Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2637/13.9 BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:01/25/2024
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:PENA DISCIPLINAR DE DEMISSÃO
PROPORCIONALIDADE
FALSIFICAÇÃO DE ASSINATURAS
CONFISSÃO
Sumário:I – Não compete aos Tribunais apreciar a medida concreta da pena, salvo em casos de erro grosseiro e manifesto, pois que tal se insere no poder discricionário da Administração.
Não é censurável que uma Entidade Pública perca em definitivo a confiança, decidindo pela cessação da relação laboral por motivos disciplinares de uma trabalhadora que repetidamente falsificou a assinatura de utentes em documentos oficiais do serviço. Tal comportamento encerra um desvalor e gravidade muito graves, só por si inviabilizador que tal trabalhadora possa continuar a exercer as funções públicas que vinha desempenhando, com o inerente risco de continuação de comportamentos desviantes face aos procedimentos administrativos instituídos.
II - Efetivamente, independentemente do número de falsificações, sempre o comportamento da aqui Recorrente constitui a violação dos deveres gerais de prossecução de interesse público, subsumível no estatuído no artigo 256.°, n.° 1, alínea c) do Código Penal, por existir um abuso de assinatura de terceiro, punível com uma pena de prisão até três anos, sendo que o n.° 4 do artigo 256.° do CP, estabelece um agravamento da pena até cinco anos, quando seja praticado por funcionário no exercício de funções, como sucede no caso em análise.
III - Na realidade, o comportamento de um funcionário público ao apor a assinatura de um utente num documento merece uma censura jurídica muito elevada, independentemente da natureza jurídica desse documento, sendo certo que, no caso, a Inscrição Consular é manifestamente um documento oficial de serviço.
IV - No que respeita já à confissão, refira-se que a mesma só será considerada como relevante e espontânea quando for feita em tempo útil, de forma livre, e tiver contribuído decisivamente para a descoberta da verdade e não resultar da evidência dos factos.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção SOCIAL
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I Relatório

M......., intentou Ação Administrativa Especial contra o Ministério dos Negócios Estrangeiros tendente à impugnação do despacho da Secretária-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, de 28.06.2013, que determinou a aplicação à Autora da pena disciplinar de despedimento, inconformada com a Sentença proferida em 9 de setembro de 2021, no TAC de Sintra que julgou improcedente a Ação, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão em 11 de outubro de 2021.
Formulou a aqui Recorrente/M....... nas suas alegações de recurso, apresentadas as seguintes conclusões:
“1- - Não foi devidamente decidida nos presentes autos a fixação da matéria de facto relevante para a decisão jurídica da causa;
2- - O Tribunal a quo deu como provado o desconhecimento ou não autorização de aposição da respetiva assinatura em Inscrições Consulares de 17 utentes com base no depoimento de apenas 4 deles;
3- - Essa extrapolação não pode ser aceite;
4- - Não há prova nos autos de que a autora não tenha obtido essa autorização dos demais ou não o tenha feito, como sempre afirmou, a pedido dos mesmos;
5- - Assim, o Mm° Juiz a quo poderia, no máximo, ter dado como assente que: "Das aposições referidas na alínea anterior, as de R......., J......., V....... e S......., foram realizadas sem o conhecimento ou autorização dos respetivos requerentes/utentes";
6- - O Tribunal também deu como provado, na alínea J), do ponto 1, do Capítulo IV, da Sentença, matéria de natureza conclusiva e não factual;
7- - Deve, pois, ser eliminada a alínea J), do ponto 1, do Capítulo IV, da Sentença;
8- - Teve o Tribunal a quo uma indevida relutância em avaliar a proporcionalidade da pena face à infração;
9- - Devia, pelo contrário, ter feito uma avaliação muito criteriosa da adequação da mais grave sanção prevista - o despedimento - aos factos concretos e anulado a sanção;
10- - O Mm° Juiz a quo, negando ele próprio o Princípio de in dubio pro réu, fez um erro de julgamento ao considerar a existência de 2 tipos infrações: uma correspondente a crime de falsificação da assinatura de 17 utentes, por cuja existência conclui sem prova, e outro correspondente ao desrespeito das regras internas;
11- - O comportamento da autora apenas poderá ser reconduzido ao aludido desrespeito, não existindo a prática de crime de falsificação;
12- - O Ministério Público no inquérito que conduziu apenas encontrou indícios, praticados por 8 trabalhadores do réu, entre eles a autora, de um crime de abuso de poder;
13- O Ministério Público entendeu não existir culpa grave e optou pela suspensão provisória do processo;
14- O Tribunal a quo considerou expressamente que a prática do/s crime/s de falsificação eram a razão que justificava a diferente punição da recorrente face aos demais;
15- Pelo que considerando que essa prática não foi provada, apenas poderá restar a incompreensão pela forma especialmente severa com que autora foi tratada face a esses demais;
16- - O despedimento viola a usual bitola disciplinar do réu;
17- - A autora tinha uma já longa carreira profissional sem qualquer reparo ou sanção disciplinar e confessou de forma espontânea a aposição das assinaturas - o que devia ter sido devidamente considerado na Sentença em crise;
18- - Deve a sanção de despedimento aplicada à recorrente ser anulada com as devidas consequências legais.
A Sentença aqui posta em crise está ferida dos vícios, assinalados supra, pelo que deve ser substituída, nos termos peticionados.”
O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 8 de novembro de 2021.
O aqui Recorrido/MNE veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 14 de dezembro de 2021, aí concluindo:
“A. Relativamente à impugnação da alínea E) da matéria de facto dada como provada, a Recorrente, salvo melhor opinião em contrário, não cumpre o ónus constante do artigo 640.°, n.° 1 al) b) e c) do CPC;
B. Com efeito, a Recorrente não procede à indicação dos concretos meios de prova que justificam, pela positiva ou negativa, decisão diversa;
C. Não é feita nenhuma alusão a documentos concretos constantes dos autos, bem como ao seu conteúdo, insuficiências ou deficiências dos depoimentos daqueles quatro utentes que permitissem conclusão diversa;
D. A Recorrente limita-se a interpretar os elementos de prova, sem demonstrar qualquer vício que inquine a decisão da matéria de facto,
E. Incumbia à Recorrente que procedesse a uma análise crítica dos meios probatórios, donde resultasse o dever de ter sido proferida decisão distinta, conforme decorre do art.° 640.°, n.° 1 al b) do CPC;
F. Incumprindo o ónus de especificação dos meios probatórios que impõem decisão diversa, deverá ser rejeitada, parcialmente, o recurso respeitante à impugnação da matéria de facto.
G. De igual modo, salvo melhor opinião em contrário, a Recorrente não cumpre, igualmente, o ónus constante da alínea c) do art.° 640.° do CPC;
H. Isto, pois, incumbe aos Recorrentes que impugnem matéria de facto a indicação da decisão que, no seu entender, deveria ter sido proferida sobre as questões de facto impugnadas, esclarecendo, de modo preciso, sobre o seu exato teor
I. Neste conspecto, a Recorrente emprega nas suas alegações e conclusões uma argumentação manifestamente contraditória;
J. De um lado, parece, num primeiro momento, que a matéria de facto deve ser alterada para que somente conste que, das 17 assinaturas, somente quatro foram apostas sem a autorização dos respetivos utentes;
K. De outro, constrói grande parte da sua argumentação jurídica partindo do pressuposto que inexiste prova de qualquer falsificação de assinatura;
L. O que fica patente na forma como a Recorrente formula a alegada decisão que deveria ter sido proferida na douta sentença quanto à matéria de facto;
M. A Recorrente emprega uma linguagem, como "deveria” ou "poderia” no máximo, ter dado como provado, o que não cria um grau de convicção se a Recorrente pretende, verdadeiramente, que tal facto seja dado como provado;
N. Nestes termos, não se alcança se a Recorrente pretende a reformulação da alínea E) para que se dê como provado a aposição de quatro assinaturas sem a autorização dos respetivos utentes;
O. Ou se a Recorrente pretende a eliminação da alínea E) da matéria de facto dada como provada, atendendo que, por diversas vezes, aduz que inexiste qualquer prova de falsificação de assinaturas;
P. Incumbe à Recorrente sustentar a sua pretensão modificativa de modo claro e preciso, de forma a não obrigar o tribunal superior a substituir se à Recorrente na concretização do objeto do recurso;
Q. Assim, pela contradição entre a solução que, na ótica da Apelante, deveria ter sido dado como provado e a solução jurídica posteriormente empregue, pela alegada falta de prova da aposição das 17 assinaturas, estamos perante o incumprimento da al c) do art.° 640.°, n.° 1 do CPC, devendo, neste conspecto, ser rejeitado o recurso da matéria de facto;
R. Quanto à impugnação da alínea J) da matéria de facto dada como provada, da qual a Recorrente pretende a sua eliminação, deverá ser julgada improcedente, na medida em que não se revela suscetível de influir na boa decisão da causa;
S. Porquanto, o que está na génese de tal facto prende-se com o desrespeito, por parte da Recorrente, face às regras instituídas pelo Cônsul-Geral e que motivaram a segunda infração disciplinar e a consequente queixa-crime por abuso de poder, onde a Recorrente sempre pugnou por ter o consentimento escrito ou verbal da Chanceler;
T. Ainda que seja eliminada a alínea J), sempre subsiste o julgamento de direito, porquanto, ainda que a Chanceler não tivesse ausente por período de férias, sempre subsistiria como não provado o consentimento escrito ou verbal da mesma, bem como a não reclamação, por parte da Recorrente, das ordens e instruções consideradas ilegítimas, ou a sua redação a escrito.
U. E a irrelevância para a boa decisão da causa fica evidenciada pelo facto da Recorrente, ao longo das suas alegações, não retirar nenhuma utilidade jurídica da eliminação da alínea J) do quadro factual;
V. Ainda que seja alterada a matéria de facto dada como provada, em concreto, a alínea E), e fique provado que, das 17 assinaturas, somente quatro não tiveram por base o consentimento dos utentes, a decisão adotada pela douta sentença não se mostra inquinada;
W. Quanto à infração disciplinar de falsificação de assinaturas, a Recorrente é acusada e punida pela violação dos deveres gerais de prossecução do interesse público, pela sua atuação desconforme com o artigo 256.° do Código Penal, de zelo e de correção, nos termos do artigo 3.°, n.° 1 e 2, alíneas a), e) e h), 3, 7 e 10, respetivamente;
X. Assim, ainda que somente estejam em causa quatro falsificações de assinatura, subsiste a violação dos deveres gerais de prossecução do interesse público, atendendo que se mantêm a atuação desconforme ao artigo 256.° do Código Penal, bem como a violação de zelo e correção;
Y. A nível penal, o abuso de assinaturas, previsto e punido no art.° 256.° n. °1 al c) e n. °4 do CP, estabelece um agravamento da pena até cinco anos, quando o ato seja praticado por funcionário no exercício de funções;
Z. Face à qualidade do agente, o legislador entendeu agravar a moldura penal, face ao especial dever que lhe impende em atuar conforme ao direito;
AA. Assim, uma falsificação de assinaturas em documentos oficiais do serviço revela-se altamente censurável, pelo que quatro ou dezassete, não afastam o juízo de censurabilidade e a gravidade da sua atuação;
BB. Deste modo, ainda que se atenda somente a quatro falsificações de assinatura, as infrações disciplinares da Recorrente continuam a constituir a prática de dois tipos de crime, nomeadamente, de falsificação de documentos e abuso de poder, as quais configuram ilegalidades agravadas;
CC. Mantem-se a prática de condutas reiteradas, tendo a falsificação de assinaturas ocorrido, pelo menos, quatro vezes e as situações de abuso de poder em maior número;
DD. Ou seja, mantêm-se os argumentos expedidos pelo Tribunal a quo;
EE. Pelo que não se mostra censurável e, consequentemente, desproporcional, que, qualquer homem médio colocado na situação da Entidade Empregadora, perca definitivo a confiança na Recorrente para continuar ao exercício de funções, uma vez que é quebrada, de forma irremediável, a confiança na genuinidade e autenticidade dos documentos em que ocorreu a intervenção da Recorrente;
FF. Qualquer pena conservatória da relação jurídica, revelava-se inadequada, atendendo que, qualquer ato praticado pela Recorrente após a cessação do procedimento disciplinar, seria apto a criar dúvidas, perante qualquer Empregador, da sua autenticidade;
GG. Improcede, igualmente, a alegada invocação da suspensão provisória do processo crime numa tentativa de demonstrar um grau de culpa leve, uma vez que tal juízo de censurabilidade é um juízo inacabado, fundando num juízo de prognose póstuma;
HH. Como não poderá acolher a alegada violação do princípio da igualdade por, aos seus colegas, terem sido aplicadas penas conservatórias da relação jurídica de emprego, atendendo ao facto de os outros funcionários não terem falsificado as assinaturas dos utentes em documentos oficiais do serviço;
II. Quanto à invocação, genérica, de uma alegada confissão e o facto de deter uma longa carreira profissional sem qualquer reparo ou sanção, na tentativa de se arrogar de circunstâncias atenuantes, a Recorrente não suscita qualquer erro de direito;
JJ. Isto é, não assaca qualquer erro na interpretação do normativo aplicado pelo Tribunal a quo, pelo que, sendo o objeto do recurso a sentença proferida pelo Tribunal, não poderá colher, nesta fase, uma segunda tentativa de julgamento de mérito, como se a primeira decisão inexistisse;
Termos em que deve ser:
i. Rejeitado o recurso relativo à impugnação da matéria de facto dada como provada, nomeadamente, quanto à alínea E), por incumprimento do ónus do artigo 640.°, n.° 1 al b) e c) do CPC;
ii. Rejeitado o recurso relativo à impugnação da matéria de facto dada como provada, nomeadamente, quanto à alínea J), por ser matéria de facto irrelevante para a boa decisão da causa;
iii. Mantida a decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa;”
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 8 de fevereiro de 2022, nada veio dizer requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, que o Tribunal a quo deu como provado matéria de facto sem qualquer prova nos autos que a sustentasse, dando como provado matéria de facto conclusiva, e que a medida concreta da pena se revela desproporcional.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo considerou a seguinte factualidade provada e não provada:
“Factos provados
A) A Autora desempenhou as funções de assistente técnica do Consulado-Geral de Portugal no Rio de Janeiro desde 2006, exercendo funções para o Estado Português desde 1998. (Acordo)
B) Em março de 2009 foi introduzido um novo sistema de tratamento dos pedidos de nacionalidade que foi designado por SIRIC (Sistema Integrado de Registo e Identificação Civil), tendo os Postos Consulares passado a registar em rede nacional eletrónica, onde ficava a constar toda a documentação apresentada pelos requerentes. (Cfr. depoimento de A......., Cônsul- Geral de Portugal no Rio de Janeiro de 12-01-2006 a 22-12-2012, de fls. 192 a 201 do PA)
C) Em janeiro de 2011, o Cônsul-Geral de Portugal no Rio de Janeiro deu as seguintes instruções aos funcionários:
- Não seriam recebidos pedidos de nacionalidade apresentados pessoalmente no Consulado, sendo obrigatoriamente enviados através do correio e acompanhados de documentação complementar;
- Deixaria de haver pagamentos de emolumentos na caixa do Posto Consular, sendo efetuados em instituições bancárias mediante um boleto eletrónico, enviado pelo Posto para o e-mail dos requerentes depois de ter sido feita a análise ao processo;
- Implementação no início de 2011 de um mapa em formato Excel, que ficou designado por “Planilha”, onde eram registados todos os processos de pedidos de nacionalidade entrados no Consulado, depois de lhes ter sido atribuído um número de Processo Individual;
- Todos os funcionários deveriam respeitar integralmente a ordem da entrada do Pedido no Consulado e a que constava da “Planilha”;
- Qualquer prioridade a atribuir a determinado processo careceria de despacho do Cônsul-geral ou da Chanceler, a proferir no processo, a atribuir carácter de urgência e prioridade sobre os que tinham entrado anteriormente.
(Cfr. depoimento de A......., de fls. 192 a 201 do PA, de R.R......., coordenador do registo civil entre 2006 e novembro de 2011, de fls. 122 a 126, de M........., de fls. 146 a 167 do PA e de D........., de fls. 117 a 119 do PA)
D) No ano de 2009, a Autora exarou a suposta assinatura dos respetivos requerentes/ utentes em 17 Inscrições Consulares. (Admitido pela Autora)
E) A aposição referida na alínea anterior foi realizada sem o conhecimento ou autorização dos respetivos requerentes/utentes. (Cfr. depoimento das testemunhas R......., J......., V....... e S......., de fls. 202 a 211 do PA)
F) À data, o prazo médio de processamento dos processos de atribuição de nacionalidade era de quatro ou cinco meses. (Cfr. depoimento de R.R......., de fls. 122 a 126 do PA, de T........., de fls. 127 a 136 do PA, de L........., de fls. 137 a 145 do PA e M........., de fls. 146 a 167 do PA)
G) Entre março e agosto de 2011, nos processos referentes às Inscrições Consulares n.°s 807064, 807120, 805619 e 805622, a Autora procedeu à sua elaboração no SIRIC. (Cfr. fls. 155 a 159, 161 e 471 a 762 do PA)
H) Entre março e agosto de 2011, nos processos referentes às Inscrições Consulares n.°s 805523, 806286, 805605, 807020, 807192, 807018, 875576, 807019, 806623, 807645 e 805663, a Autora inseriu os pedidos no Sistema de Gestão Consular (SGC), emitiu as Inscrições Consulares e elaborou-os no SIRIC. (Cfr. fls. 155 a 159, 161 e 471 a 762 do PA)
I) Todos os processos referidos nas alíneas G) e H), além dos processos respeitantes às Inscrições Consulares n.°s 806952, 806897, 806933, 806918, 806863, 806832, 806830, 806800, 806797, 806927, 807081, 807080, 807079, 807060, 807047, 807046, 807039, 807038, 807012 e 807001, foram pagos diretamente na Caixa do Posto Consular, foram elaborados em prazos muito inferiores aos referidos na al. G) e não tinham despacho a autorizar o respeito do procedimento instituído. (Cfr. fls. 155 a 159, 161, 471 a 762, 784 a 835 e 836 a 879 do PA)
J) A maioria dos processos referidos nas alíneas anteriores foram elaborados em período de ausência ao serviço da Chanceler, por motivo de férias. (Cfr. fls. 881 e 882 do PA)
K) Por despacho do Inspetor-Geral Diplomático e Consular de 4-09-2012 foi determinada a instauração de processo disciplinar à Autora, a que foi atribuído o n.° P-395/C. (Cfr. fls. 42 do PA)
L) À data, a Autora não tinha sido sujeita a qualquer pena disciplinar. (Cfr. fls. 225 do PA)
M) Em 23-11-2012, a Instrutora do processo disciplinar emitiu, contra a Autora, a nota de culpa que consta de fls. 884 a 893 do PA, que se tem por integralmente reproduzida.
N) Em 25-01-2013, a Autora apresentou no processo disciplinar a defesa que consta de fls. 937 a 952 do PA, que se têm por integralmente reproduzidas.
O) Em 26-06-2013, a Instrutora elaborou relatório final no processo disciplinar P- 395/C, tendo proposto o seguinte:
«VI. PROPOSTA FINAL
1. Face a quanto precede considera a signatária ser de propor superiormente que à arguida seja aplicada a pena disciplinar de despedimento por facto imputável à trabalhadora, nos termos dos artigos 9.°, n.° 1, d), 10.°, n.° 6, 11.°, n.° 4 e 18.°, todos do Estatuto Disciplinar». (Cfr. fls. 1360 a 1377 do PA, que se têm por integralmente reproduzidas)
P) Em 28-06-2013, a Secretária-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros apôs despacho de concordância no relatório referido na alínea anterior. (Cfr. fls. 1377 do PA)
Q) Em 19-11-2014, o Ministério Público da 10.ª Secção do DIAP de Lisboa proferiu o seguinte despacho no processo de inquérito n.° 73/12.3JDLSB:
«SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO:
Nos presentes autos, realizadas as pertinentes diligências de investigação, resultaram, de forma suficiente, indiciados os seguintes factos, que se imputam, em termos de autoria, aos arguidos:
P........., melhor identificada a fls. 425.
F........., melhor identificado a fls. 369.
C........., melhor identificado a fls. 400.
M......., melhor identificada a fls. 373.
R.A........., melhor identificado a fls. 416.
Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa Pág. 8 de 21
M.J........., melhor identificada a fls. 420;
R.R......., melhor identificado a fls. 396.
V.P........., melhor identificado a fls. 412
Todos os arguidos, à data dos factos, eram funcionários do Consulado - geral de Portugal no Rio de Janeiro, e exerciam funções relacionadas com as inscrições Consulares de cidadãos brasileiros que requerem a nacionalidade portuguesa no Consulado no Rio de Janeiro.
Em Março de 2009 foi introduzido um novo sistema de tratamento dos pedidos de nacionalidade que foi designado por SIRIC - Sistema Integrado de Registo e Identificação Civil e, a partir desse momento os Postos Consulares passaram a registar em Rede Nacional eletrónica onde ficava a constar toda a documentação apresentada pelos requerentes (Assentos de nascimento, Documentos de Identidade), o que levou o Posto do Rio de Janeiro, a receber uma grande quantidade de pedidos anuais, dada a existência de uma elevada comunidade de luso-descendentes, o que causou um atraso no tratamento dos processos e, consequentemente, no reconhecimento ou não do direito à nacionalidade Portuguesa aos requerentes que apresentavam esses pedidos.
Em Janeiro de 2011 A........., Cônsul Geral de Portugal no Rio de Janeiro deu instruções, através de Ordem de Serviço, aos arguidos de que não seriam recebidos Pedidos de Nacionalidade apresentados pessoalmente no Consulado, pois estes teriam de ser obrigatoriamente enviados através do Correio e acompanhados de documentação complementar.
Mais foi determinado que relativamente a esses pedidos deixaria de haver pagamentos de emolumentos na Caixa do Posto, mas que estes teriam de ser feitos em instituições bancárias mediante um Boleto eletrónico, enviado pelo Posto para o e-mail dos requerentes depois de ter sido feita a análise aos processos e ter-se verificado que eles teriam direito à nacionalidade.
Foi, ainda, implementada a utilização de um mapa em formato Excel, que ficou designado por “Planilha ”, o qual começou a ser utilizado no início de 2011, onde eram registados todos os processos de Pedidos de Nacionalidade entrados no Consulado, e isto depois de lhes ter sido atribuído um número de Processo Individual.
Deu ainda instruções a todos os funcionários de que deveriam de respeitar integralmente a ordem da entrada do Pedido no Consulado e a que constava da “ Planilha”. Caso houvesse motivo para alguma urgência, deveriam de expor a situação a si ou à Chanceler, e seria um dos dois a decidir, através de despacho a elaborar no processo, se entendiam que realmente havia motivo para essa urgência, e autorizarem, então, que esse processo fosse tratado com prioridade sobre os que tinham entrado anteriormente.
Sucede que os arguidos não cumpriram o que foi superiormente determinado, tendo violado as regras definidas.
Na realidade, os arguidos, durante todo o ano de 2011 praticaram atos em processos de nacionalidades e transcrição de casamento que não seguiram o procedimento imposto, causando um benefício para terceiros, no caso os requerentes que viam os seus processos serem tratados de forma muito rápida, em questão de dias, enquanto outros teriam que aguardar por vários meses até verem os seus processos concluídos.
Os cidadãos que viram os seus processos tratados de forma rápida e sem serem observadas as instruções são todos os melhor identificados a fls. 426 a 430, cujo teor aqui damos por reproduzido para todos os efeitos legais, em número total de 38.
Os arguidos que eram funcionários consulares e estavam investidos de poderes públicos, atuaram com violação dos deveres funcionais que sobre si impendiam, sacrificando o interesse público para satisfação de finalidades ou interesses particulares que se traduziram num benefício ilegítimo para os cidadãos que viram o seu pedido tratado de forma urgente.
Agiram de forma livre, voluntária e consciente.
Conheciam o carácter proibido da sua conduta sabendo, igualmente, que a mesma era punida por lei penal.
Pelo exposto, cometeu, cada um, em autoria material, um crime de abuso de poder, previsto e punido pelo artigo 382.B, do Código Penal.
Nos termos do artigo 281° do Código de Processo Penal, nos casos em que o crime cometido seja punido com pena de prisão até 5 anos ou com sanção diferente da prisão, pode haver lugar à suspensão provisória do processo, mediante a imposição ao arguido de injunções e regras de conduta desde que:
- haja a prévia concordância do arguido;
- ausência de condenação anterior por crime da mesma natureza;
- ausência de aplicação anterior de suspensão provisória de processo por crime da mesma natureza;
- não haver lugar a medida de segurança de internamento;
- ausência de um grau de culpa elevado; e
- o cumprimento das injunções seja suficiente às necessidades de prevenção.
(...)
Tudo sopesado, entendemos que a suspensão provisória do processo com aplicação de injunções ou regras de conduta aos arguidos P........., F........., C........., M......., R.A........., M.J........., R.R....... e V.P........., é suficiente para lhes fazer sentir o carácter proibido da sua conduta, bem como para restaurar a confiança da comunidade na norma violada.
Por conseguinte, crê-se que as necessidades de prevenção são passíveis de acautelamento, impostas as seguintes injunções, a cada um, a saber:
A) Entrega da quantia de € 150,00 (cento e cinquenta euros) ao Banco Alimentar de Lisboa e juntar aos autos o respetivo comprovativo (mais informe que o pagamento faz-se em qualquer caixa Multibanco, em pagamento de serviços, em que a entidade é o 21241, a referência é o 707 707 707 e depois o montante é, naturalmente, o que foi aplicado, cabendo juntar aos autos o talão do Multibanco);
B) - Pagamento ao Estado de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros) através de depósito autónomo de documento único de cobrança que, oportunamente, se vai anexar.
Tudo, nos termos do art. 281°, n°2, al. c), do Código de Processo Penal.
Assim sendo, verificados os respetivos pressupostos e justificando eles próprios a respetiva oportunidade, o Ministério Público decide-se pela suspensão provisória do processo, pelo período de 4 (quatro) meses, mediante a imposição aos arguidos das injunções já referidas — art. 282°, n° 1 e 2 do Código Penal.
Conclua os autos ao Mmo. Juiz de Instrução, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 281°, n°1 do Código de Processo Penal.
(...)» (Cfr. certidão de fls. 502-511 do SITAF)
R) Em 21-11-2014, a 1.a Secção Instrução Criminal do Tribunal da Comarca de Lisboa
- J1 - proferiu o seguinte despacho no proc. n.° 73/12.3JDLSB:
«Nos presentes autos indicia-se a prática de crime cuja pena abstrata é de prisão não superior a cinco anos.
Uma vez que se verificam os pressupostos referidos no art° 281,do CPP, nada temos a opor no tocante à suspensão provisória do processo, conforme proposto pelo Ministério Público, nos termos do art° 281 do CPP». (Cfr. certidão de fls. 502511 do SITAF)
S) Em 19-06-2015, o Ministério Público do DIAP de Lisboa proferiu o seguinte despacho no processo de inquérito n.° 73/12.3JDLSB:
«Declaro encerrado o inquérito.
Uma vez decorrido o prazo da Suspensão Provisória do Processo, e porque se mostra(m) cumprida(s) a(s) injunção(ões) impostas aos arguidos P........., F........., C........., M......., M.J........., R.R........ R.C......... e V.P......... e também não lhe são conhecidos antecedentes criminais, praticados durante o período da suspensão e nem outros inquéritos instaurados durante esse prazo (vide fls. 933 a 951), determino o arquivamento dos presentes autos, nos termos previstos no n° 3 do art° 282°do Código de Processo Penal. Cumpra o previsto no n° 3, do artigo 277°, do Código de Processo Penal.
Atento o supra referido, junte o print comprovativo de introdução dos dados no sistema informático disponível da existência do cumprimento da suspensão do processo, em nome do arguido, em cumprimento à circular 2/2008 de 2/1 da PGR». (Cfr. certidão de fls. 502-511 do SITAF)
ii) Factos não provados
Não ficou provada a alegação genérica, isto é não concretizada em factos concretos, de que os processos elaborados pela Autora com desrespeito às regras procedimentais internas definidas pelo Cônsul-Geral tiveram na sua génese o consentimento escrito ou verbal da Chanceler.
Na realidade, nos processos em que foram apuradas irregularidades, não existe ordem escrita para que seja adotado comportamento diferentes, nem do processo disciplinar resulta indiciado que tal consentimento tenha sido verbal.
Assim como também não resultou provada, por falta de prova capaz, a afirmação, também ela genérica, de que o comportamento da Autora sempre se pautou pelo cumprimento de ordens superiores, grande parte delas desprovidas de qualquer formalidade.”

IV – Do Direito
Importa agora, atenta a matéria dada como provada, analisar o Recurso apresentado pela Autora.

No que aqui relva, discorreu-se em 1ª instância:
“(...) Passando a apreciar, como tem sido jurisprudência reiterada do Supremo Tribunal Administrativo, cabe no âmbito dos poderes dos tribunais analisar da existência material dos factos apurados no processo disciplinar, bem como averiguar se os mesmos constituem infrações disciplinares. Pelo contrário, “não lhe compete apreciar a medida concreta da pena, salvo em casos de erro grosseiro e manifesto, porque essa é uma tarefa da Administração que se insere na chamada discricionariedade técnica ou administrativa’". Assim decidiram, em especial, o acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo de 29-03-2007 e o acórdão de 1203-2015, proc. n.° 0245/14.
Ora, na situação em apreço, as infrações disciplinares que foram imputadas à arguida encontram-se suportadas na prova documental e testemunhal reunida no processo disciplinar, como se encontra fundamentado na nota de culpa e no relatório final.
Sendo certo que o ónus da prova pertence ao titular do poder disciplinar, importa evidenciar que a prova produzida no procedimento permite concluir pela prática das infrações pelas quais a Autora foi condenada, como resulta da factualidade considerada provada e não provada.
Decorre da factualidade provada que a Autora foi condenada por infrações que podem ser agrupadas em duas categorias: falsificação da assinatura dos requerentes/ utentes em 17 Inscrições Consulares e desrespeito pelas regras internas definidas pelo Cônsul-Geral quanto ao tratamento dos processos de registo civil.
A primeira, foi considerada provada e, aliás, mediante confissão da Autora (facto D)), expressa no presente processo disciplinar e também nos presentes autos. De realçar que, apesar de a Autora se referir geralmente à aposição do nome, o que o processo disciplinar denota é que havia a intenção clara de reproduzir a suposta assinatura do utente.
A Autora pretende desvalorizar esse comportamento mediante a alegação de que se tratava de um documento sem importância para o processo e que a aposição da assinatura tinha sido realizada com o consentimento dos respetivos utentes.
Ora, ficou provado precisamente o contrário do que a Autora alega, isto é, que a aposição da assinatura na Inscrição Consular foi realizada sem o conhecimento ou autorização dos respetivos utentes (facto E)).
Já discussão acerca da natureza jurídica da Inscrição Consular revela-se pouco relevante para a apreciação do desvalor disciplinar da conduta da Autora. Na realidade, o comportamento de um funcionário público apor a assinatura de um utente num documento merece uma censura jurídica muito elevada, independentemente da natureza jurídica desse documento, sendo certo que, no caso, a Inscrição Consular é manifestamente um documento oficial de serviço. Aliás, terá sido a falsificação de assinaturas / documentos a determinar a aplicação de uma medida disciplinar tão gravosa à arguida, em especial quando comparada com a decidida para os demais arguidos inquiridos.
Como decorre do processo disciplinar, esta atuação da Autora configura a prática de crime de falsificação ou contrafação de documento, punível nos termos da al. c) do n.° 1 e do n.° 4 do art.° 256.° do Código Penal, com pena de prisão de um a cinco anos quando praticado por funcionário.
Diga-se ainda que, contrariamente ao alegado pela Autora, a sanção disciplinar não está dependente da averiguação dos motivos que determinaram a conduta da Autora. Assim, as infrações disciplinares apuradas não estão dependentes da demonstração da existência de qualquer benefício pessoal ilegítimo para si, ainda que tal benefício tenha sido sugerido no depoimento de algumas testemunhas, associando-o à profissão do filho.
Também a prática do crime de falsificação de documentos não está dependente da prova da obtenção de benefício pessoal, bastando-se com a obtenção de benefício ilegítimo para terceiros. O que, no caso, se verifica, porquanto os utentes em questão lograram a conclusão dos seus procedimentos administrativos em prazo muito mais curto do que ocorreria se tivesse sido seguido a ordem de antiguidade da "planilha".
O desrespeito, por parte da Autora, das regras internas definidas pelo Cônsul- Geral quanto ao tratamento dos processos de registo civil ficou igualmente provado no processo disciplinar e no presente processo, nos termos decididos na factualidade provada e não provada.
Diga-se, aliás, que a adoção dos procedimentos referidos no facto provado C) visaram, precisamente, obstar às práticas referidas em rumores que corriam, segundo os quais alguns processos eram tratados de forma muito mais célere do que a média, associando essa celeridade a situações de favorecimento pessoal ou até mesmo de recebimento de vantagens por parte dos funcionários.
Entre essas regras procedimentais, destacavam-se o respeito pela ordem de antiguidade de entrada dos processos e a implementação de um sistema de receção e pagamento sem contacto entre o utente e o funcionário, sendo o pedido instruído por correio postal e o pagamento comprovado por correio eletrónico. Mais se decidiu que os processos só poderiam ter tramitação acelerada face ao regime instituído mediante despacho a proferir no processo.
Ora, resultou provado (factos C) a J)) que, entre março e agosto de 2011, a Autora diligenciou pelo tratamento muito mais célere do que era devido em diversos processos, os quais foram pagos diretamente no Posto Consular, tudo sem despacho no processo a autorizar esse comportamento.
Desta forma, é manifesto que a Autora desrespeitou as normas procedimentais instituídas, o que fez, necessariamente, em benefício dos utentes dos processos em questão. O que merece uma censura grave, independentemente da prova do recebimento de qualquer benefício pessoal.
Atento o exposto, a deliberação impugnada não padece de erro sobre os pressupostos de facto.
Assim sendo, a decisão impugnada não viola o princípio in dúbio pro reu, o qual pretende garantir que não seja aplicada qualquer pena sem prova suficiente dos elementos do facto típico e ilícito que a suporta.
Pelo contrário, a sanção disciplinar foi aplicada na sequência de uma instrução em que foram colhidas provas das infrações disciplinares imputadas à arguida, não havendo indícios que tenha existido um pré-juízo acerca da prática dessas infrações que possa ter ferido o princípio da presunção da inocência.
Terminada a instrução, a Instrutora deduziu relatório final devidamente fundamentado que concluiu pela prática das infrações disciplinares pelas quais a Autora foi condenada. Tal condenação baseou-se em provas que, com a certeza exigível, demonstram a prática dos factos que integram as infrações disciplinares.
Em suma, não se suscitando uma situação de dúvida na análise da prova, que teria de ser valorada a favor da arguida, também não se mostra violado o princípio in dubio pro reo.
A Autora alegou também que a sua responsabilidade se encontra excluída, nos termos do n.° 1 do art.° 5.° do Estatuto Disciplinar, por ter atuado no cumprimento de ordens ou instruções emanadas de legítimo superior hierárquico e em matéria de serviço.
É aplicável ao processo disciplinar em apreço o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (Estatuto Disciplinar) aprovado pela Lei n.° 58/2008, de 9 de setembro.
De acordo com a norma invocada pela Autora, «é excluída a responsabilidade disciplinar do trabalhador que atue no cumprimento de ordens ou instruções emanadas de legítimo superior hierárquico e em matéria de serviço, quando previamente delas tenha reclamado ou exigido a sua transmissão ou confirmação por escrito».
Ora, no julgamento da matéria de facto não foram consideradas provadas as alegações genéricas segundo as quais os processos elaborados pela Autora com desrespeito às regras procedimentais internas definidas pelo Cônsul-Geral tiveram na sua génese o consentimento escrito ou verbal da Chanceler. Como aí se referiu, nos processos em que foram apuradas irregularidades, não existe ordem escrita para que seja adotado comportamento diferentes, nem do processo disciplinar resulta indiciado que tal consentimento tenha sido verbal. Também não resultou provado que o comportamento da Autora sempre se pautou pelo cumprimento de ordens superiores, grande parte delas desprovidas de qualquer formalidade.
De qualquer modo, para efeitos da exclusão da responsabilidade disciplinar, n.° 1 do art.° 5.° do Estatuto Disciplinar exige ainda que o arguido tenha reclamado das ordens e instruções consideradas ilegítimas ou exigido a sua transmissão ou confirmação por escrito. O que não se verificou na situação em apreço.
Mais alegou a Autora a ilegalidade da medida disciplinar aplicada, por violação dos princípios da proporcionalidade e da justiça. No fundo, entende que às infrações disciplinares imputadas não corresponde a sanção disciplinar de despedimento.
Como exposto, a determinação da medida da pena insere-se no âmbito da discricionariedade administrativa decisória, só podendo ser sindicável judicialmente em caso de erro manifesto de apreciação.
Na nota de culpa, a Autora foi acusada da violação grave dos deveres de prossecução do interesse público, de zelo, de lealdade e de correção, os quais se encontram definidos, respetivamente, nos n.°s 3, 7, 9 e 10 do art.° 3.° do Estatuto Disciplinar.
No relatório final, é salientado que as infrações praticadas se enquadram nos crimes de falsificação de documentos e de abuso de poder, previstos e punidos nos termos da al. c) do n.° 1 do art.° 256.° e do art.° 382.° do Código Penal. Comportamento considerado «absolutamente inviabilizador da manutenção da relação funcional, por quebra absoluta da confiança em quem praticou atos de tão grande gravidade e que as poucas atenuantes gerais aplicáveis não são suficientes para afastar a aplicação da pena mais gravosa».
Ora, a aplicação da pena disciplinar de despedimento, por prática de infrações que inviabilizem a manutenção da relação funcional, nos termos do n.° 1 do art.° 18.° do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa Pág. 17 de 21 Estatuto Disciplinar, não se revela manifestamente inadequada ou desproporcionada na situação em apreço.
Na realidade, os factos considerados provados constituem a prática de dois tipos de crimes e as práticas criminais configuram ilegalidades agravadas, merecedoras da maior censura ético-jurídica. O crime de falsificação de documentos, nos termos acima expostos. E o crime de abuso de poder, tal como resulta do despacho do Ministério Público a que se refere o facto Q), previsto no art.° 382.° do Código Penal, segundo o qual «O funcionário que, fora dos casos previstos nos artigos anteriores, abusar de poderes ou violar deveres inerentes às suas funções, com intenção de obter, para si ou para terceiro, benefício ilegítimo ou causar prejuízo a outra pessoa, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal».
Acresce que as referidas infrações não constituem casos isolados, tendo a falsificação de documentos ocorrido 17 vezes e as situações configuráveis como abuso de poder em ainda maior número.
Ora, não é censurável que uma Entidade Pública perca em definitivo a confiança, decidindo pela cessação da relação laboral por motivos disciplinares, numa trabalhadora que por 17 vezes falsifica a assinatura de utentes em documentos oficiais do serviço. Tal comportamento encerra um desvalor e gravidade muito graves, só por si inviabilizador que tal trabalhadora possa continuar a exercer as funções públicas que vinha desempenhando, com o inerente risco de continuação de comportamentos desviantes face aos procedimentos administrativos instituídos.
Desta forma, atendendo às infrações consideradas provadas, não pode ser entendido que a pena disciplinar aplicada viole o princípio da proporcionalidade e, muito menos, que padeça de um erro manifesto de apreciação que pudesse ser sindicado judicialmente.
Por fim, a Autora invoca que a decisão impugnada desconsiderou a circunstância de não possuir antecedentes disciplinares, o facto de exercer atividade profissional para o Estado desde 1998 e «a sua postura de colaboração para a descoberta da verdade material, designadamente, ao ter confessado, de modo espontâneo, as irregularidades que cometeu».
De acordo com o art.° 22.° do Estatuto Disciplinar, são circunstâncias atenuantes especiais da infração disciplinar:
a) A prestação de mais de 10 anos de serviço com exemplar comportamento e zelo;
b) A confissão espontânea da infração.
Assim, a prestação de atividade profissional para o Estado há mais de 10 anos não constitui, só por si, uma circunstância atenuante especial da infração disciplinar. Pelo contrário, a al. a) do art.° 22.° exige que tal prestação de serviço seja caraterizada pelo exemplar comportamento e zelo, o que, como afirmado na fundamentação da decisão impugnada, impõe o reconhecimento de um desempenho especialmente meritório. Ora, no processo disciplinar não ficou provado que o desempenho de funções pela Autora desde 1998, sem registo de qualquer infração disciplinar, possa assim ser considerado. O que obsta à aplicação da circunstância atenuante especial em apreço.
Como decidido, a este propósito, pelo acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 30-05-2013, proc. n.° 0658/12:
«Sendo assim, não se trata de uma circunstância atenuante geral aplicável de forma ampla a todos os funcionários como mais uma qualquer circunstância que se apresente a favor do arguido, pelo que, o Associado do A., para dela beneficiar, teria de demonstrar que prestou mais de 10 anos de serviço com exemplar desempenho e zelo, o que de todo não se encontra provado.
A circunstância de nada existir, de negativo, averbado no seu registo disciplinar não permite que daí se infira estar-se na presença de um trabalhador que durante mais de 10 anos prestou um de serviço com exemplar desempenho e zelo. O legislador fala em exemplar desempenho e zelo e não em normal desempenho e zelo, daí resultando que essa circunstância atenuante apenas se verificará não apenas quando nada militar contra o trabalhador durante o referido período de tempo, mas quando a favor do mesmo se encontrar demonstrado que teve um percurso profissional notável em termos de desempenho e zelo, revelador de especiais qualidades profissionais, que o singularizam, constituindo a sua atuação um exercício profissional a seguir como modelo, isto é, como exemplo.
Não sendo esta a situação do Associado do A., em relação ao qual nenhuma prova existe de que tenha tido um desempenho e zelo modelar, que não se encontra atestado no seu processo individual, nele não existindo menções, louvores, dedicatórias ou outras referências, nem tendo logrado demonstrar tal situação com recurso a produção de prova testemunhal no momento processual em que o devia ter feito, caso tivesse a seu favor circunstâncias que o projetassem para esse patamar de referência, forçoso é concluir que não lhe assiste razão. »
A Autora reivindica também a ilegal desconsideração da circunstância atenuante especial da confissão espontânea da infração disciplinar, invocando, para o efeito, «a sua postura de colaboração para a descoberta da verdade material, designadamente, ao ter confessado, de modo espontâneo, as irregularidades que cometeu».
A este propósito, tem sido entendido que a confissão será tida como relevante e espontânea quando for feita em tempo útil, de forma livre, tiver contribuído decisivamente para a descoberta da verdade e não resultar da evidência dos factos (cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 12-10-2012, proc. n.° 01266/04.2BEVIS).
Como afirma Manuel-Leal Henriques (Processo Disciplinar, 3.ª edição, pág. 180) a propósito do que deva ser entendido por confissão espontânea, «Só pode ser considerada como tal a confissão que é feita em tempo útil (isto é, que seja oportuna), livre (ou seja, não provocada) e ter contribuído para a descoberta da verdade (quer dizer, não deve resultar da evidência dos factos).»
Ora, no caso em apreço, a Autora não confessou espontaneamente as infrações. Apenas admitiu a aposição das assinaturas dos utentes nas Inscrições Consulares, mas apenas quando foi interrogada e numa atitude desculpabilizadora desse comportamento. Acresce que não foi por sua iniciativa que as referidas infrações foram descobertas, tendo sido uma confissão provocada pela circunstância das infrações já serem conhecidas e de serem facilmente comprováveis mediante análise documental. E, ainda assim, invocou que o tinha feito com o consentimento dos respetivos utentes, o que se verificou não corresponder à realidade.
Ademais, negou ter sido sua iniciativa de desrespeitar os procedimentos internos estabelecidos, com benefício para a celeridade de alguns dos processos que tomou a seu cargo.
Pelo que, como decidido pelo despacho impugnado, não se verifica a circunstância atenuante prevista na al. b) do art.° 22.° do Estatuto Disciplinar.
Tudo analisado, não padecendo o ato impugnado de qualquer ilegalidade, os pedidos deduzidos na presente ação administrativa especial improcedem na íntegra.

Vejamos:
A Autora, aqui Recorrente suscita relativamente à Sentença proferida em 1ª Instância, os seguintes vícios:
i) O Tribunal a quo deu como provado matéria de facto sem qualquer prova nos autos que a sustentasse;
ii) A sentença deu como provado matéria de facto conclusiva;
iii) A medida concreta da pena mostra-se desproporcional;

Da matéria de facto
São questionados os factos provados E) e J):
Resulta da Sentença Recorrida relativamente à alínea E) dada como provada, que: "A aposição referida na alínea anterior foi realizada sem o conhecimento ou autorização dos respetivos requerentes/utentes.”

Alega a Recorrente que, o Tribunal a quo, não pode dar como provado, com base em quatro depoimentos, que a aposição das dezassete assinaturas foi feita sem o respetivo consentimento dos remanescentes utentes.

Mais se refere recursivamente que inexiste qualquer prova que a Recorrente tenha procedido à aposição de 13 assinaturas sem o conhecimento dos verdadeiros titulares, o que a leva a impugnar a matéria de facto.

Mais conclui a Recorrente que o Tribunal a quo, deveria ter dado como provado apenas que: "das aposições referidas na alínea anterior as de R......., J......., V....... e S......., foram realizadas sem o conhecimento ou autorização dos respetivos requerentes/utentes".

Em qualquer caso é manifesto que a Recorrente não cuidou de dar satisfação ao imposto no art.° 640.°, n.° 1 do CPC.

Efetivamente, o art.° 640.°, n.° 1, estabelece que a impugnação da matéria de facto, deverá:
a) Indicar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, conforme dispõe a alínea a) do art.° 640.°, n.° 1 do CPC;
b) Indicar os meios probatórios, constante dos autos, que impliquem decisão diversa, conforme determina a alínea b) do art.° 640.°, n.° 1 do CPC;
c) Indicar a decisão que, no seu entender, deve ser proferida quanto à matéria de facto;

No caso concreto, a Recorrente não cumpre o referido ónus, desde logo, quanto às alíneas b) e c) do art.° 640.°, n.° 1 do CPC, aquando da impugnação da alínea E) dos factos dados como provados.

Efetivamente, não resulta invocado e menos ainda provado, quais os meios de prova que justificam a fixação de prova diversa, não se mostrando preenchido o ónus constante da al b) do art.° 640.°, n.° 1 do CPC, pois que apenas foram mencionados de forma genérica, os concretos meios probatórios que imporiam decisão diversa.

A Recorrente, em bom rigor, limitou-se a discordar de alguma da matéria de facto fixada, sem que se alcance plenamente, por que razão discorda dos aludidos factos, sendo incontornável que foram dadas como provadas 17 falsificações.

Como refere Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil’, 4.ª Edição, Almedina, páginas 158 e 159:
“A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em alguma das seguintes situações:
(...) c) falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.)”

Refere a Recorrente singelamente que "O comportamento da autora apenas poderá ser reconduzido ao aludido desrespeito, não existindo a prática de crime de falsificação”, o que se trata de uma mera alegação e não de uma prova do alegado, sendo que, em bom rigor, estão em causa reconhecidas falsificações de assinaturas, mostrando-se o seu número relativamente indiferente, em face do que a alteração proposta, à revelia da convicção firmada em 1ª Instância, nada de substancial traria para o sentido da decisão proferida e a proferir.

Já quanto à impugnação da alínea J) da matéria de facto dada como provada, da mesma consta: “A maioria dos processos referidos nas alíneas anteriores foram elaborados em período de ausência ao serviço da Chanceler, por motivo de férias,” pretendendo a Recorrente a sua eliminação, considerando que inexiste qualquer matéria factual.

Em qualquer caso, é claro que a referida circunstância se consubstancia num facto, a saber, a situação de férias da Chanceler, o que se mostra documentalmente comprovado.

Efetivamente, é incontornável que dos 35 processos elencados das alíneas G) a I) da matéria de facto dada como provada, 20 deles, os mencionados na alínea I) da matéria de facto dada como provada, foram realizados no período de 13.06.2011 a 8.07.2011, ou seja, no período em que a Chanceler se encontrava de férias.

Sempre se diga, em qualquer caso, que a eventual alteração do controvertido facto, nada traria de substancial para o sentido da decisão proferida ou a proferir.

Sendo a intervenção do Tribunal de Recurso excecional relativamente à alteração da matéria de facto, não se vislumbra que estejam reunidos os pressupostos que o pudessem justificar essa intervenção (Cfr. art.° 2.°, n.° 1 e 130.° do CPC).

Da medida da pena – Proporcionalidade
Relativamente à questão epigrafada, entende a Recorrente que o Tribunal a quo deveria ter concluído pela desproporcionalidade da pena, defendendo que a sentença não avaliou, corretamente, a adequação da sanção disciplinar;

Refira-se, desde logo que não compete aos Tribunais apreciar a medida concreta da pena, salvo em casos de erro grosseiro e manifesto, o que aqui se não vislumbra, pois que tal se insere no poder discricionário da Administração.

Como se afirmou em 1ª Instância, não é censurável que uma Entidade Pública perca em definitivo a confiança, decidindo pela cessação da relação laboral por motivos disciplinares, numa trabalhadora que por 17 vezes falsifica a assinatura de utentes em documentos oficiais do serviço. Tal comportamento encerra um desvalor e gravidade muito graves, só por si inviabilizador que tal trabalhadora possa continuar a exercer as funções públicas que vinha desempenhando, com o inerente risco de continuação de comportamentos desviantes face aos procedimentos administrativos instituídos.”

Como se afirmou já, mesmo que se admitisse a alteração à matéria de facto dada como provada, à revelia da convicção firmada pelo tribunal de 1ª Instância, ainda assim, a mera falsificação de quatro assinaturas consubstanciar-se-ia, numa infração disciplinar grave, suscetível, só por si, de inviabilizar a manutenção da relação funcional, determinante da aplicação de uma pena de demissão.

De resto, a imputada falsificação de assinaturas em dezassete Inscrições Consulares imputáveis à Apelante, mostra-se violadora do artigo 256.° do Código Penal.

Efetivamente, independentemente do número de falsificações, sempre o comportamento da aqui Recorrente constitui a violação dos deveres gerais de prossecução de interesse público, subsumível no estatuído no artigo 256.°, n.° 1, alínea c) do Código Penal, por existir um abuso de assinatura de terceiro, punível com uma pena de prisão até três anos, sendo que o n.° 4 do artigo 256.° do CP, estabelece um agravamento da pena até cinco anos, quando seja praticado por funcionário no exercício de funções, como sucede no caso em análise.

Entende-se pois, também a este respeito, que bem andou o tribunal a quo ao ter decidido com decidiu, e ter discorrido no seu discurso fundamentador o seguinte:
“Na realidade, os factos considerados provados constituem a prática de dois tipos de crimes e as práticas criminais configuram ilegalidades agravadas, merecedoras da maior censura ético-jurídica. O crime de falsificação de documentos, nos termos acima expostos.
E o crime de abuso de poder, tal como resulta do despacho do Ministério Público a que se refere o facto Q), previsto no art.° 382.° do Código Penal, segundo o qual «O funcionário que, fora dos casos previstos nos artigos anteriores, abusar de poderes ou violar deveres inerentes às suas funções, com intenção de obter, para si ou para terceiro, benefício ilegítimo ou causar prejuízo a outra pessoa, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal». Acresce que as referidas infrações não constituem casos isolados, tendo a falsificação de documentos ocorrido 17 vezes e as situações configuráveis como abuso de poder em ainda maior número.
Ora, não é censurável que uma Entidade Pública perca em definitivo a confiança, decidindo pela cessação da relação laboral por motivos disciplinares, numa trabalhadora que por 17 vezes falsifica a assinatura de utentes em documentos oficiais do serviço.
Tal comportamento encerra um desvalor e gravidade muito graves, só por si inviabilizador que tal trabalhadora possa continuar a exercer as funções públicas que vinha desempenhando, com o inerente risco de continuação de comportamentos desviantes face aos procedimentos administrativos instituídos.
Desta forma, atendendo às infrações consideradas provadas, não pode ser entendido que a pena disciplinar aplicada viole o princípio da proporcionalidade e, muito menos, que padeça de um erro manifesto de apreciação que pudesse ser sindicado judicialmente."

Mais se afirmou em 1ª Instância que "tal comportamento encerra um desvalor e gravidade muito graves, só por si inviabilizador que tal trabalhadora possa continuar a exercer funções públicas que vinha desempenhado, com o inerente risco de continuação de comportamentos desviantes face aos procedimentos administrativos instituídos”.

O facto de a Recorrente invocar a suspensão provisória do processo crime para fundamentar a desproporcionalidade da pena, de modo a tentar evidenciar que o Ministério Público considerou inexistir um grau de culpa elevado, mostra-se um entendimento temerário e abusivo do que terá sido o entendimento do Ministério Público, sendo que, e em qualquer caso, o processo disciplinar é independente do Processo crime.

Ficou igualmente por provar que tenham sido aplicadas sanções mais leves a outros funcionário decorrentes de práticas igualmente ilícitas.

Como afirmou ainda o Tribunal a quo, “Na realidade, o comportamento de um funcionário público apor a assinatura de um utente num documento merece uma censura jurídica muito elevada, independentemente da natureza jurídica desse documento, sendo certo que, no caso, a Inscrição Consular é manifestamente um documento oficial de serviço"

No que respeita já à confissão feita pela aqui Recorrente, refira-se que, ainda assim, que “tem sido entendido que a confissão será tida como relevante e espontânea quando for feita em tempo útil, de forma livre, tiver contribuído decisivamente para a descoberta da verdade e não resultar da evidência dos factos (cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 12-10-2012, proc. n.°01266/04.2BEVIS).

Igualmente afirma Manuel-Leal Henriques (Processo Disciplinar, 3.ª edição, pág. 180) que «Só pode ser considerada como tal a confissão que é feita em tempo útil (isto é, que seja oportuna), livre (ou seja, não provocada) e ter contribuído para a descoberta da verdade (quer dizer, não deve resultar da evidência dos factos).»

Em concreto, a confissão feita não foi espontânea, antes tendo resultado da evidencia dos factos, nada de substancial tendo trazido para o desfecho do Processo.

Em face de tudo quanto supra vem expendido, entende-se que não merece censura a decisão recorrida.
* * *
Deste modo, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo, subsecção social do presente Tribunal Central Administrativo Sul, negar provimento ao Recurso, confirmando-se a Sentença Recorrida.
Custas pela Recorrente
Lisboa, 25 de janeiro de 2023
Frederico de Frias Macedo Branco

Rui Pereira

Carlos Araújo