Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1065/06.7 BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:05/04/2023
Relator:ANA CRISTINA DE CARVALHO
Descritores:REVERTIDO
EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA EXECUTIVA POR ILEGITIMIDADE 
FALTA DE INTERESSE EM AGIR NA ACÇÃO DE IMPUGNAÇÃO
Sumário:O revertido que impugna as liquidações exequendas deixa de ter interesse em agir na acção de impugnação, por facto superveniente, se entretanto, no âmbito da acção de oposição, que também deduziu, foi julgada extinta a instância executiva por ilegitimidade do executado/revertido, com fundamento na falta de prova do exercício de funções de administração da sociedade executada principal, no período relevante.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, as Juízas que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I - RELATÓRIO

A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que julgou improcedente a excepção dilatória inominada da inimpugnabilidade do acto, procedente no que tange à caducidade do direito à liquidação relativamente aos actos de liquidação de IRC de 1995 e 1996 e totalmente improcedente no que respeita à liquidação de IRC referente ao exercício de 1997, deduzida por E. A., com os sinais nos autos, contra o acto de indeferimento tácito da reclamação graciosa deduzida contra as liquidações oficiosas de IRC dos exercícios de 1995, 1996 e 1997, dela veio interpor o presente recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões:


«A. Salvo o devido respeito, por opinião diversa, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, dado que da prova produzida não se podem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida.

B. Considerou o douto Tribunal, na sentença que ora se recorre, que ocorreu a caducidade do direito à liquidação relativamente aos atos de liquidação de IRC dos anos de 1995 e 1996, no entanto, não pode a Fazenda Pública concordar com tal entendimento e isto porque,

C. Conforme resulta dos fundamentos da douta sentença, a liquidação do ano de 1996 foi devidamente notificada no prazo de caducidade, pelo que ocorre, no caso em apreço, e salvo o devido respeito, que é muito, uma grosseira contradição do douto Tribunal, não existindo conformidade entre a decisão e os respetivos fundamentos.

D. Por tal motivo, e porque não foram aduzidos quaisquer outros fundamentos, carece de fundamentação a sentença recorrida, devendo ser mantida a liquidação de IRC do ano de 1996, por não padecer de qualquer vício ou ilegalidade.

E. Decidiu ainda o douto Tribunal que a liquidação de IRC, respeitante ao ano de 1995, também não foi notificada à sociedade devedora originária G. I. SA, todavia, salvo a devida vénia, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, a mesma foi realizada, tendo sido emitida em 05.12.2000 e registada nos CTT em 11.12.2000.

F. O douto Tribunal fez tábua rasa à informação prestada pela Fazenda Pública, no entanto, é importante mencionar a informação de que dispõe a AT é uma "informação oficiar, dado que, quer a data quer o n° de registo são obtidos com base nos elementos que são fornecidos pelos CTT.

G. Assim, tendo a carta sido remetida para o domicílio da sociedade devedora originária, deve entender-se que a informação de que a AT dispõe goza, também ela, de fé pública em como foi realizada a notificação.

H. Sempre se diga, que considerando o Tribunal que a informação da AT não é prova suficiente, em como a notificação foi realizada, caberia sempre ao mesmo, no âmbito do princípio do inquisitório e por deter poderes para tal, diligenciar no sentido de, junto dos CTT, obter a confirmação da existência daquele registo, todavia, não o fez.

I. Assim, ao anular a liquidação impugnada com fundamento em vícios, que se entendem por não verificados, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento em matéria de direito, razão pela qual a douta sentença recorrida não se deverá manter na ordem jurídica.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a impugnação judicial totalmente improcedente.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA!»


*


A Recorrida não apresentou contra-alegações.

*




Foi dada vista ao Ministério Público, e neste Tribunal Central Administrativo, pronunciou-se o Procurador-Geral Adjunto no sentido da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, e assim não se entendendo, pela improcedência do recurso, aduzindo os termos seguintes:


«A impugnação judicial foi deduzida contra o ato de indeferimento tácito da reclamação graciosa deduzida contra as liquidações oficiosas de IRC dos exercícios de 1995, 1996e 1997.


A douta sentença julgou do seguinte modo:


“- Improcedente, por não provada, a excepção dilatória inominada da inimpugnabilidade do acto;


- Procedente, por provada, a presente Impugnação no que tange à caducidade do direito à liquidação relativamente aos actos de liquidação de IRC de 1995 e 1996 e, consequentemente, anulam-se os actos de liquidação referidos;


- Totalmente improcedente, por não provada, a presente impugnação no que respeita à liquidação de IRC referente ao exercício de 1997, pelo que se mantem essa liquidação na ordem jurídica. ”


A Fazenda Pública veio recorrer por entender que a douta sentença recorrida padece de erro de julgamento, dado que da prova produzida não se podem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida.


O Recorrido não contra-alegou.


Entendemos ser de acolher totalmente os argumentos invocados pelo Ministério Público no parecer proferido em 1- instância, em 11.05.2021, e que aqui se dá por integralmente por reproduzido, no sentido deque ocorreu uma inutilidade superveniente da lide.


Realça-se do mesmo:


"A inutilidade decorre da circunstância da divida tributária decorrente dos actos de liquidação em apreciação nos presentes autos ter sido considerada inexigível para o ora Impugnante, por decisão tomada, com trânsito em julgado, no âmbito do processo de oposição que, sob o n° 396/06.0BESNT, correu termos por este tribunal tributário.


A nosso ver é de corroborar a posição sustentada pelo Impugnante, e no sentido de que no decurso da presente lide se verificou a falta de um pressuposto processual, a falta de interesse em agir, e isto porque face à decisão tomada na instância executiva fiscal, de excluir a responsabilidade daquele, ainda que de natureza subsidiária, pelo pagamento da divida tributária, cuja legalidade dos correspondentes actos de liquidação se encontra agora em apreciação, para o Impugnante é irrelevante a decisão que se venha a tomar, pois, e qualquer seja, o mesmo não será responsável pelo pagamento da divida. É certo que a divida tributária não se encontra extinta por prescrição e não é menos certo que subsiste a questão de saber se os actos tributários de liquidação padecem de um qualquer dos vícios que lhe vêm assacados pelo Impugnante, mas a verdade é que para o mesmo é absolutamente irrelevante a decisão que se venha a tomar, pois, qualquer que seja, ele não pode ser responsabilizado pelo pagamento da correspondente divida."


Efetivamente o douto Acórdão deste TCA Sul, de 22/10/2020, proferido no âmbito do processo de Oposição n° 396/0BESNT, manteve a douta sentença de procedência da oposição deduzida pelo ora Impugnante, por falta de legitimidade do mesmo absolvendo-o da instância executiva.


Aliás, o próprio Impugnante veio requerer nestes autos a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.


Assim não sendo doutamente entendido, estamos em crer que a douta sentença não padece de qualquer vício, devendo ser mantida na ordem jurídica.


Termos em que emito parecer no sentido da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do disposto no art. 277°, al. e) do Código de Processo Civil, aplicável "ex vi" art. 2.º, al. e) do CPT.


Caso assim não seja doutamente entendido, o presente recurso deverá improceder.»


*


Notificado o referido parecer às partes, nada disseram ou requereram.

*


Com dispensa dos vistos legais, dada a simplicidade da decisão vem o processo submetido à conferência para apreciação e decisão.

*


II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente no âmbito das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Em face da declaração do impugnante, ora recorrido, como parte ilegítima enquanto revertido no processo de execução fiscal a questão a decidir são as de saber se o recorrido mantém o interesse em agir nos presentes autos em que se discute a legalidade da liquidação ali exequenda.

Sendo a resposta positiva à primeira questão, importa decidir se ocorreu errado julgamento de facto e de direito quanto à questão da caducidade do direito à liquidação relativamente aos actos de liquidação de IRC dos anos de 1995 e 1996.

III - FUNDAMENTAÇÃO

III – 1. De facto


É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:

«1) A sociedade G. I., S.A. tinha a sua sede na Av. F., .. P/.., em Carnaxide no sistema informático da DGCI (cfr. doc. de fls. 10 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
2) Em 04/01/1996 o impugnante cessou as suas funções como administrador da sociedade melhor identificada no ponto anterior (cfr. doc. de fls. 89 dos autos);
3) A sociedade G. I., S.A. cessou actividade em 31/12/2001 (cfr. doc. de fls. 10 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
4) Em 13/12/1999 foi aberta a ordem de serviço n° 28 286 para se proceder à inspecção da sociedade G. I., S.A. em sede de IVA e IRC do exercício de 1995 (facto que se retira do Relatório inspectivo a fls. 12 a 19 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
5) Em 19/01/2000 foi aberta a ordem de serviço n° 46 479 para proceder à inspecção da sociedade G. I., S.A. em sede de IVA e IRC do exercício de 1996 (facto que se retira do Relatório inspectivo a fls. 118 a 123 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
6) Em 20/10/1999 foi aberta a ordem de serviço n° 42 935 para proceder à inspecção da sociedade G. I., S.A. em sede de IVA e IRC do exercício de 1997 (facto que se retira do Relatório inspectivo a fls. 64 a 72 do doc. de fls. 2081 do SITAF);
7) Foram efectuadas diversas diligências por parte dos serviços de inspecção tributária para obter elementos da contabilidade da sociedade melhor identificada no ponto 1 deste probatório (facto que se retira dos docs. de fls. 25 a 47 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
8) Nunca foi possível à AT ter acesso à contabilidade da sociedade melhor identificada no ponto 1 deste probatório (facto que se retira dos docs. de fls. 25 a 47 e 90 a 99 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
9) Por oficio de 30/03/2000 foi a sociedade G. I., S.A. notificada do projecto de relatório inspectivo decorrente da ordem de serviço referente ao exercício de 1995 para a morada que consta do cadastro da AT (cfr. doc. de fls. 100 a 102 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
10) O oficio identificado no ponto anterior veio devolvido com a menção "Inexistente” (cfr. doc. de fls. 102 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
11) Por ofícios de 13/01/2000 foram L. A., P. R. e J. F., notificados do projecto de relatório inspectivo que decorreu na acção inspectiva melhor identificada no ponto 4 deste probatório (cfr. docs. de fls. 57 a 62 e 65 a 66 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
12) Em 06/04/2000 foi elaborado o relatório inspectivo referente ao IVA e IRC de 1995 do qual consta q determinação da matéria colectável em sede de IRC com recurso a métodos indirectos de tributação (cfr. doc. de fls. 12 a 19 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
13) Por oficio de 13/01/2000 foi a sociedade G. I., S.A. notificada do projecto de relatório inspectivo decorrente da ordem de serviço referente ao exercício de 1996 para a morada que consta do cadastro da AT (cfr. doc. de fls. 8 do doc. de fls. 2081 do SITAF);
14) Por ofícios de 13/01/2000 foram L. A., P. R. e J. F., notificados do projecto de relatório inspectivo que decorreu na acção inspectiva melhor identificada no ponto 4 deste probatório (cfr. docs. de fls. 2 a 7 e 11 do doc. de fls. 2081 do SITAF);
15) Em 06/04/2000 foi elaborado o relatório inspectivo referente ao IVA e IRC de 1996 do qual consta que determinação da matéria colectável em sede de IRC com recurso a métodos indirectos de tributação (cfr. doc. de fls. 116 a 123 do doc. de fls. 1920 do SITAF);
16) Por oficio de 13/01/2000 foi a sociedade G. I., S.A. notificada do projecto de relatório inspectivo decorrente da ordem de serviço referente ao exercício de 1997 para a morada que consta do cadastro da AT (cfr. doc. de fls. 121 a 122 do doc. de fls. 2081 do SITAF);
17) Por ofícios de 13/01/2000 foram L. A., P. R. e J. F., notificados do projecto de relatório inspectivo que decorreu na acção inspectiva melhor identificada no ponto 5 deste probatório (cfr. docs. de fls. 116 a 120 e 123 do doc. de fls. 2081 do SITAF);
18) Em 21/03/2000 foi elaborado o relatório inspectivo referente ao IVA e IRC de 1997 do qual consta q determinação da matéria colectável em sede de IRC com recurso a métodos indirectos de tributação, com a seguinte fundamentação:
“(…)

Imagens: original nos autos
(…)


Imagem: original nos autos

(cfr. doc. De fls. 64 a 72 do doc. De fls. 2081 do SITAF):
«18. Por oficio de 03/04/2000 foi a sociedade G. I., S.A. notificada do teor do relatório inspectivo identificado no ponto anterior através de oficio remetido para a sua morada constante do cadastro (cfr. doc. de fls. 162 a 164 do doc. de fls. 2081 do SITAF);
19. Por oficio de 10/07/2000 foi o impugnante notificado do teor do relatório inspectivo da sociedade G. I., S.A. para o exercício de 1997 (cfr. doc. de fls. 165 do doc. de fls. 2081 do SITAF);
20. Por oficio de 30/03/2002 foi remetido à sociedade G. I., S.A. para a morada constante do cadastro informação da liquidação de IRC para o exercício de 1997 com o n° 2001 8310003407, juntando cópia da notificação a liquidação anteriormente efectuada onde é indicada como data limite de pagamento da liquidação 06/06/2001 (cfr. doc. de fls. 178 a 182 do doc. de fls. 2081 do SITAF);
21. O oficio identificado no ponto anterior veio devolvido com a indicação "Mudou-se” (cfr. doc. de fls. 181 do doc. de fls. 2081 do SITAF);
22. Em 31/10/2005 o impugnante solicitou ao serviço de finanças a emissão de certidões das dívidas (cfr. doc. de fls. 186 a 190 dos autos);
23. Em 10/01/2006 foram emitidas certidões pelo serviço de finanças da qual constam os mapas de apuramento do imposto e cópia dos relatório inspectivos dos exercícios de 1995, 1996 e 1997 (cfr. doc. de fls. 198 a 447 dos autos);
24. Em 13/02/2006 o impugnante apresentou um requerimento no serviço de finanças denominado "Reclamação Graciosa” no qual pede a anulação dos actos, bem como a convolação da petição em recurso para a Comissão de Revisão caso assim se entenda (cfr. doc. de fls. 465 a 540 dos autos);»

*
Consta ainda da mesma sentença que «não ficou provada a notificação à sociedade G. I., S.A. as liquidações de IRC dos exercícios de 1995 e 1996» e que «não se provaram outros factos com interesse para a decisão».

*

III – 2. Da apreciação do recurso

Resulta dos autos o seguinte circunstancialismo processual com relevo para a decisão da causa:

i) No âmbito do processo de oposição deduzido pelo impugnante, ora recorrido, contra a execução fiscal contra si revertida, que correu termos no TAF de Sintra com o n.º 396/06.0BESNT foi proferida sentença julgando a acção procedente, absolvendo o impugnante (ali oponente) da instância executiva com fundamento na falta de verificação dos pressupostos de reversão no que se refere à sua legitimidade por não ter exercido, de facto, no período a que respeitam os impostos em cobrança coerciva (IRC de 1995 a 1997) a administração a sociedade – cf. fls. 839 a 850 verso;

ii) Por Acórdão proferido no referido processo em 22/10/2020 foi negado provimento ao recurso interposto pela Representação da Fazenda Pública e manteve a sentença recorrida – cf. fls. 852 a 864 verso;


*


Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, como referimos antes, é pelas conclusões com que o recorrente extrai das suas alegações, que se determina objecto do recurso e o âmbito de intervenção deste tribunal, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

No caso dos autos foi suscitada pelo Procurador-Geral Adjunto a questão da falta de interesse em agir do Impugnante, ora recorrido resultante da circunstância da divida tributária decorrente dos actos de liquidação em apreciação nos presentes autos ter sido considerada inexigível contra ele, por decisão tomada, com trânsito em julgado, no âmbito do processo de oposição que, sob o n° 396/06.0BESNT correu termos.

O recorrido havia requerido a declaração de extinção a instância por inutilidade superveniente, sem, contudo, invocar a falta de interesse em agir, contudo não teve acolhimento pelo Tribunal recorrido.

Vejamos, então.

O interesse em agir tem sido entendido pela maior parte da doutrina e pela jurisprudência da jurisdição administrativa e fiscal como um pressuposto processual cuja falta constitui excepção dilatória inominada, que se deve subsumir no elenco não taxativo previsto no artigo 577.º do CPC, sendo de conhecimento oficiosos, conforme resulta do artigo 578.º do mesmo código aplicável por força do disposto no artigo 2.º alínea e) do CPC.

Mário Aroso de Almeida, «O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos», 1ª edição, págs. 56, refere-se à questão como sendo «a de apurar, em cada caso concreto, se quem se propõe impugnar esse acto se apresenta como parte legítima e, por outro lado, se está efectivamente colocado em situação que, do ponto de vista do interesse em agir, fundamente a necessidade de recorrer à via judicial (…) neste plano, se coloca a questão e saber se as consequências que o acto sob impugnação alegadamente projecta sobre o impugnante são de molde a justificar que ele lance mão da via judicial.» (sublinhados e destacados nossos).

No caso dos autos o recorrido impugnou as liquidações aqui em causa na qualidade de revertido, constituindo acto adquirido que no âmbito da acção de oposição, que também deduziu, foi julgada extinta a instância executiva por ilegitimidade do executado/revertido, com fundamento na falta de prova do exercício de funções de administração da sociedade executada principal, no período a que respeitam as dívidas exequendas, que correspondem às liquidações de IRC de 1995 a 1997 objecto de impugnação nos presentes autos.

Em face do conceito de interesse em agir e do enquadramento processual descrito, fácil é concluir que os efeitos que possam advir do julgamento nestes autos não se podem repercutir na esfera patrimonial do recorrido na medida em que contra ele não podem ser executadas as dívidas aqui em causa.

Dito de outro modo, o desfecho deste processo em nada afecta a esfera jurídica do recorrido, pelo que, deixou de ter a necessidade de recorrer à via judicial.

Tanto assim é, que o próprio recorrido requereu a extinção da presente instância por considerar ter ocorrido a inutilidade superveniente da lide, na medida em que a sua pretensão de não se julgado responsável pelo pagamento da dívida em causa havia sido satisfeita pela via da acção de oposição.

Como bem salienta o Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, no decurso da presente lide se verificou a falta de um pressuposto processual, a falta de interesse em agir, e isto porque face à decisão tomada na instância executiva fiscal, de excluir a responsabilidade daquele, ainda que de natureza subsidiária, pelo pagamento da divida tributária, cuja legalidade dos correspondentes actos de liquidação se encontra agora em apreciação, para o Impugnante é irrelevante a decisão que se venha a tomar, pois, qualquer seja, o mesmo não poderá ser responsabilizado pelo pagamento da divida.

Em nada obsta à procedência da excepção o facto de ela se verificar em momento processual superveniente ao da propositura da acção, já que, para o conhecimento do mérito da acção impõe-se que os pressupostos processuais se mantenham verificados até à decisão.

Impõe-se assim, julgar procedente a suscitada excepção dilatória inominada, por falta do pressuposto processual da falta de interesse em agir, que obstando ao conhecimento do mérito da causa, importa como consequência, a revogação da sentença recorrida, julgando-se em substituição, extinta a instância a que se proverá no segmente decisório.


*


A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.

A falta superveniente de um pressuposto processual decorrente da procedência da pretensão formulada pelo Autor/impugnante, importa a consideração de que deu causa a Fazenda Pública por ter revertido a execução contra quem não era responsável, por ter determinado a instauração da presente acção.

Tendo dado causa à acção é sobre a recorrente que impende a responsabilidade tributário das custas do processo (cf. n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do CPC ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT.


IV – CONCLUSÕES

O revertido que impugna as liquidações exequendas deixa de ter interesse em agir na acção de impugnação, por facto superveniente, se entretanto, no âmbito da acção de oposição, que também deduziu, foi julgada extinta a instância executiva por ilegitimidade do executado/revertido, com fundamento na falta de prova do exercício de funções de administração da sociedade executada principal, no período relevante.


*


V - DECISÃO


Termos em que, acordam as Juízas da 1ª Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em julgar verificada a excepção dilatória inominada de falta do pressuposto processual de interesse em agir, por facto superveniente e não tomar conhecimento do recurso jurisdicional.


Custas pela Fazenda Pública.

Lisboa, 4 de Maio de 2023.



Ana Cristina Carvalho - Relatora

Hélia Gameiro – 1ª Adjunta

Catarina Almeida e Sousa – 2ª Adjunta