Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 890/14.0BELRA |
| Secção: | CA |
| Data do Acordão: | 05/25/2023 |
| Relator: | FREDERICO MACEDO BRANCO |
| Descritores: | PAGAMENTO DAS PRESTAÇÕES EM DÍVIDA SEGURANÇA SOCIAL RESTITUIÇÃO DE MONTANTES RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA |
| Sumário: | I – Se o empregador não cumpriu os pressupostos legais para fazer cessar contratos de trabalho (cfr. arts. 9°, n.° 1, al d) e 10 °, n°s 1 e 4 do Decreto-Lei n.°220/2006) deve ser responsabilizado pelo pagamento da totalidade do período para que é concedida a prestação inicial de desemprego. Assim, sendo excedidos os limites previstos no n.° 4 do artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 220/2006 é aplicada a cominação do artigo 63.° do mesmo diploma. II - A reclamação para a conferência constitui o meio adjetivo próprio ao dispor da parte que se sinta prejudicada pela decisão individual e sumária do relator sobre o objeto do recurso, cfr. artº 652º nº 1 c) e nº 3 ex vi 656º CPC. O recorrente/reclamante nessa reclamação pode restringir o objeto do recurso, cfr. artº 635º nº 4 CPC, mas não pode ampliar o seu objeto. A Reclamação para a Conferência não é uma nova Ação, nem um novo Recurso, mas um meio tendente a uma reapreciação das questões originariamente suscitadas. III - No regime do art° 652° n° 1 c) e n° 3 ex vi 656° CPC a reclamação para a conferência da decisão sumária proferida apenas pelo relator faz retroagir o conhecimento em conferência do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão sumária, conhecimento limitado às questões especificadas pelo recorrente nas conclusões de recurso. IV - Não se verifica omissão de pronuncia por parte do Tribunal de 1ª Instância em coletivo, quando não apreciou expressamente os novos vícios e nulidades suscitadas inovatoriamente em sede de reclamação para a conferencia, sendo que na PI não foram invocadas quaisquer nulidades que carecessem de ser apreciadas de modo a entender que a Ação poderia ser intentada a todo o tempo. |
| Votação: | Unanimidade |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I- Relatório A V......, LDA, intentou Ação Administrativa Especial contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I. P., tendente à anulação do ato de 2.10.2013 da Diretora do Núcleo de Prestações, Desemprego e Benefícios Diferidos do Centro Distrital de Braga da Entidade Demandada, através do qual se decidiu pela manutenção da obrigação de pagamento das prestações em dívida, no valor de € 32.356,20, relativamente a dois beneficiários, correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego reconhecida àqueles trabalhadores. Tendo no TAF de Leiria sido proferida Sentença singular em 12 de novembro de 2014, absolvendo-se a Entidade Demandada da Instância, veio a Autora Reclamar para a Conferência, o que determinou que em 12 de março de 2015 tivesse sido proferido Acórdão a confirmar a Sentença Reclamada. Inconformada com a decisão proferida, veio a Autora, em 5 de maio de 2015 Recorrer para esta instância, concluindo: “A) O douto Acórdão decidiu pela procedência da exceção de caducidade do direito de ação invocada pela entidade demandada, nos termos da alínea h) do n.° 1 e 2 do artigo 89 do CPTA. B) A douta decisão é nula, pois não se pronuncia sobre as nulidades aventadas em sede das alegações apresentadas pela Recorrente- nulidades essas, que invocáveis a todo o tempo, que devidamente apreciadas e consideradas, não culminariam na caducidade do direito de ação. C) Sendo essas em concreto, a nulidade que decorre da total ausência de fundamentação tendente à demonstração de que a conduta da ora reclamante criou na convicção dos trabalhadores em causa, de que preenchiam as condições previstas no n.° 4 artigo 10.° do dec lei 220/2006 de 3 de Novembro. D) Bem como ainda a violação do princípio constitucional da desconcentração administrativa (artigo 267.°, n.°2 da CRP). E) Padece assim a douta decisão de vício de nulidade prevista na alínea d) do n° 1 do art° 668° do CPC, por omissão de pronúncia. F) Essa omissão é plena, e inequívoca, pois o Acórdão ora em crise, não conhece de questão suscitada nos autos e que deva apreciar; não emite sobre ela qualquer pronúncia expressa e não considera o seu conhecimento prejudicado. G) O art° 608°, n° 2, do Código de Processo Civil, impõe ao julgador o dever de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, sancionando com nulidade o não cumprimento desse dever — omissão de pronúncia - artigo 615°, n° 1, d) do Código de Processo Civil. H) Caso doutamente assim não se entenda, a Recorrente não se conforma com a ausência de fundamentação fáctica que culmina na condenação em pagamento — injustificado e infundado — de montante tão avultado, (32.356,20€), sem que à Recorrente tenha sido facultada a possibilidade de produzir prova tendente à confirmação dos factos que alegou — factos esses que a provarem-se necessariamente culminariam em decisão diversa da proferida a final. I) O Instituto da Segurança Social, porém, proferiu o ato administrativo ora em crise, limitando-se à aplicação “autista “ da Lei, ignorando transversalmente toda a argumentação da Recorrente- sobre a qual de resto, nunca se pronunciou. J) Não realizou uma diligência de prova sequer -não obstante indicada pela Reclamante — com vista ao apuramento de que se verificavam no caso em apreço os requisitos, de que a lei faz depender para se considerar da Responsabilidade pelo pagamento das aludidas prestações. K) Não podem deixar de ser cominadas com nulidade, as decisões que pugnam pela aplicabilidade do artigo n.°10.° n.° 4 do DL 220/2006 de 3 de Novembro, sem qualquer consideração pelo elemento subjetivo do referido dispositivo legal, em concreto, a demonstração de que a conduta da ora reclamante criou na convicção dos trabalhadores em causa, de que preenchiam as condições previstas no n.° 4 artigo 10.° do Dec lei 220/2006 de 3 de Novembro. L) Ora, omitindo o ato administrativo quaisquer elementos tendentes à constatação de que deve pender sobre a presente entidade, a responsabilidade pelo pagamento das prestações integrais de desemprego que aos trabalhadores visados caberiam, porquanto comprovadamente criou essa convicção nos trabalhadores, padece esta de nulidade, porquanto ofende nesta medida, o conteúdo essencial de um direito fundamental.- artigo 133 al. g) do CPA M) Por um lado o ato administrativo ora em crise violou o direito constitucional de produção de prova e de tutela jurisdicional efetiva previsto nos artigos 2o e 20° n° 1 da CRP, porquanto, sem qualquer fundamento legal, não ordenou que fossem efetuadas quaisquer diligências para produção de prova testemunhal, N) Por outro lado, este mesmo ato administrativo, sanciona a entidade ora Recorrente, no pagamento de avultada quantia, sem que o ato administrativo que suporta a decisão sancionatória contenha em si qualquer fundamentação fáctica, para além da que decorre da evidente violação das quotas legais definidas pelo DL 220/2006 de 3 de Novembro. O) Violando igualmente a diretiva constitucional decorrente do atual art. 268.°, n.° 3 da CRP no qual se consagra o dever de fundamentação e correspondente direito subjetivo do administrado à fundamentação. P) A presente “falta de fundamentação”, não se trata de uma situação de ininteligibilidade. mas assume, in casu. uma natureza paralela à de ofensa ao conteúdo essencial de um direito fundamental [artigo 133.° n.° 2 alínea d^ do CPA]. Q) O ato nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade, e salvo disposição legal em contrário, a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode, também a todo o tempo, ser conhecida por qualquer autoridade e declarada pelos tribunais administrativos ou pelos órgãos administrativos competentes. R) A base de uma decisão justa de mérito assenta necessariamente no julgamento adequado dos factos provados e não provados que permitam ao julgador a construção silogística necessária entre os factos e o direito a que alude o n° 3 e n° 4 do artigo 607° do Código de Processo Civil. S) Ao não acolher a solicitada produção de meio de prova testemunhal, e ao não elencar quaisquer factos tendentes à constatação de que a entidade patronal ora em causa criou nos trabalhadores visados pela extinção de posto de trabalho, o convencimento de que reuniam os pressupostos exigíveis pelo DL 220/2006 de 3 de Novembro, a administração Pública, e o ato que dela emanou, cerceou o direito que a norma fundamental consagra (artigo 20° n° 1 da CRP). T) O ato administrativo em causa, abordou o caso de forma genérica, sem a análise individual e sem a abordagem das circunstâncias fáticas que ensejaram a autuação e a apresentação de defesa. U) As circunstâncias fácticas encontram-se todas elencadas no artigo 37.° - página 9 a 15, que por razões de sistematização não se reproduzem. V) Por outro lado, a lei não se limita a sancionar a violação do limite das quotas legais definidas pelo Dl 220 /2006 de 3 de Novembro. W) Sanção essa, compreensível sob vários pontos de vista, sobretudo se considerarmos o espirito da lei - dissuadir as entidades patronais de convencerem os seus trabalhadores a cessarem os contratos de trabalho em número que ultrapasse as quotas legalmente admissíveis, que o legislador, num juízo de ponderação, entre as necessidades das empresas de concorrerem nos mercados e as necessidades de combater o desemprego, concluiu serem as adequadas. X) O que não se compreende é desproporcionalidade da sanção aplicável, em violação do Principio da Proporcionalidade plasmado no artigo 18.° da CRP — a obrigatoriedade de devolução, independentemente do trabalhador deste ter usufruído na integra resulta num enriquecimento sem causa. Y) Por ultimo, o ato administrativo em causa é também nulo, por manifesta violação do princípio constitucional da desconcentração administrativa (artigo 267.°, n.°2 da CRP), o que se invoca para os devidos efeitos. Z) O que aparentemente pode assemelhar-se a uma débil justificação pela errónea interpretação do prazo para interpor recurso hierárquico, não se pretende que assim seja, pois a quantidade de decisões judiciais que culminam na absolvição da instância, pela verificação da caducidade do direito à ação, nos moldes da presente, é assombrosa e só pode justificar-se pela existência de um quadro normativo ambíguo. AA) A este quadro ambíguo acresce que a própria conduta da Administração transpõe para os atos que comunica aos particulares essa intrínseca ambiguidade, induzindo em erro, ou melhor não esclarecendo convenientemente as formas, prazos e efeitos dos diversos meios impugnatórios ao seu dispor. Termos em que face ao exposto, e nos mais a suprir por V.Exas deve: a) Declarar-se nulidade de Douto Acórdão por omissão de pronúncia — o douto acórdão não se pronunciou sobre todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação - 615°, n° 1, d) do Código de Processo Civil. Em alternativa b) Declarar-se nulidade de douto Acórdão por violação insanável de princípios constitucionais, [artigo 133.° n.° 2 alínea d) do CPA], como sejam o principio constitucional de produção de prova e de tutela jurisdicional efetiva previsto nos artigos 2º e 20° n° 1 da CRP, principio da proporcionalidade, e o principio da desconcentração administrativa; c) Absolvendo-se a Recorrente dos presentes autos. O ISS IP veio apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 3 de julho de 2015, aí concluindo: “1- O Tribunal a quo proferiu o douto despacho saneador sentença no sentido de julgar totalmente improcedente a ação administrativa especial, por ter concluído pela caducidade do direito de ação. 2 - Não preenchendo a recorrente as condições de atribuição do direito ao subsídio de desemprego inicial reconhecido aos trabalhadores supra identificados, por não respeitar os limites de quotas estabelecidos no n.° 4 artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro. 3 - Sucede que, a recorrente considera que o douto despacho saneador sentença, ao decidir pela absolvição da instância, pela verificação da caducidade do direito de acção, optou, pela interpretação do n.° 4 do artigo 59.° do CPTA, que no seu entender “restringe o acesso dos particulares à justiça”. Por outro lado, refere que o ora recorrido induziu em erro a recorrente, não esclarecendo convenientemente “as formas, prazos e efeitos dos diversos meios impugnatórios ao seu dispor”, violando assim, disposições constitucionais (artigo 267.° n.° 2 da CRP), e impedindo o acesso à justiça administrativa. 4 - Não lhe assistindo contudo razão, na medida em que realizando-se uma simples operação aritmética, claramente se conclui que, a recorrente entre 14 de Outubro de 2013 (data da notificação da decisão final de restituição de prestações de desemprego e das notas de reposição), e 30 de Junho de 2014 (data da propositura da acção), passou quase um ano, pelo que à data em que a recorrente intentou a presente acção já se encontrava caducado o respetivo direito. 5 - A notificação da decisão em crise, é clara, ao contrário do alegado pela recorrente, uma vez que, na parte final da mesma, refere-se: “Desta decisão não cabe reclamação, cf. disposto no n.° 2 do artigo 66.° do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro, sendo porém, suscetível de recurso: - 3 meses para recorrer hierarquicamente para o Presidente do Conselho Diretivo do Instituto de Segurança Social; - 3 meses para impugnar contenciosamente. 6 - Pelo que, bem andou o Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, pela caducidade do direito de ação que consubstancia uma exceção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo, nos termos do artigo 89.° n.° 1 alínea h) do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, e que determina a absolvição do ora recorrido da instância, (artigos 278.° n.° 1 alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.° do Código de Processo dos Tribunais Administrativos), reforçada pelo Acórdão proferido a 12 de Março de 2015, que confirmou e defendeu a manutenção da decisão reclamada. Termos em que deverá ser negado provimento ao presente recurso pois só assim se fará a costumada, JUSTIÇA”. Em 8 de setembro de 2015 foi proferido Despacho de admissão de recurso, mais se tendo sustentado a decisão proferida, atenta a nulidade recursivamente suscitada. Aí se afirmou: “Vem invocada pela Autora, aqui Recorrente, a existência de omissão de pronúncia por parte do acórdão recorrido. Ora, como se sabe, tal acórdão confirmou a sentença de 12.11.2014, a qual, julgando procedente a exceção da caducidade do direito de ação, absolveu a Entidade Demandada da instância. A procedência dessa exceção determinou, evidentemente, que não se conhecesse do mérito da causa. A única questão que se impunha conhecer era, precisamente, a caducidade do direito de ação, invocada pela Entidade Demandada. E essa foi conhecida. Quanto ao mais invocado pela Autora/Recorrente, trata-se de argumentos e não de questões. Não ocorre, portanto, a nulidade prevista no artigo 615.º/1/d) do Código de Processo Civil. O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 23 de setembro de 2015, emitiu parecer em 5 de outubro de 2015, no qual, a final, se pronuncia “no sentido de que não tem razão a recorrente e que deve ser mantida na íntegra a decisão em reapreciação, pois a mesma não padece de qualquer vício, nem merece qualquer censura, designadamente a que lhe faz a recorrente.” Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento. II - Questões a apreciar Frederico de Frias Macedo Branco Alda Nunes Lina Costa |