Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09625/13
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:02/21/2013
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:DECRETAMENTO PROVISÓRIO,
ARTº 131º DO CPTA
Sumário:I. O decretamento provisório da providência cautelar, nos termos do artº 131º do CPTA, tem como âmbito de aplicação, a tutela de direitos, liberdades e garantias que de outro modo não possam ser exercidos em tempo útil ou quando se entenda existir uma outra situação de especial urgência (cfr. nºs 1 e 3).

II. Este meio de tutela urgente destina-se a evitar o periculum in mora do próprio processo cautelar, evitando os prejuízos que possam resultar da delonga desse próprio processo.

III. Constitui pressuposto ou requisito da tutela urgentíssima prevista no artº 131º do CPTA, que se mostre configurada uma situação de lesão iminente a um direito ou interesse legítimo, a qual, por ser iminente, pode ocorrer a qualquer momento, sendo de verificação em curtíssimo período de tempo ou de forma imediata.

IV. Não se mostra suficiente, que exista a mera possibilidade da entidade requerida adotar uma qualquer conduta, lesiva dos direitos e interesses legítimos das requerentes, como no caso em que tomasse a posse administrativa da concessão, sendo necessário que se mostre caracterizada de facto uma situação que revele o caráter iminente dessa lesão.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

E........ – Empresa ..................., S.A., S...............– Sociedade ............................, SA e N.............. – Serviços ..................., Lda., devidamente identificadas nos autos, inconformadas, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 18/10/2012 que, no âmbito do processo cautelar de suspensão de eficácia movido contra a APL – Administração do Porto de Lisboa, SA, determinou o levantamento das providências cautelares decretadas provisoriamente, nos termos do artº 131º do CPTA.

Formulam as aqui recorrentes nas respetivas alegações (cfr. fls. 6 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem:

“a) O presente recurso é interposto nos termos do disposto nos artigos 147º do CPTA, 142º, nº 5 do CPTA conjugado com o disposto nas alíneas l) e m), do nº 2 so artigo 691º do CPC e 143º, nº 1 do CPTA, e de acordo com o decidido pelos Acórdãos do TCA Sul de 04/11/2010, proferido no processo nº 06619/10, de 16/02/2012, proferido no processo nº 08360/11, de 12/05/2011, proferido no processo nº 06780/10 e de 14/01/2010, proferido no processo nº 05746/09;

b) O presente recurso vem interposto da decisão contida no despacho de 18 de outubro de 2012 do tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que determinou o levantamento das providências cautelares decretadas provisoriamente através do despacho de 7 de setembro de 2012, no qual o Tribunal recorrido reconheceu a existência de uma situação de especial urgência;

c) Não podem as Recorrentes concordar com a decisão proferida e muito menos com os respetivos fundamentos;

d) No respeitante a matéria de facto relevante, cabe referir que, no âmbito do Contrato de Concessão celebrado entre a APL e a N..................., foi, em 21 de outubro de 2005, celebrado um Protocolo entre a APL e as ora Recorrentes, enquanto acionistas da ...................;

e) Apesar de a APL nunca ter chegado a formalizar as obrigações que assumiu no Protocolo em Adenda ao Contrato de Concessão, começou logo após a assinatura de tal Protocolo a cumprir pontualmente as respetivas obrigações, designadamente de redução das taxas, comportamento que criou na esfera jurídica das ora Recorrentes, bem como da ..................., uma situação jurídica de confiança na atuação da APL e a expectativa de cumprimento do Protocolo e de que o contrato de concessão vigoraria, de facto, até 2021 e de que a APL nunca viria exigir o pagamento de rendas passadas não pagas e por ela não cobradas;

f) Através da carta de 23 de setembro de 2011, a APL comunicou à ................... a sua “posição” quanto ao Contrato de Concessão da mesma, referindo que tal contrato se extinguiria, por caducidade, em 31 de dezembro de 2011, e que a ................... deveria proceder ao pagamento as taxas fixas e variáveis não cobradas, no montante de global de 1.261.082,45 euros;

g) Por ser ilegal este comportamento da APL, as ora Recorrentes apresentaram o presente processo cautelar, que é acessório de uma ação com pedido de condenação da APL, ao cumprimento das obrigações que contratualizou no Protocolo, designadamente celebrando a Adenda ao Contrato de Concessão;

h) Por considerarem que existe aqui um perigo iminente, uma especial urgência, pois a execução daquelas medidas depende, única e exclusivamente, da vontadde da APL, faculdade em que se encontra investida a APL por força da decisão em crise nos autos – o que se afirma independentemente da sua manifesta invalidade – e, portanto, poderão ser executadas a qualquer momento, as Recorrente requereram ao Tribunal o decretamento provisório das providências, o que foi concedido pelo Tribunal recorrido e, posteriormente, revogado pelo despacho ora recorrido;

i) Sucede que para fundamentar tal decisão de levantamento do decretamento provisório o Tribunal recorrido limita-se a citar acriticamente os argumentos aduzidos pela ora Recorrida a favor desse levantamento, argumentos esses que não deviam ter sido considerados;

j) A carta de 23 de setembro não fala, de facto, em “posse administrativa”, mas a APL afirma, nessa mesma carta, que considera que o contrato de concessão da ................... cessou, por caducidade, no dia 31 de dezembro de 2011, pelo que, como é evidente, aquela pode, a qualquer momento, tomar posse administrativa da concessão;

k) A posse administrativa é um ato que decorre da lei e também do contrato, conforme resulta evidente da leitura do nº 1 do artigo 24º e do artigo 25º do contrato de concessão, junto como doc. 1 com o requerimento inicial;

l)Sendo que basta apenas uma carta da APL à ................... a notificá-la para entregar a concessão para desencadear todo o procedimento da posse administrativa, sem que a ................... nada possa opor, conforme estipula o artigo 156º do CPA;

m) Pelo que, estando já pode demais afirmado nos autos pela própria APL que esta considera que o contrato cessou no dia 31 de dezembro de 2011, não se entende como pode o Tribunal considerar que não existe perigo iminente de tomada da posse administrativa pela APL;

n) E nem se diga que, nos termos do artigo 152º, a “posse administrativa não é automática sempre carecendo de um procedimento administrativo de execução prévio, com notificação prévia”, pois, mesmo que, para tomar posse administrativa da concessão nos termos do artigo 156º do CPA, a APL tenha que notificar a ................... “antes de iniciar a execução” nos termos do artigo 152º do CPA, nada na lei e nesse procedimento impede que entre a notificação e a tomada de posse administrativa possam medir uns meros 5 dias;

o) Também não é verdade que a eventualidade de uma posse administrativa “nunca seria irreversível”, pois, como a APL bem sabe e conforme especificamente alegado e demonstrado no requerimento inicial, no caso de a APL tomar posse administrativa da concessão, bem como no caso de a ................... ser obrigada a pagar o montante de 1.261.082,45 euros à APL – que esta poderá reclamar a título coercivo nos termos do artigo 155º do CPA – tal implicaria a imediata extinção da empresa, pelo que nunca seria possível a retoma da concessão;

p) O que, aliás, foi dado como provado no âmbito do processo cautelar intentado pela ................... contra a APL, onde o TAC de Lisboa deu como provado que “a cessação imediata da sua atividade naquele estaleiro coloca em risco a subsistência da ................... e a manutenção de 25 postos de trabalho” – cfr. Doc. 12 junto com o requerimento inicial;

q) Por outro lado, o argumento de que a carta da APL se refere à possibilidade de prorrogação excecional do contrato da ................... “nomeadamente até que exista novo concessionário”, também não devia ter sido considerado pelo Tribunal para revogar o decretamento provisório, pois, com o presente processo cautelar, maxime com o decretamento provisório, o que as ora Recorrentes pretendem evitar é precisamente que – e para além da questão da cobrança das rendas – a APL extinga o contrato de concessão da ..................., tome posse administrativa da concessão e lance um concurso para uma nova concessão;

r) Pressupor uma prorrogação excecional ou o lançamento de um concurso é ignorar e violar um contrato válido e em vigor assinado pela própria APL e as ora Recorrentes, nos termos do qual a concessão à ................... se manteria até 2021;

s) Finalmente, é irrelevante o fundamento de que a ................... poderia pedir um pagamento a prestações, primeiro, porque com a simples notificação da ................... para o indevido pagamento do montante acima referido, aquela ficaria imediatamente obrigada a provisionar esse montante colocando-a numa situação de insolvência imediata e, consequentemente, no âmbito de aplicação do artigo 35º do Código das Sociedades Comerciais;

t) Em segundo lugar, não é possível, nem do ponto de vista da contailidade pública, nem do ponto de vista da ................... proceder ao pagamento em prestações para além do termo da concessão, visto que a empresa não tem outra atividade que não seja a exploração da concessão, extinguindo-se, em consequência, com o seu terminus;

u) Finalmente, porque, dada a ilegalidade de toda a atuação da APL exposta no presente processo cautelar, o pagamento da quantia em questão, seja integralmente seja em prestações, é o que as ora Recorrentes pretendem, precisamente, evitar até que seja a ação principal onde será julgada a ilegalidade da atuação da APL ao recusar-se agora a cumprir um Protocolo que assinou e cumpriu durante 6 anos;

v) Pelo que, não podem as ora Recorrentes conformar-se com a preponderância que o Tribunal recorrido, acriticamente, atribuiu aos argumentos da APL em detrimento dos das ora Recorrentes;

w) Estando, pois, justificada a existência de uma situação se especial urgência – pois, caso não haja decretamento provisório esvaziar-se-á o objeto do próprio processo cautelar –, o Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento ao ter acolhido acriticamente os argumentos da APL e ao ter, com base neles, revogado a sua decisão de decretamento provisório, razão pela qual, deve esse Douto TCA Sul revogar o despacho ora recorrido, mantendo-se o decretamento provisório das providências cautelares.”.

Termina pedindo a procedência do recurso jurisdicional e revogada a decisão, substituindo-se por outro que mantenha o decretamento provisório das providências cautelares.


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A ora recorrida, APL, notificada apresentou contra-alegações (cfr. fls. 45 e segs.), formulando as seguintes conclusões:

“I. No presente recurso está em causa o decretamento provisório das seguintes providências cautelares:

- Intimação da APL para que se abstenha, a título provisório, de (i) pôr termo ao Contrato de Concessão celebrado entre a APL e a ..................., (ii) de tomar posse administrativa da Concessão da ................... e (iii) de lançar um novo concurso para atribuir a concessão da ...................;

- Intimação da APL para que se abstenha, a título provisório, de exigir à ................... o (iv) pagamento de qualquer montante a título de taxas vencidas;

II. A referida ................... não é parte no presente processo o que, desde logo, determina que tenham que ser indeferidas as providências requeridas, mesmo que a título provisório;

III. Com efeito, se fossem julgadas procedentes as providências cautelares requeridas no presente processo, mesmo a título provisório, tal teria por efeito a ................... continuar concessionária, quando esta nem sequer é parte no processo;

IV. Acresce que, o presente processo cautelar, intentado por alegadas acionistas da referida ..................., foi instaurado na sequência de ter sido julgado improcedente pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa o processo cautelar idêntico intentado pela ..................., encontrando-se atualmente pendente recurso nesse douto Tribunal (v. Sentença junta com a Oposição da ora Recorrida, apresentada no presente processo em 21.09.2012);

V. Nesse processo cautelar instaurado pela ................... foi, igualmente, determinado o levantamento das providências cautelares provisoriamente decretadas (v. Despacho junto ao Requerimento apresentado pela ora Requerida no presente processo em de 17.09.2012);

VI. O presente processo cautelar, instaurado por alegadas acionistas da referida ..................., mais não constitui do que uma tentativa de subverter decisões já proferidas pelos Tribunais e de tentar obter, a final, decisões contraditórias;

VII. Acresce-se que, apesar das extensas considerações e juízos de valor, falsos e improcedentes, constantes das alegações das Recorrentes, nem sequer demonstram que se verificariam os requisitos para o decretamento provisório;

VIII. Nomeadamente, não o fazem em sede de pretensos factos, nos pontos 3 a 9 das suas alegações, em que não constam factos mas sim juízos conclusivos e descrições deturpadas, que se impugnam integralmente;

IX. Conforme referido no douto despacho recorrido, o “Ofício, invocado pelas Requerentes, datado de 23 de setembro de 2011, não contém qualquer referência à tomada de posse administrativa. Pelo contrário, refere a prorrogação do contrato, nomeadamente até à escolha de novo concessionário, no âmbito do procedimento que vier a ser aberto pela Requerida para o efeito, sem prejuízo do direito de preferência da Navarocha, sendo certo que decorre da pronúncia emitida pela Requerida, para efeitos do disposto no n.° 6, do artigo 131.°, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que não foram entretanto praticados quaisquer atos tendentes à abertura de procedimento para atribuição da concessão, à tomada de posse administrativa das instalações e/ou à cobrança coerciva dos montantes em causa” (v. págs. 6 e 7 do douto despacho recorrido – sombreados nossos);

X. Tendo-se, consequentemente, determinado, no douto despacho recorrido, o levantamento do decretamento provisório das providências cautelares requeridas, o que não é minimamente infirmado pelo referido nas alegações das Recorrentes;

XI. Com efeito, basta ler a referida comunicação de setembro de 2011 da Recorrida para a ................... (Doc. 9 do R.I.) em que se recordava a lei e o contrato de concessão celebrado com a ................... (e não com as ora Recorrentes), para verificar que não se está perante a tomada de posse administrativa da Concessão pela APL, já que em nenhum ponto dessa comunicação se faz qualquer alusão a essa tomada de posse administrativa, antes pelo contrário;

XII. A isto acresce que essa tomada de posse administrativa nunca seria automática, carecendo sempre de um procedimento administrativo prévio, sendo que as Recorrentes (ou melhor, a ...................), sempre poderiam reagir contra essa decisão, se a mesma viesse a ser tomada, o que demonstra não existir qualquer situação de especial urgência no presente caso;

XIII. O que resulta dos factos dados por provados no âmbito do processo cautelar intentado pela ................... contra a APL, é apenas o “risco” associado à cessação imediata da atividade da Navarocha naquele estaleiro, sendo que, não só não se está atualmente nessa situação, como daí não resulta demonstrada a extinção da ................... como consequência inevitável do fim da concessão;

XIV. Não resulta ainda minimamente demonstrado que a obrigatoriedade de provisionar o pagamento do montante em dívida pela ................... à APL, na sua totalidade ou a prestações, teria por efeito a sua colocação em insolvência;

XV. As Recorrentes invocam a impossibilidade de uma empresa extinta acordar o pagamento em prestações, quando, como resulta do já acima referido, atualmente não se está perante a tomada de posse administrativa da Concessão, nem também perante a xtinção da ...................;

XVI. Face ao exposto, não está em causa, nos presentes autos, uma qualquer situação de especial urgência que justifique a manutenção do decretamento provisório das providências cautelares requeridas pelas Recorrentes contra a APL, sendo manifestamente improcedentes as respetivas alegações.”.

Termina pedindo que seja negado provimento ao recurso e mantida a decisão recorrida.


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O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no artº 146º do CPTA, não emitiu parecer.

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O processo vai, sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pelas recorrentes, sendo certo que o objeto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, n.º 1 todos do CPC ex vi artº 140º do CPTA.

A questão suscitada resume-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento ao levantar as providências cautelares provisoriamente decretadas, por existir uma situação de especial urgência, decorrente da possibilidade de ser tomada a posse administrativa da concessão, com a consequente cobrança das rendas.

III. FUNDAMENTOS

DE DIREITO

O presente recurso vem interposto da decisão datada de 18 de outubro de 2012, que determinou o levantamento das providências cautelares decretadas provisoriamente pelo despacho datado de 07 de setembro de 2012, em que o Tribunal a quo reconheceu existir uma situação de especial urgência, nos termos do disposto no artº 131º do CPTA.

Na lide cautelar, as requerentes formularam os seguintes pedidos:

a) intimação da APL para que se abstenha, a título provisório, de pôr termo ao Contrato de Concessão, de tomar posse administrativa da Concessão da ................... e de lançar um novo concurso para atribuir a concessão da ...................;

b) intimação da APL para que se abstenha, a título provisório, de exigir à ................... o pagamento de qualquer montante a título de taxas vencidas.

Resulta do despacho que decretou provisoriamente as providências cautelares, a seguinte fundamentação:

“(…) considerando os factos alegados pelas Requerentes nos artigos 189º a 195º do requerimento inicial e a natureza dos prejuízos invocados, entendo que a situação dos autos configura uma situação de especial urgência nos termos e para os efeitos previstos no artigo 131º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, pelo que devem as medidas cautelares requeridas ser provisoriamente decretadas ao abrigo do disposto neste preceito legal, o que se decide.”.

Da decisão ora impugnada, proferida nos termos do disposto no nº 6 do artº 131º do CPTA, após o contraditório da entidade requerida e da ponderação dos argumentos de ambas as partes, que foram enunciados, extrai-se a seguinte fundamentação:

(…) Ora, como também refere a Requerida APL, este Ofício, invocado pelas Requerentes, datado de 23 de setembro de 2011, não contém qualquer referência à tomada de posse administrativa. Pelo contrário, refere a prorrogação do contrato, nomeadamente até à escolha de novo concessionário, no âmbito do procedimento que vier a ser aberto pela Requerida para o efeito, sem prejuízo do direito de preferência da ..................., sendo certo que decorre da pronúncia emitida pela Requerida, para efeitos do disposto no n.° 6, do artigo 131º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que não foram entretanto praticados quaisquer atos tendentes à abertura de procedimento para atribuição da concessão, à tomada de posse administrativa instalações e/ou à cobrança coerciva dos montantes em causa.

Na pronúncia agora emitida, a Requerida, referiu, além do mais, que não estamos perante uma “lesão iminente”, pois no Ofício da Requerida, de 23 de setembro de 2012, nada se refere quanto a posse administrativa, antes pelo contrário, fala-se diversas vezes de prorrogação, nomeadamente até que exista novo concessionário, se não for a própria Requerente, que se diz mesmo gozar de direito de preferência, para além de que a posse administrativa não é automática, carecendo sempre de um procedimento administrativo de execução prévio, com notificação prévia, nos termos do artigo 152.°, do Código do Procedimento Administrativo, sendo que nada impedia ou impede a ................... de pedir um pagamento a prestações.

Conforme já referimos, aquando do decretamento provisório das medidas cautelares requeridas, as medidas cautelares devem ser provisoriamente decretadas, independentemente de quaisquer formalidades, como sucedeu, quando o alegado pelo requerente permita reconhecer a possibilidade de lesão iminente e irreversível do direito, liberdade e garantia invocado ou a existência de outra situação de especial urgência (cfr. artigo 131.° n.ºs 1 e 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).

Face ao alegado pelas Requerentes no requerimento inicial, para sustentar o pedido de decretamento provisório formulado, concluímos que a situação dos autos configurava uma situação de especial urgência, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 131.º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Face à pronúncia emitida pela Requerida, para efeitos do disposto no n.° 6, do artigo 131.º. do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, ao teor do Ofício invocado pelas Requerentes – supra transcrito –, e demais documentos juntos aos autos, objeto de uma análise necessariamente perfunctória, temos de concluir que não estão reunidos os pressupostos de que a lei faz depender o decretamento provisório de providências cautelares, não podendo, assim, manter-se o decretamento provisório das medidas cautelares requeridas, determinado a fls. 346/347.”.

Nos termos antecedentes, está em causa a impugnação de uma decisão, proferida ao abrigo do disposto no nº 6 do artº 131º do CPTA, após o decretamento provisório da providência e a audição das partes para se pronunciarem sobre a possibilidade do levantamento, manutenção ou alteração da providência, decisão esta que determinou o levantamento das providências anteriormente decretadas a título provisório.

O decretamento provisório da providência cautelar, nos termos do artº 131º do CPTA, tem como âmbito de aplicação, a tutela de direitos, liberdades e garantias que de outro modo não possam ser exercidos em tempo útil ou quando se entenda existir uma outra situação de especial urgência (cfr. nºs 1 e 3).

Nos termos em que a doutrina e a jurisprudência têm caracterizado o presente meio de tutela urgente, decorre que a concessão da providência no âmbito do disposto no artº 131º do CPTA destina-se a evitar o periculum in mora do próprio processo cautelar, evitando os prejuízos que possam resultar da delonga desse próprio processo.

A necessidade de tutela urgentíssima há de reportar-se aos casos em que na pendência do processo cautelar, não fosse o decretamento provisório, haveria lesão iminente e irreversível do objeto litigioso, tornando desprovida de utilidade a adoção da providência cautelar requerida e, por sua vez, a própria sentença a proferir no processo principal.

Constitui, por isso, pressuposto ou requisito da tutela urgentíssima conferida pela lei de processo no artº 131º do CPTA, que se mostre configurada uma situação de lesão iminente a um direito ou interesse legítimo.

Tal lesão, por ser iminente, pode ocorrer a qualquer momento, sendo de verificação em curtíssimo período de tempo ou de forma imediata.

Ora, em face da alegação das partes em juízo e da prova documental produzida, designadamente, do teor do ofício que foi transcrito pela decisão ora impugnada e que pela mesma foi considerado, é possível compreender que não se mostra caracterizada de facto uma situação de especial urgência, que permita enquadrar a pretensão requerida no âmbito da factie species do artº 131º do CPTA.

Não se mostra suficiente para efeitos do pedido de decretamento provisório das providências cautelares, à luz da citada norma legal, que exista a mera possibilidade da entidade requerida adotar uma qualquer conduta, lesiva dos direitos e interesses legítimos das requerentes, como no caso em que tomasse a posse administrativa da concessão, pois é necessário que se mostre caracterizada de facto uma situação que revele o caráter iminente dessa lesão, que não se compadece com a delonga própria do decretamento de uma providência cautelar.

Essa situação de especial urgência tem de ser suficientemente caracterizada, o que o caso trazido a juízo não permite configurar.

Sendo as requerentes notificadas de que a concessão será prorrogada até que esteja ultimado o procedimento que venha a ser aberto, com vista à escolha de novo concessionário e que, nesse procedimento, a ................... gozará de direito de preferência, não se vê com base em que factos podem as requerentes sustentar que existe o perigo iminente de tomada de posse administrativa da concessão pela APL.

Além disso, não sendo a tomada de posse administrativa de efeito automático, igualmente não se mostra caracterizada tal especial urgência, que não se compadeça com a delonga própria da instância cautelar.


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Pelo exposto, será de julgar improcedente o recurso, por não provados os seus respetivos fundamentos.

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Sumariando, nos termos do nº 7 do artº 713º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. O decretamento provisório da providência cautelar, nos termos do artº 131º do CPTA, tem como âmbito de aplicação, a tutela de direitos, liberdades e garantias que de outro modo não possam ser exercidos em tempo útil ou quando se entenda existir uma outra situação de especial urgência (cfr. nºs 1 e 3).

II. Este meio de tutela urgente destina-se a evitar o periculum in mora do próprio processo cautelar, evitando os prejuízos que possam resultar da delonga desse próprio processo.

III. Constitui pressuposto ou requisito da tutela urgentíssima prevista no artº 131º do CPTA, que se mostre configurada uma situação de lesão iminente a um direito ou interesse legítimo, a qual, por ser iminente, pode ocorrer a qualquer momento, sendo de verificação em curtíssimo período de tempo ou de forma imediata.

IV. Não se mostra suficiente, que exista a mera possibilidade da entidade requerida adotar uma qualquer conduta, lesiva dos direitos e interesses legítimos das requerentes, como no caso em que tomasse a posse administrativa da concessão, sendo necessário que se mostre caracterizada de facto uma situação que revele o caráter iminente dessa lesão.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, por não provados os seus respetivos fundamentos, mantendo a decisão recorrida na ordem jurídica.

Custas pelas recorrentes.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)

(Maria Cristina Gallego Santos)

(António Paulo Vasconcelos)