Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04520/08
Secção:CA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:10/10/2013
Relator:CRISTINA DOS SANTOS
Descritores:PROJECTOS DE ESPECIALIDADES – PROJECTO DE ARQUITECTURA
Sumário:1. Aprovado o projecto de arquitectura, os aspectos que ficam por resolver são apenas os referentes aos projectos de especialidades, relativamente aos quais as normas de cariz urbanístico, designadamente as constantes dos instrumentos de planeamento em vigor, já nada têm a dizer.

2. No tocante aos projectos de especialidades a redacção actual do artº 20º RJUE, ao contrário da anterior, não requer a emissão de aprovação camária mas tão só as necessárias pronúncias pelas entidades externas competentes de acordo com os regulamentos aplicáveis.


A Relatora,
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: ... , com os sinais nos autos, inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue:

1. A douta sentença recorrida decidiu que "os actos relativos à aprovação dos projectos das especialidades, bem como de aprovação do licenciamento, são posteriores à prolação do acórdão exequendo (...) e não podem, por isso, motivar a procedência/improcedência da mesma (...)" pelo que "nada há a executar, para cumprimento do acórdão exequendo" - cfr. texto n.° s l e 2;
2. O douto Acórdão exequendo do STA, de 2005.03.02, decidiu expressamente que efectivamente "o projecto de arquitectura do recorrente obtivera aprovação tácita em 28/1/95" pois “o despacho recorrido (...) haveria que reflectir a situação à data do despacho revogado, pois a nova definição que a sua vertente construtiva intentava estabelecer havia que erigir-se «in situ»" pelo que "concede(u) provimento ao recurso contencioso e (...) anul(ou) o despacho impugnado, emitido pelo Presidente da CM Cascais", em 1996.02.07 (v. Proc. 1140/04, da 3a Subsecção da 1a Secção)- cfr. texto n.° 2;
3. A douta sentença recorrida enferma assim de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente o caso julgado da referida decisão judicial exequenda (v. art. 205°/2 da CRP e arts. 671° e segs. do CPC; cfr. arts. 1° e 158° do CPTA) - cfr. texto nºs l a 3;
4. Em sede de execução de sentença anulatória, a Administração deve reconstituir a situação em que o particular estaria hoje se o acto ilegal nunca tivesse sido praticado, dando cumprimento aos deveres que entretanto não tenha cumprido com fundamento no acto anulado (v. art. 173° do CPTA) - cfr. texto n. ° s 4 e 5;
5. A reconstituição da situação actual hipotética em execução da decisão judicial que anulou o despacho do Senhor Presidente da CMC, de 1996.02.07, impõe a supressão dos efeitos do acto anulado, a eliminação dos actos consequentes do acto anulado e a prática dos actos e operações materiais necessários à reintegração da ordem jurídica violada, de modo a restabelecer a situação que o recorrente teria se o acto ilegal não tivesse sido praticado (v. arts. 20°, 205° e 268°/4 da CRP; cfr. arts. 173° e segs. do CPTA e arts. 5° e segs. do DL 256-A/77, de 17 de Junho)- cfr. texto nºs.5 e 6
6. A entidade recorrida estava assim vinculada a reconhecer a verificação de todos os efeitos que se teriam produzido se o acto ilegal não tivesse sido praticado - maxime o deferimento tácito dos projectos apresentados - e a praticar todos os actos e operações necessários e adequados à reconstituição da situação hipotética actual do ora recorrente (v. arts. 173° e segs. do CPTA; cfr. 9°/2 do DL 256-A/77, de 17 de Junho; cfr. Simões de Oliveira, Meios Contenciosos Acessórios, in Contencioso Administrativo, Braga, 1986, p.p. 234) - cfr. texto nos. 5 e 6.
7. Os órgãos do Município de Cascais não executaram até à data a decisão judicial exequenda, não tendo sido invocada qualquer causa legítima de inexecução, no prazo legalmente estabelecido para esse efeito (v. arís. 163° e segs. do CPTA), pelo que a douta sentença recorrida nunca poderia julgar "improcedente a presente execução (...) bem como o pedido indemnizatório (...) absolvendo a executada dos pedidos" -cfr. texto n.° s 8 e 9;
8. A execução integral da decisão judicial exequenda implica, além do mais, a prática "com efeitos retroactivos, (de) um acto administrativo de sentido contrário ao anulado, que o substitua e sirva à reconstituição da situação actual hipotética" - cfr. texto n.° 9;
9. A execução integral das decisões judiciais exequendas implica ainda o reconhecimento dos deferimentos tácitos das pretensões do exequente, bem como a aprovação dos projectos apresentados e o licenciamento da construção em causa, emitindo-se o respectivo alvará (v. art. 20°DL 445/91de 20 de Novembro; cfr. Ac. STA de 1999.05.11, Proc. 044735, www.dgsi.pt ) - cfr. texto
10. A execução integral das decisões judiciais exequendas implica ainda o pagamento de indemnização ao ora recorrente:
- Por todos os danos emergentes e lucros cessantes que o acto anulado lhe provocou e continua actualmente a provocar (v. art. 176°/3 do CPTA);
- Por todas as despesas que teve com a interposição do recurso contencioso (v. Ac. STA de 2007.04.24, Proc. 0138A/03, in www.dgsi.pt). no qual foi anulado o acto em análise - cfr. texto nºs 10 e 11.
11. A douta sentença recorrida enferma assim de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente o disposto nos arts. 20°, 22° e 205° da CRP, bem como nos arts. 163° e segs. e 176° do CPTA.

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O Executado contra-alegou, concluindo com segue:

1. O Senhor Vereador do Pelouro do Urbanismo da Câmara Municipal de Cascais em 13 de Outubro de 1995, indeferiu o pedido de aprovação do projecto de arquitectura e licenciamento da construção para o prédio do qual é proprietário o recorrente, por falta de infra-estruturas no local.
2. Em 27 de Fevereiro de 1996 o Senhor Presidente da Câmara de Cascais revogou por despacho, o acto de indeferimento praticado pelo Senhor Vereador do Pelouro Urbanismo da Câmara Municipal de Cascais, declarando a caducidade da aprovação do projecto de arquitectura e, em sequência, ordenou o arquivamento do respectivo processo camarário.
3. O acórdão exequendo veio a dar razão ao exequente, por considerar ter existido deferimento tácito do projecto de arquitectura, anulando o acto anteriormente praticado.
4. A aprovação do projecto de arquitectura é somente preparatória da decisão final de licenciamento, ou não.
5. A aprovação do referido projecto não implica o direito do exequente a ver a construção licenciada, como pretende com o presente recurso.
6. A anulação do acto do Senhor Presidente da Câmara Municipal de Cascais trouxe, somente, como obrigação a aceitação e apreciação dos projectos nas especialidades.
7. No entanto esclareça-se que, o prédio do recorrente situa-se numa zona classificada no PDM da Câmara como " Espaço Cultural e Natural de Nível l e Espaço Canal."
8. Como zona classificada não permite qualquer tipo de construção, como aquela em que se insere o prédio do recorrente, artigo 52° n° 3.1 do Regulamento do Plano Director Municipal.
9. Os actos que violem o Plano Director Municipal são nulos, por força do artigo 66° do DL n° 555/99 de 16 de Dezembro, na sua actual redacção.
10. O acto anulado restringiu-se à aprovação do projecto de arquitectura, tendo-se seguido a tramitação normal e legal, onde foram praticados outros actos distintos do acto anulado pelo acórdão exequendo, os quais podiam ou não ter habilitado o exequente à obtenção do licenciamento pretendido, bem como da emissão do respectivo alvará de construção.
11. Não há nada a executar para cumprimento do acórdão exequendo.
12. Quanto aos alegados prejuízos, o exequente não logrou prová-los, nem de facto nem de direito, pelo que, não existe qualquer direito indemnizatór io.


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Colhidos os vistos legais e entregues as competentes cópias aos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência.

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A sentença sob recurso é do teor que se transcreve, n parte julgada útil.

“(..)
A presente acção de execução visa executar o acórdão proferido, pelo STA, em 02.03.2005, que concedeu provimento ao recurso contencioso de anulação, e anulou o acto consubstanciado no despacho proferido pelo Presidente da Câmara Municipal de Cascais, o qual declarou a caducidade da aprovação de um projecto de arquitectura, apresentado pelo recorrente, e ordenou o arquivarneruo do respectivo processo de licenciamento de obras, conforme resulta do teor do acórdão citado, que aqui se dá por inteiramente reproduzido ; cfr. doc°. de fls. 145 a 159 dos autos de recurso contencioso, sob o nº 672/98, apensos aos presentes autosj.

- Da fundamentação de direito
Diz o exequente que o executado não arguiu qualquer causa deinexecução de sentença, com referência ao acórdão cuja execução é visada nos presentes atitos, o acórdão do STA, proferido em 2005.03.02.
E, assim é.
Na verdade, a alegação da verificação de causa de inxecução legitima, pelo executado, constitui defesa, por cautela, e considerando a hipótese da sentença a executar, incluir os actos de aprovação dos projectos das especialidades e do licenciamento da obra de construção, o que é dito claramente pelo executado, em sede de oposição.
Não obstante o suprareferido, importa, antes de mais, verificar e clarificar o objecto da presente execução de sentença, que restringe-se unicamente ao acto anulado pelo acórdão do S TA, o qual anulou o acto o acto consubstanciado no despacho proferido pelo Presidente da Câmara Municipal de Cascais, o qual declarou a caducidade da aprovação de um projecto de arquitectura, apresentado pelo exequente, e ordenou o arquivamento do respectivo processo de licenciamento de obras.
Vem o executado dizer que a sentença executada não abrange a aprovação dos projectos das especialidades, nem o do pedido de licenciamento das obras de construção.
Mais diz, que a anulação do acto, contido na sentença a executar, limitou-se a conferir validade e eficácia ao acto de aprovação do projecto de arquitectura, e constituiu o executado na obrigação de apreciar e decidir sobre o pedido de aprovação dos projectos das especialidades.
O exequente na réplica oferecida vem elencar vários actos, praticados pela CM Cascais, dos quais interpôs recurso contencioso de anulação, sendo tais actos obviamente estranhos ao objecto da presente execução.

A questão é a de saber quais os efeitos e âmbito de eficácia da anulação produzida na decisão a executar.
E, para isso, é preciso ter como presente que, em sede de licenciamento de obras de construção, são praticados vários actos administrativos, que se sucedem e se habilitam, entre si, isto é:
1° - A aprovação do projecto de arquitectura desencadeia o efeito da obrigação, para o autor do pedido de licenciamento, de apresentação dos projectos das especialidades, e para a entidade municipal a obrigação de os apreciar e deferir/indeferir;
2° - A aprovação do projecto de arquitectura, seguido da aprovação dos projectos das especialidades, desencadeia o dever legal de apreciar e decidir do pedido de licenciamento das obras de construção, e não antes;
3° - Após a aprovação do pedido de licenciamento e aprovada a licença de construção, e cumprimento dos requisitos legais aplicáveis, é emitido o alvará de licença de construção, que titula o acto de aprovação do pedido de licenciamento de obras de construção.
O supra expendido resulta claramente do regime legal aplicável, à data contido no DL 445/91, de 20.11., na redacção dada pelo DL 250/94, de 15.10, conforme resulta do disposto nos ait°s. 17°/l/2 (projecto de arquitectura); 17°-A (projectos das especialidades); 20°/l/3 (pedido de licenciamento e licença de construção); e 21º/1 (alvará de licença de construção], do aludido diploma legal.
O que aliás, ainda hoje se mantém, no regime actualmente em vigor, e designado por "regime jurídico da urbanização edificação", contido no DL 555/99, de 16.12., na redacção dada pelo DL 177/2001, de 4 de Junho.
Os actos relativos à aprovação dos projectos das especialidades, bem como de aprovação do licenciamento, são posteriores a prolação do acórdão exequendo, como claramente resulta quer da petição de execuçãof cfr. arr."s. 9° a 11° da petição de recurso), quer da réplica oferecida pelo exequente, o qual inclusive diz ter impugnado tais actos, os quais nada tem a ver com a presente execução, e não podem, por isso, motivar a procedência/improcedência da mesma, e o mesmo ser dirá par o pedido mdemnizatóno formulado.
O acto de aprovação de projecto de arquitectura é meramente preparatório da decisão final de licenciamento, que é ainda antecedida da aprovação dos projectos das especialidades, o que significa que o acto de licenciamento de obras de construção é de formação complexa, com a prática de actos consequentes e subsequentes - /um/uns motivam o/s seguinte/s -, que culmina com a emissão do alvará de licença de construção.
O acto anulado restringiu-se à aprovação do projecto de arquitectura, a que se seguiu a tramitação do processo de licenciamento municipal, onde foram praticados outros actos - distintos do acto anulado no acórdão exequendo -, os quais podiam, ou não, ter habilitado o exequente à obtenção não só do licenciamento pretendido, bem como da emissão do respectivo alvará de licença de construção.
Assim sendo, nada há a executar, para cumprimento do acórdão exequendo.

- Do pedido indemnizatótio
O exequente formula, ainda, a condenação do executado, em pedido mdemnizatóno, o qual mostra-se não fundamentado, quer de facto, quer de direito.
Na verdade, o exeqtiente alega, de forma genérica e imprecisa, o pedido indemnizatório, sem precisar os factos que o motivam, nem tão pouco o direito em que o alicerça.
E deste modo, o pedido mostra-se carecido de qualquer fundamento, com a sua consequente improcedência. (..)”.


DO DIREITO


O Acórdão exequendo de 2.3.2005 proferido no STA – constante a fls. 145 e ss. do processo apenso, rec. nº 1140704, 3ª Secção/STA, no TAC de Lisboa proº nº 672/1998 - anulou o despacho de 7.2.96 do Presidente da Câmara de Cascais na parte em que declarou a caducidade do acto de aprovação do projecto de arquitectura e ordenou o arquivamento do procedimento de licenciamento urbanístico requerido pelo ora Recorrente em 27.5.94 no processo camarário nº 4509/94 referente à construção de um moradia inserida, à data, em área não abrangida por PMOT nem alvará de loteamento.


1. reconstituição da situação actual hipotética


Cabe esclarecer que o acto administrativo de 7.2.96 opera em duas vertentes de efeitos jurídicos:
1. na vertente destrutiva de revogação do acto de 3.10.95 que indeferiu o pedido de licenciamento da operação urbanística de construção da moradia;
2. na vertente construtiva de reconhecimento da formação do deferimento tácito de aprovação do projecto de arquitectura, acto tácito operativo em 28.1.1995 e, simultâneamente, de declaração da caducidade do dito deferimento tácito por o interessado, ou seja, o ora Recorrente, não ter solicitado a aprovação dos projectos de especialidadades nos 180 dias a contar do deferimento tácito, ou seja, a contar de 28.1.1995.
No domínio do DL 445/91 de 20.11 com as alterações introduzidas em 1.1.85 pelo DL 250/94, como se explica no citado Acórdão exequendo.
Portanto em 7.2.96 a Administração declarou a caducidade do acto de aprovação do projecto de arquitectura decorrente de acto tácito de 28.1.95; o STA anulou o despacho de 7.2.96.
A caducidade declarada pelo Presidente da Câmara fundamentou-se na circunstância de o ora Exequente não ter solicitado a aprovação dos projectos de especialidades no prazo de 180 dias a contar de 28.1.1995.
Nos termos do artº 17º-A nºs. 1 e 4 do DL 445/91 na redacção do DL 250/94, conforme fundamentação de direito detalhadamente explicativa desta sucessão de regime urbanístico antes do RJUE, no Acórdão exequendo, concretamente a fls. 150 do apenso rec. nº 672/1998.

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Continuando com o Acórdão exequendo, a fls. 150 nele se explica que o prazo de 180 dias iniciado em 28.1.95 (artº 17º-A DL 445/91 ex vi DL 250/94; excluindo sábados e domingos - artº 72º CPA) ainda não tinha atingido o respectivo termo em 3.10.95 aquando do indeferimento do pedido de licenciamento, que por sua vez foi revogado em 7.2.96, como supra em 1.
Portanto, quando em 3.10.95 foi indeferido o pedido de licenciamento, ainda estava em curso o período de 180 dias (iniciado em 28.1.95) para apresentação dos projectos de especialidades.
O despacho de indeferimento de 3.10.95 cortou qualquer hipótese de o interessado e ora Recorrente, com eficácia jurídica no procedimento de licenciamento que acabara de ser declarado extinto, apresentar os projectos de especialidades em ordem a obstar ao efeito de caducidade previsto no artº 17º-A nº 4 do DL 445/91 na redacção do DL 250/94.
Exactamente por isso se diz a fls. 151 no Acórdão exequendo de 2.3.2005 proferido no STA:

“ … Nesta medida não é defensável que o dito prazo de 180 dias tenha continuado a correr depois de 3.10.95, por forma a qu, num qualquer momento ulterior, se pudesse concluir pelo seu completo esgotamento.
Mas, assim sendo torna-se evidente a ilegalidade do despacho contenciosamente recorrido. [7.2.96] Este não podia, após revogar o acto do Vereador, emitir uma pronúncia que pressuposesse que o prazo de 180 dias continuara em curso depois da prolação dele.
Ademais, sendo o despacho recorrido um acto sobre um acto [7.2.96 sobre 3.10.95], haveria de reflectir a situação existente à data do despacho revogado, pois a nova definição que a sua vertente construtiva intentava estabelecer, haveria de erigir-se “in situ”.
Ora, ao declarara uma caducidade, necessariamente reportada a 3.10.95, que na data em questão ainda não ocorrera, o acto acometido no recurso contencioso [7.2.96] ofendeu o dispoto no artº 17ºA nº 4 do DL 445/91.
E a sentença a quo, na medida em que denegou a existência desse vício, incorreu em erro de julgamento e deve ser revogada. …
Nestes termos acordam:
a) em conceder provimento ao presente recurso jurisdicional e em revogar a sentença recorrida;
b) em conceder provimento ao recurso contencioso e anular, pelos motivos expostos, o despacho impugnado emitido pelo Presidente da C.M. de Cascais em 7.2.96 …..”

Temos, portanto, que andar para trás no tempo e situar-nos “in situ” em ordem à reconstituição da situação actual hipotética por efeito da execução da sentença de anulação – cfr. artºs. 173º nº 1 ex vi 176º nº 1 CPTA.


2. aprovação do projecto de arquitectura; apresentação dos projectos de especialidades;


O que significa situar-nos no procedimento de licenciamemnto da moradia, processo camarário nº 4509/94 e retomar a tramitação à data da declaração de caducidade de 7.2.96, reportada a 3.10.95, declaracação de caducidade anulada pelo Acórdão do STA de 2.3.2005, com a consequência de repristinar a vertente construtiva de reconhecimento da formação do deferimento tácito de aprovação do projecto de arquitectura, acto tácito formado em 28.1.1995.
Consequentemente, o procedimento de licenciamento retoma a fase de tramitação prevista actualmente no RJUE quanto ao processo de licenciamento da operação urbanística em causa, mas no respeito pelos efeitos jurídicos produzidos pelo acto de aprovação do projecto de arquitectura.
Ou seja, aplicando o artº 20º nº 4, hoje artº 20º nº 5 do RJUE, que diz o seguinte:
“ – O interessado deve apresentar os projectos de engenharia das especialidades necessários à execução da obra no prazo deseis meses a contar da notificação do acto que aprovou o projecto de arquitectura.”

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Neste sentido, uma vez que se mostra aprovado o projecto de arquitectura mediante acto de deferimento tácito válido e eficaz formado em 28.1.1995 e atendendo a que se trata de um acto constitutivo de direitos no sentido a que as questões por ele apreciadas não voltem a ser questionadas no decurso do procedimento, tal significa que não poderá ser posto em causa por qualquer Plano Director Municipal que, porventura, tenha entrado em vigor posteriormente a 28.1.1995, configurando-se “(..) indiferente qualquer alteração normativa que se venha a verificar posteriormente, tanto mais que o momento em que se deve verificar a referida conformidade é precisamente o da apreciação do projecto de arquitectura. (..)” ( Fernanda Paula Oliveira, Maria José Castanheira Neves, Dulce Lopes, Fernanda Maçãs, Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, 3ª edição, Almedina/2011, pág. 287.)
Isto é, “(..) o acto que aprova o projecto de arquitectura pronuncia-se de uma forma definitiva sobre os aspectos de conteúdo urbanístico da operação a que dizem respeito, a ponto de, no prosseguimento do procedimento, tais aspectos não poderem voltar a ser questionados, quando sejam válidos. A conformidade do projecto com os planos é feita, de facto, no momento de apreciação do projecto de arquitectura, ficando assim, tal questão definitivamente decidida.
Os aspectos que ficam por resolver são apenas os referentes aos projectos de especialidades, relativamente aos quais as normas de cariz urbanístico, designadamente as constantes dos instrumentos de planeamento em vigor, já nada têm a dizer.
Aliás, actualmente estes não são, sequer, objecto de qualquer aprovação por parte da câmara municipal, sendo antes objecto de pronúncia (aprovação, certificação, etc.) por parte de entidades externas, e apresentadas pelo interessado, limitando-se a câmara municipal, para deferir o pedido de licenciamento, a confirmar esta pronúncia favorável.
Com efeito, ao contrário da redacção anterior do artigo 20º [do RJUE] que determinava deverem os interessados requerer a aprovação dos projectos de especialidade à câmara municipal num determinado prazo a contar da aprovação do projecto de arquitectura, a lei agora apenas se refere à necessidade de os mesmos serem apresentados dentro desse prazo. (..)
A aprovação do projecto de arquitectura é, pois, um acto administrativo prévio, na medida em que através dele, a Administração aprecia uma série de condições exigidas por lei que ficam, assim, definitivamente decididas, tornando-se, por isso, aquele acto, relativamente a estas, constitutivo de direitos (pelo menos do direito a que estas questões não voltem a ser postas em causa e discutidas no decurso do procedimento de licenciamento se aquela apreciação for válida) e sendo, também, por isso, vinculativo para a câmara municipal na deliberação final (..) em termos de o pedido apenas poder ser indeferido com base noutros motivos que não ponham em causa aquilo que já ficou decidido a propósito do projecto de arquitectura. (..)”. ( Fernanda Paula Oliveira, Loteamentos urbanos e dinâmica das normas de planeamento, Almedina/2009, págs. 144/145. )

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Aplicando a doutrina citada ao caso dos autos, verifica-se que não tem sustentação jurídica a invocada classificação da zona de implantação da moradia do ora Recorrente no Regulamento do PDM de Cascais como “Espaço cultural e natural de nível 1 (REN) e espaço canal” impeditiva da operação urbanística em causa, pelo Município de Cascais no articulado de contestação e nas contra-alegações de recurso e consequente alegação de incorrer em nulidade por violação do Plano, ex vi artº 68º a) do RJUE e 107º do RJIGT.
E ocorre ainda que no tocante aos projectos de especialidades entregues pelo ora Recorrente, o Município de Cascais nada diz no articulado de contestação, sendo certo que pelas razões de direito supra era sobre estes projectos de especialidades que a tramitação do procedimento de licenciamento teria de prosseguir nos exactos termos já referidos, isto é, não prevendo a lei a emissão de acto de aprovação dos projectos de especialidades pela Câmara mas tão só as necessárias pronúncias pelas entidades externas competentes de acordo com os regulamentos aplicáveis.
E sobre esta pronúncia das entidades externas envolvidas no domínio técnico dos projectos de engenharia nas especialidades em causa atendendo à concreta operação urbanística, nem o articulado inicial do ora Recorrente nem o articulado de contestação do Município de Cascais nada diz.

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De modo que, se por um lado o RJUE vigente não impõe a emissão de um acto de aprovação por parte de nenhum órgão camarário que tenha por objecto os projectos de especialidades, por outro, porque não foram carreados para o processo factos, nomeadamente factos documentados, não está o Tribunal em condições de concluir que os projectos de especialidades foram objecto de pronúncia pelas Entidades competentes e, nesse sentido, de modo a assumir, em juízo de certeza jurídica, de estarem preenchidos todos os pressupostos necessários à prática do acto de controlo prévio da operação urbanística, mediante o acto de deferimento do licenciamento nos termos do artº 26º RJUE, seguido da emissão do competente alvará na veste de acto integrativo de eficácia do acto que titula, o dito licenciamento que tem por isso, eficácia diferida, cfr. artºs. 74º nº 1 RJUE e 129º c) CPA, e que permite o desencadear dos trabalhos em concreto.
O mesmo é dizer que não está o processo devidamente instruído em ordem a permitir ao Tribunal ordenar ao órgão camarário competente, vd. artº 75º RJUE, a emissão do alvará respeitante ao licenciamento, como peticionado.
De modo que, por fundamentação distinta, nada há a censurar à decisão proferida pelo Tribunal a quo na medida em que não cumpre ordenar a emissão do acto de licenciamento nem, consequentemente, de emissão do alvará correpondente.
Neste sentido mostra-se prejudicado o conhecimento das demais questões trazidas a recurso no tocante à pretensão indemnizatória.


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Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar improcedente o recurso e confirmar a sentença proferida.

Custas a cargo do Recorrente.


Lisboa, 10.Out. 2013



(Cristina dos Santos) ……………………………………………………………………………


(António Vasconcelos) ………….………………………………………………………………


(Paulo Gouveia) ……….………………………………………………………………………..