (em particular as despesas de publicidade ou de distribuição expostas de modo a desenvolver a rede de relações com os distribuidores, agentes ou outros estabelecimentos auxiliares) bem como o valor do mercado em que estes bens permitem aceder e a natureza dos direitos que a lei confere sobre estes bens (cfr. §6.4 das Orientações da OCDE), possui necessariamente um elevado potencial de diferenciação face às restantes marcas de mercado, podendo tornar difícil a identificação de operações comparáveis entre empresas independentes. Neste contexto, e como se refere no §6.26 das Orientações da OCDE, torna-se difícil aplicar os métodos tradicionais baseados nas operações, bem como o método da margem líquida baseado nas operações, nomeadamente quando as duas partes intervenientes na operação possuem bens incorpóreos de grande valor ou ativos únicos utilizados na operação e que distinguem esta operação de outras de potenciais concorrentes, pelo que, nestes casos, o método de fracionamento do lucro pode ser pertinente, mesmo se for suscetível de levantar problemas práticos. Tal como já se referiu, o MPCM requer um elevado grau de comparabilidade de produtos e de funções pelo que era necessário identificar operações realizadas entre entidades independentes que preenchessem os seguintes requisitos: a) A natureza dos ativos intangíveis intrínsecos ser similar; b) A entidade comparável desempenhar funções e assumir riscos similares. Dos estudos de comparabilidade apresentados não consta, contudo, informação relativa à descrição das funções exercidas, ativos utilizados e riscos assumidos pelas partes, o que desde logo faz perigar a aplicação do MPCM. Embora se compare a taxa de royalties suportada pela R.............. com um conjunto de contratos, alegadamente de natureza similar e praticados entre entidades independentes, a verdade é que esses contratos não se podem caracterizar como tendo “natureza similar” se não se puder garantir que, de facto, as funções exercidas e os riscos assumidos são similares. Ora, em nossa opinião, e não obstante a existência de estudos de comparabilidade realizados por duas entidades independentes que apontam para a existência de entidades/contratos de licenciamento comparáveis, afigura-se-nos que não foram tidas em consideração na avaliação da conformidade das operações com o Princípio de Plena Concorrência as funções desempenhadas pelas contraentes, com impacto relevante ao nível da comparabilidade das operações, nem assegurada a independência das partes. Aliás, uma das entidades tomadas como comparáveis no segundo estudo, elaborado pela A........... …………, está identificada como “J............ Group”, e em ambos os estudos são retiradas conclusões sobre o valor das marcas R.............. e M............. recorrendo a uma taxa de royalty praticada pelo grupo relativamente a outras marcas (P ………., F……………..e Biedronka). Efetivamente, no âmbito da presente análise, a avaliação das operações à luz do Princípio de Plena Concorrência deveria direcionar-se para a forma como entidades independentes estariam dispostas, em circunstâncias comparáveis, a repartir entre si os lucros gerados na atividade, considerando as funções desenvolvidas, os riscos assumidos e os ativos empregues. Neste contexto, é o comportamento das partes que deve ser considerado, de um modo geral, como o elemento mais judicioso na determinação da repartição efetiva dos riscos. Sendo certo que, em operações de plena concorrência, as cláusulas contratuais definem, em regra, quer expressa quer implicitamente, as modalidades de repartição das responsabilidades, dos riscos e dos benefícios entre as partes. E, na falta de disposições escritas, as relações contratuais entre as partes devem ser deduzidas do seu comportamento e, também, dos princípios económicos que habitualmente regem as relações entre empresas independentes. (…). Ou seja, independentemente da relação contratual existente entre as partes, para efeitos da tributação destas operações em respeito pelo Princípio de Plena Concorrência deverá atender-se aos termos efetivamente praticados nas operações, à alocação de funções e riscos efetivamente existente, considerando-se, para efeitos do benchmarking das operações, os fatores de comparabilidade relevantes, que, neste contexto, abarcam igualmente o montante, a natureza e a incidência das despesas apresentadas pela empresa que implementou ou explorou o bem incorpóreo, de modo a determinar a comparabilidade ou eventualmente o valor relativo das contribuições de cada interveniente. Pelos motivos expostos, afigura-se-nos ser inviável o recurso ao MPCM para, mediante o estabelecimento das condições que seriam praticadas entre entidades independentes em circunstâncias comparáveis, proceder à análise destas operações à luz do Princípio de Plena Concorrência, na medida em que, dadas as características intrínsecas aos ativos intangíveis, e a estas operações em particular, decorrentes do modelo de negócio adotado, torna-se difícil, ou mesmo impossível, a obtenção de comparáveis que viabilizem a análise. (…). Por sua vez, o MMLO é usualmente adotado para comparar a rentabilidade operacional de uma operação ou série de operações vinculadas, com a rentabilidade operacional obtida em operações comparáveis não vinculadas (operações em mercado aberto). Trata-se de uma forma indireta de verificar se os termos e condições das operações vinculadas observam o Princípio de Plena Concorrência. De acordo com o n.º 1 do artigo 10º da Portaria, (…). Relativamente ao indicador utilizado, refere o n.º 2 do artigo 10º da Portaria, que (…). Ora considerando, as características intrínsecas quer às operações controvertidas, quer à aplicação deste método de per se, a sua aplicação encontra-se inviabilizada nas circunstâncias em análise. Por último, o MFL assenta na repartição do lucro global (ou perdas globais) resultante de operações complexas, ou de séries de operações vinculadas realizadas de forma integrada, entre as entidades relacionadas intervenientes. A referida repartição é efetuada em função do valor relativo das funções exercidas por cada uma das entidades associadas participantes nas operações vinculadas (vide o n.º 1 do artigo 9º da Portaria e o §2.108 das Orientações da OCDE). De acordo com o n.º 4 do artigo 9º da Portaria (…). O MFL apresenta-se particularmente indicado para a avaliação de transações que envolvam transferência de ativos intangíveis de grande valor (venda e/ou licenciamento contra pagamento de royalty), em que seja difícil identificar operações comparáveis entre empresas independentes (cfr. §6.26 das Orientações da OCDE), bem como para séries de operações vinculadas realizadas de forma integrada entre entidades relacionadas. De uma forma genérica, a aplicação do método desenvolve-se nas seguintes fases: 1. Determinação do lucro económico global agregado das partes envolvidas - utilizadora e detentora do intangível; 2. Identificação das funções desempenhadas pelas partes e classificação das mesmas como funções de rotina ou como função de detenção e valorização do intangível; 3. Determinação de remunerações apropriadas para as funções exercidas por cada uma das partes, que geralmente são apuradas através da aplicação de uma margem adequada aos gastos incorridos com essas mesmas funções; 4. Determinação do lucro residual, através da dedução ao lucro económico global obtido com o procedimento descrito em 1, acima, das remunerações das funções exercidas pelas partes, apuradas conforme descrito em 3; Repartição do lucro residual pelas partes, através da identificação dos ativos intangíveis e dos respetivos detentores, bem como da contribuição relativa de cada uma das partes para o valor desses ativos e riscos assumidos. A repartição do lucro residual faz-se através do pagamento da royalty, da qual será beneficiária a parte que, na sequência dos procedimentos descritos, se apura ser do mesmo merecedora, pelas funções que desempenha e riscos que assume. Ora, todas as atividades são aqui desenvolvidas e todos os riscos assumidos pela R.............., não cabendo à O............. qualquer papel relevante, nem ao nível das funções de rotina nem ao nível das funções de detenção e valorização dos intangíveis. Efetivamente, como se disse anteriormente, apenas a R.............. desenvolve, para além da atividade operacional de distribuição, todas as funções suscetíveis de valorizar a marca que utiliza, como sejam as de a publicitar e promover, bem como as inerentes à sua gestão e desenvolvimento (realização de estudos e projetos). Assim, a valorização da marca, ou a simples manutenção do seu valor, dependem integralmente de funções exercidas e dos correspondentes gastos suportados na esfera da R............... Igualmente, todos os riscos associados ao intangível são assumidos pela R.............., o que é corroborado pelo facto de o Licence Agreement celebrado entre as partes prever, na alínea b) do seu ponto 8, uma cláusula de salvaguarda para a O............. no que respeita a eventuais acontecimentos futuros desfavoráveis, mas nada prever para a empresa portuguesa. Assim, a R.............. exerce tais funções e assume tais riscos sem qualquer remuneração, não lhe sendo, sequer, reembolsados os gastos que os mesmos acarretam. Do exposto, resulta ser nulo o valor de plena concorrência para a royalty em causa, por ser igualmente nulo o montante que entidades independentes aceitariam suportar no âmbito de um contrato de licenciamento com características análogas. Por tudo o ante exposto, conclui-se que a remuneração auferida pela O............., sob a forma de rovaties pagas pela R.............., não é consentânea com o Principio de Plena Concorrência preconizado no n.º 1 do artigo 63º do Código do IRC, razão pela qual, tais encargos deverão ser desconsiderados da esfera tributária do sujeito passivo, na medida em que se traduzem na aceitação de termos e condições diferentes dos que seriam praticados, aceites e contratados entre entidades independentes, em circunstâncias normais de mercado e de plena concorrência. 5.4. O impacto fiscal da não conformidade com o Princípio de Plena Concorrência das operações analisadas (…). Assim, tendo presente a factualidade descrita nos pontos anteriores do presente relatório, e o enquadramento destes à luz do Princípio de Plena Concorrência preconizado no n.° 1 do artigo 63.° do Código do IRC, bem como as Orientações da OCDE em matéria de preços de transferência a que se aludiu, concluiu-se que a R.............. detêm na sua esfera gastos associados à gestão e desenvolvimento das marcas R.............. e M............., bem como todos os riscos a estas inerentes, não se tendo verificado, assim, qualquer transferência de riscos e funções para a O............. aquando da sua alienação. Conclui-se, por isso, que as condições contratadas e praticadas na operação descrita não o seriam entre entidades independentes. Ora, não tendo sido contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis, existe clara violação do Princípio de Plena Concorrência preconizado no n.º 1 do artigo 63º do Código do IRC. Caso as operações controvertidas não tivessem sido realizadas, os resultados da R.............. seriam superiores em 5.389.478,53€ correspondente ao montante pago a titulo de royalties. Assim, nos termos do disposto no artigo 63º do Código do IRC e na Portaria e estando cumpridos os requisitos de fundamentação previstos no n.° 3 do artigo 77.° da Lei Geral Tributária, deverá proceder-se a um ajustamento positivo do lucro tributável da R.............., no montante de €5.389.478,53, relativo aos encargos com royalties pagas à O............. no período de 2013. (…). Como resultado das correções ora efetuadas, e conjuntamente com a liquidação adicional de imposto a entregar ao Estado, serão igualmente liquidados os juros compensatórios que se mostrarem devidos, nos termos do disposto no artigo 35º da Lei Geral Tributária, conforme nota demonstrativa de cálculo cujo teor será oportunamente notificado ao contribuinte. (…).» - cf. relatório de inspecção tributária, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 88 a 135 do processo administrativo apenso;
13. Ao abrigo da ordem de serviço n.º OI201500230, foi elaborado o relatório de inspeção tributária da actividade da Impugnante, enquanto sociedade dominante do grupo de sociedades sujeito ao regime especial de tributação do grupo de sociedades, do exercício de 2013, no qual foram incluídas as correcções referidas no ponto anterior constando do mesmo o seguinte: «O total das correções ao nível do lucro tributável do grupo nos termos do n.º 1 do artigo 70º do Código do IRC, ascende a €5.389.478,53, resultante da alteração ao lucro tributável da sociedade “R.............. Cash & C...., S.A.”, conforme se passa a discriminar: EFETUADAS NA ESFERA INDIVIDUAL DA “R.............. CASH & C...., S.A.” A empresa “R.............. Cash & C...., S.A.” contabilizou a cedência das suas marcas R.............. Cash & C.... (adiante R..............) e M............., em 2007, à sociedade de direito polaco "O............. Mark Sp. z.o.o." (doravante O............. Mark), gerando-se nos períodos subsequentes, na sua esfera patrimonial e tributária, gastos sob a forma de royalties que não respeitam o princípio de plena concorrência preconizado no n.º 1 do artigo 63º do Código do IRC, bem como nas orientações da OCDE em matéria de preços de transferência. (…). Nos termos do preconizado no artigo 63º do Código do IRC e na Portaria 1446-C/2001, de 21 de dezembro, procedeu-se a um ajustamento positivo do resultado tributável relativo á desconsideração dos royalties pagos ao abrigo do licence agreement, no montante de €5.389.478,53. (De acordo com os fundamentos constantes do ponto III do relatório de inspeção tributária individual que constitui o Anexo 1 ao presente relatório).» - cf. relatório de inspecção tributária, que se dá por integralmente reproduzido, a fls. 71 a 84 do processo administrativo apenso;
14. Em resultado das correções efectuadas pelos serviços de inspecção tributária, referidas no ponto anterior, foram emitidas, em nome da Impugnante, a liquidação de IRC n.º ………………..898, a liquidação de juros compensatórios n.º ……………..951 e a demonstração de acerto de contas n.º ……………..781, relativas ao exercício de 2013, das quais resultou o valor total a pagar de €1.810.020,65 – cf. liquidações e demonstração de acerto de contas a págs. 1 e 1051 do SITAF;
15. Com vista à cobrança do valor das liquidações referidas no ponto anterior foi instaurado contra a Impugnante o processo de execução fiscal n.º 3344201601077511 – cf. documentos a págs. 1040 e 1051 do SITAF;
16. O processo de execução fiscal referido no ponto anterior foi suspenso em 22/09/2016 em virtude de a Impugnante ter apresentado garantia bancária – cf. documentos a págs. 1040 e 1051 do SITAF;
17. Em 20/12/2016 a Impugnante pagou o valor de €1.691.218,36 referente ao valor de IRC referido no ponto 14. ao abrigo do Decreto-Lei 67/2016 de 3 de Novembro - cf. termo de adesão, comprovativos de pagamento e documentos a págs. 1040 e 1051 do SITAF;
18. Na sequência pagamento referido no ponto anterior a Autoridade Tributária e Aduaneira anulou a liquidação de juros compensatórios referida no ponto 14. –cf. documentos a págs. 1102 do SITAF.»
X
«Nada mais se provou com interesse para a decisão da causa.»
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«O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na posição das partes e na análise crítica e conjugada dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo apenso.»
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2.2. De Direito.
2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa e quanto à apreciação da matéria de facto em que terá incorrido a sentença recorrida.
A sentença julgou procedente a impugnação, determinando a anulação da liquidação adicional de IRC de 2013. Considerou, em síntese, que:
«Do relatório de inspecção não resulta se os serviços de inspecção pesquisaram sobre a existência de outros contratos de licenciamento de utilização de marcas entre entidades independentes que actuem no mesmo sector de actividade económica ou em sector semelhante, qual a sua duração, qual o valor dos royalties acordado em contratos celebrados entre entidades independentes para a utilização de marcas ou activos equiparados ou se o seu pagamento estava ou não associado a uma percentagem sobre vendas. // Os serviços de inspecção tributária não identificaram as operações que, no seu entender, reúnem as condições para serem consideradas comparáveis com a operação vinculada aqui em causa e que os levaram a concluir que nenhuma entidade independente estaria disposta a celebrar um contrato com os termos e condições estipulados no contrato referente à operação vinculada. // Deste modo, se a Administração Tributária afirma que, quanto ao pagamento de royalties, no presente caso, não foram praticadas condições idênticas às que seriam praticadas entre entidades independentes, em operações comparáveis, cabia-lhe demonstrar, à luz do disposto nos artigos 74º, n.º 1, da LGT, 63º, n.º 1, do Código do IRC e 1º, n.º 1, 4º e 5º da Portaria n.º 1446-C/2001, quais foram as operações não vinculadas realizadas entre entidades independentes, nomeadamente os seus termos e condições, selecionadas para a comparação exigida, bem como o grau e os factores de comparabilidade entre a operação vinculada e uma operação não vinculada, nos termos das disposições legais supra mencionadas, o que, no presente caso, não se verificou atenta a ausência de qualquer referência aos termos e condições celebrados em que operações comparáveis e entre que entidades independentes (actuantes no mesmo ou em semelhante ramo de actividade)».
2.2.2. A recorrente censura o veredicto que fez vencimento na instância, assaca-lhe erro de julgamento quanto à apreciação da matéria de facto e quanto ao enquadramento jurídico da causa.
Apreciação. O quadro normativo relevante é o seguinte:
i) «Nas operações comerciais, incluindo, designadamente, operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis» (1).
ii) «Quando a Direcção-Geral dos Impostos proceda a correcções necessárias para a determinação do lucro tributável por virtude de relações especiais com outro sujeito passivo do IRC ou do IRS, na determinação do lucro tributável deste último devem ser efectuados os ajustamentos adequados que sejam reflexo das correcções feitas na determinação do lucro tributável do primeiro» (2).
iii) «O sujeito passivo deve adoptar, para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método ou métodos susceptíveis de assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações ou séries de operações que efectua e outras substancialmente idênticas, em situações normais de mercado ou de ausência de relações especiais tendo em conta, designadamente, as características dos bens, direitos ou serviços, a posição de mercado, a situação económica e financeira, a estratégia de negócio, e demais características relevantes dos sujeitos passivos envolvidos, as funções por eles desempenhadas, os activos utilizados e a repartição do risco» (3).
iv) «Considera-se como método mais apropriado para cada operação ou série de operações aquele que é susceptível de fornecer a melhor e mais fiável estimativa dos termos e condições que seriam normalmente acordos, aceites ou praticados numa situação de plena concorrência, devendo ser feita a opção pelo método mais apto a proporcionar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações vinculadas e outras não vinculadas e entre as entidades seleccionadas para a comparação, que conte com melhor qualidade e maior quantidade de informação disponível para a sua adequada justificação e aplicação e que implique o menor número de ajustamentos para efeitos de eliminar as diferenças existentes entre os factos e as situações comparáveis» (4).
v) «Duas operações reúnem as condições para serem consideradas comparáveis se são substancialmente idênticas, o que significa que as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares, de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptívies de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajustamentos que eliminem os efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas» (5).
A este propósito, constitui jurisprudência fiscal assente a seguinte:
i) «Para que a AT possa corrigir o lucro tributável em virtude de relações especiais entre o contribuinte e outra entidade, necessário se torna que tenham sido estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes e que o lucro apurado na contabilidade seja diverso do que se apuraria na ausência dessas relações» (6).
ii) «A determinação de preços de livre concorrência deve ser efectuada de acordo com uma metodologia específica, cujo critério fundamental é o da comparabilidade, ao mais elevado grau, com operações substancialmente análogas realizadas entre partes independentes» (7).
iii) «(…) deve ser anulada a liquidação emitida ao abrigo do artigo 58.º do CIRC se a Administração Tributária não logrou demonstrar que, no caso concreto, as operações apresentam características económicas e financeiras relevantes suficientemente similares capazes de assegurar o elevado grau de comparabilidade legalmente exigido para que sejam realizadas correcções à matéria tributável por via do regime dos preços de transferência»(8)
iv) «Se a AT opta pelo método do preço comparável de mercado, tem de concretizar qual ou quais as operações entre entidades independentes que serviram de termo de comparação à que foi efectuada pelo sujeito passivo impugnante, e, sendo o caso, quais os factores mais comparáveis dessa operação análoga ou similar entre entidades independentes foram tidos em conta ou relevados, depois de efectuados os ajustamentos necessários a assegurar o “mais elevado grau de comparabilidade”, como preconizado no citado n.º 2 do art.º 58.º do CIRC. // Não o fazendo, nem se invocando a singularidade da operação, a correcção em preços de transferência enferma de ilegalidade por erro nos pressupostos». (9)
Mais se refere o seguinte.
«O princípio da plena concorrência faz necessariamente parte da apreciação efetuada pela Comissão das medidas fiscais concedidas a empresas de um grupo nos termos do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado, independentemente de um Estado-Membro ter incorporado este princípio no seu sistema jurídico nacional e sob que forma. É utilizado para determinar se os lucros tributáveis de uma empresa de um grupo para efeitos do imposto sobre o rendimento das sociedades foram determinados com base numa metodologia que produz uma aproximação fiável dos resultados baseados no mercado. Uma decisão fiscal que subscreva essa metodologia assegura que essa empresa não é tratada favoravelmente ao abrigo das regras gerais de tributação dos lucros das sociedades no Estado-Membro em causa comparativamente a empresas autónomas que são tributadas sobre os seus lucros contabilísticos, o que reflete os preços determinados no mercado negociados em condições de plena concorrência. O princípio da plena concorrência aplicado pela Comissão para apreciar as decisões relativas à fixação dos preços de transferência ao abrigo das regras em matéria de auxílios estatais é, por conseguinte, uma aplicação do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado, que proíbe as desigualdades de tratamento em matéria de tributação de empresas na mesma situação factual e jurídica. Este princípio vincula os Estados-Membros, e as regras fiscais nacionais não estão excluídas do seu âmbito de aplicação. // Ao examinar se uma decisão relativa à fixação dos preços de transferência é conforme com o princípio da plena concorrência inerente ao artigo 107.o, n.o1, do Tratado, a Comissão pode ter em conta as orientações fornecidas pela Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos («OCDE»), em especial os «Princípios da OCDE em matéria de preços de transferência destinados às empresas multinacionais e às administrações fiscais». Estes princípios não tratam de questões de auxílios estatais per se, mas captam o consenso internacional em matéria de fixação de preços de transferência e fornecem orientações úteis para administrações fiscais e empresas multinacionais sobre a forma de assegurar que a metodologia de fixação dos preços de transferência produz resultados em conformidade com as condições de mercado. Por conseguinte, se um acordo de fixação dos preços de transferência estiver em conformidade com as orientações fornecidas pelos Princípios da OCDE em matéria de preços de transferência, incluindo as orientações sobre a escolha do método mais apropriado, e conduzir a uma aproximação fiável de resultados baseados no mercado, uma decisão fiscal que subscreva esse acordo não é suscetível de constituir um auxílio estatal» (10).
A fundamentação da correcção em exame decorre do ponto 12. do probatório.
Não está em causa a existência de relações especiais entre as sociedades envolvidas no pagamento de Royalties, mas antes saber se a recorrente logrou demonstrar a ocorrência de transferência de rendimento entre sociedades vinculadas, através da prática de preços de transacção não conformes ao mercado, em plena concorrência. A recorrente entendeu ser de aplicar ao caso o método do fracionamento do lucro. Nos termos do artigo 9.º/1 a 3, da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21.12.2001, «[o] método do fraccionamento do lucro é utilizado para repartir o lucro global derivado de operações complexas ou de séries de operações vinculadas realizadas de forma integrada entre as entidades intervenientes. // A modalidade de aplicação do método admitida consiste em determinar o lucro global obtido pelas partes intervenientes nas operações vinculadas e, de seguida, proceder ao seu fraccionamento entre aquelas entidades, tendo como critério o do valor relativo da contribuição de cada uma para a realização das operações, considerando para esse efeito as funções exercidas, os activos utilizados e os riscos assumidos por cada uma e, bem assim, tomando como referência dados externos fiáveis que indiquem como é que entidades independentes exercendo funções comparáveis, utilizando o mesmo tipo de activos e assumindo riscos idênticos teriam avaliado as suas contribuições. // Em alternativa, é admitida outra modalidade de aplicação do método, a qual consiste no fraccionamento do lucro global das operações em duas fases: // a) Na primeira, a cada uma das entidades intervenientes é atribuída uma fracção do lucro global que reflicta a remuneração apropriada susceptível de ser obtida com o tipo de operações que realiza, determinando-se a partir de dados comparáveis sobre as remunerações normalmente obtidas por entidades independentes quando realizam operações similares e tendo em consideração as funções exercidas, os activos utilizados e os riscos assumidos, podendo ser usado, para este efeito, qualquer dos restantes métodos; // b) Na segunda, procede-se ao fraccionamento do lucro ou do prejuízo residual entre cada uma das entidades, em função do valor relativo da sua contribuição, tendo em conta as funções relevantes exercidas, os activos utilizados e os riscos assumidos e recorrendo, para o efeito, à informação externa disponível que forneça indicações sobre o modo como partes independentes repartiriam o lucro ou o prejuízo em circunstâncias similares, sendo o lucro assim atribuído utilizado para determinar o preço».
«Este método pode ser utilizado sempre que: // a) As operações vinculadas revelem um elevado grau de integração, tornando difícil avaliar as operações de forma individualizada; // b) A existência de activos incorpóreos de elevado valor e especificidade torne impossível estabelecer um grau apropriado de comparabilidade com operações não vinculadas e não permita a aplicação dos restantes métodos (4). // Sempre que as operações realizadas não sejam comparáveis em todos os aspectos considerados relevantes, e as diferenças identificadas produzam um efeito significativo na análise do fraccionamento do lucro, o sujeito passivo deve fazer os ajustamentos necessários para eliminar tal efeito, por forma a determinar a repartição do lucro global correspondente à de operações complexas ou séries de operações não vinculadas comparáveis» (5).
Do relatório inspectivo resulta o seguinte:
(…). 5.2. Avaliação da conformidade do preço de transferência com o que seria praticado entre entidades independentes - Considerando o ante exposto, importa analisar a conformidade com o Princípio de Plena Concorrência dos preços praticados nas operações de licenciamento supra descritas. De acordo com o disposto nos §1.33 e 1.34 das Orientações da OCDE, a aplicação do Princípio de Plena Concorrência, assenta, de um modo geral, na comparação entre as condições praticadas numa operação vinculada e as condições praticadas numa operação entre empresas independentes. Para determinar o grau de comparabilidade entre operações, refere esta fonte doutrinária, é necessário entender o modo como as sociedades independentes avaliam os termos de eventuais operações e, na ponderação das condições de uma eventual operação, dever-se-á ter presente que aquelas sociedades independentes vão comparar essa operação com outras poções que realisticamente se lhes oferecem, e só concluem uma operação se não tiverem outra alternativa mais vantajosa. Este articulado materializa o paralelismo existente entre o Princípio de Plena Concorrência e o princípio do sound business purpose que deverá assistir a uma gestão empresarial eficaz e eficiente. Relativamente às operações controvertidas é de realçar, desde logo, que a transferência/cedência deste tipo de ativos intangíveis - marcas - se traduz na assunção de um conjunto de riscos, ligados à forte incerteza que envolve a sua avaliação enquanto bem incorpóreo, bem como a avaliação do seu potencial de geração de benefícios económicos futuros. Neste contexto, e no quadro de um Licence Agreement celebrado entre empresas independentes, os termos contratuais acordados entre as partes salvaguardariam, necessariamente, os interesses de ambas, nomeadamente, preveriam a possibilidade de optar por contratos de menor duração ou contemplariam cláusulas de revisão de preços. Na situação em apreço não se verificou qualquer cláusula de salvaguarda deste tipo, permanecendo atualmente os pressupostos (qualitativos e quantitativos) do contrato originariamente celebrado. Neste sentido, é inequívoco que tal situação apenas é admissível e compreensível quando um contrato desta natureza é celebrado entre entidades relacionadas, que fazem parte integrante de um mesmo grupo económico, existindo pois uma comunhão de interesses entre as partes envolvidas. Ora, tal como anteriormente se referiu, a R.............. alienou (em 15/12/2007) à sociedade O............. as marcas R.............. e M............. pelos valores de 43.000.000,00€ e 6.200.000,00€, respetivamente, tendo sido quase de imediato (em 18/12/2007) celebrado entre as mesmas partes um contrato de Licence Agreement onde se estabeleciam as condições de utilização pela R.............. das referidas marcas. Com base nesse Licence Agreement, ainda em vigor, comprometeu-se a R.............. a remunerar a: entidade agora detentora das marcas num valor correspondente a uma taxa de licenciamento (royalties) de 0,6% sobre todas as vendas efetuadas pelas lojas R.............. e sobre todas as vendas relativas à marca M............., o que gerou, em 2013, um encargo de 5.389.478,53€ na esfera da sociedade portuguesa. Por outro lado, as condições contratuais obrigam a R.............. a investir, no mínimo, 0,15% do total da sua faturação em ações promocionais e publicidade, tendo efetuado no período de 2013 um investimento que ascendeu a €2.005.904,36 em despesas desta natureza. Este montante excede o montante mínimo disposto contratualmente, uma vez que o Volume de Negócios da R.............. ascendeu, em 2013, a 750.826.867,88 (€ 750.826.867,88 x 0,15% = €1.126.240,30). Verifica-se, assim, que mediante esta transmissão de ativos intangíveis a R.............. se vinculou ao pagamento de um licence fee pela utilização de marcas cuja criação e incremento de valor se verificaram na sua esfera patrimonial, situação que se continua a manter após a alienação, na medida em que esta sociedade é a única responsável pela realização de investimentos para a manutenção e incremento do valor das marcas em apreciação, sem que seja apropriadamente ressarcida pela entidade que detém a propriedade das mesmas. Para além disso, e perspetivando esta operação num horizonte temporal mais alargado, verifica- se que qualquer benefício adstrito á obtenção dos fluxos financeiros gerados pela alienação das marcas se dissipa num prazo reduzido, na medida em que os encargos incorridos pela R.............. relativamente a estas marcas (royalties e gastos com publicidade) superam os fluxos financeiros de que beneficiou na sua alienação. E, por esse motivo, a R.............. foi questionada para que, tendo presente o teor do Licence Agreement, nomeadamente a sua cláusula 7ª, apresentasse a razão pela qual, apesar de não deter a propriedade jurídica das marcas, suporta encargos avultados com a sua promoção, publicitação, investigação e desenvolvimento. Nesse âmbito, veio o sujeito passivo esclarecer que se limitou a cumprir o que foi contratualmente estabelecido, efetuando “publicidade e campanhas promocionais aos seus artigos (como folhetos, painéis e ações de loja)“, esclarecendo ainda que tais encargos “respeitam exclusivamente a publicidade e propaganda efetuada aos produtos comercializados nas suas lojas, na qual é efetuada referência às marcas “R..............” e “M............., cuja utilização é efetuada ao abrigo do contrato de royalties já disponibilizado anteriormente”. Contudo, há que salientar que, no caso em apreço, verifica-se uma total inexistência de investimento na valorização das marcas R.............. e M............. pela sua proprietária polaca, encontrando-se a cargo do sujeito passivo português todo esse investimento, a par da sua normal atividade de promoção de vendas que caracteriza as suas atividades de distribuição. De facto, e tal como se tem constatado, mediante as indagações efetuadas nos procedimentos inspetivos realizados, e como adiante se concretizará, á O............. competem apenas atividades inerentes á mera gestão administrativa das marcas. (…). A marca ultrapassa o conceito de produto em si mesmo, envolvendo toda a empresa e respetiva cadeia de valor, as suas estratégias e os seus objetivos e, ainda, o consumidor. Neste sentido, foi sempre a R.............. que (ao contrário da O.............) realizou, e continua a realizar, os investimentos necessários à valorização das marcas R.............. e M............., pelo que poderemos dizer que se algum benefício foi gerado o mesmo se deveu aos encargos suportados pela R............... Ora, se um negócio semelhante se realizasse entre entidades independentes, sem qualquer tipo de relação societária ou de comunhão de interesses, vemos com alguma dificuldade que a entidade licenciada acordasse em assumir um conjunto de encargos cuja responsabilidade é, inequivocamente, da entidade que detém o ativo (marca), e pelo qual a empresa já paga uma taxa de utilização (royalty). A este respeito, o §6.36 das Orientações da OCDE refere que, quando atividades de marketing são levadas a cabo pela entidade que não detém a propriedade legal da marca, esta entidade deve ser remunerada enquanto prestadora de serviços, pela prestação de serviços promocionais ou, em certos casos, deve beneficiar de uma fração dos rendimentos suplementares imputáveis ao bem incorpóreo de comercialização, o que não acontece no caso em apreciação. Isto porque a R.............. assegura, substituindo-se à entidade detentora das marcas, as atividades inerentes à sua gestão, i.e., publicidade, promoção, divulgação, prospeção, investigação, desenvolvimento, pagando, em paralelo, uma royalty pela utilização dessas marcas (R.............. e M.............), das quais não é a proprietária legal. Com efeito, mesmo após a venda das marcas, continuaram na esfera da R.............. um conjunto de atribuições que deveriam pertencer à O............., na qualidade de detentora das referidas marcas, tais como: Dar conhecimento da marca ao cliente; Desenvolver uma identidade de marca; Desenvolver uma estratégia de comunicação; Conceber e produzir campanhas de marca; Coordenar campanhas dentro do mercado; Negociar e celebrar acordos de patrocínio para melhorar o conhecimento da marca. (…). Estas atividades materializam aquilo que a moderna teoria empresarial designa por branding. Este consiste no conjunto de ações tendentes ao desenvolvimento da associação de um nome a um produto ou uma entidade, na mente dos consumidores, potenciando uma diferenciação valorizadora relativamente aos seus concorrentes. (…). Pelo ante dito, a marca e a sua gestão, e o marketing e a promoção de vendas, são realidades indissociáveis, na medida em que todo e qualquer esforço publicitário visando a promoção de vendas só terá sucesso se suportado por uma apropriada estratégia de branding que conheça o cliente alvo, influenciando-o na sua decisão de compra e, em paralelo, uma estratégia de marca só atingirá os seus propósitos, se a estratégia de marketing tiver sucesso na colocação dos produtos junto dos clientes, corroborando a imagem que estes percecionam da marca, e estimulando a perceção do seu valor. O sucesso das atividades de publicidade e promoção de vendas desenvolvidas pela R.............. encontra-se, assim, sustentado por um conhecimento prévio dos mercados e consumidores alvo, em razão da estratégia e posicionamento estabelecidos para as marcas R.............. e M............., cuja definição é da responsabilidade da R.............., não se vislumbrando na esfera patrimonial da O............. qualquer atividade conexa com esta abordagem de aproximação ao cliente e ao mercado. Deste modo, não se encontram na esfera patrimonial da O............. os riscos e funções inerentes à criação do valor destas insígnias, já que é a R.............. a responsável pela promoção das marcas e pela sua publicitação, bem como pelo seu desenvolvimento e criação de uma identidade de marca junto dos consumidores, assumindo ainda o risco comercial da sua utilização. Refira-se que, em condições de plena concorrência, todas estas funções e responsabilidades seriam atribuíveis a quem detém a propriedade do ativo intangível, neste caso, a O.............. Contudo, esta última entidade não suporta quaisquer encargos inerentes à posse e valorização das referidas insígnias, conforme foi possível constatar pela análise as suas contas, nem tão pouco possui estrutura para suportar os riscos e funções de detenção legal e de facto das mesmas. Efetivamente, analisada a Demonstração de Resultados da O............. para 2013, destacam-se os gastos contabilizados com a amortização de marcas que representaram 97,72% do total dos custos operacionais registados. Pelo contrário, os gastos com salários representaram em 2013 apenas 0,06% do total de custos operacionais da O.............. Ora, sabendo-se que a gestão de uma marca está relacionada com a criação e a manutenção da confiança nessa marca, facilmente se depreende, com base nas percentagens de gastos apresentadas, que a empresa polaca não detém um quadro de pessoal qualificado que se dedique ao desenvolvimento e gestão das marcas, tarefas que são efetuadas pela empresa portuguesa, ou por esta contratadas junto de outras empresas do Grupo JM, como anteriormente se evidenciou. Mais acresce que, tendo o sujeito passivo sido notificado, no âmbito do procedimento inspetivo, para proceder à identificação dos investimentos efetuados pela O............. na valorização das marcas, na qualidade de proprietária das mesmas, bem como das consultas levadas a cabo pela O............. relativas ao uso e desenvolvimento da marca, à qualidade, à estratégia de vendas, ao marketing, à coordenação internacional e a oportunidades de aquisição, nos termos previstos na cláusula 4.ª (Consulting) do Licence Agreement, veio este apresentar um documento proveniente da O............. intitulado 'Activity report 2013 regarding the trademarks M............. and R.............. CASH&C....), contendo, segundo refere, “a título de exemplo, algumas das actividades específicas por si realizadas em 2013 e subjacentes às suas marcas R.............. Cash & C.... e M............., bem como um (segundo) documento (com igual titulo}, proveniente da O............., contendo “a identificação das funções por si desenvolvidas com o objectivo de proteger, promover e valorizar as marcas de que ê legitima titular, a saber. R.............. Cash & C.... e M.............". Analisando o teor de ambos os documentos, verificamos que se reportam, em suma, à mera gestão das referidas marcas, incluindo atividades como sejam: a renovação de fees inerentes a domínios na internet, o envio quadrimestral das faturas relativas âs royalties a pagar pela R.............., o envio dos formulários 21-RH, e-maits relativos a ações de oposição a intentar contra o registo e outros e-maits relativos às marcas em causa. Verifica-se, assim, que a atividade da O............. reportada neste relatório respeita a uma mera gestão (administrativa e legal) das referidas marcas, seja pela via da renovação de fees inerentes a domínios na internet, seja pela simples proteção do registo das marcas aquando da oposição por si ou contra si apresentada. Não existe um único acontecimento relativo â promoção, publicitação, investigação e desenvolvimento das marcas, ou a qualquer outra atividade suscetível de gerar valor acrescentado para as mesmas. Podemos, por isso, afirmar que a criação de valor dos ativos intangíveis em análise é conduzida pela R.............., por via das ações publicitárias e de promoção levadas a cabo, não apenas relativamente a produtos específicos, mas também relativamente às próprias marcas, sendo que a O............. apenas suporta gastos relativos à detenção dos ativos, como sejam as amortizações e o pagamento de taxas. A importância que o investimento na promoção da marca R.............. representa para a própria R.............. está, aliás, bem expressa no seu Relatório e Contas de 2012 o qual refere, designadamente, que (…). Assim, é o próprio sujeito passivo que fornece elementos sobre a forma como pretende promover a marca R.............. e desenvolver novos canais de negócio que lhe permitirão, expectavelmente, incrementar as suas vendas e aumentar a sua quota de mercado. No que respeita à campanha promocional implementada para celebrar os 40 anos da R.............. não parecem existir dúvidas de que o que se está a promover é a própria insígnia e não qualquer tipo de produto específico. (…). Efectivamente, no âmbito da sua actividade a R.............. beneficia da estrutura do grupo, aproveitando um conjunto de serviços de apoio especializado prestados pela JM SGPS ou por outras entidades do grupo (…). O valor dos serviços prestados é posteriormente debitado à R.............. (e nunca à O.............), tendo em conta o nível dos serviços prestados e o benefício obtido, atingindo valores muito expressivos, conforme identificado no já referido ponto 3.3 do presente relatório. Verifica-se assim que a O............., para além de não desempenhar quaisquer funções com vista à valorização das marcas que adquiriu, também não promove o seu desenvolvimento através de outras entidades, não suportando quaisquer importâncias a esse título, nem exerce sequer qualquer tipo de controlo sobre as políticas de investimento seguidas pelo grupo. As marcas R.............. e M............. são, pelos motivos descritos, realidades complexas que, não se circunscrevendo aos nomes comerciais a elas subiacentes. envolvem igualmente um know-how diverso associado às atividades da distribuição e de assistência ao cliente, indissociavelmente relacionados e de grande valor acrescentado, cuia criação é da exclusiva responsabilidade da R.............., e de outras entidades suas relacionadas residentes em Portugal, cujos serviços e know-how especializados constituem gasto da R.............., materializando-se num elevado investimento na criação de valor das marcas em apreciação. (…). Assim, considerando tudo o ante exposto, demonstra-se que estas operações enfermam de uma clara não conformidade com o Princípio de Plena Concorrência, uma vez que estamos perante operações que entidades independentes não estariam dispostas a viabilizar, na medida em que uma entidade está a suportar um encargo, ao contribuir ativamente para valorização de um ativo cuja propriedade não lhe pertence, sem ser por isso devidamente compensada. (…). Ora, tal como se refere nos §1.33 e 1.34 das Orientações da OCDE, na ponderação das condições de uma eventual operação, as sociedades independentes vão comparar essa operação com outras opções que realisticamente se lhes oferecem e só concluem a operação se não tiverem outra alternativa claramente mais vantajosa. Tal preocupação, notoriamente, não assistiu às entidades intervenientes nestas operações, na medida em que destas resultou uma solução claramente desvantajosa para a sociedade portuguesa. Por tudo o ante exposto, e considerando a inexistência de contributos proativos da O............. na valorização das marcas que licenciou, e consequentemente para a cadeia de valor da atividade de distribuição realizada pela R.............. com recurso a estas marcas, afigura-se-nos que a remuneração auferida sob a forma de rovalties pagas por aquela entidade portuguesa não é consentânea com o Princípio de Plena Concorrência preconizado no n.º 1 do artigo 63º do Código do IRC»

Ou seja, por outra palavras,
i) No que respeita aos elementos materiais da transacção, consta do relatório inspectivo, que: Na análise efetuada às demonstrações financeiras e às declarações fiscais do sujeito passivo, verificou-se que este suportou em 2013 gastos com o pagamento de royalties à sociedade polaca O............., no valor de 5.389.478,53€, relativos aos direitos de utilização das marcas R.............. e M............., titulados por um contrato de licenciamento celebrado com aquela entidade. Refira-se que as insígnias em apreço, originalmente desenvolvidas e registadas pela R.............., haviam sido alienadas à O............., em 15/12/2007, com a qual foi seguidamente celebrado o referido contrato de licenciamento para utilização das marcas cedidas (Licence Agreement), com efeitos a partir de 18/12/2007. 4.1. O Licence Agreement - De acordo com o que havia sido solicitado, o sujeito passivo disponibilizou uma fotocópia do Licence Agreement, celebrado entre a O............. e a R............... O documento apresentado, em vigor a partir de 18 de dezembro de 2007 e válido por um período mínimo de 20 anos (durante o qual não pode ser revogado), descreve os termos e condições acordados entre as partes, focando os seguintes pontos: (…). Licenciamento - procede à identificação do objeto e âmbito da licença, delimitando o conteúdo dos direitos de utilização abrangidos pela licença, bem como o seu âmbito territorial e temporal. Nestes termos, a entidade licenciadora, a O............., confere à entidade licenciada, a R.............., com efeitos a partir de 18 de dezembro de 2007, o direito exclusivo de uso da licença em Portugal, o qual não pode ser alvo de sub-licenciamento sem o prévio consentimento por escrito da primeira; Marca - define as obrigações relacionadas com a salvaguarda das marcas licenciadas, bem como as formas de exploração destas (qualidade dos produtos, horários, ...). Ao abrigo desta cláusula, a entidade licenciadora compromete-se apenas a promover a proteção e defesa das marcas em Portugal, suportando os respetivos gastos; Consulta - estabelece a obrigatoriedade de a O............. consultar a R.............. no que concerne ao uso e desenvolvimento da marca, qualidade dos produtos, estratégia de vendas, marketing, coordenação internacional e oportunidades de aquisição; Pagamento de um fee - define a taxa de remuneração a pagar pelo licenciamento das marcas e a periodicidade dos pagamentos. De acordo com esta cláusula os pagamentos serão efetuados trimestralmente e serão calculados nos seguintes termos: 0,6% sobre as vendas líquidas efetuadas em todas as lojas operadas pela sociedade R.............. em Portugal como remuneração pelo uso da marca R..............; 0,6% sobre as vendas líquidas de produtos comercializados sob a marca M............., efetuadas em todas as lojas operadas pela sociedade R.............. em Portugal ou através de quaisquer outros canais de venda; e, 0,6% sobre as vendas líquidas de produtos comercializados sob as marcas R.............. e M............., efetuadas nas lojas de outras entidades autorizadas a comercializar as referidas marcas. Registo - é definida a obrigatoriedade de a R.............. manter uma contabilidade e registos completos e exatos de todas as vendas de produtos, que suportem o cálculo das taxas de licenciamento a pagar ao abrigo do Licence Agreement, os quais poderão ser examinados e confirmados pela O.............; Promocão da Marca - é estipulado que, para além do pagamento das fees definidas no contrato, a R.............. se obriga a investir 0,15% da sua faturação em publicidade institucional e promoções específicas diversas; Duração do contrato - é estabelecido que o contrato é celebrado por tempo indeterminado, não podendo contudo ser rescindido antes de 17 de dezembro de 2027 (20 anos), salvo se existir incumprimento das condições definidas no acordo e tal incumprimento exercer efeitos adversos relevantes sobre a parte que solicita a rescisão. Saliente-se que da análise às cláusulas do referido acordo constata-se que, em momento algum, se estabelece qualquer penalidade no caso de incumprimento dos termos estabelecidos e aceites por ambas as entidades. Por outro lado, também não se vislumbra a assunção de qualquer responsabilidade imputável à entidade detentora da marca - O............. - designadamente ao nível da tomada de riscos inerentes à detenção de um ativo desta natureza, quer ao nível da sua promoção, quer ao nível do seu desenvolvimento e valorização.
ii) Não existem estudos, nem operações, suscetíveis de integrar o conceito de operação comparável, dado o valor (e relevância no contexto da operação) das marcas em causa (ponto 4.2. do relatório inspectivo).
iii) A impugnante cedeu à empresa polaca “O.............” a titularidade das marcas R.............. e Master chef, mas mantém todas as responsabilidades inerentes à gestão e desenvolvimento das marcas em referência, sendo que a operação de alienação apenas serve de veículo à transmissão para a referida empresa do rendimento gerados por tais marcas, colocando-se a mesma numa posição passiva de recebedora de ganhos advindos de uma actividade gerada pela empresa impugnante.
iv) Como se refere no relatório inspectivo, Verifica-se, assim, que mediante esta transmissão de ativos intangíveis a R.............. se vinculou ao pagamento de um licence fee pela utilização de marcas cuja criação e incremento de valor se verificaram na sua esfera patrimonial, situação que se continua a manter após a alienação, na medida em que esta sociedade é a única responsável pela realização de investimentos para a manutenção e incremento do valor das marcas em apreciação, sem que seja apropriadamente ressarcida pela entidade que detém a propriedade das mesmas. Para além disso, e perspetivando esta operação num horizonte temporal mais alargado, verifica- se que qualquer benefício adstrito á obtenção dos fluxos financeiros gerados pela alienação das marcas se dissipa num prazo reduzido, na medida em que os encargos incorridos pela R.............. relativamente a estas marcas (royalties e gastos com publicidade) superam os fluxos financeiros de que beneficiou na sua alienação. E, por esse motivo, a R.............. foi questionada para que, tendo presente o teor do Licence Agreement, nomeadamente a sua cláusula 7ª, apresentasse a razão pela qual, apesar de não deter a propriedade jurídica das marcas, suporta encargos avultados com a sua promoção, publicitação, investigação e desenvolvimento. Nesse âmbito, veio o sujeito passivo esclarecer que se limitou a cumprir o que foi contratualmente estabelecido, efetuando “publicidade e campanhas promocionais aos seus artigos (como folhetos, painéis e ações de loja)“, esclarecendo ainda que tais encargos “respeitam exclusivamente a publicidade e propaganda efetuada aos produtos comercializados nas suas lojas, na qual é efetuada referência às marcas “R..............” e “M............., cuja utilização é efetuada ao abrigo do contrato de royalties já disponibilizado anteriormente”. Contudo, há que salientar que, no caso em apreço, verifica-se uma total inexistência de investimento na valorização das marcas R.............. e M............. pela sua proprietária polaca, encontrando-se a cargo do sujeito passivo português todo esse investimento, a par da sua normal atividade de promoção de vendas que caracteriza as suas atividades de distribuição. De facto, e tal como se tem constatado, mediante as indagações efetuadas nos procedimentos inspetivos realizados, e como adiante se concretizará, á O............. competem apenas atividades inerentes á mera gestão administrativa das marcas. (…) (11).
Dos elementos coligidos nos autos resulta que a recorrente logrou demonstrar que o acordo de cedência de direitos não tem arrimo na concorrência efectiva, no quadro de operações idênticas, realizadas por entidades independentes. Os estudos apresentados pela impugnante não logram subverter tal asserção, dado que, como resulta do probatório (12), respeitam as operações e segmentos de mercado distintos daquele que está em causa nos autos. A previsão do pagamento de royalties, pela cedência das marcas, associada à prestação não remunerada dos serviços de gestão e promoção das marcas em causa pela impugnante, logram comprovar a ocorrência de uma situação desviante em relação à plena concorrência, com alocação de rendimento em jurisdição fiscal distinta do Estado da fonte, sem justificação aparente. A aplicação do método do fracionamento do lucro (artigo 9.º da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21.12.2001) não merece censura. Estão em causa activos intangíveis, pelo que a invocação da comparabilidade das transacções, em casos como o presente, não permite apreender as relações estabelecidas entre as empresas envolvidas. Mais se refere que a empresa polaca recebedora dos Royalties assume uma margem mínima de custos com pessoal, sendo que os gastos com amortização de marcas representam 97,72% dos seus custos operacionais. De onde resulta o carácter não justificado das obrigações emergentes para a recorrida do contrato de licenciamento em apreço.
Perante a demonstração do carácter desviante em relação aos termos de transacção em plena concorrência, verifica-se que as obrigações declarativas da contribuinte (artigos 13.º a 16.º da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21.12.200) não foram observadas, porquanto faltam elementos que permitiriam justificar o ajustamento necessário.
Pelo que a correcção em exame não merece reparo, devendo ser confirmada na ordem jurídica. Ao julgar em sentido discrepante, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, pelo que deve ser substituída por decisão que julgue improcedente a impugnação.
Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.3. No que respeita ao pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça, cumpre referir que, nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, «[n]as causas de valor superior a €275000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento». Como decorre da Tabela I do RCP, quando o valor da causa seja superior a €275.000,00, ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada €25.000 ou fracção, três unidades de conta, no caso da coluna A, uma e meia unidade de conta no caso da coluna B e quatro e meia unidades de conta no caso da coluna C. «É esse remanescente, ou seja, o valor da taxa de justiça correspondente à diferença entre €275.00,00 e o efectivo superior valor da causa para efeito da determinação daquela taxa, que deve ser considerado na conta final, se o juiz não dispensar o seu pagamento» (13). «A referência à complexidade da causa significa, em concreto, a sua menor complexidade ou simplicidade e a positiva atitude de cooperação das partes» (14). Nos termos do artigo 527.º, n.º 1, do CPC, «[a] decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito». Nos termos do n.º 2 do preceito, «[e]ntende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for». No caso em exame, o valor da causa corresponde €1.810.020,65.
Sobre a matéria constitui jurisprudência assente a de que o direito fundamental de acesso aos tribunais (art.º 20.º, n.º 1, da CRP) implica que os custos da prestação do serviço da justiça sejam comportáveis atenta a capacidade contributiva do cidadão médio. «Sob este ponto de vista, pode acontecer que a fixação da taxa de justiça calculada apenas com base no valor da causa (particularmente se em presença estiverem procedimentos adjectivos de muito elevado valor) patenteie a preterição desse direito fundamental, evidenciando um desfasamento irrazoável entre o custo concreto encontrado e o processado em causa». [Ac. do TCAS, de 13.03.2014, P. 07373/14]. A aferição da complexidade da causa deve ter em conta o disposto no artigo 530.º/7, do CPC. Assim, consideram-se de especial complexidade, as acções que: «a) Contenham articulados ou alegações prolixas; b) Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou // c) Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas».
No caso em exame, os autos não preenchem nenhum dos requisitos enunciados com vista a aferir da especial complexidade dos mesmos. Por outras palavras, a especialidade da causa não é de molde a afastar o limiar do valor de €275.00,00, dado que a complexidade ou especificidade não justificam a imposição de encargos dissuasores do acesso à justiça. O mesmo se diga do comportamento processual das partes, o qual se pautou pelo cumprimento do dever de boa fé processual. Por outras palavras, atendendo à lisura do comportamento processual das partes e considerando a relativa complexidade do processo, afigura-se ser de deferir o pedido quanto à dispensa do pagamento da taxa de justiça na conta final, em relação a ambas as partes.
Pelo exposto, impõe-se deferir o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º/7, do RCP. Termos em que se procederá no dispositivo.
X
Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, na parte impugnada, e julgar improcedente a impugnação, nessa parte, com a consequente manutenção do acto tributário.
Custas pela recorrida, sem prejuízo da dispensa do remanescente da taxa de justiça em relação a abas as partes.
Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês - Relator)

(1.ª Adjunta – Patrícia Manuel Pires)

(2.º Adjunto – Vital Lopes)


(1) Artigo 63.º/1, do CIRC (versão vigente).
(2) Artigo 63.º/11, do CIRC (versão vigente). V. também, artigo 3.º/2, da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21.12.2001
(3) Artigo 63.º/2, do CIRC (versão vigente).
(4) Artigo 4.º/2, da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21.12.2001.
(5) Artigo 4.º/3, da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21.12.2001.
(6) Acórdão do TCAS, de 17.03.2016, P. 04412/10.
(7) Acórdão do TCAS, de 19.02.2015, P. 07049/13.
(8) Acórdão do STA, de 15-12-2022, P. 02142/11.8BELRS
(9) Acórdão do TCAS, de 30-06-2022, P. 1339/13.0BELRA
(10) §§172 e 173 da Comunicação da Comissão sobre a noção de auxílio estatal nos termos do artigo 107.o, n.o 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, (2016/C 262/01),
In https://eur-lex.europa.eu/legal
(11) Ponto 5.2. do Relatório Inspectivo.
(12) V. relatório inspectivo.
(13) Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais, anotado, 4.ª ed., p. 236.
(14) Salvador da Costa, Regulamento das Custas…, cit., p. 236.