Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04164/10
Secção:CA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:10/06/2010
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IRC
VIOLAÇÃO DO DIREITO/DEVER DE EXAUSTÃO DOS MEIOS GRACIOSOS, MAXIME RECLAMAR/PEDIR A REVISÃO DO ACTO ÍNSITO NOS ARTºS. 86º Nº 3 E 91º DA LGT.
Sumário:1.- Nos casos em que o contribuinte não forneça à AT os elementos necessários à liquidação do imposto, ou os elementos fornecidos enfermem de omissões ou revelem inexactidões que não permitam o apuramento do lucro tributável com base nesses elementos, a lei permite que a AT possa avaliá-la indirectamente mediante o recurso a métodos indiciários.

2.- Compete então à AT demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem a tributação por métodos indiciários e, feita essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que aqueles pressupostos não se verificam ou que, verificando-se, houve erro ou manifesto excesso na quantificação.

3.- Havendo a AT seguido e adoptado o procedimento da avaliação indirecta quando estavam reunidos os pressupostos para a sua aplicação e considerando a lei a inimpugnabilidade directa de um acto cometido no procedimento que culmina com a liquidação que era o acto de "fixação definitiva do imposto", na falta de reacção mediante o procedimento de revisão regulado no artº 91º e ss da LGT, o acto de avaliação e o respectivo quantum consolidava-se, tornando indiscutí­vel os seus eventuais vícios.

4.- Havendo sido aplicada a avaliação indirecta, tal impunha o esgotamento do meio administrativo de revisão e, assim, deveria o contribuinte reclamar da aplicação desse método e da respectiva quantificação da matéria colectável para a Comissão de Revisão nos termos do artº 91º da LGT, sem o que o acto tributário era inimpugnável.

5.- A matéria tributável é uma realidade única, independentemente da forma como foi determinada e, vigorando o regime da impugnação unitária, só em sede de impugnação da liquidação sequente e consequente da fixação, é que poderiam ser alegados os vícios próprios do acto de fixação definitiva de todo o imposto em falta sob pena da violação do disposto no n.º 2 do art. 91.º da LGT.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acorda-se, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo:


I.- RELATÓRIO

1.1 A...– Promoção de Eventos de Golfe, Ldª., vem interpor recurso jurisdicional da sentença do TT 1ª Instância de Lisboa julgou improcedente a impugnação judicial que deduzira contra a liquidação de IRC relativo aos exercícios dos anos de 2000 e 2001.
1.2. Em alegação, o recorrente formula conclusões que se apresentam do seguinte modo:
“I. Em síntese, versaram os autos de que ora se recorre sobre a questão de saber se a determinação da matéria colectável foi efectuada pela Administração Fiscal com recurso a métodos de avaliação indirecta ou não.
II. Entenderam a Administração Fiscal e o Tribunal a quo que a dedução da presente impugnação judicial terá ficado prejudicada dado que a recorrente não accionou o pedido de revisão previsto no artigo 91° da Lei Geral Tributária (LGT).
III. Ora, entende a ora recorrente que a sentença sub judice enferma do vício de ilegalidade, por errónea aplicação do direito ao caso em apreço, designadamente, por fazer uma interpretação e aplicação erradas do artigo 86°, conjugado com os artigos 91° e seguintes da Lei Geral Tributária
IV. Acresce que incorre igualmente o aresto em apreço em erro de julgamento por violação das regras da produção de prova dado que, ao fixar a matéria de facto provada, desconsiderou por completo, aliás, nem sequer apreciou, a prova testemunhal produzida em sede de inquirição da testemunha da recorrente Isabel Maria Pinto Cerejo dos Santos, a qual respondeu à matéria de facto constante dos artigos 6, 8 a 15, 20 e 21 da impugnação judicial.
V. Aliás, dos factos dados como provados pelo Tribunal a c\uo não consta qualquer facto alegado pela recorrente na sua impugnação, tratando-se meramente de uma transcrição do relatório de inspecção elaborado pela Administração Fiscal.
VI. Tendo a recorrente carreado aos autos prova documental e produzido prova testemunhal, mister seria que as mesmas fossem objecto de apreciação igual à que foi feita do processo administrativo junto pela Administração Fiscal!
VII. Brevitatis causa, entende a recorrente tratar-se de actos tributários de liquidação em sede de IRC resultantes de correcções meramente aritméticas, apesar de a Administração Fiscal qualificar (o que não deveria vincular o Tribunal) essas correcções como baseadas em métodos indirectos.
VIII. Todavia, as premissas em que assentam tais conclusões não correspondem à realidade dos factos, não levam em linha de conta o objecto social da sociedade e, finalmente, tomam a «nuvem por Juno», o que, entre outros aspectos, inquina as conclusões.
IX. Quanto à determinação da matéria colectável fundamentada na alegada insuficiência de suporte e comprovação pela sociedade das equipas convidadas (apesar de ter sido fornecida a lista pela sociedade) e das equipas que constam do jornal Expresso, ela é patentemente ilegal.
X. Em primeiro lugar, não há lugar à correcção por métodos indirectos previstos nos citados artigos 87° al. b) e 88° al. a) ambos da Lei Geral Tributária e nos artigos 52° a 54° ambos do CIRC.
XI. Trata-se, pelo contrário, de uma mera correcção aritmética, em que a Administração Fiscal, munida de um artigo de jornal que «fazia referência ao número de equipas inscritas participantes no evento» se limita a multiplicar o número de equipas pela taxa de inscrição
XII. A Administração Fiscal faz tábua rasa dos convites a equipas, previstos aliás em vários contratos de patrocínio comercial e normais neste tipo de actividade comercial, factos a que a testemunha inquirida em sede de audiência de discussão e julgamento respondeu peremptoriamente e que foram totalmente ignorados na sentença em apreço.
XIII. A impugnante organiza eventos de golfe, maxime, nos anos em questão, um torneio denominado M... Golfe Challenge, reservado a empresas que inscrevem equipas.
XIV. As receitas relevantes da impugnante são derivadas dos patrocínios, por exemplo com o B..., com a C..., com a D..., etc.., sendo que as receitas com as inscrições das equipas são negligenciáveis.
XV. E é normal que muitas equipas sejam convidadas, bastando haver interesse de certas empresas participarem no torneio para dar uma melhor imagem do torneio face aos patrocinadores. E tanto pode ser conferido a um patrocinador a faculdade de convidar equipas, como a própria recorrente convidar equipas directamente.
XVI. Tal faculdade pode estar escrita num contrato ou resultar de compromissos verbais dos representantes comerciais da recorrente com os clientes desta.
XVII. Apesar de existir uma divergência entre as equipas inscritas e as inscrições registadas na contabilidade, tal diferença deve-se exclusivamente aos convites a participar gratuitamente a equipas.
XVIII. Tais factos foram comprovados pelo depoimento da única testemunha inquirida nos presentes autos e não foram sequer objecto de apreciação por parte do Tribunal a quo, pelo que a sentença padece do vício de erro na apreciação das provas produzidas, neste caso, aliás, padece do vício de ausência total de apreciação.
XIX. Ora, o Tribunal a quo incorre igualmente em erro na aplicação do direito ao caso em apreço, designadamente, por fazer uma interpretação e aplicação erradas do artigo 86°, conjugado com os artigos 91° e seguintes da Lei Geral Tributária, quando admite que a Administração Fiscal recorreu à avaliação indirecta da matéria colectável, visto que o que se trata é de uma mera revisão aritmética do resultado fiscal da recorrente, admitindo impugnação judicial directa.
XX. Não existia impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, já que a lista de utilizadores pagantes consta da contabilidade (conta 72.112) e que a testemunha inquirida confirmou!
XXI. A correcção que a Administração Fiscal faz erra na qualificação dos factos (a sociedade em causa centra os seus proveitos sobretudo nos subsídios que recebe dos seus «sponsors», sendo negligenciáveis as prestações de serviços aos jogadores), o que inquina a correcção aritmética que faz ao considerar como proveitos as prestações de serviços «presumidas».
XXII. Em jeito de síntese, as conclusões do relatório de inspecção falham por sofrerem do pecado do excesso, tributam tudo, tomando o todo pela parte, o que inquina necessariamente de ilegal qualquer acto tributário de liquidação eventualmente praticado nessa extensão.
XXIII. Assim, a sentença ora recorrida deveria ter procedido à apreciação do mérito da causa, apreciando a prova produzida pela recorrente.
XXIV. Acaso o tivesse feito teria concluído forçosamente que errou a Administração Fiscal quando considerou que a recorrente não teria contabilizado todas as inscrições que efectuou, mostrando um profundo desconhecimento e desinteresse pelo ramo de actividade da recorrente e não se mostrando disponível em entender que a maioria dos participantes em torneios de golfe são convidados, beneficiando de isenção no montante de inscrição, por forma a dinamizar o evento!
XXV. Em face dos fundamentos supra alegados, a sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação da lei de processo e da lei substantiva, devendo ser revogada.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Excelências doutamente e como sempre suprirão, deverá o presente recurso merecer provimento, revogando-se a sentença recorrida, assim se fazendo a costumada Justiça.
Não houve contra – alegações.
A EPGA emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
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2.-FUNDAMENTAÇÃO

2.1.- DOS FACTOS

O Tribunal «a quo» deu como assentes as seguintes realidades e ocorrências com base na análise analisada da prova documental produzida:
1. Através das Ordens de Serviço n.° 21 992 e n.° 21 993, ambas de 02/08/02, foi ordenada a realização de uma acção de inspecção externa ao sujeito passivo A...- Promoção de Eventos de Golfe, LDA, NIPC 504 405 144 (fl. 18);
2. A acção de inspecção, referida no ponto anterior, teve âmbito geral e incidiu sobre os exercícios de 2000 e 2001, tendo dado início aos procedimentos externos de inspecção em 04/12/2002 e 19/12/2002, respectivamente (fl. 18);
3. A Impugnante exerce a título principal a actividade de organização e promoção de eventos de golfe, (fl. 18),
4. Em sede de IRC está inscrita no regime geral de tributação dos rendimentos (fl. 18);
5. Em sede de IVA é um sujeito passivo não isento, enquadrado no regime normal de periodicidade trimestral (fl. 18),
6.No âmbito da acção inspectiva referida nos pontos l e 2, a Administração Tributária fez constar e fundamentou a correcção nos seguintes termos: "Da inspecção efectuada verificaram-se os seguintes factos e fundamentos das correcções de natureza meramente aritmética á matéria tributável: Ajudas e Custos e Quilómetros;
a. Da análise aos encargos relativos a ajudas de custo e às importâncias auferidas pela utilização de automóvel próprio em serviço da empresa (vulgo quilómetros), observaram-se os seguintes factos:
b. Para o período a fiscalizar o quadro de pessoal da empresa A...integrava l sócio gerente e 3 empregados até ao final do mês de
Setembro de 2000, tendo após esta data, passado a integrar l sócio gerente e 2 empregados;
c. Da análise aos encargos com viaturas ligeiras, verificou-se a existência de 3 viaturas a gerar encargos para a empresa, nomeadamente um Citroen Saxo, mat.: 75-68-MV, um Citroen Xantia, mat.: 47-98-JR e um VW Passai, mat.: 00-60-ON. A natureza destes encargos inclui combustíveis, seguros, reparações, portagens, aluguer e amortizações;
d. O custo total com o consumo de combustíveis destas viaturas foi de esc.: 1.143.632SOO no exercício de 2000 e de esc.: 974.151 $00 no exercício de 2001;
e. Nos extractos de c/c das contas 62.2276 - "KMs" e da conta 64.835 _ "Ajudas de Custo" referentes ao exercício de 2000 estão evidenciados custos apenas para o período que decorreu entre o mês de Janeiro e o final do mês de Março, vide anexos afls. l e 2, enquanto no exercício de 2001 esses custos já são regulares ao longo do ano, vide anexos afls. 3 a 5, tendo a empresa mantido o mesmo tipo de actividade, nomeadamente a organização, promoção e realização do evento desportivo "Expresso B...M...Golf Challenge";
f. Embora todo o pessoal da empresa (gerente incluído) aufira subsídio de alimentação de montante diário que não excede os limites legais, para efeitos de tributação em sede de IRS, este valor nunca foi deduzido ao montante pago da ajuda de custo diária correspondente, conforme estipula o regime de atribuição das ajudas de custo que se encontra regulamentado nos (DL 519-M/79, de 28/12, DL 192/95, de 28/7 e Circular 12/91 de 29/04).
g. Em consequência do atrás exposto e tendo em conta que as mesmas foram pagas, não há dúvida de que as importâncias em causa assumem a natureza de complemento de vencimento, não se enquadrando em nenhuma norma de exclusão da tributação, devendo ser tributadas em sede de IRS na esfera da pessoa que as auferiu facturas de refeições do
sócio gerente E... e do empregado F..., com frequência quase diária, pelo que destinando-se as ajudas de custo a fazer face a despesas efectuadas pelos trabalhadores em deslocações ao serviço da empresa, nomeadamente com refeições e estadias, estas facturas numa situação normal não deveriam existir em tão grande número na contabilidade da empresa, o que evidencia que é atribuído o abono de ajudas de custo, mas simultaneamente a entidade patronal paga as despesas com alimentação e alojamento;
h. Relativamente à documentação de suporte às ajudas de custo e aos
quilómetros (boletins itinerários), verifica-se que nenhum indica a natureza do serviço efectuado que originou a deslocação, apenas a menção "deslocação profissional", nem as horas de partida nem as horas de chegada, vide anexos afl. 6 a 18;
i. A empregada administrativa G..., durante o exercício de 2001, auferiu 14 vezes a importância de Esc.:70.150$00 a título de deslocações casa/escritório. Todavia não cabe no conceito de deslocações as viagens efectuadas de casa para o local de trabalho. Desempenhando esta funcionária funções de secretariado, estamos perante importâncias que constituem verdadeiras remunerações;
j. Comparando os seguintes documentos contabilizados no exercício de
2001: CX.1022 versus BN 4048 , CX 3019 versus BN 4009, CX 4022 ver sus BN 4049; ex 10 023 versus BN 11 023 e BN 11 014 verifica-se que os locais de deslocações não são coincidentes, vide anexos a tis. 19 a 28;
k. Assim não obstante o tratamento que em termos formais é dado às importâncias em causa, na prática e em substância, as mesmas revestem a natureza de remunerações, e consequentemente as mesmas devem ser tributadas na sua totalidade, como rendimentos do trabalho dependente, nos termos do artigo 2.°, n° 3 alínea d) do Código do IRS.
Consequentemente, haveria que proceder a retenção na fonte relativamente a essas importâncias (artigo 99. °, n° l do Código do IRS).
l Na perspectiva da empresa A..., Lda. que pagou as importâncias em causa, as mesmas vão ser reconhecidas na totalidade como custo fiscal do exercício, nos termos do artigo 23.°, nº l alínea d) do Código do IRC, por não lhes aplicável a norma da alínea f) do n° l do artigo 41. ° deste Código, em face da respectiva descaracterização como ajudas de custo e compensação por deslocações em viatura própria e respectiva tributação como rendimentos do trabalho dependente na esfera dos beneficiários, o apuramento dos montantes das remunerações pagas a título de ajudas de custo e quilómetros por beneficiário, bem como o apuramento mensal dos montantes de imposto não retido, para efeitos de cálculo dos juros compensatórios, nos termos do n.° 2 do art. 103.° do CIRS, foi efectuado conforme mapas em anexo a tis 29 a 36, tendo sido apurados os seguintes montantes de IRS não retido, ANO: 2000 (em euros)
m. JAN./OO- 1.247,84; FEV/OO- 556,02; MAR/OO- 841,99; ABR/lOO-0,00; MAI./OO- 0,00; JUN.IOO- 0,00; JUL./OO- 0,00; AGO./OO- 0,00; SET./OO- 0,00; OUT/OO- 0,00; NOV.IOO- 0,00; DEZ.IOO- 0,00; TOTAL/OO - 2.645,85 EUROS.
n. ANO: 2001 (em euros) JAN./01- 829,00; FEV.101- 954,73; MAR/01-779,17; ABR/01- 924,21; MAL/01-1.028,37; JUN.101- 871,75; JUL./01-1.039,97; AGO.101- 624,34; SET/01- 865,36; OUT/01- 1.009,67; NOV.101-1.406,73; DEZ.1011.462,30; TOTAL/01-11.795,60 EUROS" 7. A Administração Tributária fez ainda constar no relatório a seguinte factualidade de fundamentos de correcção, que para os devidos efeitos se transcreve: Motivo e exposição dos factos que implicam o recurso aos métodos indirectos 6,1-Exposição dos factos:
a. A empresa A...è - Promoção de Eventos de Golfe, Lda. como já foi referido anteriormente, é uma sociedade comercial que se dedica á organização e promoção de eventos de golfe, sendo o seu principal evento o "Expresso B... M...Golf Challenge". Trata-se de um torneio de golfe aberto a qualquer empresa, sociedade, organização ou associação, que possua uma actividade ou negócio radicado em Portugal, composta por quatro fases: qualificações regionais (golf days), semi finais, final nacional e final mundial a realizar no estrangeiro, entre as equipas finalistas de cada um dos países onde se realizaram as provas congéneres.
b. Associado a este evento está um «media partner» de grande referência nacional o Jornal Expresso, à semelhança do que acontece com outros medias nos eventos congéneres estrangeiros, onde é publicitado, comercializado e promovido o CGCP.
c. Depois perfilam-se outras empresas que patrocinam comercialmente o evento sob a forma de sponsorização, alinhadas em diferentes categorias em função do montante do patrocínio, nomeadamente sponsor principal, cosponsors e produtos oficiais, tudo isto tendo como contrapartida um «Mix» de publicidade que inclui entre outros, a publicação de suplementos, anúncios publicitários, artigos e entrevistas no Jornal Expresso, no "Jornal do Golfe", acesso á base de dados do «Corporate», exposição mediática, publicidade estática, promoções e relações públicas. Foi solicitado verbalmente ao sócio gerente da empresa A..., o Sr. H... através da interlocutora Dra. I...., administradora da firma J... - Consultadoria, Fusões e Aquisições, SÁ, empresa que processa a contabilidade da A..., para nos fornecer cópias das edições do Jornal Expresso onde foram publicados os artigos que faziam referência ao número de equipas inscritas e participantes no «Corporate», dado ter sido exclusivamente através daquele média, que foi feita a mediatização do evento. Com alguma surpresa nossa foi-nos transmitida a informação de que não possuíam cópias dessas publicações em arquivo.
d. Diligenciando no entanto por outras vias, conseguimos obter cópias das referidas publicações, que juntamos em anexo afls. 37 a 50;
e. Feito o levantamento do número de equipas participantes no torneio, conforme está publicamente escrito nas referidas edições do Jornal Expresso, procedeu-se de seguida à contagem das inscrições registadas na contabilidade da empresa, conta 72.112 - "Serviços Prestados - Taxa Normal", de que se juntam cópias em anexo a fls. 51 a 78, tendo sido ainda tomadas em linha de conta o número de equipas convidadas, pois conforme já foi referido anteriormente, houve várias empresas a patrocinar o evento e como tal é perceptível a inclusão de convites para participação gratuita das mesmas na prova. Nesse sentido, solicitaram-se ao sócio gerente da A..., Sr. H...os seguintes elementos: uma relação das equipas convidadas a participar gratuitamente na prova e os respectivos contratos de patrocínio efectuados, com a finalidade de quantificar e comprovar o número de convites contemplados.
f. Foi-nos fornecida uma lista de equipas convidadas que juntamos em anexo a) fls. 79. Da leitura efectuada aos contratos de patrocínio, constatou-se que em apenas em dois, estava explicitamente definido o n.° de equipas a inscrever gratuitamente no 1° torneio, nomeadamente no acordo de patrocínio comercial com a RTA - Região de Turismo do Algarve (de que se junta cópia em anexo a fls.80 a 82), e com a L..., tendo sido cada entidade convidada a inscrever apenas uma equipa, (ficam a fazer parte integrante do presente processo de inspecção, para eventual consulta, cópias dos acordos de patrocínio comercial com as empresas: B..., D... e C... Telecomunicações). Não estando a lista de equipas convidadas fornecida pela A..., inequivocamente suportada e comprovada através dos acordos de patrocínio comercial estabelecidos entre as partes envolvidas, utilizámos elementos em poder da administração tributária, bem assim, os relativos a empresas ou entidades com relações económicas com o contribuinte, tendo sido elaborados os quadros em anexo a fls. 83 a 85 , que evidenciam diferenças significativas entre as inscrições efectivas das equipas participantes no evento «M...Golf Challenge» e as inscrições registadas na contabilidade da empresa com prejuízo da receita, que não foi integralmente contabilizada e declarada para efeitos fiscais
i. 6.2- Motivos:
g. Pelos factos expostos a determinação da matéria tributável vai ser efectuada com recurso aos métodos indirectos, nos termos previstos nos artigos 87°, alínea, b) e 88°, ai a), ambos da L.G.T. e artigos 52.° e 54.° do CIRC, por motivo de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis á correcta determinação da matéria tributável, resultante da inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade
8. Tendo em conta os factos antecedentes a Administração Tributária fez constar no relatório o que para os devidos efeitos se transcreve •Critérios de Cálculo dos Valores Corrigidos com Recurso a Métodos Indirectos 7.1- Determinação das Prestações de Serviços
a. Para a determinação dos montantes das prestações de serviços presumidamente efectuadas nos anos de 2000 e 2001, tivemos como base de trabalho os elementos obtidos a partir de artigos publicados no Jornal Expresso, relativos á prova nacional de golfe para empresas «Expresso B... M...Golf Challenge», os elementos de escrita da empresa, nomeadamente os registos contabilísticos na conta 72.112 -"Serviços Prestados - Taxa Normal" relativos às inscrições das equipas participantes no torneio, e os elementos na posse da administração tributária, e bem assim, os relativos a empresas ou entidades com relações económicas com o contribuinte, na parte que releva para a quantificação do número de equipas convidadas. Assim os montantes efectivamente recebidos e não reflectidos na contabilidade da A..., relativos às inscrições das equipas participantes no evento «Expresso B... M...GolfChallenge», foram de 15.263,22 Euros no exercício de 2000 e de 12.569,71 Euros no ano de 2001, conforme apuramento efectuado em anexo afl. . 85.
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Os factos provados assentam na análise crítica dos documentos insertos no presente processo de impugnação, bem como no processo administrativo junto aos autos, que não foram impugnados.
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Inexistem factos não provados com interesse para a boa decisão da causa.
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2.2. – DA APLICAÇÃO DO DIREITO AOS FACTOS

Atenta a factualidade apurada e aquelas conclusões que delimitam o objecto do recurso, a questão a apreciar e decidir no presente recurso e que, a proceder, prejudica o conhecimento de qualquer outra, é a de saber se com a dedução da presente impugnação e com a prolação da sentença não conhecendo do mérito, foram violados os artigos 86/3 e 5 e 91° da LGT.
Com efeito, na sentença recorrida, com fundamento em que foi praticada a avaliação indirecta pela AT, a Impugnante tinha que accionar o pedido de revisão previsto no art° 91° da Lei Geral Tributária, o que não fez. o acto sindicado fixou-se na ordem jurídica como caso resolvido ou decidido, não podendo conhecer-se na impugnação da errónea quantificação nem dos pressupostos que estiveram na origem da determinação indirecta da matéria colectável, assim ficando prejudicado o direito a impugnar a liquidação e prejudicados os outros fundamentos da presente impugnação judicial.
É a seguinte a fundamentação da sentença recorrida:
“A propósito da natureza destas correcções há que trazer à colação o seguinte arresto" Ora, como é sabido, a matéria colectável pode ser fixada através de três tipos de correcções. Na correcção aritmética, a matéria colectável é identificada pelo contribuinte na declaração periódica anual, pelo que a administração não precisa de se socorrer de qualquer método de avaliação - directo ou indirecto - para determinar o imposto devido: a administração tributária limita-se a corrigir erros de cálculo das declarações-liquidações, com o objectivo de garantir a exactidão das autoliquidações. Trata-se, pois, do resultado da normal função de controlo que a administração tributária realiza quando recebe as declarações do contribuinte e verifica a existência de erros de cálculo. O mesmo acontece, aliás, no caso de um acto administrativo expressar a vontade do órgão administrativo com erros de cálculo ou materiais manifestos. Neste caso, nos termos do artigo 148° do Código do Procedimento Administrativo, o acto pode ser rectificado, a todo o tempo, pelos órgãos competentes para a revogação do acto, oficiosamente (ou a pedido dos interessados) e com efeitos retroactivos. Trata-se, pois, de uma correcção oficiosa que nem careceria de previsão legal expressa. Distintas desta são as correcções técnicas que a administração tributária faz à matéria tributável determinada no âmbito da avaliação directa, isto é, quando visa determinar o valor real dos rendimentos sujeitos a tributação sem recorrer a indícios ou presunções, mas à contabilidade do contribuinte. " Acórdão do STA no processo 037/07 de 26/04/07.
Do probatório resulta que no âmbito da inspecção foram efectuadas correcções à matéria colectável com e sem recurso a avaliação em indirecta, como, aliás, a Administração Tributária deixou bem patente no relatório e ficou espelhado no probatório.
Quanto às correcções efectuadas a título de ajudas de custos, conforme se refere no arresto, estamos perante "as correcções técnicas que a administração tributária faz à matéria tributável determinada no âmbito da avaliação directa, isto é, quando visa determinar o valor real dos rendimentos sujeitos a tributação sem recorrer a indícios ou presunções, mas à contabilidade do contribuinte ".
Ou seja a Administração Tributária entendeu que aquelas despesas e aqueles custos, para efeitos fiscais, são rendimentos da categoria A em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, na titularidade dos beneficiários das mesmas e custos para efeitos fiscais em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas da Impugnante no exercícios em causa.
Quanto às restantes correcções a Administração Tributária recorreu a presunções. Para o efeito teve em conta elementos externos à contabilidade, elementos constantes nas edições do Jornal Expresso, outros elementos externos fornecidos por outras entidades, que compararam com os elementos da contabilidade. Recolhidos os elementos enunciados no relatório e constantes no probatório, conjugados com os valores constantes na contabilidade da Impugnante a Administração Tributária extrapolou outros valores, ou seja apurou outros valores, que considerou para efeito de tributação.
Isto è desconsiderou a quantificação constante da contabilidade. Este procedimento tem previsão legal nos art° 87° a) e b) e 90 da Lei Geral Tributária, equivalentes aos art° 51° e seguintes do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, 28°, 30° e 66° do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e 82°, 83° e 83o- A do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado, e 87° c) e 89° da Lei Geral Tributária.
Aos factos aplica-se o regime previsto na Lei Geral Tributária, aprovada pelo Dec. Lei n° 398/98 de 17/12, nomeadamente o art° 86°, conjugado com os art° 91° e seguintes. Conforme ensina Jorge Lopes de Sousa in Problemas Fundamentais de Direito Tributário, Ed. Vislis, pag. 347 "Essa avaliação indirecta pode ocorrer em dois casos, a saber:
1) Quando não se afigure possível comprovar e quantificar a matéria colectável deforma directa e exacta com base nos elementos da contabilidade;
2) Quando, sem razão justificada, a matéria colectável do contribuinte é significativamente menor do que a matéria colectável "normal" do sector de actividade ":
Nos termos do art° 86° n° l da Lei Geral Tributária a liquidação efectuada com recurso a avaliação directa é susceptível, nos termos da lei, a impugnação contenciosa. Contudo o n° 2 deste normativo estipula que a impugnação da liquidação com recurso "a avaliação indirecta depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão " Ou seja, "a avaliação indirecta não é susceptível de impugnação contencioso directa salvo quando não dê origem a qualquer liquidação "
Aparece assim, a reclamação ou pedido de revisão, como resulta da epígrafe do art° 91° da Lei Geral Tributária. Esta reclamação prévia à impugnação tanto é exigida quando se invoque erro na quantificação, como quando se defenda a existência de erro nos pressupostos da determinação indirecta da matéria colectável (cf. 86° n° 5 da Lei Geral Tributária).
Neste sentido a Douta Jurisprudência do STA, vertida no processo n° 0432/05 de 26/06/05 que plasma o seguinte "Nos casos de determinação indirecta da matéria colectável só é possível a impugnação desde que antes se tenha reclamado graciosamente ou pedido a revisão do acto tributário, constituindo-se caso resolvido se tal actuação não teve antes lugar".
Já concluímos que foram efectuadas correcções técnicas, mas também foram efectuadas correcções com recurso a avaliação, Então, face ao regime exposto a Impugnante tinha que accionar o pedido de revisão previsto no art° 91° da Lei Geral Tributária, o que não fez.”
Decidindo suportada em tal fundamentação, a Mª Juíza absolvo a Fazenda Pública do pedido por caducidade do direito de impugnar.
A EPGA manifesta a sua concordância com o assim fundamentado e decidido e que acolheu a posição do MºPº da 1ª instância assumida no seu parecer pré-sentencial.
Dessa solução dissente a recorrente pelos fundamentos condensados nas conclusões recursivas em que, no fundamental, discorda que haja sido aplicada a avaliação indirecta e/ou que esta fosse aplicável na concreta situação.
Quid juris?
Tendo em conta o que consta do probatório, vê-se que a AT sem dúvida nenhuma que aplicou a avaliação indirecta ou os métodos indiciários que, como o nome indica, estão reservados àqueles casos em que, na falta de elementos seguros, se tem que lançar mão de índices, de médias e/ou presunções, e, no caso dos autos, essa utilização justifica-se pela falta de credibilidade da contabilidade da impugnante.
Na verdade, a impugnante estava obrigada a manter a sua contabilidade organizada de acordo com os princípios consagrados no POC e foi porque consideraram que tal não sucedia que os serviços competentes da AF efectuaram as liquidações oficiosas derivadas das informações oficiais.
Com efeito, como consta dos documentos que formalizaram o acto tributário, os actos impugnados foram motivados pelas irregularidades apontadas e de carácter contabilístico.
No probatório alicerçado nas informações oficiais prestadas pelos Serviços de Fiscalização Tributária e que serviu de fundamentação da fixação definitiva do imposto em causa e nos demais elementos probatórios para os quais remete, deu-se como assente que:
“…
6.No âmbito da acção inspectiva referida nos pontos l e 2, a Administração Tributária fez constar e fundamentou a correcção nos seguintes termos: "Da inspecção efectuada verificaram-se os seguintes factos e fundamentos das correcções de natureza meramente aritmética á matéria tributável: Ajudas e Custos e Quilómetros;
a. Da análise aos encargos relativos a ajudas de custo e às importâncias auferidas pela utilização de automóvel próprio em serviço da empresa (vulgo quilómetros), observaram-se os seguintes factos:
b. Para o período a fiscalizar o quadro de pessoal da empresa A...integrava l sócio gerente e 3 empregados até ao final do mês de
Setembro de 2000, tendo após esta data, passado a integrar l sócio gerente e 2 empregados;
c. Da análise aos encargos com viaturas ligeiras, verificou-se a existência de 3 viaturas a gerar encargos para a empresa, nomeadamente um Citroen Saxo, mat.: 75-68-MV, um Citroen Xantia, mat.: 47-98-JR e um VW Passai, mat.: 00-60-ON. A natureza destes encargos inclui combustíveis, seguros, reparações, portagens, aluguer e amortizações;
d. O custo total com o consumo de combustíveis destas viaturas foi de esc.: 1.143.632SOO no exercício de 2000 e de esc.: 974.151 $00 no exercício de 2001;
e. Nos extractos de c/c das contas 62.2276 - "KMs" e da conta 64.835 _ "Ajudas de Custo" referentes ao exercício de 2000 estão evidenciados custos apenas para o período que decorreu entre o mês de Janeiro e o final do mês de Março, vide anexos afls. l e 2, enquanto no exercício de 2001 esses custos já são regulares ao longo do ano, vide anexos afls. 3 a 5, tendo a empresa mantido o mesmo tipo de actividade, nomeadamente a organização, promoção e realização do evento desportivo "Expresso B...M...Golf Challenge";
f. Embora todo o pessoal da empresa (gerente incluído) aufira subsídio de alimentação de montante diário que não excede os limites legais, para efeitos de tributação em sede de IRS, este valor nunca foi deduzido ao montante pago da ajuda de custo diária correspondente, conforme estipula o regime de atribuição das ajudas de custo que se encontra regulamentado nos (DL 519-M/79, de 28/12, DL 192/95, de 28/7 e Circular 12/91 de 29/04).
g. Em consequência do atrás exposto e tendo em conta que as mesmas foram pagas, não há dúvida de que as importâncias em causa assumem a natureza de complemento de vencimento, não se enquadrando em nenhuma norma de exclusão da tributação, devendo ser tributadas em sede de IRS na esfera da pessoa que as auferiu facturas de refeições do
sócio gerente E... e do empregado F..., com frequência quase diária, pelo que destinando-se as ajudas de custo a fazer face a despesas efectuadas pelos trabalhadores em deslocações ao serviço da empresa, nomeadamente com refeições e estadias, estas facturas numa situação normal não deveriam existir em tão grande número na contabilidade da empresa, o que evidencia que é atribuído o abono de ajudas de custo, mas simultaneamente a entidade patronal paga as despesas com alimentação e alojamento;
h. Relativamente à documentação de suporte às ajudas de custo e aos
quilómetros (boletins itinerários), verifica-se que nenhum indica a natureza do serviço efectuado que originou a deslocação, apenas a menção "deslocação profissional", nem as horas de partida nem as horas de chegada, vide anexos afl. 6 a 18;
i. A empregada administrativa G..., durante o exercício de 2001, auferiu 14 vezes a importância de Esc.:70.150$00 a título de deslocações casa/escritório. Todavia não cabe no conceito de deslocações as viagens efectuadas de casa para o local de trabalho. Desempenhando esta funcionária funções de secretariado, estamos perante importâncias que constituem verdadeiras remunerações;
j. Comparando os seguintes documentos contabilizados no exercício de
2001: CX.1022 versus BN 4048 , CX 3019 versus BN 4009, CX 4022 ver sus BN 4049; ex 10 023 versus BN 11 023 e BN 11 014 verifica-se que os locais de deslocações não são coincidentes, vide anexos a tis. 19 a 28;
k. Assim não obstante o tratamento que em termos formais é dado às importâncias em causa, na prática e em substância, as mesmas revestem a natureza de remunerações, e consequentemente as mesmas devem ser tributadas na sua totalidade, como rendimentos do trabalho dependente, nos termos do artigo 2.°, n° 3 alínea d) do Código do IRS.
Consequentemente, haveria que proceder a retenção na fonte relativamente a essas importâncias (artigo 99. °, n° l do Código do IRS).
l Na perspectiva da empresa A..., Lda. que pagou as importâncias em causa, as mesmas vão ser reconhecidas na totalidade como custo fiscal do exercício, nos termos do artigo 23.°, nº l alínea d) do Código do IRC, por não lhes aplicável a norma da alínea f) do n° l do artigo 41. ° deste Código, em face da respectiva descaracterização como ajudas de custo e compensação por deslocações em viatura própria e respectiva tributação como rendimentos do trabalho dependente na esfera dos beneficiários, o apuramento dos montantes das remunerações pagas a título de ajudas de custo e quilómetros por beneficiário, bem como o apuramento mensal dos montantes de imposto não retido, para efeitos de cálculo dos juros compensatórios, nos termos do n.° 2 do art. 103.° do CIRS, foi efectuado conforme mapas em anexo a tis 29 a 36, tendo sido apurados os seguintes montantes de IRS não retido, ANO: 2000 (em euros)
m. JAN./OO- 1.247,84; FEV/OO- 556,02; MAR/OO- 841,99; ABR/lOO-0,00; MAI./OO- 0,00; JUN.IOO- 0,00; JUL./OO- 0,00; AGO./OO- 0,00; SET./OO- 0,00; OUT/OO- 0,00; NOV.IOO- 0,00; DEZ.IOO- 0,00; TOTAL/OO - 2.645,85 EUROS.
n. ANO: 2001 (em euros) JAN./01- 829,00; FEV.101- 954,73; MAR/01-779,17; ABR/01- 924,21; MAL/01-1.028,37; JUN.101- 871,75; JUL./01-1.039,97; AGO.101- 624,34; SET/01- 865,36; OUT/01- 1.009,67; NOV.101-1.406,73; DEZ.1011.462,30; TOTAL/01-11.795,60 EUROS" 7. A Administração Tributária fez ainda constar no relatório a seguinte factualidade de fundamentos de correcção, que para os devidos efeitos se transcreve: Motivo e exposição dos factos que implicam o recurso aos métodos indirectos 6,1-Exposição dos factos:
a. A empresa A...è - Promoção de Eventos de Golfe, Lda. como já foi referido anteriormente, é uma sociedade comercial que se dedica á organização e promoção de eventos de golfe, sendo o seu principal evento o "Expresso B... M...Golf Challenge". Trata-se de um torneio de golfe aberto a qualquer empresa, sociedade, organização ou associação, que possua uma actividade ou negócio radicado em Portugal, composta por quatro fases: qualificações regionais (golf days), semi finais, final nacional e final mundial a realizar no estrangeiro, entre as equipas finalistas de cada um dos países onde se realizaram as provas congéneres.
b. Associado a este evento está um «media partner» de grande referência nacional o Jornal Expresso, à semelhança do que acontece com outros medias nos eventos congéneres estrangeiros, onde é publicitado, comercializado e promovido o CGCP.
c. Depois perfilam-se outras empresas que patrocinam comercialmente o evento sob a forma de sponsorização, alinhadas em diferentes categorias em função do montante do patrocínio, nomeadamente sponsor principal, cosponsors e produtos oficiais, tudo isto tendo como contrapartida um «Mix» de publicidade que inclui entre outros, a publicação de suplementos, anúncios publicitários, artigos e entrevistas no Jornal Expresso, no "Jornal do Golfe", acesso á base de dados do «Corporate», exposição mediática, publicidade estática, promoções e relações públicas. Foi solicitado verbalmente ao sócio gerente da empresa A..., o Sr. H... através da interlocutora Dra. I...C. H. ..., administradora da firma J... - Consultadoria, Fusões e Aquisições, SÁ, empresa que processa a contabilidade da A..., para nos fornecer cópias das edições do Jornal Expresso onde foram publicados os artigos que faziam referência ao número de equipas inscritas e participantes no «Corporate», dado ter sido exclusivamente através daquele média, que foi feita a mediatização do evento. Com alguma surpresa nossa foi-nos transmitida a informação de que não possuíam cópias dessas publicações em arquivo.
d. Diligenciando no entanto por outras vias, conseguimos obter cópias das referidas publicações, que juntamos em anexo afls. 37 a 50;
e. Feito o levantamento do número de equipas participantes no torneio, conforme está publicamente escrito nas referidas edições do Jornal Expresso, procedeu-se de seguida à contagem das inscrições registadas na contabilidade da empresa, conta 72.112 - "Serviços Prestados - Taxa Normal", de que se juntam cópias em anexo a fls. 51 a 78, tendo sido ainda tomadas em linha de conta o número de equipas convidadas, pois conforme já foi referido anteriormente, houve várias empresas a patrocinar o evento e como tal é perceptível a inclusão de convites para participação gratuita das mesmas na prova. Nesse sentido, solicitaram-se ao sócio gerente da A..., Sr. H...os seguintes elementos: uma relação das equipas convidadas a participar gratuitamente na prova e os respectivos contratos de patrocínio efectuados, com a finalidade de quantificar e comprovar o número de convites contemplados.
f. Foi-nos fornecida uma lista de equipas convidadas que juntamos em anexo a) fls. 79. Da leitura efectuada aos contratos de patrocínio, constatou-se que em apenas em dois, estava explicitamente definido o n.° de equipas a inscrever gratuitamente no 1° torneio, nomeadamente no acordo de patrocínio comercial com a RTA - Região de Turismo do Algarve (de que se junta cópia em anexo a fls.80 a 82), e com a L..., tendo sido cada entidade convidada a inscrever apenas uma equipa, (ficam a fazer parte integrante do presente processo de inspecção, para eventual consulta, cópias dos acordos de patrocínio comercial com as empresas: B..., D... e C... Telecomunicações). Não estando a lista de equipas convidadas fornecida pela A..., inequivocamente suportada e comprovada através dos acordos de patrocínio comercial estabelecidos entre as partes envolvidas, utilizámos elementos em poder da administração tributária, bem assim, os relativos a empresas ou entidades com relações económicas com o contribuinte, tendo sido elaborados os quadros em anexo a fls. 83 a 85 , que evidenciam diferenças significativas entre as inscrições efectivas das equipas participantes no evento «M...Golf Challenge» e as inscrições registadas na contabilidade da empresa com prejuízo da receita, que não foi integralmente contabilizada e declarada para efeitos fiscais
i. 6.2- Motivos:
g. Pelos factos expostos a determinação da matéria tributável vai ser efectuada com recurso aos métodos indirectos, nos termos previstos nos artigos 87°, alínea, b) e 88°, ai a), ambos da L.G.T. e artigos 52.° e 54.° do CIRC, por motivo de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis á correcta determinação da matéria tributável, resultante da inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade
8. Tendo em conta os factos antecedentes a Administração Tributária fez constar no relatório o que para os devidos efeitos se transcreve •Critérios de Cálculo dos Valores Corrigidos com Recurso a Métodos Indirectos 7.1- Determinação das Prestações de Serviços
a. Para a determinação dos montantes das prestações de serviços presumidamente efectuadas nos anos de 2000 e 2001, tivemos como base de trabalho os elementos obtidos a partir de artigos publicados no Jornal Expresso, relativos á prova nacional de golfe para empresas «Expresso B... M...Golf Challenge», os elementos de escrita da empresa, nomeadamente os registos contabilísticos na conta 72.112 -"Serviços Prestados - Taxa Normal" relativos às inscrições das equipas participantes no torneio, e os elementos na posse da administração tributária, e bem assim, os relativos a empresas ou entidades com relações económicas com o contribuinte, na parte que releva para a quantificação do número de equipas convidadas. Assim os montantes efectivamente recebidos e não reflectidos na contabilidade da A..., relativos às inscrições das equipas participantes no evento «Expresso B... M...GolfChallenge», foram de 15.263,22 Euros no exercício de 2000 e de 12.569,71 Euros no ano de 2001, conforme apuramento efectuado em anexo afl. . 85.
Assim, a determinação do imposto em falta deveria ter sido efectuada no pressuposto de que a escrita da ora impugnante não reflectia a veracidade da sua actividade, ou seja, as liquidações em causa teriam de ser operadas com recurso ao método presuntivo, actuante em sede de fiscalização à mesma.
De acordo com a norma ínsita no artº 87 da LGT a avaliação indirecta efectua-se há impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto.
De todo o exposto decorre que à AF cabia a demonstração da verificação dos pressupostos que a legitimassem a lançar mão do aludido método indirecto, ou seja, de que, ao que aqui nos importa, a contabilidade do contribuinte padece de anomalias que afectavam a sua credibilidade, por forma a que se tornava inviável a quantificação directa, imediata e exacta da matéria colectável. Verificados estes pressupostos transferia-se para o contribuinte o ónus de demonstrar que, ao invés do sustentado pela AF, aqueles pressupostos se não verificam, ou que, verificando-se, não permitem o apuramento dos valores encontrados.
Do relatório dos SFT constam as infracções verificadas e acima enumeradas.
Destarte, tem de concluir-se que, no caso presente, e independentemente da verificação dos necessários pressupostos legais à tributação da recorrente por recurso a métodos indiciários, estes foram aplicados por se ter considerado que nas situações descritas ocorria a impossibilidade de efectuar um controlo claro e inequívoco do valor das operações omitidas para efeitos de IRC e por isso se justificava que a AT lançasse mão do método indirecto de determinação da matéria tributável, porque impossibilitada de usar os meios de prova directa para cumprir com o seu poder dever de liquidar, impossibilidade criada pela recorrente pelo não cumprimento de obrigações a que estava adstrita.
Para o efeito e como sapientemente se refere no Acórdão deste TCA proferido em 19/12/2002 no Recurso nº 6704/02 a AF teve de basear-se “...na utilização de inferências probabilísticas (que) permita se não alcançar aquela certeza pelo menos atingir a máxima verosimilhança que seja possível alcançar no caso concreto através do emprego de tais meios. Importa desde logo salientar que o recurso a tal método é subsidiário. Significa isto que não basta a comprovação dos pressupostos que legitimam o seu recurso, é necessário também que por força desses pressupostos a AF se veja impossibilitada de calcular de forma segura e certa a matéria tributável. Também o recurso a este método não pode ser visto como sanção. Os mesmos factos poderão efectivamente ser o suporte do recurso a este método de apuramento da matéria tributável e eventualmente serem também constitutivos de infracção.
Sem que daí se possa concluir que se ofende princípio «ne bis in idem» nem que resulte uma inversão do ónus de prova. Não.
Em primeiro lugar porque o método indirecto prossegue fins diversos e depois porque o recurso ao método indirecto está legitimado por força do princípio constitucional da capacidade contributiva que só se respeita fielmente quando se mede directamente a matéria tributável sendo por isso uma faculdade da AF no exercício do seu poder dever de liquidar.”
Nesse sentido, releve-se que teria de ser deduzida reclamação para a Comissão de Revisão, o pedido de revisão ao abrigo do artº 91º da LGT.
Em homenagem ao princípio da verdade material (art°s 50° do CPPT e 58° n°1 da LGT) no âmbito do procedimento administrativo-tributário incumbe à Administração Tributária indagar sobre a verificação do facto tributável e demais elementos pertinentes à liquidação do imposto, só podendo culminar o procedimento com a liquidação em sentido estrito quando, face aos elementos apurados, estiver adquirida a convicção da existência e conteúdo do facto tributário.
Como expende J. L. Saldanha Sanches, As Avaliações do IVA e os Deveres de Cooperação dos Retalhistas, na revista Fisco n.° 2 de 15-11-1988, a avaliação fiscal, ou estimativa (recurso a métodos indiciários, ou outras designações para a mesma forma de actuação administrativa) constitui sempre uma ultima ratio fisci. A Administração Fiscal só deve recorrer às avaliações, quando estas se tornam o único método de calcular a dívida fiscal, quando a liquidação não pode assentar, como sucederá na grande maioria dos casos, nos elementos fornecidos pelo contribuinte.
Ora, é desta natureza da avaliação que necessariamente decorrem alguns dos pressupostos básicos da sua legitimidade.
O primeiro, é que a avaliação tem o claro recorte de uma medida excepcional. É um método indispensável, mas apenas perante a existência de declarações fraudulentas.
O segundo, é que o recurso a métodos indiciários constitui sempre uma sanção pela violação, que deverá ter existido, de deveres de cooperação do contribuinte, sobremaneira a violação das obrigações legais acessórias de declaração, de facturação e de escrituração.
Uma vez que os métodos actuais de tributação assentam na cooperação dos contribuintes, as leis fiscais estabelecem necessariamente uma complexa descrição das suas obrigações acessórias. Obrigações estas que têm um carácter instrumental, na medida em que se destinam simultaneamente a permitir o cálculo da dívida pelo contribuinte, e o eventual controlo destas operações pela Administração.
O recurso à avaliação tem como pressuposto que a violação destes deveres de cooperação tornem o controlo impossível. Violados estes, incorrendo o contribuinte em algum dos comportamentos omissivos ou afastados dos comandos legais, a Administração procede a uma avaliação da dívida.
E opera-se por esta forma uma verdadeira inversão material do ónus da prova. A partir daqui, é sobre o contribuinte que, materialmente, recai o ónus da prova de que a avaliação não tem bases suficientemente sólidas.
Nesse sentido, como se vê do probatório, a Administração Fiscal indicou factos concretos, verificados, donde podia concluir-se pela existência dos pressupostos legais dos quais depende o apuramento do imposto pelo método presuntivo.
Para determinar o IRC com base nas operações que o sujeito passivo presumivelmente efectuou tornava-se, pois, necessário apurar com factos ou situações do próprio contribuinte ou das suas relações com terceiros, a montante (aquisições) ou a jusante (transmissões de bens ou prestações de serviços), que constituam índices que suportem a quantificação das operações tributáveis, devendo também para determinação do IRS, nos termos do artigo 38º do respectivo Código, a Administração Fiscal utilizar-se os elementos descritos no artigo 52.° do Código do IRC - cf. Alfredo José de Sousa, e José da Silva Paixão, no Código de Processo Tributário Comentado e Anotado, 3.ª edição, nota 4 ao artigo 81 °.
Ora, este artigo 52.° do Código do IRC (vejam-se, outrossim, os artigos 88º a 90º da LGT) diz que a determinação do lucro tributável por métodos indiciários basear-se-á em todos os elementos de que a Administração Fiscal disponha, e, designadamente, em margens médias de lucro bruto ou líquido sobre vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos e serviços de terceiros; taxas médias de rendibilidade do capital investido; coeficientes técnicos de consumo ou utilização de matérias-primas ou de outros custos directos; elementos e informações declarados à Administração Fiscal, incluindo os relativos a outros impostos, e, bem assim os obtidos em empresas ou entidades que tenham relações com o contribuinte.
A indicação destes elementos, como resulta inequivocamente da letra da lei, é meramente exemplicativa - pelo que outros elementos ou factores que forem pertinentes podem ser tidos em conta, e, obviamente, não se exige que, para apuramento do lucro tributável por métodos indiciários, todos aqueles elementos que a lei elenca tenham obrigatoriamente de ser considerados sempre, em todo e qualquer caso.
E foi o que aconteceu como se assinala no probatório.
Como é evidente, a utilização de tais métodos dificilmente habilitará a Administração Fiscal a conhecer o verdadeiro lucro real obtido, dada a natureza e falibilidade de uma actuação norteada apenas por "índices médios" como sejam "as margens médias de lucro bruto ou líquido sobre as vendas, serviços prestados ou sobre as compras, fornecimentos e serviços de terceiros", ou atendendo a "taxas médias de rendibilidade do capital investido", etc, em vista do disposto no artigo 52.° do Código do IRC.
Por outro lado, e como já vimos, relativamente à fundamentação da decisão de tributação por métodos indiciários ou presunções, dizem os artigos artºs. 87º a 89º da LGT que essa decisão, para além de especificar os motivos da impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, indicará os critérios utilizados na sua determinação; o que tudo ocorre no caso concreto.
Em tal fundamentação, a Administração Fiscal tem, outrossim, o ónus de remoção da dúvida fundada sobre a existência e a quantificação do facto tributário, já que, se esta existir, o acto deverá ser anulado – nº 1 do artigo 100º do CPPT.
O n.° 2 deste artigo afirma, no entanto, que, em caso de aplicação de métodos indiciários, não se considera existir dúvida fundada, se o fundamento desta consistir na inexistência ou desconhecimento, por recusa de exibição, da contabilidade ou escrita e demais documentos legalmente exigidos ou a sua falsificação, ocultação ou destruição, mesmo que sejam invocadas razões acidentais.
De qualquer modo, a Administração Fiscal continuará a ter o ónus da remoção da dúvida fundada quanto à verificação dos pressupostos de facto de aplicação dos métodos indiciários.
Nos termos do n.° 3 do artigo 100.° do Código de Processo Tributário, o disposto no n.° 2 não prejudica a possibilidade de o sujeito passivo (o ónus agora é seu) demonstrar na impugnação judicial o erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada - cf. André Salgado de Matos, Código do IRS Anotado, em nota 3. ao artigo 38°.
No caso sub judicio, a Administração Fiscal procedeu à liquidação impugnada, através da «presunção de vendas/serviços prestados» pois o apuramento do valor tributável por métodos indiciários consiste, logicamente, em inferir, a partir de regras de experiência (técnica ou comum) um facto desconhecido (precisamente, o valor tributável) de um facto indiciário conhecido (facto base ou instrumental).
E o que acontece no caso é que a Administração Fiscal revela-nos a premissa maior que considerou (um índice ou coeficiente técnico justificável); a premissa menor em que assentou (um facto indiciário exacto, apurado directamente, e não presumido) - pois só assim, e através de uma cadeia lógico - dedutiva sem falhas, poderia ter chegado a uma conclusão válida no silogismo, que é sempre o apuramento do valor tributável por métodos indiciários.
Ora, face ao acabado de apreciar, suscitava-se a questão prévia da falta de pressupostos da impugnação porquanto aquela a que estes autos se reportam visava a liquidação adicional de IRC tendo por fundamento a errada avaliação da matéria tributável.
Daí que, se se considerasse o bem fundado das «correcções» operadas pelo Fisco, teria de admitir-se que a impugnante estava a deduzir impugnação contenciosa directa do acto de avaliação directa, sendo certo que a impugnação da avaliação directa depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão por injunção do artigo 86º nºs 1 e 2 da LGT.
Sendo manifesto que não usou nenhum desses meios, em princípio, não seria admissível a impugnação contra o acto de liquidação com aquele fundamento.
O fundamento base da impugnação que se estribe na ilegalidade da decisão de corrigir, por avaliação directa, o valor tributável, não pode ser objecto de impugnação da liquidação porque é directa e reportada a matéria que visa apenas pôr em causa a avaliação da matéria tributável.
Definindo o âmbito da avaliação directa, dispõe o Artigo 81.° da LGT que: 1. A matéria tributável é avaliada ou calculada directamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstos na lei.
No preceito faz-se a referência cumulativa a avaliação e cálculo da matéria colectável e por isso se dirá, na senda de Diogo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, LGT Comentada e Anotada, 3ª ed., pág. 418 e ss, que a designação de avaliação estará reservada para os casos em que a determinação da matéria tributável é feita através de métodos que, mesmo com uti­lização de critérios objectivos (como exige o n.° l do art. 84.° da L.G.T.), não podem deixar de envolver uma margem de subjectividade, como sucede nos casos de determinação do valor de bens (entre outros casos, para efeitos de sisa, imposto sobre sucessões e doa­ções, contribuição autárquica, em certos casos, direitos alfandegários e imposto automó­vel) e naqueles em que a determinação é feita utilizando métodos indirectos.
Destarte as referências a avaliação circunscrevem-se aos casos em que houver aplicação de elementos de carácter subjectivo.
Ora, como flui da fundamentação constante do Relatório e dos respectivos elementos de suporte, a avaliação operada pela AT está carregada de subjectividade pois estamos perante “presunções”.
Decorre do artº 81º da LGT que a utilização da avaliação directa é a regra como meio de determinação da matéria tributável e que tem carácter subsidiário da ava­liação indirecta, que só pode ser utilizada dentro do condicionalismo e nos casos previs­tos na lei.
E, como se disse, essa regra, tem um âmbito de aplica­ção limitado aos casos em há a necessidade de utilização de elementos subjectivos, o que acontecerá no caso vertente como o revela os termos utilizados pela AT para fixar o valor tributável e reconhece o próprio contribuinte quando considera que foi utilizada a avaliação indirecta.
Conforme preceitua o Artigo 83.° da LGT a avaliação directa (que a a sentença diz ter sido ter usado) visa a determinação do valor real dos rendi­mentos ou bens sujeitos a tributação (nº 1) e a avaliação indirecta (que o a FP demonstrou que foi a efectivamente utilizada) visa a determinação do valor dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária disponha (nº 2).
Resulta do inciso legal transcrito que quer a avaliação directa como a indirecta têm por fim determinar o valor dos ren­dimentos ou bens sujeitos a tributação, nos seguintes termos:
a)- no primeiro caso, a avaliação é feita com base em elementos de prova do valor real dos bens ou rendimentos tributáveis e, por isso, visa-se determinar com exactidão este valor;
b)- Os casos em que se procede a avaliação indirecta, indicados no art. 87.° da L.G.T., são situações em que não existem elementos fiáveis suficientes para demonstrar exacta­mente o valor daqueles bens ou rendimentos, o que corresponderá à verdade como já se demonstrou pois, a avaliação dos bens sujeitos a tributação deveria ter sido feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária dis­pusesse, inclusivamente alguns que poderiam ser utilizados na avaliação directa.
De resto, volta a enfatizar-se, dado o seu carácter excepcional, apenas se procede a avaliação indirecta em casos em que não seja viável determi­nar a matéria tributável através de avaliação directa, quer por falta de elementos para esta ser levada a cabo, quer por haver razões para suspeitar que o valor a que conduz a apli­cação dos métodos de avaliação directa não é a matéria tributável real [arts. 87.°, n.° l, alínea c), e 89.° da L.G.T.].
Tudo aponta, pois, para que estavam reunidos os pressupostos da avaliação indirecta o que foi respeitado pela AT.
Sendo, pois, indiscutível de que em tal situação nos encontramos perante uma avaliação indirecta, há que atentar no regime leal de impugnação judicial, regulado no artigo 86.° da LGT, de acordo com o qual:
3. A avaliação indirecta não é susceptível de impugnação contenciosa directa, salvo quando não dê origem a qualquer liquidação.
Como ensinam os ilustres anotadores, em anotação ao artº 86º da LGT e na sede indicada, no contencioso tributário vigora o princípio da impugnação unitária, nos ter­mos do qual só há impugnação contenciosa do acto final do procedimento, que afecta imediatamente a esfera patrimonial do contribuinte, fixando a posição final da adminis­tração tributária perante este, definindo os seus direitos ou deveres.
Este princípio é concretizado no art. 66.° desta Lei e no art. 54.° do C.P.P.T., em que se estabelece que, salvo quando forem imediatamente lesivos dos direitos do contribuinte ou disposição expressa em sentido diferente, não são susceptíveis de impugnação conten­ciosa autónoma os actos interlocutórios do procedimento, sem prejuízo de poder ser invo­cada na impugnação da decisão final qualquer ilegalidade anteriormente cometida.
No entanto, por vezes, a lei prevê a impugnabilidade contenciosa imediata de actos anteriores ao acto final do procedimento, que têm especial relevo para condicionar a - "decisão final.
Estes actos preparatórios da decisão final que são directa e imediatamente impug­náveis por via contenciosa assumem a natureza de actos destacáveis».
A lei considera a inimpugnabilidade directa de um acto cometido no procedimento que culmina com a liquidação que era o acto de "fixação definitiva do imposto". Ou seja, na falta de reacção mediante o procedimento de revisão regulado no artº 91º e ss da LGT, o acto de avaliação e o respectivo quantum consolidava-se, tornando indiscutí­vel os seus eventuais vícios.
Na verdade, devendo ser aplicada a avaliação indirecta, tal impunha o esgotamento do meio administrativo de revisão e, assim, deveria a impugnante ter reclamado da aplicação desse método e da respectiva quantificação da matéria colectável para a Comissão de Revisão nos termos do artº 91º da LGT, sem o que o acto tributário era inimpugnável.
*
É certo, porém, que, como já acima se deu conta, que o acto tributário em causa, não só é decorrente de correcções presuntivas, mas ainda e também, é resultante de correcções técnicas.
Põe-se, então, a questão de saber se a liquidação poderia ser impugnada directamente quanto às correcções técnicas já que se poderia entender que a existência de uma única acção da inspecção tributária de que resultaram as correcções, não impedem que tal determine mais que uma liquidação de imposto, já que são diferentes os fundamentos de uma e de outra liquidação adicional de imposto.
Para responder a esta questão, cumpre ter presente que o método por que a AT fixou o lucro tributável da Contribuinte para efeitos de IRC do ano em causa liquidado autonomamente foi, sem margem para qualquer dúvida o método indirecto, isso depois de operar a liquidação sobre a matéria tributável determinada com recurso a correcções.
Ou seja, a AT também usou para esse efeito o método directo.
Ora, o facto de na fixação do lucro tributável por métodos indirectos se dever procurar determinar directamente o maior número possível de elementos objectivos, não autoriza a ficção da existência de dois lucros tributáveis relativamente ao ano em causa, sendo um fixado por métodos directos e outro por métodos indirectos, ou que se cinda o lucro tributável, que é uma realidade única (se bem que determinada com recurso a elementos múltiplos), em duas partes distintas, sendo uma a resultante de avaliação directa e outra de avaliação indirecta.
Quer isto dizer que não logra aqui aplicação o n.º 14 do art. 91.º da LGT que dispõe que “As correcções meramente aritméticas da matéria tributável resultante de imposição legal e as questões de direito, salvo quando referidas aos pressupostos de determinação indirecta da matéria tributável, não estão abrangidos pelo disposto neste artigo; é que este só logra aplicação nos casos em que a matéria tributável tenha sido fixada exclusivamente com base em correcções aritméticas.
Assim, a AT erra ao não ter concedido o efeito suspensivo da liquidação previsto no n.º 2 do art. 91.º da LGT, pois não é possível e legal a AT proceder à liquidação com base na matéria tributável fixada por métodos indirectos antes de findo o procedimento de revisão, desde que essa liquidação seja restrita à “parte resultante de avaliação directa”.
Esse entendimento foi professado no recente Acórdão deste TCAS de 31-10-2006 no Recurso nº 01262/06 cuja fundamentação, com a devida vénia, se vai seguir de perto.
Assim, expende-se nesse aresto que “É certo que o art.º 86.º/4 da LGT, determina(va) que “Na impugnação do acto tributário de liquidação em que a matéria tributável tenha sido determinada com base em avaliação indirecta , pode ser invocada qualquer ilegalidade desta , salvo quando a liquidação tiver por base o acordo obtido no processo de revisão da matéria tributável regulado no presente capítulo” (negrito da nossa responsabilidade).
Por outro lado, é um dado adquirido que, no caso em análise, a AT (também) recorreu a presunções, como método alternativo na fixação da matéria tributável, e que os peritos (do Fisco e da Recorrente) chegaram, em sede do procedimento de revisão desencadeado e de que, acima, se deu conta, a acordo quer quanto à ocorrência dos pressupostos legais legitimadores do lançar mão da referida metodologia , quer quanto à fixação do «quantum» da matéria colectável , ao que aqui nos importa , no que concerne ao exercício de 2000.
Por isso que seja um axioma , que à luz do aludido comando legal (Que bem se entende face à qualidade de representante do contribuinte , do perito por si indigitado e interveniente no acordo), se tenha se concluir, sem possibilidade de contestação, que a impugnante não seja admitida a impugnar a liquidação em causa , quer enquanto possa dissentir da verificação dos pressupostos legais necessários ao recurso á avaliação indirecta , quer enquanto possa discordar do «quantum» fixado , designadamente por divergência dos critérios em que se possa ter suportado.
Mas sendo assim, isto não implica, como nos parece decorrer já do que acabámos de afirmar, que , em caso de avaliação indirecta em que os peritos tenham chegado a acordo em sede de procedimento de revisão , o contribuinte se veja manietado na possibilidade legal de impugnar judicialmente a impugnação da liquidação , desde logo por violação da nossa Lei Fundamental.
O que está é inibido de a impugnar, na medida em que tal impugnação vise (re)apreciar, qualquer que seja o ângulo por que possam ser colocadas , questões que tenham sido objecto de ponderação e decisão no aludido acordo dos peritos, precisamente como consagração da proibição de “venire contra factum proprium” , atenta a qualidade de representante do perito do contribuinte , pois tal significaria o “desdizer” daquilo a que se tinha , ao fim e ao cabo , vinculado em sede do procedimento de revisão.
Neste sentido apontará o Ac. do STA de 2004NOV23(3) , em termos que , muito mais certeira e esclarecedoramente do que nós poderíamos fazer , de seguida parcialmente se transcrevem;
«É que a fixação da matéria tributável, sendo assunto da competência da Administração Tributária, foi objecto de um pedido de revisão formulado pela ora recorrente, nos termos do artigo 91º da LGT, e a liquidação tomou por base o acordo a que chegaram os peritos da Administração e da agora recorrente, tudo como consta da matéria de facto fixada.
Ora, sendo, hoje, o perito designado pelo contribuinte para o procedimento de revisão um seu representante, o acordo em que ele intervenha vincula o contribuinte, projectando-se na sua esfera jurídica. Agindo o seu perito em representação do contribuinte, não pode este queixar-se senão de si – a não ser que o seu perito actue para além dos poderes que lhe conferiu, que é questão que, no caso, se não levanta.
Deste modo, estamos perante algo que não é um puro acto de autoridade, cujo resultado se imponha ao contribuinte independentemente da sua vontade, mas perante um acordo entre um seu representante e o da Administração, vinculativo, aliás, para esta, e insusceptível, com a já apontada ressalva, de afectar os seus direitos ou interesses – o acordo consubstancia, antes, a realização desses direitos ou interesses.
Não vemos, pelas razões expostas, que haja impedimento constitucional a que a lei não admita que se invoque, na impugnação judicial do acto de liquidação, a errónea determinação da matéria tributável com base em avaliação indirecta, nos casos em que aquela matéria tenha sido encontrada mediante acordo obtido no processo de revisão.
3.6. Já não será constitucionalmente admissível que, na mesma impugnação, o contribuinte fique proibido de invocar vícios ocorridos no procedimento de avaliação indirecta e de revisão, excluídos do âmbito do que foi objecto do acordo.» (sublinhado da nossa responsabilidade).
Ora, o que aqui constitui o cerne da discussão submetida à apreciação do tribunal recorrido é, precisamente e no entender da recorrente, a ocorrência de um vício no procedimento de revisão, a saber o da violação do comando plasmado no n.º 2 do art.º 91.º da LGT (efeito suspensivo , do pedido de revisão , sobre a concretização da liquidação).
Ora , e como é patente ,-não só dos termos da acta da reunião de peritos como pela própria natureza das coisas , uma vez que , como temos por claro , a questão do efeito suspensivo do pedido de revisão não é tema susceptível de apreciação dos peritos-, tal questão não se encontra englobada nas questões que foram objecto de análise, ponderação e decisão , por acordo , dos peritos.
E, sendo assim, sempre o contribuinte terá a possibilidade de impugnar judicialmente a liquidação em causa , com suporte no cometimento do aludido vício de forma , sendo irrelevante ao efeito a existência de acordo entre os peritos e , por inerência , o momento em que ocorreu o acto de introdução em juízo destes autos , por referência aos da decisão e/ou notificação do acordo a que chegaram os peritos.
Por isso que , a sentença não se possa manter na ordem jurídica , razão porque se impõe , agora , apreciar do mérito do pedido formulado pela recorrente , na sua petição inicial.”
Como decorre do aresto que vimos citando e continuaremos a seguir, tal questão tem a ver com a circunstância de, tendo a recorrente apresentado, tempestivamente, pedido de revisão da matéria colectável de IRC/00, na parte fixada por métodos indiciários, ao abrigo do art.º 91.º da LGT, a AF tenha procedido, antes da decisão desse mesmo procedimento, concretizado o acto tributário de liquidação derivado das correcções técnicas/aritméticas operadas sobre o mesmo exercício, quando o art.º 91.º/2 da LGT preceitua(va) que “O pedido” de revisão “(...) tem efeito suspensivo da liquidação do tributo.”
Ora , sendo esta factualidade incontrovertida , de acordo , aliás , com o vazado no probatório , temos por conclusivo que , à luz do que dispõem(unham) os art.ºs 86.º/2 e 91.º/2 da LGT , se verifica a violação do ordenamento jurídico , de forma que inquina , necessariamente , de anulabilidade o acto tributário impugnado , nos termos do Ac. do STA citado pela recorrente , e para o qual se remete enquanto discurso fundamentador , e onde , a dado passo e com aproveitamento ao caso dos autos , se pode ler:
«Se tal conduta» , ou seja a liquidação na pendência de reclamação com efeito suspensivo daquela «era ilegal não passa a ser legal por , a posteriori , se concluir que o montante a pagar seria o mesmo. Ora , nos termos da lei ,a reclamação era obrigatória e condição necessária de impugnação , tendo efeito suspensivo expressamente consignado , aliás em contrário da regra geral da inexistência de tal efeito. Se era assim , não podia a administração fiscal efectuar a liquidação antes de estar decidida a reclamação por só então estar fixada a matéria colectável.»
E não se fale da impossibilidade da suspensão da liquidação, no caso em análise, uma vez que quando tal acto tributário foi realizado (01.10.2003 – cfr. ponto 5 do probatório), ainda o pedido de revisão o qual só foi decidido em 12.11.2003 e culminou com nova liquidação efectuada em 30.12.2003( cfr. pontos 3 e 4 do probatório).
Como se salienta no acórdão que vimos citando, a sufragar-se, sem mais, tal posição poder-se-ia concluir que , para casos como o vertente , o disposto no art.º 91.º/2 da LGT , deixava de ter qualquer efeito útil.
De facto , na esteira do que aliás se aponta naquele citado Ac. de 2004DEZ15 , o que se visou foi a que a AT não pudesse proceder ao acto final de liquidação sem que antes a matéria colectável esteja fixada , no âmbito do procedimento gracioso , já que, a matéria colectável inicialmente fixada de que possa ter sido pedida revisão, não te , necessariamente de ser a que vier a resultar do procedimento de revisão , ou o que é o mesmo que dizer que , em boa verdade , antes da decisão de tal procedimento , quando deduzido , não existe , ainda , matéria colectável, até porque foi obtido acordo com base no qual a mesma foi alterada.
Donde que a hermenêutica correcta do art.º 91.º/2 , não possa ser outra que não a de que a AF , no caso de aplicação de avaliação indirecta , está legalmente inibida de proceder ao acto tributário de liquidação , enquanto não se mostre decidido o pedido de revisão que possa ter sido formulado ao abrigo do disposto nos art.ºs 91.º e segs..
E como já se viu, foi exactamente isso o que sucedeu no caso dos autos, em clara violação do comando contido no n.º 2 do art.º 91.º da LGT, nos supra citados termos, a liquidação impugnada.
Acresce que tendo a matéria colectável sido apurada também por métodos indiciários e tendo o contribuinte pedido a sua revisão, não podia a administração fiscal efectivar a liquidação antes de decidida esse procedimento já que aquela, nos termos dos artigos 86º nº 3 da LGT, era condição necessária para a impugnação e tinha efeito suspensivo por injunção do artº 91º nº 2 da mesma lei.
Prescrevia o artigo 86º nº 3 da LGT, que: “A avaliação indirecta não é susceptível de impugnação contenciosa directa, salvo quando não dê origem a qualquer liquidação” o que significa que era condição de impugnabilidade o pedido de revisão p. no artº 92º cujo nº 2 prescrevia que o pedido de revisão tinha efeito suspensivo da liquidação do tributo.
Resulta meridianamente claro do teor dos normativos referidos que a liquidação não pode ser efectivada antes de ter sido decidida a revisão já que, sendo esta condição necessária para se poder impugnar e tendo ela efeito suspensivo da liquidação do tributo, não faria sentido que, ignorando tais preceitos, se fizesse desde logo a liquidação sem esperar pela decisão da mesma.
É que antes de ter sido tomada a decisão sobre o pedido de revisão, não podendo dar-se como assentes os resultados dos procedimentos inspectivos, integra preterição do dispositivo legal tanto na sua forma como na intencionalidade do sistema, não podendo por isso deixar “de ser identificada aqui um motivo de anulação do acto impugnado”.
E não se diga que é irrelevante tal ilegalidade por ter dado o mesmo resultado que daria se tivesse emergido directamente da decisão do pedido de revisão, relevando apenas para a contagem de juros de mora que fossem devidos.
Reitera-se que esse entendimento não é aceitável pois a apreciação da legalidade da actuação da administração fiscal deve reportar-se ao momento em que ela teve lugar e não aos resultados concretos que dela resultam.
Tal como se afirma no Acórdão do STA de 15-12-2004, tirado no Recurso nº 01079/04, ainda que domínio da vigência do CPT mas a revelar pertinência para esclarecimento do caso dos autos, "Se a conduta era ilegal não passa a ser legal por, a posteriori, se concluir que o montante a pagar seria o mesmo. Ora, nos termos da lei, a reclamação era obrigatória e condição necessária de impugnação, tendo efeito suspensivo expressamente consignado, aliás em contrário da regra geral da inexistência de tal efeito. Se era assim, não podia a administração fiscal efectuar a liquidação antes de estar decidida a reclamação por só então estar fixada a matéria colectável. Nem se diga que era a mesma que foi considerada e que se tratou de um pré-conhecimento da liquidação, como se faz na sentença, pois só posteriormente era possível saber qual a matéria colectável a ter em conta na liquidação. Não pode pois manter-se a sentença recorrida.”
Tal solução é também imposta pelo princípio da impugnação unitária de que, como diz a recorrente, o nº 2 do artº 91º da LGT é manifestação.
Como se expende no Acórdão do TCAS de 03/11/2004, no Recurso nº 150/04, cuja fundamentação vamos seguir, a lei considera a impugnabilidade de um acto cometido no procedimento que culmina com a liquidação que era o acto de "fixação definitiva do imposto".
Como escrevem Diogo Leite Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e J. Lopes de Sousa em anotação ao artigo 86° da LGT, no contencioso tributário vigora o principio da impugnação unitária - sublinhado nosso- nos termos do qual só há impugnação contenciosa do acto final do procedimento, que afecta imediatamente a esfera patrimonial do contribuinte, fixando a posição final da administração tributária perante este, definindo os seus direitos ou deveres.
No entanto, por vezes, a lei prevê a impugnabilidade contenciosa imediata de actos anteriores ao acto final do procedimento, que tem especial relevo para condicionar a decisão final.
Estes actos preparatórios da decisão final que são directa e imediatamente impugnáveis por via contenciosa assumem a natureza de actos destacáveis".
Na senda de tal doutrina, a discordância do contribuinte relativamente à fixação só na impugnação da liquidação poderá ser sus­citada. porque se trata de vício de um acto não destacável, inserido no procedimento que culmina com a liquidação. O princípio da impugnação unitária impõe que todos os vícios ocorridos ao longo do procedimento sejam denunciados na impugnação do seu acto terminal, salvo quando a lei destaque como autonomamente sindicável um acto intermédio. E já se demonstrou que a primeira liquidação sobre as correcções técnicas incidente sobre o mesmo exercício em que em parte foi aplicado o método indirecto não era autonomamente impugnável porque o nº 2 do artº 91ºda LGT o proibia.
Na verdade, é sabido que o objecto material da impugnação é o acto da liquidação, o acto tributário em sentido estrito (arts. 62°, n°l, al. a) do ETAF e art. 99a do CPPT) porque é esse o acto administrativo do qual resulta, com carácter definitivo e efeitos executórios, a declaração do direito do Estado a um determinado quantitativo pecuniário.
Nos termos legais, a impugnação desse acto pode ter como fundamento a incompetência, vício de forma, inexistência dos factos tributários ou qualquer outra ilegalidade (art. 99° do CPPT).
Mas, embora seja a liquidação o acto tributário nuclear, para efeitos de contencioso fiscal a lei dá, por vezes, relevância a certos actos pressupostos e actos preparatórios, lógica e cronologicamente antecedentes do acto tributário principal, isto é, da liquidação, pois que se trata de actos que têm por fim reconhecer ou qualificar situações jurídicas, com base nas quais se há-de praticar o acto tributário, constituindo, assim, questões prejudiciais deste; os actos preparatórios visam habilitar a autoridade competente, no processo gracioso onde são praticados, a proferir a decisão final - o acto tributário de liquidação.
Destes actos pressupostos, porque envolvem, na generalidade dos casos, a apreciação de questões prejudiciais do acto tributário, permite a lei, por vezes, que possam ser objecto de impugnabilidade autónoma (são, mesmo, caracterizados por alguma doutrina como actos destacáveis do processo administrativo de lançamento).
Todavia, a AT poderia proceder à determinação do lucro tributável tendo em conta que, conforme determina o n.° 2 do artigo 107.° da Constituição da República Portuguesa, "a tributação das empresas incidirá fundamentalmente sobre o seu rendimento real», sendo este o princípio que enforma a determinação da matéria colectável a qual, como decorre do artigo 17.° do CIRC, é, em regra, determinada com base na declaração do contribuinte, sem prejuízo do seu controlo pela Administração Fiscal que poderá reconstituir o resultado declarado pelo contribuinte quando não seja possível a comprovação e a quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria colectável, nas situações expressamente tipificadas no CIRC, com carácter excepcional.
O art° 55° do CIRC passou a permitir que na reclamação ou na impugnação da liquidação se invocassem quaisquer ilegalidades ou erros praticados na determinação do imposto, acabando com a anterior autonomização do acto de fixação do imposto para efeitos de recurso contencioso, passando o ataque a esse acto a ficar sujeito à regra geral da impugnação unitária.
Portanto, com esta alteração, o acto (até então configurado como destacável) de fixação do imposto deixou de poder ser autonomamente impugnável, com base em preterição de formalidades legais, passando, a partir daí, a ser impugnável apenas o próprio acto de liquidação, e podendo nessa impugnação invocar-se quaisquer ilegalidades ou erros praticados também no acto pressuposto da fixação.
Apesar de tudo, neste novo regime, se é seguro que o tribunal pode conhecer sempre das ilegalidades reconduzíveis à ofensa de ilegalidade vinculada como sejam as referentes à errada qualificação dos factos tributários, à sua inexistência, à incompetência, desvio de poder, preterição de formalidades legais, etc., (arts. 99° do CPT e 55° do CIRC) já não poderá conhecer da errónea quantificação da matéria colectável considerada na liquidação do imposto, apurada com recurso a métodos indiciários ou presunções, quando (cfr. arts 87° a 94° da LGT e 117° do CPPT) o contribuinte não tenha lançado mão de prévia reclamação. Em qualquer caso, tenha ou não havido reclamação, poder-se-á conhecer da veracidade dos factos imputados no método presuntivo para alcançar o imposto presumido e, consequentemente, conhecer da ilegalidade do acto de fixação por erro nos pressupostos de facto do acto. Trata-se de uma possibilidade que não é mais do que a demonstração da inveracidade do facto que serve de base à inacção presuntiva: a negação do facto conhecido que serve de firmação do facto desconhecido (art, 349° do CCivil) - cfr. ac. do TT 2a Instância, de 19/10/93, Rec. 61578.
Em suma: - vigorando o regime da impugnação unitária, só em sede de impugnação da liquidação sequente e consequente da fixação, é que poderiam ser alegados os vícios próprios do acto de fixação definitiva de todo o imposto em falta.
E, assim sendo, também sob pena de violação do princípio da impugnação unitária, não poderia a contribuinte impugnar autonomamente as correcções técnicas também efectuadas no acto tributário impugnado a para da avaliação indirecta.
Improcedem, pois, as conclusões sob análise.

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3. DECISÃO
Termos em que acordam os Juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela impugnante.
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Lisboa, 6/10/2010
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Lucas Martins) – Voto a decisão mas restringindo a fundamentação ao facto de se não ter lançado mão do procedimento de revisão, sendo certo que a AT se serviu de metodologia indiciária.