Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07535/14
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:05/15/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
GARANTIA DE QUE GOZAM OS CRÉDITOS DE I.M.I.
PRIVILÉGIO IMOBILIÁRIO ESPECIAL.
PREFERÊNCIA FACE A HIPOTECA.
PLURALIDADE DE CRÉDITOS ENVOLVIDOS PELO MESMO TIPO DE GARANTIA.
Sumário:
1. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
2. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
3. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.
4. Os créditos de I.M.I., quando incidentes sobre o imóvel penhorado no processo de execução fiscal, gozam de privilégio imobiliário especial incidente sobre o mesmo bem imóvel cujos rendimentos a eles estão sujeitos, desde que inscritos para cobrança no ano da penhora ou nos dois anteriores, podendo tal privilégio estender-se até à data da venda de acordo com a jurisprudência do S.T.A., a qual perfilhamos (cfr.artºs.735, nº.3, e 744, nº.1, do C.Civil, “ex vi” do artº.122, nº.1, do C.I.M.I.).
5. Os privilégios imobiliários especiais, relativos a I.M.I., de que se valem os mencionados créditos fazem com que os mesmos prefiram face ao crédito de que é titular uma reclamante, o qual se encontra garantido por hipoteca, assim devendo ser pagos com preferência em relação a este (cfr.artº.751, do C.Civil).
6. Integrando o concurso de credores uma pluralidade de créditos envolvidos pelo mesmo tipo de garantia ou de preferência de pagamento, haverá que distinguir conforme estas estejam, ou não, sujeitas a registo, prevalecendo, no primeiro caso, a garantia de pagamento que primeiro tenha sido inscrita no registo (cfr.artº.6, do C.R.Predial) e, no segundo, de harmonia com a regra “prior in tempore potior in jure”, a garantia que em primeiro lugar tiver sido constituída (cfr.artº.748, do C.Civil).


O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.57 a 63 do presente processo, através da qual reconheceu e graduou créditos em incidente que corre por apenso ao processo de execução fiscal nº.3140-2005/102662.3 e aps., visando a cobrança coerciva de dívidas de I.M.I., no montante total de € 6.192,19 e a tramitar no 2º. Serviço de Finanças de Amadora.
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O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.80 a 86 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-Encontra-se documentado nos autos que o crédito exequendo (que nos termos do artº.240 nº.2 do Código de Procedimento e Processo Tributário não carece de ser reclamado) de IMI dos anos de 2006 e 2007 respeita ao imóvel penhorado, o que deveria ser levado ao probatório;
2-Com efeito, consta deste processo de verificação de créditos, a fls.21 e seg., certidão de dívidas onde se menciona expressamente que os processos de execução fiscal nºs. 3140200701020501, 3140200701058762, 3140200801044885 e 3140200801088319, integram a quantia exequenda e respeitam ao IMI do imóvel penhorado nos autos;
3-De acordo com o disposto no artº.122, n°1 do Código de Imposto Municipal sobre Imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei 287/2003, de 12 de Novembro, o imposto municipal sobre imóveis goza das garantias especiais prevista no Código Civil para a contribuição predial;
4-O art° 744 do Código Civil dispõe que os créditos por contribuição predial, inscrito para cobrança no ano corrente na data da penhora e nos dois anos anteriores, têm privilégio sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos àquela contribuição;
5-Acrescendo que, nos termos do disposto no art° 8, do Decreto-Lei 73/99, de 16 de Março (Regime Jurídico dos Juros de Mora), os créditos de juros de mora gozam dos mesmos privilégios das dívidas sobre que incidem;
6-Tendo a penhora sido efectuada em 2009, beneficiam de privilégio creditório os créditos de IMI reclamados e exequendos respeitantes ao imóvel penhorado, inscritos para cobrança nos anos de 2007, 2008 e 2009;
7-Deveriam por conseguinte os créditos de IMI dos anos de 2006 e 2007 inscritos para cobrança em 2007 e 2008 respectivamente (processos de execução fiscal n.°s 3140200701020501, 3140200701058762, 3140200801044885 e 3140200801088319), bem como os respectivos juros, ter sido graduados de acordo com o privilégio creditório de que beneficiam, juntamente com o crédito de IMI do ano de 2008;
8-Por outro lado, atendendo ao principio do inquisitório que enforma todo o processo tributário, corporizado no art. 13 n.° 1 do CPPT, e ao facto de o crédito exequendo não carecer de ser reclamado, deveria, em caso de dúvida, o que não acontece nos autos (mesmo que não estivessem já juntos aos autos os elementos de prova necessários), o meritíssimo juiz desenvolver ou ordenar as diligências necessárias ao esclarecimento dos factos;
9-A sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por desconformidade com os preceitos supra mencionados, não merecendo por isso ser confirmada;
10-Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o recurso e revogada a douta sentença recorrida, como é de Direito e Justiça.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do provimento do presente recurso (cfr.fls.100 e 101 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.58 e 59 dos autos):
1-O " ... , S.A., Sociedade Aberta", é detentor dos créditos garantidos por hipoteca, registada em 16/08/1996 e por penhora registada em 26/11/2007, sobre o imóvel penhorado no processo de execução de que o presente constitui apenso, no montante de € 165.759,34 (cfr.documentos juntos a fls.13 a 20 dos presentes autos; certidão junta a fls.96 a 98 do processo de execução fiscal apenso);
2-Os créditos reclamados pela Fazenda Pública estão titulados pela certidão de fls.21 a 26 dos autos e dizem respeito a IMI incidente sobre o imóvel penhorado na execução, referente ao ano de 2008, inscrito para cobrança em 2009;
3-Os créditos exequendos respeitam a IMI de 2003 a 2007 (cfr.documentos juntos a fls. 54, 55, 145, 147, 149, 151, 153, 155, 157 e 159 do processo de execução fiscal apenso);
4-Em 18/12/2009, foi registada a penhora efectuada pela Fazenda pública que incidiu sobre a fracção autónoma designada pela letra "AA", sita na Rua Prof. Dr. ... n°16, 1° Dto., Massamá, 2745-803 Queluz, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Massamá sob o art. 930 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Queluz sob o nº.109/20020709 - AA (cfr.certidão junta a fls.96 a 98 do processo de execução fiscal apenso).
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Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
5-Em 8/6/2005, a Fazenda Pública instaurou a execução fiscal nº.3140-2005/102662.3 e aps., visando a cobrança coerciva de dívidas de I.M.I., relativas aos anos de 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007, no montante total de € 4.406,93, a tramitar no 2º. Serviço de Finanças de Amadora, no qual surge como executado ... , com o n.i.f. 184 087 481, e de que os presentes autos de reclamação de créditos constituem apenso (cfr.documentos juntos a fls.53, 54, 55, 85, 145, 147, 149, 151, 153, 155, 157 e 159 processo de execução fiscal apenso);
6-A penhora identificada no nº.4 supra, foi levada a efeito no âmbito do processo de execução fiscal nº.3140-2005/102662.3 e aps. de que os presentes autos de reclamação de créditos constituem apenso (cfr.cópia da caderneta predial urbana da fracção autónoma penhorada junta a fls.99 e 100 do processo de execução fiscal apenso; certidão junta a fls.96 a 98 do processo de execução fiscal apenso);
7-O executado é devedor à Fazenda Pública de crédito referente a I.M.I. dos anos de 2006 e 2007, de entre os créditos exequendos identificados no nº.3 supra, inscritos para cobrança em 2007 e 2008, respectivamente, no montante de € 1.784,84, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, sendo incidentes sobre o imóvel penhorado no processo de execução (cfr.certidão junta a fls.21 a 26 dos presentes autos; documentos juntos a fls.96 a 98, 153, 155, 157 e 159 processo de execução fiscal apenso);
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos em cada um dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida ponderou, em síntese, julgar procedentes as reclamações de créditos que originaram o presente processo. Relativamente aos créditos exequendos de I.M.I., considerou que os mesmos não gozavam de qualquer privilégio creditório imobiliário, mas apenas da garantia conferida pela penhora. Nestes termos, reconheceu e graduou os créditos em presença do seguinte modo:
1º. Crédito reclamado pela Fazenda Pública referente a I.M.I. do ano de 2008 e respectivos juros;
2º. Crédito reclamado pelo " ... , S.A., Sociedade Aberta" e respectivos juros até três anos por força da garantia emergente da hipoteca (registo em 16/8/1996);
3º. Crédito reclamado pelo " ... , S.A., Sociedade Aberta" na parte referente aos juros que excedem o limite temporal de três anos (penhora em 26/11/2007);
4º. Créditos exequendos (penhora em 18/12/2009).
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar e como supra se alude, que se encontra documentado nos autos que o crédito exequendo (que nos termos do artº.240 nº.2 do Código de Procedimento e Processo Tributário não carece de ser reclamado) de I.M.I. dos anos de 2006 e 2007 respeita ao imóvel penhorado, o que deveria ser levado ao probatório. Que consta deste processo de verificação de créditos, a fls.21 e seg., certidão de dívidas onde se menciona expressamente que os processos de execução fiscal nºs. 3140200701020501, 3140200701058762, 3140200801044885 e 3140200801088319, integram a quantia exequenda e respeitam ao I.M.I. do imóvel penhorado nos autos (cfr.conclusões 1 e 2 do recurso), com base em tal alegação pretendendo, segundo percebemos, consubstanciar erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Voltando ao caso concreto, remete-se o recorrente para a factualidade aditada ao probatório por este Tribunal e supra exarada (cfr.nºs.5 a 7 da matéria de facto), factualidade essa que concretiza, se bem percebemos, o que defende o apelante quanto ao que se deve extrair da produção de prova documental no âmbito dos presentes autos.
Nestes termos, deve este Tribunal concluir pela existência de erro de julgamento de facto de que padece a decisão recorrida no que se refere aos créditos exequendos de I.M.I. dos anos de 2006 e 2007, inscritos para cobrança, respectivamente, em 2007 e 2008, assim sendo forçoso julgar procedente este fundamento do recurso.
Defende, por último e em síntese, o apelante que tendo a penhora sido efectuada em 2009, beneficiam de privilégio creditório os créditos de I.M.I. reclamados e exequendos respeitantes ao imóvel penhorado, inscritos para cobrança nos anos de 2007, 2008 e 2009. Que deveriam, por conseguinte, os créditos de I.M.I. dos anos de 2006 e 2007 inscritos para cobrança em 2007 e 2008 respectivamente (processos de execução fiscal nº.3140200701020501, 3140200701058762, 3140200801044885 e 3140200801088319), bem como os respectivos juros, ter sido graduados de acordo com o privilégio creditório de que beneficiam, juntamente com o crédito de I.M.I. do ano de 2008 (cfr.conclusões 3 a 9 do recurso), com base em tal alegação pretendendo, supomos, consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal vício.
A sentença objecto do presente recurso, na sua fundamentação, pondera que os créditos exequendos de I.M.I., relativos aos anos de 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007, porque não se encontra documentado nos autos que os mesmos digam respeito ao imóvel penhorado, não gozam de privilégio creditório imobiliário, nos termos das disposições conjugadas do artº.122, do C.I.M.I., e artºs.735 e 744, nº.1, do C.Civil, mas apenas da garantia conferida pela penhora (registada em 18/12/2009 - cfr.nº.4 do probatório).
Com base em tal entendimento, no dispositivo da sentença exarada na 1ª. instância, tais créditos encontram-se graduados em 4º. lugar, tudo conforme mencionado supra para onde se remete.
Da factualidade aditada ao probatório (cfr.nºs.5 a 7 do probatório), os créditos exequendos de I.M.I. dos anos de 2006 e 2007, inscritos para cobrança, respectivamente, em 2007 e 2008, e no montante de € 1.784,84, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, gozam de privilégio creditório imobiliário visto que incidentes sobre o imóvel penhorado no processo de execução.
Ora, tais créditos de I.M.I., porque incidentes sobre o imóvel penhorado no processo de execução, gozam de privilégio imobiliário especial incidente sobre o bem imóvel cujos rendimentos a eles estejam sujeitos, desde que inscritos para cobrança no ano da penhora ou nos dois anteriores, podendo tal privilégio estender-se até à data da venda de acordo com a jurisprudência do S.T.A., a qual perfilhamos (cfr.artºs.735, nº.3, e 744, nº.1, do C.Civil, “ex vi” do artº.122, nº.1, do C.I.M.I.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 25/6/98, rec.22143; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 10/3/2004, rec.117/04; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 29/4/2004, rec.113/04; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 19/5/2004, rec.630/03; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/11/2012, proc. 5898/12).
Nestes termos, os privilégios imobiliários especiais, relativos a I.M.I., de que se valem os mencionados créditos exequendos fazem com que os mesmos prefiram face ao crédito de que é titular o reclamante " ... , S.A., Sociedade Aberta", o qual se encontra garantido por hipoteca, assim devendo ser pagos com preferência em relação a este (cfr.artº.751, do C.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/11/2012, proc.5898/12; Salvador da Costa, O Concurso de Credores, Livraria Almedina, 1998, págs.182 e 189).
No que respeita aos restantes créditos exequendos de I.M.I. (relativos aos anos de 2003, 2004, 2005), dado não gozarem de qualquer privilégio imobiliário, antes e somente da garantia resultante da penhora, a qual igualmente abrange os juros, não devem preferir a crédito hipotecário em sede de reclamação de créditos (cfr.ac.Tribunal Constitucional nº.362/2002, I série A do D.R., de 16/10/2002; ac.Tribunal Constitucional nº.363/2002, I série A do D.R., de 16/10/2002; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 30/4/2002, rec.197/02; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/11/2012, proc.5898/12).
Refira-se, por último, que integrando o concurso de credores uma pluralidade de créditos envolvidos pelo mesmo tipo de garantia ou de preferência de pagamento, haverá que distinguir conforme estas estejam, ou não, sujeitas a registo, prevalecendo, no primeiro caso, a garantia de pagamento que primeiro tenha sido inscrita no registo (cfr.artº.6, do C.R.Predial) e, no segundo, de harmonia com a regra “prior in tempore potior in jure”, a garantia que em primeiro lugar tiver sido constituída (cfr.artº.748, do C.Civil; Salvador da Costa, O Concurso de Credores, Livraria Almedina, 1998, pág.285).
Rematando, o recurso merece provimento, não podendo manter-se a decisão recorrida, a qual será revogada e substituída pelo presente acórdão que organizará a graduação de créditos nos termos supra examinados, ao que se procederá na sua parte dispositiva.
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DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO, REVOGAR A DECISÃO RECORRIDA E REFAZER A GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS NOS SEGUINTES TERMOS, devendo as custas da execução ser pagas de acordo com o artº.262, nº.2, do C.P.P.T.:
1º. Crédito exequendo relativo a I.M.I. dos anos de 2006 e 2007, inscrito para cobrança, respectivamente, em 2007 e 2008, e no montante de € 1.784,84, conjuntamente com o crédito reclamado pela Fazenda Pública, referente a I.M.I. do ano de 2008, na quantia de € 574,36, e correspondentes juros de mora vencidos e vincendos até ao mês, inclusive, em que foi realizada a venda;
2º. Crédito reclamado pelo " ... , S.A., Sociedade Aberta" e respectivos juros até três anos por força da garantia emergente da hipoteca (registo em 16/8/1996);
3º. Crédito reclamado pelo " ... , S.A., Sociedade Aberta" na parte referente aos juros que excedem o limite temporal de três anos (penhora em 26/11/2007);
4º. Restantes créditos exequendos (penhora em 18/12/2009).
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Condena-se o executado em custas, somente em 1ª. Instância.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 15 de Maio de 2014


(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Pereira Gameiro - 2º. Adjunto)