Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1973/16.7BELSB
Secção:
CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO
Data do Acordão:08/29/2018
Relator:CRISTINA DOS SANTOS
Descritores:CONCURSO DE INGRESSO AO CEJ
CANDIDATOS APROVADOS, HABILITADOS E EXCLUÍDOS
DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE PROVAS (ARTº 28º Nº 6 LEI 2/2008)
Sumário:1. O título de legitimidade para efeitos de ingresso no curso de formação teórico prática, de celebração do contrato de formação e consequente aquisição do estatuto procedimental de auditor de justiça (artº 31º nºs. 1 e 2) depende da verificação de dois pressupostos substantivos na esfera jurídica do candidato:
(i) aprovação com nota igual ou superior a 10 valores nas provas de conhecimento das fases escrita e oral avaliação psicológica favorável (artºs. 16º nº 13, 19º nº 7, 20º nº 5, 21º nº 3, 24º n º 1, 25º º 1)
(ii) graduação final abrangida pelo número de vagas aprovado para o respectivo concurso por despacho ministerial (artº 8º nº 2, 27º nº 1, 28º nº 1 e 31º nº 1).

2. Os candidatos aptos e, como tal, aprovados mas não habilitados a passar à fase seguinte de curso de formação teórico-prático porque a classificação final obtida os excluiu do número de vagas fixado por despacho ministerial, têm o benefício atribuído no artº 28º nº 6 Lei 2/2008, 14.1.

3. O benefício de, mediante requerimento em prazo nos termos do artº 21º nºs. 1 e 2 do Regulamento do CEJ, serem “dispensados de prestar provas no concurso imediatamente seguinte, ficando graduados conjuntamente com os candidatos que concorram a este”, sendo elencados no lugar que lhes compete por ordem de graduação levando em conta todos os candidatos aprovados.

4. Em caso de candidatos excluídos, não tem base legal a aplicação do mecanismo de graduação com os candidatos aprovados (artº 28º nº 6 Lei 2/2008 e 21º nºs. 1 e 2 do Regulamento do CEJ), por manifesta falta de pressupostos, na exacta medida em que nada há a graduar, pois só se graduam classificações finais positivas, ou seja, de candidatos aprovados na decorrência de terem obtido classificação final nas provas de ingresso ao CEJ de valor igual ou superior a 10 (artºs 24º nº 2 b), 25º nºs 1, 3, 4, 26º nº 1 e 27º nº 1 Lei 2/2008).

5. O interesse público traduzido no critério legal de selecção da fase de ingresso mostra-se concretizado pelo bloco normativo enunciado nos termos acima expostos:
- artºs 14º a), b) c), 15º nº 1 a) e b) e 16º/13 Lei 2/200 – método de selecção
- artºs 19º nº 7 e 20º nº 5 Lei 2/2008 – candidatos admitidos
- artºs 24º nº 2 b), 25º nºs 1, 3, 4, 26º nº 1 e 27º nº 1 Lei 2/2008 - candidatos excluídos – classificação final - listas de graduação
- artºs 28º nºs 1, 3 e 6, 31º nºs. 1 e 2 Lei 2/200 - candidatos habilitados ao curso de formação teórico prática.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:REC. Nº 1973/16.7BELSB


O Centro de Estudos Judiciários, com os sinais nos autos, inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue:

1. O presente recurso tem por objecto a sentença proferida nos autos que julgou parcialmente procedente o presente procedimento de massa e, em consequência, condenou o Réu, ora Recorrente "a graduar os AA. no 32º Curso Normal de Formação Teóríco-Prática para Magistrados Judiciais, na posição que lhe corresponder por consideração às notas obtidas no concurso anterior, com as legais consequências".
2. O Tribunal a quo, apreciando e decidindo todas as questões, decidiu imputar ao Réu, ora Recorrente, "a violação do princípio da boa-fé, na vertente da protecção da confiança”, bem como o vício de violação de lei e princípio da legalidade, sendo esta(s) a(s) decisão(ões) que se considera(m) incorrecta(s) e que, pelo presente recurso se submete(rn) à reapreciação.
3. Sobre a violação do princípio da boa-fé, releva, desde já, mencionar que resultou provado, documental e testemunhalmente, que em tempo algum (em anteriores concursos) ficaram habilitados à frequência de qualquer curso de formação teórico-prática candidatos em situação idêntica à dos AA., ora Recorridos.
4. Tendo ficado provado, pelo testemunho prestado pelo Lic. F……., que só no concurso em causa tal situação ocorreu, ou seja, situação em que candidatos aptos no 31º concurso, mas não habilitados por falta de vagas, e excluídos no concurso imediatamente seguinte (32º concurso) seriam candidatos habilitados, bem como que tal contingência, observada após a realização das orais - altura em que está delineado o universo de candidatos habilitados -, foi a razão (e o momento) pela qual o R, ora Recorrente, teve a necessidade de reavaliar/reapreciar todo o conjunto normativo em causa, constatando que tal prática não se mostrava conforme com as normas aplicáveis e, consequentemente, não graduando os AA., ora Recorridos, bem como todos os outros candidatos na mesma situação.
5. Não tendo sido estes factos trazidos ao probatório, resulta, contudo, da matéria de facto provada e dada como assente [vide alíneas K) e L)] que o momento em que ocorreu a alteração da interpretação dada ao quadro normativo aplicável, já os AA., ora Recorridos, tinham optado por fazer as provas no âmbito do concurso em causa, tal como resuta efetivamente provado que a realização das provas ocorreu antes da alteração da interpretação dada à Lei do CEJ, facto esse que, aliás, nunca se mostrou controvertido.
6. A alteração da interpretação em causa só ocorreu no termo do procedimento em questão, razão pela qual o funcionário do CEJ, F…….., na sequência do vertido na alínea L) do probatório, chamou à atenção do primeiro A. para a nota de rodapé que consta na lista dos graduados [vide alínea M) do probatório],
7. Nesta medida, conforme demonstrado, estamos, indubitavelmente, perante um vicio lógico do raciocínio da Meritíssirna Juiz a quo, não tendo o R.,ora Recorrente, violado o princípio da boa-fé, nos termos delineados a fls. 12 e 13 da sentença recorrida, pelo se afigura estarmos perante uma oposição entre os fundamentos e a decisão, o que constitui causa de nulidade da sentença, conforme preceituado na1ª parte da alínea d) do n.° l do artigo 615º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 1º do CPTA.
8. De facto, os fundamentos que explana na sentença apontam para determinada conclusão mas, em vez de extrair, como seria lógico e expectável, decide em sentido oposto, ou pelo menos diferente, o que consubstancia um vício real no raciocínio do julgador a quo e que consubstancia nulidade da sentença [neste sentido, vd. Leopoldo Camarinha e Benjamim Silva Rodrigues in Código do Processo Civil Comentado, vol. III,1ª edição, 2015, pág. 437): ocorrendo este causa de nulidade quando a construção! da sentença é viciosa isto é, quando "os fundamentos Invocados pelo juiz conduziriam logicamente não só resultado expresso na decisão mas a resultado oposto (cfr. Prof. Alberto dos Reis in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág. 141); ou seja, quando das premissas de facto e de direito que o julgador teve por apuradas, ele haja extraído uma oposta à que logicamente deveria ter extraído {neste sentido entre outros, Acórdão do STJ de 02/10/2003, ín Rec, Rev, n.° 2585/03 - 2.a secção}.
9. Efectivamente, resulta da factualidade dada como assente [vide alíneas K) e L) do probatório] que quando o primeiro A, ora Recorrido, a 4 de agosto de 2016, com a publicação e divulgação das listas dos graduados e dos habilitados do 32.° concurso, entrou em contacto com os serviços do CEJ "para obter explicações de tais omissão, foi informado peio funcionário F……….. que tal se ficara a dever a uma interpretação inovadora das normas aplicáveis já da responsabilidade da nova Direcção (que entrou em funções em data posterior à abertura do concurso), passando a entender-se que os candidatos graduados no 31º Concurso que concorreram por opção ao 32º Concurso e foram excluídos, não eram considerados aptos e, concomitantemente, nem foram graduados nem habilitados, cf. declarações de parte e depoimento da testemunhe F……, nos autos da informação prestada". (Sublinhado nosso).
10. Tendo nesta sequência, conforme já referido, a referida testemunha chamado à atenção do primeiro A. para a nota de rodapé que consta na lista dos graduados [vide alínea M) do probatório],
11. Assim, afigura-se-nos que tendo em conta as premissas de facto que o julgador a quo teve por apuradas, o mesmo não podia ter concluído que a alteração da interpretação fosse amplamente divulgada e dada a oportunidade aos candidatos de optarem por fazer ou não as provas, para deste forma decidir pela violação do princípio em causa (a fls, 12 e 13 da sentença recorrida).
12. Dado que, conforme explanado, quando ocorre aquela alteração já os AA. Ora Recorridos, tinham prestado provas no decurso do mês de Abril de 2016 (cfr. processo administrativo), como, aliás, resulta da alínea L) do probatório: "...passando a entender-se que os candidatos graduados no 31º Concurso que concorreram por opção ao 32º Concurso e foram excluídos não eram considerados aptos e, concomitantemente, nem foram graduados nem habilitados” (sublinhado e carregado nosso).
13. Sendo, também certo e do conhecimento público, que a nomeação do actual Director do CEJ ocorreu em abril de 2016 (cfr. Despacho nº 4649/2016, de 5 de Abril, publicado na 2ª série do Diário da República, de 5 de Abril).
14. Assim, os fundamentos invocados pela Meritíssima Juiz a quo conduziriam logicamente a um resultado oposto ao expresso na decisão, ou seja, há manifesta contradição entre a decisão e os seus fundamentos, jamais podendo concluir pela violação da boa-fé pois impõe-se uma decisão de sentido inverso àquela que foi proferida.
15. Caso assim não se entenda, sempre se dirá que haverá erro de julgamento na valorarão da matéria de facto e na (não) subsunção da mesma ao direito, porquanto, de facto, foi analisada erradamente a factualidade dada como assente.
16. Pronunciando-se sobre o vício de violação de lei e princípio da legalidade, após a invocação das normas contidas nos artigos 28,°, n.° 6, da Lei n.° 2/2008, de 14 de janeiro, e 2° do Regulamento Interno do CEJ, o Tribunal a quo aderiu ao vertido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 19.10.2017, no âmbito do processo m° 1959/16.1BELSB, o qual não transitou em julgado, tendo sido interposto recurso para o Supremo Tribunal Administrativo pelo ora Recorrente e pelo Ministério Público.
17. O Recorrente entende que o Tribunal a quo, aderindo ao entendimento do referido Acórdão, fez urna errada aplicação do Direito Substantivo nos autos vertentes, pervertendo o regime legal em vigor, o que o legislador não desejou ,e que certamente não imaginava que poderia ocorrer, porquanto, com o devido respeito, o Tribunal Central Administrativo Sul incorreu em erro de julgamento porque interpretou e aplicou erradamente as citadas formas legais,
18. Pois, para além do artigo 28.º da Lei n.° 2/2008, de 14 de janeiro, releva, também, destacar as normas dos artigos 6.°, n.° 3, 24.°, 26.°, n.º 1 e 27º, nº 1, da Lei nº 2/2008, de 14 de janeiro, referentes à aprovação e respetiva graduação, das quais decorre que a graduação dos candidatos pressupõe a sua aprovação e este pressuposto está ínsito na faculdade concedida pelo n.° 6 do artigo 28.° da Lei n.° 2/2008, de 14 de janeiro: a graduação destes candidatos ocorra conjuntamente com os candidatos aprovados no concurso imediatamente seguinte. Ou seja, a Lei não prevê a graduação de candidatos excluídos ou a graduação de candidatos aprovados em conjunto com candidatos excluídos ou.
19. Na verdade, a apresentação de candidatura ao concurso imediatamente seguinte pressupõe a submissão a um novo processo avaliado mediante procedimento administrativo autónomo, o qual culmina com as listas de graduação dos candidatos aprovados, por via de admissão, e a lista dos candidatos excluídos.
20. Isto mesmo está ínsito no n.° 6 do artigo 28.°da Lei nº 2/2008, de 14 de janeiro, que confere a faculdade aos candidatos aptos (aprovados), que não ficaram habilitados por falta de vagas, de dispensarem a prestação de provas no concurso imediatamente seguinte.
21. Ao contrário do afirmado no Acórdão ao qual o Tribunal a quo aderiu, o Recorrente não pretende "introduzir uma situação-tipo não prevista na norma primária e que é a necessidade de aprovação dos candidatos no concurso seguinte caso de estes pretenderem prestar provas nesse concurso, com prejuízo da classificação obtida no concurso imediatamente anterior."
22. Como se extrai do regime jurídico aprovado pela Lei n.° 2/2008, de 14 de janeiro este implica a necessidade de aprovação. Caso contrário, o candidato não é graduado. E esta necessidade é comum a qualquer concurso (anterior ou imediatamente seguinte ou ..).
23. Pelo que, com o devido respeito, se afigura errado o julgamento efetuado pelo Tribunal a quo, porquanto não considera a plenitude do regime jurídico aprovado pela Lei n,° 2/2008, de 14 de janeiro.
24. De facto, é certo que, para a aplicação do preceito em questão, é necessária a reunião dos pressupostos avançados pelo Tribunal Central Administrativo Sul: a aprovação no concurso imediatamente anterior e a ausência de vagas que tenha impedido o candidato de ficar habilitado,
25. Sendo também certo, como referido a fls. 32 do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, que "o n.° 6 do artigo 28.° estabelece um direito que assiste a todos os candidatos que tenham ficado aprovados num concurso para a frequência de um curso teórico-prático de formação de magistrados". E, aqui, destacar que apenas o direito à dispensa cie prestação de provas e unicamente este.
26. Sendo, igualmente, certo, como bem refere o aresto recorrido, "que a única condição para o exercício - requisito - é a declaração de opção pelo mesmo, O que de resto vem previsto no n.° 1, do artigo 21º do do Regulamento Internado CEJ (..)'(carregado nosso).
27. Sucede que a razão de a declaração de pretensão do exercício do referido direito deve ser apresentada até ao termo do prazo fixado para apresentação de candidaturas no aviso de abertura do concurso imediatamente seguinte, conforme estabelece o n.° l do artigo 21º do Regulamento Interno do CEJ, tem como fundamento a circunstância de só a partir deste momento se efetivar a candidatura a um novo procedimento concursal e, consequentemente, o candidato ficar sujeito ao regime legal estatuído na Lei nº 2/2008, de 14 de janeiro, quanto à aprovação e/ou exclusão de candidatos, ou seja, ficar sujeito ao regime e avaliação que venha a ser realizada no âmbito deste procedimento.
28. Ora, o Tribunal a quo, à semelhança do Tribunal Central Administrativo Sul no Acórdão a que aderiu, desconsiderou este efeito jurídico, não analisando o direito à luz da redação do nº 6 do artigo 28.° da Lei n.° 2/2008, de 14 de janeiro.
29. A interpretação sufragada no Acórdão ao qual a sentença recorrida aderiu imputa a redação do n.° 6 do artigo 28.° a expressão "dispensados de prestar provas:
“6 - Os candidatos aptos que não tenham ficado habilitados para a frequência do curso teórico prático imediato por falta de vagas, ficam dispensados de prestar provas no concurso imediatamente seguinte, ficando graduados conjuntamente com os candidatos que concorram a este”.
Reporta-se este normativo à graduação dos candidatos aprovados artºs. 25º/1 “é o resultado …” 26º/1, 27º/1; sendo excluídos 24/2b) inferior a 10 “em qualquer das provas de conhecimentos que integram a fase escrita e a fase oral – só são admitidos c/ nota superior a 10 valores 19º/7 (f. oral) 16º/13 (fase escrita)
30. Contudo, não é esta a redação da norma em causa, pelo que se afigura que o exercício interpretativo realizado pelo Tribunal Central Administrativo Sul não tem com a letra da norma qualquer tipo de conexão, assim violando o n° 2 do artigo 9º do Código Civil.
31. Nos termos do nº 6 do artigo 28,° da Lei n.° 2/2008, de 14 de janeiro, os candidatos aptos mas não habilitados; podem aproveitar da dispensa de provas no concurso seguinte, conservando a nota final que obtiveram no concurso anterior.
32. Para tanto bastando declará-lo até ao termo do prazo fixado para apresentação de candidaturas no aviso de abertura do concurso imediatamente seguinte (cfr. primeira parte do n° l do artigo 21.° do Regulamento Interno do CEJ.
33. Resulta, assim, nos termos do quadro normativo aplicável, que não é compatível candidatar-se ao concurso seguinte e beneficiar da faculdade ali prevista. Ou seja, o nº 6 do artigo 28.° da mencionada Lei deixa de ter campo de aplicação quando o candidato apresenta candidatura
34. Apresentando-se o candidato a concurso, só se concede o direito à utilização da nota obtida no concurso anterior no caso de candidatos aptos em ambos,
35. De facto, a possibilidade de aproveitamento da melhor das duas notas, prevista no nº 2 do artigo 21.° do Regulamento Interno do CEJ pressupõe, claramente, que o candidato tenha ficado apto, como se extrai do âmbito legal da norma "No caso de se candidatarem nos termos do número anterior e ficarem aptos” (carregado nosso).
36. Em suma o espírito subjacente às normas aplicáveis, e conforme decorre do seu elemento literal, é facultar a um candidato apto mas não habilitado num concurso anterior optar por conservar a nota obtida neste ou prestar provas no concurso seguinte e no caso de ficar apto ser graduado com a melhor nota.
37. De facto, a sentença: recorrida, aderindo ao Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul encerra a mesma patente e inexorável incongruência, pois atendendo ao cerne do discurso legitimador não é possível concluir, como se conclui no Acórdão, que "Nenhum outro pressuposto aplicativo do regime ou requisito do seu exercício vêm previstos na norma em causa”, ou seja, a norma contida no n,° 6 do artigo 28º da Lei nº 2/2003, de 14 de janeiro.
38. Para alinhar o sufragado com o pensamento do legislador, não seria necessária norma regulamentar, nem a do n,° l nem a do n.° 2 do artigo 21º do Regulamento Interno do CEJ, porquanto tudo estaria a coberto do nº 6 do artigo 28º da Lei n,° 2/2008, de 14 de janeiro.
39. Mas nem o n.° 6 do artigo 28.° da Lei nº 2/2008, de 14 de janeiro está redigido de molde a sustentar o entendimento do Tribunal a quo, nem a Administração pode negar a existência da(s) norma(s) regulamentar(e s), tendo o ora Recorrente feito uma interpretação sistemática, da qual não decorrem conflitos entre as normas legal e regulamentar.
40. Face à formulação real e efetiva do nº 6 do artigo 28º da Lei n° 2/2008, de 14 de janeiro, os candidatos não aptos não serão admitidos, pelo que não pode deixar de se extrair entendimento diferente do pugnado pelo ora Recorrente.
41. Pelo que ao decidir nos termos em que o fez, o Tribunal a quo actuou, pois, desconsiderando e interpretando erradamente o regime jurídico aprovado pela Lei n° 2/2008, de 14 de janeiro, incorrendo em erro de julgamento, devendo a sentença recorrida ser revogada.

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Os Recorridos L………. e C…….. contra-alegaram pugnando pela bondade do julgado.

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Com dispensa de vistos substituída pela entrega das competentes cópias aos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência.

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Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade:

A. No âmbito do 31.° Concurso Normal de Formação Teórico-Prática para Magistrados dos Tribunais Judiciais, aberto por Aviso n.° 2140/2014, publicado na 2a série do DR, de 12 de janeiro, para o preenchimento de 40 vagas, o 1° Autor, após a prestação das provas legalmente previstas pela via académica, logrou obter a classificação final de 12.538 valores, tendo ficado graduado em 44.° lugar, cfr. doe. l, junto com a p.i, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
B. Já a 2a Autora, após idêntica prestação de provas pela mesma via, obteve a classificação de 12,342, tendo ficado graduada em 50° lugar na mesma lista de graduação, cfr. doe. l, junto com a p.i., cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
C. A 12 de fevereiro de 2016 foi então publicado, na 2a série do DR, o Aviso n.° 1756-B/2016, o qual veio declarar aberto o 32.° Concurso Normal de Formação Teórico-Prática para Magistrados dos Tribunais Judiciais, para o preenchimento de 84 vagas, sendo 28 na magistratura judicial e 56 na magistratura do Ministério Público.
D. Na sequência desta publicação de abertura do 32.° Concurso, ambos Autores contactaram o Centro de Estudos Judiciários (CEJ) a fim de confirmarem que as suas graduações no Concurso anterior estariam tuteladas através dos seus Serviços em Lisboa e no Porto, cfr. declarações de parte e depoimento das testemunhas F……, funcionário do CEJ, e C……., amiga e colega da 2° A. que assistiu à conversa telefónica.
E. E aí foi-lhes prestada informação, como aliás sucedeu com outros candidatos, de forma peremptória e inequívoca, que uma eventual candidatura para prestação de provas neste novo Concurso não prejudicaria a graduação já obtida pela classificação já alcançada no Concurso pretérito, mesmo que nela se viesse a obter uma classificação inferior ou mesmo de insuficiência, visto que, à luz daquela norma legal, já não havia obrigatoriedade de prestação de provas para assegurar a graduação, cfr. declarações de parte e depoimento das testemunhas F….., funcionário do CEJ, A….. e P……., ambos candidatos aos 31° e 32° cursos.
F. Na mesma ocasião, no sítio da internet da demandada constava o seguinte: "5 - O candidato dispensado de prestação de provas ao abrigo do nº 6 do artigo 28° da Lei 2/2008, de 14 de Janeiro, pode, apesar disso, candidatar-se ao concurso imediatamente seguinte e prestar as respectivas provas? R: Pode. Se a classificação final (e graduação) obtida no concurso imediatamente anterior não permitiu o ingresso no curso de formação inicial imediato, é de admitir que não garanta ainda o resultado pretendido (melhor graduação) no concurso seguinte, ao beneficiar-se do disposto no preceito legal citado. Uma nova candidatura proporciona essa possibilidade. Nesse caso, pelo menos 3 hipóteses se colocam: 1a — O candidato obtém uma classificação final superior no concurso seguinte: então, não terá necessidade de ficar graduado neste concurso ao abrigo do n° 6 do artigo 28°, que não tem alcance prático. 2a ~ O candidato obtém uma classificação final inferior no concurso seguinte: ficará, então, graduado neste, em função da classificação final obtida no concurso anterior, ao abrigo do n° 6 do artigo 23°. 3. ° O candidato é excluído no concurso seguinte: ficará, então, graduado neste, em função da classificação final obtida no concurso anterior, ao abrigo do n° 6 do artigo 28°.", cfr doe. 2, junto com a p.i, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
G. Os candidatos Autores, decidiram concorrer ao 32.° concurso, para o que preencheram e enviaram à demandada as suas inscrições, com expressa ressalva e reserva, aposta em lugar próprio do respectivo impresso, que pretendiam concorrer ao abrigo da salvaguarda e reserva do n.° 6 do artigo 28° da Lei 2/2008, cfr. processo administrativo apenso aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido,
H. Na sequência destes requerimentos de inscrição, os Autores foram admitidos à prestação das provas em Coimbra e Ponto, conforme lista publicada pelo C.E.J., cfr. processo administrativo apenso aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido,
I. Em reunião dos Presidentes dos Júris, datada de 08.07.2016, que teve por objectivo o apuramento dos candidatos a convocar para a realização dos exames psicológicos de selecção e elaboração da lista de graduação dós candidatos aprovados, por via de admissão, e a lista dos candidatos excluídos, foi deliberado por unanimidade, '''nos termos da alínea d) do n.º l do artigo 124.° do Código do Procedimento Administrativo (CPA), que não haveria lugar à audiência dos interessados, pois que, face ao número elevado de candidatos a ouvir, tal audiência era impraticável. Mais foi deliberado por unanimidade que, para consulta pública, nos termos do referido normativo do CP A, se procedesse à afixação das referidas listas, na sede do Centro de Estudos Judiciários e na sua delegação do Porto, pelo prazo de dez dias", cfr. doe. n.° l, junto com a contestação, cujo teor; se dá por integralmente reproduzido, e processo administrativo apenso aos autos.
J. Para consulta pública, procedeu-se à afixação das referidas listas, na sede do Centro de Estudos Judiciários e na sua delegação do Porto, pelo prazo de dez dias, cfr. processo administrativo apenso aos autos.
K. No dia 04 de Agosto de 2016, com a publicação e divulgação das listas dos graduados e dos habilitados do 32.° Concurso, constataram os 1° e 2º Autores, que os seus nomes não constavam em qualquer delas, cfr. does. 3 e; 4, juntos com a p.i, cujo teor se dá por integralmente reproduzido
L. O 1° Autor entrou de imediato em contacto com os Serviços do CEJ, para obter explicação de tais omissões, tendo sido informado pelo funcionário Filipe Alves que tal se ficara a dever a uma interpretação inovadora das normas aplicáveis já da responsabilidade da nova Direcção (que entrou em funções em data posterior à abertura do concurso), passando a entender-se que os candidatos graduados no 31.° Concurso, que concorreram por opção ao 32° Concurso e foram excluídos, não eram considerados aptos, e, concomitantemente, nem foram graduados nem habilitados, cfr. declarações de parte e depoimento da testemunha F….., autos da informação prestada.
M. Chamou ainda o referido funcionário à atenção do 1° Autor para uma nota de rodapé que consta na Esta dos graduados, onde se consignou que "nos termos do n.° 6 do artigo 28.° da Lei n.° 2/2008, de 14 de Janeiro, e do artigo 21.° do Regulamento Interno do Centro de Estudos Judiciários, os candidatos do 31.° Concurso para os Tribunais Judiciais que realizaram as provas do 32..° Concurso para os Tribunais Judiciais e neste não foram aptos, não foram graduados.", cfr. declarações de parte e depoimento da testemunha. F….., autos da informação prestada.
N. No dia l de Setembro, o CEJ, no seu sítio da internet, sob o tema de "Ingresso na Formação Inicial" o seguinte: "Os candidatos aptos que não tenham ficado habilitados para a frequência do curso teórico-prático por falta, de vagas, ficam dispensados de prestar provas no concurso imediatamente seguinte, ficando graduados conjuntamente com os candidatos que neste tiverem ficado aprovados", cfr. doe. 5, junto com a p.i, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
O. Tanto na lista dos graduados, corno na lista de habilitados, constam duas candidates – V………… (n.° 70) e A……. (n.° 78) — as quais, não obstante não terem concorrido ao 32.° Concurso ao abrigo da mesma norma legal, obtiveram o correspondente benefício por terem ficado graduadas, ainda que em posição inferior ao 1° Autor, no 31.° Concurso, cfr. doe. l, junto com a p.i., cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

Não se provou que:
l - Ambos Autores tiveram já custos acrescidos para fazer prevalecer o seu direito e sofrerão danos colaterais com a privação de acesso ao Curso que se inicia muito em breve, de natureza patrimonial e não patrimonial, mas apenas estimáveis e liquidáveis quando a legalidade for reposta e a sua situação estiver estabiliza.

Ao abrigo do regime do artº 662º nº 1 CPC ex vi artº 1º CPTA adita-se ao probatório a alínea P com a seguinte matéria:

P. Os ora Recorridos L………. e C………….. no 32.° Concurso Normal de Formação Teórico-Prática para Magistrados dos Tribunais Judiciais a que concorreram, foram excluídos em virtude de terem obtido classificação inferior a 10 valores nas provas de conhecimento que integram a fase escrita. – artigos 36º da p.i. e 11º da contestação.



DO DIREITO



1. decisão singular de mérito do relator - reclamação para a conferência;

O regime da decisão singular de mérito apenas proferida pelo Relator foi introduzido pelo DL 329-A/95, podendo a parte afectada pela decisão reclamar desta para a conferência conforme disposições conjugadas dos artºs. 705º e 700º nº 3 CPC, hoje, artºs. 656º ex vi 652º nº 1 c) e nº 3 CPC da revisão de 2013.
Deduzida reclamação para a conferência “(..) o colectivo de juízes reaprecia as questões que foram objecto da decisão singular do Relator e, nesse sentido, caso se esteja perante a decisão sumária do recurso, reaprecia novamente o recurso, naturalmente sem qualquer vinculação ao anteriormente decidido.
No entanto, se assim é, ou seja, se normalmente a intervenção da conferência, no caso em que se reclama de uma decisão sumária, faz retroagir o conhecimento do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão, importa ter presente que, nos termos gerais, no recurso ou na reclamação, o Recorrente ou o Reclamante podem restringir o seu objecto, isto é, o requerimento para a conferência (mesmo resultante de convolação do requerimento de interposição de recurso de revista) pode restringir o objecto próprio da reclamação, concretamente identificando a parte da decisão sumária de que discorda (da qual se sente prejudicado) (..)” – doutrina constante do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 23.02.2015, tirado no rec. nº RP201502231403/04.7TBAMT-H.P1.

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No citado Acórdão da Relação do Porto é feita referência expressa aos termos gerais de direito no que respeita à possibilidade de, em sede de reclamação da decisão singular do Relator, o Recorrente restringir o abjecto do recurso, “(..) identificando os segmentos decisórios sobre os quais demonstra o seu inconformismo. Trta-se, na prática, de uma solução que se encaixa na possibilidade de desistência do recurso, nos termos que constam do artº 632º nº 5, com a especificidade de a extinção da instância ser, aqui, parcial. (..)” ( Abrantes Geraldes, in Recursos no novo Código de Processo Civil, Almedina/2013, pág. 85.)
O que implica precisar o pressuposto legal de delimitação do âmbito da pretensão recursória e das hipóteses legais de modificação.
A delimitação objectiva do recurso é dada pelas conclusões, cfr. artºs. 635º nº 4, 637º nº 2 e 639º nºs 1 e 2 CPC, na medida em que “(..) A motivação do recurso é de geometria variável, dependendo tanto do teor da decisão recorrida como do objectivo procurado pelo recorrente, devendo este tomar em consideração a necessidade de aí sustentar os efeitos jurídicos que proclamará, de forma sintética, nas conclusões. (..)
Mas, independentemente do âmbito definido pelo recorrente no requerimento de interposição, é legítimo restringir o objecto do recurso nas alegações, ou, mais correctamente, nas respectivas conclusões, indicando qual a decisão (ou parte da decisão) visada pela impugnação. (..) A restrição pode ser tácita em resultado da falta de correspondência entre a motivação e as alegações, isto é, quando, apesar da maior amplitude decorrente do requerimento de interposição de recurso, o recorrente restrinja o seu âmbito através das questões que identifica nas conclusões. (..)”, cfr. artº 635º nº 4 CPC. ( Abrantes Geraldes, in Recursos no novo Código de Processo Civil, págs. 115, 84/85.)
No tocante à ampliação do objecto do recurso, o artº 636º nº 1 CPC permite que, embora a decisão seja favorável à parte e a parte vencida interponha recurso, caso no Tribunal a quo não tenha acolhido todos ou alguns dos fundamentos da acção (de facto ou de direito) suscitados pela parte vencedora, essas questões serão reapreciadas pelo Tribunal ad quem a requerimento do Recorrido em alegações complementares, isto é, o Tribunal de recurso reapreciará os fundamentos do segmento da sentença recorrida em que a parte vencedora tenha decaído.

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Do complexo normativo citado se conclui que o acto processual de convocação da conferência no regime do artº 652º nº 1 c) e nº 3 ex vi 656º CPC não é configurado como meio adjectivo próprio para alterar as conclusões de recurso, ressalvada a hipótese já mencionada de limitação do objecto (artº 635º/4 CPC), nem para desistir do recurso (artº 632º º 5 CPC), posto que “(..) a desistência do recurso apenas é possível até à prolação da decisão, tornando-se agora inequívoca a solução que já anteriormente se defendia. Representa uma medida que que valoriza o papel do tribunal superior, evitando que o recorrente accione o mecanismo da desistência depois de ter sido confrontado com o resultado do recurso.
Aliás, o momento que releva para o efeito nem sequer é o da notificação da decisão, mas antes o da sua prolação (..)”,. ( Abrantes Geraldes, Recursos do novo Código de Processo Civil, págs. 71/72.)
Neste sentido, junta aos autos a decisão singular de mérito sobre o objecto do recurso proferida pelo relator (artº 652º/1 c) ex vi 656º CPC) ocorre nessa data a preclusão de exercício do direito de desistência por parte do recorrente, cfr. artº 632º nº 5 CPC.
A reclamação para a conferência constitui o meio adjectivo próprio ao dispor da parte que se sinta prejudicada pela decisão individual e sumária do relator sobre o objecto do recurso, podendo o recorrente/reclamante, nessa reclamação, restringir o objecto do recurso no uso do direito conferido pelo artº 635º nº 4 CPC, mas não pode ampliar o seu objecto, faculdade limitada ao recorrido nos termos do artº 636º nº 1 CPC, isto é, limitada à parte vencedora que tendo decaído em alguns dos fundamentos da acção, apesar disso, obteve vencimento no resultado final.
Como se diz no Acórdão da Relação do Porto acima citado, no regime do artº 652º nº 1 c) e nº 3 ex vi 656º CPC a reclamação para a conferência da decisão sumária proferida apenas pelo relator faz retroagir o conhecimento em conferência do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão sumária, conhecimento limitado às questões especificadas pelo recorrente nas conclusões de recurso, sem prejuízo de o recorrente, ora reclamante, restringir na reclamação o objecto recursório anteriormente definido nos termos do artº 635º nº 4 CPC.
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Por requerimento de fls. --- os Recorridos requerem pronúncia em conferência, de modo que cumpre reapreciar as questões suscitadas em sede de conclusões pelo Recorrente, fazendo retroagir nos termos expostos o conhecimento do mérito do recurso ao momento anterior à decisão singular de mérito proferida pelo Relator.

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Relativamente ao Ac. do TCAS de 19.10.2017 tirado no rec. nº 1959/16.1 de cuja formação o aqui Relator fez parte como Adjunto e que ora revê posição, cabe dizer o seguinte.


2. nulidade por contradição intrínseca - art° 615° n° l c) CPC – erro de julgamento;

Nos termos do disposto no artº 615º nº 1 c) CPC aplicável ex vi artº 1º CPTA, o Tribunal incorre no vício de sentença de oposição entre os fundamentos e a decisão, “(..) quando os fundamentos invocados pelo tribunal conduzirem logicamente a uma conclusão oposta, ou, pelo menos, diferente daquela que consta da decisão. Esta nulidade é a correspondente, quanto à decisão do tribunal, da ineptidão da petição inicial por contradição entre o pedido e a causa de pedir (..)”
Ou seja, e continuando com a doutrina que vem sendo citada, a oposição entre os fundamentos e a decisão e o erro de julgamento não se colocam em alternativa face à mesma base material porque se trata de tipologias de erro judiciário absolutamente distintas. ( Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, LEX/1997, págs. 220-224.) ( Miguel Teixeira de Sousa, Estudos …, págs. 222/223 e 408/410.)
No caso concreto, o Recorrente suscita nos itens 2 a 14 das conclusões o vício de contradição lógica entre os fundamentos e a decisão, isto é, “(..) os fundamentos invocados pela Meritíssima Juiz a quo conduziriam logicamente a um resultado oposto ao expresso na decisão, ou seja, há manifesta contradição entre a decisão e os seus fundamentos, jamais podendo concluir pela violação da boa-fé pois impõe-se uma decisão de sentido inverso àquela que foi proferida. (..)”.
Todavia, o julgado não se fundamenta na violação do princípio da boa-fé reportado a informações colhidas pelo ora Recorridos em conversas informais junto de funcionários do CEJ quanto a “alterar a interpretação dada à lei do CEJ na pendência do concurso”, embora tal constitua uma “narrativa en passant” que vem aflorada no decurso da fundamentação de direito mas que não se arvora em premissa da síntese condenatória.
Do nosso ponto de vista, o julgado condenatório em 1ª Instância no sentido de “(..) o CEJ graduar os AA no 32º Curso Normal de Formação Teórico-Prática para Magistrados Judicias na posição que lhe corresponder por consideração às notas obtidas no concurso anterior (..)” tem por fundamento o Ac. do TCAS de 19.10.2017 tirado no rec. nº 1959/16.1 em que se sustentou a natureza contra-legem do artº 21º nº 2 do Regulamento Interno do CEJ face ao artº 28º nº 6 da Lei 2/2008, 14.01.
Neste contexto não existe contradição lógica, pelo que improcede a questão trazida a recurso nos itens 2 a 14 das conclusões.


3. regulamento – função administrativa secundária;

Nas conclusões de recurso sob os itens 15 a 41 vem assacada a sentença de incorrer em erro de julgamento na medida em que
(i) “o n.° 6 do artigo 28.°da Lei nº 2/2008, de 14 de janeiro, confere a faculdade aos candidatos aptos (aprovados), que não ficaram habilitados por falta de vagas, de dispensarem a prestação de provas no concurso imediatamente seguinte”
(ii) “a possibilidade de aproveitamento da melhor das duas notas, prevista no nº 2 do artigo 21.° do Regulamento Interno do CEJ pressupõe, claramente, que o candidato tenha ficado apto”
(iii) para além do artigo 28.º da Lei n.° 2/2008, de 14 de janeiro, releva, também, destacar as normas dos artigos 6.°, n.° 3, 24.°, 26.°, n.º 1 e 27º, nº 1, da Lei nº 2/2008, de 14 de janeiro, referentes à aprovação e respetiva graduação, das quais decorre que a graduação dos candidatos pressupõe a sua aprovação e este pressuposto está ínsito na faculdade concedida pelo n.° 6 do artigo 28.° da Lei n.° 2/2008, de 14 de janeiro: a graduação destes candidatos ocorra conjuntamente com os candidatos aprovados no concurso imediatamente seguinte”.
O regulamento traduz a decisão de um órgão da administração pública emanada no exercício da função administrativa e ao abrigo de normas de direito público, tendo a natureza de acto normativo na medida em que detenha eficácia externa vinculativa, no tocante aos efeitos jurídicos produzidos; neste contexto, o regulamento constitui fonte de direito administrativo.
Atendendo a que o regulamento partilha do carácter secundário da função administrativa, tal implica a sua subordinação ao princípio da legalidade cfr. artºs. 2º e 266º nº 2 CRP, isto é, ao bloco de legalidade firmado no artº 112º nº 1 CRP, ou seja, aos actos legislativos.
De modo que, os regulamentos que contrariem o bloco de legalidade a que estão sujeitos são ilegais e, normalmente, inválidos.
Da subordinação ao bloco de legalidade decorre que a interpretação dos regulamentos deve ser conforme à lei e “(..) além disso deve ser positivamente orientada para a prossecução plena e integral dos fins da lei regulamentada (..) assim, os argumentos teleológicos de interpretação das normas regulamentares não atendem exclusivamente aos fins visados pelos regulamentos em que estão inseridas, mas também àqueles que a lei na qual estes se fundamentam pretende ver prosseguidos com a sua emissão (..)” ( Marcelo Rebelo de Sousa/André Salgado Matos, Direito Administrativo Geral, Tomo III, 2ª ed. D. Quixote, págs. 250, 261/262.)

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Temos, assim que, na vertente dos requisitos objectivos materiais de legalidade, o regulamento não pode contrariar o bloco de legalidade e, no tocante aos requisitos objectivos funcionais de legalidade, o regulamento “(..) tem que visar a prossecução do fim de interesse público definido por lei; o motivo principalmente determinante da emissão do regulamento deve visar a prossecução do fim legal (..)” (Marcelo Rebelo de Sousa/André Salgado Matos, Direito Administrativo Geral, Tomo III, 2ª ed. D. Quixote, págs. 263, 266. ) , tomando aqui como conceito de interesse público “(..) a expressão político-legislativa do interesse comunitário (englobando a consideração dos interesses privados relevantes), que constitui a finalidade que justifica e vincula a função administrativa. (..)” ( Vieira de Andrade, A justiça administrativa, 15ª ed. Almedina/2016, pág. 15. )

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Aqui chegados impõe-se verificar da conformidade do artº 21º nº 2 do Regulamento Interno do CEJ - Reg. nº 339/2009 publicado no DR, 2ª série, nº 150 de 05.08.2009, republicado com alterações no DR, 2ª série nº 71 de 10.04.2014 - com o bloco de legalidadeada a que está subordinado, concretamente, com a Lei 2/2008, 14.01 que define o regime de ingresso nas magistraturas, formação inicial e contínua de magistrados e estrutura e funcionamento do Centro de Estudos Judiciários (CEJ).
A matéria em causa reporta a dois procedimentos concursais a que os ora Recorridos foram concorrentes: o 31º Concurso Normal de Formação Teórico-Prática para Magistrados dos Tribunais Judiciais, e o 32º Concurso Normal de Formação Teórico-Prática para Magistrados dos Tribunais Judiciais.
No primeiro, o 31º Concurso aberto para o preenchimento de 40 vagas, os Recorridos obtiveram
1. Autor, ora Recorrido - a classificação final de 12.538 valores, graduado em 44º lugar na lista de graduação
2. Autora, ora Recorrida - a classificação final de 12,342, graduado em 50° lugar na mesma lista de graduação.
Cabe referir que o procedimento concursal tem início com o despacho ministerial de autorização de abertura do concurso e fixação de vagas (artº 8º nºs 1 e 2) a publicitar mediante aviso de abertura no Diário da República (artº 10º nº 1) e termina com a nomeação em regime de efectividade dos juízes e procuradores-adjuntos em regime de estágio de ingresso (artº 72º nº 1).

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Importa à questão trazida a recurso saber se o artº 21º do Regulamento do CEJ - Reg. nº 339/2009 publicado no DR, 2ª série, nº 150 de 05.08.2009, republicado com alterações no DR, 2ª série nº 71 de 10.04.2014 - respeita os requisitos objectivos materiais de legalidade, isto é, respeita a relação de conformidade com a Lei 2/2008, 14.01 diploma pelo qual o legislador definiu, no que aqui importa, (i) o regime de ingresso nas magistraturas mediante provas eliminatórias de selecção dos candidatos concursais, (ii) a formação teórico-prática dos auditores de justiça e (iii) o estágio de ingresso dos juízes e procuradores-adjuntos em regime de estágio.
Relação de conformidade no tocante aos normativos que na Lei 2/2008, definem os pressupostos de classificação dos candidatos habilitados a ingressar no curso de formação teórico-prática.


4. método de selecção - artºs 14º a), b) c), 15º nº 1 a) e b) e 16º/13 Lei 2/2008;

De acordo com a citada Lei 2/2008, 14.01, o método de selecção dos candidatos admitidos ao concurso no CEJ compõe-se, conforme artº 14º a), b) c) - provas de conhecimentos jurídicos; avaliação curricular; exame psicológico de selecção.
Estas provas de conhecimento, conforme artº 15º nº 1 a) e b), têm duas fases eliminatórias: fase escrita e fase oral.
Nos termos do artº 16º/13, são admitidos à fase oral ou à fase curricular os candidatos que obtenham classificação igual ou superior a 10 valores em cada uma das provas de conhecimentos jurídicos que integram a fase escrita.
Portanto com notação abaixo de 10 em cada uma das provas de conhecimento da fase escrita o candidato, em linguagem académica “chumba”, não passa à fase seguinte.


5. candidatos admitidos - artºs 19º nº 7 e 20º nº 5 Lei 2/2008;

Nos termos do artº 19º nº 7 são admitidos a exame psicológico de selecção os candidatos que obtenham classificação igual ou superior a 10 valores em todas as provas de conhecimentos jurídicos que integram a fase oral (artº 19º nºs 2/3, tribunais comuns e tribunais administrativos e fiscais, respectivamente).
Nos termos do artº 20º nº 5 são admitidos a exame psicológico de selecção os candidatos que obtenham classificação igual ou superior a 10 valores na avaliação curricular, sendo que a avaliação psicológica tem de ser favorável, naturalmente (artº 21º nºs. 3 e 8).
O critério de aferição de passagem, mantém-se: com notação abaixo de 10 em cada uma das provas da avaliação curricular o candidato, em linguagem académica “chumba”, não passa à fase seguinte do exame psicológico.


6. candidatos excluídos – classificação final - listas de graduação - artºs 24º nº 2 b), 25º nºs 1, 3, 4, 26º nº 1 e 27º nº 1 Lei 2/2008;

Nos termos do artº 24º nº 2 b) são excluídos os candidatos que obtenham classificação inferior a 10 valores em qualquer das provas de conhecimentos jurídicos que integram a fase escrita e a fase oral.
Por sua vez, a classificação final é uma resultante por média aritmética das notações obtidas nas provas escritas e oral, conforme artº 25º nº s 1, 3 e 4.
Nos termos do artº 26º nº 1 e na lógica do critério de admissão e de exclusão de candidatos determinado nos artºs. artº 19º nº 7 e 24º nº 2 b), são elaboradas duas listas:
(i) a lista de graduação dos candidatos aprovados por via de admissão “feita por ordem decrescente de graduação” (artº 27º nº 1)
(ii) e a lista de candidatos excluídos.
Mais uma vez, o critério de aferição mantém-se: com notação abaixo de 10 em cada uma das provas de conhecimentos jurídicos da fase escrita e fase oral o candidato, em linguagem académica “chumba definitivamente”, é excluído do procedimento concursal.
O que significa que o candidato excluído por ter obtido graduação inferior a 10 valores nas provas de conhecimento escritas e orais em matérias jurídicas não passa à fase de formação teórico-prática,
Ou seja, o candidato que não obteve aproveitamento no domínio da prestação de provas escritas e orais em matéria jurídica, não tem legitimidade substantiva para adquirir o estatuto de auditor de justiça mediante celebração de contrato de formação (artº 31º nº 2), na exacta medida em que não tem legitimidade substantiva para se habilitar à fase subsequente em função da avaliação negativa.


7. candidatos habilitados ao curso de formação teórico prática – artºs 28º nºs 1, 3 e 6, 31º nºs. 1, 2 e 6 Lei 2/2008;

Nos termos do artº 28º nºs 1 e 3 são considerados habilitados a frequentar o curso de formação teórico prática os candidatos aprovados, elencados por ordem de classificação decrescente (artºs. 26º nº 1 e 27º nº 1), tendo esta admissão por limite o número de vagas aprovadas para o concurso por despacho ministerial (artº 8º nº 2).
O que significa que a específica graduação com nota igual ou superior a 10 valores define e determina o posicionamento do candidato sob dois aspectos:
(i) na lista de graduação final por ordem descente dos candidatos aprovados
(ii) no âmbito das vagas fixadas por despacho ministerial e postas a concurso (artºs. 8º nº 2 e 28º nº 1).
Como já referido, o título de legitimidade para efeitos de ingresso no curso de formação teórico prática, de celebração do contrato de formação e consequente aquisição do estatuto procedimental de auditor de justiça (artº 31º nºs. 1 e 2) depende da verificação de dois pressupostos substantivos na esfera jurídica do candidato:
(i) aprovação com nota igual ou superior a 10 valores nas provas de conhecimento das fases escrita e oral avaliação psicológica favorável (artºs. 16º nº 13, 19º nº 7, 20º nº 5, 21º nº 3, 24º n º 1, 25º º 1)
(ii) graduação final abrangida pelo número de vagas aprovado para o respectivo concurso por despacho ministerial (artº 8º nº 2, 27º nº 1, 28º nº 1 e 31º nº 1).
Nos termos do artº 28º nº 6,
“ – Os candidatos aptos que não tenham ficado habilitados para a frequência do curso teórico-pratico imediato, por falta de vagas, ficam dispensados de prestar provas no concurso imediatamente seguinte, ficando graduados conjuntamente com os candidatos que concorram a este.”
O sentido do normativo em causa (artº 28/6) é claro no seu preciso teor textual, mas resulta cristalino ao ser conjugado com os normativos dos nºs. 1 e 3 do mesmo artigo 28...
Conforme dispõe o artº 28º nºs 1 e 3 são considerados habilitados a frequentar o curso de formação teórico prática os candidatos aprovados, elencados por ordem de classificação decrescente (artºs. 26º nº 1 e 27º nº 1), tendo esta admissão por limite o número de vagas aprovadas para o concurso por despacho ministerial (artº 8º nº 2).
Portanto, o segmento “candidatos aptos que não tenham ficado habilitados para a frequência do curso teórico-pratico imediato, por falta de vagas” refere-se aos candidatos que obtenham
1. classificação igual ou superior a 10 valores em todas as provas de conhecimentos jurídicos que integram a fase oral (artº 19º nºs 2/3, tribunais comuns e tribunais administrativos e fiscais, respectivamente),
2. com avaliação psicológica favorável (artºs. 20º nº 5 e 21º nºs. 3 e 8)
3. e cuja graduação final não os exclua do âmbito do total de vagas aprovado para o respectivo concurso por despacho ministerial (artº 8º nº 2, 27º nº 1, 28º nº 1 e 31º nº 1).
Contas feitas, os candidatos aprovados, isto é, com nota igual ou superior a 10 nas provas escritas e orais de conhecimentos jurídicos e com perfil psicológico favorável, têm o ingresso na fase de formação teórico-prática na qualidade de auditores de justiça dependente de a classificação final obtida os incluir no quantum de vagas definido pelo Ministro da Justiça.
De acordo com o modelo de selecção definido na Lei 2/2008, significa que o legislador estabeleceu um critério de meritocracia, seleccionando os melhores classificados nos exames de entrada no CEJ.

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Esta exigência normativa de avaliação e selecção dos candidatos ao concurso com fundamento nas provas escritas e orais prestadas em matéria jurídica (além do exame psicológico) para aceder à fase de formação teórico-prática como auditores de justiça, configura uma linha lógico-normativa em todo o procedimento concursal.
Na fase subsequente de ingresso relativa ao juiz e procurador-adjunto em regime de estágio, a exigência selectiva mediante avaliação foi mantida pelo legislador.
Ou seja, a selecção e formação de magistrados segundo critério avaliativos excludentes, de notação abaixo de 10 no caso da fase de ingresso, constitui uma questão fundamental para o legislador, sendo de tal modo evidente e de bom senso segundo os padrões do homem comum (artº 487º nº 2 C. Civil), que resulta estranho explicar o porquê de o estatuto de candidato aprovado constituir conditio sine qua non para efeitos de ingresso na fase de formação teórico-prática por expressa determinação legal.
Todavia o objecto do presente recurso exige que essa razão normativa seja evidenciada.

8. Tribunais – complexo de órgãos de soberania - artºs 110º/1 e 202º/1 CRP;

Nos seus artºs. 110º nº 1 e 202º nº 1, o texto constitucional afirma os tribunais como órgãos de soberania.
Como nos diz a Doutrina, citando o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 81/86, “(..) os tribunais não constituem um órgão de soberania “colectivo ou múltiplo”. Não existe um órgão de soberania integrado por todos os tribunais: todos e cada um dos tribunais são órgãos de soberania. É o artº 202º da Constituição que o diz de forma inequívoca, quando dispõe que “os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo”.
Sublinhe-se: os órgãos de soberania, não o órgão de soberania. Por isso não colhe o invocado paralelismo estre os tribunais e o Governo. Este é um órgão de soberania complexo; os tribunais são um complexo de órgãos de soberania”. (..)” ( Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa – Anotada, Tomo III, Coimbra Editora/2007, pág.14.)
Exactamente por isso, no plano dos tribunais, enquanto órgão de poder da República, não existe nenhum fenómeno de essência colectivista. Pelo contrário “(..) Há, sim, um estatuto constitucional aplicável a cada juiz. (..) Todo o exercício da função jurisdicional envolve uma dimensão política, no sentido mais profundo e depurado do termo, porque materializa o exercício de poder público e comporta uma maior ou menor margem de liberdade de autodeterminação segundo critérios pessoais para cujo emprego as normas aplicadas habilitam. (..)” ( Sérvulo Correia, Direito do contencioso administrativo, LEX/2005, págs.567/569.)
A natureza da função jurisdicional não pode ser dissociada do estatuto constitucional aplicável a cada juiz e, como tal, não pode ser dissociado do critério legal de exigência expresso nos métodos de selecção e consequentes provas de classificação por escala de pontuação estabelecidas na Lei 2/2008, 14.01.
Do mesmo modo, a natureza das funções desempenhadas pelo Ministério Público nos termos definidos no artº 219º nº 1CRP, de exercício da representação do Estado a par da activação do controlo jurídico objectivo mediante o exercício da acção pública na defesa dos interesses que a lei determinar v.g. na defesa da legalidade democrática, convoca o critério legal de exigência plasmado na Lei 2/2008.
O modelo de selecção de ingresso nas magistraturas mediante avaliações eliminatórias por padrões mínimos de qualidade de conhecimentos jurídicos, nos termos estabelecido na Lei 2/2008, tem por razão de existência normativa o objecto das funções a desempenhar pelos Tribunais na administração da justiça.


9. requisitos de legalidade do regulamento - objectivos funcionais e materiais;

Como já referido, na vertente dos requisitos objectivos funcionais de legalidade, o regulamento tem que visar a prossecução do fim de interesse público definido na lei.
A Lei 2/2008, 14.1 define o quadro normativo a que deve obediência o regime de ingresso e de formação profissional de magistrados para os tribunais judiciais e para os tribunais administrativos e fiscais, cujas atribuições norteiam o elenco competencial do Centro de Estudos Judiciários.
Da Lei 2/2008, 14.01 resulta claro que o fim de interesse público prosseguido consiste na definição do regime de selecção para o ingresso e formação de magistrados – artºs 1º e 2º Lei 2/2008.
Interesse público em linha com a função jurisdicional cometida aos tribunais, ou seja, administrar a justiça em nome do povo, em prazo razoável e mediante processo equitativo – artºs. 20º nº 4 e 202º nº 1 CRP.
Concretizado mediante o critério legal de selecção dos candidatos a magistrados, constante do bloco normativo que define o modelo de selecção na fase de ingresso pela prestação de provas de conhecimentos jurídicos, escritas e orais, avaliadas por escalas de pontuação de zero a vinte, eliminatórias no nível de graduação abaixo de dez.
Ou seja, o interesse público traduzido no critério legal de selecção da fase de ingresso mostra-se concretizado pelo bloco normativo enunciado nos termos acima expostos:
§ artºs 14º a), b) c), 15º nº 1 a) e b) e 16º/13 Lei 2/200 – método de selecção
§ artºs 19º nº 7 e 20º nº 5 Lei 2/2008 – candidatos admitidos
§ artºs 24º nº 2 b), 25º nºs 1, 3, 4, 26º nº 1 e 27º nº 1 Lei 2/2008 - candidatos excluídos – classificação final - listas de graduação
§ artºs 28º nºs 1, 3 e 6, 31º nºs. 1 e 2 Lei 2/200 - candidatos habilitados ao curso de formação teórico prática

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Do ponto de vista dos requisitos objectivos materiais de legalidade, isto é, no tocante à relação de conformidade, o regulamento não pode contrariar o bloco de legalidade
No caso trazido a recurso mostra-se controvertida a relação de conformidade do artº 21º do Regulamento Interno do CEJ com os normativos que definem os pressupostos de classificação dos candidatos habilitados a ingressar no curso de formação teórico-prática.
Dispõe o artº 21º - Candidatos aptos mas não habilitados no concurso imediatamente anterior
1. Os candidatos aptos mas não habilitados que pretendam exercer o direito à dispensa de prestação de provas conferido pelo nº 6 do artº 28º da lei 2/2008 de 14 de Janeiro, devem declará-lo até ao termo do prazo fixado para apresentação de candidaturas no aviso de abertura do concurso imediatamente seguinte, sem prejuízo de poderem candidatar-se a este e ser graduados conjuntamente com os candidatos que neste ficaram aptos.
2. No caso de se candidatarem nos termos do artigo anterior e ficarem aptos, os candidatos são graduados no concurso seguinte de acordo com a classificação final mais elevada obtida nos dois concursos.”
Por seu turno, nos termos do artº 28º nº 6 da Lei 2/2008,
“ – Os candidatos aptos que não tenham ficado habilitados para a frequência do curso teórico-pratico imediato, por falta de vagas, ficam dispensados de prestar provas no concurso imediatamente seguinte, ficando graduados conjuntamente com os candidatos que concorram a este.”
O sentido do normativo em causa (artº 28/6) é claro no seu preciso teor textual, mas resulta cristalino ao ser conjugado com os normativos dos nºs. 1 e 3 do mesmo artº 28º.
Como já afirmado supra, o artº 28º nºs 1 e 3 Lei 2/2008, 14.1 determina que são considerados habilitados a frequentar o curso de formação teórico prática os candidatos aprovados, elencados por ordem de classificação decrescente (artºs. 26º nº 1 e 27º nº 1), tendo esta admissão por limite o número de vagas aprovadas para o concurso por despacho ministerial (artº 8º nº 2).

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Portanto, o segmento do artº 28º nº 6 da Lei 2/2008 “candidatos aptos que não tenham ficado habilitados para a frequência do curso teórico-pratico imediato, por falta de vagas” refere-se aos candidatos que obtenham:
1. classificação igual ou superior a 10 valores em todas as provas de conhecimentos jurídicos que integram a fase oral (artº 19º nºs 2/3, tribunais comuns e tribunais administrativos e fiscais, respectivamente),
2. com avaliação psicológica favorável (artºs. 20º nº 5 e 21º nºs. 3 e 8)
3. e cuja graduação final não os exclua do âmbito do total de vagas aprovado para o respectivo concurso por despacho ministerial (artº 8º nº 2, 27º nº 1, 28º nº 1 e 31º nº 1).
Os candidatos aptos são os aprovados nas provas de ingresso e com perfil psicológico favorável.
Os candidatos habilitados para a frequência do curso teórico-pratico imediato são os candidatos aprovados nas provas de ingresso e com perfil psicológico favorável.
O artº 21º nº 2 do Regulamento Interno do CEJ reflecte o já afirmado no bloco normativo da Lei 2/2008 que define o modelo de selecção de ingresso das magistraturas, mediante avaliações eliminatórias por padrões mínimos de qualidade de conhecimentos jurídicos.
Modelo esse de que o artº 28º nº 6 Lei 2/2008 é um aspecto parcelar do modelo, no seu todo.
Efectivamente, o artº 28º nº 6 citado regula a matéria da selecção no ingresso ao CEJ quanto aos candidatos aprovados mas não incluídos no número de vagas determinado por despacho ministerial, ali definidos como os “candidatos aptos que não tenham ficado habilitados para a frequência do curso teórico-prático imediato, por falta de vagas”.

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Do que vem dito se conclui que a relação de conformidade do artº 21º nºs 1 e 2 do Regulamento do CEJ tem que ser analisada não apenas em função da estrita matéria constante da hipótese legal e respectiva estatuição constante do artº 28º nº 6 Lei 2/2008, mas de acordo com o bloco normativo que na Lei 2/2008 determina o modelo avaliativo, os critérios de avaliação e os critérios de exclusão que, no seu conjunto supra especificado, definem o regime legal de selecção dos candidatos a magistrados da Judicatura e do Ministério Público.
Razão pela qual não se acompanha o entendimento sustentado pelo Tribunal a quo.


10. benefício e graduação – artºs. 28º nº 6 Lei 2/2008 e 21º nºs. 1 e 2 Regulamento do CEJ;

Ou seja.
Os candidatos com classificação final abaixo de 10 valores são excluídos do procedimento, nos termos supra expostos (artº 24º nº 2 b) Lei 2/2008) e, como tal, não preenchem os pressupostos determinados no artº 28º nº 6 Lei 2/2008 para o efeito.
Apenas os candidatos aptos e, como tal, aprovados, mas não habilitados a passar à fase seguinte de curso de formação teórico-prático porque a classificação final obtida os excluiu do número de vagas fixado por despacho ministerial, têm um benefício.
O benefício de, mediante requerimento em prazo nos termos do artº 21º nºs. 1 e 2 do Regulamento do CEJ, serem “dispensados de prestar provas no concurso imediatamente seguinte, ficando graduados conjuntamente com os candidatos que concorram a este.”
De modo que apenas os candidatos aprovados nas provas de ingresso e com perfil psicológico favorável mas cuja classificação final extravasa o número de vagas determinado por despacho ministerial, caso se candidatem ao procedimento concursal seguinte, têm o benefício de “exercer o direito à dispensa de prestação de provas conferido pelo nº 6 do artº 28º da Lei 2/2008” mediante requerimento sujeito a prazo (artº 21º nº 1 Regulamento do CEJ),
E na medida em que no concurso anterior ficaram aprovados mas não habilitados porque a classificação final obtida os excluiu do número de vagas, concorrem com a classificação final do concurso anterior, à graduação final do concurso seguinte, sendo elencados no lugar que lhes compete por ordem de graduação levando em conta todos os candidatos aprovados neste concurso, nos termos do artº 28º nº 6 Lei 2/2008.
Naturalmente que o regime do artº 28º nº 6 Lei 2/2008 convoca opções e comporta riscos na esfera jurídica dos interessados.
Se as classificações obtidas no concurso em que foram aprovados mas excluídos por falta de vagas forem relativamente modestas, os candidatos dispensados de prestar provas no concurso imediatamente seguinte correm o risco de ser novamente excluídos do número de vagas fixado; na hipótese menos benigna, pode ocorrer uma classificação inferior a 10 valores em qualquer das provas de conhecimentos jurídicos que integram a fase escrita e a fase oral, o que significa a exclusão do procedimento (artº 24º nº 2 b) Lei 2/2008) nos termos supra expostos.
Efectivamente, em caso de candidatos excluídos não tem base legal a aplicação do mecanismo de graduação com os candidatos aprovados (artº 28º nº 6 Lei 2/2008 e 21º nºs. 1 e 2 do Regulamento do CEJ), por manifesta falta de pressupostos, na exacta medida em que nada há a graduar, pois só se graduam classificações finais positivas, ou seja, de candidatos aprovados na decorrência de terem obtido classificação final nas provas de ingresso ao CEJ de valor igual ou superior a 10 (artºs 24º nº 2 b), 25º nºs 1, 3, 4, 26º nº 1 e 27º nº 1 Lei 2/2008), nos termos expostos.

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Em síntese, os candidatos aprovados, isto é, com nota igual ou superior a 10 nas provas escritas e orais de conhecimentos jurídicos e com perfil psicológico favorável, têm o ingresso na fase de formação teórico-prática na qualidade de auditores de justiça dependente de a classificação final obtida os incluir no quantum de vagas definido pelo Ministro da Justiça.
Os ora Recorridos estão, precisamente, na circunstância de candidatos excluídos.
De acordo com o probatório, no 31º Concurso aberto para o preenchimento de 40 vagas, o Autor, ora Recorrido, obteve a classificação final de 12.538 valores, e foi graduado em 44º lugar na lista de graduação; por sua vez, a Autora, ora Recorrida, obteve a classificação final de 12,342, sendo graduada em 50° lugar na mesma lista de graduação.
No 32.° Concurso Normal de Formação Teórico-Prática para Magistrados dos Tribunais Judiciais a que concorreram, os Recorridos foram excluídos em virtude de terem obtido classificação inferior a 10 valores nas provas de conhecimento que integram a fase escrita.
Donde se conclui que, nesta parte, assiste razão ao Recorrente, não podendo subsistir o julgado pelo Tribunal a quo.

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Pelo exposto, relativamente ao Ac. do TCAS de 19.10.2017 tirado no rec. nº 1959/16.1 de cuja formação o aqui Relator fez parte como Adjunto e que ora revê posição, cabe concluir pela procedência das questões trazidas a recurso nos itens 15 a 41 das conclusões e, nos termos expostos, revogar a sentença proferida.


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Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar procedente o recurso e revogar a sentença proferida.

Custas a cargo dos Recorridos.

Lisboa, 29.AGO.2018


(Cristina dos Santos) …………………………………………………

(Carlos Araújo) ……………………………………………………….

(Cristina Flora) -------------------------------------------------------------






(1) Abrantes Geraldes, in Recursos no novo Código de Processo Civil, Almedina/2013, pág. 85.
(2) Abrantes Geraldes, in Recursos no novo Código de Processo Civil, págs. 115, 84/85.
(3) Abrantes Geraldes, Recursos do novo Código de Processo Civil, págs. 71/72.
(4) Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, LEX/1997, págs. 220-224.
(5) Miguel Teixeira de Sousa, Estudos …, págs. 222/223 e 408/410.
(6) Marcelo Rebelo de Sousa/André Salgado Matos, Direito Administrativo Geral, Tomo III, 2ª ed. D. Quixote, págs. 250, 261/262.
(7) Marcelo Rebelo de Sousa/André Salgado Matos, Direito Administrativo Geral, Tomo III, 2ª ed. D. Quixote, págs. 263, 266.
(8) Vieira de Andrade, A justiça administrativa, 15ª ed. Almedina/2016, pág. 15.
(9) Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa – Anotada, Tomo III, Coimbra Editora/2007, pág.14.
(10) Sérvulo Correia, Direito do contencioso administrativo, LEX/2005, págs.567/569.