Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1649/18.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:03/21/2019
Relator:PAULA DE FERREIRINHA LOUREIRO
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR
NULIDADE DA SENTENÇA; OPOSIÇÃO ENTRE FUNDAMENTOS;
ART.º 118.º, N.º 2 DO CPTA- COMINAÇÃO E NÃO PRESUNÇÃO;
SUMMARIA COGNITIO;
ART.º 120.º, N.º 2 DO CPTA- PONDERAÇÃO E NÃO PROPORCIONALIDADE.
Sumário:
I- A nulidade, determinada pelo art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, aplicável ao contencioso administrativo por força da consagração contida no art.º 140.º, n.º 3 do CPTA, constitui a sanção prescrita para a sentença que patenteie uma contradição entre o sentido do dispositivo final e os fundamentos de facto e de direito donde decorre aquele dispositivo, bem como para a sentença que apresente ambiguidade ou obscuridade que a tornem ininteligível.

II- A imposição de sanção para aquelas patologias da sentença configura um relevante mecanismo de salvaguarda dos direitos de ação e de defesa das partes processuais, revelando a intolerância e a inadmissibilidade de decisões judiciais incompreensíveis, em termos lógico-jurídicos, para os seus destinatários. De igual modo, pretende-se asseverar a clareza e a racionalidade das decisões judiciais, enquanto instrumentos de tutela jurisdicional e, em última instância, de realização da Justiça.

III- A “oposição” a que faz referência o normativo contido na al. c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC concretiza-se na antinomia, incoerência, ou desarmonia lógica entre as razões de facto e de direito elencadas na decisão judicial e a consequência decisória final extraída dessas mesmas razões fundamentadoras, no sentido de que estas razões fundamentadoras determinam, racional e logicamente, uma decisão final diversa da que está contida no dispositivo da sentença.

IV- No que respeita à “obscuridade” e “ambiguidade” da sentença, interessa estabelecer que estas disfunções apenas inquinam de nulidade a decisão judicial quando a tornam ininteligível.

V- O art.º 118.º, n.º 2 do CPTA estatui que “na falta de oposição, presumem-se verdadeiros os factos invocados pelo requerente” no requerimento inicial da providência cautelar.

VI- No entanto, tal ditame não deve ser caracterizado como uma presunção legal na aceção do previsto nos art.ºs 344.º, n.º 1 e 350.º, n.º 1 do Código Civil, mas antes como uma cominação para a ausência de determinada atuação processual por parte do requerido. O enquadramento mais adequado a conferir àquela presunção de veracidade aponta para o estabelecimento de um mecanismo idêntico e correspondente à confissão dos factos em situação de revelia, nos moldes do estabelecido no art.º 567.º, n.º 1 do CPC.

VII- Por conseguinte, sendo apresentada oposição, queda afastada a aplicação do n.º 2 do art.º 118.º, importando então indagar dos exatos termos da impugnação realizada, por forma a reunir, como provados, nomeadamente, os factos admitidos por acordo- nos casos em que não subsista impugnação-, similarmente ao que prescrevem as regras que emergem do art.º 83.º, n.ºs 1, 2 e 3 do CPTA, que instituem um ónus de impugnação especificada e um real efeito cominatório para o incumprimento desse ónus.

VIII- Assim, o art.º 118.º, n.º 2 do CPTA não institui uma presunção legal, à qual corresponda uma inversão do ónus da prova, passando a atividade instrutória pela concretização do encargo da elisão da presunção, nos termos estabelecidos nos citados art.ºs 344.º, n.º 1 e 350.º do Código Civil, pois que, tal visão implicaria que sobre o requerido impenderia sempre o ónus de demonstrar uma realidade oposta, ou diversa, da que foi descrita pela requerente, competindo-lhe desenvolver toda a atividade probatória, não para propiciar o sucesso da pretensão cautelar deduzida, mas antes para asseverar o fracasso da referida pretensão.

IX- Tal interpretação ultrapassa claramente a letra e o espírito da norma inscrita no n.º 2 do art.º 118.º do CPTA, dado que arrasta uma consequência processual que afronta dois dos pilares fundamentais da arquitetura processual vigente: o princípio da igualdade das partes processuais e o princípio do dispositivo.

X- Em concomitância, refira-se que as regras de repartição do ónus da prova, bem como a modelação para casos especiais, não comportam a admissibilidade desta tese, pois que onus probandi ei incumbit qui dicit, non qui negat, de acordo com a fórmula vigente desde tempos ancestrais, acolhida nos art.ºs 341.º e 342.º do Código Civil.

XI- Enquanto o juízo conclusivo extraído a partir dos factos tem o fito criar a convicção- e não uma certeza apodítica- da ocorrência provável de uma situação de facto consumado ou de prejuízo de difícil reparação, bastando-se, pois, com raciocínios lógicos de verosimilhança e de plausibilidade, a coleção dos factos invocados pelo requerente da providência cautelar deve ser, necessariamente, demonstrada, sob pena de, assim não sendo, a concessão de providências cautelares servir situações ônticas perfeitamente hipotéticas e especulativas. E tal consequência contraria, precisamente, o intuito que preside à existência de providências cautelares, e que é o de impedir a verificação de situações de perda de utilidade da ação principal, ou seja, de situações da vida real em que a regulação jurisdicional definitiva tenha perdido toda a sua eficácia e interesse, em razão da alteração prévia da realidade.

XII- A estipulação de summaria cognitio no domínio das providências cautelares visa balizar a intensidade da atividade processual das partes e do Julgador, visto que o objetivo não é o de atingir a convicção de “certeza” da existência do direito alegado, mas sim o de concluir pela probabilidade de verificação do direito e da lesão.

XIII- Neste seguimento, o termo “sumário”, empregue na al. g) do n.º 3 do art.º 114.º pretende, quanto à matéria de facto, significar simplicidade, brevidade e concisão na atividade instrutória levada a cabo em sede de providências cautelares, atividade essa orientada por um princípio de necessidade e marcada pelo princípio do inquisitório. O que quer dizer, que a consagração da exigência de prova “sumária” não se reconduz à dispensa de prova e à ausência de atividade instrutória.

XIV- O n.º 2 do art.º 120.º do CPTA impõe ao Tribunal a realização de um juízo de ponderação- e não de proporcionalidade- entre os interesses públicos e privados em presença, devendo a providência cautelar ser decretada se esse juízo de ponderação permitir concluir que os danos que resultariam da recusa da providência se apresentam superiores aos que resultariam da concessão da providência.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. RELATÓRIO
…………………………., Ld.ª (Recorrente), vem interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa em 16/11/2018, que indeferiu a providência cautelar requerida contra o Ministério da Administração Interna (Recorrido).


Nesta providência cautelar, a Recorrente veio peticionar a suspensão da eficácia do ato proferido em 31/08/2018 pelo Presidente da Autoridade Nacional de Proteção Civil, que determinou o encerramento provisório do estabelecimento hoteleiro denominado Palace Hotel do Buçaco, concessionado à agora Recorrente.

Inconformada com a sentença proferida em 16/11/2018, que recusou o decretamento da providência cautelar com fundamento na inverificação do requisito atinente ao periculum in mora, a Recorrente apela a este Tribunal Central Administrativo, imputando nulidade e erros de julgamento diversos à sentença e, consequentemente, clamando, em última instância, pela revogação da sentença a quo e, inerente decretamento da providência cautelar.


As alegações do recurso que apresenta culminam com as seguintes conclusões:
VI. CONCLUSÕES
A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida no dia 16.11.2018 pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, no qual se julgou totalmente improcedente, por não provado, o processo cautelar, e, em consequência, se absolveu o Requerido, ora Recorrido, do pedido.
B. Confrontada com esta decisão, a ora Recorrente, então Requerente não se conforma com a mesma, na medida em que esta padece de erro na interpretação e aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.
C. Delimitando o objeto do recurso, está em causa a decisão que determina a improcedência da providência cautelar de suspensão de eficácia de ato requerida, por considerar não verificado o periculum in mora e, consequentemente, por considerar prejudicado o conhecimento dos demais requisitos.
D. Entende, desde logo, o douto Tribunal a quo que não se verifica, in casu, o fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado, conclusão com a qual não se pode concordar.
E. Antes de mais, considerando que a verificação do periculum in mora assenta num juízo de prognose realizado pelo Tribunal quanto à inutilidade da sentença que se produzirá na ação principal, cumpre sublinhar que, considerando que a sentença que se pretende obter nesta ação consiste numa sentença que declare a nulidade ou que anule o ato suspendendo, implicando, portanto, que o ato suspendendo seja extinto, a não concessão da providência cautelar redundaria na inutilidade de tal declaração de nulidade ou anulação.
F. A sentença proferida, a final, não colmataria todos os prejuízos decorrentes do indeferimento da providência cautelar, pois que a circunstância de o Palace Hotel do Buçaco ter efetivamente de encerrar implica, por si só, prejuízos bastante avultados que a posterior invalidação do ato impugnado não poderia colmatar.
G. Com efeito, não seria possível a total reintegração in natura dos prejuízos decorrentes do encerramento hoteleiro, na medida em que estes não constituem apenas prejuízos decorrentes do cancelamento de reservas e de eventos, mas também se reconduzem à imagem, à reputação e ao prestígio do Palace Hotel do Buçaco.
H. Apesar de não serem mensuráveis, estes prejuízos (relacionados com a publicidade negativa do estabelecimento hoteleiro) devem, em todo o caso, ser equacionados no periculum in mora.
I. Caso se entenda que não se estamos perante um fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado – o que não se concede e apenas por mera cautela de patrocínio se equaciona –, sempre se dirá que o n.º 1 do artigo 120.º do CPTA encontrar- se-ia, de qualquer modo preenchido, por esta ser uma situação que implica a produção de danos de difícil de reparação nos interesses que o ora Recorrente visa assegurar no processo principal.
J. Estes interesses são, desde logo, patrimoniais, mas também são, como é bom de ver, respeitantes à reputação, à imagem no mercado e ao prestígio do próprio Palace Hotel do Buçaco.
K. Com efeito, as providências cautelares devem também ser concedidas quando os prejuízos provocados, que se produzirão ao longo do tempo, não sejam suscetíveis de ser reparados (ou, pelo menos, de o ser totalmente) pela reintegração da legalidade, o que sucede com os prejuízos relacionados com a imagem e o prestígio do Palace Hotel do Buçaco.
L. O critério da suscetibilidade de avaliação pecuniária dos danos para efeitos do apuramento do periculum in mora deve, portanto, ser afastado.
M. Improcede, também, o exposto na douta decisão recorrida quando sustenta que certos prejuízos são suscetíveis de ressarcimento no âmbito da ação principal, caso se conclua pelas ilegalidades imputadas ao ato suspendendo.
N. Com efeito, não se pode considerar afastado o periculum in mora, quando, em abstrato, seja admissível um meio alternativo para o ressarcimento dos danos provocados pela não concessão da providência cautelar.
O. Com efeito, o prejuízo a evitar com a concessão da providência não tem de ser irressarcível, na medida em que quem solicita a tutela cautelar pretende, antes de mais, que o bem tutelado permaneça íntegro e não um qualquer outro meio alternativo (secundário) que compense essa ausência de tutela primária.
P. Pelo que o facto de, em abstrato, ser atribuível uma indemnização (ou qualquer outro meio alternativo à providência cautelar) não obsta, em si mesmo, ao preenchimento do periculum in mora.
Q. Face ao exposto, andou mal o Tribunal a quo ao considerar não preenchido o periculum in mora, pois que dos factos alegados e provados é possível concluir que (i) a não concessão da providência cautelar redundará numa situação de facto consumado; e (ii) caso assim não se considere – o que não se concede –, tais factos redundariam na produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Recorrente pretende ver assegurados.
R. Refere ainda o douto Tribunal a quo que os factos concretos alegados pelo Recorrente não permitem, por insuficiência, configurar uma situação suscetível de preencher o pressuposto do periculum in mora, afirmação com a qual não se pode concordar.
S. Assim, em 1.º lugar, não se compreende o alcance da referida expressão – de que os factos são “insuficientes” –, pois que, se, por um lado, o douto Tribunal a quo parece assentar a sua argumentação na circunstância de o ora Recorrente não ter factos suficientes, os fundamentos que apresenta para sustentar tal conclusão, por outro, referem-se à factualidade indiciariamente assente.
T. O douto Tribunal a quo parece, deste modo, confundir o ónus de alegação (de factos suficientes) com o ónus de prova, na medida em que para sustentar que a factualidade é, em si mesma, insuficiente recorre àquilo que se considerou provado.
U. Não se alcança assim o iter cognoscitivo da decisão recorrida, ou seja, se o que o Recorrente carecia era (i) de alegar (mais ou outros) factos; (ii) de trazer mais prova; ou (iii) de ambos.
V. Em 2.º lugar, e sem prejuízo do que se referiu anteriormente, cumpre sublinhar que o ónus de prova de tais factos, por conta do Recorrente, estava (está!) cumprido.
W. É, desde logo, discutível que, no âmbito do Contencioso Administrativo, seja possível afirmar, sem mais, um princípio de repartição do ónus da prova subjetivo semelhante ao existente no âmbito do Processo Civil.
X. Há, em todo o caso, regras específicas relativas ao princípio da livre apreciação da prova nos processos cautelares que se distinguem das regras gerais, sendo esse o caso do n.º 2 do artigo 118.º do CPTA.
Y. Considerando (i) que a expressão “falta de oposição”, prevista neste artigo, deve ser interpretada no sentido de “falta de impugnação dos factos alegados no requerimento inicial”, (ii) que os factos concernentes à marcação de eventos, à perda dos resultados operacionais, aos custos fixos com o pessoal, aos custos fixos relacionados com o estabelecimento hoteleiro, e ao pagamento de indemnizações aos trabalhadores em virtude do encerramento não constituem factos cuja confissão não seja admissível, nem factos cuja prova deva ser realizada por documento, e (iii) que o Requerido, ora Recorrido, não os impugnou especificamente, nem tal impugnação resulta da defesa considerada no seuconjunto, tais factos deveriam, nos termos do n.º 2 do artigo 118.º do CPTA ser presumidos como verdadeiros.
Z. Com efeito, tal presunção legal traduz-se na admissão por acordo de tais factos.
AA. Deste modo, andou mal a decisão recorrida ao não os considerar provados, pelo que deve esta ser revogada e substituída por uma outra que, admitindo tais factos como provados, dê como preenchido o requisito do periculum in mora e, em consequência, determine o decretamento da providência cautelar.
BB. Ainda que assim não se entenda – o que não se concede –, sempre se dirá, em 3.º lugar, que os meios de prova apresentados pelo Recorrente eram, em si mesmo, suficientes para demonstrar a verosimilhança dos factos alegados.
CC. Com efeito, no âmbito das providências cautelares, o grau de prova consiste na mera justificação, pelo que basta que os factos alegados sejam verosímeis ou plausíveis para se considerar verificado o periculum in mora, não sendo necessária a prova da sua certeza.
DD. Sucede que o douto Tribunal a quo sustentou que o Recorrente não juntou determinados documentos e que, portanto, os juntos não se mostravam suscetíveis de comprovar os factos mencionados.
EE. Ora, não sendo necessário apurar em termos certos se aqueles factos correspondem à realidade, e sendo o processo cautelar caracterizado pela sumariedade da cognição da matéria de facto e de direito, a exigência de uma prova exaustiva e exauriente não só não era exigível às partes, como não era, de todo o modo, desejável.
FF. Face ao grau de prova (de mera justificação) exigido, assim como face à inexigibilidade de o Requerente, ora Recorrente, apresentar outros meios de prova demonstrar os factos alegados, tendo em conta a summaria cognitio característica dos processos cautelares, os factos alegados encontram-se efetivamente provados e, em consequência, deve dar-se como verificado, também por esta via, o periculum in mora.
GG. Ademais, a argumentação da douta decisão recorrida parece, em todo o caso, ambígua (quase contraditória), na medida em que, por um lado, sustenta-se na alegação de que a subsistência económico-financeira da Recorrente não parece estar em risco, na medida em que esta não alegou que esta era a sua única fonte de rendimento, mas, por outro, e logo de seguida, ampara-se no desconhecimento quanto à questão de saber se este é (ou não) o único estabelecimento hoteleiro que a Recorrente explora.
HH. Ao que acresce que, tendo esse facto sido alegado pelo Recorrido no artigo 56.º da sua Oposição, este não apresentou qualquer prova nesse sentido, pelo que o Tribunal a quo não o deveria ter considerado valorado para efeitos de afastar o preenchimento da periculum in mora.
II. Também por esta via, deve a decisão recorrida ser substituída por uma outra que não incorra neste erro de julgamento.
JJ. Caso assim não se considere – o que não se concede –, sempre se dirá que, em todo o caso, tal consubstancia um fundamento ambíguo e/ou obscuro e que, nessa medida, tornando a decisão recorrida ininteligível, esta é nula, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.
KK. De igual modo, não se compreende a conclusão retirada pelo Tribunal, pela qual os danos da imagem adviriam dos motivos que fundamentam o encerramento do estabelecimento hoteleiro – e não do próprio encerramento –, pois que, como é bom de ver, tal argumento não é mutuamente excludente, constituindo no mínimo uma máxima de experiência o facto de se poder considerar como danoso para a imagem, para a reputação e para o prestígio de um estabelecimento hoteleiro o seu encerramento abrupto.
LL. Finalmente, e apesar de a decisão recorrida conseguir prejudicado o conhecimento dos restantes requisitos, sustenta (uma vez mais, incompreensivelmente) que o pressuposto da proporcionalidade não se encontrava preenchido.
MM. Porém, dos factos ora alegados e provados resulta que esmagadora maioria das irregularidades se encontrava corrigida, restando apenas a implementação das Medidas de Autoproteção.
NN. Face a este circunstancialismo, claro está que não estamos perante o cenário desastroso apresentado pelo Recorrido, o que, contrabalançando com os danos decorrentes da não concessão da providência, permite concluir que estes (os decorrentes da não concessão da providência) são, em si mesmos, muito superiores àqueles, pois que estes nunca se manifestaram e muito dificilmente sucederão face à correção e reparação das irregularidades verificadas.
OO. Conclui-se, portanto, que também se encontra preenchido o requisito previsto no n.º 2 do artigo 120.º do CPTA, devendo, nessa medida, ser a decisão recorrida ser revogada e substituída por uma outra que julgue procedente, por provada, a referida providência cautelar e, em consequência, suspensa o ato em questão.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, consequentemente, ser revogada a Sentença recorrida, sendo substituída por outra que não incorra nos mesmos erro de julgamento, declarando procedente, por provada, a presente providência cautelar e, em consequência, sendo suspenso o ato administrativo pelo qual o Recorrido determinou à Recorrente o encerramento provisório do estabelecimento hoteleiro “Palace Hotel do Buçaco”..

O Recorrido apresentou as respetivas alegações de recurso, pugnando, em suma, pelo acerto da decisão recorrida e consequente manutenção da mesma.

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Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente, vem o processo submetido à Conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.

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Questões a apreciar e decidir:
As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respetivas conclusões, consubstanciam-se, em suma, em apreciar se a sentença a quo:
I) Padece de nulidade, nos termos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, em virtude de contradição de fundamentos;
II) Padece de erro de julgamento no que tange à valoração da prova e à seleção da factualidade conduzida ao probatório como assente;
III) Padece de erro de julgamento no que concerne à apreciação realizada quanto à verificação de fundado receio de constituição de situação de facto consumado e de prejuízo de difícil reparação, bem como quanto à ponderação realizada em sede de proporcionalidade, prescrita no n.º 2 do art.º 120.º do CPTA.



II- FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa assentou factualidade como provada, e que, maioritariamente, se reproduz nos termos seguintes:
A) O estabelecimento actualmente denominado Palace Hotel do Buçaco é explorado pela Requerente, ………………………………. Ld.ª, tendo sido anteriormente explorado, desde o ano de 1920, por Alexandre……………………………. Admitido por acordo; cfr. fls. 47-50 dos autos;

B) Em 17.05.1994, o Comandante dos Bombeiros Voluntários da Mealhada comunicou, pelo ofício CO053/94, ao Serviço Nacional de Bombeiros que, tendo-se deslocado ao Palace Hotel do Buçaco, “a fim de fazer uma vistoria de segurança”, verificou “que a obra está realizada de acordo com o projecto de segurança apresentado”- Cfr. fls. 745-747 dos autos;
C) Consta assinado, com data de 11.04.2006, por Ana……………………….. e Alexandre……………………, o instrumento intitulado “AUTO DE CESSÃO A TÍTULO PRECÁRIO” de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
“Aos onze dias de Abril de dois mil e seis, pelas dez horas e trinta minutos, nesta cidade de Lisboa, na sede da Direcção-Geral do Turismo, sita na Avenida António Augusto de Aguiar, número oitenta e seis, perante mim, Lídia…………. chefe de secção desta Direcção-Geral, designada para servir de escrivão do presente auto, compareceram como outorgantes: ---------------------------------
PRIMEIRO: Lic.ª Ana ……………………………………, Directora-Geral do Turismo, outorgando em nome da Direcção-Geral do Turismo e em representação do Estado Português. -----------------------
SEGUNDOS: Alexandre …………………… (…) e Fernando ………………… (…), outorgando na qualidade de representantes da sociedade ……………………………., Lda., pessoa colectiva com o NIPC Nº …………………., com sede na Rua Álvaro de Castro, ….., 1600-…….., Lisboa. ----------------------- Verifiquei a identidade do primeiro outorgante por ser do meu conhecimento pessoal e a dos segundos pela exibição dos respectivos Bilhetes de Identidade, bem como a qualidade a que se arrogam e os poderes que legitimam a sua intervenção neste acto. ---------------------------------------------------------------
Considerando que o Estado é o proprietário do denominado Palacete Hotel do Buçaco e mata envolvente, incluindo as capelas e ermidas, Cruz Alta e tudo o que nela se contém de interesse histórico e artístico, em conjunto com o Convento de Santa Cruz do Buçaco, todos sitos na freguesia do Luso, município da Mealhada, concelho de Aveiro;---------------------------------------------------------------
Considerando ainda que o Palacete Hotel do Buçaco e mata envolvente se encontram classificados como Imóvel de Interesse Público nos termos do Decreto nº 32973, de 18 de Agosto de 1943, com a redacção dada pelo Decreto nº 2/96, de 6 de Março; ------------------------------------------ Considerando que o Estado deu de arrendamento, pelo prazo de vinte anos, à sociedade …………., Lda., o Palácio da Mata do Buçaco e anexos, elencados na Cláusula Segunda do contrato outorgado em vinte de Fevereiro de 1986 e cuja vigência se considerou reportada a 1 de Janeiro de 1985; --------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Considerando, também, que a referida Sociedade e anteriormente já o seu sócio fundador vêm, desde 1920, assegurando ininterruptamente a exploração do estabelecimento hoteleiro instalado na Palacete Hotel do Buçaco através de contratos de arrendamento que foram sendo sucessivamente renovados; Considerando, porém, que o referido contrato de arrendamento cessou a sua vigência em 31 de Dezembro de 2004, pelo que, atenta, por um lado, a relevância do Palacete Hotel do Buçaco para o turismo nacional, e, por outro, a necessidade de zelar pela sua preservação, importa assegurar no imediato a regularização da actual situação de ocupação daquele imóvel e a continuidade da sua exploração, até que esteja concluído o procedimento adjudicatório a adoptar pelo Estado para a escolha do co-contratante na celebração de um novo contrato de arrendamento; --------------------------- Considerando que, neste contexto, importa assegurar a gestão racional e integrada dos imóveis do Estado, tendo em vista, não apenas a sua rentabilização, como também a sua valorização e salvaguarda, com recurso aos instrumentos jurídicos adequados, entre os quais se perfila a figura da cessão a título precário, regulada pelo Decreto-Lei nº 24 489, de 13 de Setembro de 1934; ------------- Considerando, finalmente, que tal figura se adequa ao caso vertente, dado o seu carácter de precariedade e transitoriedade; ------------------------------------------------------------------------------------- Assim:----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- Pelo Primeiro Outorgante foi dito que, no uso da autorização concedida pelo despacho nº 234/06- SETF, de 27 de Fevereiro, do Secretário de Estado do Tesouro e Finanças, faz a cessão a título precário e oneroso, ao abrigo do Decreto-Lei nº 24 489, de 13 de Setembro de 1934, à sociedade representada pelos Segundos Outorgantes, do palácio da Mata do Buçaco, ou Palace Hotel do Buçaco, adiante designado por imóvel, que integra os seguintes edifícios, todos sitos na freguesia do Luso, município da Mealhada, distrito de Aveiro: ------------------------------------------------------------------- a) Edifício principal, incluindo a esplanada anexa à galeria deste, situada a nascente, e com a extensão de 47m na parte confinante com edifício e de 22m de fundo, que confronta do nascente com a estrada, do poente com o Convento das Carmelitas Descalças, Casa dos Brasões e Casa do Embrechado, do norte com a estrada e do sul com jardins da Mata Nacional do Buçaco, inscrito na matriz predial urbana da freguesia do Luso sob o artigo …….; -------------------------------------------------------------------------------- b) A Casa dos Brazões, que confronta do norte com o dito Convento e dos demais lados com os referidos Jardins; ------------------------------------------------------------------------------------------------------------- c) A Casa do Embrechado, que confronta do nascente com o Palace Hotel do Buçaco, do poente e norte com a estrada e do sul com o mesmo Convento; ------------------------------------------------------------
d) A Casa dos Cedros, que confronta do norte com o dito Convento, do nascente e sul com os referidos jardins e do poente com a estrada; --------------------------------------------------------------------------------------
e) A Casa do Museu, que confronta do nascente com a casa do Embrechado, do norte e poente com a estrada e do sul com o mesmo Convento; ------------------------------------
f) A garagem privativa, que confronta do Nascente com a estrada e dos demais lados com a referida Mata Nacional do Buçaco. ------------------------------------------------------------------------
A presente cessão fica ainda sujeita aos seguintes termos e condições: ---------------------------------------
1. A cessão do imóvel acima identificado e seus anexos destina-se a regularizar a actual situação de ocupação desse imóvel e a possibilitar a continuidade da exploração do estabelecimento hoteleiro ali instalado;-----------------------------------------------
2. O início da cessão reporta-se a 1 de Janeiro de 2005 e perdurará até que o Estado seleccione a entidade com quem irá contratar o novo arrendamento do imóvel, no âmbito do procedimento adjudicatório que vier a ser seguido. Uma vez seleccionada essa entidade, e caso não seja a ora cessionária esta disporá do prazo de noventa dias, contado desde a data da comunicação ao cessionário, da adjudicação, para proceder à desocupação e devolução do imóvel; -----------------------
(…)
6. A cessionária fica constituída fiel depositária dos bens móveis e equipamentos existentes no interior do imóvel a arrendar, que lhe foram disponibilizados pelo Estado, comprometendo-se a entregar tais bens e equipamentos, no termo da cessão, em estado e condições de funcionamento compatíveis com o seu uso normal e a acção do tempo; ----------------------------------------------------------------------------
(…)
9. Os demais termos e condições da presente cessão são os constantes do contrato de arrendamento assinado em vinte de Fevereiro de 1986, conforme minuta aprovada pelo Decreto-Lei nº 506/85, de 31 de Dezembro, salvo na medida em que contrariem o disposto neste auto ou a natureza precária da cessão;-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------Pelos Segundos Outorgantes foi dito que aceitam a afectação e entrega da parte do imóvel identificada neste auto, nas condições aqui expressas, que se obrigam a cumprir. Nestes termos, o Primeiro Outorgante deu a afectação e entrega por efectuada sem mais formalidades. ------------------------------
Do presente auto foram feitos três exemplares, destinados à Direcção-Geral do Turismo, à sociedade …………. Lda., e à Direcção-Geral do Património, depois de assinados pelos seus representantes da Sociedade e também por mim. ------------------------------------------
- Cfr. fls. 47-50 dos autos;

D) Por ofício do Presidente da Câmara Municipal da Mealhada, de 09.07.2018, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi comunicado, ao Comandante Operacional Distrital de Aveiro da Autoridade Nacional de Protecção Civil, o seguinte:
“Face a um pedido de colaboração feito ao Turismo de Portugal, ficou decidido promover uma inspeção, por várias entidades, ao Hotel Palace do Bussaco.
Fiquei incumbido de convidar V. Exa. a acompanhar esta inspeção dado haver matérias de segurança das instalações do hotel a observar.
A inspeção realizar-se-á no dia 17 de julho, pelas 11h.”
- Cfr. fls. 203 dos autos e fls. 293 e 282 do PA;

E) No dia 17.07.2018, foi realizada, pelo Comando Distrital de Operações de Aveiro da Autoridade Nacional de Protecção Civil, uma inspecção ao estabelecimento denominado Palace Hotel do Buçaco, a qual deu origem à emissão, em 08.08.2018, do instrumento intitulado “Relatório de Inspeção Extraordinária REL/546/CDOS01/2018” subscrito pelo Comandante Operacional Distrital de Aveiro e por uma Técnica do Gabinete de Segurança Contra Incêndios em Edifícios, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
· “Data da Inspeção: 17/07/2018; hora: 11H00M;

· Local: Mata Nacional do Bussaco- Luso;

· Designação: Palace Hotel do Bussaco;

· Proprietário: Fundação Mata do Bussaco;

· Explorador: …………………………………, Ld.ª;

· NIF: …………………..;

· Responsável de Segurança: Alexandre…………………;

· Delegado de Segurança: não identificado;

· Processo ANPC n.º: PSC1/9160/CDOS01/2018 e cadastro …………../2018;

· Município: Mealhada;

· Licença de utilização: Edifício do Estado Português classificado como Imóvel de Interesse Público com Contrato de Arrendamento para Exploração através do Decreto-Lei n.º 506/85, de 31 de dezembro válido por 20 anos. Posteriormente, em 11/04/2006 foi elaborado um Auto de Cessão a Título Precário, que vigora até à presente data;

· Utilização Tipo: VII;

· Categoria de Risco: 2.ª;

· Locais de Risco: E;

Na sequência de solicitação de ação de inspeção, apresentada ao CDOS de Aveiro por parte do Município da Mealhada, através de ofício datado de 09-07-2018, o qual se anexa, foi realizada uma ação de Inspeção Extraordinária por António……………… e Elizabete ……………., na qualidade de Comandante Operacional Distrital de Aveiro e de Técnica do Gabinete de SCIE do CDOS de Aveiro, respetivamente, de acordo e nos termos do disposto no artigo 6º do Decreto-Lei n.º 73/2013, de 31 de Maio, republicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 163/2014, de 31 de outubro, com a redação atual, conjugado com os artigos 5º, alínea a) do n.º 1 do art.º 24.° do Decreto-Lei nº 220/2008, cie 12 de novembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 224/15, de 9 de outubro, tendo sido acompanhada pelo seguinte representante da entidade: Alexandre……………, na qualidade de Sócio Gerente.

A inspeção conjunta foi também acompanhada pelos representantes das seguintes entidades:

. Rui …………………….., na qualidade de Presidente da Câmara Municipal da Mealhada;

. Arminda ……………….., na qualidade de Vereadora da Câmara Municipal da Mealhada;

. Luís ………………. e Rogério ……………, na qualidade de Técnicos Superiores da Câmara Municipal da Mealhada;

. António …………………., na qualidade de Presidente da Fundação da Mata do Bussaco;

. Antero……………………, na qualidade de Técnico Superior da DRCC - Direção Regional da Cultura do Centro;

. Ana ……………………., na qualidade de Técnica Superior do Turismo de Portugal;

. Paulo…………., Adelino …………… e Maria………………….., na qualidade de Inspetores da ASAE- Autoridade de Segurança Alimentar e Económica;

. Horácio………………., na qualidade de Porteiro de Hotelaria, Paula……….., na qualidade de Rececionista de 1ª e Carlos………….., na qualidade de Responsável pela Manutenção.

I- Factos

No decorrer da inspeção foram verificadas as seguintes irregularidades:

I.1. (…)

(…)

I.131. (…)

2- Conclusões:

Fica demonstrado o elevado grau de degradação do edifício, que conjuntamente com as suas características arquitetónicas e construtivas, associadas ao elevado grau de degradação/não funcionamento/inexistência dos equipamentos de segurança, resultante do somatório de todas as irregularidades de segurança identificadas, que configuram infrações ao regime jurídico de segurança contra incêndio em edifícios e legislação complementar, potencializa o risco iminente para a segurança das pessoas e bens -se (edifício de “interesse público”), propondo-se como medida preventiva, urgente e provisória, o encerramento das instalações agora inspecionadas, nos termos seguintes:

I. O encerramento proposto deverá permanecer até que sejam reunidas as condições de segurança, a serem verificadas após realização de inspeção regular às referidas instalações, realizada ao abrigo do disposto do n.º 3 do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 220/2008, de 12 de novembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, de 9 de outubro, por solicitação do requerente. Para esse efeito deverão ser previamente analisadas em sede de Medidas de Autoproteção as condições de segurança das referidas instalações;

II. Com base na apreciação técnica que fundamenta o presente Relatório de Inspeção Extraordinária n.º REL/546/CDOS01/2018, e que atesta inequivocamente a inexistência das condições mínimas de segurança contra incêndio no edifício;

III. A reabertura da unidade deverá ser precedida com a entrega das Medidas de Autoproteção, de acordo com as condições estabelecidas nos artigos 21º e 34º do Decreto-Lei n.º 220/2008, de 12 de novembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, de 9 de outubro;

IV. Mais se propõe que todas as ações desenvolvidas no decorrer do processo, continuem a ser acompanhadas pela DRCC- Direção Regional da Cultura do Centro, Pelo Turismo de Portugal, pela ASAE- Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, bem como, pelo Município da Mealhada e pela Fundação da Mata do Bussaco, que no âmbito das suas competências, deverão informar, dentro de 3 (três) meses, por escrito à ANPC/CDOS de Aveiro, (…) das diligências promovidas para a reposição da legalidade.

3- Recomendações:

Face ao elevado número de irregularidades detectadas, recomenda-se que a sua regularização tenha por base um projeto de segurança contra o risco de incêndio, que racionalize as intervenções necessárias, de acordo com as características arquitectónicas do edifício.”

- Admitido por acordo; cfr. fls. 51-204 dos autos e fls. 1-281 e 293-430 do PA;

F) Em 31.08.2018, o Presidente da Autoridade Nacional de Protecção Civil proferiu o “DESPACHO” de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:

“I. DOS FACTOS:
Na sequência de uma ação de fiscalização solicitada à ANPC pelo Município da Mealhada, através do ofício datado de 09-07-2018, o qual se anexa, foi efetuada uma inspeção ao estabelecimento hoteleiro “Palace Hotel do Bussaco”, que deu origem ao Relatório de Inspeção Extraordinária REL/546/CDOS01/20I8, de 17/07/2018, cuja cópia se anexa e aqui se dá por integralmente reproduzido, para os devidos efeitos legais. O relatório da inspeção é um documento autêntico (de acordo com o artigo 363.°, n.º 2 do Código Civil devemos considerar como autênticos os documentos exarados, com as formalidades legais, pelas autoridades públicas nos limites da sua competência).

II. DO DIREITO:
1) Os valores subjacentes à obrigatoriedade de os edifícios e recintos disporem das adequadas condições de segurança contra incêndio dizem respeito a uma vertente absolutamente fundamental da vida em comunidade (em conformidade com o n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-lei n.º 220/2008, de 12 de novembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, de 09 de outubro, a tutela dos bens jurídicos que se pretendem acautelar com o citado decreto-lei prendem-se com os princípios gerais da preservação da vida humana, do ambiente e do património cultural), e exigem uma proteção jurídica específica mais acentuada;
2) Tendo em vista o cumprimento daqueles princípios, o referido decreto-lei é de aplicação geral a todas as utilizações de edifícios e recintos, visando em cada uma delas (n.º 2 do artigo 4.º): a) Reduzir a probabilidade de ocorrência de incêndios;
b) Limitar o desenvolvimento de eventuais incêndios, circunscrevendo e minimizando os seus efeitos, nomeadamente a propagação do fumo e gases de combustão;
c) Facilitar a evacuação e o salvamento dos ocupantes em risco;
d) Permitir a intervenção eficaz e segura dos meios de socorro.
3) Nos termos da alínea f) do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 73/2013, de 31 de maio, republicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 163/2014, de 31 de outubro (orgânica da Autoridade Nacional de Proteção Civil, adiante designada ANPC), compete à ANPC proceder à regulamentação, licenciamento e fiscalização no âmbito da segurança contra incêndios. Cumulativamente, o n.º 6 do mesmo artigo reforça que a ANPC tem ainda por missão promover a aplicação e fiscalizar o cumprimento das leis, regulamentos, normas e requisitos técnicos aplicáveis no âmbito das suas atribuições;
4) De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 5.º do citado Decreto-Lei n.º 220/2008, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, de 09 de outubro a ANPC é a entidade competente para assegurar o cumprimento do regime da segurança contra incêndio em edifícios;
5) Em consonância com o princípio da legalidade, vertido no artigo 3.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), os órgãos da Administração Pública devem atuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes forem conferidos;
6) Analisado o relatório cuja cópia faz parte integrante do presente despacho, verifica-se a existência de um conjunto de factos de extrema gravidade que, sem margem para dúvidas, colocam em causa a segurança de pessoas e bens;
7) Na verdade, relativamente aos factos presenciados e atestados pelos elementos da ANPC que acompanharam o respetivo ato de fiscalização, não podia aquele relatório ser mais explícito na descrição do elevado risco que a situação comporta, se nenhuma medida for entretanto adotada;
8) Pelo que, esta autoridade administrativa não poderá ser complacente com comportamentos que possam colocar em perigo os valores supra citados. Assim, à Autoridade Nacional de Proteção Civil impõe-se a adoção de medidas que visem impedir a probabilidade de ocorrência de incêndios;
9) Importa reiterar que a adoção deste tipo de medidas por parte da ANPC, apenas ocorre perante a evidência de factos que, objetivamente, comprometam a segurança de pessoas e bens;
10) Na sua essência, as medidas preventivas têm natureza provisória, ou seja, são temporárias e reversíveis, até que se eliminem as causas de perigo;
11) Impõe-se, assim, a decisão sobre a qualidade da medida preventiva, atenta a necessidade de respeito pelo princípio da proporcionalidade (no respeito pelo disposto no artigo 7.º do CPA), na sua tríplice dimensão de necessidade da medida, adequação e proporcionalidade (em sentido estrito), que se traduz na proibição do excesso face à gravidade dos factos;
12) De entre as medidas a que se refere a alínea b) do n.º 2 do art. 8.º do Decreto-Lei n.º 73/2013, de 31 de maio, republicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 163/2014, de 31 de outubro considera-se que a medida de encerramento das instalações se afigura mais adequada, porquanto, dada a factualidade descrita no citado relatório, se entende que as medidas de cessação de atividade ou imobilização de equipamentos seriam inadequadas face ao fim que se visa alcançar;
13) Afigura-se, assim, necessária, face à gravidade dos factos relatados, a aplicação da medida preventiva de encerramento das instalações, sendo a mesma adequada e proporcional ao fim a que se destina;
14) De referir, contudo, que a medida preventiva de encerramento é, por natureza, como já se referiu, provisória e reversível (cfr. disposto na parte final da alínea b) do n.º 2 do citado art. 8.º, até que deixe de se verificar a situação de incumprimento ou infração), cabendo aos sujeitos dela destinatários- proprietário e/ou explorador do estabelecimento- a adoção de medidas que eliminem os perigos referenciados; por outras palavras, a medida cautelar só se mantém enquanto nada for feito por quem de direito para a sua cessação.
Face ao exposto, nos termos do artigo 89º do Código do Procedimento Administrativo, e ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 2 do art. 8.º do Decreto-Lei n.º 73/2013, de 31 de maio, determino:
1. Como medida preventiva, urgente e provisória, o encerramento do estabelecimento hoteleiro “Palace Hotel do Bussaco (sito em Mata Nacional do Bussaco, 3050-261 Luso), pelo prazo máximo de 6 meses ou até à tomada, no decurso deste prazo, de decisão definitiva;
2. Caso se verifique a ocorrência de factos supervenientes que motivem uma eventual revisão do prazo de vigência da medida referida no número anterior, a mesma poderá ser objeto de prorrogação, conforme estabelecido na alínea b) do artigo 90.º do Código do Procedimento Administrativo;
3. Não obstante a urgência justificada pela gravidade dos factos constante da cópia do relatório que faz parte integrante do presente despacho, para não causar prejuízo e/ou criar constrangimentos relativamente a reservas de alojamento previamente efetuadas para a época estival, determino a aplicação da presente medida preventiva para vigorar apenas a partir do próximo dia 17 de setembro de 2018, nos termos do disposto no artigo 89º, nº 1 e nº 2 do Código do Procedimento Administrativo, não havendo lugar a audiência dos interessados;
4. Em conformidade com o estabelecido na alínea c) do n.º 2 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 73/2013, de 31 de maio, solicito ao Comando da Polícia Municipal de Lisboa a notificação pessoal da presente decisão ao explorador do estabelecimento, com sede na Rua ………………, n.º II, 9º Piso - ………-007 Lisboa, ………………………….., Lda., cujo representante legal é o Sr. Alexandre ………………………, com a advertência expressa de que o incumprimento da presente decisão de encerramento provisório constitui crime de desobediência, previsto e punido nos termos do artigo 348.º do Código Penal;
5. Tendo em consideração que nos termos do disposto no n.º 6 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 220/2008, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, de 09 de outubro, o pagamento da(s) coima(s) que venha(m) a resultar da Instauração de procedimento(s) contraordenacional(ais) não dispensa a observância das disposições constantes do Decreto-Lei n.º 220/2008, de 12 de novembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, de 09 de outubro e legislação complementar cuja violação determinou a sua aplicação, o proprietário e/ou explorador do estabelecimento sito naquela morada, deverá adotar as providências adequadas à regularização da situação, nomeadamente, notificando e apresentando por escrito ao Comando Distrital de Operações de Socorro de Aveiro (no âmbito do Decreto-Lei n.º 220/2008, de 12 de novembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, de 09 de outubro e legislação complementar) até ao prazo máximo de duração da medida indicado no ponto I destas determinações e/ou respetiva prorrogação a informação de reparação/ reposição/ implementação das irregularidades verificadas e constantes REL/546/CDOS01/2018, integrado no procedimento oficioso da reposição da legalidade e, neste âmbito, a entrega das medidas de autoproteção exigidas para a respetiva UT e categoria de risco, cumprindo com os requisitos impostos pelo n.º 3 do artigo 193.º da Portaria n.º 1532/2008, de 29 de dezembro e tendo em consideração as características arquitectónicas e construtivas do edifício;
6. Recebida a notificação referida no número anterior, deve o Comando Distrital de Operações de Socorro de Aveiro proceder a nova inspeção do estabelecimento, solicitando-se a presença de todas as entidades presentes na primeira fiscalização (respetivamente: Câmara Municipal da Mealhada, Fundação Mata do Bussaço, DRCC - Direção Regional da Cultura do Centro, Turismo de Portugal e ASAE - Autoridade de Segurança Alimentar e Económica), a fim de verificar o cumprimento das determinações e comunicar o facto à ANPC, para imediato levantamento da medida preventiva de encerramento;
7. Notifiquem-se as entidades mencionadas no ponto anterior, através do envio de cópia do presente despacho;
8. Solicito ainda, ao abrigo da alínea c) do n.º 2 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 73/2013, de 31 de maio ao Comando da Guarda Nacional Republicana da Mealhada uma fiscalização frequente, destinada ao controlo do efetivo acatamento destas determinações, tomando todas as medidas que tiver por necessárias para assegurar o respetivo cumprimento.”
- Admitido por acordo; cfr. fls. 42-46 dos autos e fls. 287-290 do PA;

G) Em 05.09.2018, foi entregue cópia do despacho identificado na alínea anterior a Alexandre …………………………., na qualidade de representante da sociedade …………………………….. Ld.ª. - cfr. fls. 439-431 do PA.

H) Em 14.09.2018, deu entrada, no Comando Distrital de Operações de Aveiro da Autoridade Nacional de Protecção Civil, o requerimento de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
“Exmo. Senhor Comandante Operacional Distrital Dr. António …………………………
Praça Marquês de Pombal- Edifício Governo Civil 3810-076 AVEIR
(…)
ASSUNTO: “PALACE HOTEL DO BUSSACO”
Informação de reparação/reposição/implementação das irregularidades verificadas e constantes REL/546/CDOS01/2018, de 17/07/2018
Entrega das medidas de autoproteção
Exmo. Senhor Comandante,
……………………………………….., LDA. (…), notificada a 05.09.2018 do despacho do Exmo. Senhor Tenente-General Carlos ………………………….., Presidente da AUTORIDADE NACIONAL DE PROTEÇÃO CIVIL, datado de 31.08.2018, vem expor e requerer o seguinte:
a) Considerando o Relatório de Inspeção Extraordinário, anexo ao sobredito despacho, foi determinado como medida preventiva, urgente e provisória, o encerramento, até ao dia 17.09.2018, do estabelecimento hoteleiro “Palace Hotel do Bussaco", pelo prazo máximo de 6 meses ou até à tomada, no decurso desse prazo, de decisão definitiva (…);
b) No decurso do procedimento oficioso da reposição da legalidade, dispôs-se que a sociedade “………………………………., Ld.ª”, enquanto entidade exploradora do estabelecimento “Palace Hotel do Bussaco”, está adstrita ao dever de notificar e apresentar, por escrito, ao Comando Distrital de Operações de Socorro de Aveiro, o cumprimento das medidas de autoproteção exigidas;
c) Neste sentido, vem, pelo presente, notificar V. Exa. que, encontram-se concluídas e regularizadas todas as situações aludidas no referido relatório, bem como, são na presente data entregues as medidas de autoproteção, assegurando-se, assim, a reposição da legalidade (cfr. tabela com correções efetuadas, por referência ao Relatório de Inspeção Extraordinária REL/546/CDOS01/2018, de 17.07.2018 e medidas de autoproteção, juntos como Documentos n.°s 3 e 4);
d) Como tal, a partir da presente data, a sociedade “………………………, Ld.ª”, enquanto entidade exploradora do estabelecimento “Palace Hotel do Bussaco”, encontra-se totalmente disponível para que seja efetuada uma nova inspeção ao estabelecimento hoteleiro, por forma a se proceda ao levantamento imediato da medida preventiva de encerramento.”
- Cfr. fls. 345-347, fls. 418-420 e 477-479 dos autos;

I) Com o requerimento identificado na alínea anterior, foi junto o instrumento de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
(…)
- Cfr. fls. 349-359 e 422-432 dos autos;

J) Com o requerimento identificado em H), foi junto o instrumento intitulado “REQUERIMENTO- SERVIÇOS DE SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO EM EDIFÍCIOS” de cujo teor, que aqui se dá por integral mente reproduzido, se extrai o seguinte:

« texto no original»

- Cfr. fls. 480 dos autos;
K) Com o requerimento identificado em H), foi junto o instrumento intitulado “MEDIDAS DE AUTOPROTECÇÃO”, relativo ao estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.- Cfr. fls. 481-743 dos autos;

L) Em 14.09.2018, foi recebido, no Comando Distrital de Operações de Aveiro da Autoridade Nacional de Protecção Civil, o instrumento intitulado “REQUERIMENTO- SERVIÇOS DE SEGURANÇA CONTRA INCÊNDIO EM EDIFÍCIOS” de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:

«texto no original»

- Cfr. fls. 744 dos autos;

M) No dia 18.09.2018, os serviços do Comando Distrital de Operações de Aveiro, da Autoridade Nacional de Protecção Civil realizaram uma acção de fiscalização ao estabelecimento denominado Palace Hotel do Buçaco, a qual deu origem à emissão do “RELATÓRIO DE ACOMPANHAMENTO DO PROCEDIMENTO OFICIOSO PARA REPOSIÇÃO DA LEGALIDADE DE SCIE”, subscrito com data de 19.09.2018, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
· Data da Ação de Fiscalização: 18/09/2018; hora: 10H30M;
· Local: Mata Nacional do Bussaco - Luso;
· Designação: Palace Hotel do Bussaco;
· Proprietário: Fundação Mata do Bussaco;
· Explorador: ……………………………………, Ld.ª;
· NIF: …………………………….;
· Responsável de Segurança: Alexandre ……………….;
· Delegado de Segurança: Nuno ……………………..;
· Processo ANPC n.º PSCI/9160/CDOS01/2018 e cadastro …………../2018;
· Município: Mealhada;
· Licença de utilização: Edifício do Estado Português classificado como Imóvel de Interesse Público com Contrato de Arrendamento para Exploração através do Decreto- Lei n.º 506/85, de 31 de dezembro válido por 20 anos. Posteriormente, em 11/04/2006 foi elaborado um Auto de Cessão a Título Precário, que vigora até à presente data;
· Utilização Tipo: VII;
· Categoria de Risco: 2.ª;
· Locais de Risco: E;
Na sequência da exposição datada de 14-09-2018 (com grelha de ponto de situação junta como documento n.º 3 pelo Requerente), que se anexa como doc. n.º 1 e aqui se dá por integralmente reproduzido, apresentada pelo explorador do estabelecimento hoteleiro designado “Palace Hotel do Bussaco”, ao abrigo do disposto nos n.ºs 1 e 3 artigo 115.º do Código de Procedimento Administrativo, foi realizada uma nova deslocação ao local para averiguação dos factos com interesse para a decisão, com a participação de António ……… (Comandante Operacional Distrital do Comando Distrital de Operações de Socorro de Aveiro), João ………………. (Auditor Fiscal em funções na Direção Nacional de Auditoria e Fiscalização da ANPC), Carlos ………… (Chefe da Divisão de Verificação e Fiscalização da Direção Nacional de Planeamento de Emergência da ANPC) e Elizabete ………… (Engenheira em funções no Gabinete Técnico de SCIE do Comando Distrital de Operações de Socorro de Aveiro), na qualidade de representantes da ANPC, de acordo e nos termos do disposto no artigo 6º do Decreto-Lei n.º 73/2013, de 31 de Maio, republicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 163/2014, de 31 de outubro, com a redação atual, conjugado com os artigos 5º, alínea a) do n.º 1 do art.° 24.º do Decreto-Lei nº 220/2008, de 12 de novembro, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 224/15, de 9 de outubro, tendo ainda sido acompanhada pelos seguintes elementos: Fernando…………………………, na qualidade de Gerente e representante da sociedade ………………….., Ld.ª, Mara …………………., na qualidade de Diretora Geral dos ……………………………, Ld.ª, Nuno……………………….., na qualidade de Diretor do Palace Hotel do Bussaco, Nuno…………………., na qualidade de advogado dos ……………………………., Ld.ª e Elisabete……………….., na qualidade de Diretora do Palace Hotel da Curia.

No âmbito da reunião introdutória que antecedeu esta ação, foi-nos comunicado pela Diretora dos ………………………………, Ld.ª, Eng.ª Mara ……….., um dado novo omitido na inspeção que teve lugar em 17-07-2018, relativo à alegada existência de um projeto de SCIE, bem como de um Certificado de Conformidade emitido pelo extinto Serviço Nacional de Bombeiros, e datado de 19-09-2000, que se anexa como doc. n.º 2 e aqui se dá por integralmente reproduzido.
Nesta ação de fiscalização, verificou-se que as desconformidades elencadas no Relatório de Inspeção Extraordinária n.º REL/546/CDOS01/2018, de 08 de agosto de 2018, encontram-se corrigidas, com exceção das a seguir indicadas:
· 1.10- "Na sala designada por "segunda sala de pequenos-almoços", no 1º andar do edifício principal/Palácio, as paredes encontravam-se revestidas de tecido acolchoado, diminuindo as características de reação ao fogo dos elementos de revestimento de paredes e tetos, com desempenho dúbio face à produção de fumo, gotas e partículas inflamadas, podendo propagar-se, com facilidade aos espaços/objetos adjacentes, num eventual foco de incêndio..."- continuam por evidenciar as características de reação ao fogo do revestimento das paredes do referido espaço;
· 1.30- “Na designada “segunda copa”, localizada no r/chão do edifício principal/Palácio, verifica-se a violação da compartimentação, quer a nível horizontal- teto, quer a nível vertical- paredes, através do atravessamento de tubos e condutas..."- devem ser demonstradas, através de certificado de conformidade, as características de resistência e reação ao fogo dos elementos aplicados quer ao nível do teto, quer ao nível das selagens efetuadas (ver provas fotográficas números 1 e 2);
(…)
· 1.40- "A zona técnica das caldeiras de aquecimento, localizada no r/chão do edifício principal/Palácio, compartimento de risco elevado de incêndio, encontrava-se repleta de matéria combustível e não apresentava compartimentação/isolamento face aos compartimentos adjacentes…"- apesar de ter sido retirada a matéria combustível inicialmente existente, a compartimentação/isolamento do compartimento não foi executada, quer a nível da porta, quer a nível da selagem das aberturas existentes, que comunicam com os espaços adjacentes ao referido compartimento (ver prova fotográfica n.º 3);
(…)
· 1.50- "No compartimento, onde se encontra o quadro elétrico geral do edifício, localizado na entrada de serviço, r/chão do edifício principal/Palácio, foi violada a compartimentação através da passagem de cablagem, sem que esta tenha sido devidamente isolada..."- devem ser demonstradas, através de certificado de conformidade, as características de reação ao fogo do(s) elemento(s) aplicado(s) na selagem efectuada (ver prova fotográfica n.º 4);
(…)
· 1.55- "O posto de transformação existente, cuja capacidade é de 400kVA, localizado junto à porta de acesso/saída da entrada de serviço, adjacente à segunda copa, no r/chão do edifício principal e considerada como saída de emergência, não se encontra encerrado em armário com características de resistência ao fogo..."-mantém-se esta irregularidade, tendo sido alertados os presentes da necessidade de adotarem diligências junto da entidade competente (Direção Geral de Energia), para uma intervenção adequada à correção da situação identificada;
· 1.82- "No quarto 89, localizado no r/chão do edifício das Pedrinhas, verificou-se que a planta de emergência, existente no lado interior da porta de acesso ao referido quarto, não se encontrava corretamente orientada... Neste piso situavam-se os quartos 86 a 91, e importa salientar que foi possível aceder a todos os quartos, verificando-se que esta irregularidade é comum à totalidade dos mesmos"- ainda que as plantas referidas tenham sido corrigidas, verificou-se que as mesmas continuam mal orientadas, situação que carece de regularização;
· 1.86- "No quarto 73, localizado no 1º andar do edifício das Pedrinhas, verificou-se que a planta de emergência, existente no lado interior da porta de acesso ao referido quarto, não se encontrava corretamente orientada..."- ainda que a planta referida tenha sido corrigida, verificou-se que a mesma continua mal orientada, situação que carece de regularização;
· 1.92- "No quarto 7, localizado no 1º andar do Palácio, verificou-se que a planta de emergência existente, no lado interior da porta de acesso ao referido quarto, não se encontrava corretamente orientada..."- não nos foi possível aceder ao referido quarto, por motivos relacionados com a privacidade dos hóspedes que ocupavam essa "habitação", tendo-se acedido ao quarto 6, e verificando-se que a planta referida, apesar de corrigida continua mal orientada, situação que carece de regularização.
Mais se informa que em 14/09/2018, foram entregues as Medidas de Autoproteção no Comando Distrital de Operações de Socorro de Aveiro, para emissão de parecer pela ANPC e posterior implementação e verificação em sede de Inspeção Regular, também solicitada pelo Requerente na mesma data. Conclui-se que a inexistência de Medidas de Autoproteção aprovadas e implementadas, continua a prevalecer como desconformidade de maior risco para a segurança de pessoas e bens naquele local.”
- Cfr. fls. 335-340 e 408-413 dos autos;
N) Consta em anexo ao Relatório identificado na alínea anterior o CERTIFICADO DE CONFORMIDADE emitido sob o n.º 33/00, pela extinta Inspecção Regional de Bombeiros do Centro, por despacho de 19.09.2000, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
“Nome do estabelecimento:" PALACE HOTEL DO BUSSACO"
Entidade Proprietária/ exploradora: ……………………………………. LDA
(…)
Local do estabelecimento: BUSSACO
Freguesia: LUSO
Concelho de: MEALHADA Distrito de: AVEIRO”
- Cfr. fls. 363, 436 e 748 dos autos;

O) Em 16.10.2018, foi enviado à Requerente, o ofício do Comandante Distrital de Operações de Socorro de Aveiro, com a referência OF/25667/CDOS01/2018, de 09.10.2018, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
· Proc. ANPC n.º: GPS 039403/2018 e PSCI/10984/CDOS01/2018
· “Requerente: ……………………………….., Ld.ª
· Edifício/Recinto: Palace Hotel do Bussaco
(…)
· Utilização-Tipo: VII
· Categoria de Risco: 3.ª- risco elevado
Serve o presente para informar V. Exas. que, efectuada a análise técnica ao processo em referência, no âmbito do Decreto-Lei n.º 220) e Portaria n.º 1532/08 de 29 Dezembro (…), verifica-se que o mesmo não reúne condições para aprovação, uma vez que, não dá cumprimento cabal à citada legislação, devendo ser apresentado, no prazo de 20 dias uteis, um aditamento às Medidas de Autoproteção, para dar satisfação às seguintes correcções:
1.1. O termo de aceitação tem que ser assinado por elemento da administração, indigitado para o efeito, de acordo com o artigo n.º 1 do artigo 194º do RT-SCIE;
1.2. O documento designado “Proposta de Medidas Compensatórias” menciona desconformidades que já se encontram regularizadas, tais como, a implementação de iluminação e sinalização de segurança, altura de extintores e bocas-de-incêndio de mangueira flexível em carga (podendo assim considerar-se este equipamento como primeira intervenção);
1.3. Solicita-se esclarecimento no que concerne à vigilância de equipamentos que não se encontram implementados, nomeadamente, marcos de incêndio (conforme mencionado no documento referido no ponto anterior);
1.4. No que concerne à desconformidade mencionada relativamente á inexistência de detecção automática de gás combustível, nos locais onde este seja usado, sugere-se a instalação de um sistema automático de detecção do mesmo, não sendo aceite como medida compensatória unicamente a inspecção, a este tipo de sistema, por entidades competentes;
1.5. No que concerne à desconformidade referente à inexistência de sistema fixo de extinção por água, o técnico não propõe a implementação de qualquer medida compensatória, no entanto, e face aos condicionalismos arquitectónicas do edifício, é aceite que esta seja ultrapassada através do reforço dos meios de primeira intervenção (extintores e bocas de incêndio);
1.6. O documento mencionado no ponto 1.2, não faz referência à inexistência de isolamento e protecção de locais de risco, nomeadamente, os locais de risco C e C agravado e instalações técnicas (PT), sendo esta também considerada como desconformidade face à legislação actual;
1.7. Deve ser enviada a licença de utilização mencionada no ponto 4 do documento.
1.8. Sendo mencionado como medida compensatória, a colocação de marcos de incêndio, deverá ser indicado em planta a sua localização;
1.9. O número de elementos da equipa de segurança, no período nocturno, deve ser reajustado com a ocupação do hotel;
1.10. Deverá ser esclarecido em que parte dos conteúdos programáticos é feita a sensibilização da equipa de segurança e restantes funcionários, para as limitações da edificação, conforme mencionado no documento referido no ponto 1.2, uma vez que, após a leitura dos mesmos tal acção não está perceptível. Deve ser clarificada a periodicidade da formação em matéria de SCIE;
1.11. Conforme proposto em medidas compensatórias, os simulacros/exercícios seriam realizados com maior regularidade. Assim, deve ser especificada tal periodicidade, uma vez que, no capítulo VI - Simulacros, é mencionada a sua realização anual (conforme exigência do artigo 207º do RT-SCIE);
1.12. Os procedimentos de exploração e de utilização das instalações técnicas, equipamentos e sistemas de SCIE, existentes no edifício, devem ser melhorados, devendo incluir as respectivas instruções de funcionamento, os procedimentos de segurança, bem como, a descrição dos comandos e de eventuais alarmes, sintomas e indicadores de avaria, nos termos do n.º 3 do artigo 202º do RT-SCIE;
1.13. Estão em falta os organogramas funcionais de SSI, nos termos da alínea a) do n.º 3 do artigo 205º do RT-SCIE;
1.14. No que concerne ao risco florestal, deve ser dado cumprimento às distâncias de seguranças previstas no n.º 6 do artigo 202º do RT-SCIE, complementado pela Lei n.º 76/2017, de 17 de Agosto, bem como, com a colocação de hidrantes exteriores;
1.15. Devem ser revistos os procedimentos de alarme face aos equipamentos e sistemas existentes no edifício;
1.16. Os procedimentos de alerta deverão processar-se de forma automática através da CDi após confirmação de incêndio;
1.17. Solicita-se esclarecimento face aos equipamentos de SCIE que são alimentados pelo gerador mencionado no plano;
1.18. As plantas de segurança não se encontram totalmente correctas face ao número e localização dos equipamentos de segurança existentes no edifício, bem como, aos percursos de evacuação;
1.19. A evacuação dos quartos (locais de risco E), localizados no piso do r/chão, não poderá ser através de um local de risco B - Safão (n.º 4 em legenda), com efectivo de 60 pessoas (ver planta n.º 02);
1.20. As plantas de emergência apresentadas não foram elaboradas de acordo com a norma NP 4386/2014.
Mais se informa que, a unidade hoteleira só reunirá as condições de segurança requeridas na legislação, quando as desconformidades apontadas forem corrigidas e as Medidas de Autoprotecção forem aprovadas e implementadas.”
- Cfr. fls. 764- 766 e 771-773 dos autos;

P) Em 2016, o estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco vendeu um total de 9.970 quartos, dos quais 6.959, a cidadãos estrangeiros.- Admitido por acordo;

Q) Em 2016, o estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco arrecadou €280.743,78 de receita, provenientes da venda de alimentação, em eventos.- Admitido por acordo;

R) Em 2017, o estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco vendeu um total de 10.574 quartos, dos quais 7.802, a cidadãos estrangeiros.- Admitido por acordo;

S) Em 2017, o estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco arrecadou de receita €235.165,80, provenientes da venda de alimentação, em eventos.- Admitido por acordo;

T) No ano de 2018, até ao mês de Agosto, o estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco vendeu um total de 6.855 quartos, dos quais 5.207, a cidadãos estrangeiros.- Admitido por acordo;

U) No ano de 2018, até ao mês de Agosto, o estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco arrecadou de receita €181.260,85, provenientes da venda de alimentação, em eventos.- Admitido por acordo;

V) Até ao dia 31.12.2018, encontravam-se efectuadas 1.210 reservas de quartos no estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco, no valor total de €144.223,12- cfr. fls. 205-241 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
W) O prédio onde está instalado o estabelecimento Hoeteleiro Palace Hotel do Buçaco localiza-se no interior da Mata Nacional do Buçaco, rodeado de floresta, com cerca de 105 hectares.- Cfr. fls. 493, 494 e 497 dos autos.
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Com interesse para a decisão, julgo não provados os seguintes factos:
1)- Entre 17.09.2018 e 31.12.2018, encontram-se marcados eventos, no estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco, cuja realização implica a obtenção de receitas, no valor total de 144.722,00.
2)- O encerramento do Palace Hotel do Buçaco, no período entre 17.09.2018 e 16.03.2019, implica a perda de resultados operacionais no valor de €189.162,48 Euros;
3)- No período entre 17.09.2018 e 16.03.2019, a Requerente tem de despender, com custos fixos do pessoal afecto ao estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco, a quantia total de €253.325,40.
4)- No período entre 17.09.2018 e 16.03.2019, a Requerente tem de despender, com outros custos fixos relativos ao estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco, a quantia total de €20.265,13, nomeadamente, relacionados com contratos de fornecimento de electricidade, gás, água, TV cabo e satélite, internet, com higiene e segurança alimentar, apoio informático, medicina no trabalho, desinfestação, recolha de lixo, terminal de pagamento automático multibanco, seguros e manutenção de elevadores.
5)- O encerramento do Palace Hotel do Buçaco, no período entre 17.09.2018 e 16.03.2019, implica o pagamento de indemnizações aos trabalhadores no valor total de €807.487,82, em virtude do encerramento.
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Motivação: A convicção que permitiu julgar provados os factos acima descritos formou-se com base na sua admissão por acordo, decorrente da falta de impugnação especificada, bem como na análise crítica dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo [PA] apenso, conforme discriminado em cada uma das alíneas dos factos assentes.
Por sua vez, o julgamento negativo dos factos indicados como não provados resultou da sua impugnação especificada, por parte da Entidade Requerida, associada à falta de elementos probatórios que permitam formar convicção, minimamente fundada, no sentido da sua ocorrência.
Efectivamente, os documentos particulares juntos a fls. 245-248, não se mostram, em si mesmos, susceptíveis de comprovar os factos indicados em 1) a 7), uma vez que o respectivo teor corresponde somente à informação do valor discriminado pelas várias componentes consideradas para cálculo dos prejuízos alegados, os quais foram especificadamente impugnados, não tendo sido oferecida, pela Requerente, qualquer prova das situações aí discriminadas, designadamente, documentos comprovativos das marcações de eventos efectuadas no estabelecimento ou quaisquer contratos relativos ao pessoal que indicou como custo fixo. De igual modo, a Requerente não juntou quaisquer contratos ou facturas relativas ao fornecimento de electricidade, gás, água, TV cabo e satélite, internet, higiene e segurança alimentar, apoio informático, medicina no trabalho, desinfestação, recolha de lixo, terminal de pagamento automático multibanco, seguros ou manutenção de elevadores, relacionados com o referido estabelecimento.
Nem de resto, pela Requerente, foram requeridas quaisquer outras diligências de prova, designadamente, testemunhal, destinadas à comprovação desses factos, assim como da alegada a perda de resultados operacionais e respectivo valor, bem como da invocada necessidade de pagamento de indemnizações aos trabalhadores, em virtude do encerramento.”



III- APRECIAÇÃO DO RECURSO
A Recorrente requereu no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa a presente providência cautelar contra a o Ministério da Administração Interna, peticionando a a suspensão da eficácia do ato proferido em 31/08/2018 pelo Presidente da Autoridade Nacional de Proteção Civil, que determinou o encerramento provisório do estabelecimento hoteleiro denominado Palace Hotel do Buçaco, concessionado à agora Recorrente.
O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa indeferiu o decretamento da providência cautelar pedida com fundamento na inverificação do requisito atinente ao periculum in mora.
Discorda a Recorrente do julgado na Instância a quo, imputando-lhe nulidade e erros de julgamento.
Passemos, pois, ao exame da decisão recorrida.


I) Quanto à imputada nulidade nos termos do disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, por contradição de fundamentos
A Recorrente esgrime, em primeiro lugar, que a sentença a quo padece de nulidade, consonantemente com o disposto no art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, em virtude de contradição de fundamentos. E concretiza esta impetração nas conclusões GG), HH), JJ) e KK) do seu recurso jurisdicional.
Ademais, e para melhor compreensão e clarificação da patologia que é apontada pela Recorrente, importa transcrever o trecho do corpo das alegações em que a nulidade é assacada à decisão agora sob recurso:
“(…)
IV. DAS CONTRADIÇÕES E AMBIGUIDADES DA DECISÃO RECORRIDA
Vem ainda a decisão recorrida sustentar o seguinte:
“Efectivamente, das circunstâncias alegadas e provadas nos presentes autos não resulta provável que, por conta dos efeitos do despacho suspendendo, esteja em risco a própria subsistência económico-financeira da sociedade Requerente, sendo certo que a mesma não alegou que a exploração do estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco constitui a sua única fonte de rendimento.”.
Para, logo de seguida, referir o seguinte:
“Na verdade, à excepção da exploração do Palace Hotel do Buçalo, a Requerente nada alegou de concreto quanto às actividades económicas por si desenvolvidas e dimensão do negócio, desconhecendo-se, nomeadamente, se este é o único estabelecimento hoteleiro que explora e qual a sua rela situação patrimonial e financeira, de molde a que se possa aferir do impacto da medida de encerramento daquele estabelecimento hoteleiro, na sua esfera jurídica, sendo certo que o despacho suspendendo não implica o encerramento definitivo do estabelecimento, destinando-se a vigorar apenas até à efectiva correcção das ilegalidades verificadas na inspecção realizada pelo Comando Distrital de Operações de Aveiro, em 17.07.2018.”.
Sem prejuízo de não ser essencial para o preenchimento do requisito do periculum in mora a alegação (e prova) de que o referido estabelecimento hoteleiro constitui a sua única fonte de rendimentos – o que, por ora, não releva –, vem a douta decisão recorrida alegar o seguinte:
· Por um lado, alega que a subsistência económico-financeira da Recorrente não parece estar em risco, na medida em que não foi alegado que este era a sua única fonte de rendimento;

· Por outro, sustenta que desconhece se este é efetivamente o único estabelecimento hoteleiro que a Recorrente explora.

Como é bom de ver, não é claro qual é o iter cognoscitivo do douto Tribunal a quo: esta argumentação afigura-se, no mínimo, como ambígua, podendo, até, ser qualificada como contraditória.

Com efeito, ou (i) foi alegado e provado tal facto e, por conhecê-lo, o douto Tribunal a quo deve decidir em conformidade; ou (ii) ainda que tenha sido alegado, não tendo sido provado, o douto Tribunal a quo não o considera relevante, desconsiderando-o (i.e., desconhecendo-o.): não pode é dar o dito por não dito e ora considerá-lo relevante, julgando em conformidade, e, logo de seguida, sustentar que o desconhece, mantendo tal decisão!

(…)

Caso assim não se considere – o que não se concede e apenas por mera cautela de patrocínio –, sempre se dirá que tal excerto consubstancia um fundamento ambíguo ou obscuro e que, nessa medida, tornando a decisão ininteligível, implica a nulidade da sentença recorrida, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.

Não se compreende também a conclusão, retirada pelo Tribunal a quo, pela qual os danos da imagem adviriam dos motivos que fundamentam o encerramento do estabelecimento hoteleiro e não do próprio encerramento.

Ora, tal argumento não é mutuamente excludente: o facto de um facto X poder, em abstrato, produzir o dano A, não quer dizer que este mesmo dano A não seja produzido pelo facto Y.

Por outras palavras: constituirá, no mínimo, uma máxima de experiência o facto de se poder considerar como danoso para a imagem, para a reputação e para o prestígio de um estabelecimento hoteleiro o seu encerramento abrupto no qual vão implicados cancelamentos de reservas de quartos e de eventos e indemnizações aos trabalhadores.

Donde se retira, uma vez mais, um segmento (no mínimo) confuso da douta decisão recorrida.

(…)”.

Ora, desde já se adianta que a sentença recorrida não padece da patologia que a Recorrente lhe assaca, fracassando a vertente impetração.
Vejamos porquê.

O art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, aplicável ao contencioso administrativo por força da consagração contida no art.º 140.º, n.º 3 do CPTA, estipula que é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. A prescrição desta sanção, para a sentença que patenteie uma contradição entre o sentido do dispositivo final e os fundamentos de facto e de direito donde decorre aquele dispositivo, configura um relevante mecanismo de salvaguarda dos direitos de ação e de defesa das partes processuais, revelando a intolerância e a inadmissibilidade de decisões judiciais incompreensíveis, em termos lógico-jurídicos, para os seus destinatários. De igual modo, e pelas mesmíssimas razões, é punida com a respetiva nulidade a sentença que apresente ambiguidade ou obscuridade que a tornem ininteligível. Ou seja, pretende-se asseverar a clareza e a racionalidade das decisões judiciais, enquanto instrumentos de tutela jurisdicional e, em última instância, de realização da Justiça.
A dificuldade que se coloca nesta sede é, em primeiro lugar, a de identificar as situações em que “os fundamentos estejam em oposição com a decisão” e, em segundo lugar, descortinar o que deve entender-se por “ambiguidade” e “obscuridade” para efeitos de causa de nulidade da sentença.
No que concerne à oposição entre o sentido da decisão final e os respetivos fundamentos fáctico-jurídicos, salienta-se o afirmado pelo Colendo Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão proferido em 14/02/2019, no processo 08/18.0BCLSB:
“(…) De acordo com o art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC é nula a decisão quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão (no que agora interessa).
É jurisprudência uniforme que esta nulidade da sentença ou acórdão, por contradição entre os fundamentos e a decisão apenas se verifica quando a decisão proferida padeça de erro lógico na conclusão do raciocínio jurídico, por a argumentação desenvolvida no acórdão apontar num determinado sentido e, apesar disso, a decisão ser em sentido contrário ou oposto. Contradição lógica, esta, que não se confunde com erro de julgamento, isto é, a errada interpretação ou aplicação do direito. (sublinhado nosso).
E já no Acórdão prolatado no processo 0865/15, em 12/07/2017, a Colenda Instância teve ocasião para consagrar (em sumário do aludido Acórdão) que “Não ocorre a nulidade inserta na al. c) do mesmo preceito [art.º 615.º, n.º 1 do CPC] se analisada a estrutura global da decisão judicial impugnada a respetiva conclusão decisória está logicamente encadeada com a motivação fáctico-jurídica nela desenvolvida, estando fora do âmbito da nulidade em análise pretensas situações de erro ou deficiente julgamento de facto e sua motivação/fundamentação.”
Quer isto significar que a “oposição” a que faz referência o normativo contido na al. c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC concretiza-se na antinomia, incoerência, ou desarmonia lógica entre as razões de facto e de direito elencadas na decisão judicial e a consequência decisória final extraída dessas mesmas razões fundamentadoras, no sentido de que estas razões fundamentadoras determinam, racional e logicamente, uma decisão final diversa da que está contida no dispositivo da sentença.
No que respeita à “obscuridade” e “ambiguidade” da sentença, interessa estabelecer que estas disfunções apenas inquinam de nulidade a decisão judicial quando a tornam ininteligível, consonantemente com o esclarecido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14/09/2017, tirado no processo 01274/16 (sumário):
“I - Os «fundamentos» justificativos da decisão são constituídos pelos factos e pelas regras jurídicas - normas e princípios - em que a mesma se alicerça, que lhe dão apoio, que a impõem;
II - É «obscuro» o que não é claro, aquilo que não se entende;
III - É «ambíguo» o que se preste a interpretações diferentes;
IV - Não é qualquer «obscuridade» ou «ambiguidade» que é sancionada com a nulidade do acórdão, mas apenas aquela que torne a decisão ininteligível.”
Aliás, a compreensão do que consiste o erro lógico perpetrado ao longo do iter fundamentador e decisório da sentença, bem como do que consubstancia “obscuridade” ou “ambiguidade” relevantes, emerge, entre outros, do Acórdão tirado em 08/11/2018 no processo 0149/18.3BALSB, em que a mesma Suprema Instância explicita, além do mais, o seguinte:
“(…)
A nulidade do acórdão, por «contradição entre os fundamentos e a decisão», que é prevista na alínea c), do n.º1, do artigo 615.º do CPC, verifica-se quando há um vício na lógica-jurídica que presidiu à respectiva construção, de tal modo que os «fundamentos» invocados apontam logicamente num determinado sentido, e a «decisão» tomada vai noutro sentido, oposto, ou pelo menos diverso. Trata-se de doutrina pacífica e recorrente na jurisprudência dos Tribunais Superiores.
A mesma alínea do n.º1 do artigo 615.º do CPC sanciona com a nulidade, ainda, o acórdão em que «ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível».
Como se sabe, é «obscuro» o que não é claro, aquilo que não se entende; e é «ambíguo» o que se preste a interpretações diferentes. Em qualquer caso, fica o destinatário da sentença ou acórdão sem saber ao certo o que efectivamente se decidiu, ou quis decidir. Mas não é qualquer obscuridade, ou ambiguidade, que é sancionada com a nulidade do acórdão, mas apenas aquela que «torne a decisão ininteligível».
(…)
O acórdão, porque desnecessariamente longo, torna-se «confuso», mas não ao ponto de ser obscuro ou ambíguo de modo a tornar a decisão ininteligível. Aliás, a sua linha de desenvolvimento de apreciação factual e jurídica consegue, como já o fizemos acima, ser detectada por um jurista.
E dessa confusão resultam algumas afirmações aparentemente «contraditórias», de modo que a recorrente as invocou como fundamento de nulidade. De facto, afirmar-se [folha 8 do acórdão, e folha 222 dos autos] que «o acto que visou executar o julgado apreciou todas as provas apresentadas pela interessada, incluindo as que apresentou aquando do pedido de execução do julgado», parece, numa primeira análise, impor a decisão extraída pela 1ª instância, de julgamento de improcedência do pedido de execução. E não foi isso que aconteceu, mas antes o contrário. Porém, note-se, logo de seguida o acórdão deslocou a questão [folha 8 do acórdão, e folha 222 dos autos] para «o acerto da apreciação da prova produzida e para o incumprimento do princípio do inquisitório por parte da entidade demandada, designadamente por não ter ouvido as testemunhas indicadas pela interessada, cuja relevância parece resultar dos termos em que foi apreciada aquela prova». E foi a apreciação desta questão que conduziu a outra conclusão extraída no acórdão, segundo a qual «é manifesto que os autos revelam, claramente, que não foi dado cumprimento ao julgado anulatório em causa, com inobservância do caso julgado pelo novo acto praticado pela entidade demandada […] o que acarreta a nulidade do novo acto que renovou a recusa da inscrição» [folhas 28 e 29 do acórdão e 242 e 243 dos autos]. O que justificou - obviamente - a revogação da sentença aí recorrida. O restante conteúdo da decisão da 2ª instância pertence, já, a um conhecimento em substituição, e resulta de o acórdão ter considerado preenchidos os requisitos necessários à inscrição da recorrente como TOC [folhas 35 do acórdão e 249 dos autos, entre outras].
Constata-se, assim, que a afirmação invocada não pode ser isolada do contexto total do acórdão recorrido, e que, tendo este em conta, a decisão não entra em «oposição» com os seus fundamentos, o que significa que a nulidade invocada e prevista na alínea c) do nº1 do artigo 615º do CPC [ex vi artigo 1º e 140º CPTA] também não se verifica.
(…)”.
Postas estas considerações, regressemos ao caso versado.

A Recorrente, após destacar um excerto da sentença recorrida, clama que o mesmo encerra um discurso contraditório no que toca aos fundamentos de facto.
Mas não lhe assiste razão.
Com efeito, perscrutada a sentença em discussão, verifica-se que, em primeiro lugar, o discurso fundamentador da sentença é harmonioso com o dispositivo final. Realmente, a sentença rejeita a concessão da suspensão da eficácia do ato que determinou o encerramento preventivo e provisório do estabelecimento hoteleiro denominado Palace Hotel do Buçaco por entender que a execução do mencionado encerramento não traduz uma situação de facto consumado, nem acarreta prejuízo de difícil reparação.
Apoia-se a sentença em duas linhas de argumentos: por um lado, a Recorrente não invocou factos concretos suficientes e aptos a demonstrar qual o real e efetivo impacto que o período de encerramento provisório do concreto estabelecimento hoteleiro poderá causar à posição e vida económico-financeira da Requerente; por outro lado, a Requerente não requereu, nem diligenciou no sentido de desenvolver atividade probatória capaz de demonstrar diversos prejuízos invocados pela mesma, concretamente, os prejuízos conduzidos ao probatório a título de “factos não provados”.
Nessa senda, já em sede de enquadramento da factualidade provada, o Tribunal a quo alcançou a conclusão de que a situação da Recorrente, porque não acarretava periculum in mora, não reunia os requisitos para o decretamento da medida cautelar pretendida, tudo em consonância com o previsto no art.º 120.º, n.º 1 do CPTA.
Ora, não se vislumbra, neste percurso fundamentador trilhado pela sentença em crise, qualquer antinomia entre a decisão final de recusa do decretamento da providência cautelar e os fundamentos factuais e jurídicos que lhe servem de esteio.
É certo que a Recorrente ataca a seleção da factualidade vertida no probatório, bem como a valoração da prova documental e respetivo enquadramento jurídico da citada factualidade. Todavia, estas impetrações em nada se relacionam com o fundamento de nulidade da sentença convocado no caso versado, antes configurando causas eventuais de revogação da sentença a quo, em virtude de deverem ser qualificadas como erro de julgamento.
Em segundo lugar, é de anotar que o excerto da sentença recorrida no qual a Recorrente estriba a imputação de contradição não pode deixar de ser contextualizado, por forma a retirar de tal excerto uma interpretação coerente com a economia e horizonte da própria sentença.
Efetivamente, a sentença em causa contém, além do mais, o seguinte discurso fundamentador:
“(…)
Com efeito, à Requerente cabe, enquanto pressuposto prévio do ónus de prova, o ónus de alegar factos concretos suficientes que, caso venham a ser provados, permitam ao tribunal julgar como provável a verificação de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação [cfr. artigo 114.º, n.º 3, alínea g), do CPTA].
Porém, no caso dos autos, os factos concretos alegados pela Requerente não permitem, por insuficiência, configurar uma situação susceptível de preencher o pressuposto do periculum in mora, previsto na 1.ª parte, do n.º 1, do artigo 120.º do CPTA, desde logo, no que concerne aos invocados prejuízos financeiros.
De facto, as circunstâncias concretas alegadas não permitem concluir, com o mínimo de probabilidade, no sentido de que o encerramento temporário do Palace Hotel do Buçaco implica a constituição de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação na esfera jurídica da Requerente, enquanto pessoa colectiva autónoma àquele estabelecimento hoteleiro, o qual constitui um mero instrumento de desenvolvimento da sua actividade económica.
(…)
Efectivamente, das circunstâncias alegadas e provadas nos presentes autos não resulta provável que, por conta dos efeitos do despacho suspendendo, esteja em risco a própria subsistência económico-financeira da sociedade Requerente, sendo certo que a mesma não alegou que a exploração do estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco constitui a sua única fonte de rendimentos.
Na verdade, à excepção da exploração do Palace Hotel do Buçaco, a Requerente nada alegou de concreto quanto às actividades económicas por si desenvolvidas e dimensão de negócio, desconhecendo-se, nomeadamente, se este é o único estabelecimento hoteleiro que explora e qual a sua real situação patrimonial e financeira, de molde a que se possa aferir do impacto da medida de encerramento daquele estabelecimento hoteleiro, na sua esfera jurídica, sendo certo que o despacho suspendendo não implica o encerramento definitivo do estabelecimento, destinando-se a vigorar apenas até à efectiva correcção das ilegalidades verificadas na inspecção realizada pelo Comando Distrital de Operações de Aveiro, em 17.07.2018. (negro nosso)
(…)
A alegação de que o encerramento compulsivo do Palace Hotel do Buçaco, pelo período determinado, acarreta prejuízos financeiros, em consequência, designadamente, do cancelamento das reservas já efectuadas e dos eventos marcados, implicando a perda de resultados operacionais e prejuízos referentes a custos fixos com pessoal e com outros contratos, bem como o pagamento de indemnizações a trabalhadores não satisfaz as exigências do pressuposto ínsito na 1.ª parte, do n.º 1, do artigo 120.º do CPTA, que impõe a existência de um fundado receio da produção de danos de difícil reparação.
Ora, na situação dos autos, a situação configurada pela Requerente, relativamente aos prejuízos de natureza económico-financeira não permitem antever uma situação de periculum in mora, na medida em que não foi alegado qualquer facto atinente à sua concreta situação financeira, que permita concluir no sentido da constituição de uma situação de facto consumado ou ocorrência de prejuízos de difícil reparação na sua esfera pessoal, caso a providência requerida não seja decretada.
Relativamente ao pagamento de eventuais indemnizações, derivadas do cancelamento de reservas de quartos e eventos já agendados, assim como em relação à perda de resultados operacionais, custos com o pessoal e com outros contratos atinentes ao estabelecimento hoteleiro aqui em causa, tratando-se de danos de natureza pecuniária, tais prejuízos são susceptíveis de ressarcimento no âmbito do processo principal, caso se conclua pelas ilegalidades imputadas ao acto suspendendo.
Acresce que, no caso concreto, os alegados danos relativos à imagem da Requerente no mercado, bem como os relativos ao prestígio e à reputação do Palace Hotel do Buçaco no mercado internacional e, ainda, a repercussão desses danos em termos da clientela não decorrem dos efeitos da medida de encerramento em litígio, mas dos motivos que a fundamentam, os quais se consubstanciam na ausência de condições de segurança, de pessoas e bens, contra incêndios no edifício onde se encontra instalado o estabelecimento hoteleiro em causa, encontrando-se tais irregularidades evidenciadas no relatório da inspecção realizada, pelo Comando Distrital de Operações de Aveiro da Autoridade Nacional de Protecção Civil, no dia 17.07.2018 [cfr. os factos assentes em E) e F)] , e cuja verificação a Requerente não questionou, não se verificando, por isso, o necessário nexo causal entre os efeitos do acto suspendendo e esses prejuízos.
Não se afigurando nem, aliás, tendo sido alegada a obrigatoriedade de publicitação dos fundamentos do acto suspendendo, não se antevê, no caso, que a razão destes prejuízos esteja conexionada com a execução do despacho do Presidente da Autoridade Nacional de Protecção Civil, de 30.08.2018, aqui em crise.
(…)
Em suma, o ónus de alegação especificada que impende sobre a Requerente exigia da sua parte a configuração de um dano qualificado, ainda que de natureza económica, o que não se verifica, pois, no caso dos autos, a situação alegada pela Requerente não permite concluir pela probabilidade de ocorrência prejuízos, efectivos e iminentes, na sua esfera pessoal, cuja tutela se mostre insusceptível de ser cabalmente assegurada no âmbito do processo principal.
No caso, incumbiam à Requerente os ónus de alegação e de prova dos factos justificativos da concessão da tutela cautelar requerida, designadamente, a existência de uma situação de periculum in mora, o que não logrou fazer, não resultando, de facto, concretizados quaisquer danos decorrentes da medida provisória de encerramento do Palace Hotel do Buçaco que se afigurem irreversíveis ou cuja reparação se mostre especialmente difícil, caso a acção principal venha a proceder.
Nestes termos, não permitindo os factos concretos alegados concluir pela provável constituição, na esfera jurídica da Requerente, de uma situação de facto consumado ou pela produção de prejuízos de difícil reparação, é de julgar não verificado o requisito do periculum in mora, ínsito na primeira parte do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.
(…)”.
Examinado o trecho transcrito da sentença recorrida, no qual se inclui, a negro, o excerto convocado pela Recorrente como demonstrador da contradição entre os termos da sentença, não se identifica, na verdade, qualquer contradição ou oposição, uma vez que, o que tal trecho pretende realçar, é o facto da Recorrente não ter substanciado factualmente a sua situação económico-financeira, por forma a permitir ao Tribunal a quo ajuizar do impacto e significância dos factos provados nas alíneas P) a W) do probatório. É que, a Recorrente e o estabelecimento hoteleiro em discussão constituem duas realidades diversas, não se sabendo- porque a Recorrente não alegou factos nesse sentido- se o estabelecimento hoteleiro em causa é o único, dependendo toda a atividade comercial e económica da Recorrente desse estabelecimento, ou se é um entre vários e, neste caso, qual a significância das receitas geradas por tal estabelecimento na contabilidade e economia da Recorrente.
Daí que a sentença recorrida tenha enunciado, não só o facto de não ter sido alegado pela Recorrente “que a exploração do estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco constitui a sua única fonte de rendimentos”, como também que a Recorrente “nada alegou de concreto quanto às actividades económicas por si desenvolvidas e dimensão de negócio, desconhecendo-se, nomeadamente, se este é o único estabelecimento hoteleiro que explora e qual a sua real situação patrimonial e financeira, de molde a que se possa aferir do impacto da medida de encerramento daquele estabelecimento hoteleiro, na sua esfera jurídica”.
Sendo assim, não se identifica, pois, qualquer oposição ou contradição.
Finalmente, não ocorre qualquer ambiguidade ou obscuridade na sentença a quo, uma vez que, em bom rigor, o alegado pela Recorrente na conclusão KK) do recurso consubstancia a enunciação de uma mera discordância relativamente ao juízo jurídico-conclusivo patenteado na sentença recorrida e não, propriamente, a enunciação de um aspeto ininteligível, incompreensível ou de interpretação ambivalente.

Assim sendo, não se verificando a oposição entre o dispositivo da sentença recorrida e os respetivos fundamentos, bem como inexistindo obscuridade ou ambiguidade na mesma, improcede o vertente recurso no que tange ao alegado nas conclusões GG), HH), JJ) e KK).

Destarte, urge assentar que a sentença em causa não padece da nulidade que lhe é imputada, assomando a procedência do vertente recurso jurisdicional, nesta parte, como totalmente inviável.


II) Quanto ao erro de julgamento no que tange à valoração da prova e à seleção da factualidade conduzida ao probatório como assente
Nas conclusões R), S), T), U), V), W), X). Y), Z), AA), BB), CC), DD), EE), FF) e II) das alegações do recurso, a Recorrente imputa vários erros de julgamento à sentença recorrida.
Realmente, sufraga a Recorrente, primus, que a sentença recorrida não clarifica na respetiva fundamentação a afirmada “insuficiência” de factos, em virtude de a mesma não explicitar se a aludida insuficiência deriva do incumprimento do ónus de alegação, do ónus de demonstração, ou se ambos.
Não lhe assiste, contudo, razão.
Perscrutado o probatório da sentença em crise, quer a factualidade dada como provada, quer a factualidade valorizada como não provada e, bem assim, a motivação respetiva, verifica-se que o Tribunal a quo explicitou, exatamente, as razões pelas quais conduziu ao probatórios determinados factos como provados e outros como não provados.
Assim, no que concerne à factualidade valorizada como provada, a 1.ª Instância explicitou que “a convicção que permitiu julgar provados os factos acima descritos formou-se com base na sua admissão por acordo, decorrente da falta de impugnação especificada, bem como na análise crítica dos documentos constantes dos autos e do processo administrativo [PA] apenso, conforme discriminado em cada uma das alíneas dos factos assentes”.
Por seu turno, a convicção negativa quanto à factualidade vertida nos pontos 1 a 5 do probatório “resultou da sua impugnação especificada, por parte da Entidade Requerida, associada à falta de elementos probatórios que permitam formar convicção, minimamente fundada, no sentido da sua ocorrência”. E explicou porque assim sucedia, pois que, “os documentos particulares juntos a fls. 245-248, não se mostram, em si mesmos, susceptíveis de comprovar os factos indicados em 1) a 7), uma vez que o respectivo teor corresponde somente à informação do valor discriminado pelas várias componentes consideradas para cálculo dos prejuízos alegados, os quais foram especificadamente impugnados, não tendo sido oferecida, pela Requerente, qualquer prova das situações aí discriminadas, designadamente, documentos comprovativos das marcações de eventos efectuadas no estabelecimento ou quaisquer contratos relativos ao pessoal que indicou como custo fixo. De igual modo, a Requerente não juntou quaisquer contratos ou facturas relativas ao fornecimento de electricidade, gás, água, TV cabo e satélite, internet, higiene e segurança alimentar, apoio informático, medicina no trabalho, desinfestação, recolha de lixo, terminal de pagamento automático multibanco, seguros ou manutenção de elevadores, relacionados com o referido estabelecimento.
Nem de resto, pela Requerente, foram requeridas quaisquer outras diligências de prova, designadamente, testemunhal, destinadas à comprovação desses factos, assim como da alegada a perda de resultados operacionais e respectivo valor, bem como da invocada necessidade de pagamento de indemnizações aos trabalhadores, em virtude do encerramento”.
Quer isto significar, portanto, que as razões que conduziram o Tribunal a dar como demonstrados determinados factos e a entender como não demonstrados outros factos estão patenteadas na motivação crítica da fundamentação de facto da sentença, não se descortinando qualquer omissão ou silenciamento quanto à motivação do probatório.
Do que vem de se expor resulta claro em que pontos é que a Recorrente incumpriu o ónus de demonstração dos factos alegados, ou seja, precisamente quanto à factualidade que foi espraiada no probatório negativo. Pelo que, não merece qualquer acolhimento a visão da Recorrente quanto à deficiente explicitação do incumprimento do ónus da prova.
Adicionalmente, impera esclarecer a Recorrente de que a questão atinente à suficiência de alegação é já querela que não se enxerta na fundamentação fáctica da sentença, mas sim no enquadramento fáctico-jurídico, isto é, na subsunção dos factos considerados provados nos institutos jurídicos pertinentes, não constituindo esta sede a oportunidade adequada ao escrutínio de tal questão.

Secundus, clama a Recorrente pelo cumprimento do ónus da prova quanto aos factos elencados nos pontos 1 a 5 do probatório negativo, pois que, o Recorrido não os impugnou especificadamente. O que, nos termos do disposto no art.º 118.º, n.º 2 do CPTA, implica que tais factos se presumam como verdadeiros.
Ora, uma vez mais, a razão não está do lado da Recorrente.
Efetivamente, é verdade que a Recorrente, nos artigos 134.º, 135.º, 136.º, 137.º, 138.º, 139.º, 163.º, 164.º, 165.º, 166.º, 167.º, 168.º, 169.º, 170.º, 171.º, 172.º, 173.º, 174.º, 175.º, 176.º, 177.º, 178.º, 179.º, 180.º, 181.º e 182.º do seu requerimento inicial, alegou, além do mais, os factos respeitantes aos prejuízos. Porém, também é certo que o Recorrido, na oposição oferecida, dedica- para além doutros- os artigos 45.º, 46.º, 49.º, 50.º, 51.º, 52.º, 56.º, 57.º, 58.º e 59.º à impugnação da factualidade inserta nos enumerados artigos do requerimento inicial.
Realmente, nos artigos 45.º, 46.º, 49.º, 50.º, 51.º, 52.º, 56.º, 57.º, 58.º e 59.º da oposição apresentada, o Recorrido não só contradita os factos invocados pela Recorrente, como também intenta, por um lado, abalar o juízo factual que a Recorrente elabora como, por outro lado, contrariar as presunções construídas a partir desses mesmos factos. De resto, no artigo 59.º da oposição, o Recorrido impugna expressamente o invocado pela Recorrente nos artigos 134.º, 135.º, 136.º, 137.º, 138.º, 139.º, 163.º, 164.º, 165.º, 166.º, 167.º, 169.º, 170.º, 171.º, 172.º, 176.º, 177.º, 178.º, 179.º, 180.º, 181.º e 182.º do requerimento inicial.
O que vem de expender-se força, inequivocamente, a conclusão de que, contrariamente ao alegado pela Recorrente, não só foi apresentada oposição pelo agora Recorrido, como a factualidade invocada pela Recorrente, e que o Tribunal a quo coligiu no probatório negativo, foi, claramente, impugnada pelo Recorrido. O que quer significar, portanto, que não ocorre o pressuposto básico da operatividade do prescrito no art.º 118.º, n.º 2 do CPTA.
De facto, o n.º 2 do mencionado preceito estatui que “na falta de oposição, presumem-se verdadeiros os factos invocados pelo requerente” no requerimento inicial da providência cautelar. No entanto, tal ditame não deve ser caracterizado como uma presunção legal na aceção do previsto nos art.ºs 344.º, n.º 1 e 350.º, n.º 1 do Código Civil, mas antes como uma cominação para a ausência de determinada atuação processual por parte do requerido. O enquadramento mais adequado a conferir àquela presunção de veracidade aponta para o estabelecimento de um mecanismo idêntico e correspondente à confissão dos factos em situação de revelia, nos moldes do estabelecido no art.º 567.º, n.º 1 do CPC.
Ora, tendo sido apresentada oposição, queda afastada a aplicação do n.º 2 do art.º 118.º, importando então indagar dos exatos termos da impugnação realizada, por forma a reunir, como provados, nomeadamente, os factos admitidos por acordo- nos casos em que não subsista impugnação-, similarmente ao que prescrevem as regras que emergem do art.º 83.º, n.ºs 1, 2 e 3 do CPTA, que instituem um ónus de impugnação especificada e um real efeito cominatório para o incumprimento desse ónus.
Do que vem de dizer-se dimana, de modo lógico, que o art.º 118.º, n.º 2 do CPTA não institui uma presunção legal, à qual corresponda uma inversão do ónus da prova, passando a atividade instrutória pela concretização do encargo da elisão da presunção, nos termos estabelecidos nos citados art.ºs 344.º, n.º 1 e 350.º do Código Civil. Com efeito, tal visão implicaria, de acordo com a tese da Recorrente, que sobre o requerido impenderia sempre o ónus de demonstrar uma realidade oposta, ou diversa, da que foi descrita pela requerente, competindo-lhe desenvolver toda a atividade probatória, não para propiciar o sucesso da pretensão cautelar deduzida, mas antes para asseverar o fracasso da referida pretensão. Ora, grassa à evidência que a tese da Recorrente ultrapassa claramente a letra e o espírito da norma inscrita no n.º 2 do art.º 118.º, dado que arrasta uma consequência processual que afronta dois dos pilares fundamentais da arquitetura processual vigente: o princípio da igualdade das partes processuais e o princípio do dispositivo.
Em concomitância, refira-se que as regras de repartição do ónus da prova, bem como a modelação para casos especiais, não comportam a admissibilidade da tese da Recorrente, pois que onus probandi ei incumbit qui dicit, non qui negat, de acordo com a fórmula vigente desde tempos ancestrais, acolhida nos art.ºs 341.º e 342.º do Código Civil.
Deste modo, atento todo o exposto, é mister concluir pelo insucesso da iargumentação da Recorrente, no tocante ao fundamento do recurso jurisdicional vindo de escalpelizar.

Tertius, vem a Recorrente esgrimir, em ataque ao probatório negativo contido na sentença recorrida, que os meios de prova por si apresentados eram “suficientes para demonstrar a verosimilhança dos factos alegados”, até porque, “no âmbito das providências cautelares, o grau de prova consiste na mera justificação, pelo que basta que os factos alegados sejam verosímeis ou plausíveis para se considera verificado o periculum in mora, não sendo necessária a prova da sua certeza”.
E continua, ainda, a Recorrente a esbanjar a sua visão, sustentando então que “não sendo necessário apurar em termos certos se aqueles factos correspondem à realidade, e sendo o processo cautelar caracterizado pela sumariedade da cognição da matéria de facto e de direito, a exigência de uma prova exaustiva e exauriente não só não era exigível às partes, como não era, de todo o modo, desejável”.
Ora, é manifesto que a Recorrente labora em erro, confundindo, por um lado, o imperativo da demonstração dos factos com, por outro lado, o juízo de natureza jurídica, que deve ser construído e firmado a partir dos factos demonstrados, no sentido de alcançar a conclusão da existência de perigo de demora.
É que, enquanto o juízo conclusivo extraído a partir dos factos tem o fito criar a convicção- e não uma certeza apodítica- da ocorrência provável de uma situação de facto consumado ou de prejuízo de difícil reparação, bastando-se, pois, com raciocínios lógicos de verosimilhança e de plausibilidade, a coleção dos factos invocados pelo requerente da providência cautelar deve ser, necessariamente, demonstrada, sob pena de, assim não sendo, a concessão de providências cautelares servir situações ônticas perfeitamente hipotéticas e especulativas. E tal consequência contraria, precisamente, o intuito que preside à existência de providências cautelares, e que é o de impedir a verificação de situações de perda de utilidade da ação principal, ou seja, de situações da vida real em que a regulação jurisdicional definitiva tenha perdido toda a sua eficácia e interesse, em razão da alteração prévia da realidade.
Ademais, o regime jurídico das providências cautelares consagrado no CPTA conduz a asserções completamente divergentes da posição sufragada pela Recorrente. Basta, aliás, atentar no preceituado nos art.ºs 114.º, n.ºs 3, al.s f) e g) e 5, 116.º, n.º 2, al. a), 118.º, n.ºs 1, 3, 4, 5 e 6 e 121.º, todos do CPTA, para percecionar a importância da atividade instrutória a desenvolver em sede de providências cautelares, sendo certo que o não oferecimento, no requerimento inicial, da prova dos fundamentos fácticos em que se esteia o pedido cautelar pode conduzir, em última instância, à rejeição do requerimento inicial.
Mais se diga que a estipulação de summaria cognitio no domínio das providências cautelares visa balizar a intensidade da atividade processual das partes e do Julgador, visto que o objetivo não é o de atingir a convicção de “certeza” da existência do direito alegado, mas sim o de concluir pela probabilidade de verificação do direito e da lesão. Neste seguimento, o termo “sumário”, empregue na al. g) do n.º 3 do art.º 114.º pretende, quanto à matéria de facto, significar simplicidade, brevidade e concisão na atividade instrutória levada a cabo em sede de providências cautelares, atividade essa orientada por um princípio de necessidade e marcada pelo princípio do inquisitório. O que quer dizer, em afronto ao sustentado pela Recorrente, que a consagração da exigência de prova “sumária” não se reconduz à dispensa de prova e à ausência de atividade instrutória.
Assente que, mesmo em sede cautelar, é sempre necessário, para sucesso da pretensão cautelar, a demonstração de uma coleção, ainda que mínima, de factos sobre os quais há-de incidir a formulação do juízo jurídico-conclusivo quanto à subsistência de periculum in mora, importa averiguar se, no caso versado, a Recorrente ofereceu prova adequada e bastante no que concerne aos factos que constam do probatório negativo da sentença. Ou seja, cumpre examinar se, atentos os factos invocados pela Recorrente e perante a posição impugnatória explícita adotada pelo Recorrido, a sentença a quo errou ao consignar no probatório negativo os factos elencados nos pontos 1) a 5).
Ora, como já se clarificou em momento antecedente, estão em causa factos especificamente impugnados pelo Recorrido, o que desloca para a esfera da Recorrente o ónus da prova relativamente aos mesmos. E examinando a atividade instrutória realizada pela Recorrente, constata-se que, para além da prova documental existente nos autos, aquela não se socorreu, nem requereu, a produção de qualquer outro meio de prova para além da documental.
Por conseguinte, ou os factos em discussão encontram arrimo seguro nos aludidos documentos juntos aos autos e, nesse caso, devem ser tidos como demonstrados, ou, inexistindo elementos documentais suscetíveis de ancorar a convicção de verificação dos factos em discussão, deve ser formulada convicção negativa no que toca à ocorrência dos mencionados factos, em concordância com as regras de repartição do ónus da prova.
Escrutinado o manancial de elementos documentais juntos aos autos, é forçoso concluir que a sentença em crise não merece censura quanto à convicção negativa formulada a propósitos dos factos contidos nos pontos 1) a 5) do probatório negativo. Realmente, como bem assinala a sentença recorrida, o julgamento negativo dos factos indicados como não provados resultou da sua impugnação especificada, por parte da Entidade Requerida, associada à falta de elementos probatórios que permitam formar convicção, minimamente fundada, no sentido da sua ocorrência”. E, em seguida, explicita a afirmação da falta de elementos probatórios do seguinte modo:
“Efectivamente, os documentos particulares juntos a fls. 245-248, não se mostram, em si mesmos, susceptíveis de comprovar os factos indicados em 1) a 7), uma vez que o respectivo teor corresponde somente à informação do valor discriminado pelas várias componentes consideradas para cálculo dos prejuízos alegados, os quais foram especificadamente impugnados, não tendo sido oferecida, pela Requerente, qualquer prova das situações aí discriminadas, designadamente, documentos comprovativos das marcações de eventos efectuadas no estabelecimento ou quaisquer contratos relativos ao pessoal que indicou como custo fixo. De igual modo, a Requerente não juntou quaisquer contratos ou facturas relativas ao fornecimento de electricidade, gás, água, TV cabo e satélite, internet, higiene e segurança alimentar, apoio informático, medicina no trabalho, desinfestação, recolha de lixo, terminal de pagamento automático multibanco, seguros ou manutenção de elevadores, relacionados com o referido estabelecimento.
Nem de resto, pela Requerente, foram requeridas quaisquer outras diligências de prova, designadamente, testemunhal, destinadas à comprovação desses factos, assim como da alegada a perda de resultados operacionais e respectivo valor, bem como da invocada necessidade de pagamento de indemnizações aos trabalhadores, em virtude do encerramento.”
Sopesando a motivação da sentença em escrutínio e cotejando a mesma com os documentos constantes dos autos, não se recorta qualquer razão para imputar à sentença desacerto. Efetivamente, estando em causa documentos que não possuem força probatória tabelada, em virtude de constituírem documentos particulares, cumpre espoletar o funcionamento do princípio da livre apreciação. Nessa senda, tendo em consideração a aplicação do sobredito princípio, bem como a repartição do ónus da prova, resulta impreterível a conclusão de que, talqualmente como exarou a sentença a quo, não restava outra alternativa que não a da formulação de convicção negativa quanto aos factos em discussão.

Assim sendo, a decisão em crise não contém os erros de julgamento que lhe são apontados nas conclusões R), S), T), U), V), W), X). Y), Z), AA), BB), CC), DD), EE), FF) e II) do recurso. Pelo que, mostrando-se acertada a sentença a quo, soçobra, nesta parte, o vertente recurso jurisdicional.


III) Quanto ao erro de julgamento no que concerne à apreciação realizada quanto à verificação de fundado receio de constituição de situação de facto consumado e de prejuízo de difícil reparação, bem como quanto à ponderação realizada em sede de proporcionalidade, prescrita no n.º 2 do art.º 120.º do CPTA
A Recorrente, nas conclusões A), B), C), D), E), F), G), H), I, J), K), L), M), N), O), P), Q), MM), NN) e OO) do seu recurso, vem atacar a sentença a quo, afirmando que, contrariamente ao julgamento realizado por esta, ocorre fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado ou, no mínimo, de prejuízo de difícil reparação. Em suma, defende a Recorrente que a circunstância do estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco ter de encerrar implica, por si só, “prejuízos bastante avultados que a posterior invalidação do ato impugnado não poderia colmatar”, e que, “não seria possível a total reintegração in natura dos prejuízos decorrentes do encerramento hoteleiro, na medida em que estes não constituem apenas prejuízos decorrentes do cancelamento de reservas e de eventos, mas também se reconduzem à imagem, reputação e ao prestígio do Palace Hotel do Buçaco”.
A sentença recorrida formulou juízo negativo no que tange à verificação do requisito respeitante ao periculum in mora, estribando-o no seguinte discurso fundamentador:
“(…)
Como refere J. C. Vieira de Andrade, na avaliação a realizar relativamente a este prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil, por entretanto se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deveria beneficiar, que obstam à reintegração específica da sua esfera jurídica.
Neste juízo, o fundado receio há-de corresponder a uma prova, por regra a cargo do requerente, de que tais consequências são suficientemente prováveis para que se possa considerar “compreensível ou justificada” a cautela que é solicitada.”
Conforme decorre da jurisprudência dos Tribunais Superiores, designadamente do Acórdão Tribunal Central Administrativo Norte, de 08.02.2013 [Proc. nº 02104/11], que aqui acompanhamos, os critérios a atender na apreciação do “periculum in mora” (…) devem obedecer a um maior rigor na apreciação dos factos integradores de tal requisito visto que a qualificação legal do receio como “fundado” visa restringir as medidas cautelares, evitando a concessão indiscriminada de proteção meramente cautelar com o risco inerente de obtenção de efeitos que só podem ser obtidos com a segurança e ponderação garantidas pelas ações principais», pelo que ao requerente da providência se impõe «o ónus de alegar a matéria de facto integradora dos requisitos legais de que depende a concessão da providência requerida (art. 342.º do CC), não podendo o tribunal substituir-se ao mesmo», desonerando-o de alegar «os factos integradores daqueles pressupostos de modo especificado e concreto, não sendo idónea a alegação de forma meramente conclusiva e de direito ou com utilização de expressões vagas e genéricas».
Com efeito, à Requerente cabe, enquanto pressuposto prévio do ónus de prova, o ónus de alegar factos concretos suficientes que, caso venham a ser provados, permitam ao tribunal julgar como provável a verificação de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação [cfr. artigo 114.º, n.º 3, alínea g), do CPTA].
Porém, no caso dos autos, os factos concretos alegados pela Requerente não permitem, por insuficiência, configurar uma situação susceptível de preencher o pressuposto do periculum in mora, previsto na 1.ª parte, do n.º 1, do artigo 120.º do CPTA, desde logo, no que concerne aos invocados prejuízos financeiros.
De facto, as circunstâncias concretas alegadas não permitem concluir, com o mínimo de probabilidade, no sentido de que o encerramento temporário do Palace Hotel do Buçaco implica a constituição de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação na esfera jurídica da Requerente, enquanto pessoa colectiva autónoma àquele estabelecimento hoteleiro, o qual constitui um mero instrumento de desenvolvimento da sua actividade económica.
Da factualidade indiciariamente assente resulta que o Palace Hotel do Buçaco- estabelecimento hoteleiro explorado pela Requerente, …………………………………. Ld.ª, e anteriormente, desde 1920, por Alexandre…………………. - é frequentado, no que concerne a serviços de alojamento, maioritariamente, por clientes estrangeiros [cfr. as alíneas A), B), P), R) e T) dos factos provados].
Provou-se, também, que o Palace Hotel do Buçaco arrecadou, no ano de 2016, €280.743,78 e, no ano de 2017, €235.165,80 de receitas provenientes de alimentação em eventos, sendo que, até ao mês de Agosto de 2018, tal valor ascendeu à quantia de €181.260,85 [cfr. o facto assente em Q), S) e U)].
Resultou assente que, até ao dia 31.12.2018, encontravam-se efectuadas 1.210 reservas de quartos no estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco, no valor total de €144.223,12 [cfr. o facto assente em V)].
De facto, não resultou provado que já se encontrem marcados eventos, para realização no Palace Hotel do Buçaco, no período entre 17.09.2018 e 31.12.2018, que impliquem, por parte da Requerente, a obtenção de receitas, no valor total de €144.722,00, nem que o encerramento deste estabelecimento, no período entre 17.09.2018 e 16.03.2019, implique a perda de resultados operacionais no valor de
€189.162,48, ou que a Requerente tenha de despender, neste período, em custos fixos, com o pessoal afecto ao estabelecimento, a quantia total de €253.325,40, e com outros- relacionados com contratos de fornecimento de electricidade, gás, água, TV cabo e satélite, internet, com higiene e segurança alimentar, apoio informático, medicina no trabalho, desinfestação, recolha de lixo, terminal de pagamento automático multibanco, seguros e manutenção de elevadores- a quantia de €20.265,13 [cfr. os factos indicados como não provados em 1) a 4)].
De resto, não se provou que o encerramento do Palace Hotel do Buçaco, no período entre 17.09.2018 e 16.03.2019, implique o pagamento de indemnizações a trabalhadores, no valor total de €807.487,82 [cfr. o facto indicado como não provado em 5)].
Efectivamente, das circunstâncias alegadas e provadas nos presentes autos não resulta provável que, por conta dos efeitos do despacho suspendendo, esteja em risco a própria subsistência económico-financeira da sociedade Requerente, sendo certo que a mesma não alegou que a exploração do estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco constitui a sua única fonte de rendimentos.
Na verdade, à excepção da exploração do Palace Hotel do Buçaco, a Requerente nada alegou de concreto quanto às actividades económicas por si desenvolvidas e dimensão de negócio, desconhecendo-se, nomeadamente, se este é o único estabelecimento hoteleiro que explora e qual a sua real situação patrimonial e financeira, de molde a que se possa aferir do impacto da medida de encerramento daquele estabelecimento hoteleiro, na sua esfera jurídica, sendo certo que o despacho suspendendo não implica o encerramento definitivo do estabelecimento, destinando-se a vigorar apenas até à efectiva correcção das ilegalidades verificadas na inspecção realizada pelo Comando Distrital de Operações de Aveiro, em 17.07.2018.
Além disso, conforme se extrai do teor do acto suspendendo, a medida de encerramento em causa destina-se a vigorar pelo prazo máximo de 6 meses se, entretanto, não ocorrer a regularização das situações identificadas no REL/546/CDOS01/2018, sendo certo que o prazo de 180 dias, previsto na alínea d), do artigo 90.º do CPA, constitui o prazo legal máximo de vigência das medidas provisórias, findo o qual- independentemente de se encontrar fixado prazo legal ou administrativo superior para a decisão final- há lugar à caducidade da medida de encerramento.
A alegação de que o encerramento compulsivo do Palace Hotel do Buçaco, pelo período determinado, acarreta prejuízos financeiros, em consequência, designadamente, do cancelamento das reservas já efectuadas e dos eventos marcados, implicando a perda de resultados operacionais e prejuízos referentes a custos fixos com pessoal e com outros contratos, bem como o pagamento de indemnizações a trabalhadores não satisfaz as exigências do pressuposto ínsito na 1.ª parte, do n.º 1, do artigo 120.º do CPTA, que impõe a existência de um fundado receio da produção de danos de difícil reparação.
Ora, na situação dos autos, a situação configurada pela Requerente, relativamente aos prejuízos de natureza económico-financeira não permitem antever uma situação de periculum in mora, na medida em que não foi alegado qualquer facto atinente à sua concreta situação financeira, que permita concluir no sentido da constituição de uma situação de facto consumado ou ocorrência de prejuízos de difícil reparação na sua esfera pessoal, caso a providência requerida não seja decretada.
Relativamente ao pagamento de eventuais indemnizações, derivadas do cancelamento de reservas de quartos e eventos já agendados, assim como em relação à perda de resultados operacionais, custos com o pessoal e com outros contratos atinentes ao estabelecimento hoteleiro aqui em causa, tratando-se de danos de natureza pecuniária, tais prejuízos são susceptíveis de ressarcimento no âmbito do processo principal, caso se conclua pelas ilegalidades imputadas ao acto suspendendo.
Acresce que, no caso concreto, os alegados danos relativos à imagem da Requerente no mercado, bem como os relativos ao prestígio e à reputação do Palace Hotel do Buçaco no mercado internacional- e, ainda, a repercussão desses danos em termos da clientela- não decorrem dos efeitos da medida de encerramento em litígio, mas dos motivos que a fundamentam, os quais se consubstanciam na ausência de condições de segurança, de pessoas e bens, contra incêndios no edifício onde se encontra instalado o estabelecimento hoteleiro em causa, encontrando-se tais irregularidades evidenciadas no relatório da inspecção realizada, pelo Comando Distrital de Operações de Aveiro da Autoridade Nacional de Protecção Civil, no dia 17.07.2018 [cfr. os factos assentes em E) e F)], e cuja verificação a Requerente não questionou, não se verificando, por isso, o necessário nexo causal entre os efeitos do acto suspendendo e esses prejuízos.
Não se afigurando- nem, aliás, tendo sido alegada- a obrigatoriedade de publicitação dos fundamentos do acto suspendendo, não se antevê, no caso, que a razão destes prejuízos esteja conexionada com a execução do despacho do Presidente da Autoridade Nacional de Protecção Civil, de 30.08.2018, aqui em crise.
Por fim, os constrangimentos implicados, pela medida provisória de encerramento do Palace Hotel do Buçaco, no turismo da região onde este estabelecimento hoteleiro se localiza não assumem relevância em sede do preenchimento do periculum in mora, pois que os prejuízos de difícil reparação a que a lei se refere são aqueles que se se produzem na esfera jurídica dos requerentes das providências cautelares, não estando em causa, na análise desse requisito, a consideração do interesse público, o qual carece de ser apreciado em sede da ponderação de interesses, a que alude o n.º 2 do artigo 120.º do CPTA.
Em suma, o ónus de alegação especificada que impende sobre a Requerente exigia da sua parte a configuração de um dano qualificado, ainda que de natureza económica, o que não se verifica, pois, no caso dos autos, a situação alegada pela Requerente não permite concluir pela probabilidade de ocorrência prejuízos, efectivos e iminentes, na sua esfera pessoal, cuja tutela se mostre insusceptível de ser cabalmente assegurada no âmbito do processo principal.
No caso, incumbiam à Requerente os ónus de alegação e de prova dos factos justificativos da concessão da tutela cautelar requerida, designadamente, a existência de uma situação de periculum in mora, o que não logrou fazer, não resultando, de facto, concretizados quaisquer danos – decorrentes da medida provisória de encerramento do Palace Hotel do Buçaco – que se afigurem irreversíveis ou cuja reparação se mostre especialmente difícil, caso a acção principal venha a proceder.
Nestes termos, não permitindo os factos concretos alegados concluir pela provável constituição, na esfera jurídica da Requerente, de uma situação de facto consumado ou pela produção de prejuízos de difícil reparação, é de julgar não verificado o requisito do periculum in mora, ínsito na primeira parte do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.
(…)”.
Ora, desde já se adianta que o vertente recurso, no que concerne à questão agora em análise, está claramente votado ao insucesso.
É que, escrutinado o discurso fundamentador da sentença em crise no que toca à subsunção dos factos no direito aplicável, não se identifica qualquer incorreção, nem razão para alterar, corrigir ou completar o percurso lógico-jurídico trilhado pelo Tribunal a quo.
Realmente, os factos reunidos no probatório como demonstrados não permitem construir qualquer cenário de catástrofe económico-financeira da Recorrente, uma vez que a atividade comercial da Recorrente não se esgota com a exploração do estabelecimento hoteleiro visado nos autos. Com efeito, e sendo certo que a Recorrente nada aludiu quanto a essa matéria, subsiste informação segura nos elementos documentais constantes dos autos, que a Recorrente explora diversas unidades hoteleiras para além da implantada na Mata Nacional do Buçaco. O que, evidentemente, inviabiliza a formulação de um juízo positivo no que concerne à magnitude e significância do impacto financeiro resultante para a Recorrente do encerramento do estabelecimento em questão. De facto, não se sabe- porque o ónus de alegação foi incumprido por banda da Recorrente- qual a fatia de lucro, ou prejuízo, que a exploração do Palace Hotel do Buçaco representa nas contas da Recorrente, por forma a aferir, não só quais os gastos e despesas advenientes para a mesma em virtude do encerramento em discussão, como também qual é o arcaboiço financeiro da Recorrente e se o dito lhe permite sobreviver ao período de ausência de receitas.
Sendo assim, não estando demonstrados quaisquer outros prejuízos patrimoniais, a sentença recorrida não merece censura no tocante à conclusão alcançada da inexistência de prejuízo qualificado.
Adicionalmente, ressalte-se que deve ser assumida conclusão similar no que tange aos danos invocados pela Recorrente, referentes à imagem, reputação e prestígio do Palace Hotel do Buçaco, como derivados da decisão de encerramento do dito estabelecimento hoteleiro. Com efeito, como bem assinalou a sentença recorrida, a realidade daquele estabelecimento hoteleiro no tocante a questões de segurança ligadas à prevenção de riscos atinentes, especialmente, a incêndio e electrocução é muito negativa e preocupante, projetando uma imagem em nada consentânea com o prestígio e a reputação internacionais reclamadas pela Recorrente. Além disso, o encerramento de uma unidade hoteleira para realização de obras de modernização, restauro, recuperação ou outras, não configura, por si só, um facto que arraste uma perceção negativa quanto ao estabelecimento hoteleiro, sendo certo que, dada a antiguidade das instalações onde funciona o Hotel, a realização de obras apresenta-se como uma vicissitude natural na vida do Hotel, e o inerente encerramento deste para tanto como neutro em termos de imagem de mercado.
É verdade que o encerramento da unidade hoteleira em causa não derivou de uma opção espontânea da Recorrente. Contudo, inexistindo publicidade da razão que motivou o encerramento do Palace Hotel do Buçaco, não é crível que o mercado, especialmente o internacional, esteja ciente do motivo de encerramento e, por via disso, construa uma imagem negativa daquela unidade hoteleira.
Seja como for, percorrido o requerimento inicial da presente providência cautelar, verifica-se que a Recorrente limita-se, essencialmente, a oferecer meros juízos conclusivos relativamente aos danos na imagem e reputação do Palace Hotel do Buçaco, e cuja causa identifica na decisão de encerramento.
E o presente recurso nada acrescenta ao que foi aduzido no requerimento inicial e objeto de julgamento na decisão recorrida. O que quer dizer que, tendo em conta o discurso fundamentador espraiado na decisão agora em escrutínio, nada há a apontar de erróneo ou a censurar na sentença a quo.
Em acrescento ao exposto, importa clarificar que não subsiste, hodiernamente, qualquer dúvida no que concerne ao modo de interpretação e aplicação do requisito tangente ao periculum in mora, sendo por demais consabido que o julgamento deste requisito consubstancia um juízo de natureza fáctico-jurídica e que, por isso, exige a subsunção de concretos factos nos conceitos jurídicos de situação de facto consumado e de prejuízo de difícil reparação.
Do que vem de dizer-se decorre, cristalinamente, a existência de um ónus, a cargo do requerente da medida cautelar, de invocação e de demonstração dos concretos factos que permitirão ao Tribunal ancorar a formulação da convicção, em sede de raciocínio prognóstico lógico-dedutivo, de que (v.g.) a execução do ato administrativo produzirá efeitos na esfera jurídica do requerente da providência cautelar que obliteram a utilidade do julgado na ação principal proposta (ou a propor).
Dito doutro modo, a exigência da verificação do requisito em apreço prende-se com a demonstração de que a demora no julgamento do processo principal acarretará a inutilidade da sentença de procedência que venha a ser proferida neste processo, quer porque, entretanto, constituiu-se uma realidade irreversível, quer porque a produção dos efeitos do julgado na ação principal será insuscetível de compensar os danos patrimoniais e/ou morais produzidos na esfera jurídica do demandante.
De resto, a Jurisprudência é unânime nesta matéria, conforme decorre- entre muitos outros- dos Acórdãos do Colendo Supremo Tribunal Administrativo, proferidos em 07/02/2019 no processo 02012/18.9BALSB, em 18/12/2018 no processo 01165/18.0BEPRT, em 14/06/2018 no processo 0435/18, em 26/04/2018 no processo 0393/18 e em 07/12/2017 no processo 0956/17.
Por seu turno, este Tribunal Central Administrativo teve já inúmeras ocasiões de se debruçar sobre a problemática que agora nos ocupa, nomeadamente- e a título ilustrativo- nos Acórdãos produzidos em 20/09/2018 no processo 866/17.5BELSB, em 21/09/2017 no processo 2963/16.5BELSB, em 05/07/2017 no processo 12690/15, em 16/02/2017 no processo 559/16.0BESNT e em 16/02/2017 no processo 220/16.6BEFUN.

Em suma, a sentença recorrida realizou uma apreciação correta do requisito respeitante ao periculum in mora, nada havendo a censurar.


A Recorrente clama, ainda, que a sentença sob ataque errou na apreciação do critério inscrito no n.º 2 do art.º 120.º do CPTA, defendendo que o encerramento do estabelecimento hoteleiro é desproporcional face à gravidade da situação e à circunstância de a Recorrente ter procedido já à correção da larga maioria das irregularidades identificadas na ação inspetiva.
Todavia, uma vez mais, a tese da Recorrente padece de uma petição de princípio, pois que, traduz uma interpretação do citério estipulado no preceito mencionado como reconduzindo-se à proporcionalidade entre os diversos efeitos produzidos pela decisão de encerramento. Mas não é assim. É que, como é consabido, o n.º 2 do art.º 120.º do CPTA impõe ao Tribunal a realização da ponderação entre os interesses públicos e privados em presença, devendo a providência cautelar ser decretada se esse juízo de ponderação permitir concluir que os danos que resultariam da recusa da providência se apresentam superiores aos que resultariam da concessão da providência.
No caso versado, a sentença a quo, ainda que a título subsidiário e de reforço, realizou o juízo de ponderação entre os interesses invocados pela Recorrente e os interesses enunciados pelo Recorrido, tendo concluído que estes mostram-se claramente preponderantes, dado que, enquanto estes têm em vista assegurar a “segurança das pessoas que frequentam o Palace Hotel do Buçaco, a protecção da sua vida e integridade física, prevenindo situações de risco de incêndio e em caso de incêndio”, aqueles têm por finalidade, essencialmente, a manutenção da situação económico-financeira da Recorrente.
Contudo, como bem realça a sentença em análise, “a concessão da providência requerida- ao permitir o funcionamento do estabelecimento sem as condições mínimas exigidas pelo regime jurídico de segurança contra incêndios em edifícios- atinge gravemente a segurança dos clientes, trabalhadores e outros eventuais frequentadores do prédio onde está instalado o estabelecimento hoteleiro Palace Hotel do Buçaco, enquanto expressão de direitos fundamentais da sua personalidade, como o direito à vida e à integridade física, além atingirem a protecção do património classificado de interesse público”.

Assim sendo, a apreciação realizada na sentença em questão mostra-se correta e, por isso, desmerecedora de crítica.


Derradeiramente, cumpre clarificar que, não estando verificado o requisito respeitante ao periculum in mora, a presente impetração tem como destino certo o insucesso.
Vejamos porquê.
O art.º 120º, n.ºs 1 e 2 do CPTA elenca os requisitos de que depende a concessão da medida cautelar peticionada.
Ora, o n.º 1 do art.º 120º do CPTA dispõe que “(…) as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente”.
O n.º 2 do referenciado preceito estipula que “a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências”.
Do exame dos preceitos em causa dimana, pois, que o legislador faz depender a concessão da medida cautelar requerida da verificação de três requisitos:
1.º- “receio da constituição de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal”, ou seja, requisito atinente ao periculum in mora;
2.º- “seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo [o processo principal] venha a ser julgada procedente”, isto é, requisito atinente ao fumus boni juris, e;
3.º- a ponderação entre os interesses públicos e privados em presença permita concluir que os danos que resultariam da recusa da providência se apresentam superiores aos que resultariam da concessão da providência.
Quer isto significar, portanto, que para além da exigência relativa à alegação e demonstração da subsistência de perigo na demora, o requerente da providência deve alegar e demonstrar de modo suficientemente credível, quer em termos fácticos, quer em termos credíveis, a probabilidade da procedência da sua pretensão principal.
Indispensável é, por fim, ter presente que os requisitos enumerados são de verificação cumulativa, ou seja, para que a medida cautelar requerida mereça o decretamento, a mesma deve passar os três testes com sucesso, a saber: o teste da “aparência de bom direito”, o teste do “perigo na demora” e, finalmente, o teste da ponderação.
Deste modo, a formulação de juízo negativo quanto a qualquer um dos requisitos- ou “testes”- é bastante para impor a claudicação do pedido cautelar, atenta a natureza cumulativa dos indicados requisitos.
Esclareça-se a Recorrente que, quanto a esta matéria, não acontece qualquer dissidência na Jurisprudência, antes constatando-se a unanimidade na caracterização das condições de procedência das medidas cautelares requeridas como cumulativas.
No caso em discussão, fracassa inteiramente a verificação do requisito relativo ao periculum in mora. O que implica o irremediável insucesso da presente providência cautelar, e isto independentemente do ato suspendendo padecer, efetivamente, das ilegalidades que lhe são assacadas pela Recorrente. Realmente, a natureza cumulativa dos requisitos de decretamento da providência cautelar arrasta a inutilidade da apreciação dos remanescentes requisitos, no caso do apuramento prévio da inverificação de algum deles. Pelo que, concluindo-se pela carência de um dos requisitos imprescindíveis ao decretamento, não se impõe o prosseguimento da decisão no sentido de apreciar os restantes, visto que tal labor configura, em bom rigor, um ato inútil.

Sendo assim, importa concluir, também pela improcedência do alegado pela Recorrente nas conclusões A), B), C), D), E), F), G), H), I, J), K), L), M), N), O), P), Q), MM), NN) e OO) das suas alegações de Recurso.


Desta feita, atenta a factualidade provada e o enquadramento legal em que se movimenta o caso em análise, apresenta-se inequívoco que a sentença a quo não padece de nulidade, nem dos erros de julgamento que lhe são assacados, antes revelando um acerto insuscetível de ser abalado pelo vertente recurso jurisdicional.
Pelo que, em conformidade, terá de negar-se provimento ao presente recurso e confirmar-se a sentença recorrida.



IV- DECISÃO
Pelo exposto, acordam, em Conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar na íntegra a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 21 de março de 2019,

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Paula Cristina Oliveira Lopes de Ferreirinha Loureiro

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Jorge Pelicano

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Cristina dos Santos