Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05826/12
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:06/04/2013
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. CONTRIBUIÇÃO ESPECIAL. AVALIAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO.
Sumário:Doutrina que dimana da decisão:
1. A avaliação para efeitos da contribuição especial criada pelo Dec-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, que aprovou o respectivo Regulamento, não constitui um acto autónomo para efeitos de impugnação judicial, antes deve ser impugnada na impugnação judicial da subsequente liquidação;
2. Tal avaliação encontra-se sujeita a uma fundamentação com as características específicas constantes no mesmo Regulamento, como seja a da localização do prédio, o seu ambiente envolvente e os índices de ocupação do solo, de molde a justificar os valores encontrados pela comissão de avaliação;
3. Não se encontra devidamente fundamentada (formalmente) a avaliação que não pondera tais requisitos legais específicos, para mais quando nada indica quanto ao valor unitário de construção encontrado para cada um dos dois anos relevantes para o efeito.


O Relator
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. O Exmo Representante da Fazenda Pública (RFP), dizendo-se inconformado com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A...– Construções, Lda, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


I - O Decreto-Lei n.º 43/98, de 03 de Março criou uma contribuição especial por valorização dos prédios rústicos e terrenos para construção resultante dos investimentos efectuados ou a afectuar para a realização da CRIL, CREL, CRIP, CREP e respectivos acessos e da travessia ferroviária do Tejo e troços ferroviários ligeiros;
II - Constitui valor sujeito a contribuição a diferença entre o valor do prédio à data em que for requerido o licenciamento de construção ou de obra e o seu valor à data de 1 de Janeiro de 1994, corrigido por aplicação dos coeficientes de desvalorização de moeda constantes da portaria a que se refere o artigo 43.º do CIRC, correspondendo, para o efeito, à data de 1 de Janeiro de 1994 e à de realização a data de emissão do alvará de licença de construção ou de obra;
III - Nos termos do disposto no art.º 4.º daquele Decreto-Lei, "A avaliação fica a cargo de uma comissão constituída pelo contribuinte ou seu representante e por dois peritos nomeados pela Direção Geral dos Impostos", um dos quais terá apenas voto de desempate;
IV - Na determinação dos valores, a comissão terá em consideração a natureza e o destino do prédio, atendendo-se aos critérios fixados no n.º 2 do artigo 6.º daquele diploma;
V - Os atos de avaliação, em sede de Contribuição Especial, encontram-se devidamente fundamentados, no respetivo "Termo de Avaliação";
VI - O direito de participação na formação da decisão administrativa é assegurado através da inclusão do contribuinte ou alguém por si indicado, naquela Comissão de Avaliação;
VII - Tanto mais que, na comissão de avaliação esteve presente perito nomeado pela Impugnante, o qual teve perfeito conhecimento do iter cognoscitivo e valorativo dos louvados;
VIII- Pois só assim se compreende que tenha declarado não concordar com os valores encontrados, propondo outros;
IX - Pelo que, a douta Sentença fez uma incorreta interpretação dos factos;
X - Também fez, a douta Sentença, uma incorreta aplicação dos Art.ºs 77 e 84.º n.º 3, ambos da LGT;
XI - Não existe caducidade do direito à liquidação, nos termos do disposto no art.º 45.º da LGT;
XII - Ao não analisar a invocada caducidade, incorreu a Douta Sentença em "falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar", constituindo o vício nulidade de Sentença, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 125.º do CPPT

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e em consequência ser a douta Sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue a Impugnação improcedente.


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


Também a recorrida veio a apresentar alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais igualmente na íntegra se reproduzem:


I. Impunha-se à Administração Tributária, em sede de fundamentação da avaliação, adoptar um critério prático, consistente na questão de saber se um destinatário normal, face ao itinerário cognoscitivo e valorativo, constante do acto em causa, fica em condições de conhecer o motivo por que se decidiu num certo sentido e não noutro qualquer;
2. Apenas tal “fundamentação" será adequadamente compreensível na esteira do disposto nos artigos 268.º, n.º 3 da CRP, 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho, e 77.º, n.º 1 e 84.º, n.º 3 da LGT;
3. In casu, o termo de avaliação de fls. 18 e ss. do processo administrativo, no que tange ao “CRITÉRIO DE AVALIAÇÃO", não teceu qualquer comentário à putativa valorização induzida pelos investimentos públicos realizados e pela pretensa melhoria das condições de acessibilidade;
4. Sendo ainda evidente que o "CRITÉRIO DE AVALIAÇÃO" é minutado;
5. Impunha-se à Administração Tributária que fizesse referência concreta, ainda que sucinta, aos investimentos públicos realizados, à hipotética melhoria das condições de acessibilidade e ao necessário aumento de valor do prédio que permitisse a determinação dos valores em causa;
6. O que, em absoluto, não foi feito;
7. A rubrica titulada "OBSERVAÇÕES" mostra que o louvado da Impugnante manifestou o seu desacordo à avaliação efectuada;
8. Consequentemente, impendia sobre a Administração Tributária um especial dever de fundamentação, já que o grau de fundamentação exigível deverá estar directamente relacionado com o grau de litigiosidade existente, i. é, com a divergência existente entre a posição da Administração Fiscal e a do contribuinte;
9. Acresce que no auto de avaliação elaborado pela Comissão não foram aplicados os diferentes elementos a que se refere o citado artigo 6.º do Regulamento em causa;
10. Realmente, apenas foi feita uma referência, demasiado vaga, às capacidades construtivas constantes do alvará de construção, sem nunca se aludir a investimentos públicos realizados e a uma melhoria das condições de acessibilidade e sem que tivesse havido qualquer pronúncia sobre as restantes varáveis a que se refere o citado artigo 6.º, nomeadamente quanto ao coeficiente de ocupação do solo previsto no PDM do município do Seixal;
11. Por outro lado, também não foram referidas no auto de avaliação as razões para a atribuição daqueles valores, obtidos para 1994 e 2001, e não de outros;
12. Sendo certo que os valores de avaliação por metro quadrado estão em contradição com outras avaliações efectuadas pelos mesmos peritos relativas a outros prédios;
13. Na verdade, apesar de ter sido indicado que o preço unitário de construção por metro quadrado em 1994 era de € 519,00, tal valor está em clara contradição com outras avaliações efectuadas em prédios propriedade da Impugnante na freguesia da Sobreda, concelho de Almada, onde os valores aí indicados pelos peritos para a construção no ano de 1994 foram de € 315,37 e € 238,49 em dois prédios próximos;
14. Ainda se dirá que de acordo com a Portaria n.º 784/94, de 31 de Agosto, que fixou o preço máximo a adquirir pelos municípios ao abrigo do Programa Especial de Realojamento nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto, para a Zona I, que integra os Concelhos de Almada e Seixal, o valor do prédio seria inferior em 52,7% quanto à avaliação que se reporta a 1994 e 78,72 % quanto a 2001;
15. Assim, verifica-se, para além da insuficiência da fundamentação, uma manifesta falta de rigor;
16. O que é ainda reforçado pelo facto de no mapa "Avaliação em 1994" o valor de € 128.159,78 ter sido "arredondado" para € 125.000,00, e de no mapa "Avaliação em 2001", o valor de € 188.906,04 ter sido "arredondado" para € 190.000,00;
17. Sendo certo que tais “arredondamentos”, que não se encontram previstos legalmente, vêm a ocasionar distorções na valor da contribuição especial a pagar;
18. Permitindo à Administração Tributário, ficticiamente, liquidar uma contribuição especial superior, que ascendeu a 20% do valor do imposto a pagar pela ora Recorrida;
19. Em síntese, a avaliação em apreço carece de fundamentação bastante, de rigor técnico e metódico e, para mais, de razoabilidade;
20. Ainda, no entender da Impugnante, e de acordo com o expressado no termo de avaliação, onde o louvado da parte manifestou o seu desacordo com os valores atribuídos, não haveria lugar a qualquer montante a pagar a título de Contribuição Especial, na medida em que, por apelo aos valores de construção/m2 propostos pelo louvado da parte, o valor tributável seria negativo;
21. Pior, mesmo após o louvado da parte ter manifestado o desacordo com os valores fixados no "Termo de Avaliação" e ter sido exercido o direito de audição prévia, a Administração Tributária absteve-se de proceder à cabal fundamentação da liquidação;
22. Inexiste, por isso, qualquer elemento de comparação que permitisse concluir que os valores considerados eram os correntes para a avaliação reportada, quer a 1994 quer à de 2001, para que um destinatário comum pudesse entender o porquê da fixação de determinados valores para o m2 da construção e a percentagem do terreno para tal construção, relativos àquelas datas;
23. Não colhendo, por isso, a tese da Administração Tributário, vertida no considerando 38.º da sua alegação, de que a Impugnante, por não concordar com os valores apresentados e por ter apresentado novos valores, compreendeu os valores indicados pela Administração Tributária;
24. Sendo, ainda, o termo de avaliação que a Recorrente transcreve no considerando 43.º da sua alegação incomparável com o dos autos, por mais detalhado e completo;
25. Acresce que o facto de a Impugnante, aqui Recorrida, se encontrar representada na Comissão de Avaliação pelo seu louvado não mitiga o dever de fundamentação da Administração Tributária;
26. Em síntese, decorre que a avaliação em causa padece do vício de forma, por ausência de suficiente fundamentação, obscuridade e, até, incongruência, já que através da mesma não é possível conhecer os motivos que levaram a comissão a atribuir aqueles valores ao prédio, nem os diferentes preços por m2 da construção ali referidos.
Sem prescindir:
27. Sempre se dirá que se encontra verificada a caducidade do direito à liquidação;
28. Porquanto o tributo em causa constitui um imposto de prestação única, ou instantânea, que não se renova no tempo, sendo, em consequência, aplicável a norma do n.º 4 do artigo 45.º da LGT, que estabelece que o prazo de caducidade do direito à liquidação se conta desde a data da ocorrência do mesmo facto tributário;
29. Aqui chegados, importa sublinhar que o facto tributário se reporta ao momento do pedido de licenciamento de construção e não ao do deferimento do sobredito licenciamento como vincado pela Administração Tributária na sua alegação;
30. Logo, o direito à liquidação caducou, na medida em que a notificação da contribuição especial data de 14 de Fevereiro de 2006, tendo o pedido de licenciamento se verificado ainda em 2001;
31. Verifica-se, assim, que a notificação de fls. 29 do apenso administrativo não foi realizada no prazo de caducidade do direito de liquidação;
32. Está, pelo exposto, inquinado o acto de liquidação, o que constitui vício gerador de anulabilidade e constitui fundamento da impugnação, nos termos do artigo 99.º do CPPT;
33. Termos em que, subsidiariamente, deverá declarar-se a caducidade do direito de liquidação da contribuição especial em causa;
34. Mais, apesar de a Recorrente arguir a nulidade da omissão de pronúncia, na medida em que, segundo a mesma, "ao não analisar a invocada caducidade, incorreu a Douta Sentença em “falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar", importa rememorar que a douta sentença em crise determinou a nulidade da liquidação por preterição de fundamentação - vício de forma que determinou a procedência, de per si, da Impugnação;
35. Posto isto, se afigurava inútil, atendendo designadamente ao princípio da economia processual, a apreciação da alegada caducidade;
36. Em suma, a análise da caducidade mostrou-se prejudicada pela verificação do vício da falta de fundamentação;
37. Pelo que, sem necessidade de mais considerandos, por despiciendos, improcede, assim, a arguida nulidade da omissão de pronúncia;
38. Devendo, nestes termos, improceder in totum o presente recurso.

Nestes termos e nos mais de Direito, o Venerando Tribunal mantendo a decisão proferida em 1.ª Instância fará a costumada JUSTIÇA


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por a sentença recorrida ter feito uma correcta e suficiente análise da matéria de facto e correcta subsunção jurídica.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se a sentença recorrida padece do vício formal de omissão de pronúncia conducente à declaração da sua nulidade; E não padecendo, se a avaliação do lote de terreno para construção urbana donde resultou a liquidação impugnada, se mostra devidamente fundamentada, na sua vertente formal.



3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A) - Foi apresentada no Serviço de Finanças de Seixal 1 a declaração para efeitos de liquidação de contribuição especial mod. 1 em nome de A...Construções, Lda, relativamente a um terreno para construção inscrito na matriz sob o artigo 3057, acompanhada do alvará de obras de construção n° N481/04 (cfr. fls. 315 do processo administrativo em apenso)
B) - Em 031/11/2005 foi realizada a avaliação do lote de terreno para construção sito na Av. 25 de Abril, lote 9, Torre da Marinha tendo sido lavrado o termo de avaliação de fls. 17/20 do apenso e sido fixado por maioria, o valor do terreno à data de 1 de Janeiro de 1994 no montante de € 125.000,00 e à data de 2001 no montante de € 190.000,00 (cfr. fls. 18 do apenso).
C) - No referido termo de avaliação consta o preço unitário de construção/m2 em 1994- 519 Euros e o preço unitário de construção/m2 em 2001 - 765 Euros (cfr. fls. 18 do apenso).
D) - Consta ainda do termo de avaliação em observações o seguinte "não concordo com os valores atribuídos propondo para o ano 1994 de 300,00€/m2 e para o ano de 2001 de 380,00€/m2" (cfr. fls. 19 do apenso).
E) - Com base nos valores fixados no auto de avaliação foi efectuada a liquidação da contribuição especial de que resultou o montante a pagar de € 7.500,00 (cfr. documento de fls. 22 do apenso).
F) - Em 14/02/2006 a ora impugnante foi notificada da liquidação de contribuição especial mencionada na alínea anterior (cfr. teor de fls. 29 e assinatura do aviso de recepção de fls. 30 do apenso).

A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos juntos ao processo e acima expressamente referidos em cada um dos pontos do probatório.

Não existem factos relevantes para a decisão que importe registar como não provados.


4. Para julgar procedente a impugnação judicial deduzida considerou a M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese que o diploma que criou tal contribuição especial – o Dec-Lei n.º 43/98, de 3 de Março – não é inconstitucional, mas que o acto de avaliação se não encontra devidamente fundamentado por referência às exigências contidas no art.º 6.º do mesmo diploma, não exteriorizando as razões de facto e de direito que determinaram tal valor encontrado, mais não tendo conhecido dos demais vícios invocados pela impugnante, por prejudicados.

Para a Fazenda Pública (FP), ora recorrente, é contra esta falta de fundamentação que vem a esgrimir argumentos tendentes a este Tribunal exercer um juízo de censura sobre a sentença recorrida em ordem à sua revogação, pugnando que tal acto de avaliação se encontra devidamente fundamentado, tanto mais que nele teve participação o perito designado pela ora recorrida, que não assumiu os valores encontrados pelos restantes peritos, é porque a terá entendido, para além de também vir a invocar a omissão de pronúncia por a sentença recorrida não ter conhecido da caducidade do direito à liquidação, que entende não se ter verificado.

Vejamos então.
Desde logo não pode deixar de ser patente a inexistência da invocada omissão de pronúncia da sentença recorrida, já que na mesma se fundamentou explícita e conscientemente, porque se não conheciam dos demais vícios assacados pela ora recorrida ao acto de liquidação – porque a pretensão da mesma procedia, pelo vício de falta de falta de fundamentação (formal), desta forma obtendo ganho de causa – pelo que tendo sido formulado tal juízo de não conhecimento das mesmas, nunca poderá existir tal vício formal da sentença de omissão de pronúncia, mas eventual erro de julgamento, se o mesmo juízo se revelasse errado, como de resto constitui jurisprudência corrente(1).

Por outro lado, não pode deixar de ser estranho que seja a Fazenda Pública, em sede do presente recurso, a vir suscitar tal vício formal da mesma sentença e a pretender que tal questão seja apreciada, quando um dos efeitos possíveis desse conhecimento lhe seria desfavorável – a verificação da decorrência de tal prazo de caducidade do direito à liquidação – como a impugnante pugnava – cfr. art.ºs 37.º e segs da petição inicial de impugnação – não se vendo por isso qualquer interesse em agir por banda da recorrente para vir invocar tal nulidade que lhe pudesse atribuir qualquer tutela jurídica na defesa dos interesses que por lei lhe estão atribuídos.


4.1. Convém frisar desde logo, que a presente avaliação do prédio urbano donde resultou a liquidação relativa a esta contribuição especial, contém especialidades relativas às actuais avaliações ao abrigo do CIMI, quer formalmente, quer na sua substância.

No primeiro aspecto, por força do respectivo diploma que as criou – Regulamento da Contribuição Especial (doravante RCE), aprovado pelo art.º 1.º do Dec-Lei n.º 43/98, de 3 de Março – ressalta que as mesmas não constituem actos destacáveis para efeitos de impugnação autónoma, como acontece com as avaliações para efeito de IMI – cfr. art.º 77.º, n.º1 do CIMI – sendo que as mesmas apenas poderão ser impugnadas na impugnação judicial das relativas liquidações, por força do disposto nos art.ºs 24.º e 25.º do mesmo RCE, que expressamente assim o determina.

Em substância, enquanto as actuais avaliações para efeitos de IMI se encontram sujeitas à fórmula contida no art.º 38.º do CIMI, de índole essencialmente objectiva, contendo os contornos precisos da realidade a tributar, partindo para isso de dados objectivos que escapem às oscilações especulativas da conjuntura, de modo que sirvam de referência a uma sólida, sustentável e justa relação tributária entre o Estado e os sujeitos passivos, como do seu preâmbulo se pode ler, já estas avaliações, no âmbito desta contribuição especial, continuam a pautar-se por critérios marcadamente mais subjectivos, sem concretas referências de coeficientes, como seja a natureza e destino económico do prédio, localização, ambiente envolvente, infra-estruturas, caracterização, índices de ocupação, etc., constantes nas alíneas a) a g) do n.º2 do art.º 6.º do mesmo RCE.

Que tais avaliações para efeitos desta contribuição especial carecem de ser fundamentadas, determina desde logo, expressamente, a norma do n.º3 do art.º 4.º do mesmo RCE, “devidamente fundamentadas”, sendo que a posterior norma do seu art.º 6.º determina os requisitos dessa fundamentação, no caso, desta forma preenchendo a dimensão fundamentadora que, em geral, as normas dos art.ºs 268.º, n.º3 da CRP, 125.º do CPA e 77.º da LGT, impõem, quer no âmbito administrativo em geral, quer no âmbito tributário em que nos encontramos, existindo para esta contribuição um dever de fundamentação reforçado(2), por referência aos citados elementos padronizados a ter em conta nas mesmas, que os peritos terão de observar para que as mesma atinjam o patamar de decisão devidamente fundamentada, exigível, nos termos citados, de molde a permitir dar a conhecer ao contribuinte por que teve lugar aquele valor alcançado e não qualquer um outro, em suma, deve tal fundamentação conter como suas premissas, fundamentos claros, precisos e suficientes, que constituam o esteio do resultado nela alcançado.

Volvendo ao caso dos autos, do probatório da sentença recorrida, da matéria da suas alíneas C) e D), bem como da prova documental que as esteia, ou seja o doc. de fls 17/19 do PA, dele se pode colher que, para o prédio avaliado (lote de terreno para construção urbana de doze habitações unifamiliares), que o mesmo contém elementos relevantes para a sua localização, como seja quanto à zona envolvente e para as infra-estruturas existentes, em ordem à fixação do respectivo valor, ainda que algumas delas sejam descritas de forma assaz vagas, como seja ao nível da caracterização física e topográfica e ao ambiente envolvente urbanístico da zona – alíneas a) e c) do citado art.º 6.º - nada referindo, em concreto, quanto à exacta localização do prédio em Torre da Marinha, se dentro ou fora de aglomerado habitacional, junto ou distante de outras urbanizações e respectivas características arquitectónicas, bem servido ou não com zonas de comércio e, sobretudo, nada adiantando, de concreto, quanto ao valor unitário da construção por m2, ser daquela ordem de grandeza aí fixadas, quer em 1994, quer em 2001, o mesmo sendo de dizer, que tal fundamentação não cumpre cabalmente o desiderato que com a mesma se visa atingir, de dar a conhecer ao contribuinte porque em tal avaliação se logrou alcançar tal resultado e não qualquer um outro, diferente, em suma, tal fundamentação, segundo cremos, não atinge o limiar da patamar de decisão devidamente fundamentada, exigível no caso, como bem se decidiu na sentença recorrida, tal acto de avaliação, não enuncia de forma concreta os motivos da atribuição daqueles valores e não de outros, pelo que o mesmos padece do vício consistente na sua insuficiência, o que equivale à sua falta – art.º 125.º, n.º2 do CPA - conducente à sua anulação bem como à liquidação subsequente.

Para cumprir tal desiderato da exigência legal das decisões devidamente fundamentadas, também os peritos não teriam de enumerar e justificar, exaustivamente, todas as características enumeradas nas citadas alíneas a) a g) do citado art.º 6.º do RCE, mas deveriam enumerar as mais importantes que estivessem presente nesse lote avaliado, de molde a justificar, não só o seu próprio valor encontrado, como também, poder justificar as eventuais diferenças de valores encontrados para outros lotes existentes nessa zona, só assim permitindo ao contribuinte aquilatar da justeza do valor encontrado e com ele poder conformar-se, ou impugná-lo, se o encontrasse eivado de algum erro ou vício que os afectasse na sua legalidade.

O facto de a ora recorrida ter designado perito para tal avaliação em nada altera o dever de fundamentação que a mesma deveria conter, como parece pretender a recorrente – cfr. matéria das sua conclusões VII e VIII -, já que o mesmo não é representante do contribuinte e é nomeado por dever possuir reconhecida idoneidade e competência na matéria em causa, como em geral dispõe a norma do art.º 568.º, n.º1 do CPC, prestando compromisso de honra, no caso, para o desempenho das funções para que foi designado, onde, aliás, a lei não excepciona que, nestes casos, a fundamentação exigível seja de grau inferior ou inexistente, ou possa não se mostrar escrita, como parte desse acto – cfr. art.º 122.º e segs do mesmo CPA.


Improcede assim, na totalidade, a matéria das conclusões das alegações do recurso, sendo de lhe negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.


Custas pela recorrente.


Lisboa,04/06/2013

EUGÉNIO SEQUEIRA
JOAQUIM CONDESSO
PEDRO VERGUEIRO


1- Cfr. no mesmo sentido, entre muitos outros, o acórdão do STA de 29-6-2011, recurso n.º 889/10.
2- Cfr. neste sentido o acórdão deste TCAS de 2-12-2008, recurso n.º 2616/08, em caso paralelo de contribuição especial.