Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06021/12
Secção:CT
Data do Acordão:09/19/2017
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:REENVIO PREJUDICIAL
PAÍSES TERCEIROS
ART. 43.º, N.º 2 DO CIRS
Sumário:Submete-se ao Tribunal de Justiça da União Europeia, ao abrigo da alínea a) do art. 267.º do TFUE, a seguinte questão prejudicial necessária ao julgamento da presente causa:

(i) As disposições conjugadas dos artigos 12.º, 56.º, 57.º e 58.º do Tratado da Comunidade Europeia [actuais 18.º, 63.º, 64.º e 65.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia] devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal (n.º 2 do artigo 43º do Código do IRS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro), que sujeita as mais-valias resultantes da alienação de um imóvel situado num Estado-Membro (Portugal), quando essa alienação é efectuada por um nacional desse Estado-Membro, residente em país terceiro (Angola), a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel?
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, que julgou procedente a impugnação apresentada por C... e ..., da liquidação de IRS nº ..., referente ao ano de 2007 no montante de €50.171,44.

O Fazenda Pública apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:

“CONCLUSÕES
I - Visa o presente recurso reagir contra a Douta Sentença que julgou procedente a impugnação deduzida por C... e M..., contra a liquidação efectuada em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) do ano de 2007.

II - A fundamentação da sentença recorrida, assenta em síntese no entendimento de que o acto de liquidação deve ser anulado, uma vez a aplicação do artº 43º nº 2 do CIRS é incompatível com o artº 56º do Tratado que instituiu a Comunidade Europeia, sendo que por via do disposto no artº 135º do CPA o acto é ilegal .
III - Que, os impugnantes, que são residentes na Austrália, ao alienaram um imóvel localizado em Portugal, não podiam ter sido tributados, sobre a totalidade das mais valias realizadas, nos termos do artº 43º nº 2 do CIRS.

IV- A Meritíssima Juiz sustentou a sua decisão proferida na douta sentença ora recorrida, no acórdão do TJCE, que vem no sentido de que o artº 56º CE, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação Nacional, como a que estava em causa na questão prejudicial, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro Estado Membro a uma carga fiscal superior á que incidiria, em relação a esta mesmo tipo de operação sobre as mais valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel.

V- Considerou a Meritíssima Juiz, a liquidação de IRS nula, por considerar ter havido uma violação do Tratado da União Europeia, por estarmos em presença de sujeitos passivos não residentes em Portugal;

VI - Os impugnantes, proprietários de uma fracção autónoma do prédio em regime de propriedade horizontal sito no concelho de Oeiras, alienaram a referida fracção em 19/05/2008.

VII - E ,assim sendo foram tributados nos termos do artº 43º nº 2 do CIRS. (A contrario sensu)

VIII - Uma mais valia realizada por um sujeito passivo residente na Austrália - não residente em Portugal - o valor dessa mais valia não pode ser considerado em 50% mas sim na sua totalidade, interpretação que se infere da referida norma legal a contrario sensu.
IX - A citada norma não viola, nem discrimina os direitos dos não residentes por contraposição aos residentes me Portugal, conforme o decidido na douta sentença.

X- È que os impugnantes não são residentes num Estado Membro da UE, mas são residentes na Austrália.

XI -O Tratado prevê no artº 63º do Tratado da UE (ex artº 56 do TCE), proibições de restrições nos movimentos de capitais entre Estados Membros e entre os Estados Membros e países terceiros, porquanto o artº 65º do Tratado da UE ( ex artº 58º do TCE) prevê um salvaguarda que permite aos Estados Membros , em matéria de direito fiscal , que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido;

XII - Os Estados Membros da UE, em matéria de Impostos directos (IRS), têm competência para legislar e exercer a sua jurisdição fiscal, de conformidade com as leis tributárias vigentes no seu ordenamento jurídico tributário que no caso de Portugal se rege pelo norma constitucional do nº 1 da alínea i) do artº 165º da CRP ( reserva de lei da Assembleia da Republica em matéria fiscal).

XIII- O acto tributário de liquidação é legal porque está em conformidade com as leis tributárias vigente no ordenamento jurídico tributário português, não violando quaisquer princípios ou normas constitucionais nem disposições comunitárias.

XIV- Deverá por tudo o exposto, o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão judicial por padecer a mesma de erro de julgamento de facto e de direito, mormente o artº 43º nº 2 do CIRS.

Termos em que, com mui Douto suprimento de V.Exªs, deverá ser considerado procedente o Recurso e revogada a Douta Sentença,
como é de Direito e Justiça

PORÉM V.EXªS, DECIDINDO FARÃO ACOSTUMADA JUSTIÇA”
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Os Recorridos, apresentaram contra-alegações, conforme seguidamente expendido:

“ C O N C L U S Õ E S:

1.ª A liquidação de IRS anulada pela douta sentença recorrida foi nesta correctamente considerada ilegal, por assentar na observância de um preceito legal (o do n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS) que, ao discriminar entre residentes e não residentes, é contrário ao direito comunitário (artigo 56.º do Tratado da União), o qual tem de prevalecer sobre o preceito nacional com ele desconforme.

2.ª Essa ilegalidade da liquidação subsiste apesar de a discriminação respeitar a cidadãos nacionais portugueses (os ora Impugnantes) residentes em território exterior ao da União Europeia.
Efectivamente,

3.ª De conformidade com o estabelecido no artigo 12.º (na numeração resultante do Tratado de Amsterdão, correspondendo ao artigo 6.º da versão inicial) do Tratado de Roma, é proibida toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade.

4.ª O preceito do n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, se interpretado no sentido de que os não residentes, ainda que nacionais portugueses, ficam excluídos da restrição da tributação da mais-valia em questão a cinquenta por cento da mesma, é materialmente inconstitucional, por violador do princípio da igualdade,

5.ª Já que, de acordo com esse princípio, acolhido nos artigos 13.º e 14.º da constituição da República, todos os cidadãos são iguais perante a lei e não podem ser prejudicados em razão de nenhum dos factores indicados no n.º 2-primeiro dos artigos mencionados e, designadamente; de situação económica ou condição social.

6.ª Os cidadãos portugueses que residam no estrangeiro, «gozam da protecção do Estado para o exercício dos direitos e estão sujeitos aos deveres que não sejam incompatíveis com a ausência do país.»

7.ª Assim, impõe-se a aplicação aos ora Recorridos da mesma regra válida para os cidadãos residentes em Portugal, da sujeição de apenas 50 % da mais-valia apurada à tributação em IRS, pelo que bem foi decidido dever a liquidação em apreço ser corrigida em ordem a que dos Recorridos resulte cobrado apenas o montante correspondente a metade do valor da mais-valia apurada.

8.ª A matéria da distinção I discriminação feita no n.º 2 do do artigo 43.º do Código do IRS já foi abordada pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA) e pelo Tribunal Europeu das Comunidades Europeias (TJCE), em sentido favorável à presente pretensão dos Impugnantes.

9.ª O n.º 1 do artigo 56.º do Tratado de Roma estabelece a proibição de todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados­ Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.


10.ª No caso dos autos tratou-se, como no decidido no referido Acórdão do TJCE, de uma operação de liquidação de um investimento imobiliário.

11.ª Uma tal operação constitui um movimento de capitais, devendo ser tido em conta o princípio comunitário da livre circulação de capitais.

12ª O artigo 56.º CE proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros, sem prejuízo das justificações previstas no artigo 58.° CE

13.ª A luz do artigo 43.º do Código do IRS, os não residentes estão sujeitos a uma carga fiscal superior àquela que é aplicada a residentes, encontrando-se, portanto, numa situação menos favorável que estes últimos

14.ª Como já decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo, o facto de se prever uma limitação da tributação a 50% das mais-valias realizadas apenas para os residentes em Portugal, e não para os não residentes, constitui uma restrição aos movimentos de capitais, proibida pelo artigo 56.° CE. dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático>>.

16.ª Atenta a prevalência, nos termos acabados de referir, do direito comunitário sobre o direito interno, o art. 43.º, n.º 2 do Código do IRS é incompatível com o referido art. 56.º do Tratado da EU.

17.ª Assim, o acto de liquidação impugnado padece do vício de violação do referido artigo 56.º do Tratado de Roma.

18.ª Esse vício representa ilegalidade, sendo que esta justifica a pedida anulação do acto de liquidação, atento o disposto no artigo 135.º do Código de Procedimento Administrativo.

19.ª A luz do n.º 1 do artigo 56.º do Tratado de Roma, não é pelo facto de o produto da liquidação do investimento imobiliário feita ser para transferir, para um “país terceiro”, que deixa de ter aplicação a proibição vertida naquele nº 1 do art. 56º do Tratado CE.

20.ª Admitindo, porém, que, não residindo os Impugnantes em território da União, lhes não aproveitariam o raciocínio e linha de orientação acolhidos nos Acórdãos do TJCE e do STA citados nesta alegação, ainda assim a impugnação terá de proceder.

21.ª Com efeito, o n.º 2 do artigo 43.º do Código do IRS, se interpretado no sentido de que os não residentes, ainda que nacionais portugueses, ficam excluídos da restrição da tributação da mais-valia em questão a cinquenta por cento do seu valor, será materialmente inconstitucional, por violador do princípio da igualdade, já que de acordo com todos os cidadãos são iguais perante a lei e não podem ser prejudicados em razão de nenhum dos factores indicados no n.º 2 do primeiro dos ditos artigos.

22.ª No que concerne aos cidadãos portugueses que residam no estrangeiro, o artigo 14.º da Constituição garante que << gozam da protecção do Estado para o exercício dos direitos e estão sujeitos aos deveres que não sejam incompatíveis com a ausência do país . >>

23.ª Tendo presente a orientação explanada no referido acórdão do TJCE, a liquidação impugnada constituiria ou constituirá, à face dos artigos 13.º e 14.º da Constituição, intolerável discriminação dos Recorridos face aos cidadãos residentes em Portugal e ou nos demais Países Membros da União Europeia, sendo que os direitos dos Recorridos que estão em causa de modo algum são incompatíveis com a sua ausência do Pais.

24.ª Nunca poderá admitir-se que, por serem portugueses, os Recorridos ficassem penalizados, com tributação sobre os 100% da mais­ valia) enquanto, na linha do citado acórdão do TJCE, o não ficariam ou ficarão,
nas mesmas circunstâncias, um checo, um búlgaro (ou um português residente na Roménia) teriam ou terão tributação restrita a 50 % da mais-valia.

25.ª A isso se opõe frontalmente também o estatuído no artigo 12.º do Tratado CE, que determina que << … é proibida toda e qualquer discriminação em razão da nacionalidade.>>

26.ª Por quanto fica exposto, deve ser negado provimento ao recurso da Representação da Fazenda Pública, confirmando-se inteiramente a douta sentença recorrida, que fez correcta aplicação da lei.

Assim se decidindo, far-se-á a sã e costumada

JUSTIÇA.”
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Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta
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Foram ouvidas as partes sobre a colocação de questão(ões) a título prejudicial ao Tribunal de Justiça da União Europeia ao abrigo do disposto no art. 267.º do TFUE, não tendo sido sugerida qualquer questão a colocar.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

“III. SEGMENTO FACTICO
Com interesse para a decisão da causa considera-se provada a factualidade que se passa a subordinar por alíneas:

A) Em 19.05.2008, os Impugnantes apresentaram a declaração Mod. 3 de IRS para o ano de 2007, tendo declarado o estado civil de casados, residência no estrangeiro e rendimentos da Cat. G ( Incrementos Patrimoniais). (Cfr. informação a fls. 111 do p.a.t. apenso)
B) Os rendimentos da Cat. G derivaram de uma mais-valia proveniente da alienação onerosa do prédio urbano sito no concelho e freguesia de Oeiras inscrito na respectiva matriz sob o artigo n.º 2634, fracção “A”. (Cfr. informação a fls. 111 do p.a.t. apenso)
C) Em 25.08.2008, foi emitida a liquidação de IRS n.º n.º ..., referente ao ano de 2007 e no montante de € 50.171,44, na qual se mostra aposta a data de 08.10.2008 como data limite de pagamento voluntário. (Doc. n.º2 junto à p.i.)

D) Em 01.10.2008, os Impugnantes procederam ao pagamento da liquidação de IRS a que alude a al. C) do probatório. (Doc. n.º2 junto à p.i.)

E) Em 26.12.2008, deu entrada neste tribunal a petição inicial que originou os presentes autos. (Cfr. carimbo aposto a fls. 5 dos autos)

MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações, não impugnados que dos autos tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.

FACTOS NÃO PROVADOS

Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita. ”
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Com base na matéria de facto supra exposta a sentença recorrida julgou procedente a impugnação judicial, entendendo em síntese que é de aplicar a jurisprudência vertida no acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia proferido no processo C-443/06.

Importa, no entanto, ao abrigo do art. 662.º do CPC, neste TCAS, alterar-se a matéria de facto constante do ponto C) por se encontrar errado o número da liquidação, e adita-se à matéria de facto o ponto F):

C) Em 25.08.2008, foi emitida a liquidação de IRS n.º 2008 5004517801.referente ao ano de 2007, e no montante de 50.171,44€, com data limite de pagamento voluntário de 08/10/2008, que resultou da não aplicação do art. 43.º, n.º 2 do CIRS (cf. documento n.º 2 junto à p.i.)

F) No ano de 2007, os Impugnantes, de nacionalidade Portuguesa, residiam em Angola (cfr. informação de fls. 194 e documento de fls. 195 e ss dos autos).
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Estabilizada a matéria de facto a considerar, vejamos então.

Os Recorridos, à data do facto tributário, tinham nacionalidade portuguesa e residência num pais terceiro, Angola, e por conseguinte, afigura-se-nos que não estamos perante acto claro de modo a aplicar directamente a jurisprudência do acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia proferido no processo C-443/06 no qual estava em causa residentes de num Estado-Membro da União Europeia, antes importando, socorrermo-nos do disposto no art. 267.º do TFUE, sendo necessário suscitar-se questão sobre a interpretação dos Tratados (alínea a) do art. 267.º do TFUE), cuja resposta é necessária ao julgamento da causa, solicitando àquele tribunal que se pronuncie.

Neste contexto, a Relatora do presente processo entendeu ouvir as partes sobre a colocação de questões a título prejudicial ao Tribunal de Justiça da União Europeia ao abrigo do disposto no art. 267.º do TFUE, sendo certo que pelas partes não foi sugerida qualquer questão a colocar.

Vejamos, então.

Resulta dos autos que, no ano de 2007, os Impugnantes, de nacionalidade Portuguesa, residiam em Angola.

Nesse ano de 2007 alienaram onerosamente o prédio urbano sito no concelho e freguesia de Oeiras inscrito na respectiva matriz sob o artigo n.º 2634, fracção “A”, originando mais-valias tributáveis em sede de IRS.

A Autoridade Tributária (AT) considerando que os Impugnantes eram não residentes em Portugal, entendeu tributar a mais-valia na sua totalidade, sem a limitação da incidência de imposto a 50% das mais-valias realizadas por residentes em Portugal, consagrada no art. 43.º, n.º 2 do CIRS.

Em suma, o presente litígio opõe C... e ... à Fazenda Pública porquanto os mesmos entendem que a liquidação de IRS referente ao ano de 2007 de que foram objecto é ilegal, por considerarem que a aplicação do artigo 43.º, n.º 2 do CIRS os discrimina ao tributá-los por uma medida mais gravosa do que outras pessoas colocadas em idêntica situação patrimonial, mas residentes em Portugal. Esclarece-se que os impugnantes de nacionalidade portuguesa no ano de 2007 residiam em Angola.

As disposições nacionais aplicáveis aos factos do litígio são as normas constantes do n.º 2 do artigo 43.º e a alínea a) do n.º 1 do art.º 10.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, na redacção da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, normas que já existiam substancialmente na redacção originária (Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro).

Redacção originária (Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro):

“Artigo 41.º Mais-valias 1 - O valor dos rendimentos da categoria G é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes. “As mais-valias referidas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º são consideradas por 50% do seu valor.”

Redacção vigente à data dos factos (redacção da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro):



“Artigo 43.º Mais-valias

1 - O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes.
2 - O saldo referido no número anterior, respeitante às transmissões efectuadas por residentes previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, positivo ou negativo, é apenas considerado em 50% do seu valor.
(…).”

“Artigo 10.º Mais-Valias
1 - Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de: a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário;”

Não se desconhece que o art. 56.º do TCE (actual 63.º do TFEU) proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais, não apenas entre Estados-Membros, mas também entre Estados-Membros e países terceiros.

Também não se desconhece que a jurisprudência que resulta do Acórdão do TJUE de 11/10/2007, proferido no processo C-443/06, que declarou que: “O artigo 56.° CE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal, que sujeita as mais-valias resultantes da alienação de um bem imóvel situado num Estado-Membro, no caso vertente em Portugal, quando essa alienação é efectuada por um residente noutro Estado-Membro, a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel..”, jurisprudência que foi aplicada pelo tribunal de 1.ª instância e que se encontra em recurso neste Tribunal Central Administrativo Sul.

Porém, permanece a dúvida se a situação dos autos se poderá subsumir inteiramente à do processo C-443/06, porquanto, por um lado, nesse caso estava em causa um residente de um Estado-membro, e não um residente num país terceiro (Angola), com nacionalidade portuguesa.

Por outro lado, importa ainda considerar o disposto no art. 57.º do TCE (actual art. 64.º do TFUE): “O disposto no artigo 63.º não prejudica a aplicação a países terceiros de quaisquer restrições em vigor em 31 de Dezembro de 1993 ao abrigo de legislação nacional ou da União adoptada em relação à circulação de capitais provenientes ou com destino a países terceiros que envolva investimento directo, incluindo o investimento imobiliário, (…)”, ou seja, admite-se a aplicação a países terceiros de quaisquer restrições em vigor em 31 de Dezembro de 1993, ao abrigo de legislação nacional, sendo certo que a disposição nacional em causa (artigo 43.º, n.º 2 do actual Código do IRS), corresponde substancialmente à redacção originária, já em vigor desde 1 de Janeiro de 1989 (artigo 2.º do Preambulo do Decreto-lei n.º 442-A/88, 30 Novembro).

Face ao exposto, suscita-se questão sobre a interpretação dos Tratados (alínea a) do art. 267.º do TFUE), cuja resposta é necessária ao julgamento da causa, e nessa medida cumpre solicitar àquele tribunal que sobre elas se pronuncie.

Portanto, as disposições conjugadas do Direito da União Europeia, cuja interpretação é pedida, são os artigos 12.º, 56.º, 57.º e 58.º do Tratado da Comunidade Europeia [actuais artigos 18.º, 63.º, 64.º e 65.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia].

Sumário

Submete-se ao Tribunal de Justiça da União Europeia, ao abrigo da alínea a) do art. 267.º do TFUE, a seguinte questão prejudicial necessária ao julgamento da presente causa:

(i) As disposições conjugadas dos artigos 12.º, 56.º, 57.º e 58.º do Tratado da Comunidade Europeia [actuais 18.º, 63.º, 64.º e 65.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia] devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal (n.º 2 do artigo 43º do Código do IRS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro), que sujeita as mais-valias resultantes da alienação de um imóvel situado num Estado-Membro (Portugal), quando essa alienação é efectuada por um nacional desse Estado-Membro, residente em país terceiro (Angola), a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel?

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul:

1 - Submeter ao Tribunal de Justiça da União Europeia, ao abrigo da alínea a) do art. 267.º do TFUE, a seguinte questão prejudicial necessária ao julgamento da presente causa:

(ii) As disposições conjugadas dos artigos 12.º, 56.º, 57.º e 58.º do Tratado da Comunidade Europeia [actuais 18.º, 63.º, 64.º e 65.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia] devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional, como a que está em causa no litígio no processo principal (n.º 2 do artigo 43º do Código do IRS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro), que sujeita as mais-valias resultantes da alienação de um imóvel situado num Estado-Membro (Portugal), quando essa alienação é efectuada por um nacional desse Estado-Membro, residente em país terceiro (Angola), a uma carga fiscal superior à que incidiria, em relação a este mesmo tipo de operação, sobre as mais-valias realizadas por um residente do Estado onde está situado esse bem imóvel?

2 - Suspender a presente instância até à decisão do pedido de reenvio prejudicial formulado.


Custas a final.
D.N.
Lisboa, 19 de Setembro de 2017.


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Cristina Flora

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Jorge Cortês

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Joaquim Condesso