Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:77/20.2BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:06/04/2020
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:RECLAMAÇÃO JUDICIAL.
LITISPENDÊNCIA.
PRESCRIÇÃO.
Sumário:
1. Existe litispendência se, em três reclamações judiciais com o mesmo alcance jurídico, os mesmos reclamantes invocam como fundamento do pedido a prescrição da dívida exequenda.
2. Verificando-se uma sucessão cronológica de causas de interrupção da prescrição antes de 1 de Janeiro de 2007, cada uma delas tem a virtualidade de interromper o prazo prescricional, ainda que uma ocorra quando a anterior causa ainda está a produzir efeitos.
3. O efeito interruptivo da prescrição imposto pela citação cessa com o trânsito em julgado da decisão que põe termo ao processo.
4. Caducada a garantia, associada ao meio impugnatório, gracioso ou contencioso, o processo de execução fiscal continua suspenso, mesmo sem garantia, até à decisão do pleito.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão


I- Relatório

M................ e A................, melhor identificados nos autos, apresentaram ao abrigo do artigo 276.º e seguintes do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), reclamação dos actos de penhora praticados no processo de execução fiscal n.º ..............., instaurado pelo Serviço de Finanças de Seia, para cobrança de dívida de IRS do ano de 1997, no valor de € 386.471,19.
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, por sentença proferida a fls. 1109 e ss. (numeração do SITAF), datada de 04 de Março de 2020, julgou a presente reclamação improcedente e manteve os actos de penhora reclamados. Desta sentença os reclamantes interpuseram recurso jurisdicional, em cujas alegações, formulam as conclusões seguintes:
« A. Os Recorrentes não se conformam com a sentença proferida pelo Tribunal a quo, e entendem que devia ter sido ordenada a suspensão da instância ou, caso assim não se entendesse, então deveria o Tribunal a quo, conhecendo a prescrição da dívida exequenda, ter declarado a mesma prescrita.
B. No que respeita à suspensão da instância, resulta dos factos n.º 23, 25, e 26 dados como provados na sentença que os Recorrentes a 17/12/2019 apresentaram junto do Serviço de Finanças de Seia requerimento a invocar a prescrição da dívida exequenda e que por despacho proferido pela Directora de Finanças da Guarda foi indeferido tal pedido.
C. Ora, os Recorrentes apresentaram reclamação contra o acto do órgão execução (i.e., do despacho da Directora de Finanças da Guarda que não declarou a prescrição da dívida), o que foi dado a conhecer a este Tribunal no requerimento remetido a 27 de Fevereiro de 2020 a estes autos e documento n.º 8 aí junto. A reclamação contra aquele acto deu origem ao processo n.º 121/20.3BECTB pendente no TAF de Castelo Branco.
D. Assim, por força do documento n.º 8 junto no requerimento de 27 de Fevereiro de 2020 apresentado pelos Recorrentes, deveria ter sido dado como provado na sentença recorrida adicionalmente pelo Tribunal a quo que: Do despacho identificado no facto n.º 25 foi apresentada reclamação contra o acto do órgão de execução pelos Reclamantes a 13 de Fevereiro de 2020.
E. Um dos fundamentos da reclamação que subjaz a estes autos é o da necessidade da suspensão das diligências de penhora em apreço por ter sido requerida a prescrição da dívida exequenda através do requerimento de 17 de Dezembro de 2019 dirigido ao órgão de execução fiscal (cfr. documento n.º 6 junto com a p.i.).
F. Assim, consideram os Recorrentes que a pendência de decisão nos autos em que se discute a prescrição da dívida deve determinar que estes autos sejam suspensos até que seja proferida decisão transitada em julgado sobre a reclamação instaurada a 13 de Fevereiro de 2020 (e que originou o processo n.º 121/20.3BECTB).
G. O Tribunal a quo deveria ter ordenado a suspensão da instância por existir causa prejudicial, conforme o disposto no artigo 272.º do CPC, ex vi e) do artigo 2.º do CPPT, motivo pelo qual deve a sentença recorrida ser integralmente revogada e ser ordenada a suspensão da instância até que seja proferida decisão, transitada em julgado, sobre a reclamação dos actos do órgão de execução a ser apreciada no processo n.º 121/20.3BECTB.
H. Caso assim não se entenda, então a sentença deverá ser revogada na parte em que decidiu que a dívida exequenda não estaria prescrita por padecer de erro na aplicação do direito.
I. Nos presentes autos está em causa uma dívida referente ao IRS, a qual se reporta ao ano de 1997 no valor de € 386.471,19 (facto n.º 1 dado como provado na sentença) à qual se aplica o prazo de prescrição de 8 anos previsto na LGT (e não o que se previa no CPT), o qual deverá ser contado a partir da entrada em vigor da LGT, ou seja, a 01/01/1999, de acordo com o disposto no artigo 49.º, n.º 2 da LGT e artigo 279.º, n.º 1 do Código Civil.
J. A 31/01/2003, os Recorrentes deduziram reclamação graciosa, interrompendo, de acordo com a LGT (artigo 49.º, n.º 1, na redacção à data em vigor), o prazo de prescrição (facto n.º 1 dado como provado na sentença). Assim, de 01/01/1999 a 31/01/2003, tinham decorrido 4 anos e 30 dias do prazo de prescrição.
K. Tendo em conta que os Recorrentes apenas foram notificados do projecto de decisão em 02/08/2004, o procedimento de reclamação graciosa esteve parado por período superior a um ano, entre a data de apresentação da reclamação graciosa, ie., 31/01/2003 até 31/01/2004 (data em que perfaz um ano parado), o que significa que o efeito interruptivo da prescrição cessou por força do disposto no artigo 49.º, n.º 2 da LGT (redacção em vigor no ano 2003), tendo-se tal efeito transformado num efeito meramente suspensivo de um ano.
L. Assim, a partir de 01/02/2004 retoma-se a contagem do prazo de prescrição, o que significa que, é necessário ter em consideração os 4 anos e 30 dias já decorridos anteriormente.
M. Posteriormente, a 24/09/2004, os Recorrentes apresentaram impugnação judicial, que que correu os seus termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, sob o processo n.º 499/04.6BECTB (facto n.º 16). Até esta data haviam decorrido 4 anos e 30 dias do prazo de prescrição acrescidos de 7 meses e 23 dias (desde a paragem do processo de reclamação até à instauração da impugnação); no total, haviam decorrido 4 anos, 8 meses e 23 dias.
N. No aludido processo de impugnação, a AT apresentou contestação no dia 19/01/2005. Após a contestação da AT, o processo esteve parado por mais de um ano, por facto não imputável ao sujeito passivo, o que significa que, a 19/01/2006, completou um ano parado.
O. Deste modo, a 20/01/2006, retoma-se a contagem do prazo de prescrição, somando-se o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
P. No entanto, com a Lei do Orçamento de Estado de 2007 (doravante «LOE 2007»), a LGT sofreu alterações, nomeadamente, no seu artigo 49.º, tendo sido revogado o n.º 2 o qual previa que "a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação”.
Q. In casu, a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo já tinha decorrido e já se tinha completado em 19/01/2006 (tal como anteriormente referido), demonstrando, assim, a inaplicabilidade ao caso concreto da revogação do n.º 2 do artigo 49.º da LGT, retomou-se a contagem do prazo prescricional até perfazer os 8 anos.
R. Posteriormente à paragem do processo em 19/01/2006, não se verificou qualquer outra causa interruptiva da prescrição. Tal significa que o prazo de prescrição continuou a correr, somando-se o prazo que já se havia completado anteriormente.
S. Ainda que se tivesse considerado a contagem da AT aquando da resposta da Fazenda Pública no processo de impugnação n.º 499/04.6BECTB, a 24/09/2008, a mesma entendeu que tinham decorrido 6 anos, 9 meses e 4 dias, o que significa que, apenas faltaria 1 ano, 2 meses e 26 dias para perfazer os 8 anos. Deste modo, a dívida prescreveu a 20/12/2009, de acordo com a contagem da AT.
T. Ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo, a garantia prestada e a sua caducidade são irrelevantes para a contagem do prazo de prescrição
U. Os Recorrentes, de modo a suspender a execução fiscal, deram à penhora um conjunto de imóveis, tendo o processo de execução ficado suspenso a 13/01/2004 (facto n.º 9). No entanto, e tal como já se referiu, a reclamação graciosa esteve parada por período superior a um ano por facto não imputável os Recorrentes, pelo que, por despacho datado de 06/07/2004 foi declarada a caducidade das garantias (cff. facto n.º 12).
V. No artigo 183.º-A do CPPT, em vigor em 2004, estipulava-se o seguinte: “a garantia prestada para suspender a execução em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição caduca se a reclamação graciosa não estiver decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição ou se na impugnação judicial ou na oposição não tiver sido proferida decisão em 1.a instância no prazo de três anos a contar da data da sua apresentação”.
W. Sucede que, o referido artigo foi revogado pela Lei n.º 53.A/2006, de 29 de Dezembro, com o OE 2007 (DR 29 Dezembro).
X. Por outro lado, apenas se passou a prever, nos termos do n.º 2 do artigo 183.º do CPPT, o levantamento da garantia “logo que no processo que a determinou tenha transitado em julgado decisão favorável ao garantido ou haja pagamento da dívida”.
Y. Em 2009, a Lei n.º 40/2008, de 11 de Agosto, voltou a aditar o artigo 183.º-A ao CPPT, o qual passou a dispor no seu n.º 1: "A garantia prestada para suspender o processo de execução fiscal caduca se a reclamação graciosa não estiver decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição”.
Z. Tal significa que deixou de existir previsão legal para manter os processos de execução fiscal suspensos, por caducidade de garantia, nos casos em que a impugnação judicial se encontra pendente da decisão em primeira instância, há mais de três anos.
AA. Por outro lado, e no âmbito da impugnação judicial, apenas a partir de 1 de Janeiro de 2017, é que se passou a prever que “A garantia prestada para suspender o processo de execução fiscal caduca se na acção de impugnação judicial ou de oposição o garantido obtiver decisão integralmente favorável em 1a instância” através do aditamento do artigo 183.º-B do CPPT pela Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro, Orçamento do Estado para 2017 (DR 28 Dezembro).
BB. O levantamento da garantia, por força da respectiva caducidade, foi determinado em 06.07.2004, no âmbito do procedimento de reclamação graciosa e pelo mesmo não ter sido decidido no prazo de um ano pela AT.
CC. A partir de 2007 deixou de se prever qualquer norma que permitisse o decretamento da caducidade da garantia por o processo de impugnação judicial não ter sido decidido em três anos.
DD. Considerando que o processo de impugnação foi instaurado em 24/09/2004, os ditos três anos só se completariam em 24/09/2007, data esta em que já não existia qualquer previsão que determinasse a caducidade da garantia por este motivo.
EE. Em 2009, ficou expressamente previsto que apenas é possível manter a suspensão do processo de execução quando a reclamação graciosa não é decidida dentro de um ano, nada se prevendo quanto ao processo de impugnação judicial.
FF. Por outro lado, a sentença do Tribunal de 1.ª Instância foi desfavorável aos Recorrentes e apenas foi proferida em 30 de Maio de 2014 (cfr. facto n.º 17).
GG. Ora, qualquer evento suspensivo do processo de execução fiscal deixou de existir desde a instauração da impugnação judicial, uma vez que o que havia determinado a caducidade da garantia era o procedimento de reclamação graciosa, e não o processo de impugnação judicial.
HH. No limite, caso assim não se entenda, esse alegado efeito suspensivo deixou de se verificar desde 1 de Janeiro de 2007, data esta em que foi revogado o artigo 183.º-A do CPPT e deixou de se atribuir qualquer efeito em sede de garantias associado às delongas do processo de impugnação judicial.
II. Assim, o processo de execução fiscal deixou legalmente de estar suspenso desde então, por inexistência de qualquer garantia, ou caducidade de garantia, associada, e conclui-se, portanto, que, a dívida exequenda se encontra prescrita, devendo a sentença ser revogada e substituída por uma outra que julgue procedente a reclamação. (…)»
X

Em sede de contra-alegações, a Fazenda Pública expendeu o seguinte:
«i) A falta de interposição de recurso, do despacho que indeferiu o pedido de suspensão da presente instância, dentro do prazo legalmente estabelecido - 15 dias, uma vez que estamos perante processo de natureza urgente - teve como consequência, o trânsito em julgado do referido despacho e a sua consolidação no ordenamento jurídico, não sendo, por isso, suscetível de recurso.
ii) Não obstante, a caducidade do direito de recurso do referido despacho, os ora recorrentes no âmbito do presente recurso, insurgem-se contra a douta decisão recorrida, alegando que o Tribunal a quo deveria ter ordenado a suspensão da instância, peticionado a revogação da decisão recorrida e a substituição da mesma por outra que ordene a suspensão da instância.
iii) No âmbito dos processos urgentes, o artigo 147.º, n.º 1, do C.P.T.A. dispõe que os recursos são interpostos no prazo de 15 dias e sobem imediatamente, no processo principal ou no apenso em que a decisão tenha sido proferida, quando o processo esteja findo no Tribunal recorrido, ou sobem em separado, no caso contrário.
iv) Assim, o aludido despacho deveria ter sido impugnado, em recurso autónomo, no prazo de 15 dias a contar da sua notificação aos recorrentes, nos termos do citado artigo 147.º, n.º 1.
v) Nestes termos, e porque o despacho em apreço, já transitou em julgado, não tendo sido foi objeto de recurso, não pode agora ser reapreciado por este Venerando Tribunal, pelo que se impõe concluir, pela improcedência da pretensão aduzida pelos ora recorrentes, por manifesta falta de pressupostos legais para a sua recorribilidade.
vi) Acresce referir, que contrariamente à interpretação que é efetuada pelos ora recorrentes, não existe norma legal que permita ao Tribunal fixar efeito suspensivo à reclamação judicial prevista no artigo 276.º e seguintes do CPPT.
vii) Por outro lado, contrariamente ao entendimento preconizado pelos ora recorrentes não estamos perante a existência de uma eventual questão prejudicial, porquanto, independentemente do momento em que os ora recorrentes peticionaram perante a AT a prescrição da dívida exequenda em causa nos presentes autos, a verdade é que a presente reclamação, autuada com o nº 77/20.2BECTB, foi a primeira a ser apreciada e decidida pelo Tribunal a quo, sendo que as reclamações autuadas com os nºs 78/20. 2BECTB e 121/20.3BECTB, encontram-se a aguardar a prolação de sentença, a qual se prevê para breve, dada a natureza urgente dos processos em causa.
viii) Tendo o Tribunal a quo proferido decisão sobre a questão da prescrição da dívida exequenda - que também constitui objeto dos autos de reclamação com os nºs 78/20.2BECTB e 121/20.3BECTB - a questão da suspensão da presente instância carece de qualquer efeito útil nos presentes autos, porquanto, já existe decisão sobre a alegada questão prejudicial que os ora recorrentes pretendem ver decidida, ou seja, sobre a prescrição da dívida exequenda, pelo que, também por esta via, deve improceder a pretensão dos ora recorrentes.
ix) Ainda que assim não se entenda, sempre se dirá, que contrariamente ao alegado pelos recorrentes, a questão da prescrição da dívida exequenda suscitada pelos ora recorrentes no âmbito dos presentes autos e também nos autos de reclamação nº 78/20.2BECT e 121/20.3BECTB, não consubstancia uma questão prejudicial, mas sim uma exceção dilatória de litispendência.
x) Com efeito, para além da presente reclamação, os ora recorrentes apresentaram perante o Tribunal a quo mais duas reclamações de atos do órgão de execução fiscal, que foram autuadas com a identificação 78/20.2BECTB e 121/20.3BECTB.
xi) Conforme decorre das reclamações em causa - veja-se reclamação 77/20.2BECTB, 78/20.2BECTB e 121/20.3BECTB - em todas elas, os sujeitos processuais são os mesmos, o pedido é o mesmo e a causa de pedir é a mesma.
xii) Em todas as reclamações judiciais em apreço - veja-se 77/20.2BECTB, 78/20.2BECTB e 121/20.3BECTB - os ora recorrentes peticionam a prescrição da dívida exequenda que se encontra a ser objeto de cobrança coerciva no âmbito do processo de no âmbito do processo de execução fiscal nº ................
xiii) Temos assim, que em todas as reclamações judiciais em apreço - veja-se 77/20.2BECTB, 78/20.2BECTB e 121/20.3BECTB, que se encontram a correr termos junto do Tribunal a quo - a questão central que cumpre apreciar e decidir, prende-se com a prescrição da dívida exequenda, que se encontra a ser objeto de cobrança coerciva no âmbito do processo de execução fiscal nº ..............., instaurado no serviço de finanças de Seia, contra os ora recorrentes, sendo que, em todas as reclamações se verifica uma identidade de sujeitos processuais, causa de pedir e do pedido.
xiv) Nos termos da alínea i) do nº 1 do artigo 577º do CPC, a litispendência constitui uma exceção dilatória, que nos termos do nº 2 do artigo 576º do CPC, obsta ao conhecimento do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância.
xv) Perante este cenário, e atentas as repercussões jurídicas que a litispendência poderá acarretar no âmbito das reclamações com a identificação 78/20.2BECTB e 121/20.3BECTB, a Fazenda Pública invocou esta exceção dilatória, no âmbito daqueles autos de reclamação que se encontram a aguardar decisão do Tribunal a quo (TAF de Castelo Branco).
xvi) Termos em que, se impõe concluir pela inexistência de questão prejudicial entre estes autos e os autos de reclamação nº 121/20.3BECT, devendo, em consequência, improceder a pretensão dos ora recorrentes, fundada na suspensão da instância.
xvii) Nos termos do art 49º n.º 3 do LGT, desde 13-01-2004, o prazo de prescrição legal suspendeu-se, devido à suspensão do processo de execução fiscal, em virtude da pendência de reclamação acompanhada de prestação de garantia (artigo 169º do CPPT e 49 n.º 3 da LGT), tendo-se mantido a suspensão até 03-09-2019 (data do trânsito em julgado da decisão da impugnação judicial da liquidação em causa).
xviii) Durante o período de suspensão do processo de execução fiscal, o credor tributário ficou impossibilitado de cobrar a divida, não devendo, como tal, correr o prazo de prescrição.
xix) Assim, apenas, em 03-09-2019, com o trânsito em julgado da decisão definitiva de improcedência da impugnação judicial, foi retomada a contagem do prazo de prescrição que se encontrava suspenso desde 13-01-2004.
xx) Pese embora tenha sido declarada a caducidade da garantia prestada pelos ora recorrentes, nos termos do art 183º A do CPPT, não se extinguiu o efeito suspensivo da execução, tendo permanecido suspenso o prazo de prescrição (art.49.º n.º 3 da LGT na redação vigente à data) até a decisão final da reclamação graciosa e da subsequente impugnação judicial.
xxi) Isto porque, o artigo 183.º A, aditado ao CPPT pela Lei n.º 15/2001, de 5 de junho, passou a permitir aos interessados obter a declaração de caducidade da garantia prestada pelo contribuinte ou constituída pela Administração Tributária, sem perder o efeito suspensivo da execução, se a reclamação graciosa em que fosse discutida a legalidade da liquidação não fosse decidida no prazo de um ano.
xxii) Também LOPES DE SOUSA, em anotação ao referido preceito, entende que nas situações “(...)em que os processos demorassem mais do que o previsto neste artigo, o processo de execução fiscal continuaria suspenso, mesmo sem garantia até ao momento em que estaria se a garantia se mantivesse, que é, como se refere no art. 169.º, n.º 1, do CPPT, o da «decisão do pleito»” (JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6a ed., Áreas Editora, 2011, volume III, anotação 3 ao art. 183.º-A, pág. 342.).
xxiii) Também neste sentido, a jurisprudência tem considerado que, caducada a garantia, o processo de execução fiscal continuava suspenso, até a momento em que estaria se a garantia se mantivesse, ou seja, até à decisão do pleito, não sendo devida qualquer outra garantia para obter o referido efeito suspensivo. (Cf. neste sentido Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 06.02.2013, recurso 1479/12 e de 26.04.2012, recurso 364/12, e de 18.09.2013, recurso 1332/13, no Acórdão do STA no âmbito do Proc. n.º 0935/16 de 10-12-2016 in www.dgsi.pt.).
xxiv) Mesmo que se considere que o procedimento de reclamação graciosa esteve parado por mais de um ano, não podemos esquecer que com a citação dos ora recorrentes em 14-02-2003, ocorreu nova causa interruptiva sendo que, como se pode verificar da tramitação antes descrita, a execução fiscal desde a sua instauração (11/02/2003) até á respetiva suspensão (13/01/2004) não esteve parado por período superior a um ano.
xxv) E do artigo 49.º da LGT (na redação anterior à Lei 53-A/2006) não decorre que não se dê relevância a todos os factos interruptivos da prescrição ainda que alguns deles venham a ocorrer durante a produção de efeitos de outros.
xxvi) Como defende Jorge Lopes de Sousa, na obra supra citada, numa situação similar à dos presentes autos, ou seja, a ocorrência de uma nova causa de interrupção (citação) antes de 1 de Janeiro de 2007, enquanto uma anterior (procedimento de reclamação graciosa) ainda está a produzir os seus efeitos, por o processo não ter estado parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte e em que o primeiro processo (reclamação graciosa) vem a parar por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, quando o segundo (PEF) já estava pendente, a instauração do segundo processo tem potencialidade para só por si eliminar o período que decorreu anteriormente e obstar ao decurso da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que lhe puser termo ”. (nosso itálico e bold).
xxvi) Esta é também a orientação mais recente da jurisprudência do STA. (Acórdãos de 24 de Outubro de 2010-P0720/10 e de 2013.06.05-P 0903/13, disponíveis no sitio da Internet www.dgsi.pt).
xxvii) Por outro lado, com a efetivação da penhora/prestação de garantia e subsequente despacho de suspensão do PEF proferido pelo Chefe do SF, em 13-01-2004, ocorreu uma causa suspensiva do prazo de prescrição do tributo exequendo, prazo que só recomeçou a contar a partir do trânsito em julgado da decisão que veio a pôr termo à impugnação judicial, nos termos do disposto no artigo 49.º/3 da LGT.
xxviii) Donde decorre que, além dos citados factos interruptivos da prescrição (instauração da reclamação graciosa e citação), ocorreu também um facto suspensivo (previsto no art. 49.º n.º 3 na redação da Lei dada pela Lei n.º 100/99 de 26/06 e 169.º do CPPT), que originou a paragem do decurso do prazo de prescrição, desde 13-01-2004 até 03-09-2019.
xxix) Face ao exposto, impõe-se concluir que a divida exequenda ainda não se encontra prescrita, devendo, em consequência, improceder a pretensão dos ora recorrentes e manter-se a douta decisão recorrida no ordenamento jurídico, com todas as legais consequências.
xxx) Acresce referir, que os ora recorrentes não sindicam no presente recurso o segmento da douta decisão recorrida que apreciou e decidiu a questão relativa à alegada ilegalidade da penhora do veículo com a matrícula………….., que foi suscitada pelos ora recorrentes no âmbito da sua PI, tenho a douta decisão recorrida concluído pela legalidade da penhora efetuada sobre a referida viatura.
xxxi) E uma vez que tal segmento da douta decisão recorrida não integra o objeto do presente recurso, impõe-se concluir, que os ora recorrentes se conformam e aceitam a douta decisão recorrida, com todas as legais consequências.
xxxii) Do mesmo modo, se impõe concluir que os ora recorrentes se conformaram e aceitaram o segmento da douta decisão recorrida que apreciou e decidiu a questão relativa à alegada ilegalidade da penhora das contas bancárias nº ............... e nº ..............., porquanto, tal questão não é sindicada pelos ora recorrentes no âmbito do presente recurso. // Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser negado provimento ao presente recurso e em consequência manter-se a decisão recorrida.»
X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, foi regularmente notificado.
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Dispensados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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II- Fundamentação.
A sentença recorrida assentou na seguinte fundamentação fáctica e jurídica:
«1. Em 31-01-2003, os Reclamantes apresentaram reclamação graciosa contra a liquidação adicional de IRS n.º ..............., referente ao ano de 1997, no valor de € 386.471,19 à qual foi atribuído o n.º ............... (cfr. fls. 202 a 212 e 268 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
2. Em 11-02-2003, foi pelo Serviço de Finanças de Seia instaurado em nome dos Reclamantes o processo de execução fiscal n.º ..............., para cobrança coerciva de dívida proveniente da liquidação adicional de IRS n.º ............... de 1997 e respetivos juros compensatórios, no valor de € 386.471,19, tendo por base a certidão de dívida n.º 2003/6692 (cfr. fls. 48/frente e verso dos autos e fls. 1 e 2 do processo de execução fiscal - PEF - apenso aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
3. Em 14-02-2003, foi entregue aos Reclamantes citação para o processo de execução fiscal identificado no número antecedente (cfr. fls. 49/frente e verso dos autos e fls. 3/frente e verso do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
4. Em 27-02-2003 os Reclamantes apresentaram requerimento junto do Serviço de Finanças de Seia a dar conhecimento da apresentação de reclamação graciosa contra a liquidação de IRS identificada em 1), solicitando que na impossibilidade de prestarem garantia por qualquer dos meios previstos no artigo 199.º do CPPT lhe fossem penhorados o prédio urbano, sob o artigo ............... da freguesia de Seia e o prédio rústico, sob o artigo ..............., da mesma freguesia com vista à suspensão da execução (cfr. fls. 50 dos autos e fls. 4 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
5. Em 05-03-2003 foi pelo Serviço de Finanças de Seia elaborado auto de penhora dos prédios identificados no número antecedente (cfr. fls. 51 a 61 dos autos e fls. 6 a 18 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
6. Atendendo a que o valor atribuído aos prédios identificados em 4) se revelou insuficiente para garantir a divida exequenda e acrescidos, em 15-05-2003 foi entregue aos Reclamantes notificação para prestarem garantia adicional (cfr. fls. 62 a 63/verso dos autos e fls. 20 a 22/verso do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
7. Em 26-05-2003, em resposta à notificação identificada no número antecedente, os Reclamantes apresentaram junto do Serviço de Finanças de Seia requerimento a indicar à penhora os prédios urbanos, inscritos sob os artigos ............... frações A e BM da freguesia e concelho de Albufeira (cfr. fls. 64 a 67 dos autos e fls. 23 a 29 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
8. Em 21-08-2003, foi efectuada a penhora dos bens identificados no número antecedente tendo sido devolvida a carta precatória ao Serviço de Finanças de Seia em 29-12-2003 (cfr. fls. 69 a 71 dos autos e fls. 33 a 37 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
9. Em 13-01-2004, foi pelo Chefe do Serviço de Finanças de Seia proferido despacho a determinar a suspensão do processo de execução fiscal identificado em 2) até a decisão da reclamação graciosa (cfr. fls. 73/verso dos autos e fls. 41 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
10. O despacho identificado no número antecedente foi comunicado aos Reclamantes através do ofício n.º 259, remetido em 14-01-2004, por carta registada sob o registo postal n.º ………………PT (cfr. fls. 74/frente e verso dos autos e fls. 43/frente e verso do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
11. Em 31-05-2004, os Reclamantes apresentaram junto do Serviço de Finanças de Seia requerimento a solicitar a declaração da caducidade da garantia prestada, por se encontrar ultrapassado o prazo de um ano desde a apresentação da reclamação graciosa da liquidação de IRS de 1997, que deu origem a divida exequenda (cfr. fls. 75/verso dos autos e fls. 44 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
12. Por despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Seia, em 06-07-2004, foi declarada a caducidade das garantias prestadas pelos Reclamantes, com o consequente levantamento das penhoras (cfr. fls. 77 e 78 dos autos e fls. 47 e 48 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
13. Em 26-07-2004 foi elaborado pelo Director de Finanças da Guarda, projecto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada, identificada em 1) (cfr. fls. 287 a 291 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
14. Em 02-08-2004 foi entregue aos Reclamantes notificação para se pronunciarem sobre o projecto de decisão identificado no número antecedente (cfr. fls. 292/frente e verso dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
15. Em 09-09-2004, através do ofício nº 5330 datado de 08-09-2004, da Direção de Finanças da Guarda, foi comunicado aos Reclamantes a decisão de indeferimento da reclamação graciosa (cfr. fls. 293/verso e 294 dos autos e fls. 47 e 48 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
16. Em 06-10-2004, os Reclamantes apresentaram junto do Serviço de Finanças de Seia requerimento a informar a apresentação de impugnação judicial em 24-09-2004 junto do TAF de Castelo Branco, contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, à qual coube o n.º 499/04.6BECTB (cfr. fls. 85 a 97 dos autos e fls. 56 a 80 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
17. Por sentença proferida em 30-05-2014 a impugnação judicial identificada no número antecedente foi julgada improcedente (cfr. fls. 295 a 397 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
18. Da decisão identificada no número antecedente, os Reclamantes interpuseram recurso para o TCA Sul, ao qual foi atribuído o n.º 8096/14 e que, por acórdão proferido em 04-06-2015 negou provimento ao recurso (cfr. fls. 320/verso dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
19. Do acórdão identificado no número anterior foi interposto pelos Reclamantes recurso de revista excepcional para o Supremo Tribunal Administrativo, o qual, em 03-07-2019, proferiu acórdão no sentido de negar provimento à revista e manter o acórdão recorrido, o qual transitou em julgado 03-09-2019 (cfr. fls. 320 a 329 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
20. Em 08-11-2019 foi remetido aos Reclamantes o ofício n.º 2666, para, por força do trânsito em julgado da sentença, procederem ao pagamento da dívida, sob pena de o processo de execução fiscal prosseguir os seus termos, nomeadamente para penhora de bens (cfr. fls. 86/frente e verso do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
21. Em 22-11-2019 o Serviço de Finanças de Seia procedeu à penhora dos veículos automóveis com as matriculas………, ………, ………., ………., comunicada aos Reclamantes em 09-12-2019 (cfr. fls. 11/verso a 13 e 17 e 18 dos autos e fls. 91 a 117 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
22. Em 22-11-2019 o Serviço de Finanças de Seia procedeu à penhora dos saldos bancários junto do B............... referente às contas bancárias n.º ............... e n.º ..............., a qual foi comunicada em 16-12-2019 (cfr. fls. 13/verso, 18/verso e 22 dos autos e fls. 91 a 117 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
23. Em 17-12-2019 os Reclamantes apresentaram junto do Serviço de Finanças de Seia requerimento a invocar a prescrição da dívida exequenda (cfr. fls. 117 a 120 dos autos e fls. 118 a 120 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
24. A presente Reclamação foi remetida por correio electrónico ao Serviço de Finanças de Seia em 17-12-2019, tendo dado entrada neste Tribunal em 04-02-2020 (cfr. fls. 2 e 5 dos autos).
25. Por despacho proferido pela Directora de Finanças da Guarda foi indeferido o pedido de reconhecimento da prescrição formulado pelos Reclamantes e identificado em 23) (cfr. fls. 229 a 233 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
26. O despacho identificado no número antecedente foi comunicado aos Reclamantes através do ofício n.º 366, remetido em 29-01-2020 (cfr. fls. 234 a 235/verso do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
27. O Reclamante M................ não se encontra colectado em qualquer actividade para efeitos fiscais (cfr. fls. 334 a 338 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
B) FACTOS NÃO PROVADOS
Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir, designadamente, não está provado o seguinte: // 1. Não se provou que o veículo com a matrícula 86-QI-88 é o único veículo que o Reclamante M................ dispõe para se deslocar no âmbito da sua actividade profissional. // 2. Não se provou que os saldos das contas bancárias n.º ............... e n.º ............... existentes no B............... S.A. são na totalidade propriedade da mãe do Reclamante M.................
Quanto aos factos provados, a convicção do Tribunal baseou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente nas informações oficiais e documentos constantes dos autos juntos pelas partes bem como do processo de execução fiscal apenso, não impugnados, bem como na posição assumida pelas partes, conforme indicado em cada número do probatório, tudo de acordo com o princípio da livre apreciação da prova.
Quanto aos factos não provados, a convicção do tribunal fundou-se na ausência total de qualquer prova pelos Reclamantes. // No que diz respeito ao facto não provado n.º 1, os Reclamantes não concretizaram em que medida o veículo é utilizado pelo Reclamante M.............. como instrumento de trabalho, nomeadamente não concretizaram, nada alegando nesse sentido, qual a actividade desenvolvida, onde a mesma se localiza e de que forma o veículo é utilizado no exercício da actividade profissional, não tendo efectuado qualquer prova nesse sentido. // Relativamente ao facto não provado n.º 2, os Reclamantes também não fizeram qualquer tipo de prova, documental ou outra, quanto à alegada propriedade exclusiva das contas bancárias pela mãe do Reclamante M...............»
X
Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, aditam-se os elementos seguintes:
28. Em 04.02.2020, os recorrentes deduziram reclamação judicial, no TAF de Castelo Branco, invocando a prescrição da dívida exequenda, contra o acto de penhora do prédio urbano, inscrito na matriz sob o n.º……., o qual correu termos com o n.º 78/20.0BECTB e no qual foi proferida sentença, em 11.05.2020, no sentido da absolvição da instância, por litispendência em relação aos presentes autos – SITAF.
29. No processo n.º 78/20.0BECTB, a Fazenda Pública foi notificada para responder em 06.02.2020.
30. Em 22.02.2020, os recorrentes deduziram reclamação judicial, no TAF de Castelo Branco, contra a decisão do Chefe do Serviço de Finanças que não declarou a prescrição da dívida exequenda, o qual correu termos com o n.º 121/20.3BECTB, no qual foi proferida sentença, em 29.04.2020, no sentido da absolvição da instância, por litispendência em relação aos presentes autos – SITAF.
31. No processo n.º 121/20.3BECTB, a Fazenda Pública foi notificada para responder em 27.02.2020.
32. Em 27.02.2020, os recorrentes dirigiram ao tribunal recorrido requerimento, por meio do qual solicitavam a suspensão destes autos até ser proferida decisão transitada em julgado referente à reclamação do acto do órgão de execução apresentada a 13.02.2020. Alegam que o fundamento é a prescrição da dívida exequenda – fls. 341/343.
33. Em 04.03.2020, o tribunal recorrido proferiu o despacho seguinte:
«A fls. 1008 dos autos (SITAF) vieram os Reclamantes requerer a suspensão do processo de execução fiscal, com fundamento na apresentação da presente reclamação aos actos de penhora efectuados no processo de execução fiscal n.º ..............., bem como na apresentação de reclamação, em 13-02-2020, contra o despacho que indeferiu o pedido de reconhecimento de prescrição da dívida exequenda. // Ora, é certo, como tem entendido a jurisprudência, embora desde a nova redacção dada ao artigo 278.s do CPPT (pela Lei n.- 82-B/2014, de 31 de Dezembro) e à alínea n) do n.5 1 do artigo 975 do CPPT (pela Lei n.e 66-B/2012), a reclamação das decisões do órgão da execução fiscal, com subida imediata, não tenha efeito suspensivo da execução no seu todo, tal não significa que o órgão de execução fiscal possa praticar actos de execução da decisão reclamada, pois esta fica suspensa com a reclamação com subida imediata. Sendo esse efeito suspensivo imprescindível para assegurar a tutela judicial efectiva dos direitos ou interesses do reclamante afectados por actos da Administração Tributária, nos termos dos artigos 204.º n.º 1; e 268 n.º 4 da Constituição da República Portuguesa (CRP) (cfr. entre outros, acórdão do STA de 20-06-2018, proc. n.º 0480/18, disponível em www.dgsi.pt). // Contudo, não compete ao Tribunal ordenar a suspensão do processo de execução fiscal, mas sim ao órgão de execução fiscal, devendo por isso tal pedido de suspensão ser efectuado junto do órgão de execução fiscal e, de uma eventual decisão desfavorável, caberá reclamação nos termos do artigo 276.º e seguintes do CPPT. Além disso, a apreciação da prescrição já irá ser efectuada na presente Reclamação, pois, para além da mesma ser de conhecimento oficioso pelo Tribunal, foi invocada pelos Reclamante. // Em face do exposto, indefiro o requerimento de fls. 1008 dos autos (SITAF). // Notifique com a sentença».
34. Nos presentes autos, a Fazenda Pública foi notificada para responder em 06.02.2020.
X
2.2. Direito
2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre os alegados erros de julgamento seguintes:
i) Erro de julgamento, dado que a sentença devia ter deferido o pedido de suspensão da instância, deduzido na sequência da pendência de processos judiciais nos quais se discute a prescrição da dívida exequenda.
ii) Erro de julgamento, dado que a sentença devia ter declarado a prescrição da dívida exequenda.
2.2.2. No que se reporta ao fundamento do recurso referido em primeiro lugar, os recorrentes consideram que a sentença devia ter deferido o pedido de suspensão da instância, dado que está pendente reclamação judicial de acto do órgão de execução fiscal que indeferiu o pedido de declaração da prescrição da dívida exequenda. Por seu turno, a recorrida argumenta no sentido da improcedência do presente esteio de recurso.
Apreciação.
Nos presentes autos, está em causa o pedido de declaração de ilegalidade de penhoras realizadas, com base na invocação da prescrição da dívida exequenda. «Invocada que seja a prescrição da dívida exequenda a reclamação da decisão do OEF que a considerou não verificada deve ser conhecida de imediato sob pena de tal reclamação perder toda a sua utilidade» [Acórdão do STA, de 04.05.2016, P. 0304/16]. O artigo 278.º/6, do CPPT estabelece que a reclamação referida no seu n.º 3 [com subida imediata] suspende os efeitos do ato reclamado, seguindo as regras dos processos urgentes. O despacho em apreço - proferido pelo tribunal recorrido que rejeitou o pedido de suspensão da presente instância (n.º 31 do probatório) - podia ter sido impugnado através da interposição de recurso jurisdicional, que o elegesse como seu objecto, no prazo de 15 dias a contar da notificação do mesmo (artigo 283.º do CPPT), o que não sucedeu, no caso, pelo que o despacho mencionado já transitou em julgado.
Suscita-se, todavia, a questão de saber se a questão da prescrição da dívida exequenda, invocada nas três reclamações judiciais pendentes pode ser tratada como questão prejudicial ou configura uma situação de excepção dilatória de litispendência. A excepção dilatória da litispendência tem na sua base a ideia da proibição da repetição e da proibição de contradição.
Do probatório resultam os elementos seguintes:
i) Em 04.02.2020, os recorrentes deduziram reclamação judicial, no TAF de Castelo Branco, invocando a prescrição da dívida exequenda, contra o acto de penhora do prédio urbano, inscrito na matriz sob o n.º .........., o qual correu termos com o n.º 78/20.0BECTB, no qual foi proferida sentença, em 11.05.2020, no sentido da absolvição da instância, por litispendência em relação aos presentes autos.
ii) Em 22.02.2020, os recorrentes deduziram reclamação judicial, no TAF de Castelo Branco, contra a decisão do Chefe do Serviço de Finanças que não declarou a prescrição da dívida exequenda, o qual correu termos com o n.º 121/20.3BECTB, no qual foi proferida sentença, em 29.04.2020, no sentido da absolvição da instância, por litispendência em relação aos presentes autos.
iii) A presente reclamação foi deduzida em 18.12.2019.
Recorde-se que «[r]epete-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, pedido e à causa de pedir» - artigo 581.º/1, do CPC. «Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica» (artigo 581.º/2, do CPC). «Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico» (artigo 581.º/3, do CPC). E existe «identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico» (artigo 581.º/4, do CPC).
No caso, nas três reclamações judiciais instaurados, são impugnados actos do órgão de execução, com base na alegação, entre o mais, da prescrição da dívida exequenda, pelo que ocorre a tripla identidade pressuposto da verificação da excepção dilatória da litispendência, dado que as partes, o pedido e causa de pedir são idênticos ou sobrepõem-se. Para além da invocação da prescrição da dívida exequenda, comum a todas as reclamações, está o pedido de anulação de acto praticado pelo órgão de execução fiscal, na mesma execução fiscal, com base na alegação da prescrição da dívida exequenda, pedido que é comum a todas as reclamações judiciais em presença.
Não existe, pois, mera questão prejudicial (artigos 92.º do CPC), dado que a invocação da prescrição da dívida exequenda constitui o núcleo essencial da articulação fáctico-jurídico que sustenta cada uma das pretensões em referência (n.ºs 28 e 30, do probatório). O que implica que o caso julgado que se forme em torno do mérito de cada uma das pretensões em liça assume efeito preclusivo sobre as demais, algo a que é alheio o efeito associado à decisão que proceda ao conhecimento incidental próprio da questão prejudicial (artigo 91.º/2 do CPC).
A data da instauração dos presentes autos (18.12.2019), bem como a data da notificação da impugnada para responder nos autos (06.02.2020), tiveram lugar em momento anterior em face das datas dos actos correspondentes ocorridos nas demais reclamações judiciais (n.ºs 28 a 31). Nos termos do artigo 582.º do CPC, tal determina que a excepção dilatória da litispendência não pode ser invocada com sucesso nos presentes autos, por não corresponder, nesta sede, a verdadeira excepção (artigo 582.º do CPC). Pelo que não poderia a mesma ser fundamento de suspensão da instância. Como se decidiu na instância.
Motivo porque se impõe rejeitar o presente fundamento do recurso.
2.2.3. Os recorrentes assacam à sentença sob recurso erro de julgamento, no que respeita ao cômputo do prazo de prescrição da dívida exequenda. Pedem a declaração de prescrição da mesma.
No que respeita ao cômputo da prescrição da dívida exequenda, as questões suscitadas são as seguintes:
a) Estando em causa dívida de IRS de 1997, qual o prazo de prescrição concretamente aplicável?
b) Qual (ou quais) as causas interruptivas do prazo de prescrição a considerar?
c) Qual (ou quais) as causas suspensivas do prazo de prescrição a considerar?
d) Qual o efeito da declaração de caducidade de garantia nos eventuais factos suspensivos da prescrição?
2.2.3.1. No que respeita à questão mencionada em a), cumpre referir o seguinte.
Está em causa a prescrição de dívida de IRS, relativa ao ano de 1997. Tratando-se de dívida constituída na vigência do CPT é este o regime de prescrição aplicável (artigo 34.º do CPT). Existindo sucessão de leis (artigo 34.º/1, do CPT e artigo 48.º/1, da LGT), com redução de prazos, a questão que se suscita reside em determinar o prazo prescricional que correu até à data da entrada em vigor da Lei nova – LGT – 01.01.99, com vista a determinar qual o prazo de prescrição aplicável (artigo 297.º/1, do CC). Estatui o artigo 297.º, n.º 1, do CC que: «[a] lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar».
No cotejo entre o prazo de prescrição do CPT (dez anos) e o prazo de prescrição da LGT (oito anos), o prazo de prescrição, em abstrato, mais curto é o da LGT. Recorde-se que, em concreto, o prazo de dez anos do CPT, em 01.01.1999, tem um ano (faltam nove anos para o mesmo se completar), pelo que o prazo da LGT, de oito anos, é, em concreto, o mais curto, sendo este o aplicável.
No caso em exame, aplica-se o prazo de prescrição de oito anos, previsto na LGT, a contar da data de entrada em vigor deste diploma, ou seja, a partir de 1 de Janeiro de 1999. Como se refere na sentença recorrida, «tendo em conta que o início do prazo prescricional para a dívida exequenda ocorreu em 01-01-1999, a prescrição só se poderia efectivar, na ausência de quaisquer factos interruptivos ou suspensivos, decorridos 8 anos, isto é, em 31-12-2006».
2.2.3.2. No que respeita à questão suscitada em b), cumpre referir o seguinte.
Em 31.01.2003, ocorreu a interrupção da prescrição determinada pela instauração da reclamação graciosa (n.º 1 do probatório e artigo 49.º/1, da LGT). «A interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para a prescrição de todo o tempo decorrido anteriormente, sendo efeito próprio da interrupção, presente em todas as situações (artigo 326.º, n.º 1, do CC)»(1). Suscita-se a questão de saber se a interrupção em causa obsta ao decurso do prazo de prescrição. Bem assim a questão da relevância da citação dos reclamantes em 14.02.2003 (n.º 3 do probatório).
A este propósito, constitui jurisprudência fiscal assente a de que:
i) «As causas de interrupção da prescrição que tenham ocorrido antes da alteração ao n.º 3 do artigo 49.º da LGT, introduzida pela Lei 53-A/2006, produzem os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência: eliminam o período de tempo anterior à sua ocorrência e obstam ao decurso do prazo de prescrição, enquanto o respetivo processo estiver pendente ou não estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.
ii) Ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição antes da entrada em vigor da actual redacção do n.º 3 do artigo 49.º da LGT (introduzida pelo art.º 89.º da Lei 53-A/2006, de 29/12), devem todas elas ser consideradas, desde que ocorram após a cessação do efeito interruptivo das anteriores»(2).
Em síntese, a instauração da reclamação graciosa interrompe a prescrição, impedindo o decurso do prazo. A partir 01.02.2004, a reclamação esteve parada por facto não imputável ao contribuinte, pelo período superior a um ano, pelo que a interrupção da prescrição causada pela instauração da reclamação degrada-se em suspensão em 01.02.2004 (artigo 49.º/2, da LGT).
Constitui também jurisprudência fiscal assente a de que:
«Verificando-se uma sucessão cronológica de causas de interrupção da prescrição antes de 1 de Janeiro de 2007 (data em que entrou em vigor a redacção dada ao artigo 49.º da LGT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro), cada uma delas tem a virtualidade de interromper o prazo prescricional, ainda que ocorra quando a anterior ainda está a produzir efeitos. // Sempre no pressuposto de que os factos que constituem causa de interrupção ocorreram antes de 1 de Janeiro de 2007, a citação para a execução fiscal, ainda que efectuada quando se encontrava pendente reclamação graciosa, produz os seus efeitos logo que cessarem os decorrentes da reclamação graciosa. // Esses efeitos da causa de interrupção são: a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do artigo 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do artigo 327.º do CC)»(3).
No caso, em 14.02.2003, os recorrentes foram citados na execução (n.º 3 do probatório).
A este propósito, constitui jurisprudência fiscal assente a de que «(…) após a alteração introduzida no art.º 49º da LGT pela Lei nº 53-A/2006, de 29/12, esse regime desapareceu, deixando de haver norma a definir os efeitos dos actos interruptivos da prescrição relativamente a obrigações tributárias. Razão por que não há como deixar de aplicar as normas contidas no Código Civil, onde o artigo 326º estabelece que «a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos nºs 1 e 3 do artigo seguinte» e o artigo seguinte dispõe que «1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou ato equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo. // Razão por que, actualmente, o acto interruptivo da citação para a execução fiscal tem efeito duradouro»(4). De onde decorre que o efeito interruptivo da prescrição imposto pela citação apenas cessa com o trânsito em julgado da decisão que põe termo ao processo (artigo 327.º/1, do CC), o que, nos presentes autos não sucede, desde logo, dada a pendência da presente reclamação.
Em face do exposto, a dívida exequenda não se mostra prescrita.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não incorreu em erro, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.3.4. Por referência à questão suscitada em c), cumpre referir o seguinte.
Na sequência da penhora de bens dos reclamantes, em 13.01.2004, o órgão de execução fiscal [OEF] determinou a suspensão da execução (n.º 9 do probatório). A suspensão da execução, em virtude de instauração de meio impugnatório, com prestação de garantia idónea, determina a suspensão do prazo de prescrição (artigo 49.º/2, da LGT). «A paragem do processo de execução fiscal por motivo de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial ocorre nos casos em que o uso desses meios impugnatórios é acompanhado de prestação de garantia ou penhora de bens suficientes para pagamento da dívida exequenda e do acrescido (art.º 169.º, n.º 1, do CPPT)»(5).
No caso, «o processo esteve suspenso entre 13-01-2004 e 03-09-2019, quando transitou em julgado em julgado o Acórdão do STA que julgou improcedente a impugnação judicial que os Reclamantes apresentaram na sequência do indeferimento da reclamação graciosa da legalidade da liquidação de IRS de 1997 (cfr. n.ºs 16 a 19 do probatório)»(6).
A propósito da cumulação entre causas interruptivas e causas suspensivas da prescrição, cumpre referir que, «[e]xistindo uma causa de suspensão autónoma em relação ao facto com efeito interruptivo, ela produzirá os seus próprios efeitos independentemente dos produzidos pelo facto interruptivo, pelo que poderá obstar ao decurso do prazo de prescrição em situações em que não é produzido esse efeito pelo facto interruptivo. Se tanto este facto como o facto interruptivo eliminarem a relevância do mesmo período de tempo para a prescrição, será irrelevante a existência de causa de suspensão, pois esse período já não será contado para a prescrição por força do acto interruptivo. Mas, se houver algum período do prazo que não é eliminado pelo facto interruptivo e é pelo facto suspensivo, cumular-se-ão os efeitos dos dois factos»(7).
Pelo que, em face da causa suspensiva do prazo de prescrição mencionado, correspondente à dedução de meio impugnatório, gracioso e depois contencioso, associado à garantia idónea da dívida exequenda, com efeito suspensivo da execução, a dívida exequenda não se mostra prescrita.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não incorreu em erro, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.3.5. Por referência à questão referida em d), cumpre referir o seguinte.
A sentença recorrida considerou que «o processo esteve suspenso entre 13-01-2004 e 03-09-2019, quando transitou em julgado o Acórdão do STA que julgou improcedente a impugnação judicial que os Reclamantes apresentaram na sequência do indeferimento da reclamação graciosa da legalidade da liquidação de IRS de 1997 (cfr. n.ºs 16 a 19 do probatório)». Mais se consignou que «foi declarada a caducidade da garantia em 06-07-2004, contudo, esse facto não retira o efeito suspensivo ao processo de execução fiscal, que se manteve mesmo com a caducidade da garantia (cfr n.ºs 11 e 12 do probatório)». Os recorrentes censuram o veredicto que fez vencimento na instância, assacando-lhe erro de julgamento.
Apreciação. Nos termos do artigo 183.º-A, n.º 1, do CPPT (“Caducidade da garantia”), caduca a garantia prestada para suspender a execução em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição se a reclamação graciosa não for decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição ou se, na impugnação judicial ou na oposição, não tiver sido proferida decisão em 1.ª instância no prazo de três anos a contar da data da sua apresentação (Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro]). O preceito foi revogado pelo artigo 94.º da Lei n.º 53-A/2006, de 29/12. Com a Lei n.º 40/2008, de 12.08, o preceito do artigo 183.º-A, n.º 1, do CPPT (“Caducidade da garantia em caso de reclamação graciosa”) passou a ter a seguinte redação: «A garantia prestada para suspender o processo de execução fiscal caduca se a reclamação graciosa não estiver decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição».
Na anotação ao preceito em referência, Jorge Lopes de Sousa refere que «[n]estas situações em que os processos demorassem mais do que o previsto neste artigo, o processo de execução fiscal continuaria suspenso, mesmo sem garantia, até ao momento em que estaria se a garantia se mantivesse, que é, como se refere no art.º 169.º, n.º 1, do CPPT, o da «decisão do pleito». Deverá entender-se que o pleito fica decidido, no caso de impugnação administrativa, quando se formar o chamado caso decidido ou resolvido, e, no caso de processo judicial, quando ocorrer o trânsito em julgado da decisão judicial»(8).
Da jurisprudência fiscal colhe-se o ensinamento de que «[o] art. 183.º-A, aditado ao CPPT pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, passou a permitir aos interessados obter a declaração de caducidade da garantia prestada pelo contribuinte ou constituída pela Administração Tributária, sem perder o efeito suspensivo da execução, se a reclamação graciosa em que fosse discutida a legalidade da liquidação não fosse decidida no prazo de um ano ou a impugnação judicial em que fosse discutida essa legalidade não estivesse decidida, em 1.ª instância, no prazo de dois anos (ulteriormente alterado para três anos pela Lei n.º 30-B/2002, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2003), a contar da sua apresentação, prazos que eram acrescidos de seis meses caso houvesse lugar à produção de prova pericial. // Caducada a garantia o processo de execução fiscal continuava suspenso, mesmo sem garantia, até ao momento em que estaria se a garantia se mantivesse, ou seja, até à decisão do pleito. // Da norma contida no nº 3 do art. 49º da LGT, conjugada com a norma legal que define o regime da suspensão da execução fiscal (art. 169º do CPPT), resulta que o efeito suspensivo da execução fiscal não é consequência directa e imediata da instauração da reclamação, impugnação ou recurso, nem é consequência directa e imediata da prestação de garantia; o que determina o efeito suspensivo da execução – e, por consequência, o efeito suspensivo da prescrição – é a instauração de reclamação, impugnação ou recurso, quando acompanhada ou seguida da constituição ou prestação de garantia idónea, da autorização da sua dispensa, ou da penhora de bens que garantam o pagamento integral da quantia exequenda e do acrescido»(9).
No caso em exame, em 13.01.2004, foi determinada a suspensão da execução fiscal(10), com base na instauração da reclamação graciosa (31.01.2003) e prestação de garantia idónea (21.08.2003)(11). De onde se extrai que o efeito suspensivo da instauração da reclamação, com a posterior impugnação judicial, associadas à prestação de garantia idónea, apenas cessa com o trânsito em julgado da sentença que incidiu sobre aquela, em 03.09.2019(12). O facto de em 06.07.2004, ter sido declarada a caducidade da garantia em nada afecta o efeito suspensivo associado à instauração do meio impugnatório (seja o mesmo gracioso, seja o mesmo contencioso), com a prestação de garantia (artigo 49.º/4, das LGT), conforme tem sido afirmado pela jurisprudência fiscal assente. Em face do exposto, a dívida exequenda não se mostra prescrita.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não incorreu em erro, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.

DISPOSITIVO
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelos recorrentes.
Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)

(1ª. Adjunta - Lurdes Toscano)
(2ª. Adjunta – Maria Cardoso)

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(1)Jorge Lopes de Sousa, Sobre a prescrição da obrigação tributária, Notas práticas, Áreas Editores, 2010, p. 57.
(2) Acórdão do STA, de 13.01.2010, P. 01148/09.
(3)Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, de 03-04-2019, P. n.º 02369/15.3BEPNF 0983/16
(4) Acórdão do STA, de 13.03.2019, P. 01437/18.4BELRS
(5) Jorge Lopes de Sousa, Sobre a prescrição da obrigação tributária, Notas práticas, Áreas Editores, 2010, pp. 52/53.
(6) Sentença recorrida.
(7) Jorge Lopes de Sousa, Sobre a prescrição da obrigação tributária, Notas práticas, Áreas Editores, 2010, p. 65.
(8) Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado, Vol. III, 6.º Ed., p. 342.
(9) Acórdão do STA, de 12.10.2016, P. 0935/16
(10) N.º 9 do probatório.
(11) N.ºs 1 e 8, do probatório.
(12) N.ºs 16 a 19 do probatório.