Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02020/07
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/11/2008
Relator:LUCAS MARTINS
Descritores:JUROS COMPENSATÓRIOS
DIREITO DE AUDIÇÃO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
Sumário:1)É do conhecimento geral que a liquidação de juros compensatórios, tem de conter um mínimo de fundamentação própria, no que concerne à base de cálculo, à taxa aplicada, ao lapso de tempo a que os juros se reportam e ainda e também, quanto à culpa necessária à sua imputabilidade ao contribuinte.
2) E, é igualmente sabido que, no que se refere à taxa, à base de cálculo e ao período de tempo a que se referem os juros, nenhuma margem de liberdade é dada à actuação da Administração Tributária, entendendo-se, por conseguinte e no que a estes fundamentos diz respeito, que não assiste ao sujeito passivo o direito de audição prévia, antes da liquidação dos juros compensatórios.
3) Mas já assim não é, no que concerne à culpa, enquanto pressuposto dos juros em questão, pois como juízo subjectivo, tem implícito que o contribuinte possa carrear, para o procedimento elementos até aí não disponíveis à AT, e, neste âmbito, a notificação ao sujeito passivo do acto da respectiva liquidação, para exercer o direito de audição, é uma formalidade essencial, cuja omissão não é susceptível de se degradar em formalidade não essencial.
4)Tendo a AT ouvido o contribuinte, relativamente ao imposto donde provém a liquidação de juros compensatórios, já não é legalmente exigível que proceda a nova audição de forma autónoma e distinta
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:- C……………., com os sinais dos autos, por se não conformar com a decisão proferida pela Mm.a juiz do TAF de Beja, na medida em que lhe julgou improcedente esta impugnação judicial deduzida, ao que aqui releva contra a liquidação de juros compensatórios, dela veio interpor o presente recurso apresentando, para o efeito, as seguintes conclusões;
a) Vem o presente recurso interposto contra a Sentença de 26 de Fevereiro - de 2007, proferida no âmbito do processo de impugnação judicial que correu termos junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja sob o n.° …./….4BEBJA;
b) Na referida Sentença, a Senhora Dr.a Juíza a quo, não obstante admitir a existência de uma preterição de formalidade legal no procedimento que veio a dar origem ao acto de liquidação de juros compensatórios impugnado, considera, erradamente como se verá, que da mesma não decorre a anulabilidade do acto de liquidação de juros compensatórios impugnado;
c) Com efeito, nos termos da Sentença que constitui o objecto do presente recurso, o acto de liquidação de juros compensatórios é um acto vinculado, motivo pelo qual, sendo a única decisão legalmente admissível, o exercício do direito de audição nunca poderia influenciar o sentido da mesma;
d) Não parece ter razão a Senhora Dr.a Juíza a quo.
e) Com efeito, os actos de liquidação de juros compensatórios não são uma mera decorrência da lei, ou seja não são actos legalmente predeterminados - são aqueles que se encontram predeterminados na lei, ou seja a lei enuncia o conteúdo, o modo, o tempo e a forma do acto estando o poder público impedido de fugir das especificações lê ;ais.
f) Ora, resulta do disposto no artigo 35.° da Lei Geral Tributária que, a liquidação de juros compensatórios pressupõe; atraso na liquidação de imposto; que esse atraso seja imputável ao sujeito passivo; e que sobre esse atraso na liquidação seja feito um juízo de censura, ou seja que a conduta seja imputada, subjectivamente, a título de culpa.
g) Por outras palavras, importa que no respectivo procedimento de liquidação a Administração tributária invoque e comprove a verificação dos referidos pressupostos (cfr. Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Setembro de 1998, proferido no Processo n.° 22612; Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Outubro de 2002, proferido no Processo n.° 1145/02, e Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 4 de Fevereiro de 2004, proferido no Processo n.° 1733/03.
h) Culpa esta, e demais pressupostos (taxa, período de tempo pelo qual são computados e respectiva incidência) que, atento o disposto no artigo 77.° da Lei Geral Tributária deveria ter sido exteriorizada pela Administração fiscal, designadamente no Projecto de Relatório de Conclusões da Acção de Inspecção.
i) Com efeito, não obstante serem liquidados em conjunto, a liquidação de juros compensatórios é um acto autónomo da liquidação de imposto com ela não se confundindo (cfr. art.° 35.°, n.°s 8 e 9 da Lei Geral Tributária).
j) Ou seja, deveria a Administração fiscal ter exteriorizado todo o percurso, cognoscitivo que terá conduzido á decisão de liquidação de juros compensatórios, não sendo, manifestamente, um acto vinculado cujo conteúdo decorre, sem mais, da lei.
k) Incorre, pois, a Senhora Dr.a juíza a quo em erro de julgamento.
l) Importa, pois, verificar se, tendo em consideração o que se deixou exposto, a notificação do ora Recorrente para exercer o seu direito de audição em momento prévio ao da prática do acto de liquidação de juros compensatórios era, ou não, uma formalidade legal essencial.
m) O direito de audição é um direito de dignidade constitucional - n.° 5 do artigo 267.° da Constituição da República Portuguesa.
n) Assim, atento o disposto na referida disposição legal e, bem assim, o artigo 60.° da Lei Geral Tributária o órgão competente da Administração tributária deve sempre promover a audição do contribuinte visado sobre todos os aspectos relevantes, seja matéria de facto ou de direito, para a prolação da decisão final.
o) E, como refere a Doutrina as formalidades previstas na lei são essenciais sendo que a respectiva preterição motiva a anulação do respectivo acto (AMARAL, Diogo Freitas do, in Direito Administrativo, Vol. III, 1989, págs. 250 e segs.)
p) Ora, no caso em apreço, e como expressamente reconhecido na Sentença constitui o objecto do presente recurso, a Administração tributária não notificou o Recorrente para, em momento anterior ao da prática do acto de liquidação de juros compensatórios exercer o seu direito de audição.
q) E, como se deixou comprovado, in casu o exercício do direito de audição não seria um mero rito, mas antes uma fase procedimental essencial para que o Recorrente se pudesse manifestar sobre a (não) verificação dos pressupostos de que a lei faz depender a liquidação de juros compensatórios, ou seja procurando demonstrar a ausência de culpa no alegado atraso na liquidação do imposto e, bem assim, verificar se a(s) taxa(s) aplicadas e(são) a(s) correcta(s), se o período de tempo pelo qual os mesmos foram computados corresponde ao disposto no artigo 35.° da Lei Geral Tributária e ainda sobre o valor sobre o qual incidiram esses mesmos juros.
r) "É de anular a liquidação de imposto de sisa e juros compensatórios em que foi preterida a audiência prévia do contribuinte, quando esta possa servir, precisamente, para o interessado procurar induzir a Administração Tributária a compatibilizar a observância da legalidade na elaboração do acto de liquidação com a situação efectivamente existente."
A este propósito e a nosso ver, importa trazer à colação a jurisprudência fixada no Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal de 17/12/97, IN Bol. 472/246.
Ai se diz que «se se não puder afirmar que a decisão viciada só podia em abstracto ter o, conteúdo que teve em concreto, procede a arguição de anulabilidade, devendo, em consequência, o acto ser anulado.»
Efectivamente, o direito do interessado na participação da formação do acto de que é destinatário só será verdadeiramente violado se através dessa participação houver a possibilidade, ainda que ténue, de o interessado vir n exercer influência, quer pelos esclarecimentos prestados, quer pelo chamamento da atenção de certos aspectos de facto e de direito, na decisão a proferir, no termo da instrução" (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 14 de Maio de 2003, proferido no Processo n.° 317/03).
s) Em face do exposto, dúvidas não podem subsistir que não se tratando o acto de liquidação de juros compensatórios de um acto vinculado, e demonstrado que está que o Recorrente poderia, em sede de direito de audição, demonstrar a inexistência de culpa no alegado arraso na liquidação do imposto e/ou pronunciar-se sobre o período de tempo pelo qual os juros foram calculados e/ou a(s) taxa(s) de juros aplicada(s), e omissão de notificação para o exercício do direito de audição em momento anterior ao da prática do acto de liquidação de juros compensatórios impugnado, consubstancia uma preterição de formalidade legal essencial no procedimento que lhe veio a dar origem o que, inevitavelmente, torna anulável o mesmo acto de liquidação.
t) Resultou, assim, pela Sentença ora recorrida, violado o disposto nos artigos 267.°, n.° 5 da Constituição da República Portuguesa e 60.°da Lei Geral Tributária, devendo, pois, a mesma Sentença ser revogada e assim anulado o acto de liquidação de juros compensatórios em apreço.

- Não houve contra-alegações.

- O EMMP, junto deste Tribunal, emitiu o douto parecer de fls. 173 pronunciando-se, a final, no sentido de ser negado provimento ao recurso, no entendimento de que "(...) o julgado não merece a censura que lhe é reclamada".
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- Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

- A decisão recorrida, com suporte na prova documental carreada, para os autos e referida nas subsequentes alíneas deu, por provada, a seguinte;
- MATÉRIA DE FACTO -
A). De 2002-07-04 a 2003-05-01 foi realizada uma acção inspectiva à escrita do impugnante, relativamente aos anos de 1999 a 2001, tendo os serviços de fiscalização tributária realizado um projecto de relatório de inspecção tributária, no qual, em síntese, se apurou, que "... tendo em atenção tudo o que foi referido no Relatório, nomeadamente, nos pontos C. -5 e C. -6, sou de opinião que a contabilidade não foi elaborada de forma a reflectir com exactidão os volumes de negócios realizados, nem os resultados efectivamente obtidos, pelo que se propõe para os exercícios de 1999, 2010 e 2001 o recurso a métodos indirectos... " (cfr.fls. 23 a 74 dos autos):

B). Em foram emitidas as liquidações (adicional de IRS referente ao exercício de 2000 e respectivos juros compensatórios) melhor identificadas a fls. 13 dos autos;

C). Em 2004-08-10, o Impugnante deduziu reclamação graciosa, tendo a mesma sido indeferida por despacho de 2005-06-22 (cfr. fls. 14 a 22 e 75 dos autos).
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- Mais se deram, como não provados, quaisquer outros factos diversos dos referenciados nas precedentes alíneas, enquanto relevantes à decisão de mérito a proferir.
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- Por se encontrar documentalmente demonstrada e se revelar pertinente à decisão de mérito a proferir, à luz de todas as possíveis soluções de direito, adita-se ao probatório, a coberto do disposto no art.° 712.° do CPC, a seguinte factualidade;

D), o Impugnante, uma vez notificado do Projecto de Relatório resultante da acção inspectiva de que foi alvo, exerceu o direito de audição por escrito - cfr. ponto VIII, do doc. junto pelo impugnante, com o seu articulado inicial.

- Por outro lado, constata-se que, por evidente lapso de escrita, a al. B), do probatório é omissa quanto à data da emissão das liquidações de imposto e juros compensatórios, circunstância de facto que, também ela, - na linha, aliás, do referido nessa mesma alínea quanto ao seu suporte probatório -, se encontra documentada nos autos razão porque, ao abrigo daquele mesmo preceito do CPC, se adita àquela mesma alínea, a referência à data de "2003DEZ12", a inserir, no seu início, entre as palavras "Em" e "foram".
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- ENQUADRAMENTO JURÍDICO -

- A única questão que se coloca à apreciação deste Tribunal reside em saber se a liquidação de juros compensatórios padece, ou não, de ilegalidade por não ter sido, especificamente, antecedida da notificação do recorrente para, querendo, exercer o direito de audição prévia relativamente a ela e, na afirmativa, se tal vício de forma, " in casu", se degradou em mera irregularidade, sendo nessa medida, insusceptível de implicar a invalidade de tal acto tributário.

- O recorrente sustenta, por um lado, que a preterição do referido direito de audição, constitui a violação de uma formalidade essencial cominada por lei, a qual, no caso, é insusceptível de se degradar em mera irregularidade, uma vez que se não traduziria num mero rito, já que, ao invés do decidido na sentença em crise, a liquidação de juros compensatórios não constitui um acto estritamente vinculado por força da liquidação de imposto, pelo que, ao não entender assim, a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento.

- Ora, no caso, é manifesto que a Mm.a juiz recorrida considerou, por um lado, que o ordenamento jurídico aplicável impunha que se facultasse ao recorrente o direito de audição prévia, no que concerne à liquidação de juros compensatórios impugnada, o que não se verificou (cfr., por todos, o 2° §, de fls. 114 dos autos); Sem embargo, veio a concluir que tal vício de forma não implicava qualquer efeito invalidante da liquidação dos JCs em questão, uma vez que "(...) o acto tributário objecto de reclamação, não poderia ter outro conteúdo decisório." (cfr., por todos, o 5." § de fls. 114 dos autos).

- Vejamos então;
- Crê-se que ninguém dissentirá constituírem pressupostos indispensáveis a liquidação de juros compensatórios, nos termos do disposto combinadamente e ao que aqui releva, nos art.°s 91.° do CIRS e 35.° da LGT;
i- a existência de imposto devido;
ii- o retardamento da liquidação e entrega desse imposto ao credor tributário;
iii- a ocorrência, pelo referido retardamento, de prejuízo para o credor, e;
iv- a imputabilidade ao obrigado ao imposto no aludido retardamento;

- Por outro lado julga-se pacífico o entendimento de que os juros compensatórios têm uma natureza indemnizatória e não sancionatória deles sendo pressuposto uma actuação culposa do obrigado á prestação tributária "(...) aferida segundo os deveres gerais de diligência, aptidão, conhecimento e, mesmo, de perícia de um bonus pater familias.", culpa essa que cabe á FP demonstrar, pelo que "(...) em caso de inexistência de culpa ou mesma de fundada dúvida, sobre a existência de um comportamento censurável, afastado está o direito a juros compensatórios" .

- Ora, o direito de audição, nos termos do plasmado no CPA, tem por desiderato primordial "(...) habilitar a Administração a decidir perante uma dada situação concreta se está em causa o interesse público correspondente à sua competência e, em caso afirmativo, qual a melhor forma de o prosseguir", para o que é relevante o "apport" factual que possa ser coligido pelos administrados, independentemente do sentido final decisório(1).

- Já, no direito tributário, a fundamentação axiológica de tal direito é mais complexa.
- Na realidade, o que, aqui (direito tributário) está em causa não é, já e só, o referido interesse público, antes tem , ainda e também, uma "(...) óbvia função defensiva e preventiva (...)"(2) dos contribuintes, pelo que, sendo assim, o que se impõe, desde logo, extrapolar é que, para além do que sucede com o direito de ser ouvido plasmado no CPA. respeitando "(...) apenas às questões que importam à decisão que vier a ser tomada isto é, ao objecto do procedimento tal como configurado antes da decisão final" e independentemente do sentido desta, o interesse prosseguido pela figura em causa é, ainda e nuclearmente, o da descoberta da verdade material e da defesa antecipada dos interesses do contribuinte.

- Ou seja e secundando a doutrina referida, no procedimento tributário a "audição prévia do contribuinte visa garantir a defesa dos interesses deste perante o Fisco", por um lado, no sentido de que tal defesa passa pelo interesse do contribuinte "(...) em esclarecer as eventuais incertezas probatórias da Administração fiscal antes que as mesmas sejam resolvidas num sentido contrário aos seus interesses, evitando, desse modo, a necessidade de impugnar ou de recorrer da liquidação" e, por outro, na efectiva "(...) valoração dos factos tributáveis de acordo com o princípio da verdade material"(3).
- Daí que, como expende na sequência do que se acaba de referir, " A enunciação dos pressupostos negativos de natureza objectiva - isto é, das situações em que, por força de lei, a audição do contribuinte é dispensada (artigo 60.°, n.º 2, da Lei Geral Tributária) - conforma aquela dupla função, porquanto a ratio da dispensa da audição prévia reside precisamente na consideração de que, nas situações consideradas, os fins subjacentes á consagração da exigência daquela formalidade já se encontram realizados. Deste modo, a promoção da audiência nada poderia trazer de novo quer à defesa dos interesses dos contribuintes, quer à verdade material".

- Assim que, do cotejo do que acima se referiu, por um lado, quanto á natureza e pressupostos dos juros compensatórios e, por outro, no que toca à natureza e finalidade do direito de audiência prévia, se conclua, ao invés do pretendido pelo recorrente, ser de secundar o sentido decisório da sentença recorrida, se bem que com fundamentação distinta.

- Vejamos, também aqui, o porquê deste nosso entendimento.

- Reportando-nos, de novo, aos pressupostos da liquidação de juros compensatórios, como liquidação autónoma, ainda que integrada na liquidação de imposto, é evidente que esta tem que possuir um mínimo de fundamentação própria no que concerne, desde logo, à base de cálculo, à taxa aplicada, ao lapso de tempo a que se reportam (4), mas, ainda e também, quanto á culpa necessária a sua imputabilidade ao sujeito passivo; E será por referência a essa mesma fundamentação que terá de ser aferido o acatamento do poder/dever da AF de facultar ao contribuinte o direito de audição prévia.

- Ora, no que diz respeito à taxa, base de cálculo e período de tempo a que se reportam os juros compensatórios, nenhuma margem de conformação é facultada à AT, que apenas tem e pode concretizar o que se encontra expressamente consignado na lei, isto é, no que àqueles pressupostos se refere, a actuação da AF consiste num procedimento estritamente vinculado, pelo que a sua actuação, em tal domínio, não é susceptível de ser influenciada por quaisquer argumentos que o recorrente pudesse suscitar, no sentido de influenciar o acto de liquidação, por pretender a aplicação de uma taxa diferente, ou de um período de tempo ou de uma base de cálculo diversas, uma vez que estas não podem ser outras que não as determinadas pelo ordenamento jurídico aplicável.

- E evidente que a entidade liquidadora, por lapso ou por outra razão, pode atender, no que a tais pressupostos diz respeito, a elementos que não sejam aqueles a que deveria atender; Só que tal eventual circunstancialismo não constitui fundamento ao exercício do direito de audição prévia, antes e apenas a que a referência expressa e clara ao mesmo, terá de fazer parte da fundamentação da liquidação para que o seu destinatário possa, contra ela reagir, por vício de violação de lei.

- Por consequência e no que a estes fundamentos diz respeito, o que se entende é que, ao sujeito passivo não assiste qualquer direito de audição prévia antes da liquidação dos juros compensa tórios, o que vale por dizer que, neste domínio, o não lhe ter sido facultado o exercício do mesmo não consubstancia, sequer qualquer irregularidade procedimental e, muito menos, com efeitos invalidantes do acto final de liquidação.

- Já no que diz respeito à culpa, enquanto pressuposto dos juros em questão, se entende que, tratando-se de um juízo subjectivo, tem implícito que o contribuinte, em sede de exercício de audição, possa carrear para o procedimento, elementos até aí não disponíveis pela AT, que possam afastá-lo, à luz dos elementos relevantes à sua aferição, nos termos acima referidos; Por isso que se não possa concluir que o simples facto do conhecimento do retardamento do imposto, por parte do contribuinte, da taxa aplicável e do período de tempo, implique inexoravelmente o acto da respectiva liquidação, pelo que, neste âmbito, se entende, por um lado, como formalidade essencial a observar, a notificação do destinatário do acto tributário final, para exercer, querendo, o direito de audição, e, por outro, que a preterição de tal poder/dever é insusceptível de se degradar em formalidade não essencial.

- Só que, o que se vem de dizer, não significa/implica, que a razão se encontre do lado do recorrente.

- É que, como acima se deu conta, a culpa é um conceito de direito a extrapolar da factualidade adequada e pertinente, pelo que o afastamento da mesma passa pela demonstração da falta de aderência à realidade daquela em que a entidade liquidadora estriba aquele juízo conclusivo, pela sua inadequação a tal efeito desde logo pela justificação relevante susceptível de a excluir.

- Ora, no caso dos juros compensatórios e na sequência do acima referido, a factualidade em que há-de radicar o juízo de culpa, não pode ser outra que não aquela que subjaz ao apuramento de imposto entendido em falta, na exacta medida em que se integram neste, nos termos do n.° 8, do art.° 35.° da LGT.

- Mas, assim sendo, se por um lado é inexorável que, ao contribuinte tem de ser facultado o exercício do direito de audição, antes da liquidação de juros compensatórios, sob pena de invalidade deste acto final, é igualmente axiomático que o exercício desse direito se satisfaz, no que à culpa diz respeito, com o facultar-lhe o exercício desse mesmo direito antes da liquidação do imposto a que se reportam os JC's, já que será aí que ele terá de contestar a aderência á realidade, ou justificação, das circunstâncias de facto que podem constituir o fundamento daquele juízo de censura(5).

- Ora, "in casu", está demonstrado que, ao recorrente foi facultado o direito de audição, com a notificação que lhe foi feita do projecto de relatório da acção inspectiva e de onde constam, como se dá conta na decisão recorrida, todas as circunstâncias de facto que levaram a AT a tributá-lo por recurso a metodologia indiciaria, bem como dos critérios de cálculo do "quantum ", o que vale por dizer, na linha do que acirra se referiu nenhuma outra notificação lhe tinha de ser feita a facultar-lhe o exercício de audição prévia, por referência, especificamente, à liquidação dos juros compensatórios, seja por que tal formalidade se tem de considerar acatada com a notificação que, para esse mesmo efeito, lhe foi feita com referência ao imposto, seja por que, quanto aos restantes pressupostos de liquidação de JCs, eles consubstanciam-se numa conduta estritamente vinculada da AT.

- Conclui-se, assim, pela improcedência da totalidade das conclusões do presente recurso.
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- D E C I S Ã O -

- Nestes termos acordam, os juízes da secção de contencioso tributário do TCA Sul, em negar provimento ao recurso, assim se confirmando, com a fundamentação acima expressa, a decisão recorrida que, nessa medida, se mantém valida na ordem jurídica.
- Custas pelo recorrente.
08NOV11
LUCAS MARTINS
PEREIRA GAMEIRO
JOSÉ CORREIA
(1)Cfr. Pedro Machete, in A audiência dos Interessados no Procedimento Administrativo. 446 e segs. e, ainda, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário. 301 e segs..
(2) Pedro Machete, obra cit., 318.
(3) Cfr. O mesmo autor, in "Problemas Fundamentais do Direito Tributário". 318 e 322.
(4) De que será exemplo, entre muitos outros, o Ac. do STA de 2007JUN06. Proc. n.° 155/07.
(5) Neste sentido crê-se poder apontar, a título exemplificativo e entre outros, o recente Ac. deste Tribunal, de 2008OUT21. tirado no Rec. n.° 2.018/07.