Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:8/22.5 BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:06/01/2023
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:IMPUGNAÇÃO ARBITRAL
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
REJEIÇÃO
Sumário:Salvo situações excecionais, é inadmissível a impugnação de decisões interlocutórias proferidas no processo arbitral tributário.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I. RELATÓRIO

A Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante Impugnante ou AT) veio apresentar impugnação da decisão interlocutória arbitral proferida a 17.12.2021, pelo tribunal arbitral coletivo constituído no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no processo a que aí foi atribuído o n.º 765/2019-T, ao abrigo dos art.ºs 27.º e 28.º do DL n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária – RJAT).

Nas suas alegações, concluiu nos seguintes termos:

“a) Constitui objeto da presente impugnação a Decisão arbitral de 17-12-2021, por Tribunal Arbitral em matéria tributária constituído, sob a égide do CAAD, no âmbito do processo que correu termos sob o n.º 765/2019-T.

a) Importa, antes de mais, sintetizar, a factualidade relevante para a presente Impugnação, necessária para compreender os vícios imputados ao despacho arbitral e à oportunidade da presente impugnação e recorribilidade do ato impugnado.

b) Foi apresentado pela Impugnada pedido de pronúncia arbitral cujos termos correram sob o n.º de processo arbitral 765/2019-T, no âmbito do qual foi notificada às Partes a decisão arbitral final proferida nos autos em 20-052020, na sequência da qual a Impugnante interpôs, junto do STA, recurso para uniformização de jurisprudência nos termos do n.º 2 e 3 do artigo 25.º do RJAT, tendo em conta a jurisprudência emanada pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA), referente, à questão da determinação da percentagem do IVA dedutível, resultante dos custos suportados pelo sujeito passivo com serviços de utilização mista, afetos tanto a operações tributadas como a operações isentas.

c) Em 22-09-2021, no âmbito desse recurso, cujos termos correram sob o processo n.º 65/20.9BALSB, foi proferido acórdão pelo Pleno da Secção de Contencioso Tributário STA, no qual se anula a decisão arbitral final proferida, sem que, contrariamente a arestos anteriores sobre exatamente a mesma matéria, se tenha determinado a baixa dos autos à instância arbitral para posteriores diligências de provas e substituição da decisão arbitral impugnada por outra nos termos apontados no acórdão de recurso (cf. a título de exemplo o acórdão do STA, em que a Recorrida era inclusive a ora Impugnada, de 04-11-2020, proferido no processo n.º 100/19.3BALSB).

d) A Impugnada notificada do acórdão do STA apresenta, em 2021-10-12, Requerimento ao presidente do Tribunal Arbitral requerendo a produção de prova adicional e, que o Tribunal apreciasse, questões de Constitucionalidade que alegou terem sido formuladas no Processo sem que o Tribunal delas tivesse tomado conhecimento.

e) Nesta sequência, veio o Tribunal a proferir a Decisão junta como documento n.º 1, no sentido de que:

«Pelo que se referiu, a imposição constitucional de apreciação das questões de inconstitucionalidade suscitadas «durante o processo», impõe que as questões sejam apreciadas tal como foram no requerimento de 12-10-2021.

f) Como se peticiona, entende-se que a Decisão arbitral impugnada incorre em nulidades tipificadas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT, sendo por isso suscetível de impugnação arbitral para o TCA Sul, a qual, por força do disposto nos artigos 644.º, n.º 2, alíneas b), g) e h), 645.º e 647.º, n.º 2 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 281.º do CPPT e artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, é-o como impugnação autónoma, com subida imediata, em separado e efeito suspensivo.

g) No que concerne à alínea b) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC (decisão que aprecie a competência absoluta do Tribunal), considera-se que o seu preenchimento é patente face à factualidade acima descrita, para que se remete, pois é na Decisão arbitral que aqui se impugna, que o Tribunal a quo, na sequência de requerimento da Impugnada, reconhece que, não obstante este mesmo Tribunal arbitral se encontrar, nos termos do artigo 23.º do RJAT, já dissolvido por força da prolação da decisão arbitral final em 20-05-2020, tem competência material para o repristinar por ter sido proferido acórdão pelo STA em recurso para uniformização de jurisprudência que anula aquela decisão, reabrindo assim em consequência o processo arbitral.

h) Acresce que, o Tribunal Arbitral, decidiu reabrir o Processo para como observaremos, tomar apreciar questões de constitucionalidade, não formuladas no Processo (senão depois de decidido, transitado em julgado e arquivado).

i) Pelo que por força do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC deve ser aceite a presente impugnação arbitral autónoma, com subida imediata e efeito suspensivo.

j) Mesmo que assim não se entenda, por cautela e dever de representação, está-se perante a situação descrita na alínea g) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC (decisão proferida depois da decisão final), pois, como decorre da factualidade acima descrita, para que se remete uma vez mais, de modo a evitar repetições inúteis, a Decisão arbitral impugnada foi proferida em 17-12-2021, após prolação por este Tribunal arbitral de decisão de mérito sobre o pedido de pronúncia arbitral, datada de 20-05-2020, a qual veio ser anulada por acórdão proferido pelo STA no âmbito de recurso de uniformização de jurisprudência, por se entender que a pronúncia de mérito pelo Tribunal a quo sobre a questão decidenda nos autos (de substância e não de mera forma, pois esteve em causa a apreciação da questão referente à determinação da percentagem do IVA dedutível, resultante dos custos suportados pelo sujeito passivo com serviços de utilização mista, afetos tanto a operações tributadas como a operações isentas) se encontrava em oposição com a jurisprudência emanada pelo STA no seu acórdão lavrado no Recurso nº 970/13 em 03.06.2015.

k) Assim, entende-se, atento mormente o disposto no artigo 195.º, n.º 3 do CPC, que sem prejuízo da referida anulação da decisão arbitral final pelo STA, tal não impede que a Decisão arbitral aqui impugnada se considere proferida após aquela, tanto mais que houve recurso de mérito de tal decisão final incidindo exatamente sobre o direito aplicável à questão de fundo a resolver nos autos.

l) Pelo que por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC deve ser aceite a presente impugnação arbitral autónoma, com subida imediata e efeito suspensivo.

m) Pelo que por força do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC deve ser aceite a presente impugnação arbitral autónoma, com subida imediata e efeito suspensivo.

n) Mesmo que assim não se entenda, por cautela e dever de representação, está-se perante a situação descrita na alínea h) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC (decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil), por força da gravidade dos vícios imputados ao despacho arbitral impugnado, de nulidade por pronúncia indevida atenta a sua incompetência material para a sua auto-repristinação e consequente reabertura do processo arbitral e bem assim a violação do direito ao contraditório (decisão surpresa), pois se estes vícios não forem apreciados no âmbito da presente impugnação, permitir-se-á que o processo arbitral, que devia estar extinto, prossiga, conduzido por Tribunal que, contrariamente ao defendido no despacho aqui recorrido, se entende ser materialmente incompetente, e que proferirá nova decisão arbitral.

o) Em suma, como melhor explicitado se seguida, verifica-se que o despacho arbitral impugnado incorre no vício de pronúncia indevida e ainda na violação do princípio do contraditório (decisão surpresa), pelo que por força das disposições conjugadas dos artigos 26.º, 27.º, 28.º, n.º 1, alíneas c) e d) e n.º 2 do RJAT, e bem assim dos artigos 644.º, n.º 2, alíneas b), g) e h), 645.º e 647.º, n.º 2 do CPC aplicáveis ex vi artigo 281.º do CCPT e artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, deve a presente impugnação ser admitida, com subida imediata, em separado e efeito suspensivo.

p) Quanto aos fundamentos da impugnação e no que concerne ao vício de pronúncia indevida, a título preliminar refira-se que os acórdãos do TCA Sul proferidos no processo n.º 08513/15, em 12/16/2015, e n.º 09156/15, em 09-06-2016, entendem que no conceito de “pronúncia indevida”, para além do excesso de pronúncia, se incluem as situações em que o tribunal arbitral funcionou de modo irregular ou em que excedeu a sua competência.

q) Prosseguindo, entende-se que se verifica a incompetência do tribunal arbitral, sendo o despacho arbitral impugnado passível de anulação, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT, por vício de pronúncia indevida, pois não existe norma legal habilitante para que o Tribunal arbitral dissolvido, conhecendo da sua própria competência, se auto-repristine e determine o retomar do processo arbitral e bem assim ordene a ampliação da matéria de facto, não sendo tal reabertura determinada pelo acórdão proferido pelo STA proferido em sede de recurso para uniformização de jurisprudência, que, contrariamente ao que sucedeu em outros arestos semelhantes, tomou expressamente a opção de se limitar a anular a decisão arbitral e não determinar a baixa do processo à primeira instância arbitral para a referida ampliação da matéria de facto.

r) Efetivamente, decorre expressamente do artigo 23.º do RJAT que o tribunal arbitral se dissolve na data da notificação da decisão e arquivamento do processo, e não se encontra no RJAT nenhum artigo que dê sequer a ideia de que a decisão deve ser reformulada pelo mesmo tribunal.

s) Termos em que se deve concluir que se verifica a incompetência do tribunal arbitral, sendo o despacho arbitral impugnado passível de anulação, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT, por vício de pronúncia indevida.

t) Acresce que, contrariamente ao que pretende o Tribunal a quo, tal não decorre tão pouco do vertido no artigo 46.º, n.º 9 da LAV, referido pelo STA no seu segundo acórdão, nem com apoio do artigo 24.º, n.º 3 do RJAT.

u) Determina-se no artigo 46.º n.º 9 da LAV que o tribunal estadual não pode conhecer do mérito da causa, sendo que para as questões previstas em convenção de arbitragem, apenas e só o tribunal arbitral terá competência para o seu julgamento e determina o n.º 10 do artigo 46.º da LAV que «Salvo se as partes tiverem acordado de modo diferente, com a anulação da sentença a convenção de arbitragem volta a produzir efeitos relativamente ao objecto do litígio.», pelo que o que decorre da LAV é que a convenção de arbitragem que volta a produzir efeitos, e não que o mesmo processo retoma sem a decisão arbitral anulada, pelas mãos do mesmo Tribunal que a proferiu, o que desde logo invalida a interpretação na qual o Tribunal a quo suporta a sua competência material para prosseguir os autos arbitrais e proferir nova decisão.

v) Vem ainda na Decisão arbitral impugnada, ao abrigo do artigo 24.º, n.º 3 do RJAT, ficcionar-se que a Impugnada suscitou nova pronúncia arbitral, afirmando-se ademais que não se exige que essa nova pronúncia tenha de ser feita por um Tribunal Arbitral diferente do que proferiu a decisão anulada, mas tal interpretação não tem na letra da lei um mínimo de correspondência com o disposto em tal norma legal, por duas ordens de razão: a primeira - foi proferida decisão de mérito no processo arbitral e foi apresentado recurso sobre esta mesma decisão arbitral que voltou a apreciar o mérito, concluindo ter havido erro de julgamento pelo Tribunal a quo; e a segunda – a norma legal menciona expressamente o vocábulo “nova pronúncia arbitral”, cujo prazo se conta a partir da decisão arbitral.

w) Em primeiro lugar, quer da epígrafe do artigo 24.º do RJAT, que serve de referência interpretativa, quer do disposto no seu n.º 3, e atenta a factualidade acima descrita, dúvidas não há que foi proferida uma decisão de mérito, tendo o recurso para o STA sido sempre interpretado, a par do recurso para o TC, como as duas situações em que excecionalmente é possível recorrer do mérito da decisão – cf. entre outros os acórdãos do TCA Sul de 16-12-2015, proferido no processo 08513/15 e de 13-05-2021, proferido no processo n.º 6/18.3BCLSB.

x) Não se está assim, como pretende o Tribunal a quo, perante a análise de aspetos meramente formais da decisão arbitral, pois a mesma foi anulada por acórdão proferido pelo STA no âmbito de recurso de uniformização de jurisprudência, por aí se entender que a pronúncia de mérito pelo Tribunal a quo sobre a questão decidenda nos autos, referente à determinação da percentagem do IVA dedutível, resultante dos custos suportados pelo sujeito passivo com serviços de utilização mista, afetos tanto a operações tributadas como a operações isentas, se encontrava em oposição com a jurisprudência emanada pelo STA.

y) A que acresce ainda que o fundamento de ilegalidade foi apresentado pela Impugnada, pelo que também por este motivo falharia a possibilidade de aplicação do artigo 24.º, n.º 3, dado o desfecho da ação ser-lhe imputável.

z) Pelo que, atentas as razões acima identificadas, não pode ser convocado o disposto no artigo 24.º, n.º 3 do RJAT para reabrir o processo e muito menos pelo mesmo Tribunal arbitral.

aa) Em segundo lugar, a norma legal menciona expressamente o vocábulo “nova pronúncia arbitral” cujo prazo se conta a partir da decisão arbitral, o se encontra em consonância com o citado artigo 46.º, n.º 10 da LAV, em que o se retoma é a convenção de arbitragem e não o processo arbitral.

bb) Assim, mesmo que se possa ficcionar que a Impugnada requereu nova pronúncia arbitral tal implica necessariamente que o CAAD providencie pela constituição de um tribunal ex novo, seguindo-se o mesmo procedimento de seleção de árbitros, o que certamente implicará, atentas as regras de sorteio, a constituição de um tribunal diferente.

cc) De facto, nos termos do artigo do RJAT, a apresentação de uma nova petição determina o início da fase de procedimento, sendo que o início do processo arbitral, apenas surge após esta fase de procedimento, com a constituição do Tribunal arbitral (cf. artigo 15.º do RJAT), até porque se assim não for, o prazo máximo de um ano para proferir a decisão arbitral, previsto no artigo 21.º do RJAT não se pode ter como recomeçado, contando-se necessariamente da constituição do Tribunal arbitral nos termos do artigo 11.º, n.º 8 do RJAT, ou seja, do termo do prazo referido na notificação prevista na alínea c) do n.º 1.

dd) Não se desconhece que há situações em que anulada a decisão arbitral, o processo arbitral é reaberto e o mesmo Tribunal arbitral profere nova decisão, mas tal decorre de existir uma determinação pelo Tribunal Superior nesse sentido, que ordena a baixa dos autos à instância arbitral e substituição da decisão arbitral impugnada por outra nos termos apontados no acórdão de recurso/impugnação, o não sucede nos presentes autos, como decorre da factualidade descrita, para que se remete, e da qual resulta que o STA vem taxativamente afirmar que apenas quis determinar apenas a anulação da decisão arbitral.

ee) Pelo que não só falta a norma legal habilitante para que se possa repristinar o Tribunal arbitral dissolvido, e o retomar do mesmo processo arbitral como inexiste por parte do Tribunal Superior a ordem da baixa do processo para prolação de nova decisão arbitral sem o vício invalidante, pelo que se deve concluir que se verifica a incompetência do tribunal arbitral, sendo o despacho arbitral impugnado passível de anulação, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT, por vício de pronúncia indevida.

ff) No mesmo vício, incorre a Decisão Impugnada, ao Decidir apreciar de questões de inconstitucionalidade não formuladas no processo.

gg) Como referido, foi proferida a Decisão Arbitral de 20-05-2020, junta como Doc. 3.

hh) Aquela Decisão Arbitral, não foi impugnada, nem recorrida senão no já referido Recurso de Oposição, apresentado pela Impugnante junto do STA.

ii) Nesse Recurso foi proferido Acórdão do STA, que também veio a transitar em julgado, sem que dele apresentasse reclamação a Impugnada.

jj) Apenas após este Acórdão do STA ter transitado em julgado (a 07/10/2021), apresentou a Impugnada junto do Tribunal Arbitral (extinto), Requerimento no qual requereu a apreciação de novas questões de inconstitucionalidade, que são as mesmas cuja apreciação solicitara ao STA.

kk) Tendo o Tribunal Arbitral na Decisão Impugnada decidido reabrir o Processo para conhecer destas novas questões.

ll) Contrariamente ao concluído pelo Tribunal Arbitral, a Decisão de 20-05-2021, efectivamente transitou em julgado, em tudo quanto não foi o objecto do Recurso de Oposição de Julgados apresentado junto do STA..

mm) De resto, o próprio Acórdão do STA que, por um lado, estas questões não constituíram objecto daquele recurso e, por outro lado, que a Decisão Arbitral ali recorrida, não decidira com base na inconstitucionalidade.

nn) Pelo que, se impõe a conclusão de que, nos termos julgados pelo STA, em Acórdão transitado em julgado, a Decisão de 20-05-2021, não decidiu com base em inconstitucionalidade e, bem assim, que dessa decisão, não recorreu a Impugnada, no caso, para o Tribunal Constitucional.

oo) Mais, como também foi decidido no Acórdão do STA, aquelas questões, não foram obejcto daqueles autos, pelas razões ali expostas e, também não foram alegadas, em tempo algum, perante o Tribunal Arbitral, senão já após transitada em julgado quer a Decisão Arbitral (anulada), quer o Acórdão do STA.

pp) Pelo que, a pretensão do Tribunal Arbitral feita constar da Decisão Impugnada, de reabrir o Processo, para conhecer daquelas questões, não se pode ter senão por uma flagrante pronúncia indevida, porquanto aquelas questões nunca foram submetidas à apreciação do Tribunal, senão quando este já estava extinto, vício esse que por provado deve determinar a procedência da presente impugnação.

qq) Acresce que, se verifica também, uma Oposição dos fundamentos com a decisão, porquanto a Decisão Impugnada, pretende apreciar questões de constititucionalidade, que decidiu considerar terem sido submetidas à apreciação do Tribunal Arbitral, no Processo, mas, como se observou, e a própria Decisão Impugnada assume aquelas questões nunca foram colocadas à apreciação do Tribunal no Processo.

rr) Resumindo, deve a presente impugnação ser julgada procedente e, consequentemente, ser anulado o despacho arbitral impugnado e nessa medida os demais termos subsequentes, com as demais consequências legais.

Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve a presente impugnação ser julgada procedente e, consequentemente, ser anulada a Decisão arbitral impugnada e nessa medida os demais termos subsequentes, com as demais consequências legais, com o que se fará Justiça!”.

Foi ordenada a notificação do Banco S…,S.A. (doravante Impugnado) para alegar, nos termos consignados no art.º 144.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), ex vi art.º 27.º, n.º 2, do RJAT, tendo sido apresentadas contra-alegações, nas quais foram formuladas as seguintes conclusões:

“A. Em primeiro lugar, uma cabal compressão da situação sub judice impõe que se compreenda devidamente o que resultou do acórdão do STA de 22 de Setembro de 2021 proferido no processo n.º 65/20.9BALSB o que, por força do trânsito em julgado daquele acórdão, se tornou vinculativo para os demais tribunais: a. O acórdão arbitral proferido em 15.05.2020 no processo 765/2019-T não decidiu com base na inconstitucionalidade dos n.º 2 e 3 do artigo 23.º do Código do IVA, pese embora no acórdão arbitral se ter referido que “Mas, mesmo que o método previsto no ponto 9 do Ofício Circulado assegurasse mais eficazmente os referidos princípios, a falta da sua previsão em diploma de natureza legislativo nacional, em matéria em que não é directamente aplicável qualquer norma de direito da União Europeia, sempre seria um obstáculo intransponível à sua aplicação, por força do princípio da legalidade, em que se insere o da hierarquia das fontes de direito, à face do qual não é constitucionalmente admissível que seja reconhecido a actos de natureza não legislativa «o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos» (artigo 112.º, n.º 5, da CRP), para mais em matéria sujeita ao princípio da legalidade fiscal, em que se está perante matéria inserida na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República [artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n 1, alínea i), da CRP]” ;

b. O STA não conhece a questão de inconstitucionalidade explicada pela aqui Impugnada nas contra-alegações de recurso porque: i. O recurso de uniformização de jurisprudência da AT não abrange essa questão;

ii. Na situação em concreto, o STA não está em condições de proferir uma decisão em substituição do acórdão arbitral pelo que atribuiu ao respetivo acórdão efeito meramente anulatório, devendo as partes retirar as consequências dessa anulação;

iii. Os efeitos meramente anulatórios a retirar do acórdão do STA sobre o acórdão arbitral abrangem todas as questões (e não só as intrinsecamente ligadas à prova de que os custos comuns são afetos à atividade de disponibilização de viaturas e à concessão de crédito) porque, no ponto 3.4 do acórdão do STA (em que é abordada apenas a matéria da inconstitucionalidade avançada pela Impugnada) é mencionado que: “Ora, se o tribunal de recurso entende que não está em condições de dizer se a administração aplicou corretamente a lei e não é, por sua vez, chamado a aplicar a norma em causa ao caso concreto, também não tem que apreciar a constitucionalidade dessa lei”.

B. Por decisão arbitral de 15.12.2021, impugnada pela AT, entendeu o coletivo de árbitros (e, com o devido respeito, bem) determinar o prosseguimento do processo arbitral para conhecimento de tal questão de forma exemplar e em estrito cumprimento com o decidido no acórdão do STA já transitado em julgado como cuidou de explicar na aludida decisão.

C. Das passagens da decisão arbitral impugnada supra transcritas (no artigo 29.º) resulta inequívoco que o Tribunal Arbitral decidiu em determinado sentido em estrita obediência ao que o STA julgou no acórdão proferido nos autos de recurso para uniformização de jurisprudência. Foi porque o STA considerou que (i) o recurso interposto pela AT não abrangeu as questões de inconstitucionalidade (e, por conseguinte, o STA não as podia conhecer naquele contexto), e ainda (ii) que a decisão arbitral não teve como fundamento a violação dos princípios constitucionais invocados (nomeadamente o da legalidade), que o Tribunal Arbitral constatou estar obrigado a prosseguir os autos para conhecimento das questões de inconstitucionalidade invocadas.

D. A Impugnada considera ter demonstrado, à luz do direito e da jurisprudência citada, que a decisão arbitral aqui em causa, porque não é uma decisão final que põe fim ao processo, não é susceptível de impugnação junto deste Tribunal ao abrigo dos artigos 27.º e 28.º do RJAT, assim rebatendo o que vem alegado pela AT quando julga aplicável o processo de impugnação da decisão arbitral a uma decisão interlocutória como a que está em causa nos autos.

E. Convocando a jurisprudência do TCA Sul exarada no acórdão proferido no processo 83/18.7BCLSB, tem de se concluir no mesmo sentido: “a referência [no artigo 27.º do RJAT] à impugnação da decisão arbitral visa, claramente, a decisão final proferida no processo e que implica a dissolução do tribunal arbitral”.

F. A impugnação da decisão arbitral prevista no artigo 27.º do RJAT, além de não revestir a natureza de um recurso, mas sim de uma ação de anulação da decisão arbitral, apenas poderá servir para impugnar decisões finais e não interlocutórias.

G. Se pretendermos procurar um local próximo à arbitragem tributária, mais rapidamente teríamos de atender ao disposto no CPTA e na Lei da Arbitragem Voluntária (artigo 185.º-A do CPTA ex vi al. c) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT) do que ao disposto no CPC quanto aos recursos ordinários de apelação.

H. A Lei da Arbitragem Voluntária dispõe, no artigo 46.º, a possibilidade de ser pedida a anulação de sentenças junto dos tribunais judiciais. E, por sentença, só se pode entender uma decisão que decida a causa e ponha termo ao processo (não abrange, portanto, qualquer decisão interlocutória) – cfr. artigo 152.º, n.º 2 do CPC. A Lei da Arbitragem Voluntária é ainda mais impressiva ao só prever a impugnação (ação de anulação) de sentenças quando na al. g) do n.º 1 do artigo 59.º desta Lei se refere que o tribunal estadual é competente para conhecer a “A impugnação da sentença final proferida pelo tribunal arbitral, de acordo com o artigo 46.º”.

I. O STA, no processo n.º 052/19.0BCLSB, decidiu que as formas de reação às decisões arbitrais são, apenas, as que constam nos artigos 25,º 27.º e 28.º do RJAT, não sendo consentida a aplicação de legislação subsidiária, nomeadamente, do CPPT. E esclareceu ainda naqueles autos de recurso que o disposto no artigo 29.º do RJAT não traduz legislação subsidiária aplicável em matéria de reação a decisões arbitrais, e é apenas aplicável ao processo arbitral e à sua tramitação junto do tribunal arbitral (ie., até este proferir decisão arbitral final e não após este a proferir).

J. Assim, à luz da jurisprudência do STA, será ainda de concluir que as disposições do CPC, ex vi CPPT, não são aplicáveis, como defende a AT na impugnação. Com efeito, não tendo o legislador previsto, especificadamente, a possibilidade de impugnação de decisão interlocutória (como, por exemplo, o fez na Lei da Arbitragem Voluntária no respetivo artigo 18.º, n.º 9, preceito este que aqui não se julga aplicável até pelo que resulta da própria jurisprudência do STA acabada de referenciar – a legislação subsidiária é, tão só, aplicável ao processo arbitral junto do tribunal arbitral), não são admissíveis quaisquer outras formas de reação à decisão arbitral (seja ela final ou interlocutória), pelo que deve a impugnação ser rejeitada.

K. Caso se entenda que é admissível a impugnação de uma decisão interlocutória proferida pelo tribunal arbitral – o que aqui por mera cautela se equaciona –, sempre se dirá que in casu não se verifica qualquer situação excecional que o permita, nem a AT a logrou demonstrar na impugnação. Com efeito, além de o processo arbitral ser particularmente célere, a AT teria sempre a possibilidade de lançar mão da impugnação da decisão (final) que o Tribunal Arbitral viesse a tomar e caso este julgasse procedentes as questões de inconstitucionalidade (obviamente que não as julgando procedentes qualquer impugnação perderia utilidade).

L. concluiu-se ainda que a situação sub judice não se subsume à previsão da al. b) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC porque não estamos perante uma decisão que aprecia a competência absoluta do tribunal, tendo presente a definição do artigo 96.º do CPC: i. O despacho arbitral não aprecia qualquer questão relacionada com a sua competência absoluta em razão da matéria: esta está determinada no RJAT e na Portaria de Vinculação do CAAD (Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e surgiu quando a Impugnada submeteu o pedido arbitral.

ii. Não existe qualquer tribunal hierarquicamente inferior ou superior que se deva ter em conta (não existem na arbitragem!).

iii. As regras de competência internacional não revelam em absoluto na arbitragem tributária.

iv. Não estamos perante uma preterição de tribunal arbitral porque esta situação apenas abrange os casos em as partes convencionam dirimir um litígio junto de um tribunal arbitral mas não o fazem (preterem esse tribunal arbitral); é, portanto, uma hipótese prevista para os casos em que um tribunal judicial se declara competente e uma parte julga que esse litígio deve ser dirimido junto do tribunal arbitral.

M. De resto, como amplamente se explicou nas presentes contra-alegações, a decisão arbitral impugnada apenas se limitou a extrair as consequências do Acórdão do STA que anulou a decisão arbitral mas que, quanto a uma questão, porque não incluída no objeto do recurso de uniformização de jurisprudência interposto pela AT, não houve pronúncia por nenhum tribunal e requer que seja apreciada pelo arbitral.

N. A situação sub judice também não se subsume à al. g) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC que abrange aqueles casos “de decisão proferida depois da decisão final”. Não podemos defender que estamos perante uma decisão proferida depois da decisão final porque simplesmente a decisão final não existe.

O. A situação sub judice também não se subsume à al. h) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC que abrange aqueles casos “das decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil”. Como vimos, o processo arbitral é célere e a decisão final que apreciaria as questões de inconstitucionalidade seria rapidamente proferida e, sendo caso disso, a AT poderia impugnar a decisão final junto deste Tribunal alegando as nulidades que assim entendesse.

P. Deve improceder a nulidade invocada no Capítulo II.1.1 da impugnação (alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT, a saber, o de pronúncia indevida). Resulta dos pontos 3.4 e 3.5 do acórdão do STA, que em concreto nestes autos, o STA atribuiu ao respetivo acórdão um efeito meramente anulatório do acórdão arbitral. E, por isso, o processo arbitral está sem qualquer decisão quer quanto à questão que versou o recurso de uniformização de jurisprudência, quer quanto às demais como é o caso da inconstitucionalidade.

Q. Quanto à questão de saber se o mesmo tribunal arbitral pode prosseguir os autos para conhecimento da questão de inconstitucionalidade, entende-se, como na decisão arbitral impugnada, que sim, não sendo obstáculo a isso a sua dissolução aquando da prolação da decisão arbitral anulada pelo STA, por várias ordens de razão.

R. Mais uma vez repita-se, é o que se retira do acórdão do STA transitado em julgado quando este refere «cabendo às partes e, se for caso disso, ao tribunal arbitral extrair as consequências da anulação» (cfr. ponto 3.3 do Acórdão do STA).

S. E esclarece-se ainda que: muito contrariamente ao que defende a AT (artigos 56.º e ss. da impugnação), na decisão arbitral impugnada convoca-se o n.º 4 do artigo 24.º do RJAT para demonstrar que é o próprio RJAT que permite que o mesmo tribunal arbitral (e não um outro) prossiga com a apreciação de um novo pedido arbitral quando o anterior tenha findado sem decisão de mérito.

T. Assim, concluiu-se, tal como na decisão arbitral impugnada, que foi o próprio STA que ditou que o mesmo tribunal arbitral (que viu a decisão anulada) prosseguisse os autos arbitrais para extrair as consequências daquela anulação. Tendo o acórdão do STA força de caso julgado, qualquer tribunal está adstrito a ele (cfr. 205.º, n.º 4 da CRP), não merecendo a decisão impugnada qualquer censura e não estando a mesma ferida de qualquer nulidade.

U. Em abono do que vem dito, cumpre ainda acrescentar um outro argumento. Pode-se achar justificado que o n.º 9 do artigo 46.º da LAV seria subsidiariamente aplicável e que, por força da anulação do acórdão arbitral determinada pelo STA, ter-se-ia de submeter um novo pedido. Tal não deve ser lido dessa forma pelos seguintes motivos: i. O n.º 9 do artigo 46.º da LAV seria, em teoria, apenas aplicável quando estivéssemos perante a anulação de uma decisão arbitral no âmbito de um processo de impugnação de uma decisão arbitral e não quando perante um recurso para uniformização de jurisprudência;

ii. Com efeito, o n.º 9 do artigo 46.º da LAV insere-se no capítulo VIII desta lei que apenas regula “as situações de impugnação da sentença arbitral”;

iii. As situações em que é permitida a impugnação de sentença final arbitral na LAV são as elencadas nos n.º 3 do artigo 46.º da LAV que não contemplam a anulação de sentenças no âmbito de recursos para uniformização de jurisprudência:

iv. Na situação vertente, a anulação do acórdão arbitral foi determinada pelo STA no âmbito de um recurso de uniformização de jurisprudência e não no âmbito de uma impugnação de decisão arbitral;

v. De resto, repita-se que a decisão arbitral limita-se a extrair as consequências do acórdão do STA como amplamente se explicou supra.

V. Deve ainda improceder os vícios invocados pela AT no Capítulo II.1.2 da impugnação, a saber, ponúncia indevida e oposição dos fundamentos.

W. Ora, vendo bem as coisas, não se pode deixar passar em claro que neste momento não houve ainda qualquer pronúncia sobre as questões de inconstitucionaldiade!!! O tribunal arbitral apenas sustentou na decisão arbitral que as ia conhecer após alegações das partes.

X. Na verdade, e se assim o entender, a AT apenas poderá lançar mão da impugnação da decisão arbitral final que conhecer as sobreditas questões de inconstitucionalidade, pelo que deve ser julgada improcedente a impugnação ora deduzida. Esta impugnação não pode ser usada – como pretende a AT – como uma espécie de providência cautelar, pelo que, com o devido respeito, parece-nos que também esta nulidade não poderá ser acolhida por este Venerando Tribunal.

Y. De resto, considerando o teor do acórdão do STA devidamente, é precisamente porque as questões de inconstitucionalidade não terem sido conhecidas pelo STA - por não integrarem o objecto do recurso da AT e porque também não integraram o conteúdo decisão arbitral anulada -, e porque o STA se limitou a anular a decisão arbitral (e não a substituiu!) e porque demandou que o mesmo tribunal arbitral extraisse as consequências da anulação, que aquelas questões podem e devem ser reconhecidas pelo tribunal arbitral.

Z. Neste contexto, a invocação de questões de inconstitucionalidade antes de o tribunal arbitral proferir a decisão final (a anterior foi, repise-se, anulada) obriga a que delas tome conhecimento, mesmo que não estejam configuradas na petição inicial em idêntico sentido, sob pena de por força da decisão proferida pelo STA (e que se limitou, nos termos acima referido, a anular a decisão arbitral) o pedido arbitral apresentado deixar de ter uma decisão final.

AA. Na situação sub judice, atendendo ao conteúdo e aos efeitos meramente anulatórios do acórdão do STA sobre o acórdão arbitral, aliado ao dever de pronúncia sobre a questão da inconstitucionalidade (280.º/1/b), da CRP e 70.º/1/b), da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional), o despacho arbitral não merece qualquer censura, devendo assim ser julgada totalmente improcedente a impugnação da decisão arbitral.

NESTES TERMOS, E NOS MAIS DE DIREITO, DEVE A IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO ARBITRAL SER REJEITADA POR IRRECORRIBILIDADE DAS MESMA E INIDONEIDADE DO MEIO PROCESSUAL, OU, CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, SER JULGADA TOTALMENTE IMPROCEDENTE, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS”.

O Ilustre Magistrado do Ministério Público (IMMP) foi notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146.º, n.º 1, do CPTA.

A Impugnante foi notificada para, querendo, se pronunciar sobre as questões prévias suscitadas pela Impugnada, nada tendo dito.

Colhidos os vistos legais, vem o processo à conferência.

São as seguintes as questões a decidir:

Questão prévia suscitada pela Impugnada:

a) Deve a presente impugnação ser liminarmente indeferida, por inimpugnabilidade da decisão interlocutória?

Questões suscitadas pela Impugnante:

b) Há nulidade do despacho arbitral, por pronúncia indevida?

c) Houve violação do princípio do contraditório?

d) Verifica-se oposição dos fundamentos com a decisão?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. Para a apreciação da presente Impugnação estão provados os seguintes factos:

1) A 14.11.2019, a ora Impugnada apresentou junto do CAAD pedido de constituição de tribunal arbitral (cfr. fls. 1 a 337 da certidão do processo arbitral, a que correspondem futuras referências sem menção de origem, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).

2) Na sequência do referido em 1), foi constituído tribunal arbitral coletivo, tendo dado origem ao processo n.º 765/2019-T (cfr. fls. 355).

3) No âmbito do processo mencionado em 2), foi proferida, a 15.05.2020, decisão arbitral, na qual se julgou parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral (cfr. fls. 406 a 429, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).

4) Na sequência da decisão referida em 3), foi interposto recurso para uniformização de jurisprudência, junto do Supremo Tribunal Administrativo (STA), que aí deu origem ao processo n.º 65/20.9BALSB (cfr. fls. 461).

5) No âmbito do processo mencionado em 4), foi proferido, a 22.09.2021, Acórdão pelo Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, no qual se concedeu provimento ao recurso e se anulou a decisão arbitral mencionada em 3) na parte recorrida (cfr. fls. 468 a 494).

6) O Acórdão mencionado em 5) transitou em julgado a 07.10.2021 (cfr. fls. 522).

7) Foi proferido despacho, no âmbito do processo arbitral mencionado em 2), a 15.12.2021, com o seguinte teor:

«Imagem no original»






























…” (cfr. fls. 549 a 565).

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Questão prévia suscitada pela Impugnada

Considera, antes de mais, a Impugnada que, uma vez que a decisão arbitral em causa não é uma decisão final, mas sim uma decisão interlocutória, a mesma é inimpugnável.

Vejamos.

Nos termos do art.º 27.º, n.º 1, do RJAT, a decisão arbitral pode ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo, sendo que a impugnação pode ser apresentada considerando um dos fundamentos taxativamente elencados no n.º 1 do art.º 28.º do mesmo diploma.

Assim, nos termos desta última disposição legal, a decisão arbitral é impugnável com fundamento em:

“a) não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

b) oposição dos fundamentos com a decisão;

c) pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia;

d) violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artigo 16.º”.

Atento o disposto no art.º 29.º, n.º 1, do RJAT, é de considerar a disciplina subsidiariamente aplicável, de onde se destacam as normas constantes do CPPT, do CPTA e do CPC [cfr. art.º 29.º, n.º 1, als. a), c) e e), do RJAT].

Considerando este contexto, cumpre, sinteticamente, explanar em que momento e contexto foi proferida a decisão arbitral objeto da presente impugnação. Assim:

a) Foi proferida decisão final arbitral, a 15.05.2020;

b) Na sequência de recurso para uniformização de jurisprudência interposto para o STA, a referida decisão foi anulada na parte recorrida, por acórdão que transitou em julgado;

c) Nesse seguimento, a ora Impugnada requereu que fosse realizada a reunião prevista no art.º 18.º do RJAT e que fosse conhecida questão de inconstitucionalidade;

d) Foi proferida decisão interlocutória, na sequência de tal requerimento, da qual se extrai, em síntese, que, sendo de acatar o decidido pelo STA, está ali ínsito que o tribunal arbitral continua a existir, sendo por essa via de entender que caberia àquele tribunal arbitral extrair as consequências da anulação. Nesse seguimento, indeferiu a realização de diligências requeridas pela Impugnada, esclareceu serem passíveis de conhecimento as questões de inconstitucionalidade e determinou-se a prossecução do processo, com alegações simultâneas sobre as referidas questões.

Como resulta claro, não estamos perante uma decisão final do processo arbitral, mas sim perante uma decisão interlocutória.

Sobre a impugnabilidade de decisões interlocutórias proferidas pelos tribunais arbitrais já teve este TCAS a oportunidade de se pronunciar, no sentido da sua não admissibilidade, como via de regra, entendimento que consideramos ser transponível na concreta situação em apreciação.

Assim, refere-se no Acórdão de 05.06.2019 (Processo: 83/18.7BCLSB):

“[C]otejando o disposto no artigo 286.°, n.° 1, do CPPT, com o estabelecido nos artigos 27.° e ss. do RJAT para a impugnação da decisão arbitral, crê-se ser claramente de rejeitar, por inadmissibilidade legal, a impugnação de uma decisão interlocutória como aquela a que se refere a situação sub judice.

(…) [O] erro de julgamento não justifica a impugnação imediata dessa decisão interlocutória, porque bem vistas as coisas, podendo inquinar a decisão final, acaba por cair sob a alçada dos artigos 25.° e ss.do RJAT, que constituem a válvula de escape para tal situação; por outro lado, nem sequer pode ser apreciado pelo TCA, visto que o âmbito da competência deste tribunal se limita aos fundamentos previstos no artigo 28.° do RJAT.

E sendo certo que a verificar-se algum desses vícios previstos no neste normativo o momento adequado para os conhecer será aquando da impugnação da decisão final, prevista no artigo 27.° do RJAT.

Em face de todo o exposto, concluiu-se que, salvo situações excepcionais, é inadmissível a impugnação de decisões interlocutórias proferidas no processo arbitral”.

Mais recentemente, veja-se o Acórdão de 13.05.2021 (Processo: 15/21.5BCLSB)

“[A]tentando na letra do (…) [art.º] 27.º (…) [do RJAT] verifica-se que o mesmo ao reportar-se a “decisão arbitral” visa, tão-só, integrar, a decisão final e não uma decisão interlocutória ou cujo intuito vise sanar uma irregularidade processual.

(…) [O] CPPT, concretamente o artigo 281.º (…) remete em matéria de despachos interlocutórios para o CPC, mormente, para o consignado no artigo 644.º do CPC, o mesmo sucedendo no domínio do CPTA, particularmente, de acordo com o (…) artigo 142.º, nº5 do CPTA.

Logo, a regra, no domínio dos despachos interlocutórios é que estes só são impugnados a final, ressalvadas as situações de apelação autónoma constantes no artigo 644.º do CPC”.

Ora, in casu, estamos perante uma decisão interlocutória, proferida na sequência de Acórdão do STA e com vista à apreciação de requerimento apresentado pela ora Impugnada, na qual, na parte contra a qual a Impugnante se insurge, o tribunal arbitral considerou a situação enquadrável no âmbito do art.º 24.º, n.º 3, do RJAT, e referiu que as questões de inconstitucionalidade suscitadas deveriam ser apreciadas – e, nessa sequência, ordenou a notificação das partes para alegarem, alegação essa circunscrita a tais questões.

Portanto, não estamos perante qualquer decisão final sobre o processo, mas tão-só perante uma decisão interlocutória em que, considerando ser de aplicar o n.º 3 do art.º 24.º do RJAT, se entende estar reconstituído o tribunal arbitral e ser de conhecer determinadas questões e em que se acaba determinando a notificação para apresentação de alegações, para que as partes sejam ouvidas nesse contexto sobre essas mesmas questões.

Mesmo fazendo apelo ao disposto no art.º 644.º do CPC, não consideramos que a decisão interlocutória em causa se enquadre em nenhuma das alíneas do seu n.º 2.

Com efeito, como resulta da leitura da decisão interlocutória em causa:

a) Não estamos perante apreciação feita pelo tribunal arbitral sobre a sua competência absoluta, pelo que não se aplica o disposto no n.º 2, al. b), do art.º 644.º do CPC;

b) Não se trata de decisão proferida depois da decisão final, atentando na circunstância de esta decisão ter sido anulada, como que decorre do Acórdão proferido pelo STA, não se aplicando o disposto no art.º 644.º, n.º 2, al. g); e

c) Não se trata de decisão cuja impugnação com o recurso da decisão final fosse absolutamente inútil, não se aplicando o disposto no art.º 644.º, n.º 2, al. h). No caso, o advérbio de modo utilizado pelo legislador é bem emblemático e a inutilidade de uma reação sobre a decisão final tem de ser absoluta. Ora, o que resulta da própria alegação da Impugnante é que a mesma entende que a apreciação da decisão interlocutória é mais oportuna, para evitar, na sua perspetiva, a prossecução dos autos, o que de todo representa uma situação de absoluta inutilidade da reação à decisão final. Aliás, em bom rigor, tudo o alegado respeita a potenciais vícios que o RJAT configura como eventuais vícios da decisão arbitral final.

Assim, não se considerando que a decisão interlocutória em causa seja imediatamente impugnável, cumpre rejeitar a presente impugnação arbitral (com a consequente não apreciação do alegado).

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

a) Rejeitar a presente impugnação, por inimpugnabilidade imediata da decisão interlocutória arbitral;

b) Custas pela Impugnante;

c) Registe e notifique.


Lisboa, 01 de junho de 2023

(Tânia Meireles da Cunha)

(Susana Barreto)

(Patrícia Manuel Pires)