Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2742/10.3BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/04/2020
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:BENS DO ACTIVO CORPÓREO IMOBILIZADO.
AMORTIZAÇÕES EXTRAORDINÁRIAS.
COMUNICAÇÃO PRÉVIA DO ABATE.
Sumário:A não aceitação dos custos relativos a amortizações extraordinárias de bens do activo corpóreo imobilizado, com base na mera preterição de obrigação de comunicação prévia, no prazo de 15 dias anterior ao abate dos bens, constitui uma consequência excessiva e desproporcionada.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão


I- Relatório

I…………….., LDA, melhor identificada nos autos, deduziu impugnação judicial contra o acto de liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) n.º……………., datada de 12.07.2010, e respetiva demonstração de liquidação de juros compensatórios n.º …………….. e de juros compensatórios por recebimento indevido n.º………………, na demonstração de acerto de contas n.º………………, todas respeitantes ao exercício de 2007, e contra o ato tributário consubstanciado na liquidação de IRC n.º……………, datada de 12.07.2010 e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º…………….., na demonstração de acerto de contas n.º………………., de 30.07.2010, todas respeitantes ao exercício de 2008. O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida nos autos, datada de 10 de Outubro de 2019, julgou procedente a Impugnação, anulando os atos de liquidação de imposto e de juros compensatórios e ordenando a restituição do montante indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.
Desta sentença foi interposto recurso pela Fazenda Pública. A recorrente alega nos termos seguintes:
«I. A Fazenda Pública considera que a decisão recorrida não faz, salvo o devido respeito, uma correta apreciação da matéria de facto relevante e não faz uma acertada aplicação e interpretação das normas legais aplicáveis ao caso sub judice.
II. A douta sentença recorrida considera que a autoridade tributária não põe em causa a verificação dos requisitos previstos nas alíneas a) e b) do Decreto Regulamentar 2/90.
III. Contudo, da análise do relatório de inspeção e das referidas normas do Decreto Regulamentar 2/90 não pode extrair-se que a AT não põe em causa, os pressupostos da norma porquanto, na realidade o relatório refere que “o contribuinte veio aos autos provar o abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização dos bens através dos autos que juntou ao processo (anexo 4), preenchendo desse modo, o requisito a que se refere a al. a) do nº 4 do Decreto Regulamentar nº 2/90.” (o sublinhado é nosso).
IV. Porém, o facto de cumprir os requisitos da alínea a) entregando autos preenchidos não significa que se encontre provado que os factos descritos no auto se tenham verificado. Com efeito a prova do abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização dos bens nos termos e para efeitos desta norma só fica concluída se estiverem preenchidas as três alíneas, não podendo ser dispensada a comunicação prévia com a antecedência prevista na alínea c) visto que é esta que proporciona à AT a possibilidade de verificar os factos que constam dos autos e da relação discriminada dos elementos do imobilizado em causa.
V. A douta sentença recorrida considerou ainda que a inobservância do prazo de 15 dias não se aplica ao caso concreto por considerar que a alínea c) não prevê as situações de abandono de bens, mas apenas de abate, desmantelamento ou inutilização.
VI. Porém, a alínea c) não pode ser dissociada do corpo do número 4 do artigo do qual fazem parte as três alíneas, que constituem requisitos cumulativos sob pena de, não sendo entregue a relação discriminativa (prevista na alínea b) do citado nº 4), não se poder identificar os elementos do imobilizado em causa. E, a falta de entrega da comunicação prevista na alínea c) com a antecedência de 15 dias não poderá ser considerada mera irregularidade porquanto a comunicação integra o conjunto de elementos cujo cumprimento permite a dedução pelo sujeito passivo – ainda que a AT não se tenha deslocado ao local para verificar os factos descritos nos autos previstos nas alíneas a) e b) do nº 4. Porém ter-lhe-ia de ser dada a possibilidade de o fazer.
VII. Importa ainda salientar que no caso concreto do encerramento das lojas, se revela mais adequado o termo desmantelamento dos bens do imobilizado e entrega do bem ao dono do espaço arrendado, não sendo assim adequado qualificá-los como abandonados, sobretudo se, como alega a impugnante, os mesmos porventura estiverem integrados no imóvel.
VIII. Acresce ainda referir que o facto de a AT ter solicitado elementos não demonstra por si só que a comunicação é meramente acessória e que como tal foi tratada pela AT.
IX. Pelo contrário, verificamos que em face da falta de comunicação à AT, o relatório de inspeção refere que esta falta é insuprível. O pedido de elementos pela AT não pode ser entendido como se a AT considerasse que a comunicação é uma obrigação acessória, mas como tentativa de esclarecer e verificar o cumprimento dos requisitos, tendo a AT concluído que os mesmos não se encontravam preenchidos. Acresce ainda que não é o comportamento da AT que determina se uma obrigação é acessória ou não.
X. Relativamente a esta matéria, em caso idêntico de entrega de imóvel ao senhorio, já se pronunciou o STA, em acórdão de 02-11-2011, processo nº 0719/11 (acórdão disponível em www.dgsi.pt).
XI. Refere ainda a douta sentença que a AT poderia ter verificado o declarado a posteriori, tendo dado relevância à declaração da testemunha F..................... que declarou que apesar das datas de encerramento comunicadas à AT, os estabelecimentos comerciais mantiveram-se na pose da impugnante nalguns casos, mais algumas semanas, não tendo a AT contactado a impugnante.
XII. Contudo, ainda que no âmbito da produção da prova se venha dizer que afinal a loja permaneceu mais tempo na posse do sujeito passivo, esta informação é agora irrelevante porquanto das comunicações efetuadas (com desrespeito pelo cumprimento da antecedência mínima de 15 dias), não resulta que os bens poderiam ser analisados posteriormente.
XIII. Assim sendo, salvo o devido respeito que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida ao julgar procedente a presente impugnação judicial, incorre assim em erro de julgamento e erro de interpretação de lei. Ao considerar provado o abate tal como descrito nos autos, e julgar meramente acessória a obrigação de comunicação prévia com antecedência mínima de 15 dias, a sentença recorrida viola a norma do artigo 10º, nº 4 do Decreto Regulamentar 2/90, bem como o artigo 607º, nº 4 do CPC.
XIV. Relativamente aos juros indemnizatórios, importa referir que a sentença recorrida violou o estatuído no nº 1 do artigo 43º da LGT porquanto não se vislumbra a existência de qualquer erro de direito, como ficou demonstrado supra.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação improcedente.
Porém, V. Exªas decidindo, farão a costumada JUSTIÇA.»
X

A impugnante I………………., LDA, contra-alegou, expendendo conforme segue:
«1 .ª A douta sentença recorrida julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra o ato tributário consubstanciado na liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) n.º………….., datada de 12.07.2010, e respetiva demonstração de liquidação de juros compensatórios n.º …………. e de juros compensatórios por recebimento indevido n.º………… , na demonstração de acerto de contas n.º………………, todas respeitantes ao exercício de 2007, e contra o ato tributário consubstanciado na liquidação de IRC n.º…………., datada de 12.07.2010, e respetiva liquidação de juros compensatórios n.º…………., na demonstração de acerto de contas n.º……………., de 30.07.2010, todas respeitantes ao exercício de 2008;
2 .ª O Tribunal a quo concluiu, em suma, que a factualidade em apreço consubstancia uma situação de abandono de bens, a qual não exige a verificação da exigência consagrada na alínea c) do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de comunicar com a antecedência mínima de 15 dias, que consubstancia uma obrigação acessória, pelo que, em qualquer caso, não poderia implicar a desconsideração fiscal do custo relevado contabilisticamente;
3 .ª Conforme supra se aludiu, o Ilustre Representante da Fazenda Pública insurge-se contra a douta sentença recorrida por considerar que “(…) a prova do abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização dos bens nos termos e para efeitos desta norma só fica concluída se estiverem preenchidas as três alíneas (…)”, assim como que se verifica um erro de julgamento da sentença recorrida, “Ao considerar provado o abate tal como descrito nos autos, e julgar meramente acessória a obrigação de comunicação prévia com antecedência mínima de 15 dias, a sentença recorrida viola a norma do artigo 10º, nº 4 do Decreto Regulamentar 2/90, bem como o artigo 607º, nº 4 do CPC.” (cf. artigo 23.º das alegações de recurso);
4 .ª Salvo o devido respeito, é entendimento da Recorrida que o presente recurso deve ser julgado improcedente;
5 .ª Em primeiro lugar, no n.º 4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, não existe nenhuma conjunção aditiva, que forneça a ideia de adição às diversas alíneas, conduzindo a uma interpretação de que seja necessário um preenchimento cumulativo da norma;
6 .ª Também facilmente se compreende a razão da alínea c) não se aplicar às situações de abandono, na medida em que a comunicação com a antecedência mínima de 15 dias não se justifica nos casos em que não se vai proceder à destruição/decomposição/alteração dos bens, pois os bens continuam a existir;
7 .ª Assim, estando por demais evidenciado que as três alíneas do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90 não são de aplicação cumulativa, e sendo certo que o Ilustre Representante da Fazenda Pública não controverte que as situações de abandono não têm enquadramento na alínea c), dúvidas não podem subsistir de que bem andou a sentença recorrida quando, qualificando a presente situação como abandono, não determinou a aplicabilidade do prazo de 15 dias previsto na alínea c) do n.º 4 do artigo 10.º daquele diploma;
8 .ª Improcede, assim, nesta parte o recurso apresentado pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública;
9 .ª Pretende ainda o Ilustre Representante da Fazenda Pública defender que a situação em presença não configura uma situação de abandono, mas de desmantelamento (cf. artigos 16.º e 17.º das alegações de recurso), caso em que já seria aplicável o prazo de 15 dias previsto na alínea c) do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90;
10 .ª Também aqui não se lhe assiste, com o devido respeito, qualquer razão, devendo improceder o presente recurso;
11 .ª Com efeito, e desde logo, importa salientar que o Ilustre Representante da Fazenda Pública não controverteu a matéria de facto dada como provada e não provada na sentença recorrida, incumprindo com um qualquer ónus de especificação da matéria de facto impugnada, previsto no artigo 640.º do Código do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT;
12 .ª Deste modo, não estando controvertida a matéria de facto dada como provada nos autos, a qualificação da presente situação como abandono tem de ser efetuada, naturalmente, à luz dos factos que estão dados como provados nos autos, os quais só permitem a conclusão de que a situação se configura, precisamente, como um abandono (cf. factos 2, 25, 26 e 27 do probatório da sentença recorrida);
13 .ª As considerações tecidas pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública nas suas alegações de recurso não têm, pois, a suscetibilidade de alterar a conclusão acima descrita;
14 .ª Com efeito, embora se afigure à Recorrida que não se encontra devidamente explicitada a razão pela qual o Ilustre Representante da Fazenda Pública entende que se trata de um desmantelamento e não de um abandono, o que é certo é que os factos dados como provados evidenciam, precisamente, que a situação configura um abandono;
15 .ª Acresce que, tanto quanto se consegue depreender das alegações de recurso, os pressupostos em que o Ilustre Representante da Fazenda Pública parece assentar o desmantelamento não se verificam no caso em apreço, na medida em que, no caso, não se está perante bens que “(…) possam ser ou não removidos” (cf. artigo 17.º das alegações de recurso), sendo que o litígio nos autos apenas se reporta aos bens incorporados nos estabelecimentos comerciais que foram encerrados (cf. facto 2 e 27 do probatório da sentença recorrida);
16 .ª Assim, no seguimento de defendido pela Recorrida e da matéria dada como provada pelo Tribunal Recorrido, a situação nos autos consubstancia um caso de abandono e não de desmantelamento, não sendo, por isso, exigível o cumprimento da comunicação com antecedência mínima de 15 dias, conforme descrito na alínea c) do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90;
17 .ª Deste modo, também perante o exposto, deve improceder o recurso apresentado, mantendo-se a sentença recorrida;
18 .ª Por fim, invoca ainda o Ilustre Representante da Fazenda Pública que a decisão recorrida não faz “(…) uma acertada aplicação e interpretação das normas legais ao caso sub judice. Ao (…) julgar meramente acessória a obrigação de comunicação prévia com antecedência mínima de 15 dias a sentença recorrida viola a norma do artigo 10º, nº 4 do Decreto Regulamentar 2/90, bem como o artigo 607º, nº 4 do CPC.” (cf. artigo 23.º das alegações de recurso);
19.ª Também aqui não lhe assiste qualquer razão, com o devido respeito;
20 .ª Conforme se evidenciou nos presentes autos, a obrigação consagrada no n.º 4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90 corresponde a uma obrigação acessória por não visar diretamente o apuramento/quantificação da obrigação tributária, mas permitir apenas a fiscalização por parte da administração tributária da conformidade da relevação contabilística e fiscal de uma determinada componente negativa do facto gerador do imposto, em linha com o disposto nos artigos 31.º e 59.º da LGT;
21 .ª Foi precisamente este o entendimento sufragado na sentença recorrida, em que se menciona que “De facto, a obrigação prevista na alínea c) do n.º4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º2/90 visa, tão só, permitir a verificação, por parte da Autoridade Tributária, da conformidade da relevação contabilística e fiscal, no caso, das amortizações extraordinárias, o que consubstancia uma obrigação acessória.”
(cf. p. 21 da sentença recorrida);
22 .ª Assim, tratando-se de uma obrigação acessória, não pode a sua inobservância ter como consequência a desconsideração fiscal de um custo contabilístico;
23 .ª Também não obsta a esta conclusão a circunstância de a Fazenda Pública alegar que a comunicação prévia com a antecedência de 15 dias tem como objetivo permitir que a Autoridade Tributária tenha a possibilidade de verificar os factos que constam nos autos, porque o abandono dos bens foi sempre comunicado antes do encerramento das lojas, tendo existido a oportunidade de realizar esta verificação;
24 .ª Adicionalmente, note-se que não é, naturalmente, o comportamento da administração tributária que define a qualificação desta obrigação como acessória, nem o Tribunal assim o entendeu;
25 .ª Assim, correspondendo a obrigação prevista na alínea c) do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90 a uma obrigação acessória, o seu alegado incumprimento não poderia gerar a desconsideração fiscal do custo contabilístico;
26 .ª Razão pela qual, também por este motivo deve o presente recurso ser considerado improcedente, mantendo-se a sentença recorrida;
27 .ª Sem prejuízo do exposto, ainda que se conclua pela procedência do recurso apresentado pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública, o que apenas por dever de patrocínio se admite, sem conceder, requer-se, nos termos artigo 636.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT, a ampliação do objeto do recurso tendo em vista a apreciação pelo Tribunal ad quem dos demais fundamentos invocados pela Recorrida na sua impugnação judicial, cujo conhecimento ficou prejudicado pela solução dada ao litígio;
28 .ª Caso não se entenda que as liquidações sub judice enfermam de erro de Direito por incorreta interpretação e aplicação dos preceitos legais supra enunciados, o que apenas por cautela de patrocínio se admite, sem conceder, então sempre deverão declarar-se as liquidações contestadas ilegais por violação do princípio da legalidade e aplicação de norma inconstitucional;
29 .ª Na verdade, tomando como correta a interpretação que a administração tributária adotou no caso vertente, segundo a qual é requisito indispensável à aceitação como custo fiscal a comunicação, com a antecedência mínima de 15 dias, do abandono dos elementos do ativo corpóreo imobilizado, atento o disposto na alínea c) do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar, então sempre ressalta à evidência a violação do princípio da legalidade fiscal;
30 .ª Com efeito, estando a matéria regulada pelo artigo 10.º, n.º 4, do Decreto Regulamentar n.º 2/90 incluída na reserva relativa da competência legislativa da Assembleia da República, nos termos do artigo 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP, por se relacionar com a incidência dos impostos, não poderia o Governo inovar, por via regulamentar, condicionando a própria aceitação dos custos em análise ao cumprimento de uma qualquer obrigação acessória;
31 .ª Assim, qualquer norma deste regulamento que se reporte a matérias englobadas na incidência do IRC, como o artigo 10.º, n.º 4, será organicamente inconstitucional, não podendo ser aplicada pelos Tribunais;
32 .ª Em face do exposto, não se poderá deixar de considerar que a norma do artigo 10.º, n.º 4, alínea c) do Decreto Regulamentar n.º 2/90, na interpretação enunciada e em conjugação com o artigo 33.º, n.º 1, alínea c) (atual 34), como organicamente inconstitucional, por violação dos artigos 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1 alínea i), da CRP, recusando-se a sua aplicação;
33 .ª Ademais, ainda que assim não se entenda, a norma em discussão deve sempre ser considerada ilegal por violação do princípio da legalidade consagrado no artigo 8.º da LGT;
34 .ª O artigo 10.º, n.º 4, do Decreto Regulamentar n.º 2/90, ao impor a obrigação acessória ao sujeito passivo de comunicar com a antecedência mínima de 15 dias o abandono dos elementos do ativo corpóreo imobilizado, infringiu o princípio da legalidade fiscal consagrado na lei ordinária (cf. artigo 8.º, n.º 2, alíneas c) e e) da LGT);
35 .ª Para além do disposto, nos termos do artigo 112.º, n.º 7, da CRP, não existe poder regulamentar sem fundamento numa lei anterior;
36 .ª Sucede que no caso em apreço, o artigo 10.º, n.º 4, alínea c), do Decreto Regulamentar n.º 2/90, veio impor com caráter geral e abstrato, uma determinada obrigação, sem que para tal existisse qualquer lei habilitante, o que também consubstancia uma inconstitucionalidade, por violação do princípio da procedência de lei;
37 .ª Ainda que a norma regulamentar se tenha baseado no artigo 30.º do Código do IRC, tal não foi indicado expressamente, pelo que sempre se estaria perante uma inconstitucionalidade formal (cf., neste sentido, entre outros, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 144/2009, de 24 de março de 2009, proferido no recurso n.º 414/08), o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais, impondo-se a anulação das autoliquidações em crise;
38 .ª Para além dos vícios apontados de inconstitucionalidade e ilegalidade por violação do princípio da legalidade, a aplicação das normas em referência deverá ainda ser recusada por padecerem as mesmas de inconstitucionalidade material por violação do princípio da proporcionalidade, visto que o artigo 10.º, n.º 4, do Decreto Regulamentar n.º 2/90, in casu a sua alínea c), em conjugação com o disposto no artigo 33.º, n.º 1, alínea c), do Código do IRC (atual artigo 34.º), e na interpretação de que fica precludida a aceitação como custo fiscal de amortizações excecionais, pelo simples facto de não terem sido comunicadas com a antecedência mínima de 15 dias, é uma norma manifestamente desproporcional, o que se invoca para os devidos efeitos legais;
39 .ª Em primeiro lugar, a presente obrigação não representa a “menor desvantagem possível”, sendo possível adotar outras medidas menos onerosas, assim o demonstra a circunstância do Código do IRC à data dos factos não consagrar esta comunicação, exigindo apenas para efeitos da consideração como custo fiscal a comprovação das causas anormais que estiveram na sua origem (cf. artigo 29.º, n.º 5, alínea b), do Código do IRC);
40 .ª Além disso, seria igualmente idóneo à prossecução do mesmo fim [controlo de exatidão dos factos declarados e prevenção da evasão fiscal] um controlo e exatidão dos factos a posteriori pela apresentação de documentos probatórios, designadamente os que integram o processo de documentação fiscal;
41 .ª Assim, atendendo à carga coativa que a presente obrigação comporta, facilmente se constata também a desproporcionalidade stricto sensu, na medida em que a consequência que resulta do incumprimento da norma em análise – a preclusão, para todo o sempre, da aceitação fiscal de um custo efetivo e comprovado da empresa – é uma medida demasiado excessiva face ao resultado;
42 .ª Em face do exposto, verifica-se também uma ilegalidade por aplicação da norma inconstitucional, qual seja o artigo 10.º, n.º 4, do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de janeiro, conjugado com o artigo 33.º, n.º 1, alínea c), do Código do IRC (atual 34.º), na interpretação enunciada, por violar o princípio da proporcionalidade lato sensu integrante do princípio do Estado de Direito Democrático consagrado no artigo 2.º da CRP, não consubstanciando a medida em questão uma medida necessária e proporcional stricto sensu;
43 .ª Ainda que assim não se entendesse, sempre existiria uma violação do princípio da proporcionalidade das medidas restritivas dos direitos, liberdades e garantias, nos termos do artigo 18.º, n.º 2 da CRP, dado que a presente obrigação acessória é claramente desproporcional face ao princípio da tributação de acordo com o rendimento real (cf. artigos 104.º, n.º 2, da CRP), o qual é corolário do princípio da capacidade contributiva e da igualdade com consagração no artigo 13.º da CRP, o que também se invoca para os devidos efeitos legais;
44 .ª Por fim, sem prejuízo do acima exposto, a liquidação dos juros compensatórios também padece de ilegalidade, na medida em que não se encontram reunidos os pressupostos para a sua aplicação nos termos do artigo 35.º da LGT, por não se verificar o elemento subjetivo, ou seja, o facto censurável ou culposo imputável à Impugnante, ora Recorrida;
45 .ª Razão pela qual, em face de todo o exposto, sempre deverá concluir-se pela anulação das liquidações adicionais de imposto e de juros compensatórios sindicadas.
Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado improcedente, por não provado, mantendo- se a sentença recorrida, ou, caso assim não se entenda, determinada a ampliação do presente recurso, conhecendo-se dos fundamentos que não foram apreciados, julgando-se procedente a impugnação judicial e determinada a anulação das liquidações contestadas…».
X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal, foi regularmente notificado, emitindo parecer no sentido da improcedência do recurso.
X
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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II- Fundamentação.
A sentença recorrida considerou provados os factos seguintes:
« 1. A Impugnante é uma sociedade comercial que tem por objeto ”A venda a reta- lho de confeções para homem, senhora, criança, incluindo sapatos, acessórios, perfumes e relógios”, a que corresponde o CAE 04711, encontrando-se enquadrada no regime normal de tributação em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas – cfr. certidão permanente a fls. 178 e 179 dos autos e fls. 170 do PAT;
2. Nos anos de 2007 e 2008, a Impugnante procedeu ao encerramento de seis estabelecimentos comerciais, designadamente:
- Loja no Centro Comercial Norte Shopping, Porto;
- Loja no Centro Comercial Península Galerias, Porto;
- Loja na Avenida Valbom, n. º9-A, Cascais;
- Loja no Centro Comercial Anadia Shopping, Funchal;
- Loja na Rua da Sé, Funchal
- Loja de Gondomar no Centro Comercial de Gondomar
- cfr. documentos n.ºs 1 a 6 juntos aos autos com a petição inicial e prova testemunhal;
3. A Impugnante deslocou-se ao Serviço de Finanças, para proceder à entrega de requerimento com o assunto “Pedido de Autorização para Auto Abate de Imobilizado Corpóreo e aceitação da desvalorização excecional”, datado de 12.01.2017, relativo às lojas sitas no Centro Comercial Norte Shopping e Centro Comercial Península Galerias, tendo a receção do aludido requerimento sido recusada naquele Serviço de Finanças, por não se encontrarem indicados o local e a data da destruição dos bens, conforme menção aposta na referida comunicação – cfr. documento n.º4 junto aos autos com a petição inicial;
4. Em 01.02.2007, a Impugnante apresentou, junto dos serviços da Administração Tributária, “Pedido de Autorização para Auto Abate de Imobilizado Corpóreo e aceitação de desvalorização excecional”, referente aos estabelecimentos designados “Loja de Península” e “Loja do Norte shopping”, com o seguinte teor:
Vem nos termos do n. º3 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 2/90, de 12.1 a empresa expor e requerer o seguinte:
1. O requerente registou contabilisticamente no exercício de 1991 a 2006 no ativo imobilizado corpóreo, nos estabelecimentos estáveis situados:
–Porto – Centro Comercial Norte Shopping R. Sara Afonso, 105/117, LJ 119 4450/841 Porto
-Porto – Centro Comercial – Península Galerias – Praça do Bom Sucesso,
Lj 123 4150/146 Porto
instalações elétricas, ar condicionado, e benfeitorias diversas.
2. Os bens que a empresa pretende abater estiveram sujeitos a desgaste mais rápido que o normal em consequência de laboração em mais que um turno, ou seja, 14 horas por dia, 363 dias por ano.
3. Note-se que derivado à especificidade da estrutura nos centros comerciais, todos os aparelhos eletrónicos têm um período de utilização de 24 horas por dia;
4. Dado o estabelecimento estar situado dentro de um Centro Comercial com grande afluência de público, está sujeito a condições intensas de exploração e consequentemente de redução de durabilidade do imobilizado;
5. Estes estabelecimentos vão encerrar em definitivo ao público:
- Loja da Península: 01.02.2007;
- Loja do Norte shopping: 30.01.2007;
6. Discriminação dos bens para abate: Anexo 1;
7. A empresa terá que deixar as benfeitorias efetuadas (tais como pavimento, rede de ar condicionado, rede de instalações elétricas, pinturas, rodapés, etc) investidas e não totalmente amortizadas.
8. Todas e quaisquer obras ou benfeitorias, incluindo a instalação de equipamentos, que a empresa tenha efetuado no locado, ficam a fazer parte integrante da loja em questão, não tendo a subarrendatária direito a qualquer indemnização, nem podendo alegar direito de retenção em relação às mesmas benfeitorias de acordo com as normas do Contrato de Utilização de Loja em Centro Comercial.
9. Devido às normas impostas pelos shoppings em causa a empresa deverá manter em perfeitas condições todos os equipamentos e bem como as benfeitorias deverão estar em bom estado. // (…) // Face ao exposto, a empresa vem requerer a aceitação como custo dedutível as amortizações excecionais e a aceitação do auto de abate no exercício de 2007 (…)” - cfr. fls. 172 e 173 do PAT;
5. Na sequência da comunicação referida no ponto que antecede, a Impugnante foi notificada, através do ofício n.º 015963, datado de 23.02.2007, para apresentar os seguintes documentos:
- Contrato de rescisão do arrendamento, dos estabelecimentos comerciais a encerrar;
- Mapa de amortização, anos de 2005 e 2006;
- Destino dos bens a abater ao imobilizado;
- Cópia das faturas dos bens/serviços adquiridos nos exercícios económicos de 2005 e 2006 – cfr. documento n.º 7, junto aos autos com a petição inicial;
6. Em 09.03.2007, a Impugnante procedeu à apresentação dos documentos e aos esclarecimentos solicitados através do ofício mencionado em 5) – cfr. documento n. º8, junto aos autos com a petição inicial;
7. Através do ofício n.º 024956, datado de 26.03.2007, a Impugnante foi notificada, para apresentar os seguintes documentos:
- Destino dos bens a abater, nomeadamente, computadores, impressoras, scanner, mobiliário, material de som e outros;
- Fatura correspondente ao Orçamento apresentado pelo Fornecedor P………………, Lda., NIPC ……………, de € 28 078,22”.
– cfr. documento n. º9, junto aos autos com a petição inicial;
8. Em 24.04.2007, a Impugnante apresentou resposta ao solicitado, com o seguinte teor:
Destino dos bens a abater, nomeadamente computadores, impressoras, scanner, mobiliário, material de som e outros.
Computadores, impressoras, scanner – foram retirados da loja e enviados para o nosso escritório para ser enviado para o lixo adequado;
Estes bens estão totalmente amortizados. Junto envio despacho emitido pelo Ministério das Finanças.
Aparelhagem de som – foi retirada pelo nosso fornecedor deste equipamento, encontrando-se desta nas instalações do mesmo. À semelhança dos computadores, estão totalmente amortizados.
Mobiliário – foram abandonados na loja dado que são encastrados, considerando-se na família de benfeitorias, reportando desta forma aos contratos enviados anteriormente.
“De acordo com os contratos de utilização de loja em centro comercial podemos constatar o seguinte, quando se verificar a sua revogação ou resolução o arrendatário será obrigado a deixar todas as benfeitorias que foram introduzidas nas lojas, que fazem parte integrante da mesma, sem qualquer direito a indemnização não podendo alegar direito a indemnização não podendo também alegar direito de retenção em relação a tais benfeitorias. Desta forma, de acordo com o ponto 8 do pedido de autorização entregue, enviámos cópias dos respetivos contratos onde poderão confirmar respetivamente:
- Norteshopping – a alínea 10.ª e 11.ª
- Península – alínea 7.ª
Enviamos a Guia de acompanhamento de resíduos da loja Norteshopping e as fotografias de remoção do lixo da loja Península e uma fotografia do Norteshopping antes do encerramento
- Fatura e orçamento do Fornecedor Prontal de 28 078,22€ (…).”
- cfr. documento n.º 10, junto aos autos com a petição inicial;
9. Em 18.07.2007, a Impugnante apresentou, junto dos serviços da Administração Tributária, “Pedido de Autorização para Auto Abate de Imobilizado Corpóreo e aceitação de desvalorização excecional”, referente ao estabelecimento sito em Cascais, na Av. …………, n.º 9 A, com a menção de que o mesmo encerrou definitivamente em 16.07.2007, indicando o contacto telefónico do Departamento de Manutenção (F.....................) e juntando, como Anexo 1, a discriminação dos bens para abate, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. fls. 175 e 176 do PAT;
10. Em 08.10.2007, a Impugnante apresentou, junto dos serviços da Administração Tributária, “Pedido de Autorização para Auto Abate de Imobilizado Corpóreo e aceitação de desvalorização excecional”, referente aos estabelecimentos sitos no Funchal, designadamente na Rua …………… e no Centro Comercial Anadia Shopping, nº …. a …., com a menção de que os mesmos encerrariam definitivamente em 13.10.2007, indicando o contacto telefónico do Departamento de Manutenção (F.....................) e juntando, como Anexo 1, a discriminação dos bens para abate, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. fls. 176 vs e 177 do PAT;
11. Em 11.10.2007, na sequência da comunicação efetuada, conforme ponto que antecede, a Impugnante foi notificada, através de fax, para informar em que data e hora iria proceder à destruição dos bens – cfr. documento n.º11, junto aos autos com a petição inicial;
12. Em resposta ao solicitado em 11), a Impugnante informou:
“ Relativamente ao Pedido de Auto de Abate de Imobilizado Corpóreo e aceitação de desvalorização excecional em duas lojas situadas na Madeira, a empresa não irá efetuar a destruição dos bens, o que a empresa pretende é dar conhecimento que irá abandonar o local e deixar as benfeitorias que incorporou nos imóveis arrendados nomeadamente, pinturas, pladur, envernizamento do chão e a instalação elétrica, conforme mencionado nos pontos 6 e 7.
No dia 16 de outubro do corrente o arquiteto F..................... irá encontrar- se na Madeira, podendo Vexas. entrar em contacto com o mesmo, a fim de validar o Pedido de Auto de Abate.” - cfr. documento n.º 12, junto aos autos com a petição inicial;
13. Através do ofício n.º 009026, datado de 04.02.2008, a AT solicitou à Impugnante a apresentação de documentos, designadamente:
- Decisão do competente órgão de gestão quanto ao abate de imobilizado
- Destino dos bens a abater, deve comprovar com documentos
- Auto de abate
- Contrato de cedência das instalações por parte da empresa, loja sita no Centro Comercial Anadia Shopping – Funchal.”
– cfr. fls. 182 vs. do PAT;
14. Os documentos e esclarecimentos solicitados, conforme ponto que antecede, foram remetidos pela Impugnante – cfr. documento n.º13, junto aos autos com a petição inicial;
15. Através do ofício n.º 28032, datado de 10.04.2008, a AT solicitou à Impugnante a apresentação de documentos, designadamente:
- Cópia da comunicação, rececionada pelo Serviço de Finanças, de desmantelamento/abate dos bens
- Indicação do método utilizado para a destruição dos bens e procedimentos subsequentes
- Cópia do auto de abate elaborado
- Destino dos bens abatidos ao imobilizado e/ou cópia de Guia/Fatura de transporte de bens para o Centro de Abate.”
- cfr. fls. 181 vs. do PAT;
16. Por carta datada de 13.05.2008, a Impugnante respondeu ao ofício referido em
15) – cfr. documento n.º 14, junto aos autos com a petição inicial;
17. Em 28.07.2008, a Impugnante apresentou, junto dos serviços da Administração Tributária, “Pedido de Autorização para Auto Abate de Imobilizado Corpóreo e aceitação de desvalorização excecional”, referente ao estabelecimento sito no Centro Comercial de Gondomar, com a menção de que os mesmo encerra definitivamente em 08.08.2008, indicando o contacto telefónico do Departamento de Manutenção (F.....................) e juntando, como Anexo 1, a discriminação dos bens para abate, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido – cfr. fls. 178 vs e 179 do PAT;
18. Com data de 22.10.2009, a AT emitiu o Ofício n.º 089678, dirigido à Impugnante, constando do mesmo, designadamente, o seguinte:
“ Na sequência do v/ pedido de autorização para aceitação como custos das quotas de reintegração equivalente ao valor líquido de 293.678,17€, com referência à loja de Gondomar – Centro Comercial de Gondomar loja …….., de elementos do v/ativo imobilizado corpóreo, por desvalorização excecional, en- trado no serviço de finanças de Lisboa 3, em 28 de julho de 2008, ficam V. Exas. por este meio notificados, nos termos dos artigos 37.º e 48.º do RCPIT, para no prazo de 10 (dez) dias apresentarem os seguintes documentos:
- Auto de abate, comprovando o abate físico, desmantelamento, abandono e/ou inutilização dos bens, assinado por duas testemunhas e identificados e comprovados os factos que originaram as desvalorizações excecionais;
- Mapa de amortizações anos de 2006 e 2007.
A falta de remessa destes elementos, determinará o parecer desfavorável ao p dido de aceitação fiscal. (…)” - cfr. fls. 180 do PAT;
19. Em 26.10.2009, na sequência das comunicações e pedidos efetuados nos pontos 4,9,10 e 17, foi emitida a Ordem de Serviço n.º OI2009077787, que deu origem a ação inspetiva interna, com âmbito limitado à verificação do IRC dos exercícios económicos de 2007 e 2008 – cfr. fls. 167v do PAT;
20. Notificada do Projeto de Correções do Relatório de Inspeção, emitido no âmbito da ação inspetiva, a Impugnante, em 01.06.2010, exerceu o direito de audição prévia, procedendo à junção de seis “autos de abandono físico de bens do Imobilizado Corpóreo”, assinados por duas testemunhas, referente às lojas encerradas e comunicações referidas nos pontos 4, 9, 10 e 17, constando dos mesmos a descrição dos bens, quantidade, ano de aquisição, valor de aquisição, valor contabilístico e valor líquido fiscal – cfr. anexo 4 do Relatório de inspeção Tributária, fls. 185 a 191, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
21. Da ação inspetiva referida em 19) resultou o relatório de inspeção tributária (RIT), datado de 11.06.2010, do qual consta designadamente, o seguinte:
(…) VIII Direito de audição – Fundamentação
Remete-se o Projeto de Relatório para o exercício do Direito de Audição nos termos do artigo 60.º da Lei Geral Tributária.
O contribuinte foi notificado para exercer o direito de audição nos termos do artigo 60.º da LGT e do artigo 60.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária, conforme N/notificação n.º 39545, de 14 de maio de 2010 (anexo3). Em exercício do direito de audição, o contribuinte veio aos autos provar o abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização dos bens, através dos autos que juntou ao processo (anexo 4), preenchendo, desse modo, o requisito a que se refere a al. a) do n.º4 do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de janeiro. Contudo, não cumpriu o disposto na alínea c) do n.º4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar n.º2/90, de 12 de janeiro, com a alteração dada pelo Decreto-lei n.º 211/2005, de 7 de dezembro, falta essa que é insuprível, nos termos da referida alínea c) na medida em que o contribuinte não comunicou ao serviço de finanças da área do local onde aqueles bens se encontravam com a antecedência mínima de 15 dias, o local, a data e a hora de abate, desmante- lamento ou inutilização e o total do valor líquido dos bens. Deste modo, não pode ser atendida a pretensão do contribuinte, pelo que se indefere totalmente o seu pedido, não se aceitando como custo do exercício de 2007, o valor de € 186.455,39 e para o exercício de 2008 o valor de € 293.687,17, referentes a amortizações extraordinárias de elementos do seu ativo imobilizado corpóreo. Efetivamente, o contribuinte nada disse quanto ao prazo previsto na alínea c) do n.º 4 do art.º 10.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90.
IX. Conclusão
Dado que o contribuinte não cumpriu o disposto na alínea c) do n.º4 do art. 10.º do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de janeiro, com a alteração dada pelo Decreto Lei n.º 211/2005, de 7 de Dezembro, falta que é insuprível, não pode ser atendido o seu pedido, pelo que não é aceite como custo do exercício de 2007, o valor de € 186.455,39, e para o exercício de 2008, o valor de € 293.687,17, referentes a amortizações extraordinárias de elementos do seu ativo imobilizado corpóreo. (…)” – cfr. Relatório de Inspeção Tributária, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a fls. 167 a 191 do PAT;
22. Na sequência do RIT, mencionado no ponto que antecede, e das correções técnicas elaboradas com os n.ºs ………….e……………, foram emitidas, pela Administração Tributária (AT), em nome da Impugnante, as seguintes liquidações adicionais de IRC:
- n.º………………, relativa ao exercício de 2007, no valor de € 42.101,52 (IRC);
- n.º………………, relativa ao ano de 2007, no valor de € 7.377,53 (juros compensatórios);
- n.º…………….., relativa ao ano de 2007, no valor de € 3.389,63 (juros compensatórios);
- n.º……………, relativa ao exercício de 2008, no valor de €44.834,55 (IRC).
- n.º………………., relativa ao ano de 2008, no valor de € 1.871,99 (juros compensatórios).
- cfr. documentos n.ºs 15 e 16, junto aos autos com a petição inicial e fls. 149 a 154 do PAT;
23. Em 05.10.2010, foram instaurados os processos de execução fiscal n.º ……………….. e n.º…………….., para cobrança coerciva das dívi- das referentes às liquidações referidas em 22) – cfr. fls. 155 e 162 do PAT;
24. Por despacho de 21.10.2010, foi autorizado, no âmbito dos processos executivos referidos no ponto que antecede, o pagamento dos valores em dívida, referidos em 23), em duas prestações mensais – cfr. documento n.º 17, junto aos autos com a petição inicial;
25. Devido ao encerramento das lojas referidas em 2), foram deixados, nas mesmas, bens do ativo imobilizado corpóreo que se encontravam afetos a cada um dos estabelecimentos e que consubstanciavam benfeitorias efetuadas pela Impugnante, incorporadas no imóvel arrendado – prova testemunhal;
26. As benfeitorias efetuadas pela Impugnante, incorporadas nos estabelecimentos comerciais que encerraram, referidos em 2), foram deixadas nos mesmos, devido às condições impostas, contratualmente, pelas entidades gestoras dos Centros Comerciais e por obsolescência de alguns bens – prova testemunhal;
27. As benfeitorias referidas no ponto 25) compreendem pavimentos, redes de ar condicionado, redes de instalações elétricas, pinturas, rodapés, móveis encastra- dos e outras estruturas fixas – cfr. prova testemunhal;
28. Devido ao encerramento das lojas referidas em 2), os bens não incorporados nos estabelecimentos comerciais em causa, como móveis não encastrados, material informático e vestuário, foram retirados dos mesmos, pela Impugnante – prova testemunhal;
29. A AT não contactou a Impugnante, no sentido de verificar, no local, o mencionado nos pontos 25 a 28 – prova testemunhal;
30. Em 26.11.2010 foi apresentada, neste Tribunal, a petição inicial que deu origem aos presentes autos – cfr. fls. 2 dos autos;
31. Em 01.01.2011, a Impugnante procedeu ao pagamento dos valores liquidados referentes a IRC e Juros Compensatórios, do exercício de 2007, no valor total de
€ 52.868,68 – cfr. fls. 265 a 268 dos autos, no SITAF;
32. Em 01.01.2011, a Impugnante procedeu ao pagamento dos valores liquidados referentes a IRC e Juros Compensatórios, do exercício de 2008, no valor total de
€ 46.706,54 – cfr. fls. 269 a 271 dos autos, no SITAF.
Factos não provados
Não existem factos não provados, em face das possíveis soluções de direito,
Quanto aos factos provados, a convicção do Tribunal fundou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos, no processo administrativo tributário, apesar de o mesmo não ter sido remetido na íntegra, bem como na posição assumida pelas partes.
Os factos constantes dos pontos 2, 25, 26,27, 28, foram considerados provados com base no depoimento das duas testemunhas inquiridas. // J..................., sócio gerente da Impugnante, à data dos factos, depôs de forma espontânea e com conhecimento efetivo dos procedimentos em causa, mostrando- se tal depoimento credível e esclarecedor. // A testemunha logrou descrever os procedimentos associados ao encerramento das lojas, designadamente, no que se refere ao destino dado às benfeitorias efetuadas pela Impugnante e demais bens afetos aos estabelecimentos. Esclareceu ainda que as obrigações decorrentes dos contratos celebrados com as entidades gestoras dos centros comerciais, determinaram o destino dado aos bens, designadamente, aos que estavam incorporados nas lojas. // F.................., encarregado de obras da Impugnante, afirmou ter acompanhado o encerramento dos estabelecimentos comerciais em causa, para além de outros estabelecimentos da Impugnante, esclarecendo, igualmente, os procedi- mentos seguidos aquando do encerramento dos mesmos. // A testemunha revelou conhecimento direto dos factos, pelo exercício das suas funções na Impugnante, tendo explicado de forma coerente e convincente que tipo de bens/ benfeitorias foram deixados nos estabelecimentos encerrados e os motivos que o determinaram, designadamente os deveres decorrentes dos contratos de arrendamento com as entidades gestoras dos centros comerciais. // Mais referiu que, apesar das datas de encerramento comunicadas à AT, os estabelecimentos comerciais mantiveram-se na posse da Impugnante após as mesmas, nalguns casos, mais algumas semanas.
No que respeita ao facto 29) a testemunha, F....................., afirmou que a Impugnante nunca foi contactada pela AT, a fim de verificar, no local, quais os bens que foram deixados nas lojas e que bens foram retirados.»
X
2.2. Direito
2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento em que terá incorrido a sentença recorrida. Para julgar procedente a impugnação, a sentença considerou que, apesar de a Impugnante ter procedido à comunicação prevista na alínea c), do n.º 4 do artigo 10.º do Decreto Regulamentar 2/90, não o fez com a antecedência determinada na mesma. Sem embargo, uma vez que está em causa obrigação acessória, tal omissão não teria como consequência a não aceitação justificada das amortizações em referência.
2.2.2. A recorrente censura o veredicto que fez vencimento na instância. Alega, para tanto, que, «verificamos que em face da falta de comunicação à AT, o relatório de inspeção refere que esta falta é insuprível. O pedido de elementos pela AT não pode ser entendido como se a AT considerasse que a comunicação é uma obrigação acessória, mas como tentativa de esclarecer e verificar o cumprimento dos requisitos, tendo a AT concluído que os mesmos não se encontravam preenchidos; em caso idêntico de entrega de imóvel ao senhorio, já se pronunciou o STA, em acórdão de 02-11-2011, processo nº 0719/11; ainda que no âmbito da produção da prova se venha dizer que afinal a loja permaneceu mais tempo na posse do sujeito passivo, esta informação é agora irrelevante porquanto das comunicações efetuadas (com desrespeito pelo cumprimento da antecedência mínima de 15 dias), não resulta que os bens poderiam ser analisados posteriormente».
Apreciação. Está em causa a aceitação como custos do exercício de amortizações extraordinárias do imobilizado, ocorridas em virtude do abandono do equipamento, instalado em seis lojas da impugnada, objecto de encerramento. As reintegrações e amortizações consideram-se custos ou perdas desde que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (artigo 23.º/1/g), do CIRC). «São aceites como custos as reintegrações e amortizações de elementos do activo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais os elementos do activo imobilizado que, com carácter repetitivo, sofrerem perdas de valor resultantes da sua utilização, do decurso do tempo, do progresso técnico ou de quaisquer outras causas» (artigo 28.º/1, do CIRC – versão vigente).
Nos termos do artigo 29.º, n.º 4 e 5 do CIRC, «[e]m relação a cada elemento do activo imobilizado deve ser usado o mesmo método de reintegração e amortização desde a sua entrada em funcionamento até à sua reintegração ou amortização total, transmissão ou inutilização. // O disposto no número anterior não prejudica: (…) // b) A consideração como custos de quotas de reintegração ou amortização superiores devido à superveniência de desvalorizações excepcionais provenientes de causas anormais devidamente comprovadas, aceites pela Direcção-Geral dos Impostos».
«Quando à data do balanço, os elementos do activo imobilizado corpóreo e incorpóreo, seja ou não limitada a sua vida útil, tiverem um valor inferior ao registado na contabilidade, devem ser objecto de amortização correspondente à diferença se for de prever que a redução desse valor seja permanente» (5.4.4. do POC, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 410/89, de 21 de Novembro).
A propósito da desvalorização excepcional de elementos do activo imobilizado, o artigo 10.º (n.º 1) do Decreto-Regulamentar n.º 2/90, de 12.01 (versão vigente à data), determinava que, «[n]o caso de se verificarem em elementos do activo imobilizado desvalorizações excepcionais provenientes de causas anormais devidamente comprovadas, poderá ser aceite como custo ou perda do exercício em que aquelas ocorrem uma quota de reintegração ou amortização superior à que resulta da aplicação dos métodos referidos no artigo 4.º».
Nos termos do n.º 4 do preceito, «[q]uando os factos que determinaram as desvalorizações excepcionais dos bens e o abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização ocorram no mesmo período de tributação, o valor líquido fiscal dos bens, corrigido de eventuais valores recuperáveis, pode ser aceite como custo ou perda do exercício desde que: // a) Seja comprovado o abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização dos bens, através do respectivo auto, assinado por duas testemunhas e identificados e comprovados os factos que originaram as desvalorizações excepcionais; // b) O auto seja acompanhado de relação discriminativa dos elementos do imobilizado corpóreo em causa, contendo, relativamente a cada bem, a descrição, o ano e o valor de aquisição, bem como o valor contabilístico e o valor líquido fiscal; // c) Seja comunicado ao serviço de finanças da área do local onde aqueles se encontrem, com a antecedência mínima de 15 dias, o local, a data e a hora do abate, desmantelamento ou inutilização e o total do valor líquido fiscal dos bens».
Por seu turno, do probatório resultam os elementos seguintes:
i) A Impugnante procedeu ao encerramento dos seis estabelecimentos comerciais em causa, e as benfeitorias, efetuadas e incorporadas nos estabelecimentos encerrados, foram deixadas nos mesmos, por tal decorrer do contrato de arrendamento e por alguns bens se encontrarem obsoletos (pontos 2, 8, 9, 10, 17, 25, 26 e 27).
ii) Os “autos de abate”, entregues pela Impugnante, contêm os elementos previstos nas alíneas a) e b) do artigo 10.º, n.º 4, do Decreto Regulamentar n.º2/90, de 12 de janeiro. (pontos 20 e 21).
iii) Em face dos elementos fornecidos pela impugnante, a posição da AT, tal como resulta do RIT, é a seguinte: «Dado que o contribuinte não cumpriu o disposto na alínea c) do n.º4 do art. 10.º do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de janeiro, com a alteração dada pelo Decreto Lei n.º 211/2005, de 7 de Dezembro, falta que é insuprível, não pode ser atendido o seu pedido, pelo que não é aceite como custo do exercício de 2007, o valor de € 186.455,39, e para o exercício de 2008, o valor de € 293.687,17, referentes a amortizações extraordinárias de elementos do seu ativo imobilizado corpóreo» (n.º 21).
A AT não questiona o preenchimento material dos pressupostos da amortização operada pela contribuinte, nos termos do artigo 10.º, n.º 4, do Decreto Regulamentar 2/90, de 12 de janeiro, antes invoca o incumprimento de uma obrigação formal (comunicação do abate, com a antecedência mínima de 15 dias). Todavia, tal incumprimento não se comprova nos autos, dado que a contribuinte apresentou os elementos solicitados pela AT, disponibilizou-se para as vistorias consideradas necessárias, oferecendo o contacto dos seus funcionários responsáveis pelas lojas em causa e efectuou as comunicações de encerramento das lojas, em momento concomitante a tal encerramento (n.ºs 4, 9, 10, 17 do probatório). A recorrente reconhece a completude do dossier fiscal apresentado(1). A alegada preterição de obrigação formal de comunicação prévia, com a antecedência mínima de 15 dias em relação ao abate dos bens; não logra pôr em causa a verificação material dos pressupostos da amortização. O exercício dos poderes de fiscalização da AT não foi objecto de qualquer preclusão, dado que em face dos elementos fornecidos pela contribuinte (autos de abate com lista discriminativa dos bens), aquela não contactou a segunda, com vista à comprovação dos elementos fornecidos (n.ºs 25 a 29, do probatório).
A recorrente invoca também a doutrina do Acórdão do STA de 02.11.2011, P. 0719/11, segundo o qual, «[o] abate em imobilizado, decorrente da dedução como custo de benfeitorias efectuadas em imóvel arrendado, em montante superior ao que resultaria das quotas do artigo 4.º do DR 2/90, de 12 de Janeiro, por não renovação do contrato, deve ser considerado como desvalorização excepcional para efeitos do artigo 10.º deste DR, e, como tal, dependente de prévia aceitação por parte da DGCI, o que não tendo acontecido determina a sua não aceitação como custo».
Sucede, porém, que a orientação do Acórdão em referência não se aplica ao caso em exame nos autos, dado que a AT reconhece a verificação material dos pressupostos da desvalorização excepcional do imobilizado, reconhece a completude dos elementos apresentados, recebeu sucessivas comunicações da contribuinte e solicitou a esta os esclarecimentos considerados necessários sobre os abates em causa (n.os 19 a 21 do probatório). Pelo que a não aceitação dos custos em apreço, com base na preterição de obrigação de comunicação prévia, no prazo de 15 dias anterior ao abate dos bens, constitui uma consequência excessiva e desproporcionada, que a correcta interpretação do preceito do artigo 10.º/4, do Decreto-Regulamentar n.º 2/90, de 12.01, não consente.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não merece censura, não incorre em erro ou vício, pelo que deve ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
DISPOSITIVO
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)

(1ª. Adjunta)

(2ª. Adjunta)

________________
(1) RIT, n.º 21 do probatório.