Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:325/08.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:04/04/2024
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRC.
ROYALTIES.
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA.
Sumário:As quantias pagas a entidade não residente pela prestação de serviços de assistência técnica, por não envolver nenhuma transferência de conhecimentos especializados, são tributáveis enquanto lucro da entidade beneficiária do rendimento
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais: Subsecção tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO
I- Relatório
A Administração Tributária e Aduaneira recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, proferida a fls. 271e ss. (numeração do processo em formato digital-sitaf), datada de 28/04/2017, na parte em que julgou procedente a impugnação judicial que a sociedade S……….. P………… - Serviços ……………….., LDA, deduziu sequência do indeferimento expresso da reclamação graciosa que apresentara contra o acto tributário de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) e de juros compensatórios do exercício de 2003, com o nº ……………….240, no valor global de 115.252,04.
Por decisão sumária de 28/02/2018, o Conselheiro Relator declarou o STA incompetente em razão da hierarquia para conhecer do objecto recurso, determinando a remessa dos autos ao TCA Sul.
Na sua alegação inserta a fls. 390 e ss. (numeração do processo em formato digital - sitaf), a recorrente formulou as conclusões seguintes:
I – Pelo elenco de razões acima arroladas, ressalve-se melhor e douto entendimento, infere-se que a sentença proferida pelo Tribunal “ad quo” caiu em erro, porquanto os factos dados como provados devem levar, na aplicação devida das normas substantivas, a solução diversa da sentenciada e portanto conduzir uma decisão diferente daquela adotada pelo Tribunal ad quo que falhou na interpretação do contrato junto aos autos, ou seja, na fixação do sentido e alcance juridicamente relevantes, onde deve ser procurado, não apenas o sentido de declarações negociais artificialmente isoladas do seu contexto negocial global, mas antes o discernir do sentido juridicamente relevante do complexo regulativo como um todo.
Como tal, somos levados a concluir pela existência de uma distorção na aplicação do direito de tal forma a que o decidido não corresponde à realidade normativa objeto de uma análise deficiente, levando a decisão recorrida a enfermar de error juris.
II – Desde logo, não estando o Tribunal vinculado à qualificação contratual dada pelas partes, a questão controvertida passa por dirimir se a remuneração dos serviços prestados a coberto do tal contrato, não deve ser qualificada como royalty ou redevance, constituindo, ao invés, rendimento de prestação de serviços, livre de imposto no país da fonte, nos termos da Convenção para evitar a dupla tributação celebrada entre Portugal e Espanha, este o Estado da residência do beneficiário dos pagamentos.
Pronuncia-se a sentença em crise no sentido de que estando perante rendimentos de prestação de serviços, sendo a beneficiária dos mesmos residente fiscal em Espanha, o accionamento do artigo 22.º da CDT implica a sua não tributação em Portugal, o que leva a concluir pela ilegalidade da liquidação impugnada e, consequentemente, pela sua anulação, tal como dos juros compensatórios respectivos.
III - No presente caso, como juridicamente relevante para a interpretação contratual seguimos o percurso traçado pela obra “Estudos em memória do Prof. Doutor J. L. SALDANHA SANCHES”, Vol. IV, no capítulo “Activos Intangíveis - Algumas Reflexões Contabilísticas e Fiscais”, onde se faz uma abordagem no sentido de que no direito Europeu … o Regulamento CE 1606/2002 estabelece uma remissão genérica para as Normas Internacionais de Contabilidade, publicadas pelo Internacional Accounting Standards Board. Mas a vigência de cada Standard em particular fica dependente de um acto da Comissão Europeia, que actua com base num parecer do Comité de Regulamentação Contabilística”, no qual têm assento os Estados-membros. Portanto… As normas internacionais de contabilidade emitidas pelo Internacional Accounting Standards Board transformam-se em normas legais pela intervenção de um acto legislativo europeu.”
IV - Neste conspecto, a interpretação a fazer deve recorrer não apenas às CDT mas também às normas internacionais de contabilidade (NIC), através das quais resulta que no instrumento contratual visado não está em causa uma simples prestação de serviços de assistência técnica mas a transmissão de uma experiência adquirida em que, uma das empresas fornece a outra, uma técnica de “comercialização” e saber fazer que, ela própria utiliza e que, comprovadamente, se mostra eficiente e eficaz face aos bons resultados produzidos.
V - Discorrendo, após leitura da decisão recorrida sobre aquilo que deve ser acolhido como um dos sentidos possíveis pelos quais Miguel Teixeira de Abreu, em “Fisco” refere que «… a tributação da assistência técnica em sede de royalties deve ser interpretada de uma forma restritiva, nela incluindo apenas a assistência técnica que tenha um carácter meramente subsidiário em relação ao objecto principal do contrato (que será a transmissão de know how) e que, ao mesmo tempo, seja prestada em íntima ligação com a transmissão de know how ou de outra realidade tributável em sede de royalties.”, é de concluir que tal se deve aos casos, como é o dos autos, nos quais o que o que se pretende por via contratual não será transmitir os serviços em si mesmos, mas antes os resultados que esses serviços podem proporcionar, possibilitando para tal a aquisição do know how necessário à tarefa da concretização, após o términus contratual.
VI – Ora, pela sentença recorrida não foi devidamente ponderado que sendo a “prestadora de serviços” e a recorrida sócias dedicadas à mesma actividade económica com o mesmo objecto empresarial, a exploração de todas as actividades relacionadas com a indústria de frio, designadamente a armazenagem, embalagem, rotulagem, logística, transporte e distribuição de produtos congelados e refrigerados, o que seria expectável através dessa prestação contratual pelo facto de uma das sociedades ainda que de modo indirecto gerir a outra, seria que, futuros benefícios económicos daí advenientes fossem incorporados e reconhecidos para que mutuamente deles se aproveitassem.
VII – Na verdade não está em causa uma simples prestação de serviços mas uma transmissão de experiência adquirida no sector de actividade, restringindo também o acesso de outras empresas a essa informação, como resulta do contrato. Ora o goodwill de uma empresa estará sempre relacionado com a capacidade de criação de lucros dessa empresa, a qual pode derivar de diversos vectores (v.g. superior capacidade de gestão; marketing e publicidade eficaz; localização estratégica).
Para isso, a SDF Ibérica dispunha de capacidade técnica, além dos recursos humanos qualificados, sendo patente que o contrato em causa visa a gestão do conhecimento e implementação de um projecto que tem ínsita a transmissão e partilha de determinado know how necessário para a sua execução no futuro.
Tal compreende a direcção jurídica e financeira, direcção informática, direcção de recursos humanos, direcção de exploração, direcção comercial e qualquer outro projecto não específico que pudesse ser necessário adoptar, tal como consta do contrato.
VIII – Os benefícios esperados seriam entre outros a redução dos custos com empregados directamente resultantes de levar o activo à sua condição de funcionamento e para tal teria necessariamente que existir, implícita, uma partilha de conhecimento, um processo para criação, captura, armazenamento, disseminação, uso e protecção desse conhecimento importante para a empresa. Ainda que outros benefícios existissem tais como a redução do pagamento de honorários daí resultantes; redução de custos de formação de pessoal.
Assim é inquestionável que estamos perante recursos intangíveis tais como conhecimentos científicos ou técnicos, concepção e implementação de novos processos ou sistemas, licenças, propriedade intelectual, conhecimento de mercado e marcas e, objectivos comerciais (incluindo nomes comerciais e títulos de publicações). Exemplos comuns de itens englobados nestes grupos que se encontram visados contratualmente são o software de computadores, franchises, relacionamentos com clientes ou fornecedores, fidelidade de clientes, quota de mercado e direitos de comercialização.
IX - As sociedades em causa, controlam esses benefícios, na medida em que o conhecimento dos mesmos está protegido por direitos legais tais como copyrights ou outros, estabelecidos por via contratual: a restrição de acordos ou deveres legais dos empregados de manter a confidencialidade, o que é patente sob a epígrafe confidencialidade na cláusula sexta do contrato em causa.
Ainda por via contratual a SDF Ibérica colocou as suas capacidades ao dispor da sócia SDF Portugal necessitada delas, nos termos da cláusula primeira do contrato. Ora esta assessoria prestada entre ambas as empresas, expressa por direitos contratuais (cláusulas quinta, sexta e sétima) e implicitamente protegida por direitos legais habilita-a a controlar e perceber benefícios económicos futuros.
X - Ou seja e como será de concluir, está em causa um goodwill gerado por via do contrato celebrado entre ambas as contraentes, cujo objectivo, a partilha desse goodwill, se destina a desenvolver o negócio como um todo, ponto sobre o qual a sentença não teceu qualquer consideração, ao que acresce não ter considerado o facto da noção de royalties incluir necessariamente serviços técnicos.
Tal é no entanto evidente quando se avalia a probabilidade da obtenção de benefícios por via de um valor acrescentado atribuível a essa colaboração entre ambas as entidades, na medida em que a primeira coloca à disposição da segunda um conjunto de recursos humanos altamente especializado a quem não compete executar tarefas, mas gerir o rumo da empresa, pôr em marcha um plano empresarial que adeqúe os recursos técnicos, financeiros e outros necessários à capacidade empresarial da entidade em causa para que esta se torne produtiva, aproveitando o facto de que as marcas, cabeçalhos, títulos de publicações, listas de clientes e outros itens podem ser substancialmente semelhantes entre ambas as empresas conforme exposto no ponto primeiro do contrato.
XI – O objecto do contrato em causa é a implementação de um projecto em que se encontra implícito o know-how que tem como intento a transmissão de técnicas preexistentes e não reveladas ao público, em si mesmo consideradas, na forma da cessão temporária ou definitiva de direitos, para que o adquirente as utilize por conta própria, em benefício de ambas as empresas e sem que o transmitente intervenha na aplicação da tecnologia cedida mas garanta o seu resultado. Tal inclui necessariamente serviços técnicos e, justifica o pagamento dos royalties.
XII - Como vem a propósito refira-se que há muito que o direito comercial faz a distinção entre os elementos essenciais do estabelecimento comercial, onde se inclui o aviamento. O “aviamento” significa o conjunto de elementos que caracterizam um estabelecimento comercial e é o que se pode designar hoje por “goodwill”.
Na verdade, face à relação existente entre ambas as empresas a marca, o nome comercial, fórmulas, receitas e especialização tecnológica são similares, partilhadas por ambas as empresas e, tal valor reconhecido por ambas. Ora no caso das actividades contratadas estão não apenas em causa a assistência mas a implementação de projectos e modelos, a conceção de ferramentas, utensílios, moldes e suportes envolvendo nova tecnologia a conceção, ou uma escolha para materiais, aparelhos, produtos, processos, sistemas ou serviços novos ou melhorados.
Ou seja, estamos perante um plano que inclui os recursos técnicos, financeiros e outros necessários e a capacidade da entidade para assegurar esses recursos, ficando as marcas, cabeçalhos, títulos de publicações, listas de clientes e itens substancialmente semelhantes gerados e transmitidos protegidos por cláusulas de confidencialidade, tal como resulta do teor das mesmas, apesar de a informação transmitida relativa às práticas adoptadas e a adoptar pelas contratantes ser à partida controlada por ambas.
Como se conclui, a definição de redevances compreende a partilha de “informações respeitantes a uma experiência adquirida no domínio industrial, comercial, ou científico”, o que é patente no contrato subjudice, que acorda o direito de uso de um serviço que não se confunde com a prestação resultante do contrato de prestação de serviços, consistindo antes numa transmissão mediante certo preço de um determinado conhecimento, de um transmitir do saber fazer ou da experiência adquirida, tal como resulta do art.º 12.º da Convenção Modelo da OCDE.

Pugna pela revogação da sentença e sua substituição por decisão que julgue improcedente a impugnação.

X
A sociedade recorrida, S…………. P……………L, Serviços …………………………, LDA, apresentou contra-alegações (requerimento de fls. 411 e ss. numeração do processo em formato digital – sitaf), expendendo conclusivamente o seguinte:
A. O Recurso apresentado pela recorrente põe em causa a Sentença proferida no dia 28 de Abril de 2017, pelo Tribunal Tributário de Lisboa, no âmbito do processo n.°325/08.7BELRS, que julgou verificada a inutilidade superveniente parcial da lide, quanto à parte de imposto e juros compensatórios anulados na pendência do processo de Impugnação Judicial, e procedente quanto ao demais imposto e juros compensatórios liquidados, determinando a anulação dos actos de liquidação do IRC e juros compensatórios, n.° ……………………..240, de 12 de Janeiro de 2006, respeitante ao exercício de 2003, e a restituição do remanescente do montante de imposto e dos juros compensatórios pagos indevidamente e o pagamento dos juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido até à data de emissão na nota de crédito para integral pagamento;
B. Entende a recorrente que a Sentença em análise falhou na interpretação do contrato, quanto à fixação do sentido e alcance juridicamente relevantes, onde deve ser procurado, não apenas o sentido de declarações negociais artificialmente isoladas do seu contexto negociai global, mas antes o discernir do sentido juridicamente relevante do complexo regulativo como um todo;
C. O presente Recurso configura uma tentativa de a recorrente melhorar e acrescentar fundamentação, a posteriori, referente ao acto de liquidação adicional, tecendo considerações e invocando fundamentos que extravasam o objecto do recurso - erro na apreciação dos factos face ao contexto jurídico do caso em apreço por parte do Tribunal de primeira instância -, não pondo, verdadeiramente, em causa o entendimento do Tribunal a quo vertido Sentença;
D. Por via do recurso jurisdicional, a Administração tributária invoca, a posteriori, razões adicionais para considerar que, no presente caso, a entidade não-residente auferiu rendimentos de royalties, logrando fazer, agora, uma apreciação quanto ao conteúdo do contrato e quanto à forma de retribuição convencionada pelas partes - algo que não logrou fazer nos termos do Relatório de Inspecção Tributária;
E. A Administração tributária não faz, também, qualquer exame crítico às provas que suportaram a convicção do Tribunal, por forma a permitir à recorrida e ao Tribunal de recurso aceder aos motivos pelos quais entende que o processo lógico ou racional que subjaz à formação da convicção do julgador está, de facto, errado;
F. As Alegações e respectivas conclusões apresentadas pela recorrente logram tecer considerações jurídicas e conceptuais sobre a natureza dos contractos de prestações de serviços e contractos de aquisição de know-how e respectivas finalidades de cada um, sem, no entanto, apontar vícios estruturantes de avaliação e/ou erros de facto ou de Direito, suscetíveis de alterarem o sentido da Sentença proferida pelo Tribunal a quo;
G. O Tribunal a quo não incorreu, porém, em qualquer erro de apreciação do contrato em face do contexto factual e do contexto jurídico do caso em apreço, na medida em que faz uma clara distinção sobre as duas figuras contratuais, considerando que, no caso em apreço, os rendimentos respeitavam ao pagamento dos serviços prestados e que se reconduziam a assessoria e apoio na direcção e planeamento dos objectivos e estratégias da empresa, a assessoria e apoio em assuntos jurídicos, fiscais e financeiros, incluindo negociação de financiamentos, a assessoria e apoio na área informática e telecomunicações, a assessoria e apoio na área comercial, gestão de transportes, sistemas de armazenagem e distribuição, não podiam ser qualificados como royalties, antes como luco da entidade não residente;
H. O entendimento do Tribunal a quo baseia-se na apreciação crítica das provas apresentadas pela ora recorrida, quer documentais quer testemunhais;
I. No contexto da sua decisão, o Tribunal a quo afastou (bem) o entendimento segundo o qual o contrato em apreço não visava a transmissão de know-how de uma sociedade para a outra, “(...)uma vez que, em vista dos considerandos doutrinais acima traçados, o que se visa remunerar não é a transferência de know how, nem uma actividade de prestação de serviços subsidiários ou complementares em ordem à operacionalidade de tecnologia porventura contratualmente transferida (contrato de assistência técnica), mas apenas providenciar à impugnante um acervo de serviços de aconselhamento em várias áreas, ou seja, de verdadeira prestação de serviços, a venda do serviço em si mesma considerada que não visa nem a operacionalidade de qualquer tecnologia contratualmente transferida, nem a transferência de savoir-faire relativamente a tai tecnologia, ou informações adquiridas no sector comercial.”;
J. O entendimento da recorrente não corresponde, em momento algum, à realidade dos factos levados a conhecer ao Tribunal a quo e por este dados por provados, na medida em que, como demonstrado pelas testemunhas arroladas no processo, a sociedade espanhola (a S……….. Ibérica, S.A.) funcionava como uma central de apoio a todas as áreas de actividade das sociedades pertencentes ao grupo, esgotando o seu desempenho na assessoria técnica das várias empresas que necessitavam de auxílio nas diversas áreas de actividade;
K. Tal como demonstrado e dado como provado pelo Tribunal a quo, este contrato esgota-se no fornecimento de um conjunto de serviços (à ora recorrida) de aconselhamento em várias áreas, aliás bastante comuns, de forma continuada e recorrente, sem qualquer objectivo de colocar a recorrida em posição de se substituir ao prestador de serviços na realização das actividades consubstanciadas nesses mesmos serviços, por via de uma qualquer transferência de know-how para o efeito;
L. Não incorreu o Tribunal a quo em qualquer erro, na medida em que: não existe qualquer distorção na aplicação do Direito ao caso em apreço, os factos apresentados e provados, por prova testemunhal e prova documental, não deixam subsistir dúvidas de que o contrato em apreço visa a prestação de serviços de assessoria nas mais variadas áreas de actividade do Grupo, centralizados na sociedade de direito social espanhol, não existindo, aqui, qualquer tipo de declarações negociais artificiais que visam encobrir qualquer possível aquisição de know-how; e
M. O presente recurso deve ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida no ordenamento jurídico.

Pugna pela manutenção da sentença recorrida.

X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido do não provimento ao recurso.
X
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
X
II- Fundamentação
2.1. De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

A) Em 01.01.1996, Representantes da Impugnante e da sociedade de direito espanhol “S……….. I…………..”, assinaram o escrito denominado “Contrato de Prestação de Serviços”, mediante o qual a sociedade espanhola se comprometeu a prestar uma série de serviços administrativos, económico-financeiros, de recursos humanos, de gestão, de informática e serviços relacionados com a exploração do negócio, todos concretamente determinados no referido contrato, designadamente apoio em todos os assuntos legais e jurídicos, assistência na negociação com entidades financeiras para a obtenção de melhores condições de financiamento, comissões, seguros, determinando-se que os serviços prestados serão pagos pela empresa portuguesa em função das horas gastas em cada um dos serviços prestados e do pessoal empregue da sua realização, de acordo com a tabela de valores anexa ao contrato (cfr. fls. 117 a 130 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
B) Em 27.07.2005 a Impugnante enviou aos serviços de inspeção tributária, o Modelo 12-RFI certificado pelas autoridades fiscais espanholas, atestando a residência da beneficiária dos rendimentos naquele país, todos os valores pagos mensalmente à mesma pela Impugnante e a referência ao contrato mencionado na alínea antecedente (cfr. fls. 136 a 138 dos autos).
C) Em cumprimento da Ordem de Serviço nº OI200502439, de 08.03.2006, foi realizada ação de inspeção à Impugnante, com referência aos exercícios de 2002 a 2004, tendo em 16.12.2005 sido realizado o relatório final da ação com o seguinte teor:
“2 - OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA.
2.1 - OBJECTIVOS, ÂMBITO E DILIGÊNCIAS EFECTUADAS.
O Contribuinte, "S…………P…………. - SERVIÇOS ………………., LDA." – NIPC…………….., foi seleccionado através da ordem de serviço n.º OI 200502439, inserida no código PNAIT 221.22, a fim de se fiscalizar externamente os exercícios de 2002, 2003 e 2004 no âmbito parcial de imposto, mais concretamente, no que respeita à retenções na fonte relativos a pagamentos feitos a entidades não residentes.
De referir que a abertura da referida ordem de serviço, teve por base numa informação efectuada à empresa acima mencionada, no âmbito de um pedido de reembolso efectuado ao abrigo do D/L. 408/87.
Neste contexto e independentemente da abertura da ordem de serviço, foram solicitados elementos no sentido de esclarecer a natureza das operações subjacentes ao pagamento de verbas a não residentes, contabilizadas na conta 622369 - "Outros trabalhos especializados", bem como o contrato estipulado com a "S……….. – I………. SA.", tendo o contribuinte remetido elementos através da carta de 23/02/2005 e dos faxes de 03/03/2005 e 27/07/2005, (anexos 01, 02 e 03).
Após a análise dos respectivos elementos, comprovou-se a necessidade de abertura de uma ordem de serviço externa, tendo o contribuinte sido notificado da fiscalização através da carta aviso em anexo 04.
A fiscalização teve início a 08/11/2005.
3 - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS.
3.1 - Retenções na fonte a não residentes
De acordo com o âmbito da ordem de serviço, foram retiradas cópias de todas as facturas respeitantes a pagamentos efectuados a não residentes e contabilizados na conta 622369, bem como os balancetes analíticos de 31 de Dezembro de cada ano - (Anexo 05).
Conjugando os elementos constantes no contrato em anexo 01, com a cópia das facturas extraídas conjuntamente com o mapa de apoio, concluiu-se que as operações em causa representam prestações de serviços efectuados por não residentes, estando por isso sujeitos a imposto, ao abrigo do disposto no art.º 4.°, n.º 3, alínea 7 do CIRC., sendo a retenção obrigatória nos termos do art.º88.°, n.º 1, alínea g) do CIRC e o imposto apurado de carácter definitivo, de acordo com a alínea b) , n.º 3 do art.º 88.°, do mesmo diploma legal.
Relativamente à taxa prevista, a mesma é de 15% e vem regulada na alínea a), n.º 2 do art. 80.° do CIRC.
De referir que o contribuinte accionou os mecanismos com vista à aplicação da convenção com o objectivo de evitar a dupla tributação, (entre Portugal e Espanha), tendo solicitado somente à Agência Tributária da Administração Fiscal de Espanha, a 4 de Julho de 2005., por conseguinte muito posterior à data limite, conforme vem estipulado no artigo 90.°, n.ºs 2 e 3 do CIRC. (Anexo 03), não tendo remetido até ao termo da fiscalização, qualquer cópia do pedido à Administração Tributária Portuguesa.
Nestes termos e de acordo com o estipulado no n.º 4 do art.º 90.º do CIRC., o substituto tributário, neste caso a SDF - Portugal ficava obrigado a reter e a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei, ou seja, 15% sobre as importâncias atribuídas a SDF Ibérica.
Assim foram apurados os seguintes valores de imposto não retido e não entregue por períodos:
(…)
3.1.3. – Exercício de 2003


9 - DIREITO DA AUDIÇÃO – FUNDAMENTOS
O contribuinte exerceu o direito de audição, tendo enviado através de fax, (anexo 6) datado de 14/12/2005, os factos da sua contestação.
Relativamente aos fundamentos apresentados, há a salientar o seguinte:
a) - Não se depreende pela análise efectuada ao direito de audição, se o contribuinte invoca que a S……… - I…………, (sociedade espanhola, beneficiária dos rendimentos), é uma sociedade isenta total ou parcial, relativamente aos rendimentos atribuídos.
No entanto, caso fosse esse o facto, deveria fazer prova da respectiva isenção. Entende os serviços que a simples posse de um certificado de residência, que não foi apresentado à Administração Fiscal Portuguesa, mas somente presente à Inspecção aquando da fiscalização, não constitui elemento de prova desse facto.
Por outro lado, é entendimento dos serviços, que esses rendimentos são sujeitos à retenção, conforme vem referido no ponto 3.1 do relatório, pois tratam-se de pagamentos respeitantes a informações e serviços prestados por técnicos da empresa S…………. – I…………, à empresa S………. de P…………., podendo enquadrar-se como "Redevances".
b) - No que respeita aos rendimentos pagos em 2003 e 2004, invoca o contribuinte que além do certificado de residência, que é datado de 2005, (posterior à data de atribuição dos respectivos rendimentos), possui também os modelos 12 RFI, (datados de 04/07/2005).
De salientar também que esses modelos, nunca foram apresentados à Administração Fiscal Portuguesa, para o accionamento da Convenção, mas somente foram presentes à Inspecção Tributária, aquando da fiscalização em curso.
Nestes termos, não se encontravam reunidos os pressupostos necessários para se considerar que os respectivos pagamentos não estavam sujeitos à retenção na fonte, bem como a Sociedade S………..- Portugal, não accionou os mecanismos necessários para a aplicação da taxa prevista na Convenção.
10 - PROPOSTA FINAL
Tendo em conta de que o direito de audição prestado pelo contribuinte não veio alterar a posição inicialmente tomada pela Administração Fiscal, sou de opinião de que se deverão manter todas as correcções inicialmente propostas e identificadas no ponto 6 do relatório.
Pelas infracções verificadas, irá ser levantado o respectivo auto de notícia e preenchidos os Documentos Únicos de Correcção.” (cfr. fls. 155 a 160 do PAT, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
D) Em 12.01.2006 foi emitida em nome da Impugnante a liquidação de retenções na fonte – IRC, com o nº …………………..240, no montante total de 115.252,03€, sendo 105.265,59€ a título de imposto e o montante de 9.986,44€ a título de juros compensatórios (cfr. fls. 69 dos autos).
E) A “Demonstração de Liquidação de Juros Compensatórios” notificada à Impugnante identifica os valores base, as datas de início e de fim de contagem dos juros, a duração em dias, a taxa aplicada e o valor apurado (cfr. fls. 69 dos autos).
F) Em 26.04.2006 a Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação referida em F), a qual foi instaurada no Serviço de Finanças de Vila Franca de Xira 2 sob o nº……………358 (cfr. fls. 2 a 32 do processo de reclamação graciosa apenso ao PET).
G) Por despacho de 25.01.2008, do Diretor de Finanças Adjunto de Lisboa, foi a reclamação graciosa referida na alínea antecedente indeferida, constando da informação que serviu de fundamento ao indeferimento, designadamente o seguinte:
“(…) Parecer
1. Está em causa a qualificação dos rendimentos colocados à disposição da entidade residente no estrangeiro, que segundo a reclamante os mesmos configuram rendimentos resultantes de serviços de assessoria e apoio na direcção, assuntos jurídicos, fiscais, financeiros, informática, gestão de recursos humanos, área comercial entre outros, que revestem a natureza de lucros os quais não podem ser tributadas em território português, nos termos da CDT - E.
2. Por outro lado, a Administração Fiscal qualificou esses mesmos rendimentos, e bem, como Royalties - prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector comercial e científico (know-how), e por tal facto enquadrados nas normas acima referidas e sujeitos a uma taxa interna de 15%.
3. Isto porque, através das alegações da reclamante, bem como dos documentos apresentados, tanto em sede do procedimento de inspecção como agora em sede de reclamação graciosa, comprova-se que esses rendimentos que foram colocados à disposição da empresa estrangeira, se enquadram nas normas acima referidas, configurando-se como royalties.
4. Configuram o uso de informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico, de acordo com a parte final do n.° 3 do art.º 12° da CDT - E.
5. Isto é, a empresa Portuguesa (a reclamante) necessitou de apoio e assessoria de técnicos da empresa Espanhola, por um tempo limitado, para adquirir conhecimentos que não teria (Know How). Estes serviços são qualificados pela própria CDT - E como royalties.
6. Relativamente ao procedimento a adoptar para a aplicação da CDT - E, também a reclamante não procedeu correctamente.
(…)” (cfr. fls. 136 a 148 do processo de reclamação graciosa apenso ao PAT).
H) A Impugnante efetuou o pagamento da liquidação impugnada em 28.04.2006 (cfr. fls. 284 e 285 do PAT).
I) Todos os Serviços Centrais do “Grupo S……….” encontravam-se no ano de 2003 sediados em Madrid, prestando serviços a todas as delegações e sociedades que dependem do grupo, existindo apenas uma direção comercial, uma direção de recursos humanos, uma direção financeira, de entre as demais (prova testemunhal de J …………….. e P …………….).
J) Notificada em 01.02.2008 da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, a Impugnante apresentou a presente impugnação em 15.02.2008 (cfr. fls. 2 dos autos).
K) Por despacho do Diretor de Finanças Adjunto de Lisboa, proferido em 02.09.2008, no âmbito da apreciação administrativa da presente impugnação, foi a liquidação impugnada anulada parcialmente, na medida em que foi considerada acionada a CDT entre Portugal e Espanha, pelo que, mantendo a A.T. a consideração de que se está perante rendimentos de royalties, a taxa a aplicar é de 5%, tendo, assim, sido anulado o valor de imposto correspondente à parte dos 10% inicialmente liquidados, ou seja, 70.177,06€ (cfr. fls. 317 e 320 do PAT).
L) A Impugnante foi notificada da decisão referida na alínea antecedente por ofício de 03.09.2008 (cfr. fls. 318 do PAT). “

X
“Não foram provados outros factos com relevância para a decisão dos presentes autos.”
X
“Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos e ao PAT, referida a propósito de cada uma das alíneas do probatório. //A prova testemunhal produzida relevou para o facto dado como assente em I), designadamente pelo esclarecimento cabal, claro e coerente das relações estabelecidas entre a sociedade espanhola e a Impugnante, tendo como pano de fundo o contrato celebrado em 01.01.1996.”
X
2.2. De Direito.
2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento quanto ao enquadramento jurídico da causa em que terá incorrido a sentença sob recurso.
A sentença determinou a inutilidade superveniente parcial da lide, quanto à parte de imposto e juros compensatórios já anulados, e quanto ao demais imposto e juros compensatórios liquidados, determinou a anulação da liquidação de IRC-Retenções na fonte, com o nº 2006 6420000240, de 12.01.2006, respeitante ao exercício de 2003. Para assim proceder, estruturou, em síntese, a argumentação seguinte:
«Vertendo ao caso dos autos, partindo da análise do clausulado do contrato que suporta os pagamentos em causa, resulta que o mesmo tem por objeto a prestação de serviços consistentes, nos termos do seu artigo 1º, no fornecimento de apoio, ajuda, assessoria, manutenção, assistência, abrangendo, para além do mais, na área jurídica e financeira, a adequação da Impugnante a normas fiscais, a negociação com entidades financeiras para a obtenção de melhores condições de financiamento, análise financeira e previsional, contabilidade e fiscalidade; na área dos recursos humanos, a negociação coletiva e com trabalhadores, a vigilância e operacionalização das normas de segurança do trabalho; nas áreas informática e operacional, a manutenção de sistemas de comunicações e aplicações informáticas, (software e hardware), gestão informática de armazém e faturação; na área comercial, a assistência na negociação e cumprimento de contratos com clientes, etc.. // O conjunto dos serviços postos à disposição da Impugnante através do aludido contrato, remunerado através dos pagamentos aqui controvertidos, é de caracterizar, em nosso entender e sem margem para dúvidas, como sendo de verdadeiras prestações de serviços, uma vez que, em vista dos considerandos doutrinais acima traçados, o que se visa remunerar não é a transferência de know how, nem uma atividade de prestação de serviços subsidiários ou complementares em ordem à operacionalidade de tecnologia porventura contratualmente transferida (contrato de assistência técnica), mas apenas providenciar à Impugnante um acervo de serviços de aconselhamento em várias áreas, ou seja, de verdadeira prestação de serviços, a venda do serviço em si mesma considerada que não visa nem a operacionalidade de qualquer tecnologia contratualmente transferida, nem a transferência de savoir-faire relativamente a tal tecnologia, ou informações adquiridas no setor comercial. // (…) // Assim, a remuneração dos serviços prestados a coberto de tal contrato, isto é, de um contrato de prestação de serviços, não pode ser qualificada como royalty ou redevance, constituindo, ao invés, rendimento de prestação de serviços, livre de imposto no país da fonte, nos termos do artigo 22º da Convenção para evitar a dupla tributação celebrada entre Portugal e a Espanha, que é o Estado da residência do beneficiário dos pagamentos».

2.2.2. A recorrente censura o veredicto que fez vencimento na instância, assacando-lhe erro de julgamento quanto à apreciação da matéria de facto e quanto ao enquadramento jurídico da causa.
Apreciação. Está em causa correcção relativa à não aceitação da dispensa de retenção na fonte por conta do IRC (2003), aquando do pagamento de rendimentos à entidade beneficiária, não residente em território português.
Concretamente, no relatório inspectivo (1) refere-se o seguinte:
a) - Não se depreende pela análise efectuada ao direito de audição, se o contribuinte invoca que a SDF - Ibérica, (sociedade espanhola, beneficiária dos rendimentos), é uma sociedade isenta total ou parcial, relativamente aos rendimentos atribuídos.
No entanto, caso fosse esse o facto, deveria fazer prova da respectiva isenção. Entende os serviços que a simples posse de um certificado de residência, que não foi apresentado à Administração Fiscal Portuguesa, mas somente presente à Inspecção aquando da fiscalização, não constitui elemento de prova desse facto.
Por outro lado, é entendimento dos serviços, que esses rendimentos são sujeitos à retenção, conforme vem referido no ponto 3.1 do relatório, pois tratam-se de pagamentos respeitantes a informações e serviços prestados por técnicos da empresa S………- I………….., à empresa S………. de ………., podendo enquadrar-se como "Redevances".
b) - No que respeita aos rendimentos pagos em 2003 e 2004, invoca o contribuinte que além do certificado de residência, que é datado de 2005, (posterior à data de atribuição dos respectivos rendimentos), possui também os modelos 12 RFI, (datados de 04/07/2005).
De salientar também que esses modelos, nunca foram apresentados à Administração Fiscal Portuguesa, para o accionamento da Convenção, mas somente foram presentes à Inspecção Tributária, aquando da fiscalização em curso.
Nestes termos, não se encontravam reunidos os pressupostos necessários para se considerar que os respectivos pagamentos não estavam sujeitos à retenção na fonte, bem como a Sociedade S……….- P………., não accionou os mecanismos necessários para a aplicação da taxa prevista na Convenção.

Nos termos da cláusula 12.º/2, da CDT Portugal/Espanha(2) as «redevances podem ser igualmente tributadas no Estado Contratante de que provêm e de acordo com a legislação desse Estado, mas se a pessoa que receber as redevances for o seu beneficiário efectivo, o imposto assim estabelecido não poderá exceder 5% do montante bruto das redevances». Redevances «significa as retribuições de qualquer natureza pagas pelo uso ou pela concessão do uso de um direito de autor sobre uma obra literária, artística ou científica, incluindo os filmes cinematográficos, bem como os filmes ou gravações para transmissão pela rádio ou televisão, de uma patente, de uma marca de fabrico ou de comércio, de um desenho ou de um modelo, de um plano, de uma fórmula ou de um processo secretos, bem como pelo uso ou pela concessão do uso de um equipamento industrial, comercial ou científico e por informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico» (3).
Com vista à caracterização dos rendimentos em causa, seja pela sua integração na categoria de contrapartida pela transferência de informação tecnológica (Know how), seja na sua qualificação como contrapartida pela prestação de serviços técnicos (engineering), resultam do probatório os elementos seguintes:
i) Em 01.01.1996, Representantes da Impugnante e da sociedade de direito espanhol “S…….. I………….”, assinaram o escrito denominado “Contrato de Prestação de Serviços”, mediante o qual a sociedade espanhola se comprometeu a prestar uma série de serviços administrativos, económico-financeiros, de recursos humanos, de gestão, de informática e serviços relacionados com a exploração do negócio, todos concretamente determinados no referido contrato, designadamente apoio em todos os assuntos legais e jurídicos, assistência na negociação com entidades financeiras para a obtenção de melhores condições de financiamento, comissões, seguros, determinando-se que os serviços prestados serão pagos pela empresa portuguesa em função das horas gastas em cada um dos serviços prestados e do pessoal empregue da sua realização, de acordo com a tabela de valores anexa ao contrato (alínea A).
ii) Em 27.07.2005 a Impugnante enviou aos serviços de inspeção tributária, o Modelo 12-RFI certificado pelas autoridades fiscais espanholas, atestando a residência da beneficiária dos rendimentos naquele país, todos os valores pagos mensalmente à mesma pela Impugnante e a referência ao contrato mencionado na alínea antecedente (alínea B).
iii) Todos os Serviços Centrais do “Grupo S…….” encontravam-se no ano de 2003 sediados em Madrid, prestando serviços a todas as delegações e sociedades que dependem do grupo, existindo apenas uma direção comercial, uma direção de recursos humanos, uma direção financeira, de entre as demais (alínea I).

Para efeitos fiscais, a remuneração do know-how é um rendimento de capital, dado que retribui um capital tecnológico previamente acumulado que é posto à disposição do beneficiário; a remuneração da prestação de serviços não pessoais é o preço pela “venda” do serviço em si mesmo considerado e não retribuição de um “factor de produção”, de uma “tecnologia”, cuja transmissão não é em si objecto do contrato (4). Enquanto «a contraprestação nos contratos de know-how reveste a forma de um lump sum ou de uma percentagem da facturação, da produção ou do lucro, a contraprestação nos contratos de prestação de serviços de engineering é fixada essencialmente com base no custo demonstrado por critérios relativos ao trabalho desenvolvido, como o número de horas dispendidas» (5).
No caso em exame, seja do clausulado do contrato (no qual se estipula a prestação de serviços técnicos, sem transmissão de informação, mas com a intervenção directa do prestador e garantia, por este, de obtenção de resultados, junto do destinatário da prestação), seja pela forma acordada de remuneração (tempo despendido com a prestação de serviços e pessoal empregue), seja pela discriminação dos serviços prestados, cujo contrapartida é determinada de acordo com a tabela de valores anexa ao contrato, resulta a existência de elementos que reconduzem o rendimento em referência à contrapartida pela prestação de serviços técnicos e não a remuneração de capital tecnológico. É que não existe nas prestações em apreço qualquer transferência de informação tecnológica, que seja autonomizável, como tal, mas antes, a prestação de serviços de assistência técnica por parte da “S……….. I………….”.
De onde se extrai que os rendimentos em causa se subsumem no disposto no artigo 7.º da CDT Portugal/Espanha (“Lucros das empresas”) e não no disposto no artigo 12.º da CDT Portugal/Espanha (“Redevances”), pelo que a sua tributação pelo IRC português se encontra excluída em face do disposto no artigo 4.º/4, do CIRC.
A recorrente não põe em causa que a entidade beneficiária do rendimento tenha sede no estrangeiro. «Resulta da interpretação dos artigos 103 da CRP e 90 do CIRC que os formulários exigidos como prova da dispensa da retenção na fonte de IRC dos rendimentos auferidos por entidades não residentes são meros documentos ad probationem pelo que podem ser apresentados “a posteriori” dentro dos prazos legalmente fixados podendo ser substituídos nos termos do artigo 364.º n.º 2 do Código Civil». (6)
A este propósito, constituem pontos firmes os seguintes:
i) «Um contrato de know how tem como objeto a transmissão de tecnologias preexistentes e não reveladas ao público, em si mesmas consideradas, na forma da cessão temporária ou definitiva de direitos, para que o adquirente as utilize por conta própria, sem que o transmitente intervenha na aplicação da tecnologia cedida ou garanta o seu resultado. // Um contrato de know how não se confunde com um contrato de prestação de serviços em que o prestador utiliza o seu conhecimento para, designadamente, potenciar boas práticas por parte de quem adquire esse serviço. // Nos contratos de prestação de serviços técnicos o objeto é a prestação em si dos serviços, sem que haja qualquer prévia aquisição de tecnologia e/ou um objetivo de ensinar o adquirente a utilizar tal tecnologia» (7).
ii) «O contrato de know-how, tem por objecto «[a] transmissão de informações tecnológicas preexistentes e não reveladas ao público, em si mesmo consideradas, na forma da cessão temporária ou definitiva de direitos, para que o adquirente as utilize por conta própria, sem que o transmitente intervenha na aplicação da tecnologia cedida ou garanta o seu resultado» e «[a]o invés, o contrato de prestação de serviços tem por objeto a execução de serviços que pressupõem, por parte do prestador, uma tecnologia, a qual porém, não se destina a ser transmitida, mas meramente aplicada ao caso concreto mediante ideias, concepções e conselhos baseados num estudo pormenorizado de um projecto». (8)

Em síntese, uma vez demonstrada a sede no estrangeiro da entidade beneficiária do rendimento e comprovado o carácter remuneratório da prestação de serviços de carácter técnico de tal rendimento, forçoso se torna concluir, em face da CDT aplicável (9), que não existe obrigação de retenção na fonte nos termos pretendidos pela recorrente. O que implica que o acto tributário enferme de erro nos pressupostos de direito.
Ao decidir no sentido referido, a sentença sob recurso não merece censura, pelo que deve ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.


Dispositivo

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da subsecção do juízo comum da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)

(1ª. Adjunta- Maria Isabel Silva)
(2ª. Adjunta – Maria da Luz Cardoso)
(1) Ponto 9., Direito de audição, alínea C), do probatório.
(1) Aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 6/95, publicada no DR, 1ª Série-A, n.º 24, de 28/01/1995.
(1) Cláusula 12.ª/3, da CDT Portugal/Espanha.
(1) Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2ª Edição, Almedina, 2011, p. 699.
(1) Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, cit., p. 699.
(1) Acórdão do STA, de 07-09-2022, P. 03385/06.1BELSB. No mesmo sentido, v. Acórdão do STA, 14-11-2018, P. 0844/04.4BELSB 0934/17.
(1) Acórdão do TCAS, de 21/05/2020, P. 2078/05.1BELSB.
(1) Acórdão do TCAS, de 06-02-2020, P. 996/04.3BESNT
(1) CDT Portugal/Espanha, citada.