Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07063/13
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:03/19/2015
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:O ARTIGO 11.º/5, DO CIMTI; CADUCIDADE DA ISENÇÃO; JUSTO IMPEDIMENTO.
Sumário:1) A invocação do justo impedimento exige a demonstração de que a não celebração do contrato definitivo de revenda dos prédios em causa dentro do limite temporal de caducidade da isenção não é imputável a conduta da recorrente.
2) Pelo menos na data da inscrição do registo das fracções em favor da recorrente, ocorrida, em 08.02.2005, a mesma estava em condições de celebrar os contratos de revenda dos prédios, o que significa que a escritura pública em causa podia ter sido outorgada em momento anterior àquele em que teve lugar.
3) A recorrente não logrou demonstrar que não lhe fosse, como é, exigível outro comportamento, mais diligente na outorga da revenda, tendo em vista a observância do ónus fiscal em referência.
4) Não está, por isso, demonstrada a ocorrência de justo impedimento dirimente da falta de observância do prazo de caducidade de três anos da isenção em apreço.

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I- Relatório


“……………………….., SA”, m.i. nos autos, interpõe o presente recurso jurisdicional da sentença proferida a fls. 96/109, que julgou improcedente a impugnação judicial da liquidação de Imposto Municipal sobre as transmissões onerosas de Imóveis/IMT, no valor de €13.954,64, na parte relativa às fracções …. e …….
Nas alegações de fls. 114/121, a recorrente formula as conclusões seguintes:
a) A recorrente adquiriu para revenda, duas fracções autónomas.
b) Nessa qualidade, beneficiou da isenção do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas, nos termos do art.º 7.º do Código I.M.T.
c) A recorrente tinha um prazo de três anos para proceder à revenda dessas fracções autónomas, nos termos consagrados no art.º 11.º, n.º 5.
d) Nesse sentido, prometeu vender as referidas fracções, através de contrato promessa, permitindo desde logo que, a promitente compradora gozasse as duas aludidas fracções.
e) Verificando-se assim, materialmente a “traditio”.
f) Por se ter verificado um litígio entre promitentes compradora e vendedora, surgiu um procedimento cautelar de arresto das fracções autónomas.
g) O procedimento cautelar foi decidido procedente e deu lugar a uma acção principal, que funcionou na dependência do referido procedimento.
h) A recorrente ficou assim impedida de formalizar o negócio prometido, dentro do prazo de três anos.
i) Só após trânsito em julgado, foi possível outorgar a escritura pública do contrato prometido.
j) Essa escritura foi outorgada para além dos três anos contemplados na lei, como período máximo para a revenda dos prédios adquiridos.
k) A Autoridade Fiscal e Aduaneira, invocando incumprimento no prazo permitido para a revenda, efectuou a liquidação dos impostos respectivos.
l) Situação que, a recorrente impugnou.
m) Em termos substantivos, a revenda foi efectuada dentro do prazo dos três anos permitidos na lei.
n) A recorrente entende que o prazo de caducidade ficou suspenso, com a entrada no Tribunal Civil de uma acção judicial, tendo como objecto o negócio prometido “sub-judice”.
o) Estamos perante um justo impedimento, devidamente fundamentado.
p) A Autoridade Fiscal e Aduaneira não respeitou os valores defendidos pela Doutrina e Jurisprudência, ao efectuar liquidações de impostos de uma forma tão redutora.
q) Face ao que os actos de liquidação daqueles tributos são inválidos, por falta de fundamentação convincente, o que determinou e determina o pedido de anulação daqueles impostos.
r) Os elementos de facto e de Direito, que serviram de base à douta decisão do Tribunal “a quo”, apresentam uma contradição insanável entre si.
Não há registo de contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (fls. 139/140, dos autos), no qual se pronuncia no sentido da recusa de provimento ao presente recurso jurisdicional.
X
Colhidos os vistos legais, vem o processo à conferência para decisão.


X

II- Fundamentação.
1.De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:
1) Em 2 de Agosto de 2003, foi redigido um documento, intitulado "Contrato promessa de compra e venda", por ………………………., SA, (primeira contratante) e ………………………., Lda., o qual se dá aqui por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor - cfr. fls. 83-85 dos autos:
"(...) // PRIMEIRA: - A primeira contratante é única e legítima possuidora das fracções autónomas, constituídas em regime de propriedade horizontal, correspondentes ao rés-do-chão, n.º …., fracção …. do prédio sito em ……………., inscrito na Conservatória do Registo Predial de Portimão sob o n.º ……./ de 30/06/87 e rés-do-chão, n.º …., fracção ….. do prédio urbano sito em …………….., inscrito na Conservatória do Registo Predial de Portimão sob o n.º ……../300687.
SEGUNDA - A primeira contratante promete vender à segunda contratante, ou a quem esta indicar, livre de quaisquer ónus, encargos e hipotecas, e esta promete comprar, os referidos prédios, pelo preço global de 100.000,00 euros (cem mil euros).
TERCEIRA - A primeira outorgante declara no presente contrato já ter recebido por conta do valor da venda e da quantia convencionada, a título de sinal, a quantia de €60.970 (sessenta mil novecentos e setenta euros), do qual, desde já, dá a respectiva quitação.
ALÍNEA A) - O remanescente do valor, no montante de € 39.030 será pago até à marcação da respectiva escritura pública.
QUARTA - A fim de realizar a escritura pública de compra e venda, a primeira outorgante compromete-se a comunicar à segunda outorgante, no prazo máximo de trinta dias da entrega do Tribunal Judicial da Comarca de Portimão, de toda a documentação necessária para a outorga da escritura definitiva a favor da primeira outorgante, devendo para tanto ser a segunda outorgante notificada mediante carta registada com aviso de recepção.
ALÍNEA A)- (...)
ALÍNEA B) - A supra referida escritura definitiva de compra e venda dos prédios objecto do presente contrato deverá realizar-se em cartório notarial a indicar pela segunda outorgante e no prazo máximo de 60 dias a contar da data da entrega pelo Tribunal Judicial da Comarca de Portimão à primeira outorgante de toda a documentação necessária para a outorga da escritura pública a favor da primeira outorgante.
(...)
OITAVA - A segunda outorgante toma a posse e domínio sobre os imóveis objecto do presente contrato, na data do presente contrato a fim de possibilitar à mesma a realização de todas as obras necessárias à instalação da sua actividade.
2) As fracções referidas nos pontos que antecedem foram integradas na massa falida decorrente da declaração de falência proferida a José…………………… e outros - cfr. fls. 29 do Processo Administrativo.
3) No dia 23 de Março de 2004, no cartório notarial de Silves, foi celebrada escritura pública de compra e venda entre …………….. - ………………., Lda., e ………….. - ………………, SA, tendo por objecto:
-A fracção autónoma designada pela letra …., correspondente ao rés-do-chão, número ….., do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito no …………….., freguesia e concelho de Portimão, sob o número ……………………., inscrito a favor dos executados pelas inscrições …-um e …-dois e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ………..; // A fracção autónoma designada pela letra ….., correspondente ao rés-do-chão, número ….. , do mesmo prédio urbano.
Nesta escritura ficou exarado o seguinte: // Que ………………………, Lda., estava presente "na qualidade de encarregada da venda pelo Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Portimão, primeiro juízo cível, nos autos de carta precatória (distribuída) //.- 505/2000, vinda da segunda secção da décima sétima vara cível do Tribunal judicial da Comarca de Lisboa e extraída dos autos de Execução Sumária número mil quinhentos e trinta e sete-A barra mil novecentos e noventa e seis, e em que são executados, José …………………… e mulher Mana…………………………."', e // Que a "Transmissão [está] isenta de IMT, em virtude de a sociedade ………………………….., SA, se encontrar colectada na rubrica Compra e Venda de Bens Imobiliários e ter exercido normal e habitualmente a actividade por que se encontra colectada no ano transacto, conforme certidão fiscal já arquivada no maço de documentos do nosso Livro de Notas para escrituras diversas número duzentos e treze-F e sob o número setenta e dois" - cfr. fls. 11-16 dos autos.
4) No dia 2 de Fevereiro de 2005, foi julgado procedente o procedimento cautelar especificado de arresto, requerido por ………………….., Lda., contra …………………, SA, e, consequentemente, decretado, além do mais, o arresto das referidas fracções …. e …... - cfr. fls. 33-49 do Processo Administrativo.
5) Em 16 de Fevereiro de 2005, foram registados provisoriamente os arrestos - cfr. fls. 71 e 76 dos autos.
6) No dia 8 de Abril de 2005, foram registadas as aquisições das fracções ….. e …., a favor de ……………………………, SA, referidas em 3. - cfr. fls. 71 e 76 dos autos.
7) Em 6 de Maio de 2008, foi proferido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça no processo n.º 770/08 que negou a revista interposta da sentença proferida no processo principal do processo cautelar referido em 4. que, por sua vez, a havia julgado improcedente, não reconhecendo a resolução do contrato promessa, nem condenando a ora Impugnante a restituir o sinal em dobro nem no pagamento de quantia relativa a benfeitorias efectuadas pela promitente compradora - cfr. fls. 51- 64 do Processo Administrativo.
8) No dia 18 de Junho de 2008, no cartório notarial de Carlos ……………, em Portimão, foi celebrada escritura pública de compra e venda entre ……………………….., SA, e ………………………., Lda., tendo por objecto:
- A fracção autónoma designada pela letra …., correspondente ao rés-do-chão, número …, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito no …………………, freguesia e concelho de Portimão sob o número ………………….., inscrito a favor dos executados pelas inscrições ……-um e ……-dois e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ……..; e // - A fracção autónoma designada pela letra …., correspondente ao rés-do-chão, número ….., do mesmo prédio urbano. // Ficou mencionado na escritura o arquivo da "declaração para a liquidação do IMT com o correspondente comprovativo de cobrança n.º ……………………… no valor de € 6.500,00 de 18.06.2008 do Serviço de Finanças de Portimão" - cfr. fls. 79-82 dos autos.
9) Em 16 de Julho de 2008, foi registada a aquisição destas fracções ….. e ….. a favor de ………….........., Lda. - cfr. fls. 73 dos autos.
10) No dia 17 de Agosto de 2011, foram sancionadas as conclusões do Relatório de Inspecção Tributária relativa à inspecção parcial (IMT de 2007 e IRC de 2008 e 2009) efectuada à Impugnante, que aqui se dão por integralmente reproduzidas e que, no que ora interessa, têm o seguinte teor:
“(…) III.1.2. – Artigo n.º………. fracções …., …. e …..
No dia 23 de Março de 2004, o sujeito passivo adquiriu para revenda/por escritura pública lavrada no Cartório Notarial de Silves, livro 217-F, fls. ……, as fracções autónomas designadas pelas letras …., …. e ….., inscritas na matriz predial urbana sob o artigo n.º …….., destinadas a comércio, sitos no ……………., freguesia e concelho de Portimão, pelo valor de € 24.108,57 cada fracção.
A aquisição acima mencionada está sujeita a IMT nos termos do n.º l do art. 2.º do CIMT e ficou isenta ao abrigo do art. 7.º do mesmo Código. Não tendo os prédios sido revendidos no prazo de três anos, a isenção caducou nos termos do n.º 5 do artigo 11.º do CIMT, pelo que o sujeito passivo deveria ter solicitado a liquidação do imposto no prazo de 30 dias conforme o n.º l do art. 34.º do CIMT. (...)" - cfr. fls. 71-82 do Processo Administrativo.
11) Consequentemente, foi emitida liquidação de IMT, no valor de € 13.954,64, relativa às transmissões das fracções …., …. e ….. do artigo ……. - acto parcialmente impugnado - cfr. fls. 68 do Processo Administrativo.
12) Em 20 de Setembro de 2011, a Impugnante deduziu Reclamação Graciosa contra aquela liquidação - cfr. fls. 2 do procedimento de Reclamação Graciosa.
13) No dia 11 de Abril de 2012, aquela Reclamação foi indeferida - cfr. fls. 9 a contar do final da Reclamação.

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Os documentos referidos não foram impugnados pelas partes e não há indícios que ponham em causa a sua genuinidade.
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Ao abrigo do artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
14) A acção referida em 7), foi intentada por “…………………..” contra “…………………, SA”, tendo em vista o reconhecimento judicial da resolução do contrato-promessa celebrado entre A. e R., por incumprimento imputável a esta última; a condenação da R. na restituição à A. do dobro das quantias entregues a esta e a condenação da R. a entregar à A. da quantia de €47.241,41, respeitante a benfeitorias realizadas pela A. nas fracções prometida vender» - sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Portimão de fls. 25/32, do p.a.
15) Para julgar improcedente a acção, a sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Portimão assentou, em síntese, na fundamentação seguinte: «Resulta, pois, claro que apenas na data do cancelamento das inscrições respeitantes à integração dos bens na massa falida – Abril de 2005 – se reuniram as condições para que a R. pudesse proceder ao registo da propriedade a seu favor e à entrega à A. de toda a documentação necessária para a realização da escritura de compra e venda. // Constata-se, pelo supra exposto, que à data da interposição da presente acção não existia, como pretende a A., qualquer incumprimento por parte da R. (que aliás se manifesta disponível para a realização do contrato definitivo)» - sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Portimão de fls. 25/32, do p.a.
16) Da fundamentação do acórdão do STJ que negou provimento ao recurso de revista interposto do acórdão do Tribunal da Relação que havia confirmado a sentença proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Portimão consta, entre o mais, o seguinte:
«Com efeito, e como consta da matéria de facto antecedentemente enunciada, foi clausulado que a escritura pública de compra e venda, a outorgar entre a A. e a R., seria realizada no prazo de 60 dias a contar da entrega àquela última, pelo tribunal de Portimão, da documentação necessária para a realização da escritura, a favor da mesma, relativa à aquisição das fracções, tendo aquela Ré, em 24/03/2004, e por instrumento público, adquirido a propriedade dos referidos imóveis, sem que, porém, e apesar de para tal ser notificada pela A. haja disponibilizado qualquer documento até à apresentação da petição em juízo, o que ocorreu em 21/10/2004 - pontos D), G) e R) e fls. 2. // Ora, atendendo à pactuada natureza temporalmente imprevisível do termo daquele indicado prazo e dada a inexistência de qualquer convenção escrita sobre as consequências ligadas ao seu incumprimento por parte da Ré., é de considerar que a sua fixação, porque não ligada à influência do referido prazo sobre os efeitos do contrato, muito em especial sobre a redução ou desaparecimento da utilidade da prestação para o credor após o seu vencimento, o mesmo não assume a natureza de um termo essencial do contrato, mas sim e apenas de um termo relativo, que não confere ao respectivo beneficiário a faculdade de, sem mais, proceder à resolução do negócio jurídico em causa (…)» – fls. 50/64, do p.a.
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2.2.De Direito.
2.2.1. Vem interposto recurso jurisdicional da sentença proferida a fls. 96/109, que julgou improcedente a impugnação judicial da liquidação de Imposto Municipal sobre as transmissões onerosas de Imóveis/IMT, no valor de €13.954,64, na parte relativa às fracções ….. e …….
2.2.2. Para julgar improcedente a impugnação, a sentença esteou-se, entre o mais, na fundamentação seguinte:
«As aludidas dificuldades na revenda, fruto do circunstancialismo emergente do litígio com a promitente compradora, fazem parte dos riscos próprios da actividade empresarial da Impugnante que se dedica à compra e venda de imóveis: quando uma sociedade imobiliária celebra um contrato promessa de compra e venda não ignora, pois que tal faz parte do seu quotidiano, que há a possibilidade de tal acordo não ser pontualmente cumprido por qualquer das partes. // Sendo que no caso dos autos a Impugnante não foi confrontada com a impossibilidade física ou jurídica de revender os prédios, mas, antes, com a existência de dificuldades acrescidas em revender no aludido prazo de três anos, dado o litígio que surgiu com a promitente compradora, litígio que faz parte dos riscos inerentes ao seu negócio».
2.2.3. Do alegado erro de julgamento dada a invocada impossibilidade de realização do acto de revenda no prazo de caducidade da isenção de tributação
Estatui o artigo 7.º do CIMTI (“Isenção pela aquisição de prédios para revenda”) que: «1. São isentas do IMT as aquisições de prédios para revenda, nos termos do número seguinte, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo 112.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea a) do n.º 1 do artigo 109.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da actividade de comprador de prédios para revenda. // 2. A isenção prevista no número anterior não prejudica a liquidação e pagamento do imposto, nos termos gerais, salvo se se reconhecer que o adquirente exerce normal e habitualmente a actividade de comprador de prédios para revenda. // 3. Para efeitos do disposto na parte final do número anterior, considera-se que o sujeito passivo exerce normal e habitualmente a actividade quando comprove o seu exercício no ano anterior mediante certidão passada pelo serviço de finanças competente, devendo constar sempre daquela certidão se, no ano anterior, foi adquirido para revenda ou revendido algum prédio antes adquirido para esse fim».
Estabelece, por seu turno, o artigo 11.º/5, do CIMTI (“Caducidade das isenções”) que: «A aquisição a que se refere o artigo 7.º deixará de beneficiar de isenção logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda».
A este propósito, de referir que: «[a] afectação do prédio para revenda é revelada pela sua contabilização no activo permutável da empresa. Essa contabilização manifesta a vontade e a decisão da administração da empresa de afectar e manter o prédio como uma mercadoria, que impede a tributação em IMT. (…) [A] aquisição do prédio para revenda exige que se cumpram três requisitos essenciais: // 1. Que essa intenção seja manifestada e fique expressa no contrato de compra e venda; // 2. Que o prédio se mantenha afecto ao activo permutável enquanto se mantiver no património da empresa, e finalmente; // 3. Que a revenda ocorra no prazo máximo de três anos após a aquisição»(1).
Ao invés do que se considera na sentença recorrida, a recorrente sustenta que a caducidade da isenção não ocorreu, pelas razões seguintes:
1) A revenda foi efectuada no prazo de três anos, dado que ocorreu a transmissão dos prédios, através da celebração do contrato-promessa, com a tradição das fracções em causa;
2) A pendência de litígio judicial relativo aos bens em causa tornou impossível a celebração da escritura pública de compra e venda em momento anterior àquele em que foi efectuada.
Vejamos cada um destes argumentos de per si.
2.2.4. Do alegado erro de julgamento por ter sido desconsiderada a transmissão dos prédios, através da celebração do contrato-promessa, com a tradição das fracções.
No ponto em exame, a recorrente pretende fazer valer o argumento de que houve a celebração do contrato-promessa com entrega dos prédios, pelo que a transmissão económica dos bens teve lugar, defende.
A este propósito de referir que: «[a] lei exige como pressuposto essencial do direito à isenção que a revenda se efectue, não usando o conceito de transmissão. (…) // Não basta que estas empresas pratiquem outros negócios sobre esses imóveis, nomeadamente celebrem contratos de promessa de alienação para que se considere consumada a revenda. Embora a celebração deste tipo de contratos com tradição da posse seja considerada pelo CIMT como um facto sujeito a imposto, o certo é que no caso da isenção de prédios adquiridos para revenda, a lei exige, sem mais, a efectivação da revenda como pressuposto essencial da isenção, sem equiparar a ela qualquer outro tipo de acto ou contrato»(2). Como se explicita no Acórdão do STA, de 28.11.2012, P. 0529/12, «[a]s normas que regulam a isenção de imposto, na medida em que contrariam os princípios da generalidade e da igualdade da tributação, são insusceptíveis de aplicação a casos que não tenham sido expressamente contemplados no benefício concedido, devendo ser objecto de interpretação estrita ou declarativa. // Para efeitos da isenção prevista no artº 7º, nº 1 do CIMT não assume qualquer relevo a troca ou permuta de bens, sendo apenas de considerar a revenda no seu sentido técnico-jurídico».
Não sofre dúvida que a revenda dos prédios no sentido técnico-jurídico apenas ocorreu em 18.06.2008 (n.º 8 do probatório), o seja, para além do limite temporal de três anos, o que determina a caducidade do direito à isenção em apreço, como se concluiu na informação de suporte do acto tributário.
Ao decidir no sentido mencionado, a sentença recorrida não merece o reparo que lhe é dirigido, devendo ser mantida nesta parte.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.5. Do alegado erro de julgamento por ter sido desconsiderada a impossibilidade de celebração da escritura pública de compra e venda em momento anterior àquele em que foi efectuada, dada a pendência de litígio judicial relativo aos bens em causa
Sob o presente item, a recorrente aduz a ocorrência de justo impedimento, havendo, no caso, no seu entender, impossibilidade jurídica e física da outorga dos contratos de revenda dos bens em causa dentro do limite temporal referido.
Vejamos.
A este propósito constitui jurisprudência assente a seguinte: «[m]esmo a admitir-se que, em abstracto, se possa configurar uma situação de “justo impedimento” relativamente ao prazo fixado para a caducidade da isenção de sisa prevista no n.º 3 do art. 11.º do CIMSISD (não ao abrigo do art. 146.º do CPC, mas ao abrigo do princípio geral de direito que lhe está subjacente), a alegação susceptível de integrar o “justo impedimento” teria que se referir a uma verdadeira impossibilidade de efectuar a venda, não bastando para esse efeito a alegação da impossibilidade em obter comprador ao preço pretendido. // Fora das situações de “justo impedimento”, a caducidade da isenção dita em I opera independentemente das razões por que se não verificou a revenda dentro do prazo de três anos, não podendo vislumbrar-se na falta de relevância dessas razões violação alguma de norma ou princípio constitucional» [Acórdão do STA, de 31.01.2012, P. 0706/11]. Cumpre referir que «[e]sta regra do justo impedimento que, como transparece da sua própria designação, é reclamada por exigências evidentes de justiça, deve ser considerada de aplicação generalizada, não só por imperativo constitucional decorrente do princípio da justiça que decorre da ideia de Estado de direito democrático, consignada no art.º 2.º da CRP, mas também do próprio princípio do acesso aos tribunais e à justiça (…). Aliás, deve entender-se que vigora no nosso direito uma regra básica de que não deve perder direitos pelo decurso do tempo quem esteve impossibilitado de exercê-los, regra essa que tem vários afloramentos, um dos quais é a regra do justo impedimento» (3).
A invocação do justo impedimento exige a demonstração de que a não celebração do contrato definitivo de revenda dos prédios em causa dentro do limite temporal referenciado não é imputável a conduta da recorrente. Dir-se-á que assim sucede no caso em exame, porquanto a acção intentada pela promitente-compradora e detentora dos prédios em causa com vista à resolução do contrato-promessa, por incumprimento imputável à promitente-vendedora não foi julgada procedente pelos tribunais da jurisdição comum (4), o que deporia no sentido da falta de culpa da recorrente, promitente-vendedora, na omissão de outorga atempada das escrituras públicas de revenda dos bens em apreço.
Recorde-se, porém, que resulta da fundamentação do Acórdão do STJ, proferido no âmbito da acção de resolução do contrato-promessa (5), que «tendo aquela Ré [ora recorrente], em 24/03/2004, e por instrumento público, adquirido a propriedade dos referidos imóveis, sem que, porém, e apesar de para tal ser notificada pela A. haja disponibilizado qualquer documento até à apresentação da petição em juízo, o que ocorreu em 21/10/2004» (6). Por outras palavras, pelo menos na data da inscrição do registo das fracções em favor da recorrente, ocorrida, em 08.02.2005 (7), a recorrente estava em condições de celebrar os contratos de revenda dos prédios, o que significa que a escritura pública em causa podia ter sido outorgada em momento anterior àquele em que teve lugar, e por isso, dentro do prazo de caducidade de três anos da isenção em apreço; com tal não contende a pendência de acção judicial relativa aos imóveis ou o arresto entretanto decretado, pois que tais factos não consubstanciam impedimento jurídico ou fáctico à outorga da escritura em apreço; também não afecta a possibilidade que assistiu à recorrente de outorga do contrato definitivo no tempo próprio o facto não ter sido condenada no pedido de resolução do contrato-promessa por incumprimento imputável do mesmo, no quadro da acção que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Portimão, porquanto a falta de culpa na não celebração do contrato-prometido não significa que à recorrente não fosse, como é, exigível outro comportamento, mais diligente na outorga da revenda, tendo em vista a observância do ónus fiscal em referência; comportamento que se tornou exigível a partir da data do registo das fracções em nome da recorrente, ou seja, em 08.02.2005.
Não está, por isso, demonstrada, a ocorrência de justo impedimento dirimente da falta de observância do prazo de caducidade de três anos da isenção em apreço.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida deve ser confirmada, ainda que com a presente fundamentação.
Termos em que se impõe julgar improcedentes as presentes conclusões de recurso.

DISPOSITIVO
Acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês - Relator)


(1º. Adjunto)


(2º. Adjunto)



(1)José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 2011, p. 421.
(2)José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 2011, p. 423.
(3)Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado, Vol. I, 6.ª Ed., p. 275.
(4)N.º 7 do probatório.
(5)N.º 16 do probatório
(6)N.º 16 do probatório.
(7)N.º 6 do probatório.