Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05555/12
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:11/14/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:NULIDADE DA SENTENÇA. FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DE FACTO.
ARTº.615, Nº.1, AL.B), DO C.P.CIVIL.
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
CONCEITO DE CUSTOS EM SEDE DE I.R.C.
PAGAMENTO A ENTIDADES NÃO RESIDENTES E SUJEITAS A UM REGIME FISCAL PRIVILEGIADO.
ARTº.57-A, DO C.I.R.C.
Sumário:1. Nos termos do preceituado no citado artº.668, nº.1, al.b), do C.P.Civil (cfr.actual artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.659, nº.3, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação. No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto da decisão, como causa de
nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário.

2. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).

3. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

4. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.

5. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.

6. Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito. Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico.

7. Consagrava o artº.57-A, do C.I.R.C., em vigor em 1998, o procedimento de pagamento a entidades não residentes e sujeitas a um regime fiscal privilegiado. Da exegese da norma deve concluir-se que não são dedutíveis fiscalmente as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a entidades residentes num território com um regime fiscal claramente mais favorável a não ser que o contribuinte demonstre que estão cumpridos dois requisitos, que são:
a-Estarmos perante operações efectivamente realizadas;
b-Que não têm um carácter anormal ou que o montante em causa não é exagerado.

8. Estamos perante norma anti-abuso específica, criada com o objectivo de combater a fraude e evasão fiscal, dada a sua cada vez maior dimensão internacional, resultante da crescente internacionalização das empresas, da maior mobilidade das pessoas e dos capitais e do próprio desenvolvimento das técnicas utilizadas para o efeito, tudo conforme se retira do exame do preâmbulo do citado dec.lei 37/95, de 14/2, para o efeito se invertendo o ónus da prova que passa a onerar o sujeito passivo nos termos do nº.1 do preceito. No entanto, no seu nº.2, a norma consagra índices ou pressupostos que à Administração Fiscal cumpre demonstrar querendo accionar a mesma (cfr.artº.74, nº.1, da L.G.T.): quando no território de residência a pessoa singular ou colectiva esteja sujeita a um regime fiscal claramente mais favorável, devido a não tributação em I.R.C. ou, estando sujeita a tributação quanto aos rendimentos em causa, esta seja inferior a 20%.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
“I............., S.A.”, com os demais sinais dos autos que aqui se dão por reproduzidos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.234 a 244 do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedente a impugnação pelo recorrente intentada tendo por objecto liquidações de I.R.C. e juros compensatórios, relativas aos anos fiscais de 1997 e 1998 e no montante total de € 411.026,20.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.256 a 260 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-A recorrente entende que o Tribunal "a quo" incorreu em erro na apreciação e valoração da matéria de facto, nomeadamente quanto à prova atinente à aceitação do custo com comissões pagas à empresa "C....... Investments …................" no ano de 1998, e, consequentemente, incorreu em erróneo julgamento da matéria de direito;
2-A douta sentença, quanto a esta matéria, apenas dá por provado o ponto 5 do probatório (o qual remete para o Capítulo III do relatório de inspecção), acrescentando que a produção de prova testemunhal não foi relevante pois a prova do alegado era realizada por documento ou pela ausência dele;
3-Coloca-se, então, a questão de se saber que meios de prova são admissíveis quanto aos custos incorridos, sua materialidade e indispensabilidade, e de que modo devem ser valoradas as provas produzidas nos autos;
4-Admite a recorrente que o meio de prova mais relevante, quanto à admissibilidade de custos, é o documental;
5-No entanto, em sede de I.R.C., a jurisprudência nacional tem enten­dido que o documento justificativo do custo não equivale, nem exige o forma­lismo previsto nas facturas, em sede de I.V.A., ou dito de outro modo, em sede de I.R.C., o documento comprovativo ou justificativo do custo não se equipara ou confunde com a factura;
6-Acresce que, em matéria de prova de custos incorridos, esta não se cinge a documentos e tem sido entendido pela jurisprudência dos tribunais fiscais a admissão de outros meios de prova, nomeadamente a prova testemu­nhal, para comprovar a efectividade e indispensabilidade do custo;
7-Ora, reportando-nos ao caso dos autos, quanto à prova da efectiva realização da despesa, foi levado ao conhecimento do douto Tribunal "a quo", designadamente o documento 20 junto à p.i. (e que foi apresentado à Adminis­tração Fiscal aquando da inspecção), documento comprovativo da sua efectivi­dade;
8-Documento este que não foi sequer valorado, isto é, na douta sen­tença recorrida não se emitiu um juízo de valor sobre a sua (ir)relevância, seja para provar os factos, ou dá-los como não provados;
9-Ademais, o registo contabilístico da operação (pagamento de comis­sões) devia ter sido em si mesmo valorado como prova da efectividade das despesas, tanto mais que a veracidade da contabilidade da inspecciona­da/recorrente não foi posta em causa pela Administração Fiscal, e porque, em sede de inspecção, foram aceites como custos dedutíveis outras despesas (estudo de mercado) pagas à mesma entidade receptora das comissões;
10-Por outro lado, a prova testemunhal produzida deve ser valorada para se aquilatar se o custo incorrido pela empresa com comissões foi indis­pensável à obtenção dos proveitos ou à manutenção da fonte produtora;
11-As testemunhas ouvidas explicaram, com razão de ciência, de for­ma clara e objectiva a forma como funcionava o mercado dos moldes, em especial o mercado externo, e de como a indústria de moldes recorre aos comissionistas, ou angariadores de clientes, bem como explicaram as margens médias praticadas e que as comissões dependiam da concretização e paga­mento do projecto/molde pelos clientes finais;
12-Pelo que, a prova testemunhal produzida nos autos contraria a afirmação ou conclusão extraída pelos serviços inspectivos da Administração Fiscal, dado como facto provado no ponto 5 do probatório da douta sentença recorrida;
13-Nestes termos, a recorrente entende que cumpriu o ónus que lhe cabia, alegando e provando a efectividade do custo e a sua indispensabilidade;
14-Entende a recorrente, que a prova documental e testemunhal pro­duzida, por não ter sido apreciada e valorada pela Meritíssima Juíza "a quo", determinou uma errada apreciação dos factos;
15-Apreciação e valoração da prova que não podia ter sido omitida, devendo ter sido indagadas, à luz do princípio do inquisitório, todas as ques­tões alegadas quanto à errónea quantificação da matéria colectável, em espe­cial quanto à não aceitação como custo fiscal das comissões;
16-O douto Tribunal "a quo" aceitou como suficiente a fundamentação do acto tributário, quanto às comissões, porém, omitiu-se de apreciar os factos alegados pela impugnante e a respectiva prova e pronunciar-se sobre a erró­nea quantificação da matéria colectável, no que concerne à não aceitação dos custos com comissões;
17-Ao decidir como decidiu, o Tribunal "a quo" omitiu a apreciação e valoração da prova produzida, incorrendo em errónea apreciação da matéria de facto e tendo violado o artº.659, nº.3, do C.P.C.;
18-Termos em que deve o presente recurso ser julga­do procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, anulando-se a liquidação de I.R.C. do ano de 1998, na parte proporcional aos custos corrigidos relativos a comissões debitadas à recorrente pela firma "Cothi Investiments Limited".
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de se negar provimento ao recurso e se manter a sentença recorrida (cfr.fls.275 a 277 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.279 e 280 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.235 a 238 dos autos):
1-A impugnante, “I..................., S.A.”, com o n.i.p.c. …............. e com sede em Rua …................. - P............... - …............, encontrava-se, à data dos factos a exercer a actividade de comércio por grosso de máquinas e ferramentas (cfr.cópia de relatório da inspecção tributária junta a fls.50 a 63 dos presentes autos);
2-No âmbito do procedimento interno de inspecção e análise à declaração Mod. 22 de I.R.C. do ano de 1997, datado de 06/02/2001, foram efectuadas as correcções que abaixo se descriminam:

“(…)
DESIGNAÇÃO CORRESPONDENTE AO CAMPO DA DECLARAÇÃO OBJECTO DE CORRECÇÃO
Campo
PERIODO/ANO/EXERCICIO DE 1997
Valor declarado
Correcção
Valor após correcção
Valor
Item Rel
Reintegrações não aceites
323
1.723.665$
12.151.695$
13.875.360$
Correcção em crédito de imposto
335
4.796.236$
-1.839.628$
2.956.608$
20% enc. c/ viaturas lig. passageiros
339
5.541.202$
64.861$
5.606.063$
Custos não aceites 23.° CIRC
341
0$
2.241.899$
2.241.599$
Menos-Valias fiscais
346
44.237$
-44.237$
0$
Proveitos não fiscais
-
0$
13.231$
13.231$
(…)”
(cfr.documentos juntos a fls.36 e 145 a 148 dos presentes autos);
3-Das correcções resultantes da análise interna e identificadas no nº.2 foi dado conhecimento à impugnante por carta registada (cfr.documentos juntos a fls.143 e 144 dos presentes autos);
4-Os Serviços de Inspecção Tributária da D.F. de Leiria procederam a uma acção inspectiva às empresas que integram o perímetro de consolidação do Grupo I................., a coberto das Ordens de Serviço que a seguir se discriminam, motivada por dúvidas surgidas na análise interna das declarações de rendimentos mod. 22 (cfr.cópia de relatório da inspecção tributária junta a fls.50 a 63 dos presentes autos):

Ord. Serv.
Destinatário
Data de início
Âmbito
Extensão
54630
I................., SA. (Entidade consolidante)
14/05/2002
Par./IRC
1997
54631
I..............., SA. (Entidade consolidante)
14/05/2002
Geral
1998
57036
S............. Soc. Eng. e T.................., SA
02/07/2002
Par./IRC
1997/1998
57037
E.............. Carreira …....., Lda.
02/07/2002
Par./IRC
1998

a) A Ordem de serviço n.° 54630, tem o Cód. Pnait 22314 e foi ali determinado proceder-se a Inspecção externa à empresa I................, SA. por despacho de 05/04/2002, assinado pelo responsável, Inspector Tributário Adelino d............................. (cfr.documento junto a fls.186 dos presentes autos);
b) A Ordem de serviço n.° 54631, tem o Cód. Pnait 22334 e foi ali determinado proceder-se a Inspecção externa à empresa I................, SA. por despacho de 05/04/2002, assinado pelo responsável, Inspector Tributário Adelino d.................... (cfr.documento junto a fls.188 dos presentes autos);
c) A Ordem de serviço n.° 54636, tem o Cód. Pnait 22314 e foi ali determinado proceder-se a Inspecção externa à empresa S........ Soc. Eng. e Transformação SA. por despacho de 02/07/2002, assinado pelo responsável, Inspector Tributário Adelino ….................. (cfr.documento junto a fls.193 dos presentes autos);
d) A Ordem de serviço n.° 54637, tem o Cód. Pnait 22314 e foi ali determinado proceder-se a Inspecção externa à empresa E.......... Carreira …......., Lda. por despacho de 02/07/2002, assinado pelo responsável, Inspector Tributário Adelino …..................... (cfr.documento junto a fls.191 dos presentes autos);
5-Do relatório elaborado no âmbito da inspecção supra descrita consta no capítulo III a descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável, que aqui se dá por integralmente reproduzido, transcreve-se apenas a descrição sucinta das respectivas conclusões (cfr.cópia de relatório da inspecção tributária junta a fls.50 a 63 dos presentes autos):
“(…)
I-2. Descrição sucinta das conclusões da acção de inspecção
1.2.1. As correcções ao resultado tributável consolidado são as constantes do quadro seguinte e resultam da soma das correcções indicadas nos pontos 1.2.1.1.,1.2.1.2., 1.2.1.3 e 1.2.1.4:

1998 em Esc. 1998 em Euros 1997 em Esc. 1997 em Euros
40% aumento reint.result. reav
(...)
-13.661,98
(...)
-566,81
Reintegrações não aceites
(...)
65.222,99
(...)
9.343.50
IRC
(...)
1.893,34
(...)
Juros compensatórios
(...)
324,37
(...)
Despesas não documentadas
(...)
2.169,77
(...)
Despesas de representação
(...)
2.291,86
(...)
260,15
20% enc. Com viat. Lig. Passag.
(...)
-303.10
(...)
Custos não aceites
(...)
288.643,46
(...)
463.714,75
Mais-valias contabilísticas
(...)
1.995,19
(...)
Totais
(...)
348.575,90
(...)
472.751,59
1.2.1.1. I................., SA (individual)
1998 em Esc. 1998 em Euros 1997 em Esc. 1997 em Euros
40% aumento reint.result. reav
(...)
-2.274,79
(...)
Reintegrações não aceites
(...)
62.430,24
(...)
7.173,24
IRC
(...)
1893,34
(...)
Juros compensatórios
(...)
324,37
(...)
Despesas não documentadas
(...)
2.169,77
(...)
Despesas de representação
(...)
2.291,86
(...)
260,15
20% enc. Com viat. Lig. Passag.
(...)
-1.064,16
(...)
Custos não aceites
(...)
7.127,82
(...)
Totais
(...)
72.898,45
(...)
7.433,39
1.2.1.2. S........... Soc. Eng. e T.................., SA (individual)
1998 em Esc. 1998 em Euros 1997 em Esc. 1997em Euros
40% aumento reint.result. reav
(...)
-10.227,45
(...)
Reintegrações não aceites
(...)
27,93
(...)
20% enc. Com viat. Lig. Passag.
(...)
50,50
(...)
Custos não aceites
(...)
279.341,76
(...)
463.714,75
Totais
(...)
269.192,74
(...)
463.714,75
1.2.1.3.E........... Carreira …..........., Lda. (individual)
1998 em Esc. 1998 em Euros 1997 em Esc. 1997 em Euros
40% aumento reint.result. reav
(...)
-1.159,74
(...)
-566,81
Reintegrações não aceites
(...)
2.764,82
(...)
2.170,26
20% enc. Com viat. Lig. Passag.
(...)
710,56
(...)
Custos não aceites
(...)
2.173,88
(...)
Totais
(...)
4.489,52
(...)
1.603,45
1.2.1.4 Operações de consolidação - As correcções referem-se a mais-valias contabilísticas e são de 400.000$ (Euros 1.995,19).
1.2.2 As correcções ao quadro 19 da declaração de consolidação de exercício de 1998 são as seguintes:
1.2.2.1. À tributação autónoma das despesas confidenciais de 130.500$ (650,93 Euros). Esta correcção resulta da efectuada à I................. SA (individual), conforme pontos 3.1.8 e 3.1.9.
1.2.2.2. Ao valor deduzido referente ao CFI de 737.759500 (3.679,93 Euros). Esta correcção resulta da soma das efectuadas individualmente à S............. Soc. Eng. E T............. SA e Edilásio................., Lda., conforme pontos 3.3.6 e 3.5.8.
(…)”;
6-A impugnante teve conhecimento do projecto de relatório por carta registada e datada de 30/08/2002, com a indicação de prazo, para, querendo, exercer o direito de audição (cfr.documentos juntos a fls.153 e 154 dos presentes autos);
7-O relatório de inspecção externa supra referido obteve despacho de concordância por parte do Chefe de Divisão João …......................, por delegação (cfr.documento junto a fls.157 dos presentes autos);
8-A impugnante teve conhecimento do conteúdo do relatório supra, por carta registada com aviso de recepção que foi assinado em 23/09/2002, que lhe foi endereçada pela D.F. de Leiria - Serviços de Inspecção Tributária (cfr.documentos juntos a fls.176 e 177 dos presentes autos);
9-A impugnante teve conhecimento dos actos de liquidação por cartas que lhe foram remetidas pelos Serviços Centrais da DGCI - Ministério das Finanças, Direcção-Geral dos Impostos, Balcão Central I.R.C. - e assinada (mecanograficamente) pelo então Director Geral - Armindo …................- do doc. de cobrança 2002 8310033879 de 1997 e 2002 8310033880 de 1998, com data limite de pagamento em 6/11/2002 (cfr.documentos nºs.1 e 2 juntos à p.i. de fls.24 e 25 dos presentes autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Dos factos com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram outros que em face das várias soluções de direito importe registar como não provados…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A convicção do Tribunal no estabelecimento deste quadro factológico fundou-se no teor dos documentos citados nas alíneas supra.
Com a produção da prova testemunhal nada foi acrescentado de relevante atento a que os fundamentos invocados se referem ao procedimento inspectivo e por conseguinte são documentalmente suportados, sendo a sua prova realizada pelo documento ou pela ausência dele…”.
X
Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e levando em consideração que o recorrente impugna, parcialmente, a decisão da matéria de facto constante da sentença objecto do presente recurso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
10-As liquidações de I.R.C. e juros compensatórios identificadas no nº.9 supra são relativas aos anos de 1997 e 1998, sendo a primeira no montante total de € 248.168,60 e a segunda no quantitativo total de € 162.857,61 (cfr.documentos juntos a fls.24 e 25 dos presentes autos);
11-Do relatório identificado no nº.5 supra do probatório, no âmbito das correcções realizadas à empresa “S............. - Sociedade de …............ e T............., S.A.”, a qual integrava o perímetro de consolidação do “Grupo I......................”, a A. Fiscal não aceitou custos contabilizados na conta 622280540 (Comissões), custos estes relativos ao ano de 1998, com base na seguinte fundamentação (cfr.ponto 3.3.5 do relatório junto a fls.50 a 63 dos presentes autos):
“(…)
3.3.5. Contabilizou conta 622280540 (comissões), com base em facturas sem número emitidas por C.......... I.................... Limited, entidade sediada na Ilha de Jersey, diversos valores que ascendem a 55.415.176$00 em 1998 e 92.966.460$00 em 1997. Nos mesmos exercícios pagou a esta entidade o valor de 208.988.881$00, que respeita a parte daqueles custos e outros contabilizados em anos anteriores. Dado tratar-se de rendimentos pagos a entidades não residentes, sujeitas a um regime fiscal privilegiado, procedeu-se à notificação da empresa, nos termos do actual artº.59 do C.I.R.C., em 17/7/2002, para apresentar prova de que os valores antes mencionados correspondem a operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado. Analisada a resposta dada bem como a documentação apresentada, não consideramos correctamente feita a prova porque a empresa se limitou a presentar a documentação contabilística e uma relação de clientes e facturas, sem qualquer justificação para a cessação destas comissões em Fevereiro de 1998. Assim, não se aceita como custo o valor de 55.415.176$00 (documento interno 01050118), que foi pago em 20/3/1998 (artº.23 do C.I.R.C.).
(…).
12-Na resposta à notificação mencionada no nº.11 a sociedade notificada apresentou junto dos serviços da Inspecção Tributária o requerimento cuja cópia se encontra a fls.69 e 70 dos presentes autos, tal como os documentos anexos de fls.71 a 120 dos presentes autos, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
X
Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos em cada um dos números do probatório.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida, em síntese, julgou totalmente improcedente a impugnação pelo recorrente intentada tendo por objecto as liquidações de I.R.C. e juros compensatórios, relativas aos anos fiscais de 1997 e 1998 (cfr.nº.10 do probatório).
X
Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Levando em consideração o trânsito em julgado da sentença da 1ª. Instância nesta parte (cfr.artº.635, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) não deve este Tribunal apreciar a sentença recorrida no trecho que manteve a liquidação de I.R.C. relativa ao ano de 1997, tal como na relativa ao ano de 1998, com excepção da correcção referente a comissões pagas pelo recorrente e identificada no nº.11 do probatório supra.
O apelante aduz, antes de mais, que ao decidir como decidiu, o Tribunal "a quo" omitiu a apreciação e valoração da prova produzida, incorrendo em errónea apreciação da matéria de facto e tendo violado o artº.659, nº.3, do C.P.C. (cfr.conclusão 17 do recurso), com base em tal argumentação pretendendo, supõe-se, consubstanciar nulidade da decisão recorrida devido a falta de especificação dos fundamentos de facto.
Dissequemos se a decisão recorrida padece de tal vício.
Nos termos do preceituado no citado artº.668, nº.1, al.b), do C.P.Civil (cfr.actual artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.659, nº.3, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.139 a 141; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.687 a 689; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36).
No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, norma onde estão consagrados todos os vícios (e não quaisquer outros) susceptíveis de ferir de nulidade a sentença proferida em processo judicial tributário (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.357 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.871/10; ac.S.T.A-2ª.Secção, 13/10/2010, rec.218/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/5/2013, proc.6406/13).
Voltando ao caso concreto, conforme se retira do exame da decisão recorrida constante de fls.234 a 244 do presente processo e do exarado supra quanto à fundamentação da matéria de facto da sentença do Tribunal “a quo”, é a mesma manifestamente improcedente, visto que o vício que consubstancia esta nulidade, conforme supra mencionado, consiste na falta de fundamentação absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente.
Concluindo, improcede o presente esteio do recurso incidente sobre a alegada falta de especificação dos fundamentos de facto da decisão recorrida.
O recorrente discorda do julgado, alegando em segundo lugar e como supra se alude, que o Tribunal "a quo" incorreu em erro na apreciação e valoração da matéria de facto, nomeadamente quanto à prova atinente à aceitação do custo com comissões pagas à empresa "C.............I.............. Limited" no ano de 1998. Que a sentença recorrida, quanto a esta matéria, apenas dá por provado o ponto 5 do probatório (o qual remete para o Capítulo III do relatório de inspecção), acrescentando que a produção de prova testemunhal não foi relevante pois a prova do alegado era realizada por documento ou pela ausência dele. Que quanto à prova da efectiva realização da despesa com comissões, foi levado ao conhecimento do Tribunal "a quo", designadamente o documento 20 junto à p.i. (e que foi apresentado à Adminis­tração Fiscal aquando da inspecção), documento comprovativo da efectivi­dade do mesmo custo. Que o registo contabilístico da operação (pagamento de comis­sões) devia ter sido em si mesmo valorado como prova da efectividade das despesas, tanto mais que a veracidade da contabilidade da inspecciona­da/recorrente não foi posta em causa pela Administração Fiscal, e porque, em sede de inspecção, foram aceites como custos dedutíveis outras despesas (estudo de mercado) pagas à mesma entidade receptora das comissões. Que a prova testemunhal produzida deve ser valorada para se aquilatar se o custo incorrido pela empresa com comissões foi indis­pensável à obtenção dos proveitos ou à manutenção da fonte produtora. Que as testemunhas ouvidas explicaram, com razão de ciência, de for­ma clara e objectiva a forma como funcionava o mercado dos moldes, em especial o mercado externo, e de como a indústria de moldes recorre aos comissionistas, ou angariadores de clientes, bem como explicaram as margens médias praticadas e que as comissões dependiam da concretização e paga­mento do projecto/molde pelos clientes finais (cfr.conclusões 1, 2, 7 e 9 a 15 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de facto da sentença recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal pecha.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/11/2012, proc.6011/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11).
Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.
No caso concreto, não pode deixar de estar votado ao insucesso o fundamento do recurso em análise devido a manifesta falta de cumprimento do ónus mencionado supra, no que diz respeito à prova testemunhal produzida em 1ª. Instância, dado que não concretiza o recorrente quais os concretos depoimentos testemunhais que obrigariam a uma decisão diferente no que se refere à alegada aceitação como custos dedutíveis das comissões pagas à sociedade "C..........I..................... Limited" no ano de 1998.
Abordemos, agora, a prova documental constante do processo.
Conforme reconhece o apelante, a factualidade relativa à não aceitação, pela A. Fiscal, como custos dedutíveis das comissões alegadamente pagas à sociedade "C......... I................ Limited" no ano de 1998 já consta do nº.5 do probatório, estruturado pelo Tribunal “a quo”, no qual se dá por integralmente reproduzido o relatório da inspecção que fundamentou a liquidação de I.R.C. do ano de 1998.
Apesar disso, remete-se o recorrente para a factualidade aditada ao probatório por este Tribunal e supra exarada (cfr.nºs.11 e 12 da matéria de facto), factualidade essa que concretiza, se bem percebemos, o que defende o apelante quanto ao que se deve extrair da produção de prova documental no âmbito dos presentes autos.
O recorrente dissente do julgado alegando, por último, que o Tribunal "a quo" incorreu em erro de julgamento da matéria de direito quanto à prova atinente à aceitação do custo com comissões pagas à empresa "C.........I.................. Limited" no ano de 1998. Que cumpriu o ónus que lhe cabia, alegando e provando a efectividade dos custos em causa e a sua indispensabilidade. Que deve ser revogada a sentença recorrida, anulando-se a liquidação de I.R.C. do ano de 1998, na parte proporcional aos custos corrigidos relativos a comissões debitadas à recorrente pela firma "C............... I................ Limited" (cfr.conclusões 1, 13 e 18 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de direito da sentença recorrida.
Deslindemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Conforme se retira da factualidade provada, a A. Fiscal não aceitou como custo o valor de 55.415.176$00, o qual foi pago em 20/3/1998 pela sociedade impugnante à empresa "Cothi Investiments Limited", entidade sediada na Ilha de Jersey, dado tratar-se de rendimentos pagos a entidade não residente e sujeita a um regime fiscal privilegiado, tudo ao abrigo dos artºs.23 e 59, do C.I.R.C. (cfr.nº.11 do probatório).
Por sua vez, o recorrente defende que tais custos devem ser aceites, atenta a prova produzida, nomeadamente os documentos que juntou a fls.71 a 120 dos presentes autos (cfr.nº.12 da factualidade provada).
Tem razão o recorrente.
Expliquemos porquê.
A base de incidência do I.R.C. encontra-se consagrada no artº.3, do C.I.R.C., sendo, nos termos do seu nº.2, definido o lucro tributável como o resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.
Por outro lado, é no artº.17 e seg. do mesmo diploma que se consagram as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no artº.23 quais os custos que, como tal, devem ser considerados pela lei.
Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/2/2012, proc.4690/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc. 5721/12; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Lex Lisboa 2000, 2ª. Edição, pág.237 e seg.; António Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pág.101 e seg.).
Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/2/2012, proc.4690/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc. 5721/12; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.206 e seg.).
Além do examinado artº.23, do C.I.R.C., a A. Fiscal igualmente fundamentou a não aceitação como custo das alegadas comissões pagas pelo recorrente à empresa "C............. I.................. Limited" no artº.59, do C.I.R.C.
Dir-se-á, antes de mais, que é hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr.artº.11, da L.G. Tributária; artº.9, do C.Civil; José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, Editorial Verbo, 4ª. edição, 1987, pág.335 e seg.; J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1989, pág.181 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de C.T.Fiscal, nº.174, 1996, pág.363 e seg.).
Consagrava o artº.59, do C.I.R.C., o procedimento de pagamento a entidades não residentes e sujeitas a um regime fiscal privilegiado (cfr.artº.57-A, do C.I.R.C., em vigor em 1998; artº.65, do C.I.R.C., actualmente em vigor).
O citado artº.57-A, do C.I.R.C., na redacção derivada do dec.lei 37/95, de 14/2 (redacção aplicável ao caso “sub judice” - artº.12, do C.Civil), estatuía:
1 - Não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo puder provar que tais encargos correspondem a operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.
2 - Considera-se que uma pessoa singular ou colectiva está submetida a um regime fiscal claramente mais favorável quando no território de residência da mesma não for tributada em imposto sobre o rendimento ou, relativamente às importâncias pagas ou devidas mencionadas no número anterior, houver lugar a uma tributação sobre o rendimento nesse território inferior a 20%.
(…)
Da exegese da norma deve concluir-se que não são dedutíveis fiscalmente as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a entidades residentes num território com um regime fiscal claramente mais favorável a não ser que o contribuinte demonstre que estão cumpridos dois requisitos, que são:
1-Estarmos perante operações efectivamente realizadas;
2-Que não têm um carácter anormal ou que o montante em causa não é exagerado.
Estamos perante norma anti-abuso específica, criada com o objectivo de combater a fraude e evasão fiscal, dada a sua cada vez maior dimensão internacional, resultante da crescente internacionalização das empresas, da maior mobilidade das pessoas e dos capitais e do próprio desenvolvimento das técnicas utilizadas para o efeito, tudo conforme se retira do exame do preâmbulo do citado dec.lei 37/95, de 14/2, para o efeito se invertendo o ónus da prova que passa a onerar o sujeito passivo nos termos do nº.1 do preceito (cfr.Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, O controlo e combate às práticas tributárias nocivas, C.T.F. nº.409/410, pág.119 e seg.; J. L. Saldanha Sanches, Os limites do planeamento fiscal, Coimbra Editora, 2006, pág.202 e seg.).
No entanto, no seu nº.2, o preceito consagra índices ou pressupostos que à Administração Fiscal cumpre demonstrar querendo accionar a norma (cfr.artº.74, nº.1, da L.G.T.): quando no território de residência a pessoa singular ou colectiva esteja sujeita a um regime fiscal claramente mais favorável, devido a não tributação em I.R.C. ou, estando sujeita a tributação quanto aos rendimentos em causa, esta seja inferior a 20%. (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 15/3/2006, rec.1078/05; ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2008, rec. 188/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 21/4/2009, proc.2892/09).
Revertendo ao caso dos autos, do exame do probatório claramente se conclui que a A. Fiscal somente se refere ao facto da sociedade "C....... I................Limited" ser uma entidade sediada na Ilha de Jersey (cfr.nº.11 da factualidade provada). Assim não fazendo prova dos pressupostos de aplicação da norma acabados de identificar.
Por assim ser, porque não se encontra demonstrada a existência de um regime fiscalmente mais favorável e, portanto, a possibilidade de aplicação do regime previsto no examinado artº.57-A, do C.I.R.C., nem sequer se equaciona a questão de saber se o recorrente demonstrou ou não a efectivação das despesas realizadas e o seu carácter não anormal ou com montante exagerado (cfr.nº.1 do preceito), antes se devendo concluir que o acto de liquidação em causa se encontra ferido do vício de violação de lei e, como tal, devendo ser anulado nesta parte.
Concluindo, julga-se procedente este fundamento do recurso e, consequentemente, revoga-se a sentença recorrida no que respeita à liquidação de I.R.C. relativa ao ano de 1998 e identificada nos nºs.9 e 10 do probatório, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO E REVOGAR A DECISÃO RECORRIDA, NO TRECHO NÃO TRANSITADO EM JULGADO, mais se anulando a liquidação de I.R.C. do ano de 1998, na parte proporcional aos custos não aceites relativos a comissões debitadas à recorrente pela firma "C........... I............ Limited" e devidamente identificados no nº.11 do probatório supra.
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Sem custas, porque a Fazenda Pública delas se encontrava isenta à data da instauração destes autos.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 14 de Novembro de 2013


(Joaquim Condesso - Relator)

(Eugénio Sequeira - 1º. Adjunto)

(Aníbal Ferraz - 2º. Adjunto)