Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:890/14.0BELRA
Secção:CA
Data do Acordão:05/25/2023
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:PAGAMENTO DAS PRESTAÇÕES EM DÍVIDA
SEGURANÇA SOCIAL
RESTITUIÇÃO DE MONTANTES
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
Sumário:I – Se o empregador não cumpriu os pressupostos legais para fazer cessar contratos de trabalho (cfr. arts. 9°, n.° 1, al d) e 10 °, n°s 1 e 4 do Decreto-Lei n.°220/2006) deve ser responsabilizado pelo pagamento da totalidade do período para que é concedida a prestação inicial de desemprego.
Assim, sendo excedidos os limites previstos no n.° 4 do artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 220/2006 é aplicada a cominação do artigo 63.° do mesmo diploma.
II - A reclamação para a conferência constitui o meio adjetivo próprio ao dispor da parte que se sinta prejudicada pela decisão individual e sumária do relator sobre o objeto do recurso, cfr. artº 652º nº 1 c) e nº 3 ex vi 656º CPC.
O recorrente/reclamante nessa reclamação pode restringir o objeto do recurso, cfr. artº 635º nº 4 CPC, mas não pode ampliar o seu objeto.
A Reclamação para a Conferência não é uma nova Ação, nem um novo Recurso, mas um meio tendente a uma reapreciação das questões originariamente suscitadas.
III - No regime do art° 652° n° 1 c) e n° 3 ex vi 656° CPC a reclamação para a conferência da decisão sumária proferida apenas pelo relator faz retroagir o conhecimento em conferência do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão sumária, conhecimento limitado às questões especificadas pelo recorrente nas conclusões de recurso.
IV - Não se verifica omissão de pronuncia por parte do Tribunal de 1ª Instância em coletivo, quando não apreciou expressamente os novos vícios e nulidades suscitadas inovatoriamente em sede de reclamação para a conferencia, sendo que na PI não foram invocadas quaisquer nulidades que carecessem de ser apreciadas de modo a entender que a Ação poderia ser intentada a todo o tempo.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I- Relatório
A V......, LDA, intentou Ação Administrativa Especial contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I. P., tendente à anulação do ato de 2.10.2013 da Diretora do Núcleo de Prestações, Desemprego e Benefícios Diferidos do Centro Distrital de Braga da Entidade Demandada, através do qual se decidiu pela manutenção da obrigação de pagamento das prestações em dívida, no valor de € 32.356,20, relativamente a dois beneficiários, correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego reconhecida àqueles trabalhadores.
Tendo no TAF de Leiria sido proferida Sentença singular em 12 de novembro de 2014, absolvendo-se a Entidade Demandada da Instância, veio a Autora Reclamar para a Conferência, o que determinou que em 12 de março de 2015 tivesse sido proferido Acórdão a confirmar a Sentença Reclamada.
Inconformada com a decisão proferida, veio a Autora, em 5 de maio de 2015 Recorrer para esta instância, concluindo:
“A) O douto Acórdão decidiu pela procedência da exceção de caducidade do direito de ação invocada pela entidade demandada, nos termos da alínea h) do n.° 1 e 2 do artigo 89 do CPTA.
B) A douta decisão é nula, pois não se pronuncia sobre as nulidades aventadas em sede das alegações apresentadas pela Recorrente- nulidades essas, que invocáveis a todo o tempo, que devidamente apreciadas e consideradas, não culminariam na caducidade do direito de ação.
C) Sendo essas em concreto, a nulidade que decorre da total ausência de fundamentação tendente à demonstração de que a conduta da ora reclamante criou na convicção dos trabalhadores em causa, de que preenchiam as condições previstas no n.° 4 artigo 10.° do dec lei 220/2006 de 3 de Novembro.
D) Bem como ainda a violação do princípio constitucional da desconcentração administrativa (artigo 267.°, n.°2 da CRP).
E) Padece assim a douta decisão de vício de nulidade prevista na alínea d) do n° 1 do art° 668° do CPC, por omissão de pronúncia.
F) Essa omissão é plena, e inequívoca, pois o Acórdão ora em crise, não conhece de questão suscitada nos autos e que deva apreciar; não emite sobre ela qualquer pronúncia expressa e não considera o seu conhecimento prejudicado.
G) O art° 608°, n° 2, do Código de Processo Civil, impõe ao julgador o dever de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, sancionando com nulidade o não cumprimento desse dever — omissão de pronúncia - artigo 615°, n° 1, d) do Código de Processo Civil.
H) Caso doutamente assim não se entenda, a Recorrente não se conforma com a ausência de fundamentação fáctica que culmina na condenação em pagamento — injustificado e infundado — de montante tão avultado, (32.356,20€), sem que à Recorrente tenha sido facultada a possibilidade de produzir prova tendente à confirmação dos factos que alegou — factos esses que a provarem-se necessariamente culminariam em decisão diversa da proferida a final.
I) O Instituto da Segurança Social, porém, proferiu o ato administrativo ora em crise, limitando-se à aplicação “autista “ da Lei, ignorando transversalmente toda a argumentação da Recorrente- sobre a qual de resto, nunca se pronunciou.
J) Não realizou uma diligência de prova sequer -não obstante indicada pela Reclamante — com vista ao apuramento de que se verificavam no caso em apreço os requisitos, de que a lei faz depender para se considerar da Responsabilidade pelo pagamento das aludidas prestações.
K) Não podem deixar de ser cominadas com nulidade, as decisões que pugnam pela aplicabilidade do artigo n.°10.° n.° 4 do DL 220/2006 de 3 de Novembro, sem qualquer consideração pelo elemento subjetivo do referido dispositivo legal, em concreto, a demonstração de que a conduta da ora reclamante criou na convicção dos trabalhadores em causa, de que preenchiam as condições previstas no n.° 4 artigo 10.° do Dec lei 220/2006 de 3 de Novembro.
L) Ora, omitindo o ato administrativo quaisquer elementos tendentes à constatação de que deve pender sobre a presente entidade, a responsabilidade pelo pagamento das prestações integrais de desemprego que aos trabalhadores visados caberiam, porquanto comprovadamente criou essa convicção nos trabalhadores, padece esta de nulidade, porquanto ofende nesta medida, o conteúdo essencial de um direito fundamental.- artigo 133 al. g) do CPA
M) Por um lado o ato administrativo ora em crise violou o direito constitucional de produção de prova e de tutela jurisdicional efetiva previsto nos artigos 2o e 20° n° 1 da CRP, porquanto, sem qualquer fundamento legal, não ordenou que fossem efetuadas quaisquer diligências para produção de prova testemunhal,
N) Por outro lado, este mesmo ato administrativo, sanciona a entidade ora Recorrente, no pagamento de avultada quantia, sem que o ato administrativo que suporta a decisão sancionatória contenha em si qualquer fundamentação fáctica, para além da que decorre da evidente violação das quotas legais definidas pelo DL 220/2006 de 3 de Novembro.
O) Violando igualmente a diretiva constitucional decorrente do atual art. 268.°, n.° 3 da CRP no qual se consagra o dever de fundamentação e correspondente direito subjetivo do administrado à fundamentação.
P) A presente “falta de fundamentação”, não se trata de uma situação de ininteligibilidade. mas assume, in casu. uma natureza paralela à de ofensa ao conteúdo essencial de um direito fundamental [artigo 133.° n.° 2 alínea d^ do CPA].
Q) O ato nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade, e salvo disposição legal em contrário, a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode, também a todo o tempo, ser conhecida por qualquer autoridade e declarada pelos tribunais administrativos ou pelos órgãos administrativos competentes.
R) A base de uma decisão justa de mérito assenta necessariamente no julgamento adequado dos factos provados e não provados que permitam ao julgador a construção silogística necessária entre os factos e o direito a que alude o n° 3 e n° 4 do artigo 607° do Código de Processo Civil.
S) Ao não acolher a solicitada produção de meio de prova testemunhal, e ao não elencar quaisquer factos tendentes à constatação de que a entidade patronal ora em causa criou nos trabalhadores visados pela extinção de posto de trabalho, o convencimento de que reuniam os pressupostos exigíveis pelo DL 220/2006 de 3 de Novembro, a administração Pública, e o ato que dela emanou, cerceou o direito que a norma fundamental consagra (artigo 20° n° 1 da CRP).
T) O ato administrativo em causa, abordou o caso de forma genérica, sem a análise individual e sem a abordagem das circunstâncias fáticas que ensejaram a autuação e a apresentação de defesa.
U) As circunstâncias fácticas encontram-se todas elencadas no artigo 37.° - página 9 a 15, que por razões de sistematização não se reproduzem.
V) Por outro lado, a lei não se limita a sancionar a violação do limite das quotas legais definidas pelo Dl 220 /2006 de 3 de Novembro.
W) Sanção essa, compreensível sob vários pontos de vista, sobretudo se considerarmos o espirito da lei - dissuadir as entidades patronais de convencerem os seus trabalhadores a cessarem os contratos de trabalho em número que ultrapasse as quotas legalmente admissíveis, que o legislador, num juízo de ponderação, entre as necessidades das empresas de concorrerem nos mercados e as necessidades de combater o desemprego, concluiu serem as adequadas.
X) O que não se compreende é desproporcionalidade da sanção aplicável, em violação do Principio da Proporcionalidade plasmado no artigo 18.° da CRP — a obrigatoriedade de devolução, independentemente do trabalhador deste ter usufruído na integra resulta num enriquecimento sem causa.
Y) Por ultimo, o ato administrativo em causa é também nulo, por manifesta violação do princípio constitucional da desconcentração administrativa (artigo 267.°, n.°2 da CRP), o que se invoca para os devidos efeitos.
Z) O que aparentemente pode assemelhar-se a uma débil justificação pela errónea interpretação do prazo para interpor recurso hierárquico, não se pretende que assim seja, pois a quantidade de decisões judiciais que culminam na absolvição da instância, pela verificação da caducidade do direito à ação, nos moldes da presente, é assombrosa e só pode justificar-se pela existência de um quadro normativo ambíguo.
AA) A este quadro ambíguo acresce que a própria conduta da Administração transpõe para os atos que comunica aos particulares essa intrínseca ambiguidade, induzindo em erro, ou melhor não esclarecendo convenientemente as formas, prazos e efeitos dos diversos meios impugnatórios ao seu dispor.
Termos em que face ao exposto, e nos mais a suprir por V.Exas deve:
a) Declarar-se nulidade de Douto Acórdão por omissão de pronúncia — o douto acórdão não se pronunciou sobre todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação - 615°, n° 1, d) do Código de Processo Civil.
Em alternativa
b) Declarar-se nulidade de douto Acórdão por violação insanável de princípios constitucionais, [artigo 133.° n.° 2 alínea d) do CPA], como sejam o principio constitucional de produção de prova e de tutela jurisdicional efetiva previsto nos artigos 2º e 20° n° 1 da CRP, principio da proporcionalidade, e o principio da desconcentração administrativa;
c) Absolvendo-se a Recorrente dos presentes autos.

O ISS IP veio apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 3 de julho de 2015, aí concluindo:
“1- O Tribunal a quo proferiu o douto despacho saneador sentença no sentido de julgar totalmente improcedente a ação administrativa especial, por ter concluído pela caducidade do direito de ação.
2 - Não preenchendo a recorrente as condições de atribuição do direito ao subsídio de desemprego inicial reconhecido aos trabalhadores supra identificados, por não respeitar os limites de quotas estabelecidos no n.° 4 artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro.
3 - Sucede que, a recorrente considera que o douto despacho saneador sentença, ao decidir pela absolvição da instância, pela verificação da caducidade do direito de acção, optou, pela interpretação do n.° 4 do artigo 59.° do CPTA, que no seu entender “restringe o acesso dos particulares à justiça”. Por outro lado, refere que o ora recorrido induziu em erro a recorrente, não esclarecendo convenientemente “as formas, prazos e efeitos dos diversos meios impugnatórios ao seu dispor”, violando assim, disposições constitucionais (artigo 267.° n.° 2 da CRP), e impedindo o acesso à justiça administrativa.
4 - Não lhe assistindo contudo razão, na medida em que realizando-se uma simples operação aritmética, claramente se conclui que, a recorrente entre 14 de Outubro de 2013 (data da notificação da decisão final de restituição de prestações de desemprego e das notas de reposição), e 30 de Junho de 2014 (data da propositura da acção), passou quase um ano, pelo que à data em que a recorrente intentou a presente acção já se encontrava caducado o respetivo direito.
5 - A notificação da decisão em crise, é clara, ao contrário do alegado pela recorrente, uma vez que, na parte final da mesma, refere-se: “Desta decisão não cabe reclamação, cf. disposto no n.° 2 do artigo 66.° do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro, sendo porém, suscetível de recurso:
- 3 meses para recorrer hierarquicamente para o Presidente do Conselho Diretivo do Instituto de Segurança Social;
- 3 meses para impugnar contenciosamente.
6 - Pelo que, bem andou o Tribunal a quo, ao decidir como decidiu, pela caducidade do direito de ação que consubstancia uma exceção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo, nos termos do artigo 89.° n.° 1 alínea h) do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, e que determina a absolvição do ora recorrido da instância, (artigos 278.° n.° 1 alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.° do Código de Processo dos Tribunais Administrativos), reforçada pelo Acórdão proferido a 12 de Março de 2015, que confirmou e defendeu a manutenção da decisão reclamada.
Termos em que deverá ser negado provimento ao presente recurso pois só assim se fará a costumada, JUSTIÇA”.
Em 8 de setembro de 2015 foi proferido Despacho de admissão de recurso, mais se tendo sustentado a decisão proferida, atenta a nulidade recursivamente suscitada. Aí se afirmou:
“Vem invocada pela Autora, aqui Recorrente, a existência de omissão de pronúncia por parte do acórdão recorrido. Ora, como se sabe, tal acórdão confirmou a sentença de 12.11.2014, a qual, julgando procedente a exceção da caducidade do direito de ação, absolveu a Entidade Demandada da instância.
A procedência dessa exceção determinou, evidentemente, que não se conhecesse do mérito da causa. A única questão que se impunha conhecer era, precisamente, a caducidade do direito de ação, invocada pela Entidade Demandada. E essa foi conhecida.
Quanto ao mais invocado pela Autora/Recorrente, trata-se de argumentos e não de questões. Não ocorre, portanto, a nulidade prevista no artigo 615.º/1/d) do Código de Processo Civil.

O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 23 de setembro de 2015, emitiu parecer em 5 de outubro de 2015, no qual, a final, se pronuncia no sentido de que não tem razão a recorrente e que deve ser mantida na íntegra a decisão em reapreciação, pois a mesma não padece de qualquer vício, nem merece qualquer censura, designadamente a que lhe faz a recorrente.”

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
Há que verificar predominantemente se estão reunidos os pressupostos que determinaram a procedência da exceção de caducidade do direito de ação invocada pela entidade demandada, nos termos da alínea h) do n.° 1 e 2 do artigo 89º do CPTA, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, importando verificar, designadamente, o suscitado “erro de interpretação e aplicação da lei”.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade:
«A) Em 17.10.2013 a Autora foi notificada do despacho de 2.10.2013 da Diretora do Núcleo de Prestações, Desemprego e Benefícios Diferidos do Centro Distrital de Braga da Entidade Demandada, através do qual se decidiu pela manutenção da obrigação de pagamento das prestações em dívida, no valor de € 32.356,20 , relativamente a dois beneficiários, correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego reconhecida àqueles trabalhadores (confissão – artigo 1.º da petição inicial – e documento n.º 1 junto com a petição inicial);
B) Em 17.1.2014 a Autora interpôs recurso hierárquico desse despacho (acordo);
C) O recurso hierárquico não obteve decisão (acordo);
D) A presente ação deu entrada neste tribunal em 27.6.2014 (fls. 1 dos presentes autos)».

IV – Do Direito
Analisemos então o suscitado.
Discorreu-se em 1ª instância, no que aqui releva, o seguinte:
«Nos termos do artigo 58.º/2/b) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a presente ação teria de ser proposta no prazo de três meses, contados nos termos do n.º 3 do mesmo artigo e com o termo inicial fixado de acordo com o artigo 59.º/1 do mesmo código, no qual se estabelece que «[o] prazo para a impugnação pelos destinatários quem o ato administrativo deva ser notificado só corre a partir da data da notificação, ainda que o ato tenha sido objeto de publicação obrigatória».
«Ora, a notificação a que se refere o já invocado artigo 59.º/1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ocorreu em 17.10.2013 [A) do probatório]. Deste modo, o prazo de três meses para a propositura da ação iniciou-se no dia 18.10.2013.
«Considerando a suspensão do prazo no período de férias judiciais que decorreu de 22.12.2013 e 3.1.2014 (cfr. o artigo 12.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais aprovada pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro), o mesmo deve ser convertido em 90 dias (cfr., neste sentido, e nomeadamente, o acórdão de 8.11.2007 do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 703/07). Daqui resulta que o prazo terminaria no dia 28.1.2014.
«No entanto, em 17.1.2014 veio a ser interposto recurso hierárquico [B) do probatório]. De acordo com o disposto no artigo 59.º/4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, «[a] utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respetivo prazo legal». Na medida em que o recurso não obteve decisão [C) do probatório], releva o decurso do prazo legal para a decisão.
«De acordo com o disposto no artigo 175.º/1 do Código do Procedimento Administrativo, «[q]uando a lei não fixe prazo diferente, o recurso hierárquico deve ser decidido no prazo de 30 dias contado a partir da remessa do processo ao órgão competente para dele conhecer» (e não 90 dias, ao contrário do que invoca a Autora no artigo 38.º do articulado de resposta à exceção, na medida em que a aplicação do regime do n.º 2 do artigo 175.º depende da efetiva realização de nova instrução ou de diligências complementares).
Portanto, àquele prazo de 30 dias acrescem os 15 dias que resultam do artigo 172.º/1 do mesmo código (neste sentido, vd. o acórdão de 25.2.2010 do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 320/08). Deste modo, o prazo de 90 dias que se iniciou em 18.10.2013 suspendeu-se por 45 dias úteis em 17.1.2014, ou seja, suspendeu-se até 20.3.2014. Até ali tinham decorrido 78 dias. Retomando a contagem dos 90 dias em 21.3.2014, temos que o prazo terminou em 1.4.2014. A presente ação foi proposta em 27.6.2014, motivo pelo qual terá de proceder a exceção da caducidade do direito de ação invocada pela Entidade Demandada.
«Esta conclusão não é abalada pela alegação da Autora. Desde logo, não se pode dizer que o recurso hierárquico é um «mecanismo útil, facultando a possibilidade de incentivar os particulares a recorrer a uma impugnação administrativa em vez de irem a tribunal» (cfr. o artigo 6.º do articulado de resposta à exceção). Se o mesmo é necessário, e tal como decorre da própria designação, não consubstancia uma mera faculdade dos particulares, mas sim um ónus cuja observância é condição de acesso à via judicial (cfr. o artigo 167.º/1 do Código do Procedimento Administrativo).
«Por outro lado, não se vê o fundamento – nem a Autora o indica – para a conclusão que mesma tira no artigo 7.º da resposta, no sentido de que a notificação a levou ao entendimento de que havia lugar à interposição de recurso hierárquico necessário. Tal notificação não se mostra parca nem enganosa, ao contrário do que alega a Autora no artigo 21.º daquele articulado, pelo que se mostra inaceitável a invocação – com base na notificação efetuada – que a Entidade Demandada age em abuso de direito (cfr. o artigo 18.º da resposta). Por outro lado, não estava a Entidade Demandada obrigada a indicar, no ofício de notificação, «as vicissitudes da suspensão da contagem do prazo» nem o «prazo para apreciar o recurso» (cfr. os artigos 25.º e 28.º da resposta), na medida em que tal não integra a solução constante do artigo 68.º do Código do Procedimento Administrativo.
«Igualmente não colhe o entendimento de que a interpretação do artigo 59.º/4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos feita pela Entidade Demandada (e agora por este tribunal) viola disposições constitucionais. Existe um prazo (de três meses) para impugnação contenciosa. A Autora beneficiou do alargamento desse prazo por força da apresentação de recurso hierárquico. O referido artigo 59.º/4 determina o momento em que se retoma a contagem do prazo de impugnação contenciosa, não podendo ser interpretado contra legem a pretexto de que deve vingar a solução que maior prazo der ao particular. Nenhuma das disposições ou princípios constitucionais invocados pela Autora pode fundamentar essa solução.
«Em suma, não se verifica qualquer circunstancialismo que deva determinar a aplicação das alíneas a) ou b) do n.º 4 do artigo 58.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
«A caducidade do direito de ação consubstancia uma exceção dilatória, que obsta ao prosseguimento do processo, nos termos do artigo 89.º/1/h) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e que determina a absolvição da Entidade Demandada da instância (artigo 278.º/1/e) do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos)».

Refira-se, desde logo, que se não vislumbram razões para divergir do entendimento adotado em 1ª instância.

Enquadrando o decidido judicialmente, por decisão singular proferida 12.11.2014 no TAF de Leiria, foi julgada procedente a exceção dilatória de caducidade do direito de ação, facto que determinou a absolvição da entidade demandada da instância, nos termos da alínea h) do n.° 1 e 2 do artigo 89.° do CPTA.
A Autora, não se conformando com aquela decisão, veio Reclamar da mesma para a correspondente Conferência, nos termos e para os efeitos do n.° 2 do artigo 27.° do CPTA.

O Tribunal Coletivo veio a confirmar a Sentença Recorrida, por acórdão de 12 de Março de 2015.

Com efeito, alega-se recursivamente que o ato objeto de impugnação se mostrará nulo, o que obstaria à procedência da exceção de caducidade do direito de ação, pois que nos termos do artigo 58.° n.° 1 do CPTA a “A impugnação de atos nulos ou inexistentes não está sujeita a prazo”.

Não se reconhece que assim seja, pois que resulta dos autos que a reclamante em 11 de Outubro de 2013, foi notificada pelo ofício n.° 271401, da decisão que determinou a manutenção da obrigação de pagamento do valor total de €32.356,20, relativamente aos beneficiários A...... (€22.051,20) e L...... (€10.305), correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego reconhecidas àqueles trabalhadores, nos termos do artigo 63.° do Decreto- Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro, alterado pelo Decreto-Lei n.° 68/2009, de 20 de Março, pela Lei n.° 5/2010, de 5 de Maio e pelo Decreto-Lei n.° 72/2010, de 18 de Junho que o republicou.

Àqueles trabalhadores foram atribuídas prestações de desemprego requeridas, devido à cessação dos respetivos contratos de trabalho com a ora recorrente, por acordo, ao abrigo do disposto no artigo 10.°, n.° 4 do Decreto-Lei n.° 220/2006, de 3 de Novembro.

Como se afirmou no Acórdão deste TCAS n.° 05013/09, “trata-se de uma responsabilidade atribuída à entidade empregadora, conforme se pode constatar através de jurisprudência nesse sentido: “De facto, parece que a lei entendeu que se o empregador não cumpriu os pressupostos legais para fazer cessar contratos de trabalho (cfr. arts. 9°, n.° 1, al d) e 10 °, n°s 1 e 4 do Decreto-Lei n.°220/2006) deve ser responsabilizado pelo pagamento da totalidade do período para que é concedida a prestação inicial de desemprego”.

Assim, sendo excedidos os limites previstos no n.° 4 do artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 220/2006 é aplicada a cominação do artigo 63.° do mesmo diploma.

Desse modo, foi a aqui recorrente notificada, em 11/10/2013, de que devia proceder ao pagamento do valor relativo ao período total de concessão da prestação inicial de desemprego aos referidos trabalhadores, tendo sido emitidas duas notas de reposição, uma no valor de €22.051,20, e outra no valor de €10.305.

Assim, tendo a recorrente sido notificada da decisão de indeferimento em 14/10/2013, (3.° dia útil após a remessa do ofício por correio), foi a partir desta data que começou a correr o prazo para reclamar, e recorrer, hierárquica e contenciosamente.

Foi assim que a aqui Recorrente, veio igualmente a Recorrer hierarquicamente em 17/01/2014, o que determinou automaticamente a suspensão do prazo de impugnação contenciosa, nos termos do n.° 4 do artigo 59.°, do CPTA.

Como se discorreu no Acórdão do TCAN proferido no processo n.° 941/09.0BEBRG, de 22.02.2013, “(...) havendo impugnação administrativa facultativa e impendendo sobre o ente competente ao qual a mesma foi dirigida o dever legal de decidir no prazo de 30 dias findo o qual e sem que haja sido tomada uma decisão se considera o ‘‘recurso tacitamente indeferido” (...) o prazo judicial de impugnação que se mostra previsto no art.° 58°, n.° 2 do CPTA foi suspenso tendo retomado com o seu curso, no caso, com o decurso do prazo legal para a decisão daquela impugnação administrativa (....)”.

A impugnação administrativa determinou assim a suspensão do prazo para recorrer contenciosamente até 24/03/2014, data correspondente ao termo do prazo que a entidade tinha para decidir do recurso hierárquico.

Retomada a contagem do prazo de impugnação contenciosa em 25/03/2014, contando os 90 dias que mediaram entre a data da notificação (14/10/2013) até à interposição do Recurso Hierárquico (17/01/2014), o prazo total de 90 dias para impugnação contenciosa do ato findou no dia 02/04/2014, quase 3 meses depois do termo do prazo.

Tendo a presente ação sido intentada em 30/06/2014, tal como decidido em 1ª Instância, mostra-se a mesma intempestiva,

Há depois uma questão essencial e que se mostra incontornável e que se prende com a circunstancia de na PI Autora não ter suscitado qualquer nulidade, tendo peticionado singelamente “(…) a anulação do ato administrativo, que ordena restituição de prestações de desemprego, promovendo, se lhe aprouver as diligências de prova que se afigurarem pertinentes, com vista à obtenção da verdade material”, mais peticionado “(…) a anulação da decisão que ordena a restituição de prestações de desemprego com as demais consequências legais.”

Assim sendo, mal se compreende como a decisão final poderia pecar por omissão de pronuncia, ao não terem sido abordadas as nulidades invocadas, quando as mesmas não foram sequer suscitadas na PI.

É certo que na Reclamação para a conferência vem a Recorrente suscitar a verificação de nulidades, mas tal resultou da circunstância de ter constatado que a decisão singular havia declarado a Caducidade da Ação, o que a levou a, só aí, a invocar nulidades, para procurar contornar a caducidade declarada, sendo que a Reclamação para a Conferencia não é a sede própria para que se suscitem vícios e nulidades não anteriormente invocadas.

Como se sumariou no Acórdão do TCAS nº 72/10.0BELSB, de 01-06-2017, “A reclamação para a conferência constitui o meio adjetivo próprio ao dispor da parte que se sinta prejudicada pela decisão individual e sumária do relator sobre o objeto do recurso, cfr. artº 652º nº 1 c) e nº 3 ex vi 656º CPC.
O recorrente/reclamante nessa reclamação pode restringir o objeto do recurso, cfr. artº 635º nº 4 CPC, mas não pode ampliar o seu objeto, …”:

A Reclamação para a Conferência não é uma nova Ação, nem um novo Recurso, mas um meio tendente a uma reapreciação das questões originariamente suscitadas.

“No regime do art° 652° n° 1 c) e n° 3 ex vi 656° CPC a reclamação para a conferência da decisão sumária proferida apenas pelo relator faz retroagir o conhecimento em conferência do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão sumária, conhecimento limitado às questões especificadas pelo recorrente nas conclusões de recurso, sem prejuízo de o recorrente, ora reclamante, restringir na reclamação o objeto recursório anteriormente definido nos termos do art° 635° n° 4 CPC.
Pelas razões de direito expostas, no caso concreto cumpre reapreciar as questões suscitadas pela Reclamante em sede de conclusões de recurso, fazendo retroagir o conhecimento do mérito do recurso ao momento anterior à decisão singular de mérito apenas proferida pelo Relator.” (Cfr. Acórdão nº 0415/16.2BEVIS de Supremo Tribunal Administrativo 16 de Dezembro de 2020”.

Assim, não se verifica omissão de pronuncia por parte do Tribunal a quo, em coletivo, quando não apreciou expressamente os novos vícios e nulidades suscitadas inovatoriamente em sede de reclamação para a conferencia, sendo que na PI não foram invocadas quaisquer nulidades que carecessem de ser apreciadas de modo a entender que a Ação poderia ser intentada a todo o tempo.

V - Decisão
Deste modo, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao Recurso, confirmando-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo.

Custas pela Recorrente

Lisboa, 25 de maio de 2023

Frederico de Frias Macedo Branco

Alda Nunes

Lina Costa