Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1393/11.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:05/22/2019
Relator:HÉLIA GAMEIRO SILVA
Descritores:INSTITUTO DA REVERSÃO NO ÂMBITO DO PROCESSO DA EXECUÇÃO FISCAL;
REGIME NORMATIVO DA DECISÃO DE REVERSÃO;
CITAÇÃO DO REVERTIDO;
INAPLICABILIDADE DO PRINCIPIO DO APROVEITAMENTO DOS ATOS.
Sumário:i. O instituto da reversão produz no processo de execução fiscal uma modificação subjectiva da instância, que opera pelo chamamento do revertido (alguém que não é o devedor que figura no título) à execução, a fim de ocupar nela a posição passiva de executado.

ii. A audiência prévia em sede de reversão da execução fiscal, tem carater de obrigatoriedade (art. 23.º n.º 4 da LGT), pelo que, a sua falta, constitui um vício de forma do procedimento tributário susceptível de conduzir à anulação da decisão que nele vier a ser tomada (cfr.artº.135, do CPA em vigor à data dos factos).

iii. O principio do aproveitamento não atua em sede direito de audição do potencial revertido, face aos elementos que, mesmo comprovadamente, lhe sejam dados a conhecer no âmbito da citação deste na execução fiscal, já que a participação do interessado, enquanto potencial revertido, na fase anterior à reversão, é susceptível de contribuir para a alteração do projeto de decisão, através da junção de elementos de prova e/ou requerendo a produção de diligências instrutórias.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1.ª Sub-secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 – RELATÓRIO

Joaquim ................, melhor identificado nos autos, veio deduzir OPOSIÇÃO à execução fiscal nº ..............., instaurada originariamente à “C........, CRL”.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por decisão de 06 de novembro de 2018, julgou procedente a oposição.

Inconformada, a Fazenda Pública, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

«I - Recorre-se do segmento decisório da sentença proferida pelo Tribunal a quo, na medida em que considera que o oponente pretende que seja declarada a sua ilegitimidade por falta do exercício do direito de audição enquanto revertido na qualidade de devedor subsidiário da devedora principal.

II - Mais concretamente vejamos que o que o oponente pretende é que seja declarada a nulidade da citação o que alega desde logo alegou como questão prévia, em sede de oposição à execução fiscal nº ................

III - A douta sentença proferida pelo Tribunal a quo julgou do seguinte modo: “Tendo ficado provado que no caso a notificação para o exercício da audição prévia (reversão) apesar de ter sido enviada por carta registada para o domicílio do oponente, conhecido pela AT, e que veio devolvida e, não tendo ficado provado que houvesse qualquer aviso colocado pelo distribuidor postal, não funciona a presunção estabelecida no nº 1 do artº 39º do CPPT e, não pode retirar-se a conclusão alegada Tribunal Tributário de Lisboa pela RFP que tendo sido enviada a notificação para a morada correcta considera-se notificado”.

IV - A consequência de tal decisão foi a declaração de ilegitimidade do oponente em sede de execução, apesar de o mesmo nunca evocar a sua ilegitimidade mas sim que não se encontra preenchido o pressuposto da reversão fiscal consubstanciado na fundada insuficiência de bens penhoráveis da executada originária.

V – Ademais, a decisão recorrida deu como provado em E) que “Ao oponente foi enviado o ofício nº ........ de 06-08- 2010, para a morada sita na Quinta .............., nº …, Charneca da Caparica, sob o registo nº RM .................PT (fls 70, dos autos);” e, em F) que “Na carta identificada em E), em 10-08-2010 foi aposta a indicação “não atendeu”, aposta no verso pelo distribuidor postal (fls 70vº, dos autos);”

VI - Ora, não nos podemos conformar com a decisão recorrida porquanto sob errada apreciação da prova documental que se até mostra insuficiente, fez, salvo melhor entendimento e com o devido respeito, uma errada apreciação de direito dos factos.

VII – O oponente consta como identificado na lista dos responsáveis subsidiários, que foram notificados para, querendo, exercer o direito de audição, conforme nº 4 daquele artº 23º da LGT e artº 60º também da LGT.

VIII - O oponente foi citado no processo de execução fiscal nº ............... alegando, em síntese que não foi notificado para o exercício do direito de audição, nos termos e para os efeitos dos artºs 23º nº 4 e 60º da LGT e ainda que não se encontra fundamentada a insuficiência do património da devedora originária.

IX - Estamos perante um acto de cariz administrativo, pelo que quanto ao fim da formalidade legal, a audição consiste na observação do direito consagrado no n.º 5 do artigo 267.º da CRP que determina que o processamento da actividade administrativa deve garantir a participação dos cidadãos na formação das decisões que lhe digam respeito.

Como refere a decisão recorrida “com efeito, dispõe o artº 23º, n.º4 da LGT que «a reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação». (negrito nosso)

X - Portanto, como acima melhor explanámos, face ao fim visado por tal formalidade - direito de audição, o despacho decisório a proferir nessa sede, não constituirá caso julgado senão perante a caducidade do exercício de qualquer meio de defesa legalmente previsto em sede de citação.

XI - E o facto é que o oponente foi posteriormente citado pedindo a nulidade da citação em sede judicial, tudo com fundamento na preterição do direito de audição.

Ou seja, como agora se pode concluir o contribuinte não esgotou os seus meios de defesa perante a Administração relativamente ao acto em crise e aos fins visados por esse acto.

XII - Como refere Jorge Lopes de Sousa em anotação ao art.º 37.º do CPPT, por si anotado e comentado - o Tribunal Constitucional no acórdão n.º 245/99 entendeu que a norma do n.º 2 do art.º 31.º do LPTA (equivalente ao n.º 2 do art.º 37.º do CPTT, ao fazer recair sobre o interessado o ónus de requerer, no prazo de um mês, a notificação da fundamentação em falta no acto, como meio de deferir o início do prazo de recurso contencioso, não viola qualquer norma ou princípio constitucional, designadamente o art.º 268.º n.º 3, da Constituição da República, por ela não dispensar “a Administração de notificar integralmente o acto administrativo ao respectivo interessado, apenas prevenindo a hipótese de tal não ter sido feito, manda contar o prazo para o recurso contencioso da data em que o interessado tomar, efectivamente, conhecimento da fundamentação do acto”.

XIII - Ainda a propósito, veja-se o acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional, proferido no processo n.º 332/2005 aflora que não obstante, em muitos casos, a decisão a ser tomada sem observação do direito de audição não poderia deixar de ser idêntica àquela que seria tomada perante os factos apontados pelo contribuinte nessa sede.

XIV - Assim, e não obstante melhor entendimento, decorre do enquadramento legal ser devida a aplicação do princípio do aproveitamento dos atos praticados no processo, impondo-se concluir que, face aos argumentos apresentados neste caso concreto, face aos fundamentos de oposição, o exercício do direito de audição nada acrescentaria que possibilitasse a procedência da interposta acção.

XV - Como se pode ainda colher no CPPT anotado e comentado em nota n.º 11 ao art.º 37.º, entende Jorge Lopes de Sousa: “A faculdade prevista no n.º 1 do art.º 37.º, poderá ser utilizada em relação à citação para processo de execução fiscal, se estiver presente uma situação enquadrável na alínea h) do n.º 1 do art.º 204.º deste Código, em que a lei autorize a discussão da legalidade concreta da liquidação da dívida exequenda por não estar legalmente assegurado meio de impugnação contenciosa daquela ou se se tratar de caso em que em que seja admissível impugnação judicial a contar da efectivação da citação, como sucede com os responsáveis subsidiários (art.º 22.º, n.º 4 da LGT).”

XVI - Por outro lado, como podemos epilogar, tendo o oponente alegado a nulidade da citação com fundamento em não ter sido notificado para o exercício do direito de audição, importa desde já adiantar que a jurisprudência maioritária entende que o meio próprio para arguir a nulidade da citação não é a oposição.

XVII - Nos termos supra expostos a sentença recorrida não se pode manter na ordem jurídica face às consequências que extraiu dos factos ou do enquadramento legal seguido.

XVIII - Em consequência deve o despacho em crise manter-se e produzir os devidos efeitos na esfera jurídica do oponente.

Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser julgado procedente anulando-se a recorrida decisão em apreço, com as legais consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.»


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O Recorrido, devidamente notificado para o efeito, optou por não apresentar contra-alegações.

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O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal, nos termos do artigo 289.º, n.º1 do CPPT, veio oferecer o seu parecer no sentido de ser julgada verificada a excepção de incompetência absoluta deste Tribunal, em razão da hierarquia, nos termos das disposições combinadas dos art. 280º nº 1 do C.P.P.T., 26º, al. a) do E.T.A.F. e 96º al. a), 97º nº 1, 98º, 99º nº 2, 576º nº 1 e 2, 577º, al. a), e 578º do C.P.C., estes aplicáveis por força do disposto no art. 2º, al. e), do C.P.P.T, por considerar que a questão a decidir é essencialmente de direito.

Entendemos que a situação em apreço envolve a apreciação da situação fática resultante do exposto nas conclusões da Recorrente (Fazenda Pubilca) evidenciadas nos pontos V e VI, onde se questiona a materialidade dada como provada nos pontos E) e F) do probatório por considerar que a sentença recorrida fez uma errada apreciação dos factos. È o que se retira do texto recursivo que se deixa transcrito: “…sob errada apreciação da prova documental que se até mostra insuficiente, fez, salvo melhor entedimento e com o devido respeito, uma errada apreciação de direito dos factos.”

Termos em que, na aquilatação do pedido, este o tribunal não pode deixar de apreciar, já que a lei do processo tributário reservou claramente a competência do Supremo Tribunal Administrativo (STA) para os recursos de decisões dos Tribunais de 1.ª Instância que versem exclusivamente matéria de direito (art. 280.º n.º 1 do CPPT e 26.º al. a) e b) do ETAF.) - o sublinado é nosso.

Na situação que nos ocupa vem instado ao tribunal pronuncia sobre as ilações que de facto se devem retirar sobre os fctos assentes e bem assim sobre o erro na apreciação e suficiência da prova em que assenta a decisão, matéria que, per si, afasta a competência do STA.

Cumpre assim, apreciar e decidir.


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Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Sub-secção do Contencioso Tributário para decisão.

»«

2 – FUNDAMENTAÇÃO

A sentença recorrida considerou os seguintes factos provados:

«A) Entre a C........, CRL e a Fundação ............ foi celebrado, em 08-05-2006, foi celebrado o Protocolo, junto a fls 145 a 153, dos autos, que se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais, onde constam, nomeadamente as seguintes cláusulas:

(…).


"texto integral no original; imagem"






(…).








(…)

B) Por despacho do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, de 12-09- 2006, junto a fls 158 a 160, que se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais, onde consta, nomeadamente o Considerando:


"texto integral no original; imagem"

C) Em 16-11-2006 foi instaurado o processo de execução fiscal nº ..............., à C........, CRL, na importância de €79.470,97 por dívidas à Caixa Geral de Aposentações (CGA) (fls 54 a 55, dos autos);

D) Por despacho de 05-08-2010 foi proferido despacho que determinou a preparação da execução fiscal identificada em A), para efeitos de reversão contra Joaquim ................ (ora oponente);

E) Ao oponente foi enviado o ofício nº ........ de 06-08-2010, para a morada sita na Quinta .............., nº…, Charneca da Caparica, sob o registo nº RM .................PT (fls 70, dos autos);

F) Na carta identificada em E), em 10-08-2010 foi aposta a indicação “não atendeu”, aposta no verso pelo distribuidor postal (fls 70vº, dos autos);

G) Em 09-11-2010 a Chefe do Serviço de Finanças proferiu o seguinte despacho (fls 91, dos autos):
“Dos elementos do processo, designadamente da informação retirada do sistema informático da detecção de bens penhoráveis, designadamente por SIPA, concebido para o efeito e disponível nos Serviços de Finanças e depois de excutidos os bens da originária devedora, nomeadamente a penhora de créditos existentes junto da Fundação ............, constatou-se a inexistência de quaisquer outros bens penhoráveis da executada, o que, por força do disposto no artº 24º da LGT, constitui fundamento para o chamamento à execução dos seus responsáveis subsidiários.
Dos autos consta a identificação dos responsáveis subsidiários, que foram notificados para, querendo, exercer o direito de audição, conforme nº 4 daquele artº 23º da LGT e artº 60º também da LGT.
O Sr. Joaquim ................ e a Sra Paula ................, nada vieram alegar, pelo que contra eles se reverte a execução.
Quanto ao objecto da notificação – os requisitos para operar a pretendida reversão – sempre se dirá que dispondo o artº 24 da LGT que “os administradores, directores, gerentes e outras pessoas que exerçam ainda que somente de facto, funções de responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si, pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do eu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento”.
Por sua vez o artº 23 estabelece que “a reversão contra os responsáveis subsidiários depende da fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal”.
Converto, pois, em definitivo o projecto de decisão de reverter a decisão contra Joaquim ................ e Paula ................, identificados como responsáveis subsidiários.
Proceda-se à citação dos executados.

H) O oponente foi citado, nos termos seguintes:



"texto integral no original; imagem"


"texto integral no original; imagem"

I) Em 16-12-2010 foi deduzida oposição.

A convicção do tribunal formou-se no teor dos documentos identificados em cada ponto dos factos provados.

Não se provaram, nomeadamente os factos alegados nos artºs 25 a 30, 37 a 41, 49, da petição.»

De direito

Em sede de aplicação de direito a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar procedente a oposição e anular o despacho de reversão, com a consequente absolvição do Oponente da instância executiva por falta de legitimidade processual.

Para assim decidir, considerou a Mma. Juiz a quo, que “…o oponente não foi notificado para exercer o direito de audição prévia à reversão, …”

Antes de mais, se dirá que, como é sabido, são as conclusões das alegações que definem, o objeto do recurso e consequentemente o âmbito de intervenção do Tribunal “ad quem”, com ressalva para as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua apreciação (cfr.artº.s 639.º, do NCPC e 282.º, do CPPT).

Como resulta das conclusões formuladas pela Fazenda Pública, ainda que de forma pouca clara, assentamos em que a questão que nos vem dirigida assenta unicamente em saber se o Recorrido tem ou não legitimidade processual no processo de execução fiscal n.º ............... instaurado originariamente contra C........, CRL.

Fazendo um esforço para entender o raciocínio exposto pela Recorrente nas alegações e conclusões recursivas, parece-nos poder extrair dele alguma imprecisão quanto aos vícios invocados, já que por um lado vem falar do vicio decorrente da falta de notificação para o exercício do direito de audição e por outro o decorrente da falta ou deficiência de citação do revertido – (concl. I a VI).

Individualizando os conceitos, concordamos em dizer que ambas as situações são suscetiveis de conduzir è ilegitimidade do executado, porém em planos bem diferenciados e separados pela prolação do despacho de reversão, não obstante, ambos se circunscevam a pressupostos processuais, ou seja a “…desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder – embora não de modo expresso - uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais…”, - como se lhe refere MANUEL DE ANDRADE, Noções elementares de processo civil, de 1979, página 176 - , cuja falta conduz à verificação da correspondente exceção dilatória, dando lugar à absolvição do Réu da instância, cfr. artigos 576º, n.º 2 e 577º, alínea e), ambos do Código de Processo Civil, caminho que foi, e bem, seguido na sentença recorrida.

Não estando em causa nos autos, acrescenta-se para a afastar, que a legitimidade processual ou formal não se confunde com a legitimidade substancial definida no art. 30.º do NCPC face ao interesse em demandar ou contradizer, e bem assim com eventuais erros da citação nomeadamente, na identificação do citado, por não ser a pessoa citada o próprio devedor que costa no titulo ou o seu sucessor, situação enquadrável na primeira parte da al. b) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT cuja verificação no processo de oposição à execução fiscal dá lugar à procedência do pedido por se tratar de um fundamento legalmente instituído neste tipo de processo.

Continuando, mas antes de prosseguir para a situação que nos ocupa e para que fique bem claro, atenta a desfocagem que se retira das conclusões de recurso, importa esmiuçar as diferenças que ‘grosso modo’ distinguem no processo de execução fiscal a falta de notificação para o exercício do direito de audição antes da prolação do despacho de reversão e a citação do revertido.

Neste campo chamamos á colação os parametros em que se molda o instituto da reversão no âmbito do processo de execução fiscal, para o que convocamos por transcrição o que se disse no acórdão deste Tribunal (TCAS) proferido em 25/05/2017 no proc. n.º 4/16.1BEBJA, que detalhadamente e ele se refere e diz assim:

“(…)

O instituto da reversão é exclusivo da execução fiscal, sendo desconhecido na execução comum, e traduz-se numa modificação subjectiva da instância, pelo chamamento, a fim de ocupar a posição passiva na acção, de alguém que não é o devedor que figura no título. O legislador só consagrou o instituto da reversão na execução fiscal, como alteração subjectiva da instância executiva, para possibilitar que, por essa via, se cobrem, no mesmo processo executivo, as dívidas de impostos, mesmo de quem não ocupa, inicialmente, a posição passiva na execução, por não figurar no título executivo. O que se justifica em atenção à natureza da dívida e aos interesses colectivos em jogo (o legislador concebeu a execução fiscal como um meio mais expedito e célere do que a execução comum, visando a cobrança coerciva das dívidas fiscais), e à certeza e liquidez destas dívidas, atributos que não adornam, necessariamente, as dívidas não tributárias (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 6/2/2002, rec.25037; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/6/2011, proc.4505/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/9/2012, proc.5370/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/6/2014, proc.7634/14; Carlos Paiva, O Processo de Execução Fiscal, Almedina, 2008, pág.179 e 180).

(…)” - O negrito é nosso.

O chamamento do revertido à ação executiva encontra-se regulado na Lei Geral Tributária (LGT) no regime da responsabilidade subsidiária (artigos 23.º e 24.º) devendo ser precedido de audição prévia do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão da reversão, por força do estatuído no art. 23.º n.º 4 do diploma citado, sendo que quanto à declaração fundamentada dos pressupostos e extensão da reversão a norma impõe ainda que sejam incluidos na citação.

Ora a exigência de audiência prévia nesta sede, tem carater de obrigatoriedade, pelo que, a sua falta, constitui um vício de forma do procedimento tributário susceptível de conduzir à anulação da decisão que vier a ser tomada conforme se previa no art.135.º, do Código de Procedimento Administrativo, em vigor á data dos factos.

È desta forma que se entende o especial cuidado que deve revestir o chamamento o revertido à execução, já que, verificados que sejam os requisitos legais, este, vai responder, na primeira pessoa, por dividas de outrem.

A este respeito escreveu-se no acórdão do STA proferido em 09/01/82019 com o n.º 01790/14.9BELRS0670/18 o seguinte:

“(…)

5.1. De acordo com o disposto no nº 1 do art. 23º da LGT, a responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal, sendo o despacho que a ordena (despacho de reversão) o acto que dá início ao procedimento para efectivação da responsabilidade subsidiária.

(…)”

Fica assim clara a importância atribuída ao direito de audição em sede de reversão no processo de execução fiscal face ao intuito de, com ele, se dar a conhecer ao revertido o projeto de decisão de contra si reverter a execução, devendo este através da fundamentação do acto de reversão, ficar a conhecer as razões de facto e de direito que subjazem à decisão do órgão de execução fiscal ficando, deste modo, em condições de a poder impugnar por erro nos pressupostos ou qualquer outro vício.

Distintamente, a citação ocorre na fase processual posterior à prolação do despacho de reversão e constitui o meio capaz de levar ao conhecimento do executado que contra ele corre uma ação executiva (art. 35.º e 189.º e seguintes do CPPT e 219.º do NCPC), neste caso com origem no despacho de reversão (art. 23.º n.º 1 da LGT) e destina-se a chamar o revertido, à execução, agora na qualidade de executado. Sendo que a falta ou irregularidade da citação, sempre que possa prejudicar a defesa do interessado constitui nulidade insanável em processo de execução fiscal e por conseguinte suscetivel de culminar, também ela, na ilegitimidade de executado.

Regressando agora à situação que nos ocupa e à sentença recorrida damos conta que a mesma dá procedência ao vicio de forma, consubstanciado na falta de notificação do revertido para o exercício do direito de audição, deixando, expressamente, por conhecer qualquer dos demais fundamentos de oposição.

Assim e tal como vem sendo dito repetidamente na nossa jurisprudência, os recursos são meios de obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos Tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do Tribunal de que se recorre, visto implicar a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição.

Limitemo-nos pois à apreciação das circunstâncias que levaram à decisão e aos vícios que a ela vem iputados, nomeadamente a questão de saber se o potencial revertido se encontra ou não notificado para o exercício do direito de audição.

Note-se que nas conclusões de recurso a Recorrente se limita a dizer que “O oponente consta como identificado na lista dos responsáveis subsidiários, que foram notificados para, querendo, exercer o direito de audição, conforme nº 4 daquele artº 23º da LGT e artº 60º também da LGT” - (concl. VII), sem contudo pôr em causa a materialidade dada por provada na sentença recorrida, nomeadamente os factos a que se reportam os pontos E) e F) do probatório e que se reportam à devolução ao destinatário da notificação enviada ao revertido no intuito do exercício da audição, nem apela à verificação da presunção de notificação a que se reporta o n.º 1 do art. 39.º do CPPT, na verdade, como muito bem refere o Sr. Procurador Geral Adjunto, no seu douto parecer, a recorrente não coloca em causa a factualidade dada como provada, o que pretende, dizemos nós, é dela tirar ilações que não conduzam á declaração de ilegitimidade do oponente em sede de execução.

Para tal apela ao principio do aproveitamento do atos com a pretensão de demonstrar que nem sempre a preterição do direito de audiência conduz à anulação do acto, pois que, neste caso o revertido tomou conhecimento da decisão fundamentada em sede de citação.

È o que se retira do exposto na conc. XVI “Assim, e não obstante melhor entendimento, decorre do enquadramento legal ser devida a aplicação do princípio do aproveitamento dos atos praticados no processo, impondo-se concluir que, face aos argumentos apresentados neste caso concreto, face aos fundamentos de oposição, o exercício do direito de audição nada acrescentaria que possibilitasse a procedência da interposta acção.”

O que significa que, no entendimento da FP, independentemente do que viesse a ser apresentado ou demonstrado no âmbito do exercício do direito de audição, o despacho de reversão em nada seria diferente, mas também aqui não tem razão.

Na verdade, não desconhecendo este Tribunal o alcance do princípio invocado, é óbvio, que a tese da Recorrente, não é aceitável, por ser para nós evidente que a participação do potencial revertido na fase anterior à reversão, é susceptível de contribuir para a alteração do projeto de decisão, na fase do procedimento de reversão, através da junção de elementos de prova e/ou requerendo a produção de diligências instrutórias.

Não podemos assim aceitar um tal juizo de prognose que, de forma conclusiva, adminta, sem mais, a denecessidade do exercício do direito.

Como supra deixamos referido, a falta de notificação para o exercício do direito de audição gera a invalidade do despacho de reversão proferido.

Assim, anulado o despacho de reversão por preterição de formalidade essencial, fica, sem título, a execução movida contra o ora recorrido, verificando-se quanto a ele a excepção dilatória de ilegitimidade passiva do executada no processo executivo, determinante da absolvição da instância executiva relativamente ao Oponente, aqui Recorrido, o que não impede o órgão da execução fiscal de proferir novo despacho de reversão, sanado que seja o vício que determinou a presente anulação.

Decidindo desta forma deixamos de fora a conclusão recursória enunciada no ponto XVI uma vez que a mesma se reporta a situações sobre as quais o tribunal recorrido não se pronunciou, nomeadamente, a nulidade da citação e o meio próprio para arguir da respetiva nulidade.

Em suma, face a tudo o que vem de dizer-se, há que concluir pela improcedência da totalidade das conclusões da alegação de recurso e, como tal, pelo não provimento do recurso.

A sentença recorrida, nos termos em que decidiu, fê-lo com acerto, devendo ser mantida.

4 - DECISÃO

Em face do exposto, acordam, os juízes da Sub-secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso jurisdicional e manter a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente

Lisboa, 22 de Maio de 2019


(Hélia Gameiro Silva)

(Jorge Cortês)

(Lurdes Toscano)