Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03230/07
Secção:CA - 2º. JUÍZO
Data do Acordão:12/04/2014
Relator:NUNO COUTINHO
Descritores:ESTAÇÕES DE RADIOCOMUNICAÇÕES; ACTO CONSTITUTIVO DE DIREITOS; REVOGAÇÃO IMPLÍCITA;TAXAS
Sumário:1. Praticado acto de deferimento de pretensão de instalação de infra-estrutura de suporte de estação de radiocomunicações, sem qualquer condição, a imposição de pagamento de taxas, um ano após a prática do referido acto, constitui revogação implícita do referido acto.
2. A instalação das infra estruturas de suporte de estação de radiocomunicações apenas está sujeita ao pagamento da taxa de instalação prevista no artº 6º nº 10 do D.L. nº 11/2003.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – Relatório

O……, S.A. intentou acção administrativa especial, visando acto proferido pelo Presidente da Câmara Municipal da Lourinhã, em 21 de Dezembro de 2004, nos termos do qual foi deferido o requerimento de autorização municipal para instalação de infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações, com a indicação de que deveria pagar as taxas devidas desde o ano de 2004.

Por Acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa 2 foi julgada parcialmente procedente a acção, tendo sido anulado o despacho impugnado, no segmento que determina a aplicação retroactiva da taxa devida pela autorização das estações de radiocomunicações.

Inconformado com o decidido, o A. recorreu para este TCA Sul, tendo formulado as seguintes conclusões:

A. Na petição inicial da acção administrativa especial que espoletou o presente processo, a O…… alegou a invalidade do acto impugnado, entre outras razões relativamente às quais nunca concedeu, pelo facto de, nos termos da lei, a autorização para instalação de antenas de radiocomunicação não poder ficar condicionada ao pagamento de quaisquer taxas.

B. Para além disso, defende-se igualmente que a taxa prevista constitui urna prestação única e não, conforme entendimento do Município da Lourinhã, uma renda anual.
C. Ora, apesar de as invalidades referidas terem sido submetidas à apreciação do tribunal recorrido, de as mesmas serem essenciais à conformação do pedido, de a sua indagação não se encontrar prejudicada pela solução dada às questões efectivamente tratadas pelo TAF de Loures e de este dispor de todos os elementos indispensáveis à sua decisão, o douto Acórdão subjudicenão toma, pura e simplesmente, qualquer posição sobre as questões em causa, assim violando o disposto nos artigos 95°, n.°s 1 e 2, do CPTA, e 660°, a° 2, do CPC, termos em que aquele se encontra ferido com o vício de nulidade, ao abrigo do artigo 668°, nº 1, alínea d), do CPC, aplicável por força do artigo l’ do CPTA.
D. Seja como for, a decisão de que ora se recorre traça uma incorrecta caracterização do acto impugnado, considerando-o um acto meramente confirmativo, quando, na verdade, o mesmo é, efectivamente, um acto administrativo de teor revogatório, que produz, por si só, um efeito inovatório no ordenamento jurídico com potencialidade lesiva e a consequente susceptibilidade de ser impugnado (a aplicação das taxas e o condicionamento, ao seu pagamento da autorização municipal para instalação de estruturas de radiocomunicaçao).
E. Nestes termos, serão dc julgar provadas as invalidades reconhecidas ao acto em questão, elencadas na petição inicial da acção proposta.

F. A primeira autorização municipal conferida à autora em 28/11/2003 é um acto perfeitamente válido, constitutivo de direitos ou interesses legalmente protegidos, sendo, portanto, ao abrigo do artigo 140°, a° 1, alínea c), e n.° 2, alínea b), do CPA, irrevogável, salvo nas situações em que, de acordo com a alínea b) do n.° 2 desse preceito, o interessado dê a essa revogação o seu consentimento.
G. Ora, esse consentimento não foi dado - nem solicitado -, pelo que é inequívoca a anulabilidade do acto impugnado.
H. Sem prescindir, mesmo se a referida autorização tivesse sido concedida de modo ilícito, o despacho de 23/12/2004 seria igualmente anulável, uma vez que, segundo o artigo 141°, n.° 1, do CPA, os actos inválidos apenas podem ser revogados no prazo máximo de um ano - o que não aconteceu.

I. Aliás, continuando a não conceder, sempre se diga que acto impugnado seria anulável mesmo que se tratasse de um acto primário incidente sobre a situação subjacente ao requerido, uma vez que aquela autorização não pode ficar condicionada ao pagamento de quaisquer taxas.
J. Com efeito, resulta dos termos conjugados dos n.°s 9 e 10 do artigo 6° do Decreto-Lei n.° 11/2003, de 18 de Janeiro, que logo que verificados os pressupostos legais de que depende a concessão da autorização, o Município deve praticar o correspondente acto administrativo de deferimento, o qual não pode, por expressa determinação da lei, ficar dependente do pagamento de qualquer quantia - uma vez deferido o pedido, o requerente pode proceder à instalação das infra-estruturas ou manter o seu funcionamento, sendo ilícito e anulável o acto pelo qual se condiciona esse deferimento ao pagamento das taxas respectivas.
K. Ao que deve ainda ser acrescentado que as taxas solicitadas são ilegais, pois a que é prevista no artigo 6°, nº 10, do Decreto-Lei nº 11/2003, de 18 de Janeiro, é uma taxa administrativa (única) de instalação, e não uma renda anual, de modo que, perfilhando o entendimento contrário, é o acto impugnado, também por esse motivo, anulável.

L. O despacho em crise é, pois, ilegal, por violação dos artigos 6°, nºs 9 e 10, e 15°, nº 4, ambos do Decreto-Lei nº 11/2003, de 18 de Janeiro, bem como os artigos 140°, nºs 1, alínea c), e 2, alínea b), e 141°, n.° 1, ambos do CPA..

Não foram apresentadas contra-alegações.
II) No Acórdão recorrido foram dados como assentes os seguintes factos:

1. Depois da publicação do Decreto-Lei n.º 11/2003, de 11 de Janeiro, a A., que possuía três antenas de radiocomunicações já instaladas no concelho da Lourinhã, apresentou o pedido de autorização previsto no art. 15.º daquele diploma (acordo e fls. 2-1, do processo instrutor).
2. Em 4 de Novembro de 2003, foi emitida pelos serviços da Divisão de Ordenamento do Território e Urbanismo da R., a Informação n.º 78/03, na qual consta parecer favorável relativamente à autorização municipal das estações da A. com os n.º 39 e 605, e parecer desfavorável relativamente à estação n.º 78, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. doc. n.º 1, anexo à PI, a fls. 10-13, dos autos, e fls. 76-73, do processo instrutor).
3. Em 28 de Novembro de 2003, foi exarado despacho sobre a Informação n.º 78/03, referida no ponto anterior, com o seguinte teor (cf. fls. 76, do processo instrutor):
Deferido
De acordo com Parecer
03/11/28
O Presidente da Câmara
(Assinatura ilegível)
4. Em 21 de Dezembro de 2004, foi exarado novo despacho sobre a Informação n.º 78/03, referida no ponto anterior, com o seguinte teor (cf. fls. 76, do processo instrutor):
Deferido a)
De acordo com Parecer
2004/12/21
O Presidente da Câmara
(assinatura ilegível)
a) Devendo pagar as taxas devidas desde o ano de 2004 (assinatura ilegível)
5. A A. foi notificada do despacho referido no ponto anterior, através de ofício emitido pelos serviços do Município da Lourinhã, com o n.º 3702, datado de 22 de Dezembro de 2004, e comunicado à A. em 23 de Dezembro de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e no qual se lê, designadamente o seguinte (cf. fls. 78, do processo instrutor, doc. 2, anexo à PI, a fls. 14, dos autos e acordo quanto à data de conhecimento pela A.):
(…)
Conforme despacho do Sr. Presidente datado de 21/12/04 e relativamente ao assunto em
referência, informamos V. Ex.ª que foi deferido o requerido mediante o pagamento das
taxas administrativas previstas no RUET, à excepção da situada no Outeiro da Cabeça,
pelo facto de não se localizar no território concelhio.
(…)
6. Através de carta datada de 11 de Janeiro de 2005, dirigida ao Presidente da Câmara Municipal da Lourinhã, a A. pede que “se digne a informar a Requerente, por escrito, do valor das taxas administrativas devidas pela presente Autorização Municipal” (cf. fls. 79, do processo instrutor).
7. Em 25 de Fevereiro de 2005, é emitido pelos serviços da Divisão de Ordenamento do Território e Urbanismo da R., ofício com o n.º 598, em resposta ao pedido de informação referido no ponto anterior, cujo teor aqui se dá por reproduzido, e no qual se lê, designadamente, o seguinte (cf. fls. 80-81, do processo instrutor):

Estações de Radiocomunicações e respectivos acessórios
TAXAS
Por cada unidade de instalação de infraestruturas de suporte das estações de
radiocomunicações e respectivos acessórios
Por cada unidade de instalação (duas unidades) 1.000
Ano de 2004 (duas unidades) 1.000
Ano de 2005 (duas unidades 1.000
TOTAL 3.000

Ao abrigo do artigo 662º nº 1 do C.P.C. adita-se o seguinte facto:

O requerimento referido em 1) foi formulado através de ofício datado de 15 de Junho de 2003. – cfr. doc. de fls. 46 dos autos.

III) Fundamentação jurídica

A primeira questão que importa apreciar, no presente recurso, prende-se com a nulidade, por omissão de pronúncia, do Acórdão recorrido, tendo a recorrente referido, para invocar a referida nulidade, ter invocado, na p.i., a violação do artigo 6º nº 10 do D.L. nº 11/2003, de 18 de Janeiro e a circunstância de a autorização para instalação das estações de infra- estruturas de suporte de radiocomunicações não poder ficar condicionada ao pagamento de quaisquer taxas.

Apreciando:

Preceitua a alínea d) artº 615 do C.P.C. (versão actual) que a sentença é nula quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”, prevendo os nº 1 e 3 do artº 5º, respectivamente, que “às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas e que “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito”, preceito que encontrava correspondência no artigo 664 da anterior versão do C.P.C. nos termos do qual “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito; mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no artigo 264º”.

Conforme se refere em Acórdão do TCA SUL, proferido em 31 de Outubro de 2013, no âmbito do Proc. nº 06832/13: “A sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, o excesso de pronúncia pressupõe que o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes. Por outras palavras, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “ultra petita”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 143 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690 e seg.; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).

Munidos destes considerandos, importa apreciar a argumentação aduzida pela recorrente para sustentar a nulidade do Acórdão recorrido, importando referir que o Acórdão recorrido se pronunciou, ainda que de forma indirecta, quanto à questão da instalação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações poder ou não ficar condicionada ao pagamento de quaisquer taxas, bem como, ainda que igualmente de forma indirecta, quanto à invocada violação do nº 10 do artigo 6º do Decreto Lei nº 11/2003, de 18 de Janeiro, pronúncia que se deve ter como efectuada, no Acórdão recorrido, dado no mesmo se concluir pela legalidade do acto praticado pelo Presidente da Câmara Municipal da Lourinhã, visado nos autos, concluindo-se que a pretensão da ora recorrente apenas deveria ser julgada procedente na estrita medida “…em que determina a aplicação retroactiva da taxa devida pela autorização das estações de radiocomunicações, pelo que improcede a arguição da nulidade do Acórdão recorrido.

Julgada não verificada a nulidade assacada ao Acórdão recorrido necessário se torna entrar na análiseda violação dos artigos 140º e 141º do C.P.A., preceitos que a recorrente entende terem sido violados com a prática do acto visado nos autos, dado o mesmo constituir uma revogação, ainda que implícita do despacho proferido pelo Presidente da Câmara Municipal da Lourinhã em 28 de Dezembro de 2003, tarefa para a qual importa recordar a matéria de facto dada como assente.

Assim, e recordando os factos apurados: no dia 4 de Novembro de 2003, foi elaborada pelos serviços da Divisão de Ordenamento do Território e Urbanismo da R., a Informação n.º 78/03, na qual consta parecer favorável relativamente à autorização municipal das estações da A. com os n.º 39 e 605, e parecer desfavorável relativamente à estação n.º 78, tendo o Presidente da Câmara Municipal da Lourinhã, em 28 de Novembro de 2003, exarado despacho, sobre a referida informação com o seguinte teor: “Deferido. De acordo com o parecer”, no dia 21 de Dezembro de 2004 foi exarado novo despacho sobre a referida informação com o seguinte teor: Deferido a)De acordo com Parecer; a) Devendo pagar as taxas devidas desde o ano de 2004 (assinatura ilegível).

Preceituam os artigos 140º e 141º do C.P.A.:
Artigo 140º
Revogabilidade dos actos válidos
1.Os actos administrativos que sejam válidos são livremente revogáveis, excepto nos casos seguintes:
a) Quando a sua irrevogabilidade resultar de vinculação legal;
b) Quando forem constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos;
2. Os actos constitutivos de direitos ou interesses legalmente protegidos são, contudo, revogáveis:
a) Na parte em que sejam desfavoráveis aos interesses dos seus destinatários;
b) Quando todos os interessados dêem a sua concordância à revogação do acto e não se trate de direitos ou interesses indisponíveis.
Artigo 141º
Revogabilidade dos actos inválidos
1.Os actos administrativos que sejam inválidos só podem ser revogados com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade demandada.
2. Se houver prazos diferentes para o recurso contencioso, atender-se-á ao que terminar em último lugar.”

Confrontando o teor do acto praticado em 28 de Dezembro de 2003, com o proferido em 21 de Dezembro de 2004, não pode deixar de se firmar a conclusão segundo a qual o referido segundo acto revogou, ainda que implicitamente, o despacho datado de 28 de Dezembro de 2003, dado que, se por força do primeiro, o requerimento formulado pela A. de pedido de autorização de instalação de infra-estruturas de suporte de antenas de radiocomunicações foi deferido sem qualquer condição, o segundo acto defere a mesma pretensão, condicionando-a, contudo, ao pagamento das “…taxas devidas desde o ano de 2004”, pelo que sendo inequívoco que o despacho proferido em 28 de Dezembro de 2003 é um acto constitutivo de direitos, o acto impugnado revogou-o, ainda que em implicitamente, em violação do disposto na alínea b) do nº 2 do artigo 140º dado a ora recorrente não ter dado a sua concordância quanto à revogação pelo mesmo operada.

Assim, não se acompanha o Acórdão recorrido quando no mesmo se refere que o despacho visado nos autos apenas se limita a confirmar o despacho proferido em 28 de Novembro de 2003, contendo apenas um segmento inovador relativo ao pagamento de taxas, dado este “segmento de inovador” ser o que permite concluir que o despacho em apreço opera uma revogação, implícita, como se referiu, do despacho datado de 28 de Novembro de 2013.

Aqui chegados, e tendo presente que o acto impugnado não revogou, com fundamento na invalidade do mesmo, o despacho datado de 28 de Novembro de 2013, pelo que não haverá lugar à apreciação da violação do artigo 141º do C.P.A., importa apreciar a violação dos artigos 6º nº 9 e 10º e 15º nº 4 do D.L. nº 11/2003, de 18 de Janeiro.

Preceituam as normas invocadas:

Artigo 6.º
Procedimento

1 - O presidente da câmara municipal profere despacho de rejeição liminar do pedido no prazo de oito dias a contar da respectiva apresentação, sempre que o requerimento não seja instruído com os elementos referidos no artigo anterior.

2 - Compete ao presidente da câmara municipal promover, no prazo de 10 dias a contar da data de apresentação do pedido, a consulta às entidades que, nos termos da lei, devem emitir parecer, autorização ou aprovação relativamente à instalação

3 - O requerente pode solicitar previamente os pareceres, autorizações ou aprovações legalmente exigidos junto das entidades competentes referidas no número anterior, devendo para o efeito disponibilizar os documentos mencionados na alínea c) do n.º 1 do artigo 5.º.

4 - No termo do prazo referido no n.º 2, o interessado pode solicitar a passagem de certidão da promoção das consultas devidas, a qual será emitida pela câmara municipal no prazo de dois dias.

5 - Se a certidão for negativa, o interessado pode promover directamente as consultas que não hajam sido realizadas, devendo em tal certidão ser enumeradas as entidades que devem ser consultadas.

6 - Os pareceres, autorizações ou aprovações das entidades consultadas devem ser recebidos pelo presidente da câmara municipal ou pelo requerente, conforme o caso, no prazo de 10 dias a contar da data de recepção do pedido de consulta.

7 - Considera-se haver concordância daquelas entidades com a pretensão formulada se os respectivos pareceres, autorizações ou aprovações não forem recebidos dentro do prazo fixado no número anterior.

8 - O presidente da câmara municipal decide sobre o pedido no prazo de 30 dias a contar da data de recepção do pedido.

9 - O acto de deferimento do pedido consubstancia a autorização para a instalação de infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações e respectivos acessórios.

10 - O disposto no número anterior não dispensa o pagamento de taxas administrativas de instalação exigíveis nos termos e montantes a definir em regulamento municipal, de acordo com os critérios definidos na lei.


Artigo 15.º
Norma transitória

1- O presente diploma aplica-se às infra-estruturas de suporte de radiocomunicações já instaladas sem que tenha havido deliberação ou decisão municipal favorável, devendo os operadores requerer a respectiva autorização municipal no prazo de 180 dias a partir da data da sua entrada em vigor.

2- Para efeitos do disposto no número anterior, devem os operadores apresentar ao presidente da câmara municipal um processo único do qual conste uma lista com a identificação e localização de todas as infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações instaladas no respectivo município, acompanhada dos documentos referidos nas alíneas a), b), e) e f) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º do presente diploma.

3- O presidente da câmara municipal poderá solicitar complementarmente outros documentos referidos no artigo 5.º do presente diploma.

4- O presidente da câmara municipal profere decisão final no prazo de um ano a contar da entrega do processo, de acordo com as normas do presente diploma que se mostrem aplicáveis.”

Invocou o recorrente a violação do artº 6º nºs 9 e 10 supra transcrito, tendo referido que as taxas aí previstas são taxas devidas pela instalação de infra estruturas de suporte de antenas de radiocomunicações, não podendo as mesmas ser aplicadas anualmente.

Vejamos:

A aplicação das referidas taxas teve como fundamento o artigo 42º do Regulamento de Urbanização, Edificação e Taxas do Município da Lourinhã, aprovado na sessão da Assembleia Municipal realizada em 30 de Setembro de 2004, publicado no apêndice nº 133 do Diário da República nº 264, IIª Serie de 10 de Novembro de 2004, que se transcreve:

“Artigo 42.º
Autorização de instalação de estações de radiocomunicações e respectivos acessórios
A autorização de instalação de estações de radiocomunicações e respectivos acessórios fica sujeita ao pagamento da taxa fixada no quadro XXIII da tabela anexa ao presente Regulamento.”

Por sua vez, no quadro XXIII previa-se o seguinte:
QUADRO XXIII
Estações de radiocomunicações e respectivos acessórios
Valor
(em euros)
1 — Por cada unidade de instalação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações e respectivos
acessórios ............................................................................................................................................................................... 500,00
a) Por cada ano ................................................................................................................................................................ 500,00

Face ao teor do nº 10 do artigo 6º do D.L. nº 11/2003, considera o Tribunal assistir razão à recorrente dado a norma em apreço prever apenas a existência de taxas devidas pela instalação das infra estruturas de suporte de antenas de radiocomunicações, conforme se infere da expressão “…pagamento de taxas administrativas de instalação…”, ora as taxas que o recorrido pretende que a recorrente pague nos anos de 2004 e em diante, por força do acto impugnado, não são taxas devidas pela instalação mas sim pela permanência no local onde se encontram as referidas infra estruturas, taxas essas que a norma em apreço não consente sejam cobradas independentemente do que preveja quanto a este ponto o Regulamento Municipal. A este propósito afigura-se relevante transcrever excerto de Acórdão proferido pela S.T.A. em 12 de Outubro de 2011, no âmbito do Proc. 0631/2011 “A instalação de tais equipamentos em propriedade privada está sujeita a autorização autárquica e essa intervenção municipal legitima a cobrança de taxas administrativas de instalação previstas em regulamento municipal, cujo facto gerador não é, obviamente, a ocupação do domínio público ou privado municipal (pois que estas não estão instaladas em domínio municipal) mas a intervenção dos municípios neste domínio, que o legislador procura que concilie a protecção do ambiente, do património cultural e da defesa da paisagem urbano ou rural e o ordenamento do território com a imperiosa necessidade de incentivo e apoio à prossecução e promoção do desenvolvimento da sociedade de informação (cfr. o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 11/2003, de 18 de Janeiro).

Assim, também quanto a este ponto procede o recurso dirigido a este Tribunal Central, dado o acto impugnado violar o disposto no nº 10 do artigo 6º do D.L. nº 11/2003, não violando contudo o nº 4 do artº 15º do mesmo diploma dado que não obstante o acto em apreço ter sido praticado quando se encontrava esgotado o prazo de um ano previsto nesta norma, tal não significa que o Presidente da Câmara Municipal estivesse impedido de praticar o mesmo, dado o decurso do prazo consagrado na norma supra referida apenas ter como consequência o indeferimento tácito da pretensão formulada, dado o regime do deferimento tácito previsto no artigo 8º do diploma em apreço não se aplicar às infra-estruturas de suporte de radiocomunicações já instaladas sem que tenha havido deliberação ou decisão municipal favorável.(1)

III) Decisão

Assim, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul, em conceder provimento ao recurso,julgando totalmente procedente a acção administrativa especial, anulando o acto proferido pelo Presidente da Câmara Municipal da Lourinhã em 21 de Dezembro de 2004.
Sem custas, dado não terem sido apresentadas contra-alegações.

Lisboa, 4 de Dezembro de 2014


Nuno Coutinho


Carlos Araújo


Rui Belfo Pereira (Vencido)-Estando em causa matéria que tem a ver com a legalidade do pagamento duma taxa, entendo que seria competente para conhecer do pedido formulado nos autos a jurisdição fiscal.

1)Cfr neste sentido Acórdão proferido pelo TCASUL em 10/02/2011, no âmbito do Proc. 02595/07