Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:225/12.6 BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:02/29/2024
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:EXECUÇÃO
PRESTAÇÃO DE PROVAS PÚBLICAS
INSTITUTO POLITÉCNICO
RETROATIVIDADE;
Sumário:I– O momento temporal que importa atender para efeitos da almejada aplicação retroativa de decisão não pode ser anterior à data da pronuncia da entidade destinatária do requerido, qualquer que ela seja.
II- Mesmo que se entendesse ser a condição de Professor Coordenador suscetível de retroagir, não poderia a almejada retroação ser reportada a data anterior à decisão proferida, ainda que de indeferimento, sob pena de, assim não sendo, beneficiar o exequente do indeferimento verificado, pois que em caso de deferimento, teria sido esta a data relevante para que se iniciasse o procedimento tendente à pretendida transição funcional.
III- Por outro lado, se o requerimento indeferido tivesse antes sido deferido, tal não determinava que as funções de Professor Coordenador passassem a ser exercidas de imediato e automaticamente, pois que, em bom rigor, o que vinha requerido era que o exequente fosse admitido a prestar “provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico cientifica para a categoria de professor coordenador”, sendo que, só “em caso de aprovação”, tal determinaria, “a transição, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na categoria de professor coordenador”.
IV- Deste modo, nunca a requerida colocação como Professor Coordenador, qualquer que tivesse sido a decisão do IPS, poderia retroagir ao “primeiro dia do mês seguinte ao mês em que fez a apresentação do requerimento”, sob pena de operar em data anterior ao ato objeto de impugnação.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção SOCIAL
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
J......., melhor identificados nos Autos, veio em 12 de outubro de 2021 propor ação executiva, com base na Sentença de 21.10.2014, objeto do Acórdão de 15.04.2015, do TAF de Sintra e do Acórdão de 12.11.2020, do TCA Sul, contra o Instituto Politécnico de Setúbal, na qual requer que seja “o Executado condenado a executar, nos seus precisos termos e de acordo com os atos e operações especificados pelo Exequente, o Acórdão prolatado em 15 de abril de 2015, deferindo “… o requerimento do Autor para prestação de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico cientifica para a categoria de professor coordenador, em caso de aprovação, determinar a transição, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na categoria de professor coordenador.”.

Importa, desde já, atender à seguinte cronologia fática:
a) Em 24 de fevereiro de 2012, J......., Professor Adjunto a exercer funções no Instituto Politécnico de Setúbal, intentou ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL de impugnação do ato praticado, em 16 de Novembro de 2011, pelo Presidente do Instituto Politécnico de Setúbal, que indeferiu o seu pedido de prestação de provas públicas para Professor Coordenador”
b) Por Acórdão do TAF de Sintra de 15 de abril de 2015 foi julgada a ação totalmente procedente e condenada a Entidade Demandada a deferir o requerimento do Autor para prestação de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico cientifica para a categoria de professor coordenador e, em caso de aprovação, determinar a transição, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na categoria de professor coordenador.
c) No seguimento de Recurso jurisdicional interposto pelo IPS, em 12 de novembro de 2020, o TCAS profere Acórdão a negar provimento ao recurso e manter o acórdão recorrido na ordem jurídica.
c) Em 10 de dezembro de 2021, o Autor, aqui Exequente apresenta Petição de Execução de Sentença, requerendo, a final, a condenação do Executado, Instituto Politécnico de Setúbal, a “(…) a executar, nos seus precisos termos e de acordo com os atos e operações especificados pelo Exequente, o Acórdão prolatado em 15 de abril de 2015, deferindo “… o requerimento do Autor para prestação de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico cientifica para a categoria de professor coordenador e, em caso de aprovação, determinar a transição, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na categoria de professor coordenador.”
d) Em 6 de julho de 2023 é proferida Sentença de Execução no TAF de Sintra na qual se decide:
“a) Declara-se a inutilidade superveniente da lide, quanto aos três primeiros atos identificados no Requerimento Executivo, extinguindo-se a presente execução, na parte correspondente;
b) Absolve-se o Executado quanto à pretensão da prática do ato de transição do Exequente para a categoria de professor coordenador com efeitos retroativos, por improcedência da mesma.”
e) o Exequente encontra-se integrado na categoria de professor coordenador, desde 29 de outubro de 2013

Aqui chegados, em 25 de setembro de 2023, vem o Autor, aqui Exequente, Recorrer da Sentença de Execução de 6 de julho de 2023, concluindo:
“1. O presente recurso versa sobre matéria de facto e de direito e tem por objeto a impugnação do segmento decisório da douta sentença recorrida que absolveu o Executado quanto à pretensão da prática do ato de transição do Exequente para a categoria de professor coordenador com efeitos retroativos, por improcedência da mesma”, por ser entendimento do Recorrente que segmento padece de erro de julgamento.
2. Quanto à matéria de facto, o concreto ponto que o Recorrente considera incorretamente julgado resulta da omissão do seguinte facto “No início de 2012, quando o Exequente ainda detinha a categoria profissional de Professor Adjunto, propôs contra o Instituto Politécnico de Setúbal ação administrativa especial de impugnação do ato administrativo praticado, em 16 de novembro de 2011, pelo Senhor Presidente deste Instituto, que indeferiu o seu pedido de prestação de provas públicas para Professor Coordenador.”
Este facto está alegado no artigo 1.° da petição de execução de sentença (cfr. fls. 485 a 489 dos autos SITAF) e foi admitido por acordo, ao abrigo do n.º 2 do artigo 574.° do Código Civil.
3. É ainda de acrescentar que a presente ação administrativa especial foi interposta com vista à impugnação do ato administrativo praticado, em 16 de Novembro de 2011, pelo Senhor Presidente do Instituto Politécnico de Setúbal, que indeferiu o seu pedido de prestação de provas públicas para Professor Coordenador.(cfr. Petição Inicial a fls 3 a 24 dos autos no SITAF).
Nesta Petição Inicial, para além da procedência da ação, o aqui Recorrente pediu ao Tribunal a emissão de sentença que:
a) Anule o ato praticado pelo Senhor Presidente do Instituto Politécnico de Setúbal, em 16 de Novembro de 2011, que indeferiu o pedido apresentado pelo Autor com vista à prestação de provas públicas para Professor Coordenador, em virtude do mesmo se encontrar ferido do vício de violação de lei, nos termos expostos;
b) Condene o Réu à prática dos atos devidos consubstanciados na marcação de provas públicas necessárias para o Autor ser avaliado e, obtida a aprovação, transitar para a categoria a que foi opositor...”
4. Consta do ponto 2 da matéria de facto provada da douta sentença recorrida que “A 20 de abril de 2015, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra proferiu Acórdão de cujo teor se extrai o seguinte: “Termos em que acordam em julgar a ação totalmente procedente e condenar ... cfr. fls. 361 a 378 dos autos no SITAF. ”.
Ou seja, a deliberação exequenda, previamente à condenação, anulou, com fundamento em violação de lei, o ato praticado pelo seu Presidente, em 16 de Novembro de 2011, que indeferiu o pedido então apresentado pelo Recorrente com vista à prestação de provas públicas para Professor Coordenador.
5. A Petição Inicial, o Acórdão Exequendo e a Petição de Execução de Sentença supramencionados e identificados nos autos, são os concretos meios probatórios que impunham decisão diferente sobre o facto omitido, que deve constar da matéria de facto provada nos seguintes termos: “No início de 2012, quando o Exequente ainda detinha a categoria profissional de Professor Adjunto, propôs contra o Instituto Politécnico de Setúbal ação administrativa especial de impugnação do ato administrativo praticado, em 16 de novembro de 2011, pelo Senhor Presidente deste Instituto, que indeferiu o seu pedido de prestação de provas públicas para Professor Coordenador. ”
6. Quanto à matéria de direito, a fundamentação da douta sentença recorrida relativa “... à transição do Exequente para a categoria de professor coordenador, com efeitos retroativos, entende que “O âmbito da execução é definido pelo teor da decisão judicial, isto é, não pode o tribunal, em sede de processo executivo, condenar em termos que excedam os limites do segmento decisório da decisão judicial que se visa executar. Compulsados os autos, verifica-se que o Acórdão que o Exequente pretende executar, nos presentes autos, determinou (cfr. n.º 2 do probatório):
a) A condenação do Executado a deferir o requerimento do Autor para prestação de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico científica para a categoria de professor coordenador;
b) Em caso de aprovação, a condenação do Executado a operar a transição do Exequente, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na categoria de professor coordenador.
Não resulta assim, do teor da decisão judicial exequenda, qualquer determinação quanto à produção de efeitos retroativos de uma eventual aprovação nas referidas provas públicas destinadas à categoria de professor coordenador. ”
7. A douta sentença recorrida omite que, para além de condenar o Recorrido, o Acórdão exequendo julgou a ação totalmente procedente ...” o que significa que anulou o ato impugnado. Esta anulação teve de anteceder a condenação, que não podia ter lugar se o ato impugnado tivesse sido julgado válido.
8. Foi com base na anulação do ato impugnado que o Recorrente pediu a aplicação retroativa na execução do ato devido, tendo como fundamento o n.º 1 do artigo 173.° do CPTA.
É por isso que o Recorrente não concorda com a parte da douta sentença recorrida que afirma que “... a decisão judicial declarativa delimitou o âmbito do que é admissível executar, não podendo este Tribunal,, substituindo-se àquela decisão, exceder os limites aí fixados. ”.
É verdade que a decisão judicial declarativa delimitou o âmbito da execução, mas esse âmbito não afasta a aplicação retroativa da condenação, na medida em que estamos perante uma ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo, em que a execução do Acórdão corre termos de acordo com as disposições contidas no Capítulo IV do Título VII do CPTA, denominado “Execução de sentenças de anulação de atos administrativos”, que inclui, entre outras normas, o já artigo 173.°.
9. O Acórdão exequendo anulou o ato impugnado, pelo que a execução de deliberação judicial proferida em sede de ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo que seguia a tramitação do Capítulo II do Título VII do CPTA ( relativa à Execução para prestação de factos ou de coisas) padece de erro, por as normas neles inserida não serem aptas para tratar da execução de um Acórdão que anulou um ato administrativo. O quadro normativo adequado é o constante no Capítulo IV do Título VII do CPTA, denominado “Execução de sentenças de anulação de atos administrativos”, nomeadamente o n.º 1 do artigo 173.°, que foi violado pela douta sentença recorrida.
10. Por padecer de vício de erro de julgamento a douta sentença recorrida, deve ser anulada e, consequentemente, substituída por outra que:
i) Dê como provado que: “No início de 2012, quando o Exequente ainda detinha a categoria profissional de Professor Adjunto, propôs contra o Instituto Politécnico de Setúbal ação administrativa especial de impugnação do ato administrativo praticado, em 16 de novembro de 2011, pelo Senhor Presidente deste Instituto, que indeferiu o seu pedido de prestação de provas públicas para Professor Coordenador
ii) Determine a transição do Recorrente para a categoria de professor coordenador, com os efeitos retroativos peticionados.”
Subsiste apenas como questão controvertida a requerida retroatividade da nomeação do Exequente com o Professor Coordenador.
O Recurso Jurisdicional foi admitido por despacho de 16 de novembro de 2023.
O aqui Recorrido/Instituto Politécnico não veio a apresentar Contra-alegações de Recurso.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 7 de dezembro de 2023, nada veio dizer, requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
As questões aqui em apreciação cingem-se predominantemente ao suscitado erro na fixação da matéria de facto e a correspondente aplicação do direito, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo considerou a seguinte factualidade provada:
“1) A 29 de outubro de 2013, o Exequente foi contratado pelo Executado, como Professor Coordenador, na decorrência de procedimento concursal, ao qual se candidatou - cfr. documento junto com o requerimento do Executado de 17 de fevereiro de 2022 e admissão por acordo.
2) A 20 de abril de 2015, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra proferiu Acórdão de cujo teor se extrai o seguinte:
“Termos em que acordam em julgar a ação totalmente procedente e condenar a Entidade Demandada a deferir o requerimento do Autor para prestação de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico científica para a categoria de professor coordenador e, em caso de aprovação, determinar a transição, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na categoria de professor coordenador." - cfr. fls. 361 a 378 dos autos no SITAF.
3) A 12 de novembro de 2020, o Tribunal Central Administrativo proferiu Acórdão de cujo teor se extrai o seguinte:
"Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e manter o acórdão recorrido na ordem jurídica."
- cfr. fls. 428 a 448 dos autos no SITAF.
4) A 10 de dezembro de 2021, deu entrada neste Tribunal Requerimento Executivo, em nome do ora Exequente, e de cujo teor se extrai o seguinte:
«[...] o exequente especifica os atos e operações em que considera que a execução deve consistir:
- Deferimento do requerimento apresentado pelo exequente com vista à prestação de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico científica para a categoria de professor coordenador;
- Juntamente com este ato dever ser designação do Júri das provas;
- E marcada a data de realização das provas;
- No caso de obtenção de aprovação, o exequente deve transitar para a categoria de Professor Coordenador, retroativamente, para todos os efeitos legais, desde o primeiro dia do mês seguinte ao mês em que fez a apresentação do requerimento.
Nestes termos e nos mais de Direito, deve a presente petição de execução de sentença ser recebida e julgada procedente por provada e o Executado condenado a executar, nos seus precisos termos e de acordo com os atos e operações especificados pelo Exequente, o Acórdão prolatado em 15 de abril de 2015, deferindo "... o requerimento do Autor para prestação de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico cientifica para a categoria de professor coordenador e, em caso de aprovação, determinar a transição, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na categoria de professor coordenador."» - cfr. fls. 485 a 489 dos autos no SITAF.
5) A 22 de junho de 2022, foi subscrita Ata do júri para a realização de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico-científica na categoria de professor coordenador para a área disciplinar de Tecnologia e Gestão Industrial requeridas pelo Exequente, de cujo teor se extrai o seguinte:
"Após a sessão pública das provas o júri aprovou o candidato nas provas por unanimidade, tendo elaborado o parecer anexo a esta ata." - cfr. documento junto com o requerimento do Executado de 24 de março de 2023.

IV – Do Direito
No que aqui releva, discorreu-se no discurso fundamentador da decisão recorrida:
“No seu Requerimento Executivo, o Exequente identifica quatro atos que entende que devem compor a execução da decisão judicial:
- Deferimento do requerimento de prestação de provas públicas;
- Designação do Júri das provas;
- Agendamento da realização das provas;
- Transição para a categoria de Professor Coordenador, retroativamente, desde o primeiro dia do mês seguinte ao mês em que fez a apresentação do requerimento.
Compulsados os autos, verifica-se que o teor do ato a que se refere o n.º 5 do probatório corresponde aos primeiros três atos identificados pelo Exequente.
Por outro lado, verifica-se que o Exequente já se encontra integrado na categoria de professor coordenador, desde 29 de outubro de 2013, por via diversa.
Importa, pois, enquadrar a situação no contexto da inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide, figura que é definida, no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 9 de janeiro de 2013, proferido nos autos do processo n.º 1208/12, do seguinte modo:
“Como é sabido a inutilidade superveniente da lide ocorre quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de ter todo o interesse e utilidade, conduzindo, por isso, à extinção da instância (art.° 287°, al. e), do Código de Processo Civil).
A inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide dá-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo, ou se encontra fora do esquema da providência pretendida."
Verifica-se que o caso dos autos é, precisamente, o de uma situação em que a pretensão do Exequente já se encontra parcialmente satisfeita, isto é, uma situação de inutilidade parcial superveniente da lide.
Com efeito, face ao ato a que se refere o n.° 5 do probatório, não subsiste a utilidade dos três primeiros atos identificados no Requerimento Executivo.
Pelo que é aplicável o disposto na alínea e) do artigo 277.° do CPC, ex vi do artigo 1.° do CPTA, cuja redação é a seguinte:
“A instância extingue-se com a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide."
Nestes termos, impõe-se extinguir parcialmente a presente instância, quanto aos três primeiros atos identificados pelo Exequente.
Quanto à transição do Exequente para a categoria de professor coordenador, com efeitos retroativos
O Exequente vem identificar, como quarto ato a praticar no âmbito da execução da decisão judicial, a transição para a categoria de professor coordenador, com efeitos retroativos a 1 de junho de 2011.
O Executado considera que os efeitos retroativos não podem reportar-se à data pretendida pelo Exequente, mas, ao invés, a quatro meses após a data invocada pelo Exequente. Entende, ainda, que os efeitos retroativos não podem verificar-se ao nível remuneratório, atento o congelamento das valorizações remuneratórias que vigorou entre 2011 e 2017.
Cumpre apreciar e decidir.
O âmbito da execução é definido pelo teor da decisão judicial, isto é, não pode o tribunal, em sede de processo executivo, condenar em termos que excedam os limites do segmento decisório da decisão judicial que se visa executar.
Compulsados os autos, verifica-se que o Acórdão que o Exequente pretende executar, nos presentes autos, determinou (cfr. n.° 2 do probatório):
a) A condenação do Executado a deferir o requerimento do Autor para prestação de provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico científica para a categoria de professor coordenador;
b) Em caso de aprovação, a condenação do Executado a operar a transição do Exequente, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na categoria de professor coordenador.
Não resulta assim, do teor da decisão judicial exequenda, qualquer determinação quanto à produção de efeitos retroativos de uma eventual aprovação nas referidas provas públicas destinadas à categoria de professor coordenador.
Todavia, veio o Exequente requerer, em sede executiva, a respetiva transição para a categoria de professor coordenador, com efeitos retroativos.
Em face do que ficou explanado supra, resulta patente que a pretensão supra citada não se enquadra no âmbito da decisão exequenda, motivo pelo qual a mesma não pode proceder, nos presentes autos de execução de julgado.
Com efeito, a decisão judicial declarativa delimitou o âmbito do que é admissível executar, não podendo este Tribunal, substituindo-se àquela decisão, exceder os limites aí fixados.
Considera o Exequente que está em causa a execução de uma decisão judicial anulatória, pelo que incumbe ao Executado, nos termos do n.° 1 do artigo 173.° do CPTA, o “dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado".
Todavia, esta norma não se mostra aplicável ao caso concreto, uma vez que o Acórdão exequendo não constitui uma decisão de anulação de atos administrativos, motivo pelo qual a respetiva execução não se enquadra no contexto do Capítulo IV do Título VII do CPTA, denominado “Execução de sentenças de anulação de atos administrativos".
Efetivamente, a decisão judicial ora exequenda constitui uma decisão condenatória, ao invés de anulatória, no âmbito de uma ação administrativa de condenação à prática de ato devido, ao invés de ação administrativa de impugnação de ato administrativo.
Nestes termos, a execução da decisão judicial em apreço rege-se pelo disposto no Capítulo II do mesmo Título, por se tratar de uma execução para prestação de facto.
Pelo exposto, improcede a pretensão de atribuição de efeitos retroativos à transição para a categoria de professor coordenador.”

Vejamos:
Quanto à matéria de facto,
Entende o Recorrente que existe uma omissão na fixação da matéria de facto provada, a qual terá acabado por ser determinante na aplicação da matéria de direito.

A invocada omissão terá resultado de não ter sido fixado na matéria de facto provada que "No início de 2012, quando o Exequente ainda detinha a categoria profissional de Professor Adjunto, propôs contra o Instituto Politécnico de Setúbal ação administrativa especial de impugnação do ato administrativo praticado, em 16 de novembro de 2011, pelo Senhor Presidente deste Instituto, que indeferiu o seu pedido de prestação de provas públicas para Professor Coordenador."

Sendo o referido “facto” integrante da presente Ação, ainda que na fase declarativa, mal se compreenderia que tal circunstancia constasse da matéria de facto da decisão controvertida, o que se mostraria inútil e redundante, pois que, em bom rigor, estamos perante a mesma Ação.

Mais afirma o aqui Recorrente que encontrando-se tal facto alegado na petição de execução e não tendo sido impugnada especificadamente pelo Executado deve considerar-se provada por acordo, ao abrigo do n.° 2 do artigo 574.° do Código Civil (Deverá querer-se dizer CPC).

Sem prejuízo do já afirmado, quanto à redundância da fixação do referido “facto”, na matéria dada como provada, sempre se dirá que o Artº 83º do CPTA exceciona o constante do invocado Artº 574º nº 2 do CPC, ao referir expressamente no seu nº 4 que “(…) a falta de impugnação especificada nas ações relativas a atos administrativos e normas não importa confissão dos factos articulados pelo autor, mas o tribunal aprecia livremente essa conduta para efeitos probatórios.”

Diga-se, finalmente, e em qualquer caso, que a introdução de tal “facto” na matéria dada como provada, não lograria, só por si, alterar o sentido da decisão proferida ou a proferir, pois que se tratam de factos meramente circunstanciais que constam já instrumentalmente da presente ação, não tendo a virtualidade de influenciar o sentido do desfecho decisório, no caso, da presente Execução.

Improcede assim o vicio vindo de analisar.

Quanto à matéria de direito
No que aqui releva, requereu o Exequente que “No caso de obtenção de aprovação, o exequente deve transitar para a categoria de Professor Coordenador, retroativamente, para todos os efeitos legais, desde o primeiro dia do mês seguinte ao mês em que fez a apresentação do requerimento.”
Há duas datas que se mostram incontornáveis:
- Em 16 de Novembro de 2011, o Presidente do Instituto Politécnico de Setúbal, indeferiu o seu pedido de prestação de provas públicas para Professor Coordenador;
- Em 29 de outubro de 2013, o Exequente foi contratado pelo Executado, como Professor Coordenador

Assim, o lapso temporal que importaria atender para efeitos da almejada aplicação retroativa da decisão, mediaria entre 16 de Novembro de 2011 e 29 de outubro de 2013, pois que, mal se compreenderia que a pretendida retroação da decisão se reportasse a data anterior à pronuncia da entidade destinatária do requerido.

Efetivamente, mesmo que se entendesse ser a condição de Professor Coordenador suscetível de retroagir, não poderia a almejada retroação ser reportada a data anterior a 16 de novembro de 2011, sob pena de, assim sendo, beneficiar o exequente do indeferimento verificado, pois que em caso de deferimento, teria sido esta a data relevante para que se iniciasse o procedimento tendente à pretendida transição funcional.

Por outro lado, se o requerimento indeferido em 16 de novembro de 2011, tivesse antes sido deferido, tal não determinava que as funções de Professor Coordenador passassem a ser exercidas de imediato e automaticamente, pois que, em bom rigor, o que vinha requerido era que o exequente fosse admitido a prestar “provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico cientifica para a categoria de professor coordenador”, sendo que, só “em caso de aprovação”, tal determinaria, “a transição, sem outras formalidades, para o regime de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato por tempo indeterminado na categoria de professor coordenador”, pelo que a data de provimento como Professor Coordenador, sempre seria ulterior àquela data (16 de novembro de 2011) e incerta.

Deste modo, nunca a requerida colocação como Professor Coordenador, qualquer que tivesse sido a decisão do IPS, poderia retroagir ao “primeiro dia do mês seguinte ao mês em que fez a apresentação do requerimento”, sob pena de operar em data anterior ao ato objeto de impugnação.

De resto, atento que a “29 de outubro de 2013, o Exequente foi contratado pelo Executado, como Professor Coordenador”, não há quaisquer evidências nem garantias que demonstrem que este pudesse ter vindo a ser provido como tal, anteriormente a esta data, mesmo que o despacho objeto de impugnação de 16 de Novembro de 2011 tivesse sido favorável à sua pretensão, pois que, como já abundantemente referido e como o exequente reconhece, sempre teria previamente de prestar “provas públicas de avaliação da competência pedagógica e técnico cientifica para a categoria de professor coordenador”, processo que não é imediato nem automático.

Não logrou, pois, o Exequente fazer prova que tenha deixado de ser cumprido o desiderato ínsito no n.º 1 do artigo 173.° do CPTA, que estipula a obrigação “... de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado”, improcedendo, deste modo, o Recurso interposto.

V – Decisão
Deste modo, acordam os Juízes que compõem a Subsecção Social da Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, ainda que com base em fundamentação nem sempre coincidente, em negar provimento ao Recurso, confirmando-se o sentido da decisão recorrida.

Custas nesta instância pelo Recorrente.

Lisboa, 29 de fevereiro de 2024
Frederico de Frias Macedo Branco

Rui Pereira

Eliana de Almeida Pinto