Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 817/05.0BEALM-A |
| Secção: | CA |
| Data do Acordão: | 06/18/2020 |
| Relator: | CELESTINA CASTANHEIRA |
| Descritores: | EXECUÇÃO RESTITUIÇÃO DE LOTES ENCARGOS URBANÍSTICOS |
| Sumário: | I - A liquidação e cobrança de encargos exigidos pelo Município não podem de modo algum condicionar a restituição dos lotes nem a reconstituição da situação que existiria se os referidos atos não tivessem sido praticados. II - Sendo possível essa restituição no caso concreto, terá a decisão obrigatoriamente de recair nesse sentido, independentemente de quaisquer exigências. III - A execução do julgado não invalida a onerosidade da operação urbanística, que eventualmente possa ser devida, o que determina é que a restituição dos lotes não pode ser condicionada a pagamentos prévios. |
| Votação: | UNANIMIDADE |
| Aditamento: |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul Relatório: F... – Imobiliária e Turismo, Lda, autora na ação administrativa especial 817/05.0BEALM que propôs contra o Município de Almada, veio apresentar processo executivo, requerendo a condenação da entidade requerida a executar a sentença datada de 25 de janeiro de 2012, proferida no âmbito daquela ação. Por sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, foi decidido: a) julgar procedente a exceção da inadequação do meio processual relativamente ao pedido formulado na alínea d), do petitório, com os fundamentos invocados no artigo 70.°, alíneas a), b), e) e f), da Petição Executiva, e na Réplica, e aos pedidos formulados nas alíneas b) e e), do petitório e, consequentemente, absolver o Requerido da instância relativamente a estes pedidos; b) declarar a nulidade do despacho comunicado pelo ofício referido na Alínea F), dos Factos Assentes, na parte em que condiciona a restituição dos lotes números 9 e 21 a 25, ao pagamento de encargos urbanísticos; c) condenar o Requerido para, no prazo de trinta dias, restituir à Requerente os lotes números 9 e 21 a 25; d) condenar a Requerente e o Requerido em custas, em partes iguais, fixando a taxa de justiça em 4UC (artigos 527.°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil, e 7.°, n.° 4, do Regulamento das Custas Processuais). Não se conformando com tal decisão veio o Município de Almada interpor recurso para este TCAS. Deduziu o recorrente as suas alegações, tendo formulado as seguintes conclusões: I. A douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do direito aos factos, e por manifesta contradição entre os próprios fundamento e a decisão que afinal veio a ser proferida. II. Da sentença exequenda consta que antes da emissão do presente alvará de loteamento urbano deve efetuar o pagamento da taxa devida pela aplicação da alínea a) do n° 1 do artigo 90°, do RTTLP, aplicada à totalidade da área de pavimento permitida para os lotes que ficam na posse do requerente e que constam do quadro de loteamento, no total de 14.722 m2, como comparticipação na execução das infraestruturas básicas e equipamentos de interesse coletivo de apoio à zona. III. Em sede de execução de sentença o Município determinou que se promovessem as diligências e se praticassem os atos necessários à devolução dos lotes à requerente. Para o efeito procedeu à liquidação das taxas devidas e notificou a requerente para efetuar o respetivo pagamento; IV. A douta sentença recorrida embora considere que o município não se encontra impedido de liquidar e cobrar os encargos urbanísticos relativos aos lotes a devolver à requerente e que esta liquidação e cobrança não viola os limites do caso julgado acaba por concluir que o município não pode condicionar a transferência da propriedade dos lotes ao pagamento dos encargos urbanísticos; V. Esta conclusão assim como a decisão que afinal veio a ser proferida contradiz os seus próprios fundamentos. O que como se sabe importará a sua nulidade. VI. Efetivamente a sentença exequenda, apenas determina a restituição dos lotes à autora. Mas é evidente que essa restituição se terá que efetuar nos termos da lei. VII. O artigo 173° do CPTA consagra aplicáveis, tanto nos casos em que o impugnante opte por só fazer valer as pretensões que emergem da anulação em processo autónomo, a intentar após a procedência do processo impugnatório, como nos casos em que, logo no âmbito do próprio processo impugnatório, ele opte por cumular com o pedido de anulação pretensões dirigidas à imposição da prática dos atos e operações que a administração deve optar para reconstituir a situação que deveria existir se o ato ilegal não tivesse sido praticado. VIII. Pelo que no caso vertente, é, ao artigo 173°, que o juiz deve ir buscar os fundamentos da disciplina substantiva a aplicar. IX. O artigo 173°, n° 1, reconhece à sentença anulatória a existência de um efeito repristinatório ou mais amplamente, um efeito reconstitutivo à sentença que impõe na medida em que tal for necessário e possível, sem grave prejuízo para o interesse público, a reconstituição da situação que teria existido ou poderia ter existido, se não tivesse sido praticado o ato ilegal, ou se o ato tivesse sido praticado sem a ilegalidade. X. Na sentença exequenda foi declarada a nulidade da deliberação impugnada, na parte em que condicionava a aprovação do loteamento do prédio da F...- Imobiliária e Turismo, Lda., à cedência para o domínio privado do Município dos lotes 9 e 21 a 25, e a condenação da Câmara a restituir esses mesmos lotes. XI. A execução da sentença terá necessariamente que consistir na restituição dos lotes, porque possível, mas não só. XII. Como resulta da factualidade dada como provada, sobre os lotes, cuja restituição agora se impõe, não foram liquidados e consequentemente não foram cobradas taxas de urbanização devidas, porque os mesmos se destinavam ao domínio privado do município. XIII. A referência à situação de facto e de direito existentes à data em que foi proferida a deliberação na parte anulada, a reconstituição da situação que existiria sem o vício, impõe a restituição dos lotes assim como a liquidação e a cobrança dos encargos urbanísticos (taxas de urbanização) devidas na data, com os valores monetários corrigidos. XIV. Consistindo a execução da sentença na reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido praticado o ato ilegal, isto é, se o loteamento não tivesse sido aprovado com a obrigação de a requerente ceder para o domínio privado do Município aqueles lotes, os mesmos teriam ficado na posse da requerente, e sobre os mesmos teria o município liquidado o cobrado a referida taxa de urbanização. XV. Contrariamente ao decidido, não estamos perante a imposição de uma qualquer condição, mas perante a adoção de todos os atos e diligências necessárias e inerentes à execução daquela sentença. XVI. Pelo que ao decidir como decidiu a douta sentença recorrida violou entre outras disposições legais, o preceituado no artigo 173° do CPTA. XVII. De todo o modo, encontrando-se a autora obrigada ao pagamento das taxas devidas pela realização da operação urbanística, sempre assistira ao município o direito de retenção sobre os aludidos lotes de terreno, nos termos previstos no artigo 754° do Código Civil. Notificada a F... - IMOBILIÁRIA E TURISMO, LDA, esta veio apresentar as suas contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões: A – Das conclusões formuladas pela ora recorrente 1ª. As conclusões das alegações de recurso apresentadas pelo MA não integram qualquer individualização das questões ou resumo do corpo daquela peça processual, limitando-se à "reprodução integral e ipsis verbis do anteriormente alegado no corpo das alegações (...) equivalente à ausência de conclusões, que dá lugar à rejeição do recurso, nos termos do art. 641°, n° 2, al. b), (do) Novo CPC" (v. Ac. RC de 2015.11.10, Proc. 158/11.3TBSJP.C1; cfr. Ac. STJ de 2015.05.26, Proc. 1426/08.7TCSNT.L1.S1, in www.dgsi.pt) - cfr. texto n°s. 1 e 2; 2ª. O presente recurso deve assim ser rejeitado (v. art. 641°/2/b) do NCPC), pois as conclusões das alegações da recorrente não são "passíveis de despacho de aperfeiçoamento, como o não seriam «conclusões» que desenvolvessem o corpo das alegações" (v. Ac. RL de 2016.03.17, Proc. 147733/14.4YIPRT.L1-2, in www.dgsi.pt) - cfr. texto n°s. 2 e 3; B – Do efeito meramente devolutivo do presente recurso 3ª. Deve ser atribuído efeito meramente devolutivo ao presente recurso (v. arts. 143°/3 do CPTA e 160° do CPTA), dado que "a suspensão dos efeitos da sentença é passível de originar (...) a produção de prejuízos de difícil reparação para a parte vencedora" (v. Ac. TCA Sul de 2016.11.24, Proc. 919/16.7BELSB, in www.dgsi.pt). pois: a) Impede que lhe sejam de imediato “restituídos os lotes números 9 e 21 a 25", que a ora recorrida foi forçada a ceder gratuitamente à CMA, em 1998.11.11, “ou, se tal restituição não se mostrar possível, a entregar-lhe o correspondente valor em dinheiro", como foi determinado na sentença exequenda, de 2012.01.25, e na douta sentença recorrida, o que o MA aceita expressamente, ao afirmar que "a execução da sentença terá necessariamente que consistir na restituição dos lotes, porque possível" (v. conclusões VI e XI das alegações do MA); b) A restituição dos seis lotes de terreno para construção só após a decisão final do processo executivo provocará graves e extensos prejuízos à ora recorrida que passa actualmente por enormes dificuldades financeiras causadas pelos actos ilícitos praticados pelo MA desde há cerca de vinte anos e cuja nulidade foi declarada no presente processo, por decisão judicial transitada em julgado; c) O MA não é titular de qualquer “direito de retenção sobre os aludidos lotes de terreno, nos termos previstos no artigo 754° do Código Civil" (v. conclusão XVII), pois este normativo nunca seria aplicável in casu, dado que o alegado, mas inexistente, crédito de taxas urbanísticas invocado pelo MA não "resulta de despesas feitas por causa" dos lotes a entregar, nem "de danos por ele(s) causados" - cfr. texto n°. 4; C – Da inexistência de nulidades da sentença recorrida 4ª. A douta sentença recorrida não enferma de qualquer nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão (v. art. 615°/1/c) do NCPC: cfr. art. 1° do CPTA), pois assenta num discurso claro, lógico e coerente, tendo: a) "Declara(do) a nulidade do despacho (do Senhor Director do Departamento de Administração urbanística da CMA, de 2015.07.09), na parte em que condiciona a restituição dos lotes números 9 e 21 a 25, ao pagamento de encargos urbanísticos": e b) "Condena(do) o Requerido (a), no prazo de trinta dias, restituir ao Requerente os lotes números 9 e 21 a 25" - cfr. texto n°s. 5 a 7; 5ª. Estes segmentos decisórios assentam nos seguintes fundamentos precisos e claros: a) "O Município de Almada não pode condicionar a transferência da propriedade dos referidos lotes ao pagamento dos encargos urbanísticos liquidados": e b) "A sentença exequenda, transitada em julgado, constituiu o Município de Almada no dever de restituir os lotes em causa à ora Requerente independentemente da verificação de qualquer condição, pelo que não pode exigir o cumprimento de deveres ou fazer quaisquer exigências para proceder à restituição dos lotes" (v. fls. 52 da sentença) - cfr. texto n°. 7; 6ª. O ora recorrente pretende obter, por via oblíqua, marginal e lateral, a reapreciação ou a modificação do decidido na douta sentença exequenda que "conden(ou) o R. (Município de Almada) a restituir (os) lotes à A., ou, se tal restituição não se mostrar possível, a entregar-lhe o correspondente valor em dinheiro" (v. art. 613.º do NCPC; cfr. art. 1° do CPTA), o que é manifestamente inadmissível (v. Ac. STJ de 1996.11.12, Proc. 088420; cfr. Ac. RL de 2002.09.26, Proc. 0021696, ambos in www.dgsi.pt) - cfr. texto n°s. 7 e 8; D – Da não violação do art. 173.º do CPTA 7ª. A liquidação e cobrança dos encargos urbanísticos agora inovatoriamente exigidos pelo MA nunca poderia condicionar a restituição dos lotes em causa à ora recorrida, nem a reconstituição da situação que existiria se os referidos actos não tivessem sido praticados (v. art. 173° do CPTA), reeditando ilegalmente a discussão do objecto da decisão anulatória da sentença exequenda, de 2012.01.25 e violando frontalmente o postulado do caso julgado e os princípios da imutabilidade e intangibilidade das decisões judiciais (v. art. 205°/2 da CRP: cfr. Acs. STJ de 1990.05.03, BMJ 397/407; e Ac. RL de 1992.02.11, CJ 1992/1/98) - cfr. texto n°s. 9 a 11; 8ª. A imposição pela CMA dos referidos pagamentos integra a criação inconstitucional de verdadeiros impostos ou contribuições especiais não previstos na lei (v. art. 103° da CRP, arts. 4° e 13° da LGI, art. 161°/2/b) e k) do NCPA, art. 3° do RGTAL e art. 15°/2 da Lei 2/2007, de 15 de Janeiro), e a exigência do cumprimento de pretensas obrigações tributárias que, por se referirem a factos verificados há mais de dezassete anos, sempre teria ocorrido a caducidade da respectiva liquidação ou, pelo menos, a prescrição da respectiva dívida tributária (v. arts. 34º do CPT, 45° a 49° da LGI e 175° do CPPT - cfr. ainda art. 5º do DL 398/98, de 17 de Dezembro e art. 297°/1 do Cód. Civil) - cfr. texto n° 13; 9ª. Contrariamente ao invocado pelo MA, a douta sentença recorrida não violou o disposto no art. 173° do CPTA, ao declarar a nulidade do referido despacho, de 2015.07.09, face à manifesta ilegalidade da cobrança de novos encargos urbanísticos a F..., cuja liquidação nunca poderia condicionar a devolução à ora recorrida dos 6 lotes de terreno para construção ou do “correspondente valor em dinheiro" que a CMA foi condenada a restituir incondicionalmente pela douta sentença exequenda - cfr. texto n°s. 12 a 14. Notificado nos termos e para efeitos do disposto no art.º 146.º do CPTA, o Ministério Público junto deste Tribunal, não emitiu parecer. Considerando que a Recorrida F...-Imobiliário e Turismo, Ld.ª invocou, nas suas contra-alegações, questão suscetível de conduzir à rejeição do recurso, bem como impugnou a atribuição de efeito suspensivo ao vertente recurso, foi o Recorrente Município notificado para, querendo, e nos termos do preceituado nos art.ºs 654.º e 655.º do CPC, aplicável aos autos por força do disposto no art.ºs 140.º, n.º 3 e 143.º do CPC, emitir pronúncia no tocante às aludidas problemáticas. Veio o Município emitir pronúncia defendendo que devem as questões suscitadas pela recorrida nas suas contra-alegações ser julgadas improcedentes, prosseguindo o recurso a sua normal e legal tramitação, com o que se fará a costumada justiça. Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à Conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão. *** Delimitação do objeto de recurso: O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144.º, n.º 2, e 146.º, n.º 1, do CPTA e dos artigos 608.º, nº 2, 635.º, nºs. 4 e 5, e 639.º, do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do disposto no artigo 140.º, n.º 3, do CPTA. Importa aferir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do direito aos factos e se existe manifesta contradição entre os próprios fundamento e a decisão que a final veio a ser proferida e se viola o artigo 173.º do CPTA. *** Fundamentação: Os factos Para a decisão do recurso, importa considerar a seguinte matéria de facto fixada na sentença recorrida: A. Em 30 de Novembro de 2005, foi apresentada em juízo a petição inicial que originou a acção que correu termos neste Tribunal sob o n.° 817/05.0BEALM, proposta pela ora Requerente contra o Município de Almada, em que se pedia a declaração de nulidade das deliberações da Câmara Municipal de Almada de 16.07.1997, e de 07.10.1998, na parte em que condicionaram a aprovação do loteamento do prédio denominado “Casa do O...” ou “Quinta do O...” à cedência dos lotes 9, 21 a 25 e, em consequência, a condenação do Município de Almada a restituir à ora Requerente os referidos lotes ou, não sendo possível a restituição dos lotes, a pagar-lhe o valor correspondente em dinheiro, a liquidar em sede de execução de sentença (cf. fls. 1, e seguintes, da Acção n.° 817/05.0BEALM, que aqui se dão por integralmente reproduzidas). B. Esta acção n.° 817/05.0BEALM foi decidida pela sentença exequenda, proferida em 25 de Janeiro de 2012, que aqui se dá por integralmente reproduzida e da qual se extrai o seguinte: «(…) Fundamentação Vista a prova documental constante dos autos e considerando as posições assumidas pelas partes nos articulados, dão-se como provados os seguintes factos com interesse para a decisão: a) Em 23/06/1995, J..., requereu junto do R. o licenciamento do loteamento a concretizar no prédio rústico denominado “Casa do O...” ou “Quinta do O...”, com a área total de 29640 m², sito na freguesia de Sobreda, concelho de Almada, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Almada sob o n.º 2.../9... e inscrito na matriz predial rústica da freguesia da Caparica, sob o art.º n.º 3…, da Secção O - docs. n.ºs 6 e 7, juntos com a P.I.; b) (…) c) A A. é uma sociedade por quotas, que se dedica à realização de estudos empresariais, implementação de novas tecnologias, comércio internacional, indústria turística, gestão integrada de grandes unidades económicas, compra e venda de imóveis e a revenda dos adquiridos para esse fim - al. c) da matéria assente; d) Em 26/07/1996 a aqui autora adquiriu por escritura pública o prédio objecto do processo de loteamento - doc. 4 junto com a p.i. e doc. fls. 122 do P. A. apenso. e) Em 16/10/1996 a autora entregou ao R. um requerimento rectificativo ao processo administrativo de loteamento, tendo, entre o mais, junto “memória descritiva” com o seguinte teor: (…) f) Através da deliberação da Câmara Municipal de Almada de 16/07/1997, procedeu-se ao licenciamento do loteamento, tendo-se estabelecido, entre o mais, que: “(…)1 - É autorizada a constituição de 25 (vinte e cinco) lotes, designados de 1 a 25, destinados a habitação e possuindo estacionamento em cave, salientando-se que o lote n°9 com a área de 78m2, é incompleto sendo cedido para o Domínio Privado da Câmara o qual será completado por um lote a criar através da proposta de loteamento que venha a ser aprovado para a propriedade confinante a Sul-Nascente, L/322, de acordo com as; localização e características de ocupação indicadas na Planta de Síntese no total de 191 (cento e noventa e um) fogos, ficando 148 (cento e quarenta e oito) fogos na posse da requerente (lotes n°s 1 a 8 e 10 a 20) e os restantes 43 (quarenta e três) fogos, correspondentes aos lotes 9 (incompleto) e 21 a 25, para a Câmara. São ainda criadas as zonas de cedências designadas por; lotes 26, 27, 28, 29, 30 31, as parcelas “A” e “8” (destinadas à instalação de dois Postes de Transformação) e ainda a área destinada à protecção e implantação da Via-6. 1.1 - Verificando-se a existência de uma construção (art° 119 da respectiva Matriz da Freguesia da Caparica), cuja implantação se verifica principalmente, no local onde se situará o lote no 26, (cedência para Zona Juvenil - Campo Polivalente Com Apoios), acrescido da existência de inúmeros anexos e instalações de apoio à construção, disseminados pela totalidade da propriedade pelo que a aprovação do pedido de emissão do presente alvará de loteamento urbano, terá, obrigatoriamente, de ser antecedida pela verificação “in loco”, da total demolição das construções existentes no local. Se as referidas demolições não se tiverem efectuado, na totalidade, o pedido de aprovação do vertente alvará de loteamento urbano, será liminarmente indeferido. 1.2 - Constitui encargo do titular do alvará de loteamento, a total demolição das construções existentes no local, assim como o realojamento de todos os moradores. 2 - Cedências A requerente cede gratuitamente ao Município de Almada, livres de quaisquer ónus ou encargos, as áreas identificadas na Planta de Cedências e/ou de Síntese, nos momentos e com os usos que de seguida se explicitam: 2.1 - Domínio Público A requerente cede gratuitamente por abate efectuado sobre a área da propriedade, na ocasião do registo do presente alvará de loteamento, livres de qualquer ónus ou encargos, as áreas identificadas na planta de cedências e/ou síntese, destinadas aos seguintes fins: 2.2 - Domínio Privado da Câmara (dentro da propriedade) A requerente cede, antes ou em simultâneo com a emissão do presente alvará de loteamento, livres de qualquer ónus ou encargos, as áreas identificadas na planta de cedências e/ou síntese, destinadas aos seguintes fins: (destinado a construção, será, posteriormente, completado com a área de cedência que venha a ser efectuada pelo loteamento confinante a Sul-Nascente, L/322). 2.3 - As cedências que dizem respeito ao número anterior, tanto no Domínio Público como no Domínio Privado, terão de se efectuar considerando que as mesmas têm de se encontrar devidamente infraestruturadas e equipadas de acordo com os projectos de infraestruturas e de arranjos exteriores que venham a ser apresentados e aprovados pela Câmara, na fase do projecto L/O/759, respeitando os usos que são apontados nas peças de Loteamento, com a explicitação dos equipamentos e/ou mobiliário a instalar, como é o caso das diferentes Zonas Infantis e Juvenis. 3 - Ainda antes da emissão do presente alvará de loteamento urbano deve efectuar o pagamento da taxa devida pela aplicação da alínea a) do n° 1 do art. 90 do R.T.T.L.P., aplicada à totalidade da área de pavimento permitida para os lotes que ficam na posse do requerente e que consta no quadro de loteamento, no total de 14.722m2, como comparticipação na execução das infraestruturas, básicas e equipamento de interesse colectivo de apoio á zona. (…)” – cfr. doc. 1 junto com a P.I. (…) k) Através de despacho datado de 06/10/1998, foi decidido submeter a deliberação da Câmara Municipal de Almada, a proposta de alteração à deliberação de 16/07/1997, que havia aprovado o licenciamento do loteamento, com fundamento nas seguintes considerações: “(…) a) - Decorrente do facto de se terem concluído as demolições das construções existentes, que constituíam o prédio urbano existente, a propriedade passa a ser constituída por um prédio rústico, pelo que o ponto “A” da Deliberação de Câmara de 16/07/97, deverá ser substituído pelo seguinte: A - A propriedade que é objecto da presente proposta de loteamento urbano tem a seguinte composição; (…) b) - Decorrente meramente, da alteração da designação de alguns lotes e áreas a criar na presente operação de loteamento urbano mantendo-se as anteriores características (uso, área e forma decedência), acrescido do facto, de não se verificar a necessidade de ser criado um segundo lote P.T., tal como inicialmente se encontrava previsto, verifica-se que o ponto n° “1”, terá de ser substituído pelo seguinte: - É autorizada a constituição de 29 (vinte e nove) lotes, designados de 1 a 28 e lote PT, destes os lotes designados de 1 a 25, destinam-se a habitação em que todos possuem estacionamento em cave, salientando-se que o lote n°9 com a área de 78m2, é incompleto sendo cedido para o Domínio Privado da Câmara, e será completado por uma parcela a criar através da proposta de loteamento que venha a ser aprovado para a propriedade confinante a Sul-Nascente L1322, de acordo com as; localização e características de ocupação indicadas na Planta de Síntese no total de 191 (cento e noventa e um) fogos, ficando 148 (cento e quarenta e oito) fogos na posse da requerente (lotes nºs 1 a 8 e 10 a 20) e os restantes 43 (quarenta e três) fogos, correspondentes aos lotes 9 (incompleto) e 21 a 25, ficam na posse da Câmara. São ainda criadas as zonas de cedências designadas por; lotes 26, 27, 28 e lote P.T., destinado à instalação de Posto de Transformação, as zonas para a instalação de “Miradouro - Zona de Estadia”, “Zona Verde de Enquadramento”, Zona Verde Confinante ao Prédio objecto da Proposta de loteamento L1322” e ainda a “Área destinada à protecção e implantação da Via 6”. c) - Decorrente da verificação no local, da total e completa demolição das construções anteriormente existentes no local e que constituíam o artigo urbano com o n° 1… da respectiva Matriz da Freguesia da Caparica, verifica-se que os pontos “1.1” e “1.2”, do texto da Deliberação de Câmara de 16/07/97, devem ser anulados. d) - Decorrente unicamente das alterações ocorridas nas designações das áreas, lotes e parcelas a ceder à Câmara Municipal de Almada, os pontos “2.1” e “2.2”, da citada Deliberação de Câmara, devem ser substituídos pelos seguintes: 2.1 - Domínio Público A requerente cede gratuitamente por abate efectuado sobre a área da propriedade, na ocasião do registo do presente alvará de loteamento, livres de qualquer ónus ou encargos, as áreas identificadas na planta de cedências e/ou síntese, destinadas aos seguintes fins: 2.2 - Domínio Privado da Câmara (dentro da propriedade) A requerente cede, antes ou em simultâneo com a emissão do presente alvará de loteamento, livres de qualquer ónus ou encargos, as áreas identificadas na planta de cedências e/ou síntese, destinadas aos seguintes fins: e) - Decorrente do que se encontra previsto nas peças de projecto, constantes no projecto de infraestruturas e arranjos exteriores (L101759), e de acordo com as condições de aprovação do mesmo, no sentido de clarificar as opções que foram propostas pela equipe projectista e aceites pela Câmara, por força da aprovação do projecto de infraestruturas e arranjos exteriores (L/O/759) e que constam na peça de projecto “Planta de Pavimentos”, deverá ser acrescido o ponto “10.3-e”, referente ao capítulo 10.2 – “Rede Viária”, com o seguinte texto: 10.3-e - De acordo com as características dos arruamentos que são apresentados na presente proposta de loteamento urbano, com a finalidade de se efectuar a diferenciação entre as diversas utilizações dos mesmos, o pavimento da totalidade dos impasses “Impasse -1, 2, 3, e 4, será executado em calçada grossa, com cubos de vidraço de 11cm de aresta”. A ligação entre cada impasse e o arruamento confinante será executada mediante a colocação de um lancil em cantaria, efectuando um remate com a camada de desgaste do arruamento (tapete betuminoso). Decorrente do facto anteriormente apontado, a totalidade do pavimento dos estacionamentos previstos no exterior das construções, será igualmente realizado em “calçada grossa, com cubos de vidraço de 11cm de aresta” e a demarcação dos lugares de parqueamento, será executada em cubos de ganto. Finalmente, o atravessamento dos passeios, nas zonas onde se efectua o acesso das viaturas automóveis ao interior das construções (estacionamento em cave), efectuar-se-á, do mesmo modo com o pavimento realizado em “calçada grossa, com cubos de vidraço de 11cm de aresta”. As presentes alterações devem ser consideradas na aprovação do pedido de emissão do alvará de loteamento correspondente à presente operação de loteamento urbano (10/98)” – cfr. fls. 248 a 250 do P.A.; l) Em 07/10/1998, a Câmara Municipal deliberou proceder à alteração do texto da licença de operação de loteamento datada de 16/07/1997, de acordo com a proposta a que se refere a alínea anterior – cfr. doc. n.º 2 junto com a P.I.; m) A fls. 251 do P.A., encontra-se ofício n.º 12607/98, de 16/10/1998, dirigido à A., a dar-lhe conhecimento da deliberação de Câmara de 98/10/07, referente à alteração ao texto da licença de loteamento; n) Em 11/11/1998, a A. cedeu gratuitamente ao R. o lote 9 (incompleto), destinado a habitação e os lotes 21, 22, 23, 24, 25, destinados a habitação, o 26, destinado a equipamento 27, destinado a zona infantil – pequena e média mobilidade, 28, destinado a zona verde e de enquadramento, “lote PT”, destinado a posto de transformação – cfr. doc. n.º 6 junto com a P.I.; o) Os lotes cedidos foram registados a favor do Município e, os lotes n°s. 9 (incompleto), 21, 22, 23, 24 e 25 estão descritos na Conservatória do Registo Predial de Almada sob as fichas no. 2…/2…, 3…/2…, 3…/2…, 3…/2…, 3…/2… e 3…/2…, da freguesia da Sobreda- doc. 7 junto com a p.i.; p) Pelas inscrições G- 1, Aps. 25/2…, foi registada a “aquisição a favor do Município de Almada” dos prédios descritos sob as fichas n.ºs 2997/2… e 3009/2… a 3013/2…, da freguesia da Sobreda - doc. 7 junto com a p. i.; q) Em 11/11/1998, foi emitido o alvará de loteamento n.º 442, - através do qual é licenciado o loteamento L/759 e as respectivas obras de urbanização que incidem sobre o prédio rústico denominado Casa do O...…‖, onde, para além do mais, se declarou que em 04/11/98, havia sido pago o montante de 66.249.000$00, a título da taxa prevista na alínea a) do n.º 1 do art.º 90.º do RTTLP como comparticipação na execução das infra-estruturas básicas e equipamento de interesse colectivo; que em 27/07/1998 havia sido pago o montante de 994.250$00 nos SMAS, como comparticipação na construção da vala da Sobreda; que haviam sido entregues vários contentores para o lixo; que haviam sido entregues garantias bancárias, a título de caução de realização das obras de infra-estruturas gerais e arranjos de espaços exteriores e de execução da rede eléctrica de iluminação pública e de abastecimento domiciliária e de comparticipação no equipamento e construção do posto de transformação; que a ligação das infraestruturas internas do loteamento à rede de drenagem existente, era da responsabilidade da A., bem assim como a ligação das obras de execução da rede viária à Rua A... e à Rua do A…; que cabia à A. a execução e colocação das placas toponímicas nos arruamentos e da sinalização do trânsito. Estabeleceu-se ainda que: r) Em 31/10/2001, deu entrada no Tribunal Judicial de Almada, a P.I. de uma acção de condenação interposta pela A. contra o R., em que, com fundamento em dolo, erro sobre os motivos determinantes do negócio ou em coacção moral, pede que se proceda à anulação do contrato de cedência indicado na alínea anterior. Subsidiariamente, pediu que fosse declarada a resolução do mesmo contrato com fundamentação em alteração anormal das circunstâncias, ou, pelo menos, na verificação de condição resolutiva ou em enriquecimento sem causa. Pediu ainda que o R. fosse condenado a restituir à A. os lotes de terreno cedidos através do referido acordo – cfr. doc. de fls. 184; s) Através de sentença proferida no âmbito do processo n.º 881/01, o 3.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Almada, declarou improcedente o pedido, decisão essa que foi confirmada através de acórdão de 28/09/2004 do TRL e de acórdão de 07/04/2005, do STJ – cfr. docs. de fls. 117 a 144 dos autos; t) Os representantes da CMA e os seus técnicos informaram a A. que, caso a cedência não fosse realizada, aquela não se procederia à emissão do alvará - al. M) da matéria assente; u) Os técnicos do Município de Almada informaram a A. que, face ao processo de loteamento por ela apresentado e aprovado, a cedência dos lotes destinados a habitação era legalmente exigível - al. N) da matéria assente; v) A A. apenas cedeu ao R. os lotes de terreno destinados a habitação porque, sem tal cedência, o alvará não seria emitido – resposta ao quesito 1.º; w) A A. executou as infra-estruturas necessárias ao loteamento – resposta ao quesito 2.º; x) Os lotes cedidos ao Município foram em número superior ao exigido pela aplicação do Plano Director Municipal de Almada – resposta ao quesito 4.º; … Conclui-se, assim, que a cedência para o domínio privado do Município dos lotes acima indicados, violou o art.º 15.º e o n.ºs 2 e 4 do art.º 16.º do regime de loteamentos urbanos aprovado pelo DL n.º 448/91, de 29 de Novembro, por as cedências não terem sido efectuadas para o domínio público e, ainda, por uma parte dos lotes cedidos ter sido destinada a habitação e não para uma finalidade pública. Porque a exigência da cedência dos lotes destinados a habitação para o domínio privado do Município não encontra o mínimo assento em qualquer norma aplicável, entende-se que sai violado o núcleo essencial do direito de propriedade da A. sobre os mesmos, dado que e desde logo, importa a sua extinção na esfera jurídica da A. de uma forma discricionária. Por outro lado, sai violado o n.º 3 do art.º 94.º do RPDM de Almada, o que é sancionado com o desvalor da nulidade, nos termos do art.º 56.º, n.º 1, al. b) do regime de loteamentos urbanos aprovado pelo DL n.º 448/91, de 29 de Novembro. Quanto aos restantes vícios invocados pela A., entende-se que, como já referido, não há que os conhecer por apenas serem susceptíveis de, a existirem, serem sancionáveis com o desvalor da anulabilidade (art.º 135.º do CPA). Não demonstram os autos que exista qualquer impossibilidade de devolução das parcelas à A., pelo que tal pedido, face ao apontado vício das deliberações, terá de proceder. * Decisão Pelo exposto, declara-se a nulidade das deliberações impugnadas, na parte em que condicionaram a aprovação do loteamento do prédio da A. à cedência dos lotes números 9 e 21 a 25 para o domínio privado do Município e, por conseguinte, condena-se o R. a restituir tais lotes à A., ou, se tal restituição não se mostrar possível, a entregar-lhe o correspondente valor em dinheiro, a liquidar em execução de sentença.» (cf. documento junto com a Petição Executiva /fls. 659, e seguintes, da Acção n.º 817/05.0BEALM ). C. Não se conformando com esta sentença, o Município de Almada dela interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul, que foi rejeitado, por decisão sumária, proferida em 12 de Setembro de 2014, “por ser legalmente inadmissível, por falta de prévia reclamação para a conferência”, não tendo sido convolado para reclamação para a conferência por ter sido apresentado para além do prazo legal para a respectiva apresentação (cf. processado do Tribunal Central Administrativo de fls. 795, e seguintes, da Acção n.º 817/05.0BEALM). D. Não se conformando com esta decisão, o Município de Almada dela interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, que não foi admitido por da decisão sumária recorrida caber reclamação para a conferência e não recurso (cf. processado do Tribunal Central Administrativo de fls. 795, e seguintes, da Acção n.º 817/05.0BEALM). E. O despacho que não admitiu o recurso interposto pelo Município de Almada para o Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 20 de Novembro de 2014, foi notificado às partes por ofício de 24 de Novembro de 2014 (cf. processado do Tribunal Central Administrativo de fls. 795, e seguintes, da Acção n.º 817/05.0BEALM). F. Em 16 de Julho de 2015, a ora Requerente recebeu o Ofício da Direcção Municipal de Planeamento, Administração do Território e Obras do Município de Almada n.º3631/15, de 09 de Julho de 2015, que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual se extrai o seguinte: «Em execução da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, no processo melhor identificado em epígrafe, a que respeita o loteamento n.º 759/95 e o alvará de loteamento n.º 442/98, comunicamos a V. Exa o seguinte: - Que iremos proceder às diligências necessárias ao registo dos Lotes a que a mesma sentença se reporta, a favor da vossa empresa, junto da Conservatória do Registo Predial competente; - Que deverão proceder ao pagamento dos encargos urbanísticos abaixo indicados, no valor de 151.886,05 € (cento e cinquenta e um mil, oitocentos e oitenta e seis euros e cinca cêntimos) cuja forma de cálculo e fundamento constam de seguida - no prazo máximo de 30 dias, a contar da data de recepção deste ofício. São os seguintes os fundamentos e forma de cálculo dos dados encargos: Uma vez que a taxa correspondente ao Ponto 1 do Art.º 90º do Regulamento e Tabela de Taxas e Preços (RTTP) de 1998, suportada pelo urbanizador na fase de emissão do alvará de loteamento, não incluiu o valor correspondente os lotes então cedidos ao Município, foram agora calculadas as taxas relativas aos lotes números 9; 21, 22; 23; 24 e 25 com referência a este ano, em que foi emitido o alvará n.º 442/98. Os encargos urbanísticos devidos pela constituição destes lotes, são calculados nos seguintes termos: Aplicando o fator de correção monetária ao valor apurado (21.294.000 escudos), de acordo com a Portaria n.º 281/2014, de 30 dezembro, o valor atual dos encargos corresponde a 151.886,05€ (cento e cinquenta e um mil, oitocentos e oitenta e seis euros e cinco cêntimos). Por Delegação de Assinatura O Director de Departamento» (cf. documento junto com a Petição Executiva sob o n.º 11). *** O Direito Preliminarmente importa apreciar as questões colocadas nas contra-alegações, A Recorrida em sede de contra-alegações, argumenta que: “As conclusões das alegações apresentadas pelo ora recorrente não integram qualquer individualização das questões ou resumo do corpo daquela peça processual, limitando-se à reprodução integral e ipsis verbis do anteriormente alegado no corpo das alegações (….)” e conclui pedindo a rejeição do recurso, por considerar que as conclusões da recorrente não são passiveis de despacho de aperfeiçoamento e como tal considera ser evidente a ausência de conclusões. Não assiste razão à Entidade recorrida, porquanto como se poderá verificar pela consulta das mesmas, as conclusões aí referidas, não reproduzem integral e ipsis verbis os indicados pontos do texto. Sendo que, não importa se em sede de conclusões são repetidas frases ou até mesmo parágrafos utilizados no texto da motivação. O que importa em sede de conclusões, é que o recorrente enuncie resumidamente as razões pelas quais pretende ver revogada, modificada ou anulada a sentença recorrida. Dispõe o artigo 639.º, n.º 1 do CPC que o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Ora, o recorrente, serviu-se de algumas das frases utilizadas nas suas alegações, elencando as razões da sua discordância com a sentença recorrida, assim como as razões pelas quais entendia que a mesma deve ser modificada, bem como o sentido da modificação pretendida. Não subsistem dúvidas em como o recorrente apresentou as suas conclusões e que as mesmas respeitam todas as indicações prescritas na lei. Sendo que, a eventual falta de alguma destas indicações importaria o seu aperfeiçoamento, nunca a rejeição do recurso com fundamento na falta de conclusões. Veio ainda a recorrida impugnar o efeito do recurso, pretendendo que ao recurso seja atribuído efeito meramente devolutivo porque em seu entender o efeito suspensivo causa extensos e injustificados prejuízos. No despacho que admitiu o recurso o tribunal a quo fixou o efeito suspensivo ao recurso. Apreciando, dispõe o art. 143.º do CPTA, a propósito dos efeitos dos recursos, o seguinte: 1 - Salvo disposto em lei especial, os recursos ordinários têm efeito suspensivo da decisão recorrida. 2 - Para além de outros a que a lei reconheça tal efeito, são meramente devolutivos os recursos interpostos de: a) Intimações para proteção de direitos, liberdades e garantias; b) Decisões respeitantes a processos cautelares e respetivos incidentes; c) Decisões proferidas por antecipação do juízo sobre a causa principal no âmbito de processos cautelares, nos termos do artigo 121.º 3 - Quando a suspensão dos efeitos da sentença seja passível de originar situações de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação para a parte vencedora ou para os interesses, públicos ou privados, por ela prosseguidos, o recorrente, no requerimento de interposição de recurso, pode requerer que ao recurso seja atribuído efeito meramente devolutivo. 4 - Quando a atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso possa ser causadora de danos, o tribunal pode determinar a adoção de providências adequadas a evitar ou minorar esses danos e impor a prestação, pelo interessado, de garantia destinada a responder pelos mesmos. 5 - A atribuição de efeito meramente devolutivo ao recurso é recusada quando os danos que dela resultariam se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua não atribuição, sem que a lesão possa ser evitada ou atenuada pela adoção de providências adequadas a evitar ou minorar esses danos. Sendo que, a pedido da parte, o tribunal pode alterar o efeito-regra, de acordo com o previsto naqueles nºs 3, 4 e 5 artigo em análise. O que se pretende é que “o tribunal afaste o efeito suspensivo do recurso e lhe atribua um efeito meramente devolutivo, de modo a que, se a pretensão for deferida, a sentença passe a ser exequível e deva ser imediatamente cumprida pela parte vencida, não obstante a pendência do recurso” (cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4.ª ed., 2017, p. 1102). Como resulta dos autos, a recorrente não peticionou que ao recurso fosse atribuído efeito suspensivo, porque este é o efeito que resulta diretamente da lei. É verdade que o número 3 dessa mesma disposição legal refere que, quando a suspensão dos efeitos da sentença seja passível de originar situações de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação para a parte vencedora ou para os interesses, públicos ou privados, por ela prosseguidos, pode requerer que ao recurso seja atribuído efeito meramente devolutivo. Para o efeito terá o requerente, necessariamente, que alegar e provar factos que permitam ao Tribunal concluir que a suspensão dos efeitos da sentença é suscetível de dar origem a uma situação de facto consumado ou à produção de prejuízos de difícil reparação. Porém, a recorrida não alega e, consequentemente, não demonstra um único facto concreto, que permita ao tribunal aferir da verificação daqueles pressupostos para que ao recurso seja atribuído efeito meramente devolutivo, limitando-se a concluir que a suspensão da sentença lhe causará extensos e injustificados prejuízos. Considerando que a situação já decorre há muitos anos, poderá a recorrida em sede própria, questão que foi analisada e decidida na sentença recorrida, ser indemnizada dos alegados prejuízos. Pelo que, se mantem o efeito suspensivo fixado pelo tribunal a quo. *** Posto isto, considerada a factualidade fixada, importa, analisar os fundamentos do recurso jurisdicional. Entende a Recorrente, primeiramente, que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do direito aos factos e por manifesta contradição entre os próprios fundamentos e a decisão que veio a ser proferida. E, nesse sentido, que tal importará a sua nulidade (Conclusões I a V das suas alegações). Mais alega que a douta sentença viola o plasmado no n.º 1 do artigo 173.º, no que respeita ao seu efeito repristinatório, ou seja, com a decisão tomada, impunha-se a reconstituição da situação que teria existido ou poderia ter existido, se não tivesse sido praticado o ato ilegal, ou se o ato tivesse sido praticado sem a ilegalidade (Conclusões VI a XVI). Conclui as suas alegações solicitando a revogação da sentença recorrida na parte em que declarou a nulidade do despacho comunicado pelo ofício referido na alínea F) dos Factos Assentos, na parte em que condiciona a restituição dos lotes ao pagamento de encargos urbanísticos e consequentemente que condenou o município a restituir os lotes em 30 dias. A recorrida veio contra-alegar, pugnando pela manutenção do julgado. Vejamos então: Nas suas alegações, o ora recorrente veio arguir a nulidade da sentença recorrida, invocando que “a decisão que a final veio a ser proferida contradiz os seus próprios fundamentos” (v. conclusões I. a V.). Ora, desde já se diga, não enferma a sentença recorrida de qualquer nulidade (v. art. 615º/1/c) do NCPC). O art. 615º, n.º 1, alínea c) do CPC determina que é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”. Neste tipo de nulidade está essencialmente em causa “a congruência do dispositivo judicial com as respectivas premissas” pois “entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador segue determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decide noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição é causa de nulidade da sentença” (v. Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum, 2000). Sendo que, a jurisprudência e a doutrina têm pacificamente entendido que existe oposição entre a decisão e os fundamentos “quando a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue caminho oposto, ou pelo menos, direção diferente” existindo “contradição real entre os fundamentos e a decisão” (v. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, Manual de Processo Civil, 2ª ed., p.p. 689 e entre outros, o Ac. STJ de 2004.05.06, Proc. 04B1409). Na verdade, a sentença exequenda condenou o Município de Almada a restituir os lotes em causa à ali autora ou, na sua impossibilidade, a entregar-lhe o correspondente em dinheiro. Na fundamentação da referida decisão consta: “A sentença exequenda, transitada em julgado, constituiu o Município de Almada no dever de restituir os lotes em causa à ora Requerente independentemente da verificação de qualquer condição, pelo que não pode exigir o cumprimento de deveres ou fazer quaisquer exigências para proceder à restituição dos lotes”; “Sendo a restituição dos lotes possível (conforme o requerido reconheceu, desde logo, na notificação que dirigiu à Requerente para proceder ao pagamento dos encargos urbanísticos, onde refere que irá proceder às diligências necessárias ao registo dos lotes a que a sentença exequenda se reporta, a favor da Requerente, junto da Conservatória do Registo Predial competente – cfr. alínea F) dos Factos Assentes), a execução do julgado anulatório passa pela restituição à ora Requerente dos lotes em questão independentemente de quaisquer exigências” (v. fls. 52 da sentença). Assente nestes pressupostos, a sentença recorrida decidiu: a) “Declarar a nulidade do despacho (do Senhor Director do Departamento de Administração urbanística da CMA, de 2015.07.09), na parte em que condiciona a restituição dos lotes números 9 e 21 a 25, ao pagamento de encargos urbanísticos”; e b) “Condenar o Requerido (a), no prazo de trinta dias, restituir à Requerente os lotes números 9 e 21 a 25” (v. fls. 54 da sentença). O Tribunal a quo declarou assim a nulidade do referido ato administrativo e condenou o MA a restituir os lotes em causa, considerando congruente e logicamente que o despacho, de 2015.07.09, não poderia ter condicionado a restituição dos imóveis – já ordenada na sentença exequenda, com trânsito em julgado - ao pagamento dos encargos urbanísticos que invoca serem devidos, como fez. Assim sendo, não se verificam as contradições ou oposições agora invocadas pelo ora recorrente, pelo que improcede a alegada nulidade. Nas conclusões VI a XVII das suas alegações, o Município de Almada, vem invocar que a sentença recorrida viola o art. 173.º do CPTA, ao “declarar a nulidade do despacho (do Senhor Director do Departamento de Administração Urbanística da CMA, de 2015.07.09), na parte em que condiciona a restituição dos lotes números 9 e 21 a 25, ao pagamento de encargos urbanísticos”, defendendo que: “ A referência à situação de facto e de direito existente à data em que foi proferida a deliberação na parte anulada, a reconstituição da situação que existiria sem o vício, impõe a restituição dos lotes assim como a liquidação e a cobrança dos encargos urbanísticos (taxas de urbanização)” (v. conclusão XII). Ora, se a sentença exequenda, que se encontra devidamente transitada em julgado, obriga o Município de Almada a devolver os aludidos lotes à aqui recorrida e não estipulando quaisquer condições, não será certamente o próprio município que estipulará condições para o devido efeito. A recorrente invoca o n.º 1 do artigo 173.º do CPTA, que tem por epígrafe “Dever de executar” e que dispõe o seguinte: 1 - Sem prejuízo do eventual poder de praticar novo ato administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um ato administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento naquele ato, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter atuado. (…) No caso vertente, a liquidação e cobrança de encargos exigidos pelo Município não podem de modo algum condicionar a restituição dos lotes nem a reconstituição da situação que existiria se os referidos atos não tivessem sido praticados. E sendo possível essa restituição no caso concreto, terá a decisão obrigatoriamente de recair nesse sentido, independentemente de quaisquer exigências. Porque, caso assim, não fosse, estaríamos assim a violar o consagrado no caso julgado. Nesse sentido, veja-se o Acórdão do STA 02842/16.6BEPRT (0509/18) de 25-09-2019, que “(…) releva para a apreciação do recurso a distinção entre caso julgado material e caso julgado formal. As figuras jurídicas têm expressão normativa distinta: - transitada em julgado a sentença que aprecie o mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida configura caso julgado material, tendo força obrigatória dentro e fora do processo, sem prejuízo da sua alteração em consequência da procedência de recurso de revisão (art.619º nº1 CPC); - recaindo unicamente sobre a relação processual, a decisão constante da sentença tem força obrigatória restrita ao processo onde foi proferida, formando caso julgado formal (art.620º CPC) O caso julgado material exprime o efeito imperativo da sentença transitada em julgado que tenha apreciado a relação material controvertida (art.619º nº1 e 621º CPC vigente) A força do caso julgado material abrange, para além da decisão da questão expressamente submetida à apreciação do tribunal, a decisão das questões instrumentais que constituam o antecedente lógico necessário da parte dispositiva do julgado. O caso julgado cumpre uma dupla função: a) positiva, exercida pela autoridade do caso julgado que se traduz na sua força obrigatória dentro e fora do processo; b) negativa, manifestada na exceção dilatória do caso julgado que impede a reapreciação da mesma causa pelo tribunal Sobre a distinta autoridade e consequências jurídicas do caso julgado material e do caso julgado formal pronunciou-se a doutrina: A diferença está no seguinte: a) tratando-se de caso julgado meramente formal, a estabilidade é restrita ao processo respetivo; e por isso tudo se reduz ao fenómeno da preclusão; b) tratando-se de caso julgado material, a estabilidade ultrapassa as fronteiras do processo, produz-se a impossibilidade de a decisão ser alterada mesmo noutro processo. Por outras palavras: ao passo que o réu dispõe da exceção do caso julgado para obstar a que o caso julgado material seja desrespeitado noutro processo, e até o tribunal tem o dever de invocar oficiosamente esse caso julgado (…) para o efeito de recusar o conhecimento do mérito da causa, nada disto sucede no tocante ao caso julgado formal; este não tem força obrigatória fora do processo respetivo (…) e portanto nem vincula o juiz, nem pode ser alegado pelas partes em processo diferente daqueles em que foi proferido (v. Alberto dos Reis in Código de Processo Civil Anotado, Coimbra 1984 Volume V pp.157/158 ) Deste modo, o Tribunal ao aceitar que a aqui recorrente condicionasse a restituição dos lotes à recorrida mediante o pagamento dos encargos urbanísticos, estaria o violar o caso julgado anteriormente decidido no âmbito da sentença exequenda que não estipulou quaisquer condições para a prévia restituição, mas não afastou a efetivação do pagamento das quantias que se mostrarem devidas. Se existem encargos ou outras exigências tal deve ser apenas e somente colocado depois da restituição dos lotes em causa. Sendo que, na eventualidade de, depois da restituição, a Câmara exigir o pagamento de taxas e sempre pode a interessada impugnar essa liquidação e discuti-la no âmbito de um processo novo e, até configurar a questão unicamente como tributária, bem como, o Município tem ao seu dispor instrumentos jurídicos adequados para (posteriormente) garantir a efetivação do pagamento das quantias que se mostrarem devidas na sequência das liquidações das taxas respetivas, em caso do seu não pagamento voluntário. Em suma, a execução do julgado não invalida a onerosidade da operação urbanística, que eventualmente possa ser devida, o que determina é que a restituição dos lotes não pode ser condicionada a esses pagamentos prévios. Assim, as conclusões do recurso revelam-se improcedentes ou irrelevantes e a pronúncia da decisão recorrida, é merecedora de confirmação, porquanto não violou as disposições legais que o recorrente considera violadas. Nestes termos, não pode proceder a censura dirigida contra a sentença recorrida, a qual não incorreu em qualquer erro de julgamento. Decisão: Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida. Custas pela Entidade recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 18 de junho de 2020 Celestina Caeiro Castanheira Ana Celeste Carvalho Pedro Marchão Marques |