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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06153/12
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:02/05/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:EMBARGOS DE TERCEIRO.
REQUISITOS DE DEDUÇÃO NO PROCESSO TRIBUTÁRIO.
QUALIDADE DE TERCEIRO FACE AO PROCESSO DE EXECUÇÃO.
Sumário:1. No actual Código de Processo Civil, aprovado pelo dec.lei 329-A/95, de 12/12, os embargos de terceiro deixaram de ter a natureza de processo especial, passando a ser configurados como modalidade do incidente de oposição, ampliando-se os pressupostos da sua admissibilidade, assim deixando de estar ligados, necessariamente, à defesa da posse do embargante. Isto é, face a este novo regime, o embargante, através dos embargos, além da posse, pode defender qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial (cfr.artºs.351 e seg., do C.P.Civil; relatório constante do dec.lei 329-A/95, de 12/12).
2. Os requisitos da dedução dos embargos de terceiro, de acordo com a lei processual tributária, são os seguintes (cfr.artº.237, do C.P.P.Tributário):
a-A tempestividade da petição de embargos;
b-A qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma diligência;
c-A ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial.
3. O embargante deve, além do mais, oferecer prova informatória da qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma.
4. Os embargos de terceiro só podem ser deduzidos por terceiros, não indicando o C.P.P.T. qualquer conceito próprio do processo de execução fiscal, pelo que, de harmonia com a legislação subsidiária, terá de recorrer-se às normas do C.P.Civil relativas aos embargos de terceiro. Com a reforma operada no C.P.Civil pelo dec.lei 329-A/95, de 12/12, deixou de existir qualquer disposição legal equivalente à do anterior artº.1037, nº.2, do C.P.Civil, que estendia o conceito de terceiro de forma a abranger o próprio executado, relativamente a bens que, pelo título da sua aquisição ou pela qualidade em que os possuía, não devessem ser abrangidos pela diligência. Já à face do actual C.P.Civil, considera-se terceiro em relação a qualquer acção judicial, todo aquele que não seja parte na causa (cfr.artº.351, nº.1, do C.P.Civil), sendo de considerar terceiro face a penhora efectuada todo aquele que não é exequente nem executado.
5. A restrição deste conceito de terceiro, levada a cabo pela referida reforma foi acompanhada pelo aditamento de disposições em que se confere ao executado e seu cônjuge a possibilidade de se oporem à penhora de bens de que sejam detentores, mas que não devam ser penhorados (cfr.incidente de oposição à penhora, previsto nos artºs.863-A, 863-B e 864-A, do C.P.Civil). No C.P.P.T. optou-se por inserir tais situações no âmbito das reclamações previstas no artº.276, do mesmo diploma, assim visando o legislador a protecção dos executados contra actos que atinjam bens que não devem ser penhorados (cfr.artº.278, nº.3, do C.P.P.T.).



O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
A..., com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.119 a 125 do processo, através da qual julgou improcedentes os embargos de terceiro intentados pelo recorrente opondo-se a penhora de imóvel levada a efeito no âmbito da execução fiscal nº.3573-2008/116700.6, a qual corre seus termos no 2º. Serviço de Finanças de Vila Franca de Xira.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.150 a 155 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-A ora recorrente não pode ser considerada parte nos autos de execução, visto não ser responsável pelos montantes devidos;
2-Os valores apurados em sede de I.R.S., correspondem, única e exclusivamente, à actividade profissional do executado B..., seu ex-cônjuge, e;
3-A este deverão ser imputados na sua totalidade;
4-Por tratar-se de um montante proveniente do exercício da sua actividade profissional, a ele apenas aproveitou;
5-Esta foi contraída após a dissolução do casamento de ambos;
6-O executado Rui da Graça Charrua, assumiu a existência e responsabilidade pelo pagamento da dívida, através de declaração devidamente reconhecida e autenticada, que já se encontra junta aos autos;
7-Logo, a ora recorrente não poderá ser considerada executada, assumindo sim, a sua qualidade de terceiro;
8-Verificando-se a existência de uma probabilidade séria de violação do direito invocado pela ora recorrente, encontra-se devidamente fundamentada a sua legitimidade para deduzir embargos;
9-Sendo os embargos de terceiro, o meio legalmente idóneo para a efectiva e legítima defesa dos seus direitos;
10-Deste modo, deverão os embargos de terceiro serem admitidos por manifestamente verificar-se face a todo o exposto, muito mais do que uma probabilidade séria da existência do direito invocado pela ora recorrente;
11-Pelo exposto e pelo mais que for doutamente suprido por V. Exas. deve conceder-se provimento ao presente recurso, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso (cfr.fls.190 e 191 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.120 a 122 dos autos):
1-Em 17/12/2008, foi instaurada a execução fiscal nº.3573-2008/116700.6 contra B... e a ora embargante, A... (cfr.capa do processo de execução apenso; informação exarada a fls.43 e 44 do apenso de execução);
2-Servem de base à execução as certidões de dívida que constituem fls.34 e 35 do apenso, de ambos os títulos constando como executados o identificado Rui e a ora embargante;
3-A dívida exequenda é proveniente de I.R.S. e juros dos anos de 2004 e 2005, nos montantes respectivos de € 25.423,13 e € 12.934,90 (cfr.certidões de dívida juntas a fls.34 e 35 do processo de execução apenso);
4-Na execução foi efectuada a penhora da fracção autónoma designada pela letra “B” do prédio inscrito na matriz predial da freguesia de Vialonga sob o artigo nº.3817, descrito na 2ª. Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira com o número 270-B (cfr.auto de penhora de 23/07/2009 constante de fls.36 do apenso de execução; informação exarada a fls.43 e 44 do apenso de execução);
5-A embargante consta do auto de penhora como co-executada (cfr.auto de penhora constante de fls.36 do apenso de execução);
6-No seguimento da penhora, foi a ora embargante citada no processo executivo “nos termos do disposto no artº.193, nº.2, do C.P.P.T.” (cfr.ofício de citação junto a fls.37 do apenso de execução);
7-Os embargos deram entrada no 2º. Serviço de Finanças de Vila Franca de Xira em 10/08/2010, conforme carimbo de entrada aposto a fls.4 dos presentes autos;
8-O executado e a embargante contraíram casamento, sem convenção antenupcial, em 29/06/1985, o qual foi dissolvido, por divórcio, em 19/03/1993 (cfr.assento de casamento junto a fls.10 dos presentes autos);
9-Estão inscritos como titulares do imóvel penhorado o executado e a ora embargante (cfr.auto de penhora constante de fls.36 do apenso de execução; extracto da certidão matricial junto a fls.69 dos presentes autos).
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A sentença objecto do recurso considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Com interesse para a decisão, nada mais se provou de relevante, nomeadamente, não se provou qualquer penhora efectuada sobre vencimentos auferidos pela embargante…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Assenta a convicção do tribunal no conjunto da prova dos autos e apenso de execução, com destaque para a assinalada e informação incorporada a fls. 43/44 do apenso. Os factos não provados assentam na falta de prova…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou totalmente improcedentes os embargos objecto dos presentes autos, tudo em virtude de não reunir a embargante a qualidade de terceiro no processo executivo em que se realizou a penhora do imóvel, assim não se verificando um pressuposto necessário da sua procedência.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.685-A, do C.P.Civil; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do julgado, alegando em síntese e como supra se alude, que não pode ser considerado parte nos autos de execução, visto não ser responsável pelos montantes devidos. Que os valores apurados em sede de I.R.S., correspondem, única e exclusivamente, à actividade profissional do executado B..., seu ex-cônjuge. Que este já assumiu a existência e responsabilidade pelo pagamento da dívida, através de declaração devidamente reconhecida e autenticada, que já se encontra junta aos autos. Que a ora recorrente não poderá ser considerada executada, assumindo sim, a sua qualidade de terceiro. Verificando-se a existência de uma probabilidade séria de violação do direito invocado pela ora recorrente, encontra-se devidamente fundamentada a sua legitimidade para deduzir embargos (cfr.conclusões 1 a 10 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo, supõe-se, concretizar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
No actual Código de Processo Civil, aprovado pelo dec.lei 329-A/95, de 12/12, os embargos de terceiro deixaram de ter a natureza de processo especial, passando a ser configurados como modalidade do incidente de oposição, ampliando-se os pressupostos da sua admissibilidade, assim deixando de estar ligados, necessariamente, à defesa da posse do embargante. Isto é, face a este novo regime, o embargante, através dos embargos, além da posse, pode defender qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial (cfr.artºs.351 e seg., do C.P.Civil; relatório constante do dec.lei 329-A/95, de 12/12).
Os requisitos da dedução dos embargos de terceiro, de acordo com a lei processual tributária, são os seguintes (cfr.artº.237, do C.P.P.Tributário; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 18/1/95, rec.18307, ap.D.R., 31/7/97, pág.175 e seg.; ac.T.C.A.Sul, 12/6/2012, proc.5181/11; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.670 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.123 e seg.):
1-A tempestividade da petição de embargos;
2-A qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma diligência;
3-A ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial.
No processo vertente é o exame do segundo requisito que está em causa.
Segundo a sentença recorrida, é abundante a jurisprudência superior, quer dos Tribunais comuns, quer dos Tribunais da jurisdição administrativa e fiscal, quanto ao entendimento de que não pode ser reconhecida legitimidade activa para a dedução de embargos de terceiro a quem é parte no processo executivo em que se efectuou a penhora.
Pelo contrário, o recorrente entende que não poderá ser considerado executado, assumindo antes a sua qualidade de terceiro, visto que os valores apurados em sede de I.R.S., correspondem, única e exclusivamente, à actividade profissional do executado B..., seu ex-cônjuge, assim não sendo da sua responsabilidade.
O embargante deve, além do mais, oferecer prova informatória da qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma.
Os embargos de terceiro só podem ser deduzidos por terceiros, não indicando o C.P.P.T. qualquer conceito próprio do processo de execução fiscal, pelo que, de harmonia com a legislação subsidiária, terá de recorrer-se às normas do C.P.Civil relativas aos embargos de terceiro. Com a reforma operada no C.P.Civil pelo dec.lei 329-A/95, de 12/12, deixou de existir qualquer disposição legal equivalente à do anterior artº.1037, nº.2, do C.P.Civil, que estendia o conceito de terceiro de forma a abranger o próprio executado, relativamente a bens que, pelo título da sua aquisição ou pela qualidade em que os possuía, não devessem ser abrangidos pela diligência.
Já à face do actual C.P.Civil, considera-se terceiro em relação a qualquer acção judicial, todo aquele que não seja parte na causa (cfr.artº.351, nº.1, do C.P.Civil), sendo de considerar terceiro face a penhora efectuada todo aquele que não é exequente nem executado.
A restrição deste conceito de terceiro, levada a cabo pela referida reforma foi acompanhada pelo aditamento de disposições em que se confere ao executado e seu cônjuge a possibilidade de se oporem à penhora de bens de que sejam detentores, mas que não devam ser penhorados (cfr.incidente de oposição à penhora, previsto nos artºs.863-A, 863-B e 864-A, do C.P.Civil).
No C.P.P.T. optou-se por inserir tais situações no âmbito das reclamações previstas no artº.276, do mesmo diploma, assim visando o legislador a protecção dos executados contra actos que atinjam bens que não devem ser penhorados (cfr.artº.278, nº.3, do C.P.P.T.; Eurico Lopes-Cardoso, Manual de Acção Executiva, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1987, pág.384; Jorge Duarte Pinheiro, Fase Introdutória dos Embargos de Terceiro, Almedina, 1992, pág.46 e seg.; Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.119; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.159 e seg.).
Voltando ao caso concreto, resulta do probatório (cfr.nºs.1, 2, 6 e 9 da factualidade provada) que a execução fiscal nº.3573-2008/116700.6 foi instaurada contra a embargante/recorrente e o seu ex-marido, tendo por base títulos executivos em que ambos surgem como devedores, sendo a mesma citada no âmbito do processo executivo como executada e estando inscrita como titular do imóvel penhorado (juntamente com o executado seu ex-marido). Ora, atenta a factualidade a que se acaba de aludir, é inequívoco que a embargante/recorrente detém a posição de executado no âmbito do processo de execução fiscal nº.3573-2008/116700.6, assim não reunindo a qualidade de terceiro, vector pressuposto da dedução dos presentes embargos.
O acabado de mencionar implica que o recorrente não tenha a possibilidade de embargar de terceiro, devendo reagir contra actos ilegais que afectem os seus direitos através dos meios processuais concedidos ao executado, sendo tal pedido analisado e decidido pelo órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação da sua decisão para Tribunal, nos termos previstos no artº.276 e seg. do C.P.P.T., tudo conforme já aludido supra (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/6/2012, rec.939/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2006, proc.1194/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/11/2009, proc.3392/09).
Por último, sempre se dirá que não reveste qualquer relevo processual, no âmbito do exame dos pressupostos de dedução dos presentes embargos, a junção ao presente processo de declaração onde o co-executado assume a responsabilidade pelo pagamento da dívida exequenda, contrariamente ao defendido pelo recorrente.
Finalizando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em em consequência, se mantém na ordem jurídica.
X
Condena-se o recorrente em custas.
X
Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 5 de Fevereiro de 2013



(Joaquim Condesso - Relator)


(Lucas Martins - 1º. Adjunto)



(Aníbal Ferraz - 2º. Adjunto)