Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:145/05.0BEFUN-A
Secção:CA
Data do Acordão:04/04/2019
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL;
DANOS PATRIMONIAIS;
EQUIDADE;
JUROS DE MORA;
CASO JULGADO.
Sumário:
i) A equidade é um critério normativo a integrar segundo os ditames do art. 566.º do Código Civil o recurso à fixação da indemnização a que a equidade é chamada, não está no livre arbítrio do juiz; a leitura da lei evidencia a existência de critérios a que o juiz, nessa tarefa deve atender (n.º 3- Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados).

ii)Para ressarcimento dos danos patrimoniais sofridos pelo Autor e Recorrido no recurso principal, consistentes nas despesas inerentes à apresentação de um estudo prévio e de uma maquete, no âmbito do concurso limitado para execução de projectos do “Centro de Feiras e Exposições do Funchal”, lançado em 1990, em execução do acórdão do STA de 20.06.2013, proc. nº 1360/12, tendo presente o disposto no artigo 566.º, n.ºs 2 e 3, do Cód. Civil, mostra-se equitativo fixar a indemnização devida ao A. na quantia de EUR 18.000,00, já actualizada.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. Relatório

Alberto ……………………. intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal contra o Município do Funchal incidente de liquidação, na sequência do acórdão do STA de 20.06.2013, no proc. 1360/12, que revogou o acórdão do TCAS recorrido (que condenou o município R. a pagar ao A. a quantia de EUR 282.877,29, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação), remetendo as partes para liquidação para efeitos de execução de sentença.

Por sentença de 30.11.2014 do TAF do Funchal, a acção foi julgada parcialmente procedente e o R. município foi condenado a pagar ao A. a título de despesas com a elaboração da proposta e por recurso à equidade, a quantia de EUR 45.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação para a acção declarativa em 28.07.2005 e até integral pagamento.

O R. interpôs dessa decisão recurso jurisdicional e o A., com a s contra-alegações, apresentou recurso subordinado.

Nas alegações do recurso principal interposto o R. Município do Funchal, ora Recorrente, concluiu do seguinte modo:











O A., Alberto …………………………, contra-alegou, concluindo do seguinte modo:


«imagem no original»

E no recurso subordinado interposto concluiu:


«imagem no original»


O Recorrido no recurso subordinado apresentou contra-alegações pugnando pela sua improcedência.


O Ministério público pronunciou-se no sentido da improcedência dos recursos.


Após vistos legais, importa apreciar e decidir.



I. 1. Questões a apreciar e decidir:

I.1.1. No recurso principal

As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar:

i) Se a ocorre a excepção de ilegitimidade activa;

ii) Se a sentença recorrida errou no julgamento de facto e de direito, ao ter condenado o R., com recurso à equidade, ao pagamento ao A. da indemnização objecto do recurso.

I.1.2. No recurso Subordinado

A questão suscitada pelo aqui Recorrente, Alberto …………………………, delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduz-se em apreciar se o tribunal a quo errou no arbitramento do quantitativo indemnizatório, resultando dos autos um valor de despesas bastante superior que computa em EUR 170.000,00.


II. Fundamentação

II.1. De facto

Na sentença recorrida foi fixada a seguinte matéria de facto:

1. O Autor apresentou uma proposta contendo o estudo prévio e uma maquete, no âmbito do concurso limitado lançado pelo Município do Funchal denominado “Centro de Feiras e Exposições do Funchal.”

2. O atelier do Autor despendeu quatro meses para a elaboração da proposta referida em 1. supra.

3. Para a elaboração da proposta o Autor sub-contratou técnicos das especialidades de engenharia electrotécnica, engenharia civil e maquetistas.

4. Os técnicos que trabalharam na elaboração da proposta deslocaram-se ao Funchal para efeitos de elaboração da mesma.

5. O Autor recebeu o montante de €5.000,00 pago pelo Réu.

No tribunal a quo foi dada como não provada a seguinte factualidade:

a- O Autor despendeu os seguintes montantes com a elaboração da proposta:

OO tribunal a quo fundamentou a decisão da matéria de facto como segue:

A matéria de facto dada como assente nos presentes autos foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida segundo as várias soluções plausíveis das que stões de direito. A formação da nossa convicção para efeitos da fundamentação dos factos atrás dados como provados teve por base os documentos juntos aos autos infra referidos, os quais foram analisados segundo as regras da experiência comum e os depoimentos das testemunhas prestados em audiência final.

Deram-se como provados os factos vertidos em 1. supra com base nos documentos n.º 2 e n.º 3, a fls. 20-239 dos autos. O Tribunal considerou ainda o depoimento da testemunha João………………….. Esta testemunha prestou depoimento de forma isenta e credível mostrando ter conhecimento directo dos factos. Afirmou ter trabalhado directamente na proposta e no conteúdo da mesma no âmbito do concurso lançado pelo Município do Funchal.

Deu-se como provado o facto vertido em 2. supra com base no depoimento da testemunha João………………………... A testemunha referiu-se ao tempo despendido pelo atelier do Autor e pelas pessoas que no mesmo trabalhavam para a elaboração da proposta. Concretizando, disse que o tempo utilizado para a elaboração da proposta foi de 4 meses.

Deu-se como provado o facto vertido em 3. supra com base no depoimento da testemunha João………………… , da testemunha Ana……………………………………. e da testemunha João ………………………………………...

A testemunha João…………….. referiu-se à necessidade de contratação externa (ao atelier) de técnicos de diversas especialidades para a elaboração da proposta.

A testemunha Ana …………… prestou depoimento de forma segura e imparcial criando no Tribunal a convicção da veracidade das suas declarações. Referiu-se à criação de uma equipa multidisciplinar para a elaboração da proposta, com técnicos especialistas de engenharia civil, engenharia electrotécnica e maquetistas.

A testemunha João …………….. prestou depoimento de forma espontânea e verosímil. Tinha conhecimento directo dos factos tendo feito parte da equipa que trabalhou na elaboração da proposta. Afirmou que existiu recurso à subcontratação perante a complexidade da proposta.

Deu-se como provado o facto vertido em 4. supra com base no depoimento da testemunha João ……………………… e da testemunha Ana …………………………………….

A testemunha João ………… disse que se tinha deslocado à Madeira 1 ou 2 vezes, não tendo, no entanto, precisado o número de vezes em que essas viagens ocorreram.

A testemunha Ana………….. referiu-se às viagens do Autor à Madeira, não tendo, no entanto, precisado o número de vezes em que tal sucedeu.

Deu-se como provado o facto vertido em 5. supra por acordo das partes expresso nos articulados.

Os depoimentos das testemunhas Herberto …………………….. e de Manuel ………………………. não foram considerados pelo Tribunal. As testemunhas são trabalhadores com vínculo profissional ao Réu não tendo conhecimento directo dos concretos custos suportados pelo Autor.

Quanto aos factos não provados tal deveu-se à não produção de prova sobre os mesmos.



II.2. De direito

II.1.1. Do recurso principal

Como ponto prévio importa deixar estabelecido que a decisão sobre a matéria de facto não vem impugnada nos recursos (art. 685.º-B do CPC antigo; art. 640.º do CPC actual), pelo que o probatório fixado se dá como devidamente estabilizado.

Isto estabelecido, vejamos a primeira questão que nos vem colocada no recurso principal e que se prende com a suscitada ilegitimidade do Autor e aqui Recorrido.

Esta questão, porém, encontra-se subtraída ao conhecimento deste tribunal face ao caso julgado formado pelo acórdão do STA de 20.06.2013, no proc. 1360/12.

No aresto do STA escreveu-se:

Resta identificar os danos surgidos em resultado da apontada ilegalidade que são susceptíveis de indemnização – serão apenas os decorrentes da frustração das expectativas na conclusão do negócio, dano de confiança (interesse contratual negativo), como defende o Recorrente, ou, pelo contrário, como sustenta o Recorrido, os mesmos abarcam os benefícios que a conclusão do negócio traria ao Autor, os lucros cessantes (interesse contratual positivo)?

2. O art.º 483.º/1 do CC estatui que quem, culposamente, praticar facto ilícito que cause danos a outrem está obrigado a ressarcir o lesado e o art.º 562.º do mesmo diploma estabelece que o autor da lesão está obrigado a “reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação” (art.º 562.º do CC), obrigação que, de resto, é comum a todas as formas de responsabilidade civil.

Tal poderia significar que mesmo na responsabilidade pré-contratual seria de admitir que, em certas situações e verificados certos pressupostos, a obrigação de reparação indemnizatória pudesse abarcar os benefícios que o lesado teria com a celebração do contrato nela cabendo, por isso, tanto os danos emergentes como os lucros cessantes. Dito de outra forma, tais normas permitiriam concluir que se considerasse que, no âmbito da responsabilidade civil pré-contratual, em certas situações - designadamente aquelas em que o lesado tinha direito à celebração do contrato e em que este só não foi celebrado em função da violação das regras do concurso - caberia indemnizar não só o interesse contratual negativo mas também os lucros cessantes, reconstituindo-se a situação patrimonial que existiria se o evento que obriga à reparação não se tivesse verificado.

Não tem sido essa, porém, a jurisprudência largamente maioritária deste Supremo Tribunal.

Com efeito, não ignorando que a prática culposa do acto ilícito faz incorrer o lesante no dever de indemnizar todos os danos daí decorrentes, este Supremo Tribunal tem entendido que os danos resultantes da violação das normas concursais ocorrida previamente à celebração do contrato obrigam apenas à reparação do interesse contratual negativo, isto é, dos danos decorrentes da frustração das expectativas de conclusão do negócio, dano de confiança, excluindo, por isso, a reparação do interesse positivo que a celebração de um contrato válido poderiam trazer à outra parte. Ou seja, vem sendo entendido que, por esta via, não poderão ser ressarcidos os lucros que o lesado porventura obteria se o facto ilícito não fosse praticado e o contrato fosse validamente celebrado.

Para tanto são invocados dois fundamentos essenciais; por um lado, tratar-se de uma situação onde o valor a proteger é o da confiança pelo que só deverão ser ressarcidos os prejuízos resultantes da violação da frustração ilícita do direito ao contrato e, por outro, considerar-se ser esse o único e verdadeiro dano que atinge o lesado já que “este continua a poder celebrar outros contratos, com a sua capacidade negocial apta a obter o lucro que obteria com a celebração do negócio frustrado. A detenção da capacidade de obter o lucro (noutros negócios) é que determina, em termos de razoabilidade e justiça, que - em regra - o dano negativo não compreenda o “lucro esperado” naquele contrato.” (Acórdão de 23/09/2003 (rec. 1527/02).). Se assim é, isto é, se o lesado continua com a sua capacidade negocial intacta e, por essa razão, pode alcançar noutros negócios os benefícios que poderia ter obtido com o negócio frustrado não haverá que indemnizá-lo pelo interesse contratual positivo, atenta a inexistência de danos que nessa vertente pudessem ser quantificados e merecer protecção jurídica.

Por isso, mais não fora, por força do disposto no artº 8.º/4 do CC, cumpre respeitar essa jurisprudência.

Mas, pode ainda acrescentar-se que nesse sentido converge o que se dispõe no art.º 102.º/5 e 6 do Código dos Contratos Públicos onde se lê que se a entidade adjudicante decidir não outorgar o contrato por razões que só a ela devem ser imputadas o lesado pode apenas exigir judicialmente a celebração do contrato e reclamar indemnização por todas as despesas e demais encargos em que comprovadamente incorreu com a elaboração da proposta e com a prestação de caução. Ou seja, a citada norma, em coerência com o que também se estatui no art.º 79.º/4 do mesmo diploma, limita o ressarcimento dos danos causados pela violação ilícita do direito à celebração do contrato às despesas tidas com a elaboração da proposta e com a prestação de caução.

3. No caso, o Autor propôs esta acção administrativa comum pedindo a condenação do Réu no pagamento de uma indemnização que o ressarcisse dos danos provocados pelo facto da CMF, ilegalmente, se ter recusado a celebrar o contrato referente ao concurso promovido pela CMF, apesar de ter sido classificado em 1.º lugar, e de nos termos do respectivo Regulamento ter direito a essa celebração.

Não vem questionada a ilicitude da conduta da Câmara nem que ela não tenha agido de forma culposa. Está pois em causa apenas a existência de danos e a sua amplitude.

Como acabamos de ver, o Autor tem direito a ser indemnizado apenas pelo dano negativo (dano de confiança), que - vd. Ac. do Pleno de 22/10/2009, já citado - abrange as despesas com a aquisição das despesas do processo do concurso e com a elaboração da proposta, não sendo de incluir nessa indemnização o lucro esperado com o cumprimento do contrato. [sublinhado nosso]

Na petição inicial o Autor identifica os danos sofridos com a ilegal conduta da CMF como sendo a perda dos seus honorários, no montante de 721.252,45 euros ou, se assim não for entendido, com “o direito a ser ressarcido pelo seu trabalho e despesas inerentes à preparação e apresentação da proposta no concurso em causa, que correspondem ao montante de 20% dos honorários previstos e que deveriam ser pagos à cabeça, com a celebração do contrato.” Ou seja, o autor contabilizou em 20% do total dos honorários, as despesas inerentes à preparação e apresentação da proposta, valor a que deveria ser subtraído o montante do prémio pela classificação em 1.º lugar no montante de 1.000.000$00 (5.000,00 euros) que o mesmo já havia recebido.

E foi esse valor que o Réu foi condenado a pagar pelo Acórdão recorrido.

Mas a verdade é que tais despesas não foram discriminadas e, por isso, como alega o Recorrente, nada se provou a esse propósito. Deste modo, tendo o autor direito ao pagamento das mencionadas despesas e sendo essencial a sua prévia identificação e prova, cumpre remeter as partes para liquidação deste Acórdão onde se fará a prova do montante das despesas efectivamente suportadas com a preparação e apresentação da proposta do Autor.

Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em conceder parcial provimento ao recurso e, revogando o Acórdão recorrido, remeter as partes para liquidação para efeitos de execução de sentença. [sublinhados e carregados nossos]”

Como também impressivamente se pode ler no citado aresto: “[a] Câmara Municipal do Funchal (doravante CMF) pôs a concurso a selecção da equipa técnica que ficaria responsável pela execução dos projectos do Centro de Feiras do Funchal e o Autor concorreu tendo a sua proposta sido classificada em 1.º lugar. Todavia, aquela Câmara, em 20/12/90, deliberou adjudicar o objecto do concurso ao concorrente classificado em 3.º lugar”.

Ou seja, o STA remeteu as partes, que o mesmo é dizer o A. ALBERTO……………………… e o R. MUNICÍPIO DO FUNCHAL, para incidente de liquidação para apuramento das despesas efectivamente despendidas pelo R. derivadas das despesas incorridas com o processo do concurso e com a elaboração da proposta. Sendo que, salvo o devido respeito, é totalmente desprovido de sentido vir nesta sede argumentar que o STA terá incorrido em erro de julgamento, como resulta da alegação do Município.

Pelo que, sob pena de violação de caso julgado, tem o recurso nesta parte que improceder.

Continuando, vejamos agora se o tribunal a quo errou ao ter condenado o R., aqui Recorrente, ao pagamento ao A. da indemnização objecto do presente e que foi arbitrada com base na equidade.

No TAF do Funchal a indemnização foi fixada com base no seguinte discurso fundamentador:

“(…) os factores produtivos utilizados pelo Autor tiveram necessariamente uma remuneração, a qual embora não provada, decorre das regras de experiência comum e do conhecimento empírico.

No entanto, a ausência de demonstração do quantum das despesas suportadas não deve ser valorada de forma a negar ao Autor o ressarcimento absoluto e integral das mesmas, atento o circunstancialismo já referido de as mesmas terem ocorrido há mais de 20 anos.

Porque se pretende evitar a injustiça e a contradição, não sendo de todo possível a quantificação das despesas deve o julgador recorrer à equidade e não julgar a liquidação improcedente sob pena de violar o caso julgado formado no acórdão que reconheceu a existência de um direito de crédito apenas não quantificado, vide neste sentido o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/07/2009, processo n.º 630-A/1996.S1.

Entendo, assim, que é de fixar o valor das despesas através de um juízo de equidade em conformidade com o disposto no art. 566.º, n.º 3, do Código Civil, tendo como limite máximo o valor reclamado pelo Autor.

Ponderando os custos com a utilização de meios humanos, técnicos e materiais, nomeadamente quanto ao tempo gasto pelo atelier do Autor de 4 meses, o recurso à sub-contratação de técnicos das especialidades de engenharia electrotécnica, engenharia civil e maquetistas, as deslocações ao local (Funchal), considero equitativo a fixação das despesas suportadas pelo Autor com a elaboração da proposta no montante de €50.000,00.

Ora o que desde logo se detecta é simplesmente que cálculo do valor indemnizatório foi diluído num apuramento genérico com recurso a juízos de equidade, e que teve como referentes os elementos indicados: utilização de meios humanos, técnicos e materiais, tempo de 4 meses gasto pelo atelier do Autor, subcontratação de técnicos das especialidades de engenharia electrotécnica, engenharia civil e maquetistas e as deslocações ao local (Funchal). Porém, por referência a cada um destes elementos nada mais é dito. É, pois, legítimo perguntar como chegou o tribunal a quo à fixação do montante indemnizatório em EUR 45.000,00 e não a outro montante qualquer (isto sempre com o valor limite fixado no pedido). Na verdade, nada é dito sobre o concreto apuramento do montante de EUR 45.000,00 entendido como adequado enquanto valor da indemnização a conferir a título de danos patrimoniais.

Necessário é ter presente que a equidade constitui um critério normativo (supletivo), sendo que a fixação da indemnização com recurso à equidade não está no livre arbítrio do juiz, antes a leitura da lei evidencia a existência de critérios a que o juiz, nessa tarefa, deve atender (art.s 566.º, n.º 3, e 496.º, n.º 4, e 494.º do Código Civil).

Ora, nada se provou nomeadamente quanto aos valores-hora praticados, preços de mercado à data, nem sobre os custos de deslocações entre o continente (não é dito, mas é incontroverso que o Atelier do A. tem sede em Lisboa) e o Funchal. Dados que permitiriam um apuramento do dano indemnizável com maior rigor e segurança.

É igualmente seguro que, como a jurisprudência tem afirmado, perante decisões fundadas na equidade, em sede de recurso é adequado um critério de revogação apenas das soluções que excedam manifestamente determinada margem de liberdade decisória, sendo então de verificar o padrão de equidade aplicado em concreto, pelo que, a situar-se a indemnização no quadro de um exercício razoável do juízo de equidade, não se justificará a revogação (cfr., i.a., o ac. deste TCAS de 30.03.2017, proc. nº 7445/11, subscrito pelo ora relator na qualidade de 2.º adjunto, também o ac. do TR de Coimbra de 14.03.2017, proc. nº 595/14.1TBCBR.C1).

E que não podendo apurar-se exactamente o montante dos danos patrimoniais – como é o caso -, devem os mesmos ser determinados segundo juízos de equidade, dentro dos limites que o tribunal teve como provados (art. 566.º, nº 3, do C.Civil).

Estabelecido este quadro de análise, o que temos provado para calcular a indemnização é o seguinte:

a) O Autor apresentou uma proposta contendo um estudo prévio e uma maquete;

b) O seu atelier despendeu quatro meses para a elaboração da proposta;

c) O Autor subcontratou técnicos das especialidades de engenharia electrotécnica, engenharia civil e maquetistas; e que

d) Os técnicos que trabalharam na elaboração da proposta deslocaram-se ao Funchal para efeitos de elaboração da mesma.

Mais ficou provado que foi pago ao A. pelo R. a quantia de EUR 5.000,00.

É isto que temos provado; nada mais.

E é perante esta factualidade, considerando devidamente que o acórdão do STA em execução reconheceu que o A., aqui Recorrido, tem direito a ser indemnizado pelo dano atinente às despesas de aquisição do processo de concurso e com a elaboração da proposta, que cumpre apreciar do acerto da decisão recorrida quando fixou o referido montante indemnizatório em EUR 45.000,00, já deduzido dos EUR 5.000,00 que foram pagos.

Vejamos.

Estamos a falar de uma proposta elaborada em 1990 que envolveu um estudo prévio e a construção de uma maquete, trabalho técnico computado em 4 meses, a subcontratação de serviços e deslocação (deslocações?) entre o continente e o Funchal.

Se atentarmos que um valor de 1.000.000,00 Escudos em 1990 corresponde a um valor de 11.458,58 Euros em 2018, tendo sido utilizado o Índice de preços no consumidor (Média anual) com o factor de actualização de 2,297 (fonte: Instituto Nacional de Estatística), teríamos que a indemnização arbitrada cobria despesas no montante de 4.000.000,00 Escudos (quatro mil contos à data).

Ora, é entendimento deste tribunal que tal valor é exagerado face ao que vem provado, afastando-se do exercício razoável do juízo de equidade.

Pelo que terá que revogar-se a sentença quando nesta se fixa o montante indemnizatório no montante de EUR 45.000,00, acrescido de juros de mora.

Com efeito, apurando-se que foi despendido tempo – 4 meses, mas sem que venha provado que o foi em regime de exclusividade, o que nem foi alegado - para a elaboração do estudo prévio e da maquete, com todo o trabalho a tal inerente e que envolveu apenas o que ficou provado, considera-se como razoável a fixação de montante de despesas contabilizadas no dobro do prémio que foi pago (1.000.000,00 Escudos). Raciocínio que se apresenta como plausível considerando a presunção de que, em condições normais de mercado, qualquer candidato se apresentaria a concurso tendo necessariamente despesas e que adequaria os gastos havidos com a apresentação da proposta em aproximação ao valor máximo coberto pelo prémio, sob pena da eventualidade de registar prejuízos assinaláveis e que vão muito para além de um juízo económico aceitável de ponderação do custo-benefício. O limite máximo agora definido dos montantes havidos com despesas, apresenta-se igualmente adequado tendo em consideração que estamos a falar de valores praticados em 1990.

Ou seja, tem-se por adequado fixar o valor das despesas incorridas e inerentes à apresentação do estudo prévio e maquete em causa, no montante, à data, de 2.000.000,00 Escudos. A que corresponde actualmente, por aplicação do mesmo índice de preços no consumidor (fonte: INE), o montante de EUR 22.917,16 (Dezembro de 2018). E considerando-se que aquele valor carece de ser actualizado à presente data, entende-se fixá-lo em EUR 23.000,00.

A este valor temos, porém, que deduzir o montante já pago pelo A. ao R., no valor de EUR 5.000,00, chegando-se ao valor final de EUR 18.000,00.

De igual modo, o montante da indemnização devida ao R., aqui Recorrido, e que visa ressarcir os danos patrimoniais por este sofridos, deve considerar-se devidamente actualizada.

Assim sendo, na procedência parcial do recurso principal, terá que revogar-se a sentença recorrida e fixar-se o montante indemnizatório nos termos supra enunciados.

Sobre a quantia apurada, cujo montante se encontra já devidamente actualizado como explicitado, são devidos juros de mora contados da presente decisão. Pelo que são devidos juros de mora, a contar da data da prolação do presente acórdão até integral pagamento, calculados à taxa de 4% ao ano e correspondentes taxas legais subsequentemente em vigor.

II.1.2. Do recurso Subordinado

A questão suscitada pelo aqui Recorrente, Alberto……………………, delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduz-se em apreciar se o tribunal a quo errou no arbitramento do quantitativo indemnizatório, por defeito. Alega o Recorrente que resultou dos autos um valor de despesas bastante superior que computa em EUR 170.000,00.

Reitera-se, neste ponto, o que preliminarmente se deixou estabelecido sobre a ausência de impugnação da matéria de facto e suas consequências jurídicas.

Ora, assim sendo, e em face do que se acabou de concluir no recurso principal, têm as conclusões do recurso subordinado que naufragar.

Com efeito, a Portaria em causa não se mostra aplicável ao presente caso, dado que o incidente de liquidação teve como objecto a determinação das despesas efectivamente suportadas com a preparação e apresentação da proposta do A. e aqui Recorrente. E no presente caso não há lugar ao cálculo de honorários a que se reporta a Portaria de 7 de Fevereiro de 1972, in Suplemento ao Diário do Governo, n.º 35, 2.ª Série, de 11 de Fevereiro de 1972 (alterada pelas Portarias n.º de 22 de Novembro de 1974, publicada no Diário de Governo, n.º 2, 2.ª Série, de 3 de Janeiro de 1975, e Portaria publicada no Diário da República, n.º 53, de 5 de Março de 1986), nos termos da qual se determina as instruções para o cálculo de honorários referentes aos projectos de obras públicas.

Por tudo o que se vem de dizer, improcede o recurso subordinado.



III. Conclusões

i)A equidade é um critério normativo a integrar segundo os ditames do art. 566.º do Código Civil o recurso à fixação da indemnização a que a equidade é chamada, não está no livre arbítrio do juiz; a leitura da lei evidencia a existência de critérios a que o juiz, nessa tarefa deve atender (n.º 3- Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados).

ii)Para ressarcimento dos danos patrimoniais sofridos pelo Autor e Recorrido no recurso principal, consistentes nas despesas inerentes à apresentação de um estudo prévio e de uma maquete, no âmbito do concurso limitado para execução de projectos do “Centro de Feiras e Exposições do Funchal”, lançado em 1990, em execução do acórdão do STA de 20.06.2013, proc. nº 1360/12, tendo presente o disposto no artigo 566.º, n.ºs 2 e 3, do Cód. Civil, mostra-se equitativo fixar a indemnização devida ao A. na quantia de EUR 18.000,00, já actualizada.




IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

- Conceder parcial provimento ao recurso;

- Revogar a sentença recorrida e fixar a indemnização devida na quantia de EUR 18.000,00, acrescida dos juros vincendos à taxa legal até efectivo e integral pagamento.

- Negar provimento ao recurso subordinado.

Custas no recurso principal por ambos as partes, Alberto……………………… e Município do Funchal, fixando-se o respectivo decaimento em 80% e 20%; custas no recurso subordinado pelo aí Recorrente, Alberto …………………………..

Lisboa, 4 de Abril de 2019


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Pedro Marchão Marques

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Alda Nunes

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Cristina Santos