Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:448/11.5BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:09/17/2020
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:NOTIFICAÇÃO LIQUIDAÇÃO
ÓNUS PROBATÓRIO
DILIGÊNCIAS/PRINTS
Sumário:
I-A falta de notificação da liquidação constitui fundamento de oposição à execução, nos termos do artigo 204.º nº 1, al. i) do CPPT.

II-Tendo o Juiz do Tribunal a quo, investido do seu poder inquisitório, requerido, de forma expressa e inequívoca, a junção de suportes documentais que atestassem a notificação da liquidação de IRS, e limitando-se a Recorrente a juntar guias de expedição de registos e respetivos prints sem qualquer possibilidade de associação com a liquidação, ter-se-á de decidir contra a parte onerada com a prova, donde concluir pela falta de notificação.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I-RELATÓRIO

O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a oposição deduzida por C….. no âmbito dos processos de execução fiscal nºs ….. e ….., respeitantes a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), dos anos 2006 e 2008, cujas quantias exequendas ascendem a €1.183,46 e 15.996,21 e acrescidos, no montante de €254,42 e €1.653,08, respetivamente.

A Recorrente apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem:

I - Visa o presente Recurso reagir contra a douta Sentença que julgou a presente oposição procedente, quanto à dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º ….., com a consequente extinção desta execução e, a condenação da Fazenda Pública ao pagamento de custas na proporção de 7%.

II – Afigura-se-nos que, a decisão ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correta apreciação da matéria de facto relevante e, bem assim, total e acertada interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis ao caso em apreço.

III – Defende o Tribunal “a quo” que não tendo a AT demonstrado nos autos a notificação da liquidação de IRS em cobrança no PEF n.º ….., previamente à citação do mesmo para a execução, impõe-se concluir pela ineficácia da mesma relativamente ao Recorrido.

IV - Ora, como resulta do ponto 29.º da pi é o próprio Recorrido que diz que, foi notificado em 10/02/2010 da demonstração do acerto de contas, e juntou, também, à pi cópia da predita demonstração, na qual se pode verificar que a importância de € 1.183,46 se encontra em dívida.

V - Neste sentido e, tendo presente os elementos carreados para os autos, mormente da Direção dos Serviços de Cobrança - Divisão de Cobrança Voluntária, o ora Recorrido, antes da citação teve conhecimento da dívida no montante de € 1.183,46, a ser cobrada coercivamente no PEF n.º …...

VI - Assim, a douta sentença ora recorrida a manter-se na ordem jurídica, é convencimento da Fazenda Pública que incorreu em erro de julgamento, quer sobre a matéria de facto quer sobre a matéria de direito.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a oposição judicial totalmente improcedente. PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA”.


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A Recorrida não apresentou contra-alegações.

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A Digna Magistrada do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II) FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O Tribunal a quo fixou a seguinte factualidade:

A) Em 05.06.2009, foi emitida pela Administração Tributária, em nome do ora Oponente, a liquidação n.º ….., relativa ao IRS do ano de 2008, no valor de 2.785,11 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 30.09.2009 (cfr. documentos de fls. 80 e 131 dos autos e fls. 14 do processo de execução apenso);

B) Em data não determinada, a Administração Tributária emitiu ofício dirigido ao ora Oponente, da qual consta a demonstração da liquidação mencionada na alínea A) que antecede (cfr. documento de fls. 131 dos autos);

C) Em 22.10.2009, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa 2, contra o ora Oponente, o processo de execução fiscal n.º ….., para cobrança do montante de imposto apurado na liquidação identificada em A) supra (cfr. documento de fls. 2 e 3 do processo de execução apenso);

D) Em resultado de declaração de substituição apresentada pelo ora Oponente, em 28.12.2009, a Administração Tributária procedeu, em 01.02.2010, à anulação do valor de 1.601,65 EUR relativo ao imposto mencionado em A) e C) supra, com a consequente extinção do processo identificado em C), na parte correspondente (cfr. documentos de fls. 67, 81, 82 e 83 dos autos e fls. 4 do processo de execução apenso);

E) Em 18.04.2010, foi emitida pela Administração Tributária, em nome do ora Oponente, a liquidação n.º ….., relativa ao IRS do ano de 2006 e respectivos juros compensatórios, no valor de 17.649,29 EUR, correspondendo 15.996,21 EUR a imposto e 1.653,08 EUR a juros compensatórios, com data limite de pagamento voluntário fixada em 02.06.2010 (cfr. documentos de fls. 131 dos autos e fls. 14 do processo de execução apenso);

F) Face à falta de pagamento do montante de imposto e juros compensatórios apurado na liquidação identificada em E) supra, foi emitida em 23.06.2010, a certidão de dívida n.º ….., no valor de 17.649,29 EUR, correspondendo 15.996,21 EUR a imposto e 1.653,08 EUR a juros compensatórios (cfr. documento de fls. 14 do processo de execução apenso);

G) Em 23.06.2010, tendo por base a certidão de dívida mencionada na alínea anterior, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa 2, contra o ora Oponente, o processo de execução fiscal n.º ….., para cobrança do montante de imposto e juros compensatórios constante da referida certidão (cfr. documento de fls. 13 e 14 do processo de execução apenso);

H) Em 11.10.2010, deu entrada no Serviço de Finanças de Lisboa 2 a presente oposição (cfr. carimbo aposto a fls. 5 dos autos).


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A decisão recorrida fixou como factualidade não provada o seguinte:

“Dá-se como não provado, com interesse para a decisão, o seguinte facto:

- Que a Administração Tributária tenha remetido à ora Oponente, ou esta tenha recebido, a notificação da liquidação de IRS identificada na alínea A) do probatório supra. [Não foi apresentada prova deste facto. Na verdade, não foi junto aos autos qualquer comprovativo do efectivo envio ao ora Oponente do ofício de notificação da liquidação, designadamente o registo postal ou aviso de recepção referente à notificação da liquidação, ou outro comprovativo, nomeadamente emitido pela entidade responsável pelos serviços postais (CTT).

Com efeito, dos autos resulta somente ter sido emitido um ofício dirigido ao ora Oponente, do qual consta a demonstração da liquidação exequenda (fls. 131), não decorrendo, contudo, da factualidade demonstrada nos autos que tal ofício tenha sido efectivamente remetido ao Oponente ou que este tenha recepcionado o mesmo.

Sendo que, tendo a Fazenda Pazenda sido notificada para juntar aos autos documentos comprovativos da notificação ao Oponente da liquidação exequenda, a mesma, a fls. 129 a 139, para além do documento junto a fls. 131, que constitui o já mencionado ofício dirigido ao Oponente, limita-se a juntar duas guia de expedição de registos dos CTT e três impressões extraídas do sistema informático da Administração Tributária, das quais consta um registo com a identificação de registos postais e respectiva data de emissão e envio, documentos estes que nada provam relativamente à questionada notificação da liquidação exequenda.

Com efeito, as guias de expedição de registos dos CTT, para além de conterem dados inócuos, para o que aqui nos interessa, sendo datadas de 03.03.2010 e 30.04.2010, são posteriores à própria instauração da execução. Resultando da própria informação que acompanha os referidos documentos, junta a fls. 129, que nem as referidas guias de expedição, nem os mencionados “prints” extraídos do sistema informático da Administração Tributária, se reportam à liquidação exequenda relativa ao ano de 2008 (a cuja que se reporta a alegação de falta de notificação), mas antes à liquidação do ano de 2006 (também em cobrança, mas relativamente à qual não se reporta a alegação de falta de notificação). Na verdade, na referida informação de fls. 129 reconhece-se que o ofício de notificação, alegadamente remetido ao Oponente, não foi enviado com registo postal.”


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A motivação da matéria de facto assentou no seguinte:

“Assenta a convicção do tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos e do processo de execução, não impugnados, com destaque para os referidos a propósito de cada uma das alíneas do probatório.


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Por se entender relevante à decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada adita-se ao probatório, ao abrigo do preceituado no artigo 662.º, nº 1, do CPC, ex vi artigo 281.º do CPPT, a seguinte factualidade:

I) A 01 de fevereiro de 2010, foi emitido documento denominado de “demonstração de acerto de contas”, com o nº ….., respeitante a IRS do ano de 2008, com saldo apurado 0,00, do qual consta, designadamente, o seguinte:

(cfr. doc. 1 junto com a p.i., a fls. 14 dos autos);


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III) FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a oposição à execução fiscal, tendo decretado a procedência quanto à dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º ….., com a consequente extinção desta execução, e a improcedência quanto à dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º ….., absolvendo-se, nesta parte, a Fazenda Pública do pedido.

Cumpre, desde já, relevar que em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Face ao exposto e atentas as conclusões das alegações do recurso interposto importa evidenciar, ab initio, que não se insurgindo o Recorrido contra a parte na qual decaiu, não tendo interposto o competente recurso, a exigibilidade da dívida exequenda objeto de cobrança coerciva no processo de execução fiscal nº ….., consolidou-se na ordem jurídica.

Assim, compete ao Tribunal ad quem aferir se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito ao decidir que a Recorrida não foi notificada da liquidação de IRS referente ao ano de 2008, objeto de cobrança coerciva no processo de execução nº …..competindo, nessa medida, avaliar se face à prova produzida se pode extrair que a mesma foi, devidamente, notificada do aludido ato de liquidação de IRS.

Vejamos, então.

A Recorrente defende que atentando no articulado inicial, mormente, artigo 29.º resulta inequívoca a assunção e reconhecimento expresso de notificação, em 10 de fevereiro de 2010, da demonstração do acerto de contas, tendo, outrossim, junto a prova documental que a suporta, concretamente, a demonstração de liquidação de IRS em contenda, da qual resulta em dívida a importância de € 1.183,46.

Pelo que, face aos elementos carreados para os autos, resulta inequívoco que o ora Recorrido, antes da citação teve conhecimento da dívida no montante de €1.183,46, a ser cobrada coercivamente no PEF n.º …...

Razão pela qual, tendo a decisão recorrida decidido em sentido contrário incorre em erro de julgamento.

Vejamos, então, se assiste razão à Recorrente.

Comecemos por convocar a fundamentação jurídica em que assentou a procedência e consequente extinção do processo de execução fiscal nº …..decretada pelo Tribunal a quo:

“No caso dos autos, como decorre da factualidade assente, não se demonstrou ter ocorrido o acto de notificação da liquidação exequenda, relativa ao ano de 2008, pois não resulta dos autos que a Administração Tributária tenha remetido ao ora Oponente, ou este tenha recebido, a notificação da referida liquidação de IRS do ano de 2008.

Com efeito, dos autos não consta qualquer comprovativo do efectivo envio ao ora Oponente do ofício de notificação da liquidação, não constando dos autos qualquer registo ou aviso de recepção referente à notificação da liquidação, ou outro comprovativo, designadamente emitido pela entidade responsável pelos serviços postais (CTT).

Dos autos resulta somente ter sido emitido um ofício dirigido ao ora Oponente, do qual consta a demonstração da liquidação exequenda (fls. 131), não decorrendo, contudo, da factualidade demonstrada nos autos que tal ofício tenha sido efectivamente remetido ao Oponente ou que este tenha recepcionado o mesmo.

Sendo que, tendo a Fazenda sido notificada para juntar aos autos documentos comprovativos da notificação ao Oponente da liquidação exequenda, a mesma, a fls. 129 a 139, para além do documento junto a fls. 131, que constitui o já mencionado ofício dirigido ao Oponente, limita-se a juntar duas guias de expedição de registos dos CTT e três impressões extraídas do sistema informático da Administração Tributária, das quais consta um registo com a identificação de registos postais e respectiva data de emissão e envio, documentos estes que, pelas razões já expendidas supra, na fundamentação da factualidade dada como não provada, nada provam relativamente à questionada notificação da liquidação exequenda.

Certo é também que a Administração Tributária nenhum elemento adicional relevante forneceu no sentido de provar que o ora Oponente teve conhecimento do acto notificado em momento anterior à sua citação para a execução, sendo que, como supra foi referido, o ónus de demonstrar a correcta efectivação da notificação cabia à Administração Tributária.

Dito isto, não se tendo demonstrado nos autos ter sido efectuada a válida notificação ao Oponente da liquidação de IRS em cobrança no processo de execução n.º …..previamente à citação do mesmo para a execução, impõe-se concluir pela ineficácia da mesma relativamente ao Oponente, que impede que produza efeitos em relação a este e, por isso, que a dívida seja exigida (cfr. artigo 36.º, n.º 1, do CPPT).

Pelo exposto, procede o fundamento em apreciação, impondo-se concluir, desde já, pela procedência da presente oposição quanto ao processo de execução n.º …...”

Atentando no supra expendido, entendemos que a decisão recorrida não merece qualquer censura, tendo interpretado adequadamente o regime jurídico que releva para o caso dos autos com a devida transposição para a matéria de facto.

Senão vejamos.

Os fundamentos da execução fiscal são os taxativamente indicados nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, sendo fundamento de oposição constante na alínea i) do citado artigo 204.º, n.º 1, do CPPT, a pretensa falta de notificação do ato de liquidação. Verificando-se a falta de notificação do ato que subjaz à instauração da execução fiscal, estar-se-á perante uma omissão de um ato imposto por lei, necessário para assegurar a eficácia do ato, nos termos das citadas normas legais, que se reconduz ao fundamento previsto na alínea i) do citado artigo 204.º, n.º 1, do CPPT.

Dispõe o artigo 36.º, n.º 1, do CPPT que: “[o]s atos em matéria tributária que afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados”, pelo que entre os referidos pressupostos figura a notificação validamente efetuada ao sujeito passivo.

Independentemente da formalidade específica atinente à notificação de ato de liquidação de IRS, relativamente ao ano de 2008, ou seja, carta registada ou carta registada com aviso de receção -questão não sindicada nos presentes autos- a verdade é que, como bem decidiu o Tribunal a quo, nenhuma prova resulta dos autos que permita concluir no sentido propugnado pela Recorrente.

Do probatório resulta que, em 05 de junho de 2009, foi emitida pela Administração Tributária, em nome do ora Oponente, a liquidação n.º ….., relativa ao IRS do ano de 2008, no valor de 2.785,11 EUR, com data limite de pagamento voluntário fixada em 30 de setembro de 2009, tendo, igualmente, sido emitido, em data não concretamente apurada, um ofício dirigido ao Recorrido com a aludida de demonstração de liquidação.

Mais dimanando assente que a 22 de outubro de 2009, foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa 2, contra o ora Oponente, o processo de execução fiscal n.º ….., visando a cobrança coerciva da evidenciada liquidação.

Resultando, ainda, provado que em data ulterior à instauração do aludido processo executivo, concretamente, em 28 de dezembro de 2009, ocorreu uma anulação parcial no montante de €1.601,65, com a consequente extinção do processo de execução fiscal na parte correspondente.

Constando, de forma expressa e inequívoca, enquanto factualidade não provada que não resultou provado que a Administração Tributária tenha remetido ao Oponente, ora Recorrido, ou que esta tenha recebido a notificação da liquidação de IRS nº ….., relativa ao IRS do ano de 2008, no valor de 2.785,11 EUR.

Ora, face à aludida factualidade- não impugnada- não se ajuíza qualquer erro de julgamento.

É certo que a Recorrente vem invocar que o Recorrido reconhece no articulado inicial que foi notificado da aludida notificação, porém da leitura da p.i. não se retira, de todo, esse reconhecimento, bem pelo contrário.

Mas, explicitemos porque assim o entendemos.

Analisando o articulado inicial retira-se, desde logo, nos artigos 1.º a 3.º e em sentido contrário ao expendido pela Recorrente que o Recorrido alega, de forma expressa e inequívoca, que “[n]ão foi notificado da liquidação referente ao IRS de 2008, anterior ao momento do conhecimento efectivo da existência da execução fiscal. Essa falta de notificação constitui facto negativo. Recaindo sobre a Administração Tributária, o ónus da prova de que procedeu à notificação do oponente nos termos legais.”

Mais acresce que, o convocado artigo 29.º da p.i. não permite, de todo, inferir que foi validamente notificado da liquidação que subjaz ao processo de execução fiscal, ora em contenda.

E isto porque, o Oponente, ora Recorrido, o que aduz no referido artigo é, tão-só, o seguinte:

“O executado foi notificado, em 10/02/2010, de uma demonstração de acerto de contas relativo ao IRS do ano de 2008, nos termos da qual o saldo apurado é de €0,00 (cfr. doc. nº2 que se junta)”.

Ora, atentando no supra exposto e confrontando com o aludido documento, melhor evidenciado na alínea I) do probatório, ora aditada, não é possível extrapolar no sentido da notificação do ato de liquidação descrito na alínea A) da factualidade assente, porquanto o ato a que é feita alusão pelo Recorrido não só não consubstancia a liquidação que fundamentou a instauração do PEF em contenda, como é posterior ao mesmo.

Ademais, da leitura do aludido documento de acerto de contas e, contrariamente ao defendido pela Administração Tributária, não se infere que exista valor em dívida e a pagar, pois do aludido ato resulta perentória a existência de saldo apurado “0” e expressa menção que não há lugar ao pagamento ou reembolso do saldo apurado.

Assim, face ao exposto não tendo sido carreados para os autos quaisquer elementos probatórios que atestem, de forma inequívoca, a notificação da liquidação constante na citada alínea A) do probatório, outra não pode ser a solução que não a procedência da oposição.

Note-se, neste particular, que o Juiz do Tribunal a quo, investido do seu poder inquisitório requereu, de forma expressa e inequívoca a junção de suportes documentais que atestassem tal notificação, e a verdade é que os únicos documentos juntos aos autos e conforme explicitado em sede de motivação da matéria de facto, não permitem, de forma alguma, extrapolar a notificação do aludido ato tributário, porquanto confrontado o ato de liquidação nº ….., no valor de €2.785,11, descrito em A), com a guia de expedição de registos e print do registo privativo não se consegue, de todo, materializar qualquer associação entre os mesmos.

Assim, atento todo o expendido e sem necessidade de outros considerandos, ter-se-á de concluir que a Administração Tributária não logrou fazer a prova que lhe competia, in casu, notificação do ato de liquidação de IRS referente ao ano de 2008, descrito em A) do probatório, pelo que contra ela deve ser onerada essa falta de prova.

Destarte, a falta de notificação da liquidação constitui fundamento de oposição à execução, nos termos do artigo 204.º nº 1, al. i) do CPPT, improcedendo, na íntegra, o recurso sendo de manter a decisão recorrida.


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IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

-NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.

Custas pela Recorrente.

Registe. Notifique.


Lisboa, 17 de Setembro de 2020

(Patrícia Manuel Pires)

(Susana Barreto)

(Vital Lopes)