Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:237/16.0BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:06/04/2020
Relator:LUÍSA SOARES
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL;
IVA;
ÓNUS DA PROVA.
Sumário:I- Sobre a administração tributária recai o ónus de provar que reúne os pressupostos legais que a habilitam a proceder às correções de IVA, nos termos do artigo 74.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT), cabendo-lhe demonstrar a factualidade que abala a presunção de veracidade das declarações do contribuinte, prevista no artigo 75.º, n.º 1 da LGT.
II- Cumprido este ónus probatório, recai sobre o contribuinte o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a deduzir o imposto nos termos do disposto no artigo 19.º, n.º 3 do CIVA, ou seja, o ónus de demonstrar que as transações tituladas pelas faturas apresentadas são verdadeiras e reais e, por conseguinte, tem direito a proceder à dedução do respetivo imposto.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I – RELATÓRIO

P............, SA.., veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IVA e juros compensatórios do período de 201107 no montante total de € 118.871,86.

A Recorrente, depois de convidada a aperfeiçoar as suas alegações de recurso, formulou conclusões nos seguintes termos:

“Termos em que se requer a V. Ex.ª sejam as presentes alegações recebidas por estarem em tempo concedendo a douta decisão do Tribunal ad quem provimento ao recurso por provado, revogando a sentença recorrida por outra, por se entender padecer aquela de nulidade nos termos do que dispõem as alíneas c) e d) o n.º1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil.
Assim não se entendendo, o que não se admite, ainda assim deve a douta decisão do Tribunal ad quem conceder provimento ao recurso, determinando a anulação da liquidação impugnada, na medida em que:

A – Impugna a factualidade dada como provada vertida nas alíneas 1.3, 1.4, 1.9, 1.10, 1.13 e 1.15 da sentença recorrida, por apresentar incorreções e deficiências, violando assim o disposto no n.º 4 do artigo 607.º do CPC.

B – É incompetente o órgão que determina a prorrogação da acção, precedendo o
conhecimento da competência o de qualquer outra questão, violando assim preceitos do Código de Procedimento Administrativo.

C – Extravasou a IT os limites que a lei lhe impõe ao prosseguir com um procedimento inspectivo para além do prazo da prorrogação, a ser esta válida, subvertendo os preceitos legais que obrigam à fundamentação dos actos de prorrogação, uma vez que tão pouco se verificou uma segunda prorrogação, sendo que a isso anuiu a sentença recorrida, sem qualquer fundamentação válida em contraposição com o que determina o n.º 4 do artigo 607.º do CPC.

D – Entende a ora recorrente que não tendo havido qualquer despacho do órgão com competência para efeitos de exercício do contraditório desconhece se o órgão cuja competência foi definida no início teve conhecimento do projecto, admitindo-se assim que qualquer projecto de qualquer teor pudesse ter sido notificado.

E – As correcções que deram causa à liquidação impugnada apenas dizem respeito a transacções com a sociedade T................, não se alcançando a motivação em transcrever o teor do relatório final de inspecção tributária vertido na alínea 1.10 da sentença recorrida.

F – E, nesse sentido, deve o Tribunal ad quem declarar a nulidade da sentença recorrida em conformidade com o que dispõem as alíneas c) e d) o n.º1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil.

G – Assim não sendo entendido, deve ainda ser concedido provimento ao recurso na medida em que impende o ónus da prova sobre quem invoca o direito que no caso foi a AT que corrigiu e liquidou e não fez o trabalho inspectivo que se impunha designadamente, junto dos Serviços Alfandegários sendo que a recorrente anexou todas as provas atinentes à exportação, sendo que a esta perspectiva anuiu a sentença recorrida sem que apresente qualquer fundamento válido, violando assim o n.º 4 do artigo 607.º do CPC.
* *
A Recorrida não apresentou contra-alegações.
* *
O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
* *
Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, importa decidir se a sentença recorrida padece de:
- nulidade por excesso de pronúncia, ambiguidade ou obscuridade por o tribunal ter transcrito o teor do relatório final de inspeção tributária vertido no ponto 1.11 da sentença não se alcançando a sua motivação, violando o disposto nas alíneas c) e d) do nº 1 do art. 615º do CPC (cfr. alíneas E) e F) das conclusões de recurso).
- Erro de julgamento da matéria de facto dada como provada nas alíneas 1.3, 1.4, 1.9, 1.10, 1.13 e 1.15 por apresentar incorreções e deficiências, violando o nº 4 do art. 607º do CPC (cfr. alínea A) das conclusões de recurso).
- Erro de julgamento de direito por incompetência do órgão que determinou a prorrogação da acção de inspecção, violando preceitos do Código do Procedimento Administrativo, por ter prosseguido com um procedimento inspectivo para além do prazo de prorrogação (cfr. alínea B) e C) das conclusões de recurso), por não ter havido qualquer despacho do órgão com competência para efeitos de exercício do contraditório (cfr. alínea D) das conclusões de recurso) e finalmente, por ter sido decidido, sem justificação que a impugnante não cumpriu com o ónus da prova, tendo violado o disposto no art. 607º, nº 4 do CPC (cfr. alínea G) das conclusões de recurso).

Face às questões acima elencadas entendemos que não se verifica qualquer circunstância que obste à apreciação do mérito dos autos, designadamente que deva ser ordenada a baixa dos autos a fim de que o Meritíssimo Juiz se pronuncie quanto às nulidades suscitadas, como determina o artigo 617.ºdo CPC. Na verdade com a última reforma ao Código de Processo Civil, foram introduzidas a nível do regime processual relativo à tramitação dos recursos várias alterações, constituindo uma das mais relevantes a redacção do actual artigo 617.º n.º 5 do CPC (anterior artigo 670.º n.º 5), ao consagrar que “Omitindo o juiz o despacho previsto no n.º 1, pode o relator, se o entender indispensável, mandar baixar o processo para que seja proferido; (…)”.

Compulsados os autos, em especial os termos do recurso ora apresentado, consideramos que, embora tenham sido imputadas nulidades à sentença recorrida e que essa pronúncia não existiu, não se justifica, no caso concreto, a baixa dos autos, considerando que a apreciação dessas nulidades reveste manifesta simplicidade face à clareza do julgado e aos termos em que essas nulidades se encontram fundamentadas.

Vem a Recorrente impugnar a matéria de facto dada como provada nas alíneas 1.3, 1.4, 1.9, 1.10, 1.13 e 1.15 por apresentar “incorrecções e deficiências”, violando o nº 4 do art. 607º do CPC (cfr. alínea A) das conclusões de recurso), sem contudo especificar e concretizar em que medida ocorreram essas incorreções e deficiências e, sublinhe-se, que manteve após ter sido convidada a aperfeiçoar as suas conclusões.

Ora, considerando o disposto no art.° 640.° do CPC, aplicável ex vi do art. 281º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto caracteriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de discordância com tal decisão.

O art. 640º do CPC, sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, consagra que:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos nºs 1 e 2 aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.° 2 do artigo 636°."

Na verdade não basta a mera citação de um artigo disciplinador da elaboração da sentença para que possamos julgar minimamente cumpridos os ónus previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil, que exige não apenas a indicação dos factos alegadamente mal apurados (como provados, não provados ou impertinentes) mas, também no mínimo, o sentido ou redacção com que deviam constar no probatório.

Assim, a Recorrente não indicou, concretamente e em que medida os factos elencados nas alíneas 1.3, 1.4, 1.9, 1.10, 1.13 e 1.15 foram incorrectamente julgados, como exige o disposto no art. 640.º do CPC, limitando-se a alegar e concluir, genericamente, pelo erro de julgamento da matéria de facto, pelo que, no caso em apreço, face ao incumprimento daquela disposição legal, rejeita-se o recurso nesta parte, nos termos do disposto no n.º 1, alínea a) daquele preceito legal.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

1) O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Consideram-se documentalmente provados os seguintes factos, relevantes para a decisão da causa:

1.1. Em 2013.09.16, a coberto da Ordem de Serviço n.º OI201301312, os Serviços de Inspeção Tributária da Direcção de Finanças de Leiria deram início a uma ação inspectiva em sede de IVA e IRC, e aos exercícios de 2011 e 2012, à aqui Impugnante - cf. Relatório de Inspeção Tributária junto com o Processo Administrativo Instrutor (PA).

1.2. A Ordem de Serviço n.º OI201301312, determinada pelo Chefe de Divisão, no âmbito de delegação de competências do Director de Finanças de Leiria, foi assinada pelo Técnico Oficial de Contas da Impugnante em 2013.09.16 - cf. Ordem de Serviço a fls. 97 do PA.

1.3. Em 2014.02.28 a Inspetora Tributária em regime de substituição do Chefe de Divisão II, emitiu o despacho de prorrogação do procedimento inspectivo por mais três meses, bem como a alteração do âmbito da inspeção para Geral, o que foi notificado pessoalmente à Impugnante em 2014.07.02 - cf. informação constante de fls. 97 e ss. do PA anexo aos autos, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

1.4. Em 2014.06.13, a Chefe de Equipa, no âmbito da delegação de competências do Diretor de Finanças de Leiria emitiu o despacho na folha e rosto do projecto de relatório e emitiu o ofício, dirigido à Impugnante, com o assunto “PROJECTO DE RELATÓRIO DA INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA – artigo 60.º da Lei Geral Tributária – LGT e art. 60.º do RCPIT)” - cf. fls 97 e ss. do PA, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, e que foi pessoalmente notificado à Impugnante, conforme certidão constante do mesmo PA.

1.5. Em 2014.07.16, a Impugnante exerceu o direito de audição prévia, assumindo a responsabilidade pelas correções efetuadas a que se reporta a parte III. 2 do projeto de Relatório, não aceitando as correções efetuadas na parte III.1 do mesmo projeto – cft. fls. 20 e ss. do PA anexo, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

1.6. Em 2014.07.14 a Impugnante procedeu à entrega do modelo 22 de substituição de IRC via internet relativamente ao período de tributação de 2011.01.01 a 2011.12.31, declarando lucro tributável no montante de € 152.437,30 - cft. fls. 25 e ss. do PA, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

1.7. Em 2014.07.14, a Impugnante procedeu à entrega do modelo 22 via internet relativo à declaração de substituição de IRC do período de tributação de 2012.01.01 a 2012.12.31, na qual declara um lucro tributável no montante de € 90.022,21 – cft. fls. 29 e ss. do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido.

1.8. Em 2014.07.15 a Impugnante entregou Via Internet, a declaração de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA), relativa ao período de Dezembro de 2012, na qual declara a base tributável no valor de € 53.000,00 – cft. fls. 36 do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

1.9. Em 2014.07.28 foi emitido o Relatório Final de Inspeção Tributária relativo à Impugnante, o qual mereceu o despacho de concordância do Diretor de Finanças Adjunto, no âmbito da delegação de competências do Diretor de Finanças, nos termos constantes de fls. 43 a 54 do PA, e cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

1.10. O aviso de receção que acompanhou a carta registada pela qual foi remetido o ofício da Direção de Finanças de Leiria com o assunto “Relatório de Inspeção Tributária – Art. 62.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT)”, de 2014.08.18, foi rececionado pela Impugnante em 2014.08.14 - cf. oficio e registo constante a fls. 40 a 43 do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

1.11. Do ponto III do RIT consta, além do mais, o seguinte:
“(…) III.1. Factos e valores que indiciam a prática de um crime fiscal
No decurso da ação inspectiva realizada aos elementos contabilísticos da P..........., Ld.ª detetámos 3 fornecedores que não cumprem com os requisitos/obrigações fiscais.
São os fornecedores A..................., S.R.L., NIF ES..................., O................... Unipessoal, Ld.ª, NIF .................. e T......................., Ld.ª, NIF .....................
(…)
No que respeita aos meios de pagamento que pretendem justificar os pagamentos à T..................., Ld.ª, temos de evidenciar o seguinte:
1) Foram emitidos diversos cheques pré-datados do Banco B................... que se encontram contabilizados na conta corrente ................... (a débito) por contrapartida da correspondente conta de cheques pré-datados ..................., conforme consta do quadro seguinte:
(…).
2) Na data do vencimento, foram contabilizados os seguintes cheques, cujo documento de suporte é a fotocópia do extrato bancário:
(…)
3) Da análise dos quadros anteriores constatamos que os cheques que foram inicialmente emitidos à T..................., Ld.ª não coincidem com os cheques que foram efetivamente descontados e contabilizados nas contas correntes deste fornecedor.
Os dados referentes ao pagamento das faturas emitidas em nome de T..................., Ld.ª identificam a S................ como beneficiária, o que denuncia tratar-se de empresas relacionadas e com gerente(s) de facto em comum e não de entidades independentes entre si.
(…)
Em resumo, os cheques emitidos pela P..........., Ld.ª que pretendem justificar o pagamento das faturas emitidas em nome da T..................., Ld.ª, foram depositados: Na conta n.º ............., da Caixa ............., no montante de €194.157,00. Esta conta é da firma G............. – Comércio de Combustíveis, S.A., NIF ............., com sede em Montemor-O-Novo. Na conta n.º ............. do Banco ............., no montante de €36.900,00; Numa conta, da Caixa ............., no montante de €80.319,00.
Na conta n.º ............. do Banco B..................., no montante de €36.900,00. Esta conta é titulada por A............. que foi gerente da O............., Ld.ª até 2009/01/28 e presidente da S................, S.A. até 2009/01/21. Na conta n.º ............., do Banco B..................., no valor de €9.900,00. Esta conta pertence a R............, presidente da S................, S.A. desde 2009/01/21.
Refira-se ainda que os cheques foram emitidos ao portador. Quatro cheques indicam o nome G............., S.A., sendo perceptível a diferença de caligrafia entre quem preencheu este nome no cheque e quem preencheu o restante.
Face aos dados recolhidos, nenhum cheque justifica de forma inequívoca o pagamento à T..................., Ld.ª, dado que não se comprovou o correspondente depósito em contas tituladas por esta empresa.
f) Da análise realizada não se detetou a existência de relações comerciais entre a P............ Ld.ª e a G............., S.A.. Da mesma forma, não se detetou, pela consulta aos anexos “O” e “P”, relações comerciais entre a T..................., Ld.ª, /S................, S.A. e a G............., S.A.
(…)
III.1.3. Elementos comuns às 4 empresas: A............, SRL, O............., Ld.ª, S................, S.A. e T..................., Ld.ª
Pelo descrito nos pontos anteriores, e analisando as assinaturas dos documentos em análise, constatamos que: Todas as transacções tituladas pelas faturas emitidas em nome de A............, SRL, O............., Ld.ª e T..................., Ld.ª foram realizadas com a mesma pessoa J............, que é funcionário da S................, S.A. e indicou os contactos desta empresa (anexos 3 e 4); A assinatura do representante da O............., Ld.ª nos CMR é igual à assinatura constante nas notas de débito emitidas em nome da T..................., Ld.ª (anexos 5 e 7, fls. 2 a 6); A assinatura das guias de remessa emitidas em nome da T..................., Ld.ª (anexo, n.º 9) é igual à das facturas n.ºs …………., ………… e ………. (anexo n.º 1, fls. 12 a 14) emitidas em nome de A............, SRL; A assinatura constante das facturas emitidas em nome de O............., Ld.ª (anexo n.º 1, fls. 2 a 10) é coincidente com a constante das facturas n.ºs ……….. e …………. (anexo n.º 1, fls. 15 e 16) emitidas em nome de A............, SRL e a assinatura constante das faturas e recibos emitidos pela S................, SA (anexo n.º 6). A beneficiária do cheque n.º ............, emitido pela P............, Ld.ª alegadamente para pagamento à T..................., Ld.ª é R............, presidente da S................, SA. As declarações periódicas de IVA da O............., Ld.ª dos anos de 2011 e 2012 foram entregues, sem movimentos pela Técnica Oficial de Contas E............, NIF ............, TOC da S................, SA.
III.1.4. Vantagem Patrimonial
Face ao exposto nos pontos anteriores, constatamos que: A S................, SA é uma empresa que tem pessoal, equipamentos e instalações que lhe permitem o exercício da actividade de comércio de viaturas. A O............., Ld.ª e a T..................., Ld.ª têm declarações periódicas de IVA e IRC em falta; A A............, SRL está cessada desde 2010/01/18 (anexo 1, fls. 11) Os valores constantes das faturas emitidas em nome da O............., Ld.ª não foram declarados nas declarações periódicas de IVA entregues por esta empresa, concretamente nos períodos de 201109T e 201209T; Não são conhecidos fornecedores que tenham declarado vendas a estas entidades nas declarações de Informação Empresarial Simplificada; Os negócios foram, de acordo com o afirmado pelo sócio gerente da P............, Ld.ª, todos realizados com o senhor J............, cujos n.ºs de telefone e fax são coincidentes com os constantes das faturas da S................, SA (anexo 3). O senhor J............ é funcionário da S................, SA e não declara ter recebido da O............., Ld.ª nem da T..................., Ld.ª.
Pelo que existem indícios suficientemente credíveis que nos levam a concluir que as faturas emitidas por estas 3 entidades – A............, SRL, O............., Ld.ª e T..................., Ld.ª – não correspondem a transacções realmente efectuadas por estas empresas.
Assim, pela contabilização das faturas emitidas em nome de A............, SRL, O............., Ld.ª e T..................., Ld.ª, a empresa em análise, P..........., Ld.ª obteve as seguintes vantagens patrimoniais:
(…)
Em sede de IVA
IVA deduzido indevidamente
PeríodoO............., LdaT..................., LdaTotal
201107€106.605,00€106.605,00
201201€46.495.00€46.495,00
201207€46.000,00€104,040,00€150.040,00
201212 a)€3.450,00€3.450
Total€152.605,00€153.985,00€306.590,00
a) A fatura n.º 20110020 foi contabilizada em dezembro 2012, data em que o IVA foi deduzido

1.12 Na sequência da ação inspetiva identificada em 1.1., foram emitidas as liquidações adicionais de IVA e respetivos juros compensatórios, no montante de €106.605,00 e € 12.266,88, respetivamente – Vd. Fls. 85 e ss do PA anexo.

1.13. Em 2015.03.02 a Impugnante apresentou no Serviço de Finanças de Caldas da Rainha a reclamação graciosa das liquidações referidas em 1.11, invocando
- incompetência para a prática do acto/prorrogação da acção inspectiva;
- excesso do prazo legalmente estabelecido para o procedimento inspectivo;
- ineficácia das correcções constantes do projecto do relatório por ausência
de despacho que ratifique o processado para efeitos de audição prévia;
- ilegalidade da correções em sede de IVA quanto ao período 201107 – cft. Fls. 2 e ss. do procedimento de Reclamação Graciosa incluso no PA anexo aos presentes autos.

1.14. Após o exercício de audição prévia por parte da Impugnante, em 2015.05.15 o Chefe de Divisão, em delegação de competências do Diretor de Finanças de Leiria, proferiu o despacho de indeferimento da reclamação graciosa - Cft. Fls. 132 do PA, cujo teor aqui se dá aqui se dá por integralmente reproduzido.

1.15. Em 2015.06.17 a Impugnante apresentou no Serviço de Finanças de Caldas da Rainha a petição do recurso hierárquico constante de fls. 2 e ss. do PA, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

1.16. Em 2015.10.29, no âmbito da subdelegação de competências, a Diretora de Serviços do IVA emitiu o despacho de indeferimento do recurso hierárquico, aposto na informação n.º 21425/2015 - cft. fls. 15 e ss. do PA, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

2. FACTOS NÃO PROVADOS

Inexistem outros factos nos autos cuja não prova seja relevante para a decisão da causa.

3. MOTIVAÇÃO

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, e especificados nos vários pontos da matéria de facto provada.”


Por se considerar relevante para a decisão do presente recurso, nos termos do art. 662º do CPC, adita-se ao probatório, o ponto seguinte:

1.17 No Diário da República, 2ª Série, n.° 87, de 7 de Maio de 2013, foi publicado o despacho n.° 5864/2013, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de que se destaca o seguinte:
“Despacho n.º 5864/2013
Delegação e subdelegação de competências
Ao abrigo das seguintes normas legais:
Artigo 62.º da lei geral tributária (LGT);
Artigo 9.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, na versão republicada em anexo à Lei n.º 64/2011, de 22 de dezembro;
Artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de abril;
Artigos 29.º, n.º 1, e 35.º a 37.º do Código do Procedimento Administrativo;
e ainda dos despachos:
Do diretor-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, despacho n.º 9414/2012, de 3 de julho, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 134, de 12 de julho de 2012;
Do diretor-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, despacho n.º 10699/2012, de 3 de julho, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 153, de 8 de agosto de 2012;
Do subdiretor-geral da Cobrança, despacho n.º 12744/2012, de 10 de setembro, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 189, de 28 de setembro de 2012;
Do subdiretor-geral da Inspeção Tributária, despacho n.º 16486/2012, de 5 de dezembro, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 251, de 28 de dezembro de 2012:
Procedo às seguintes delegações e subdelegações de competências:
I - Competências próprias:
Delego:
2 - Nos chefes de divisão M............, J............, A............, M............ e E............:
2.1 - A prática de todos os atos, que, não envolvendo juízos de oportunidade e conveniência, não possam deixar de ser praticados uma vez verificados os pressupostos de facto;
2.2 - A resolução de dúvidas colocadas pelos serviços de finanças;
2.3 - A emissão de parecer acerca das solicitações, efetuadas pelos trabalhadores ou pelos sujeitos passivos, a entidades superiores a esta Direção de Finanças;
2.4 - A assinatura de toda a correspondência das respetivas unidades orgânicas que se destinem entidades de nível hierárquico equiparado ou inferior;
2.5 - Na ausência ou impedimento do titular, os atos de assinatura serão praticados pelo substituto legal ou quem aquele indigite para o efeito;
2.6 - A elaboração do plano e relatório anuais de atividades da respetiva unidade orgânica;
2.7 - A fixação dos prazos para audição prévia e a prática dos atos subsequentes até à conclusão do procedimento (artigo 60.º, n.º 4, da LGT).
3 - Nos chefes de divisão da Inspeção Tributária I e II, respetivamente, A............ e M............, relativamente a cada uma das respetivas áreas funcionais:
3.1 - As competências indicadas em I-1, com os nºs 1.4 a 1.10 e nºs 1.14 a 1.19 (inclusive);
3.2 - O apuramento, a fixação ou a alteração de rendimentos e atos conexos, quando esteja em causa a aplicação dos artigos 39.º e 65.º do CIRS, até ao limite de (euro) 250 000, por cada exercício;
3.3 - A fixação da matéria tributável sujeita a IRC, nos termos do artigo 54.º, atual artigo 59.º do CIRC, e dos artigos 87.º a 89.º e 90.º da LGT, bem como, nos casos de avaliação direta, proceder a correções técnicas ou meramente aritméticas, resultantes de imposição legal, nos termos dos artigos 81.º e 82.º da LGT, até ao limite de (euro) 500 000, por cada exercício;
3.4 - A fixação do IVA em falta, nos termos do artigo 90.º do CIVA e dos artigos 87.º a 89.º e 90.º da LGT até ao limite de (euro) 250 000, por cada exercício;
3.5 - Nas suas faltas, ausências e impedimentos, o chefe de divisão de Inspeção Tributária I será substituído pelo inspetor tributário assessor licenciado E............;
3.6 - Nas suas faltas, ausências e impedimentos, o chefe de divisão de Inspeção Tributária II será substituído pela inspetora tributária assessora principal licenciada M.............
4 - Nos inspetores tributários A............, E............, M............, F............, V............, J............, A............, M............, M............, M............ e A............, no âmbito da chefia das respetivas equipas:
4.1 - As competências indicadas em I-1, com os nºs 1.6 e 1.17.
4.1 - As competências indicadas em I-1, com os nºs 1.6 e 1.17 (…)”.


E ao abrigo do disposto no artigo 662º, n.º 1 do CPC, altera-se, oficiosamente, a redacção dos pontos 1.3, 1.13 e 1.15 do probatório.

Constata-se que por manifesto erro de julgamento ou manifesto lapso material, nestes pontos do probatório as datas neles mencionadas não se mostram correctas porquanto, no ponto 1.3 ficou a constar que a Impugnante tomou conhecimento do despacho de prorrogação a 2 de Julho de 2014, contudo, a Recorrente, nos artigos 3.º a 5.º da petição inicial, tinha invocado como data desse conhecimento o dia 13 de Março de 2014 e da prova documental resulta esta data.
Igualmente da prova documental junta aos autos verifica-se a ocorrência de lapso na indicação das datas de apresentação das petições de reclamação graciosa e de recurso hierárquico porquanto do ponto 1.13 do probatório consta que a petição de reclamação graciosa foi apresentada a 02.03.2015 sendo a data correcta 27.02.2015 e no ponto 1.15 do probatório consta a que a petição de recurso hierárquico foi apresentada a 17.06.2015 e a data correcta é 16.06.2015.

Assim, a redacção dos pontos 1.3., 1.13 e 1.15 dos factos provados passam a ser as seguintes:

1.3. Em 2014.02.28 a Inspetora Tributária em regime de substituição do Chefe de Divisão II, emitiu o despacho de prorrogação do procedimento inspectivo por mais três meses, bem como a alteração do âmbito da inspeção para Geral, o que foi notificado pessoalmente à Impugnante em 2014.03.13 - cf. informação constante de fls. 97 e ss. do PA anexo aos autos, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

1.13. Em 2015.02.27 a Impugnante apresentou no Serviço de Finanças de Caldas da Rainha a reclamação graciosa das liquidações referidas em 1.11, invocando
- incompetência para a prática do acto/prorrogação da acção inspectiva;
- excesso do prazo legalmente estabelecido para o procedimento inspectivo;
- ineficácia das correcções constantes do projecto do relatório por ausência
de despacho que ratifique o processado para efeitos de audição prévia;
- ilegalidade da correções em sede de IVA quanto ao período 201107 – cft. Fls. 2 e ss. do procedimento de Reclamação Graciosa incluso no PA anexo aos presentes autos.”

1.15. Em 2015.06.16 a Impugnante apresentou no Serviço de Finanças de Caldas da Rainha a petição do recurso hierárquico constante de fls. 2 e ss. do PA, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.”


IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Vem a Recorrente apresentar recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IVA e juros compensatórios do período de 201107 no montante total de € 118.871,86.

A Recorrente desde logo imputa à sentença nulidade por excesso de pronúncia, ambiguidade ou obscuridade por o tribunal ter transcrito o teor do relatório final de inspeção tributária vertido no ponto 1.11 da sentença não se alcançando a sua motivação, violando o disposto nas alíneas c) e d) do nº 1 do art. 615º do CPC (cfr. alíneas E) e F) das conclusões de recurso). E erro de julgamento de direito por incompetência do órgão que determinou a prorrogação da acção de inspecção, violando preceitos do Código do Procedimento Administrativo, por ter prosseguido com um procedimento inspectivo para além do prazo de prorrogação (cfr. alínea B) e C) das conclusões de recurso), por não ter havido qualquer despacho do órgão com competência para efeitos de exercício do contraditório (cfr. alínea D) das conclusões de recurso) e finalmente, por ter sido decidido, sem justificação que a impugnante não cumpriu com o ónus da prova, tendo violado o disposto no art. 607º, nº 4 do CPC (cfr. alínea G) das conclusões de recurso).

Importa desde já decidir da nulidade da sentença por excesso de pronúncia e ambiguidade e obscuridade da decisão.

A Recorrente considera que a sentença é nula dado que o Tribunal recorrido conheceu de questão que não lhe foi colocada, violando o artigo 615.º, n.º 1 al. c) e d) do Código de Processo Civil e é ambígua e obscura por não se entender porque assim decidiu. Para o efeito alega que, estando em causa nos autos apenas correcções em sede de IVA, decorrentes das relações comerciais desenvolvidas entre as sociedades T................... – ............, Lda., e O............. – Sociedade Unipessoal Lda., não compreende o motivo pelo qual o Tribunal transcreveu integralmente o teor do relatório final de inspecção, sendo que, ao fazê-lo, conheceu de questão de que não podia conhecer já que nenhuma das partes lha colocou.

Considerando que foi já proferido Acórdão por este Tribunal em 2020/05/21 no processo nº 236/16.2BELRA verificando-se identidade de fundamentos e referente à mesma Recorrente (no âmbito do qual a ora Relatora foi 2ª Adjunta) seguiremos de perto a fundamentação nele vertido por se revelar igualmente acertada na apreciação dos presentes autos de recurso, não só quanto à questão da nulidade da sentença mas também quanto à questão da incompetência do órgão que determinou a prorrogação da acção de inspeção e que de seguida se transcreve, com as necessárias adaptações:

“(…) No ordenamento jurídico-processual a que este processo deve antes de mais obedecer, a nulidade por excesso de pronúncia está prevista no artigo 125.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Ou seja, tal como ocorre no ordenamento jurídico processual geral (no artigo 615.º n.º 1, al. c), 2ª parte do CPC), também o legislador tributário elegeu a pronúncia do juiz sobre questão que não deva conhecer como causa de nulidade da sentença.

Esta nulidade, como recorrentemente se afirma, está relacionada com a segunda parte do nº 2 do artigo 608.º do Código de Processo Civil (subsidiariamente aplicável, ex vi artigo 2.º do CPPT): o juiz “não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras questões”.

Por sua vez, a nulidade da sentença por obscuridade ou ambiguidade, prevista na segunda parte da al. c) do nº 1 do artigo 615º do CPC, verifica-se (e só se verifica) “quando o pensamento do juiz que se retira da análise da decisão se afigura incompreensível ou imperceptível ou quando o sentido da decisão não seja unívoco, por ser susceptível de diversas interpretações ou comportar vários significados ou sentidos”.

Como começamos por adiantar, nem na sentença recorrida foi apreciada qualquer questão que não tenha sido suscitada pela Recorrente – as questões apreciadas surgem, de resto, todas devidamente identificadas e autonomamente apreciadas no julgado por referência expressa às alegações da Recorrente-, nem da transcrição do teor quase integral do relatório de inspecção no probatório decorre qualquer obscuridade (ininteligibilidade) ou ambiguidade (possibilidade de serem atribuídos dois ou mais sentidos diferentes) da sentença.

Aliás, se bem atentarmos na fundamentação aduzida para suportar a nulidade por excesso de pronúncia, facilmente concluímos que a Recorrente está a confundir factos provados com questões de facto e questões de direito, olvidando que aqueles primeiros apenas servem o propósito de resolver as segundas. Ou seja, os factos mais não são do que a recriação processual, confirmativa ou infirmativa, da realidade que as partes invocaram para sustentar a solução, num ou noutro sentido, das questões de facto e de direito que colocaram ao Tribunal.
E precisamente por os factos serem “apenas” um instrumento de resolução de questões (de facto e de direito) que não pode ver-se neles o conhecimento das questões.

Se assim for, isto é, se os factos traduzirem, per se, a própria solução das questões colocadas e, consequentemente, da decisão, há-de traduzir-se em meras conclusões de facto - que, salvo casos contados, não devem estar integradas no probatório – ou de direito, ou seja, conterão em si mesmos uma valoração jurídica que representa o sentido da solução final do litígio e, consequentemente, nessa circunstância, a qualidade de facto é-lhes alheia.

Em suma, não constituindo os factos, em si mesmos, questões, da integração no probatório do teor do relatório de inspecção não pode resultar a apreciação daquelas últimas e, consequentemente, há que concluir que as alegações da Recorrente são inidóneas para suportar o vício de nulidade por excesso de pronúncia imputado a sentença.

Tudo quanto podia concluir-se, uma vez que deixámos já firmado que o Tribunal não conheceu de nenhuma questão que não lhe tenha sido colocada pela Recorrente, e que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria errara no julgamento de facto ao seleccionar factos totalmente imprestáveis para resolução de qualquer uma das questões colocadas no processo.

Não é, todavia, sequer o caso. Efectivamente, tendo no processo sido suscitadas, quase exclusivamente, questões atinentes ao próprio procedimento e ao relatório, com impacto na validade formal ou substancial daquele, isto é, conexas com o conteúdo das diligências realizadas, com as datas em que foram concretizadas e com a identidade de quem as autorizou tal como descrito no relatório, e indiscutível a pertinência da sua transcrição integral.

Acresce que, ainda no que respeita à valia dos indícios recolhidos pela Administração Tributária para sustentar a conclusão de falsidade das facturas, postas em causa pela Recorrente na petição inicial, é também de realçar que os indícios recolhidos surgem na economia do relatório simultaneamente relacionados com cada um dos fornecedores e respectivas operações económicas e numa lógica globalizante, isto é, como definidores de uma conduta geral ou sistemática da Impugnada tendente a reforçar a qualidade individual de cada um dos indícios sérios e objectivos (credíveis) que sustentam a conclusão alcançada.

Por fim, essa transcrição integral ou quase integral é, no contexto que vimos referindo, ou seja, tendo em conta todos os vícios que foram invocados, a forma mais transparente e rigorosa de fixação da factualidade pertinente, já que da sua transcrição parcial podia resultar a dúvida quanto à decisão que viesse a ser tomada sobre cada uma das questões que a propósito do seu teor foram suscitadas.

Assim se conclui que a sentença não padece de qualquer ambiguidade ou obscuridade, sendo de julgar improcedente a alegada nulidade da sentença.

Confirmada a validade formal da sentença e estabilizada que está a matéria de facto com base na qual cumpre apreciar o julgamento de direito, apreciaremos as demais questões suscitadas no presente recurso

- Incompetência do órgão que determinou a prorrogação do prazo do procedimento inspectivo para além de 16 de Março de 2015

No entender da Recorrente a Administração Tributária, a quem incumbia provar a existência dessa competência, indicando expressamente o órgão delegante ou subdelegante e a respectiva publicação, não o fez.

Conclui, assim, que o acto que determinou a prorrogação é nulo, tal como o são todos os actos subsequentes praticados no procedimento após 16 de Março de 2014, o que deve ser reconhecido por este Tribunal de recurso, revogando-se nesta parte a decisão.

Não lhe assiste razão.

Como é sabido, a competência é definida por lei ou por regulamento, é irrenunciável e inalienável, sem prejuízo de eventual delegação ou subdelegação de poderes ou substituição nos casos não expressamente proibidos por lei (artigo 29.º n.° 1, do Código de Procedimento Administrativo (CPA), na redacção anteriormente detida e que será a relevada infra em todos os normativos que deste diploma venham a ser convocados, atenta a data da prática dos factos, e artigo 62.º, n.° 1, da Lei Geral Tributária - LGT).

Por expressa imposição legal, o órgão delegado ou subdelegado deve mencionar essa qualidade no uso da delegação ou subdelegação, cabendo a sua substituição, nos casos de ausência, falta ou impedimento do titular do cargo, ao substituto designado na lei ou, sendo esta omissa, essa substituição deve ser assegurada pelo inferior hierárquico imediato, mais antigo, do titular a substituir, abrangendo os poderes delegados e subdelegados (artigos 38.º e 41.º do CPA).

Para além das referências que de forma especial se encontrem legalmente previstas para o acto concreto, deste devem constar sempre a indicação da autoridade que o praticou e a menção da delegação ou subdelegação de poderes, quando exista, cabendo ao órgão competente para a prática do acto, em caso de incompetência, o poder de o ratificar, ratificação esta (tal como a reforma e a conversão) que retroagem os seus efeitos à data dos actos a que respeitam, salvo se tiver entretanto havido alteração ao regime legal pertinente (artigos 123.º e 137.º do CPA).

Posto isto, e revertendo ao caso concreto, não é discutível, face ao vertido no ponto 1.17. do probatório, mais concretamente face ao teor do despacho n.° 5864/2013, publicado no Diário da República, 2ª Série, n.° 87, de 7 de Maio de 2013 (identificado no documento de fls. 198 do processo administrativo) que o Director de Finanças de Leiria delegou no Chefe de Divisão M............, nomeadamente, a competência para emitir as ordens de serviço e despachos, incluindo a alteração dos fins, âmbito e extensão do procedimento de inspecção tributária, prevista nos arts. 13.°, 15.°, n.° 1, 16.°, n.° 1, al. b) e 46.° do RCPITA, e, bem assim, a competência para autorizar, em casos devidamente justificados, a ampliação dos actos de inspecção, nos termos dos artigos 36.°, n.° 3, als. a) a c), e 53.°, ambos do RCPITA.
É também indiscutível que ficou provado, atento o teor desse mesmo despacho, que o Director de Finanças de Leiria determinou que o Chefe de Divisão, M............, seria substituído, nas suas faltas, ausências e impedimentos, pela inspectora tributária assessora principal M............. E que o Chefe de Divisão, M............, no uso da delegação de competências conferida pelo Director de Finanças de Leiria, emitiu a Ordem de Serviço n.° OI201301312, e a coberto da qual os Serviços da Inspecção Tributária, da Direcção de Finanças de Leiria, deram início a um procedimento de inspecção, em nome da Impugnante, com referência a IVA e IRC dos exercícios de 2011 e 2012 (cfr. factos apurados sob os n.ºs 1.1 e 1.2 do probatório).
Ficou ainda provado que a Chefe de Divisão, M............, em regime de substituição, decidiu, mediante despacho exarado a 28 de Fevereiro de 2014, prorrogar o prazo do procedimento inspectivo em mais três meses, bem como alterar o seu âmbito para geral (cfr. facto apurado sob o n.º 1.3.).
Ora, tendo presente a disciplina legal supra definida é forçoso concluirmos, face aos factos descritos, que que a Chefe de Divisão M............, quando proferiu o despacho que determinou a prorrogação do prazo do procedimento de inspecção tributária por mais três meses, isto é, a 28 de Fevereiro de 2014, não tinha competência para esse efeito.
Todavia, admitindo o vício em análise (incompetência relativa) que é passível de sanação e tendo esta ocorrido através do despacho n.° 7491/2014 – porque aí foi delegado na Chefe de Divisão, M............, a autorização, em casos devidamente justificados, da ampliação e da suspensão dos actos de inspecção, de harmonia com os arts. 36.°, n.° 3, als. a) a c), e 53.° do RCPITA, com efeitos reportados a 1 de Fevereiro de 2014 e foram ratificados todos os actos, entretanto, praticados (artigos 134.°, n.°s 1 e 2, al. b), 135.°, 137.º, n.ºs 3 e 4, todos do CPA, 2.°, al. d), do CPPT e 4.°, al. e), do RCPITA), a questão suscitada não tem razão de ser.
Ou seja, não existe fundamento, contrariamente ao que constitui pretensão da Recorrente, para afastar da ordem jurídica o acto atacado nem os que subsequentemente foram proferidos e que da sua validade estavam dependentes.
(…) Alega ainda a Recorrente que o Tribunal a quo, ao validar o prosseguimento da inspecção para além desse prazo de prorrogação, subverteu, “sem avançar qualquer fundamentação, violando dessa forma o preceituado no n.º 4 do art.º 607.º do CPC”.
Recordamos, de novo, que o artigo 607.º do CPC, preceito que a Recorrente convocou insistentemente (e de forma descontextualizada) ao longo das suas alegações e conclusões de recurso, estabelece os critérios formais de elaboração da sentença. E que consta do seu n.º 4, que, “ Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.”.
(…)
Na verdade, nos termos do artigo 36.º, n.° 1 do RCPITA, o procedimento de inspecção tributária pode iniciar-se até ao termo do prazo de caducidade do direito de liquidação dos tributos ou do procedimento sancionatório, sem prejuízo do direito de exame de documentos relativos a situações tributárias já abrangidas por aquele prazo, que os sujeitos passivos e demais obrigados tributários tenham a obrigação de conservar.
Por sua vez, por força do preceituado nos n.ºs 2 e 3 do mesmo preceito e diploma legais, o procedimento de inspecção deve ser contínuo e concluído no prazo máximo de seis meses a contar da notificação do seu início, salvo se o prazo for prorrogado, o que pode ocorrer, no máximo, por dois períodos de três meses.
A regularidade ou cumprimento deste prazo e o conhecimento das eventuais prorrogações são controladas pela cópia, assinatura e data desta apostas na ordem de serviço que determinou o procedimento, a qual deve ser entregue ao sujeito passivo no início daquele, alvo nas situações previstas no artigo 46.º (artigo 51.º, n.°s 1, 2 e 3 do RCPITA. Nos termos do preceituado nos artigos 61.°, n.° 1 e 62.º n.º 1 e 2 do RCPITA, os actos de inspecção consideram-se concluídos na data de notificação da nota de diligência emitida pelo funcionário incumbido do procedimento, devendo o procedimento culminar com a elaboração de um relatório final com vista à identificação e sistematização dos factos detectados e sua qualificação jurídico-tributária, cuja notificação ao contribuinte deve ser realizada, por carta registada, nos 10 dias posteriores ao termo do prazo referido no n.° 4 do artigo 60.°, considerando-se concluído o procedimento na data dessa notificação.
Ora, como se constata dos factos apurados, o procedimento inspectivo realizado pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Leiria, teve o seu início a 16 de Setembro de 2013 e findou a 14 de Agosto de 2014, tendo, durante esse período de tempo sido objecto de prorrogação por três meses, notificada à Impugnante a 13 de Março de 2013 (cfr. factualidade apurada nos pontos 1.1, 1.3 e 1.10 do probatório e artigos 51.°, n.°s 1 a 3 e 62.º n.ºs 1 e 2 do RCPITA).
Donde, é forçoso concluirmos que, in casu, foi ultrapassado o prazo de 9 meses (seis meses do prazo inicial acrescidos dos três meses do período de prorrogação), atento o preceituado no artigo 36.º, n.° 2 e 3 do RCPITA.
Acontece, porém, que contrariamente ao que a Recorrente defende, essa circunstância de facto, comprovada, não tem por efeito inelutável a ilegalidade do procedimento, conduzindo apenas, como pacífica e reiteradamente a doutrina e a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores vem explicando, a que o efeito suspensivo, produzido pela instauração do procedimento, cesse. Ou seja, o prazo de caducidade do direito à liquidação do imposto, nesta circunstância de facto, contar-se-á, por força do estabelecido, conjugadamente, nos artigo 32.º, n.º 1 do RCPITA e 46.°, n.º1 da LGT, desde o seu início. Neste sentido, entre muitos, vide o acórdão do Tribunal Constitucional de 25 de Setembro de 2008 (acórdão n.º 457/2008), que aqui realçamos pela amplitude e profundidade a sua exposição fundamentadora, integralmente disponível em https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos).
Ora não tendo sido colocada a questão de uma eventual caducidade do direito à liquidação (…) há que concluir que a não observância do prazo procedimental não produz sobre a validade do procedimento e dos actos subsequentes os efeitos que a Recorrente lhe imputa.”

Prosseguindo na apreciação das demais questões suscitadas quanto ao erro de julgamento, vem a Recorrente invocar “não ter havido qualquer despacho do órgão com competência para efeitos de exercício do contraditório” e que foi decidido, sem justificação que a impugnante não cumpriu com o ónus da prova, tendo violado o disposto no art. 607º, nº 4 do CPC (cfr. alíneas D) e G) das conclusões de recurso).

Importa destacar que do ponto de vista formal nada há a apontar ao projecto de relatório de inspecção porquanto o despacho que nele foi exarado encontra-se proferido por entidade competente, atenta a qualidade de quem o exarou, pois, como vimos a propósito da questão antecedente, esse despacho foi proferido pela Chefe de Equipa no exercício de competências delegadas (cfr. ponto 1.4 do probatório), pelo que improcede o fundamento pela Recorrente na alínea D) das suas conclusões de recurso.

Vejamos agora se existe erro de julgamento por ter sido decidido, sem justificação que a impugnante não cumpriu com o ónus da prova, tendo violado o disposto no art. 607º, nº 4 do CPC (cfr. alínea G) das conclusões de recurso).

Para tanto importa atender à fundamentação vertida na sentença recorrida e que de seguida se transcreve:

Quanto às correções propriamente ditas em sede de IVA, relativamente ao período 201107:
Alega a Impugnante que, ao contrário do entendido pela Inspeção Tributária, não há indícios suficientemente credíveis de que as transações não foram realmente efetuadas, tendo a Impugnante disponibilizado todos os elementos contabilísticos, tendo toda a faturação sido emitida de acordo com os preceitos legais em vigor. Mais alega que o incumprimento de alguns seus fornecedores perante o fisco ou o facto de o meio de pagamento ter sido endossado a quem entender o recetor do mesmo, não constitui indício da prática de crime fiscal.
Ora, sobre a administração tributária recai o ónus de provar que reúne os pressupostos legais que a habilitam a proceder às correções de IVA, nos termos do artigo 74.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT), cabendo-lhe demonstrar a factualidade que abala a presunção de veracidade das declarações do contribuinte, prevista no artigo 75.º, n.º 1 da LGT.
Por seu turno, resulta do artigo 19.º, n.º 3 do CIVA que “não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura ou documento equivalente.”.
É jurisprudência pacífica dever interpretar-se a expressão “operação simulada” como querendo referir-se a qualquer operação total ou parcialmente inexistente, abrangendo o referido preceito tanto as situações de simulação absoluta, como as situações de simulação relativa, que se poderá representar como a simulação do valor da operação, ou dos seus intervenientes.
Destarte, administração tributária não tem de fazer a prova direta da simulação, sendo suficiente a prova indireta, não se tornando, assim, necessário que a administração tributária prove os pressupostos da simulação previstos no artigo 240.º do Código Civil, bastando a prova de elementos indiciários que a levam a concluir nesse sentido.
Assim mesmo vem sendo entendido pelos tribunais superiores, que consideram que não é possível a dedução do IVA quando às faturas não corresponda uma operação económica concreta, concluindo, assim, que a possibilidade de dedução está intimamente conexionada com a existência de uma concreta transação comercial, transmissão de bens ou prestação de serviços. Daqui resulta que “o direito de dedução do IVA pago a montante apenas poderá existir, segundo a própria natureza das coisas, relativamente a imposto efetivamente suportado em operações efetivamente acontecidas. De contrário, estaríamos perante um simples arquétipo intelectual virtual e não perante um tributo que visa atingir de forma geral o consumo real de bens e serviços nos diversos estádios do circuito económico.” (neste sentido, Ac. STA de 2002.04.17, proc. n.º 026635).
Na sua tarefa, os serviços inspetivos da AT podem, inclusivamente, lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, obtidos junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das faturas não têm necessariamente que advir de, nem sequer em exclusivo, de elementos do próprio contribuinte fiscalizado. Ou seja: os SIT podem utilizar elementos concernentes aos emitentes das faturas para concluir pela existência de faturação falsa.
Cumprido este ónus probatório, recai sobre o contribuinte o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a deduzir o imposto nos termos do disposto no artigo 19.º, n.º 3 do CIVA, ou seja, o ónus de demonstrar que as transações tituladas pelas faturas apresentadas são verdadeiras e reais e, por conseguinte, tem direito a proceder à dedução do respetivo imposto.
In casu, e conforme consta do relatório de inspeção que deu origem ao ato de liquidação aqui sindicado, os serviços inspetivos concluíram que a mercadoria constante das faturas desconsideradas pode ter sido adquirida pela Impugnante, mas não nos termos em que as respetivas faturas de compra titulam.
Para chegar a esta conclusão, os SIT tiveram em consideração os seguintes fatores:
- as faturas emitidas em nome de A............, SRL foram anuladas depois do TOC da impugnante ter detetado que aquela empresa não se encontrava registada para efeitos de transações intracomunitárias;
- a pessoa com quem o sócio-gerente da impugnante afirmou perante os Serviços de Inspeção ter realizado as transações é funcionário da S................, S.A, tendo indicado também os contactos desta empresa;
- os documentos contabilísticos que suportam os pagamentos registados na conta corrente da T..................., Lda. têm a indicação manuscrita “S................”;
- encontra-se registado em Outubro de 2012 na conta corrente da S................, S.A. um depósito em numerário de €43.420,00, com indicação de empréstimo, seguido de um “pagamento” através do cheque nº ............, no valor de €43.419,00, constatando-se que este valor corresponde ao valor de cada cheque pré-datado emitido pela impugnante à T..................., Lda. em março 2012, o que não parece ser coincidência, e
- as empresas A............, SRL, O............., Lda. e T..................., Lda. não têm estrutura (instalações, pessoal, compras, …) que lhes permita a realização das operações tituladas pelas faturas emitidas em seu nome.
Ora, esta factualidade apurada, concatenada, permite concluir pela existência de indícios de que as transações tituladas pelas faturas emitidas em nome de Agrupaicones, SRL, O............., Lda. e T..................., Lda. não correspondem a transações efetivas no que respeita aos seus intervenientes, e que a impugnante P..........., Lda. tinha conhecimento destes factos.
Ora, para que haja direito à dedução do IVA mencionado nas faturas e documentos equivalentes, além de ser necessário que estes estejam passados em forma legal – n.º 2 do artigo 19.º e artigo 35.º do CIVA -, também é necessário que as operações constantes das faturas ou documentos equivalentes se tenham realizado e pelo preço aí referido, não podendo deduzir-se imposto que resulte de operações simuladas ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente (n.º 3 do art. 19º CIVA). Ou seja, não confere direito à dedução de IVA o imposto que resulte de simulação do preço constante da fatura ou documento equivalente, de acordo com o n.º 3 do artigo 19º do CIVA, e ainda que, eventualmente, o mesmo tenha sido entregue nos cofres do Estado.
Ou seja, a Autoridade Tributária deu a conhecer a forma de apuramento das irregularidades apontadas, demonstrou a respetiva existência, bem como da determinação das correções efetuadas nos períodos em apreço, fazendo, assim, a prova que lhe compete nos termos do artigo 74.º da LGT.
Inversamente, competia à Impugnante afastar os supramencionados indícios, demonstrando que as faturas refletem operações nos exatos termos em que foram emitidas.
Todavia, a Impugnante não cumpriu o seu ónus probatório a este respeito, porquanto os documentos apresentados por si junto com os procedimentos administrativos não foram suficientes para contrariar as irregularidades encontradas durante a inspeção em causa, nem tampouco nesta sede impugnatória efetuou qualquer prova adicional, fosse documental ou testemunhal, que permitisse abalar a factualidade descrita, resultando assim indedutível o IVA apurado naquelas faturas que titulam negócios simulados,
Impunha-se que a impugnante fosse mais longe no cumprimento do seu ónus probatório (artigo 74.º da LGT). Não logrando fazê-lo, nesta parte, tal não pode deixar de ser decidido contra si, pois obtidos indícios credíveis e exposta a factualidade capaz de sustentar uma probabilidade elevada da simulação das operações constantes das faturas em análise nos presentes autos, fica ilidida a presunção legal de veracidade das declarações da Impugnante e dos dados constantes da sua contabilidade, nos termos do disposto no artigo 75.º, n.º 2 da LGT, cabendo-lhe então o ónus da demonstração da efetiva realidade dos intervenientes nas transações em causa nos presentes autos, titulados pelas faturas aqui sindicadas, sem margem para dúvidas.
No caso em apreço, essa prova não foi feita: os elementos documentais carreados para os autos pela impugnante não permitem demonstrar o verdadeiro e real circuito monetário envolvido nas várias transações tituladas pelas faturas em causa nos presentes autos, porquanto os documentos juntos não comprovam que os produtos constantes das faturas foram efetivamente fornecidos ou vendidos pelas entidades emitentes das faturas, apenas evidenciando o circuito formal do movimento comercial e contabilístico.
Em suma, os documentos apresentados pela Impugnante não são bastantes para comprovar que os bens que constam das faturas desconsideradas pelos SIT foram efetivamente fornecidos pelas emitentes, porquanto a impugnante apenas se preocupou em demonstrar, formalmente, a compra e venda de mercadorias e respetivo pagamento do preço, olvidando que não foi posto em causa a existência efetiva das transações ou do pagamento do respetivo preço, mas sim os seus intervenientes e os meios de pagamento utilizados, o que era do conhecimento da impugnante, circunstância que esta não logrou desconstruir.
Como tal, conclui-se que os SIT lograram carrear indícios sérios e credíveis de que os emitentes das faturas em causa nos presentes autos não foram os reais fornecedores da mercadoria adquirida e depois exportada pela impugnante, não tendo esta conseguido demonstrar que não tinha conhecimento dessa circunstância.
Cumpre ainda registar que tendo sido esta a linha argumentativa da Impugnante em sede de recurso hierárquico, outra não podia ser a decisão daquele procedimento, ao entender que não tendo sido suscitado nenhum quadro factual original, nem acrescentado qualquer quadro legal inovatório em relação àquele em que se sustenta a informação prestada pelos SIT no seu relatório, que dá por integralmente reproduzida, dever ser mantida a posição da AT, pelo que inexiste a invocada falta de fundamentação da decisão que indefere o recurso hierárquico.
Motivo pelo qual improcede também a alegação da impugnante quanto a esta questão, pelo qua a presente Impugnação resulta totalmente improcedente”

Considerando o teor da sentença acima transcrito, consideramos que a mesma não merece qualquer censura na medida em que define o quadro legal da situação e a repartição do ónus da prova de forma clara e assertiva. Por outro lado, também do ponto de vista da valoração dos factos, o julgado merece a nossa concordância, na medida em que os indícios recolhidos pela administração tributária e vertidos no relatório de inspecção são credíveis, sérios e objectivos e revelam fortes razões para questionarmos a veracidade das facturas e como tal, afastar a presunção de veracidade dos elementos contabilísticos da Recorrente.

Por outro lado, não tem a Recorrente razão quando alega que cumpriu o seu ónus probatório.

Na verdade, centrando-se a questão na identidade dos intervenientes nas transações fiscalmente desconsideradas, impunha-se que a Recorrente tivesse demonstrado que foi efectivamente com aquelas sociedades, cujos fornecimentos estão em causa nos autos, que celebrou os referidos negócios.
Ora, como a prova produzida demonstra, tal circunstancialismo de facto não resultou provado, ou seja, não ficou provado que as compras tituladas naquelas facturas tenham sido efectivamente vendidas pelas supra identificadas sociedades. Sendo, outrossim, evidente que a Recorrente bem sabia, pelo conhecimento que tinha da pessoa que intermediou os negócios – os múltiplos negócios ao longo dos anos –, as funções que este desempenhava e a quem se destinavam os cheques, especialmente que não seriam recebidos pelo interveniente “formal” do negócio. Ou seja, não se provou que as facturas fossem verdadeiras quanto aos intervenientes e provou-se que recorrente sabia que elas não eram verdadeiras na parte questionada na fundamentação das liquidações.

Face ao exposto conclui-se serem improcedentes todos os fundamentos invocados pela Recorrente no presente recurso pelo que a sentença recorrida não padece de qualquer vício, devendo ser mantida na ordem jurídica.

V- DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo da Recorrente.

Lisboa, 4 de Junho de 2020

Luisa Soares
Mário Rebelo
Patrícia Manuel Pires