Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:172/12.1BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:07/11/2019
Relator:ANA PINHOL
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
INSTRUÇÃO DO PROCEDIMENTO DE REVERSÃO
INSUFICIÊNCIA DE BENS
Sumário:I. Se a Administração Tributária demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes, passará a competir ao responsável subsidiário demonstrar a existência de bens, suficientes, no património da sociedade de que aquela não teve conhecimento, fazendo, assim, a prova da ilegalidade do acto de reversão.

II. O Revertido não demonstra a existência do crédito sobre terceiros que afirma existir, já que, decorre da matéria assente que os mesmos foram contestados pela devedora, ao interpor recurso da decisão que a condenou a pagar à executada originária a quantia correspondente ao créditos que invoca.

III. O que significa que estamos perante um crédito sobre terceiro que não é certo, nem líquido e, por conseguinte, não se conclui, como pretendido, pela suficiência dos bens da devedora originária para solver a dívida em cobrança executiva.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SUBECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I.RELATÓRIO
A FAZENDA PÚBLICA veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou procedente a oposição à execução fiscal nº ......... e apensos, deduzida por SUSANA ........., contra si revertida para cobrança de dívidas provenientes de IRS e IVA, referentes aos exercícios de 2008 a 2010, no valor global de €46.461,53, instaurados contra a sociedade «A........., S.A.».

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«I.Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou procedente a oposição deduzida por Susana ......... à execução fiscal n.º ......... e apensos, contra si revertida e instaurada originariamente contra a sociedade “A......... SA”, NIPC: ........., por dívidas provenientes de IVA e IRS – Retenção na Fonte, relativos aos anos de 2008, 2009 e 2010, no valor de €46.461,53.
II.A Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal a quo, ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correcta apreciação da matéria de facto relevante no que concerne à aplicação dos artigos 23.º n.º 2 LGT e 153.º CPPT.
III.Vem a douta sentença decidir que dos factos provados nos autos não é possível afirmar que resultou provada a insuficiência de bens do património da devedora originária. E tal impossibilidade decorre de a Administração Tributária não ter logrado produzir prova bastante quanto à insuficiência patrimonial da devedora originária.
IV.São pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores, cfr. n.º 2 do artigo 23.º da LGT e n.º 2 do artigo 153.º do CPPT, e bem assim, exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta, cfr. n.º 1 do artigo 24.º relativamente aos impostos e n.º 1 do artigo 8.º do RGIT no que concerne às coimas.
V.Pois, como muito bem aponta a jurisprudência do STA que tem sido vertida sobre esta matéria, “são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT). Daí que a fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT)”, cfr. acórdão do STA de 16-10-2013, proc. n.º 0458/13.
VI.Ao contrário do decidido na sentença ora recorrida “que a AT não demonstra, em cumprimento do dever de inquisitório (cfr. art. 58.º da LGT), que tenha realizado todas as diligências necessárias a provar a insuficiência patrimonial da devedora originária” foram desenvolvidas múltiplas diligências no sentido de aferir da existência de bens penhoráveis propriedade da devedora originária, tanto assim é que constitui factualidade assente nos presentes autos.
VII.Não desconsideramos que compete à AT o ónus da prova da verificação da referida inexistência ou insuficiência de bens, todavia, também não ignoramos que era à Oponente que incumbia fazer prova efectiva da existência de créditos a favor da sociedade originária devedora passíveis de execução para pagamento das suas dívidas.
VIII.Ora, foi precisamente neste contexto que se efectivou a reversão porquanto, nos termos dos artigos 23.º nº 2 da LGT e 153.º nº 2 do CPPT, a reversão do processo de execução fiscal contra o responsável subsidiário depende de verificação da inexistência de bens penhoráveis do devedor originário e seus sucessores/responsáveis solidários ou da fundada insuficiência, para pagamento da dívida exequenda e acrescido, dos bens penhoráveis, integrantes do património destes, sendo que esta última circunstância se pode ter como preenchida com base em elementos constantes de auto de penhora e outros elementos disponíveis para na execução fiscal.
IX.Da mesma forma “…não é, na actualidade, necessária a prévia excussão do património do devedor originário para ser praticável a reversão, bastando a fundada insuficiência, atestada pela forma referenciada – acórdão TCA Sul, Proc. 1601/14.5BESNT, de 07-06-2018”.
X.No caso que nos ocupa o órgão de execução fiscal, após as tentativas de penhora, concluiu pela inexistência de bens da devedora originária para pagamento da quantia exequenda. E isso fez constar no projecto de reversão tal como reconhecido pela sentença ora recorrida – cfr. factualidade dada como provada.
XI.Não pode, assim, a Fazenda Pública conformar-se com a sentença ora recorrida quando decidiu julgar parte ilegítima o ora Recorrido porquanto “…que a AT não logrou produzir prova bastante quanto à insuficiência patrimonial da devedora originária.”
XII.É hoje pacificamente aceite tanto na jurisprudência como na doutrina que o órgão de execução fiscal não tem de especificar, no despacho de reversão, factos concretos nos quais baseia a sua fundamentação- não obstante até o ter feito em informações prévias.
XIII.In casu, o SF Oeiras … fez constar do despacho de reversão, o pressuposto de cariz substantivo da reversão, que corresponde à constatação de inexistência ou fundada insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária, nos termos do artigo 23º nº2 da LGT e nos termos do artigo 153º nº2 CPPT.
XIV.Vale isto por dizer que, o despacho de reversão permitiu à revertida conhecer, questionar e se este entender, atacar os pressupostos determinantes da reversão da execução que foi movida contra si. Tanto se verificou, que a revertida, ora Recorrida deduziu a presente oposição judicial.
XV.Por este motivo, não pode o douto Tribunal a quo desconsiderar toda a factualidade que consta dos autos e considerar que há défice instrutório.
XVI.Assim, e porque são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, bem como o exercício efectivo da gerência nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta, a “fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT)”, não se “impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.”
XVII.Conclui-se, portanto, que é distinta a análise que esta Fazenda Pública retira da factualidade dada como provada, tal como o é a valoração que desses mesmos factos a faz, salvo o devido respeito, tudo conduzindo a que seja oposta a conclusão a que chegamos.
XVIII.Deste modo, e tendo presente a realidade em análise e de todos os elementos constantes do probatório, considera a Fazenda Pública, contrariamente ao doutamente decidido, que a actuação da Administração Tributária foi no estrito cumprimento dos artigos 23.º da LGT e 153.º CPPT.
XIX.Face ao exposto, salvo o devido respeito que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida ao julgar procedente a presente oposição judicial, enferma de erro de apreciação da prova e de erro de interpretação de lei.


TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DEVE A DOUTA SENTENÇA, ORA RECORRIDA, SER REVOGADA, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!»

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A recorrida, SUSANA ........., apresentou as suas contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

«A)Tendo presentes os factos dados por provados na douta sentença, tal como a sua fundamentação de direito, não se vê que haja qualquer erro por banda do Tribunal a quo quando decidiu daquela forma, nem o poderia ter feito de outro modo.
B)Considerando os elementos de facto dados por assentes e não “contestados”, pela Fazenda Pública, designadamente, os constantes em D, J, K, L e M do probatório da douta sentença demonstram inequivocamente a existência de um crédito, da originária devedora, no montante de 196.900,00 €, muito superior (mais de 4 vezes) aos montantes em reversão, que foi dado a conhecer, à AT, pela oponente, em sede de audição prévia, a esse procedimento de reversão.

C)Apesar de ter tomado diligências para penhora desses créditos, frustradas essas diligências, a Oponente, não teve qualquer conhecimento das mesmas, muito menos da impossibilidade de penhora dos referidos créditos, nem foi chamada a prestar esclarecimentos adicionais destinados a fazer prova dos mesmos ou, se assim o entendesse, indicar outros bens à penhora, ou sequer a colaborar com a AT naquilo que fosse necessário à efectivação de tais penhoras.
D)E, como bem refere a douta sentença, apesar de ter tomado diligências para penhora desses créditos, frustradas essas diligências, a AT teria, ao abrigo do princípio da colaboração – e em concretização do princípio da boa fé – nos termos expressamente previstos na alínea d) do n.º 1 do art. 59.º da LGT, de informar a Oponente da impossibilidade de penhora dos referidos créditos, de forma a assegurar que a mesma pudesse prestar esclarecimentos adicionais destinados a fazer prova dos mesmos ou, se assim o entendesse, indicar outros bens à penhora, como bem entende a douta Sentença, ora recorrida.
E)Porquanto, como consta dos factos L e M, no decurso dos anos de 2010 e pelo menos 2012, e aos olhos do bonnos pater famílias, seria possível à oponente colaborar com a AT, no sentido de localizar a entidade A......... e dessa forma colaborar pela penhora de tais créditos, reconhecidos judicialmente, caso tomasse conhecimento de tais diligências e viesse a ser chamada a intervir, o que não sucedeu.
F)A AT optou por não dar conhecimento dessa pretensa impossibilidade e sem mais, proceder à efectivação da reversão com fundamento na inexistência de bens.
G)Pelo que, bem decidiu a douta sentença ao entender que houve uma clara violação do principio do inquisitório, do princípio da colaboração – e em concretização do princípio da boa fé – nos termos expressamente previstos na alínea d) do n.º 1 do art. 59.º da LGT, sem qualquer notificação prévia da Oponente para esse efeito constituindo, dessa forma, uma decisão surpresa, violadora das regras da boa fé (cfr. art. 10.º do Código do Procedimento Administrativo) e do referido princípio da colaboração.
H)Demonstrando, inequivocamente, um claro deficit instrutório da decisão de reversão, (cfr. art. 58.º da LGT), sem que tenha realizado todas as diligências necessárias a provar a insuficiência patrimonial da devedora originária.
I)Neste contexto, cabe à AT o ónus da prova dos pressupostos legais da decisão de reversão, pelo que só pode concluir-se que, neste caso, a AT não demonstrou que o património da sociedade executada era insuficiente para a satisfação da dívida exequenda e acrescido, pelo que falta um dos pressupostos legais para a reversão da dívida para a Oponente, nos termos previstos no art. 23.º, n.º 2 da LGT e 153.º, n.º 2, alíneas a) e b) do CPPT, art. 74.º, n.º 1 da LGT e 342.º, n.º 1 do Código Civil.
J)Aliás, tal como se refere e reconhece no douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul de 19 de Setembro de 2017 em situação similar à constante dos autos, “(…) constata-se que o recorrido em sede de audição prévia informou o Serviço de Finanças que a devedora originária possui bens penhoráveis, visando, desde modo, demonstrar que o pressuposto da reversão correspondente à inexistência de bens penhoráveis da devedora originária não se verificava.”
K)“Ora, no despacho do chefe do Serviço de Finanças que reverte a execução fiscal contra o recorrido invoca-se no que aqui releva, o seguinte: «Constatada a inexistência de bens da originária devedora», sem que lhe faça qualquer alusão onde se possa inferir que os créditos litigiosos, só por si, eram insuficientes para o pagamento da dívida exequenda e o acrescido.
L)“Por conseguinte, e como sabemos, compete à Administração Tributária demonstrar o pressuposto da inexistência patrimonial (no caso é o pressuposto que releva) da devedora originária, e portanto, temos de concordar com a sentença sob recurso, no sentido de que, não poderia ter sido, como foi, desconsiderado a existência dos créditos em discussão judicial, cujo montante é, alias, superior ao valor que o Recorrido foi chamado a pagar.
M)“(…) Ora, não tendo a Administração Tributária posto em causa a existência das acções intentadas com vista à resolução do litígio entre a responsável originária e os devedores identificados nas alíneas L) a O) do probatório, «[d]evia ter suspendido a execução fiscal e ter-se privado de reverter a execução contra o ora Recorrido, a título de responsável subsidiário. E isto é assim precisamente porque, em tais circunstâncias, não se pode aferir do pressuposto da reversão que exige que se verifique a insuficiência ou inexistência de bens penhoráveis do executado originário.» (acórdão citado na sentença sob recurso). “
N)“Em face do quanto se disse, bem decidiu a Meritíssima Juiz no sentido de que foram violados os artigos 23.º, nº2 da LGT e 153.º, nº2 do CPPT e que o oponente, ora Recorrido, é parte ilegítima na presente execução, nos termos dos artigos 204.º, nº1, alínea b) do CPPT e 24.º da LGT, devendo a execução, na medida em que contra o oponente reverteu, ser extinta.
O)Mais, a AT, ao agir como agiu, o fez em violação do princípio do inquisitório, dos deveres de imparcialidade, justiça e proporcionalidade, quer em violação de todos os demais princípios constantes do art. º55º da LGT, segundo o qual a “A administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários”.
P)Pois, a direcção da instrução do procedimento tributário cabe à administração tributária (art.º 71 da LGT). Toda a actividade da administração tributária deve subordinar-se ao interesse público que, relativamente ao sistema fiscal, consiste, em primeira linha, na obtenção de receitas para satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades (art. º103º, nº1, da CRP). Por força do preceituado no art. º266º da CRP, esta actividade tem de ser levada a cabo em subordinação à Constituição e à lei e deve respeitar os direitos e interesses legítimos dos cidadãos (princípio da legalidade) e os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé.
Q)Também o art.º 3º do CPA concretiza o princípio da legalidade especificando que «os órgãos da administração pública devem actuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes foram conferidos».
R)Ainda, o princípio da igualdade impõe à Administração que, nas suas relações com os particulares, os trate de forma igualitária, não os privilegiando, beneficiando, prejudicando, privando de qualquer direito ou isentando de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social (art.º 6º do CPA).
S)Também, o princípio da proporcionalidade obriga a administração a não afectar os direitos ou interesses legítimos dos administrados em termos não adequados e proporcionados aos objectivos a realizar (art.º 4º e 5º do CPA). O art.º46º do C.P.P.T. reafirma e desenvolve este princípio estabelecendo que «os actos a adoptar no procedimento serão os adequados aos objectivos a atingir, de acordo com os princípios da proporcionalidade, eficiência, praticabilidade e simplicidade», mesmo expressamente previsto no nº2 do art.º63º da L.G.T.
T)Os princípios da justiça e imparcialidade impõem à administração que trate de forma justa e imparcial os que com ela entrem em relação (art. º8º e 9º do CPA), expressamente prevista no art.º 58º da L.G.T.
U)Da mesma forma, também o princípio da boa fé determina que a administração deve relacionar-se com os particulares de acordo com as regras da boa fé, ponderando os valores fundamentais do direito, designadamente, a confiança suscitada pela sua actuação e o objectivo a alcançar (art.º10º do CPA), com suporte no art.º266º, nº2, da C.R.P., e reconhecimento na L.G.T. nos seus arts. 59º, nº1, e 68º. Veja-se a esse propósito o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 8 de Janeiro de 2015.
V)Pelo que, só se poderá concluir, que a douta sentença sub judice ao decidir desta forma, faz uma correcta interpretação e aplicação da factualidade dada por assente e provada, visto que a AT viola, os princípios, do ónus da prova, do inquisitório, deveres de imparcialidade, justiça e proporcionalidade, bem como o princípio da tributação pelo rendimento real.

Consequentemente deve o recurso ser julgado improcedente, com as legais consequências.»

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Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público que emitiu parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Assim, vistas as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que, no caso concreto, a questão a decidir é a de saber se a sentença recorrida fez ou não correcto julgamento ao considerar a Oponente parte ilegítima na execução, por a Administração Tributária não ter logrado demonstrar a insuficiência do património da devedora originária para pagamento das dívidas exequendas, o que passa por indagar se a Administração Tributária violou o artigo 59.º, n.º3, alínea d) da LGT.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A. DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:
« A. Corre termos no Serviço de Finanças de Oeiras - …, em nome da sociedade “A........., S.A.”, o PEF n.º ......... e apensos, para cobrança coerciva de dívidas IRS, de 2008 a 2010, e IVA, de 2008 a 2010, no valor total de € 46.461,53 – cfr. fls. 87 a 108 do PEF apenso;
B. Em 24.03.2011, foi elaborada “Informação” no Serviço de Finanças de Oeiras - …, no qual consta, na parte relevante, o seguinte:
“(…) DADOS DA EMPRESA (…)
Início de actividade: 2006-12-07
Cessação IVA: 2010-12-31
(…)
BENS PENHORÁVEIS
Cumpre-me informar que, em face das diligências processuais que antecedem, nomeadamente o auto de diligências a fls. 108, onde consta que a morada fiscal da empresa em causa não tem bens no local, onde o local existe somente para correspondência e a consulta ao Sistema Informático de Penhoras automáticas a fls. 102 e 103, não são conhecidos bens penhoráveis à executada nem esta se encontra activa, conforme ponto anterior.
(…) A última declaração entregue foi referente ao ano de 2009, a qual consta a fls. 90 a 100, onde a fls. 94 consta o resultado líquido do exercício de – 103504,57.
Não havendo bens da devedora originária, ora executada que respondam pelo pagamento da dívida, estão pois verificadas as condições previstas no n.º 2 do art.º 153.º do Código do Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) para o chamamento à execução, dos responsáveis subsidiários (…)”.
(cfr. informação, a fls. 109 e 110 do PEF apenso);

C. Através do ofício n.º …., de 10.05.2011, a Oponente foi notificada, no âmbito do PEF referido na alínea A., para efeitos de audição prévia sobre o projecto de reversão, com os seguintes fundamentos:
“PROJECTO DA REVERSÃO
Inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão (art. 23.º/n.º 2 da LGT):
Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provada não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período do exercício do cargo art. [24º/n.º 1/b) LGT]”.
– cfr. despacho e ofício, a fls. 114 e 118 do PEF apenso;
D. Em 23.05.2011, a Oponente exerceu o seu direito de audição informando que a sociedade possui património penhorável, nomeadamente os créditos vencidos sobre a cliente “A........., S.A.”, que permitem à devedora principal responder pela dívida que se pretende reverter e requereu que não fosse decretada a reversão (cfr. resposta, a fls. 124 a 126 do PEF apenso);
E. Na sequência do exercício do direito de audição, em 26.05.2011, foi elaborado “Auto de Diligências” onde consta: “(…) em cumprimento do mandado de penhora (…) verificámos não poder cumprir a penhora de créditos junto da A......... SA, em virtude de após nos termos deslocado ao local termos sido recebidos por um senhor que se identificou como gerente da empresa E......... SA (…), que nos informou que têm contrato de arrendamento desde Julho de 2007 com a Caixa ......... que é proprietária deste imóvel, tendo nos mostrado o referido contrato.” (cfr. fls. 127 do PEF apenso);
F. As penhoras de créditos ordenadas a 24.11.2009 e 13.08.2010, referentes à sociedade A........., foram devolvidas (cfr. informação do SIPA, a fls. 134 do PEF apenso);
G. Em 02.06.2011, elaborada “Informação”, no Serviço de Finanças de Oeiras – …, no qual se afirma, na parte relevante, que:
“(…) ANÁLISE DA DEFESA
A contribuinte Susana ......... vem indicar que a devedora originária (A.........) possui bens passíveis de penhora (…).
Mas a contribuinte em causa não indica quais os montantes que a firma A......... deve à devedora original.
Informa-se ainda que já foi tentada via Sistemas de penhoras automáticas duas tentativas de penhoras de créditos junto da entidade A........., tendo as mesmas sido devolvidas (fls. 134).
Mesmo assim, no dia 24 de Maio de 2011, deslocou-se uma brigada deste Serviço de Finanças à Av. ........., n.º .... (sede fiscal da A.........), acompanhado de mandado de penhora a fim de poder penhorar créditos dessa entidade com a devedora original.
A fls. 127, foi efectuado auto de diligências, onde consta que a empresa A......... não possui sede naquele local, estando em parte incerta, estando pelo menos desde 2007 outra empresa.
BENS PENHORÁVEIS
Assim, julgo que se mantém os pressupostos do projecto de reversão (…)”.
(cfr. informação, a fls. 135 a 141 do PEF apenso)
H. Na sequência da informação referida na alínea antecedente, em 15.06.2011, o Chefe do Serviço de Oeiras - … proferiu despacho de reversão, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 24.º da LGT (cfr. despacho, a fls. 143 do PEF apenso);
I. Através do ofício n.º …., da mesma data, recebido a 22.06.2011, foi a Oponente citada por reversão, no âmbito do PEF referido em A., constando da respectiva citação o seguinte:
“Pelo presente fica citado(a) de que é EXECUTADO(A) POR REVERSÃO nos termos do artigo 160º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), na qualidade de Responsável Subsidiário para, no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, pagar a quantia exequenda de 46.461,53 EUR de que era devedor(a) o(a) executado(a) infra indicado(a) (…).
FUNDAMENTOS DA REVERSÃO
    Inexistência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão (art. 23.º/n.º 2 da LGT):

    Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por
    não terem provada não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período do exercício do cargo art. 24º/n.º 1/b) LGT.


    JUNTO SE ENVIA EM ANEXO CÓPIA DO DESPACHO DE REVERSÃO/ INFORMAÇÃO EM QUE SE FUNDAMENTOU O DESPACHO, CERTIDÕES DE DÍVIDA E RESPECTIVAS LIQUIDAÇÕES
(…)”.
– cfr. ofício de citação e aviso de recepção, a fls. 147 do PEF apenso;


J. Em 2010, a sociedade devedora originária detinha um crédito, titulado pelas facturas nºs. 20........., 20........., 20........., 20......... e 20........., sobre o cliente “A........., S.A.”, no valor total de € 196.900,00 (cfr. facturas a fls. 73 a 77 dos autos);
K. No mesmo ano, a sociedade devedora originária intentou um procedimento de injunção contra a sociedade referida na alínea antecedente para obter o pagamento do crédito mencionado na alínea antecedente (facto não impugnado);
L. Em 09.02.2012, no âmbito do processo n.º 371157/10.0YIPRT, que correu termos na 1.ª Secção da 9.ª Vara Cível de Lisboa, a “A......... S.A.” foi condenada a pagar à sociedade devedora originária a quantia referida na alínea J. supra, acrescida de juros à taxa de 8% até integral pagamento (cfr. sentença, a fls. 112 a 122 dos autos);
M. A “A........., S.A.” interpôs recurso da decisão referida na alínea antecedente (facto não controvertido).
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FACTOS NÃO PROVADOS
Não há factos que importe registar como não provados.
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MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou do exame dos documentos juntos aos autos e ao PEF apensos, e não impugnados, conforme referido em cada uma das alíneas do probatório.
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B. DO DIREITO
Resulta dos autos que foi instaurada execução fiscal contra a sociedade denominada «A........., S.A.» para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IVA e IRS (Retenção na Fonte) relativas aos anos de 2008, 2009 e 2010, no valor de € 46.461,53, tendo a mesma revertido contra Susana ........., na qualidade de responsável subsidiária.
A Executada por reversão opôs-se a essa execução fiscal insistindo na existência do crédito da devedora originária sobre a sociedade «A........., S.A.» defendendo que « (…) é totalmente inadmissível a conclusão assumida pela AF em sede de despacho de reversão, segundo o qual, inexiste na esfera patrimonial da sociedade devedora principal qualquer bem susceptível de ser penhorado.».
Com base no quadro factológico oportunamente transcrito, a oposição foi julgada procedente, no essencial, com base na seguinte fundamentação:
«No caso dos autos, encontra-se demonstrado que a sociedade devedora originária era titular de um crédito sobre clientes no montante de € 196.900,00 (cfr. alíneas J. e L. dos factos assentes). Ou seja, de valor superior à dívida exequenda (cfr. alínea A. supra).
No exercício do direito de audição sobre o projecto de reversão, a Oponente indicou à AT que a devedora originária dispunha do mencionado crédito vencido sobre a sociedade “A........., S.A.”, titulado pelas facturas nºs. 20........., 20........., 20........., 20......... e 20........., e requereu, a final, que não fosse decretada a reversão (cfr. alínea D. dos factos assentes).
Ficou igualmente demonstrado que a penhora automática dos referidos créditos se frustrou (cfr. alínea F. dos factos provados) e que, na sequência do exercício do direito de audição, foi emitido mandado de penhora de créditos, não tendo a AT, nas diligências efectuadas, conseguido localizar a referida sociedade (cfr. alínea E. do probatório).
Ora, frustradas essas diligências, a AT teria, ao abrigo do princípio da colaboração – e em concretização do princípio da boa fé – nos termos expressamente previstos na alínea d) do n.º 1 do art. 59.º da LGT, de informar a Oponente da impossibilidade de penhora dos referidos créditos, de forma a assegurar que a mesma pudesse prestar esclarecimentos adicionais destinados a fazer prova dos mesmos ou, se assim o entendesse, indicar outros bens à penhora.» (…)
Na verdade, o conhecimento dos elementos de prova da insuficiência patrimonial da devedora originária é fundamental para o revertido poder ter a possibilidade de contestar a conclusão retirada nesse âmbito pelo órgão de execução fiscal, sendo um dos pilares do seu direito de defesa.
Neste caso, face aos elementos probatórios recolhidos, concluímos que a AT não logrou produzir prova bastante quanto à insuficiência patrimonial da devedora originária, requisito indispensável para que a reversão da execução fiscal, inicialmente instaurada contra a devedora originária, possa ser validamente realizada contra a sua responsável subsidiária.
Assim, considerando que compete ao Tribunal sindicar a legalidade da decisão de reversão com base nos elementos que o exequente tinha, à data em que a proferiu, e que cabe à AT o ónus da prova dos pressupostos legais da decisão de reversão, conclui-se que, neste caso, a AT não demonstrou que o património da sociedade executada era insuficiente para a satisfação da dívida exequenda e acrescido, pelo que falta um dos pressupostos legais para a reversão da dívida para a Oponente, nos termos previstos no art. 23.º, n.º 2 da LGT e 153.º, n.º 2, alíneas a) e b) do CPPT, art. 74.º, n.º 1 da LGT e 342.º, n.º 1 do Código Civil.».
Discordando do assim decidido, a Fazenda Pública sustenta que a sentença recorrida incorre em erro de julgamento ao considerar que não se encontra demonstrada a insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária, já que, «a actuação da Administração Tributária foi no estrito cumprimento dos artigos 23.º da LGT e 153.º do CPPT». Mais alega a Fazenda Pública que « Ao contrário do decidido na sentença ora recorrida “que a AT não demonstra, em cumprimento do dever de inquisitório (cfr. art. 58.º da LGT), que tenha realizado todas as diligências necessárias a provar a insuficiência patrimonial da devedora originária” foram desenvolvidas múltiplas diligências no sentido de aferir da existência de bens penhoráveis propriedade da devedora originária, tanto assim é que constitui factualidade assente nos presentes autos.».
Vejamos se assiste razão à Fazenda Pública.
Nos termos do artigo 23.º, nºs 1 e 2 da LGT:
«1 - A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal.
2 - A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão.»
Por seu turno, no artigo 153.º, nº 2 do CPPT:
2 - O chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias:
a) Inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores;
b) Fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido.
Daqui resulta, então, que a reversão contra o responsável subsidiário depende, no que aqui importa considerar, da inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão prévia tendo por base a recolha de elementos objectivos.
E, nesta sede, (como a própria recorrente reconhece) incumbe à Administração Tributária o ónus da prova de que se verificam os factos que integram o fundamento, previsto na lei, para que possa chamar à execução os responsáveis subsidiários e reverter contra eles o processo executivo, cabendo-lhe, por isso, demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes (cfr. artigo 74.º, n.º 1 da LGT e, artigo 342.º, n.º1 do Código Civil).
Se a Fazenda Pública demonstrar o preenchimento desses pressupostos, passará a competir ao responsável subsidiário demonstrar a existência de bens, suficientes, no património da sociedade de que aquela não teve conhecimento, fazendo, assim, a prova da ilegalidade do acto de reversão (neste sentido, vide entre muitos outros: Acórdão deste Tribunal Central Administrativo, de 10.07.2015, proferido no processo n.º 08792/15, disponível em texto integral em www.dgsi.pt)
Retornando ao caso em presença, a Oponente, no exercício do seu direito de audiência prévia à reversão, alegou, que « (…) tem informação de que a referida sociedade dispõe de património penhorável, nomeadamente de créditos dos seus clientes. Os quais ascendem a valores elevados e que permitiriam à própria devedora principal responder pelas dividas fiscais que ora se pretende reverter. Nomeadamente, encontram-se vencidos os créditos da sociedade devedora principal sobre a cliente “ A........., S.A., nipc ........., tituladas pelas facturas nºs. 20........., 20........., 20........., 20......... e 20........., (…)» visando, desde modo, demonstrar que o pressuposto da reversão correspondente à inexistência ou insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária não se verificava.
Com base no informado pela Oponente e que supra se transcreveu, o Órgão de Execução efectuou diligências complementares de instrução em resultado das quais apurou o seguinte:« (…) já foi tentada via Sistemas de penhoras automáticas duas tentativas de penhoras de créditos junto da entidade A........., tendo as mesmas sido devolvidas (fls. 134).
Mesmo assim, no dia 24 de Maio de 2011, deslocou-se uma brigada deste Serviço de Finanças à Av. ........., n.º .... (sede fiscal da A.........), acompanhado de mandado de penhora a fim de poder penhorar créditos dessa entidade com a devedora original.
A fls. 127, foi efectuado auto de diligências, onde consta que a empresa A......... não possui sede naquele local, estando em parte incerta, estando pelo menos desde 2007 outra empresa.».
Seguidamente, face ao apurado, concluiu: «Não havendo bens da devedora originária, ora executada que respondam pelo pagamento da dívida, estão pois verificadas as condições previstas nos termos do n.º2 do artigo 153.º do Código do Procedimento e Processo Tributário ( CPPT), para o chamamento à execução, dos responsáveis subsidiários (…)».
Conforme, vimos supra, o Tribunal de 1ª Instância entendeu que não tendo surtido efeito as diligências realizadas previamente à proposta de reversão « (…) a AT teria, ao abrigo do princípio da colaboração – e em concretização do princípio da boa fé – nos termos expressamente previstos na alínea d) do n.º 1 do art. 59.º da LGT, de informar a Oponente da impossibilidade de penhora dos referidos créditos, de forma a assegurar que a mesma pudesse prestar esclarecimentos adicionais destinados a fazer prova dos mesmos ou, se assim o entendesse, indicar outros bens à penhora.».
A questão está pois em saber se, por força da alínea d) do n.º3 do artigo 59.º da LGT, o Órgão de Execução Fiscal estava obrigado a notificar a Oponente do resultado das diligências que efectuou tendo por base informação prestada em sede de audição prévia e não o tendo feito, aferir se é legal a conclusão a que chegou o Tribunal de 1ª Instância.
Comecemos por nos deter sobre o citado normativo.
Dispõe, a alínea d) do n.º3 (que apenas por mero lapso de escrita o Tribunal de 1ª Instância indicou n.º1) do artigo 59.º da LGT: « Os órgãos da administração tributária e os contribuintes estão sujeitos a um dever de colaboração recíproco.
3 - A colaboração da administração tributária com os contribuintes compreende, designadamente:
(…)
d) A notificação do sujeito passivo ou demais interessados para esclarecimento das dúvidas sobre as suas declarações ou documentos;»
Sobre o alcance do Princípio da Colaboração na vertente que aqui importa, esclarece António Lima Guerreiro: «A notificação do contribuinte para o esclarecimento das dúvidas sobre as suas declarações ou documentos a que se refere a alínea d) do número 3 do presente artigo já constituía, anteriormente à Lei Geral Tributária, a prática corrente da maioria dos serviços da Administração Tributária e é o resultado do princípio constitucional da participação.».
E o Autor continua:
«É, também, a solução mais adequada do ponto de vista da eficácia da Administração Tributária, já que, nos termos do artigo 121°, número 1, do C .P.T. (100°, número 1, do C.PPI), reverte a favor do contribuinte a fundada dúvida sobre a existência e a quantificação dos factos tributários, pelo que a falta de notificação do contribuinte, em caso de dúvida sobre a sua situação fiscal, pode conduzir indirectamente à anulação do acto tributário.
Deve a Administração Tributária proceder oficiosamente ao esclarecimento das dúvidas sobre a existência e quantificação dos factos tributários, sob pena de essa dúvida, em caso de processo judicial, poder ser resolvida contra si.» (LEI GERAL TRIBUTÁRIA ANOTADA, Editora Rei dos Livros, pág.272).
Conforme se pode verificar do probatório, em resultado das diligências efectuadas pelo Órgão de Execução, quer as realizadas em momento prévio ao projecto de reversão, quer as posteriores ao mesmo, se concluiu, de forma peremptória, pela inexistência de bens penhoráveis da devedora originária para satisfazer as dívidas exequendas.
E, sendo assim, não tendo o autor do despacho de reversão, perante os factos objectivos que apurou, qualquer “dúvida” sobre a situação patrimonial da devedora originária, não se vislumbra a necessidade de qualquer pedido de esclarecimento à Oponente.
De qualquer forma, o que dos autos resulta também é que o despacho reversão não deixou de ter em conta os elementos factuais novos aduzidos (créditos sobre terceiros da devedora originária) pela Oponente na resposta ao direito de audição prévia à reversão.
Conclui-se, portanto, que contrariamente ao consignado na sentença recorrida, não se verifica qualquer insuficiência na instrução do procedimento de reversão. (Neste sentido vide Acórdão deste Tribunal Central Administrativo de 8.10.2015, proferido no processo n.º 7046/13, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Deste modo, deve considerar-se que o Órgão de Execução fez o que lhe era exigido quanto à demonstração do pressuposto correspondente à inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis da devedora originária (cfr.nº 2 do artigo 23.º da LGT e nº 2 do artigo 153.º do CPPT).
Aliás, deve dizer-se que, nesta sede, a Oponente não demonstra a existência dos créditos sobre a «A........., S.A.» que afirma existirem, já que, decorre da matéria assente que os mesmos foram contestados pela devedora, ao interpor recurso da decisão que a condenou a pagar à executada a quantia de €196.900,00, respeitante aos créditos que invoca.
O que significa que estamos perante um crédito sobre terceiro que não é certo, nem líquido e, por conseguinte, não se conclui, como pretendido, pela suficiência dos bens da devedora originária para solver a dívida em cobrança executiva. Pelo contrário, aliás.
E, sendo assim, temos de concluir que a Oponente não demonstrou a certeza da existência de bens, no património da sociedade para satisfazer as dívidas exequendas.
De resto, como se salientou no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 20.12.2012, proferido no processo n.º00812/07.4BEBRG, que «…não é a dúvida sobre a inexistência de bens suficientes que leva a concluir que não está verificada a condição ou pressuposto da reversão da execução contra o potencial responsável subsidiário; é a certeza de que existem bens penhoráveis e que eles são suficientes que deve determinar a não reversão da execução por falta da verificação de pressuposto legal para tanto». ( disponível em texto integral em www.dgsi.pt)
Do que se conclui que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar a Oponente parte ilegítima na execução, na medida em que a Administração Tributaria não demonstrou que o património da devedora originária era insuficiente para a satisfação da dívida exequenda e acrescido. Como tal, não pode permanecer na Ordem Jurídica.
Pelo exposto, nenhuma outra questão havendo a decidir, importa concluir pelo provimento do recurso, o que se traduz na revogação da sentença recorrida e consequente procedência da oposição fiscal.
IV.CONCLUSÕES
I.Se a Administração Tributária demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes, passará a competir ao responsável subsidiário demonstrar a existência de bens, suficientes, no património da sociedade de que aquela não teve conhecimento, fazendo, assim, a prova da ilegalidade do acto de reversão.
II.O Revertido não demonstra a existência do crédito sobre terceiros que afirma existir, já que, decorre da matéria assente que os mesmos foram contestados pela devedora, ao interpor recurso da decisão que a condenou a pagar à executada originária a quantia correspondente ao créditos que invoca.
III.O que significa que estamos perante um crédito sobre terceiro que não é certo, nem líquido e, por conseguinte, não se conclui, como pretendido, pela suficiência dos bens da devedora originária para solver a dívida em cobrança executiva.
V.DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes da 1ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em conceder provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública, revogar a sentença recorrida e, consequentemente, julgar a oposição deduzida por Susana ........., improcedente.

Custas pela Recorrida em ambas as Instâncias.

Lisboa, 11 de Julho de 2019.

Ana Pinhol

Isabel Fernandes

Catarina Almeida e Sousa