Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2573/10.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:10/22/2020
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:OPOSIÇÃO,
PRESCRIÇÃO
Sumário:A jurisprudência reconhece à interrupção da prescrição decorrente da citação do executado (n.º 1 do art. 49.º da LGT) um duplo efeito: a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do art. 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do art. 327.º do CC).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA e M....., J... e V....... vieram recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou parcialmente procedente a oposição deduzida pelos segundos contra a execução fiscal n.° 422….. e apensos, que o Serviço de Finanças de Odivelas lhes moveu, por reversão de dívidas da sociedade C.... - T....., Lda., relativas a IRC, IVA e coimas.

A recorrente FAZENDA PÚBLICA apresentou as suas alegações e formulou as seguintes conclusões:

«1. In casu, salvo o devido respeito, o qual, é muito, deveria ter sido dada uma maior acuidade ao escopo do vertido nos arts. 29.°, n.° 1 do CPEREF; art. 48.° da LGT; art. 34.° e 80.° do RGIT; art. 30.° e 30.°, A) do RGIT, assim como ao Princípio da Legalidade, para que, se pudesse aquilatar pela IMPROCEDÊNCIA DA IMPUGNAÇÃO aduzida pelo Recorrido.
2. Pelo que, a Recorrente, com o devido respeito, conclui não ter razão o Tribunal a quo, que julgou num determinado sentido que perante a matéria de facto dada como assente, devidamente conjugada com os elementos constantes dos autos, mormente do acervo probatório documental que foi apurado e sindicado, não tem a devida correspondência com o modo como as normas que constituem o fundamento jurídico da decisão a quo deveriam ter sido interpretadas e aplicadas ao caso vertente.
3. Outrossim, o sobredito “erro de julgamento” (consubstanciado na errada valoração e consideração da factualidade considerada assente, assim como a errada subsunção jurídica que foi realizada pelo respeitoso areópago à matéria dada como assente) foi como que causa adequada para que fosse preconizada uma errada interpretação e aplicação do direito ao caso vertente.
4. Consequentemente, o respeitoso Tribunal a quo, concluiu com o seguinte DISPOSITIVO:
- “ Nos termos e com os fundamentos expostos, julga-se a oposição parcialmente procedente, julgando-se prescrita a dívida exequenda em cobrança nos processos de execução n.°s 42….., 42….., 42….. e 42….., relativa > IVA dos períodos de 2000/06T 2000/09T e a coimas, com a consequente extinção dos referidos processos de execução, mantendo-se os restantes processos de execução por referência aos quais foi deduzida a presente oposição (422……, 42….., 42…., 42…. e 42…..)”. - (cfr. fls. 17 do douto aresto a quo).
5. A predita vicissitude, preconizada pelo respeitoso Tribunal a quo, a qual, humildosamente, se pretende que seja devidamente sindicada pelo respeitoso Areópago ad quem, foi, mutatis mutandis, causa adequada, para que fosse alvitrada pelo Tribunal recorrido, uma errada consideração da factualidade dada como assente, e consequentemente, a errada interpretação e aplicação do direito aos factos do caso vertente, culminando em erro de julgamento.
7. A MATÉRIA FACTUAL DADA COMO ASSENTE, consta dos itens A) ao K) do segmento fáctico do douto aresto recorrido, mormente de fls. 3 a fls. 5,do mesmo, para os quais se remete, dando-se aqui por integralmente vertidos por imperiosa razão de economia processual.
8. Sendo que, no que em concreto diz respeito à temática recorrida e a sindicar pelo respeitoso Areópago ad quem, tem particular relevância a factualidade dada como provada e constante das alíneas 1) à 8) do Item A) e itens C), I) e J) do segmento fáctico dado como assente, os quais, salvaguardado o devido respeito, que é muito, não foram devidamente considerados pelo respeitoso Tribunal a quo, pois que, resulta uma errada interpretação e aplicação do direito (aplicável) àqueles factos. entre o segmento decisório constante do dispositivo e aquela factualidade dada como assente.
9. A douta FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO que é plasmada na douta sentença a quo, a mesma está vazada de fls. 11, in fine, a fls. 16, do douto aresto recorrido, e para a qual, igualmente se remete, dando-se aqui por integralmente vertida por razão de economia processual.
ORA,
10. Contrariamente ao asseverado pelo respeitoso Tribunal a quo, propendemos para considerar que as causas de interrupção e suspensão do prazo de prescrição das obrigações tributárias estão previstas no art. 49.° da LGT, sem prejuízo, todavia, do que vem enunciado noutras leis igualmente aplicáveis à actividade tributária, nomeadamente o n.° 2 do art.° 29.° do Código do Processo Especial de Recuperação de Empresas e Falências (CPEREF), aprovado pelo Decreto-Lei n.° 132/93 de 23 de Abril e o art. 100.° do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado pelo Decreto- Lei n.° 53/2004 de 18 de Março.
11. Pelo que nos termos dos citados artigos, o prazo de prescrição esteve suspenso em todas as acções executivas que, nos termos do preceituado no n.° 1 do art. 29.° do CPEREF, tiverem sido abrangidas pelo regime de suspensão do despacho de prosseguimento do processo especial de recuperação de empresa, e, entre essa acções, sempre se entendeu estar incluído o processo de execução fiscal.
12. E, assim vai asseverado, porquanto, enquanto a Administração Tributária está impossibilitada de cobrar o tributo, não poderá estar a correr o prazo de prescrição, sendo que o prazo legal de prescrição equivale ao tempo útil para o exercício do direito.
13. Sendo que, a avocação dos processos de execução fiscal ao processo de falência, explica-se por, na pendência do processo de falência deverem ser centralizadas no respectivo douto Juiz todas as decisões relativas às dívidas e créditos a ele atinentes.
14. Consequentemente, e salvo o devido respeito, não ocorreu o decurso do prazo prescricional das quantias que são objecto da presente lide. Mormente, das quantias exequendas que dizem respeito aos processos de execução fiscal com os n.°s 42….., 42……, n.°s 42…… e 42…...
15. Decidindo como decidiu, o Tribunal a quo não considerou correctamente a factualidade dada como assente das alíneas 1) à 8) do Item A) e itens C), I) e J) do segmento fáctico fazendo, por isso, uma errada interpretação e aplicação do direito aos factos, mormente das normas legais supra vazadas ao corpo factual dado como assente.
16. Em face do sobredito, salvaguardado o devido respeito, o Tribunal a quo lavrou em erro de julgamento.
NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, e com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido total provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a sentença proferida com as devidas consequências legais.
CONCOMITANTEMENTE,
Apela-se desde já à vossa sensibilidade e profundo saber, pois, se aplicar o Direito é um rotineiro ato da administração pública, fazer justiça é um ato místico de transcendente significado, o qual poderá desde já, de uma forma digna ser preconizado por V. as Exas, assim se fazendo a mais sã, serena, objectiva e acostumada JUSTIÇA!»

Os recorrentes apresentaram as suas alegações, tendo formulado as conclusões seguintes:

«1. Os factos Tributários remontam 2001.
2. Ora sucede que já decorreram cerca de 15 anos.
3. As dívidas Tributárias prescrevem no prazo de 8 anos, nos termos do n° 1 do art. 48° da Lei Geral Tributária.
4. Por outro lado, os executados foram citados em 7 de Setembro de 2009, ou seja, depois de 5 anos, da data posterior ao da liquidação, sendo que a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto aos responsáveis subsidiários. (art. 48° n° 3 da Lei Geral Tributária )
5. Assim, as dívidas Tributárias estão prescritas por decurso do prazo de 8 anos.
6. A douta sentença recorrida violou o art. 48° da Lei Geral Tributária.
Nestes termos, o presente recurso deve ser julgado procedente e provado e, consequentemente, o processo fiscal deve ser arquivado, com base na prescrição de todas dívidas fiscais.
Assim se fará Justiça!»

Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Magistrado do Ministério Público ofereceu parecer no sentido de ser julgada verificada a exceção de incompetência absoluta deste Tribunal, em razão da hierarquia.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

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As questões a decidir no presente recurso são as seguintes:
_ exceção de incompetência deste TCAS em razão da hierarquia, suscitada pelo Ministério Público no seu parecer;
_ improcedendo a exceção, aferir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e direito ao ter declarado a prescrição parcial da dívida, considerando os fundamentos do recurso da Fazenda Pública e dos Oponentes.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

“A) Foram instaurados pelo Serviço de Finanças de Odivelas, contra a sociedade C.... - T....., Lda, os seguintes processos de execução fiscal:
1. Processo n.° 422….., instaurado em 19.01.2001, por dívida de IVA do período 2000/06T, no valor de 3.754,45 EUR, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 16.08.2000;
2. Processo n.° 422……, instaurado em 31.05.2001, por dívida de IVA do período 2000/09T, no valor de 4.184,50 EUR, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 15.11.2000;
3. Processo n.° 422……, instaurado em 12.04.2002, por dívida de IVA do período 2001/06T, no valor de 1.409,97 EUR, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 16.08.2001;
4. Processo n.° 422……, instaurado em 04.06.2002, por dívida de IVA do período de 2001/09T, no valor de 2.154,33 EUR, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 15.11.2001;
5. Processo n.° 422……., instaurado em 14.09.2002, por dívida de IVA do período de 2001/12T, no valor de 2.475,07 EUR, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 15.02.2002;
6. Processo n.° 422……., instaurado em 18.09.2003, por dívida de IRC do ano de 2001, no valor de 62,05 EUR, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 21.07.2003;
7. Processo n.° 422……., instaurado em 20.12.2005, por dívida de coimas e custas do respectivo processo de contra-ordenação, do ano de 2005, no valor de 908,79 EUR, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 25.05.2005;
8. Processo n.° 422……., instaurado em 20.12.2005, por dívida de coimas e custas do respectivo processo de contra-ordenação, do ano de 2005, no valor de 613,77 EUR, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 02.06.2005;
9. Processo n.° 422……, instaurado em 24.01.2007, por dívida de IRC do ano de 2002, no valor de 125,89 EUR, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 03.01.2007.
(cfr. documentos de fls. 9 dos autos e fls. 1, 2, e 78 e seguintes da certidão do processo de execução apensa);

B) Foram apensados ao processo de execução n.° 422……, identificado no ponto 1 da alínea anterior, os processos de execução identificados nos pontos 2 a 9 da referida alínea (cfr. documento de fls. 19 dos autos);

C) A sociedade mencionada em A) foi declarada falida, por sentença de 23.05.2003, do Tribunal de Comércio de Lisboa, no processo n.° 72/03.6TYLSB (cfr. documento de fls. 15 a 19 dos autos);

D) Os processo de execução fiscal mencionados em A), já instaurados, foram suspensos, na sequência do mencionado em C), a 24.06.2003, tendo sido avocados ao processo falimentar e devolvidos ao Serviço de Finanças de Odivelas a 18.10.2007 (cfr. documento e informação de fls. 19 e 20);

E) Entre a instauração e a devolução mencionada em D), não foi praticado qualquer acto nos processos de execução fiscal identificados em A) supra;

F) Em 16.04.2009, no processo de execução fiscal mencionado em A), foi elaborada informação e foi proferido despacho, pelo Chefe do Serviço de Finanças de Odivelas, no sentido de os ora Oponentes serem notificados para exercício do direito de audição sobre projecto de reversão (cfr. documentos de fls. 20 a 22 da certidão do processo de execução apensa);

G) Na sequência do mencionado em F), foram remetidos, em 22.04.2009, por correio postal registado, ofícios dirigidos aos Oponentes, designados de “Notificação Audição - Prévia (Reversão)” (cfr. documentos de fls. 23 a 30 da certidão do processo de execução apensa);

H) Em 26.08.2009, foram proferidos nos processos de execução fiscal mencionados em A), pelo Chefe do Serviço de Finanças de Odivelas, despachos de reversão contra os Oponentes, dos quais consta designadamente o seguinte:
“(...) FUNDAMENTAÇÃO DA REVERSÃO
Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do seu cargo [art. 24°/n°1 /b) LGT].
Dos administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração em pes. colectivas, por não terem pago as coimas aplicadas a infracções por factos praticados no exercício do seu cargo [art. 8°/n°1/a) LGT].” (cfr. documentos de fls. 31 a 36 da certidão do processo de execução apensa);

I) Em 02.09.2009, foram remetidos, por correio postal registado com aviso de recepção, ofícios dirigidos aos Oponentes, designados de “Citação (Reversão)” (cfr. documentos de fls. 41 a 51 da certidão do processo de execução apensa);

J) Os avisos de recepção mencionados em I), foram assinados pelos destinatários, em 07.09.2009, no campo destinado ao preenchimento pelos mesmos (cfr. documentos de fls. 41 a 51 da certidão do processo de execução apensa);

K) Em 07.10.2009, foi apresentada a presente oposição (cfr. fls. 11 dos autos).
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FACTOS NÃO PROVADOS: não existem factos a dar como não provados com interesse para a decisão.
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Assenta a convicção do tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos e da certidão do processo de execução apensa, não impugnados, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
Quanto ao facto E), a convicção do Tribunal fundou-se no facto de não constarem da certidão do processo de execução fiscal apensa elementos susceptíveis de provar a prática de qualquer acto nos processos de execução fiscal.

Sendo certo que, relativamente ao processo n.° 422…., consta a fls. 19 da certidão do processo de execução fiscal apensa uma impressão do sistema informático da Administração Tributária, a qual contém a referência a citação postal, não se reconhece a tal documento qualquer valor probatório, porquanto, por um lado, nessa impressão constam duas datas de citação (23.06.2001 e 03.07.2001), o que constitui, em si mesmo, uma contradição que retira credibilidade à informação, e, por outro lado, aquela impressão do sistema informático apenas prova o registo no sistema da própria Administração Tributária e não a ocorrência do acto registado.

Também é verdade que, relativamente ao processo de execução n.° 422……, consta um ofício/carta denominado “aviso - citação”, com a menção de “registada”. Contudo, da certidão do processo de execução fiscal apensa não consta qualquer elemento que demonstre, desde logo, que tal aviso/carta foi enviado ao executado. Sendo que, havendo a menção de a carta de citação ser registada, a prova do envio da citação, sem qualquer outro elemento, teria que passar pela presença do registo postal, o que não se verifica.»

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Cumpre, então, antes de mais, aferir da competência deste Tribunal Central Administrativo Sul em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso, pois a infração às regras de competência em razão da hierarquia determina, nos termos do disposto no art. 16.º, n.º 1 do CPPT, a incompetência absoluta do tribunal.

As questões de competência absoluta são de conhecimento oficioso, precedendo o seu conhecimento o de qualquer outra questão, e pode ser arguida por qualquer interessado, Fazenda Pública e suscitada pelo Ministério Público (cf. art.º 16.º, n.º 2, do CPPT).

Por conseguinte, a competência do Tribunal em razão da hierarquia constitui questão que o tribunal deve conhecer oficiosamente ou mediante arguição, com prioridade sobre qualquer outra, até ao trânsito em julgado da decisão final (cf. Ac. do STA de 09/04/2014, proc. n.º 0161/14).

A sentença foi proferida em 12/12/2016, e ambos os recursos interpostos em 03/01/2017, pelo que é aplicável o CPPT na redação anterior à Lei 118/2019, de 17 de setembro (cf. art. 13.º, n.º 1, alínea c)), bem como o ETAF na redação anterior à da Lei 114/2019, de 12/09.

É competente para conhecer dos recursos de decisões dos Tribunais Tributários a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo quando o recurso tem por fundamento exclusivo matéria de direito (art. 26º, al. b), do ETAF), sendo competente a Secção de Contencioso Tributário de cada Tribunal Central Administrativo se o fundamento não for exclusivamente de direito (art. 38.º, al. a), do ETAF).

Em consonância com aquelas regras de competência, dispõe o art. 280.º, n.º 1 do CPPT que das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância cabe recurso, para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo quando a matéria for exclusivamente de direito. Para aferir da competência do tribunal em razão da hierarquia há que atender aos fundamentos do recurso, que devem constar das conclusões, uma vez que estas fixam o objeto do recurso nos termos do disposto no art. 635.º, n.º 4, do CPC.

Se face as conclusões de recurso se constata que as questões controvertidas se resolvem mediante uma exclusiva atividade de aplicação e interpretação de normas jurídicas, então será competente o STA, pelo contrário, será competente do TCA, se aquelas questões implicam a necessidade de dirimir questões de facto “seja por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, seja porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, seja ainda porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos” (Ac. do STA de 09/04/2014, proc. n.º 0161/14).

Passando ao caso dos autos.

Analisando as conclusões das alegações de recurso apresentada por ambas as recorrentes temos que as questões a serem dirimidas não são exclusivamente de direito, porquanto se coloca em causa a matéria de facto subjacente à decisão recorrida, e se fazem juízos sobre questões probatórias que implicam a apreciação de matéria de facto, como decorre da conclusão 2, 3, 5, 8 15 das conclusões de recurso da Fazenda Pública, o que tanto basta para se concluir que o presente TCAS é competente para conhecer do presente recurso.

Face ao exposto, improcede a exceção suscitada.

Passemos então, ao conhecimento do mérito dos recursos.

Conforme resulta dos autos, com base na matéria de facto supratranscrita, o Meritíssimo Juiz do TAF de Lisboa julgou parcialmente procedente a Oposição, entendendo que a dívida exequenda se encontrava prescrita na parte correspondente às dívidas de IVA de 2000/06T a 2000/09T e a coimas.

A recorrente Fazenda Pública não se conforma com o decidido na parte da decisão que lhe é desfavorável, e invoca, para tanto, erro de julgamento de facto e de direito, porquanto entende que a dívida exequenda não se encontra prescrita, fundando a sua pretensão no facto de a sentença recorrida não ter devidamente considerado para o cômputo do prazo de prescrição os factos constantes “das alíneas 1) à 8 do Item A) e itens C), I, J) do segmento fáctico dado como assente” (conclusão 8). Entende que se deveria ter considerado as causas de suspensão do processo de execução fiscal previstas no art. 100.º do CIRE, e art. 29.º, n.º 2, do CPEREF.

Por sua vez, os recorrentes Oponentes também não se conformam com a parte da sentença que lhes é desfavorável, considerando que a dívida se encontra prescrita, considerando que foram citados depois de 5 anos da data da liquidação (em 07/09/2009) e, por conseguinte, nos termos do art. 48.º, n.º 3, da LGT a interrupção do prazo de prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos relativamente aos Oponentes, tendo já decorrido o prazo de prescrição de 8 anos previsto no n.º 1, do art. 48.º da LGT.

Apreciando.

Está em causa nos autos dívidas de IVA dos períodos de 2000/06T, 2000/09T e 2001/06T a 2001/12T, IRC dos exercícios de 2001 e 2002, e coimas aplicadas no ano de 2005.

No que diz respeito às dívidas por coimas aplica-se o regime previsto no RGIT e no RGCO. No que diz respeito às dívidas de impostos, poderá aplicar-se, consoante os casos, o CPT ou a LGT.

No seu recurso, a Fazenda Pública coloca em causa o decurso do prazo de prescrição, com o fundamento de que não foram consideradas as causas de suspensão do prazo que se encontram previstas no previstas no art. 100.º do CIRE, e art. 29.º, n.º 2, do CPEREF e respetiva matéria provada nas alíneas A) e C), bem como a citação dos Oponentes dadas como provadas nas alíneas I) e J).

Contudo, não lhe assiste razão quanto tais fundamentos.

Na verdade, resulta da matéria de facto (alínea C.) que a sociedade executada originária foi declarada falida em 23/05/2003.


Porém, não constitui facto suspensivo do prazo de prescrição a declaração de falência e a remessa dos autos executivos àquele processo, porque na “vigência do CPEREF, a declaração de falência não suspende o prazo de prescrição, só determinando a sustação das execuções a fim de serem apensadas ao processo de falência para aí correrem os seus termos como reclamação dos créditos exequendos.” – Acórdão do Pleno do STA de 15/10/2014, proc. n.º 0431/14.

Portanto, a sentença recorrida não enferma de erro de julgamento de facto e de direito, improcedendo, nesta parte os fundamentos do recurso da Fazenda Pública.

Ora, também relativamente às dívidas de coimas, a recorrente Fazenda Pública vem imputar erro de julgamento por violação do disposto no art. 34.º e 80.º do RGIT e art. 30.º e 30.º-A, do RGCO (cf. conclusão 1) das alegações de recurso), contudo, também não se vislumbra qualquer erro de julgamento, sendo de confirmar a sentença recorrida que assim decidiu:

“Como foi supra referido, as coimas aplicadas no âmbito das contra-ordenações fiscais possuem norma específica regulamentadora do prazo da prescrição, concretamente o artigo 34.° do RGIT, o qual estabelece que:“As sanções por contra-ordenação tributária prescrevem no prazo de cinco anos a contar da data da sua aplicação, sem prejuízo das causas de interrupção e de suspensão previstas na lei geral”.
Fixa-se, assim, um prazo de prescrição de cinco anos, sendo o termo inicial do mesmo a data do trânsito em julgado da decisão administrativa/judicial que aplicou a coima - apesar do legislador fazer referência à data da sua aplicação, é esta interpretação que se deve ter como a mais acertada e que melhor se coaduna com a unidade do sistema jurídico, atentos os ditames consagrados no artigo 9.° do Código Civil (cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 25.06.2003, processo n.° 1076/02, e, na doutrina, Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias Anotado, Áreas Editora, 4.a edição, 2010, pág. 332 e seg.).
Sendo que o legislador, na parte final do preceito em causa, determina a aplicação ao regime de prescrição da coima das causas de suspensão e de interrupção previstas na lei geral, mais exactamente nos artigos 30.° e 30.°-A do RGCO.
Dispõe o artigo 30.°, sob a epígrafe “Suspensão da prescrição da coima”:
“A prescrição da coima suspende-se durante o tempo em que:
a) Por força da lei a execução não pode começar ou não pode continuar a ter lugar;
b) A execução foi interrompida;
c) Foram concedidas facilidades de pagamento.”
Por sua vez, nos termos do artigo 30.°-A, com a epígrafe “Interrupção da prescrição da coima”:
“1- A prescrição da coima interrompe-se com a sua execução.
2- A prescrição da coima ocorre quando desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade. ”.
Consagra-se no citado n.° 2 do artigo 30.°-A, do RGCO um termo absoluto para a prescrição da coima (à semelhança do que se estabelece no artigo 126.°, n.° 3, do Código Penal, para a prescrição da pena). Assim, descontado o período de suspensão da prescrição que eventualmente se tiver verificado, a prescrição ocorrerá sempre que tiverem decorrido sete anos e meio sobre a data do trânsito em julgado da decisão de aplicação da coima (cfr. Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, ob. cit., pág. 335).
Seguindo a jurisprudência dos nossos tribunais superiores, sublinha-se que a instauração do processo de execução fiscal para cobrança coerciva de coimas não constitui facto interruptivo da prescrição da execução das coimas previsto no n.° 1 do artigo 30.°-A do RGCO.
Como se afirma a este propósito o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17.06.2015 (processo n.° 0334/14), estamos perante “norma de teor idêntico à prevista na alínea a) do n.° 1 do artigo 126.° do Código Penal e em relação à qual, no que à prescrição da pena de multa respeita, o Supremo Tribunal de Justiça fixou jurisprudência no sentido de que: A mera instauração pelo Ministério Público de execução patrimonial contra o condenado em pena de multa, para obtenção do respectivo pagamento, não constitui a causa de interrupção da prescrição da pena prevista no artigo 126°, n° 1, alínea a), do Código Penal (cfr. Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.° 2/2012, de 8 de Março de 2012, DR, n.° 73, I Série, 12-4-2012, p. 1862 ss.) (...)
Ora, o entendimento firmado pelo STJ no que à execução da pena de multa respeita, pode e deve ser transposto para a execução da coima, pois que, como se afirmou no acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 5 de Fevereiro de 2013, proa. n.° 2TAELV.E1 não se descortina razão alguma para, no que à prescrição da coima diz respeito, se decidir em sentido diverso. Mal se compreenderia que, em matéria de contra-ordenações, o legislador afirmasse uma vontade de perseguição sancionatória superior à que reserva para a pena de multa, sanção reservada à prática de crimes. Daí que, como decidido e contrariamente ao alegado pelo recorrente, se deve entender que a instauração do processo de execução fiscal não constitui “execução da coima” para efeitos do disposto no n.° 1 do artigo 30.°-A do RGCO, antes consubstancia a prática de um acto inserido numa determinada actividade processual que visa tal execução mas que não a consubstancia, daí que não tenha efeito interruptivo da prescrição.”.
Por outro lado, a simples instauração do processo executivo visando a cobrança coerciva da coima não reveste virtualidade, por si só, para constituir uma causa de suspensão da prescrição, dado não constar do elenco das medidas suspensivas previstas no artigo 30.° do RGCO [neste sentido, vejam-se os acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 27.09.2011 (processo n.° 02970/09), de 10.04.2014 (processo n.° 07467 /14), e de 04.06.2015 (processo n.° 08614/15)].
Passando para a aplicação do regime legal exposto, começa-se por referir que, não se verificando qualquer causa de interrupção nos autos até ao momento em que se completou o prazo geral de prescrição de 5 anos, então é esse o prazo a aplicar, porquanto o prazo previsto no n.° 2 do artigo 30.°-A do RGCO (prazo da prescrição acrescido de metade) apenas se aplica quando ocorrem causas de interrupção no decurso do prazo geral de prescrição, pois a finalidade daquela norma é a de limitar o prazo de prescrição àquele máximo nos casos em que as causas interruptivas, no decurso do prazo geral de prescrição, dilatam esse prazo que recomeça a contar de cada vez que se verifica uma causa interruptiva.
Atento o disposto no artigo 80.°, n.° 1, do RGIT, a decisão é recorrível no prazo de 20 dias após a sua notificação.
Face aos elementos constantes dos autos, as decisões de aplicação das coimas em causa nos autos (em cobrança nos processos de execução n.°s 422….. e 422……) ter-se-ão tornado definitivas em Junho de 2005, tendo os respectivos processos de execução sido instaurados em 20 de Dezembro de 2005.
Assim, tendo-se tornado definitivas as decisões de aplicação de coima em Junho de 2005, a coima prescreveu em Junho de 2010.
De resto, ainda que se entendesse que a instauração da execução (no caso em apreciação, em 20 de Dezembro de 2005) tem efeito interruptivo, ainda assim, como é bom de ver, a prescrição já teria ocorrido (em 20 de Dezembro de 2010).
Face ao exposto, decorre que se encontram prescritas as coimas que integram parte da dívida exequenda, devendo, assim, proceder o pedido nesta parte.”

Sublinhe-se ainda que o supra referido de que não constitui facto suspensivo do prazo de prescrição a declaração de falência e a remessa dos autos executivos àquele processo na vigência do CPEREF, também se aplica às dívidas exequendas de coimas nos termos dos artºs 30º e 30º-A, nº2, do R.G.C.O.

Por conseguinte, as dívidas de coimas encontram-se efetivamente prescritas, sendo de confirmar a sentença recorrida nesta parte.

A recorrente Fazenda Pública também não aceita a decisão de prescrição parcial da dívida porque entende que a citação do Oponente que não foi considerada pela sentença recorrida, e devia sê-lo face à matéria de facto das alíneas I) e J) (cf. conclusão 8 e 15 das alegações de recurso). Por sua vez, os recorrentes Oponentes também não se conformam com a parte da sentença que lhes é desfavorável, considerando que a dívida se encontra prescrita, considerando que foram citados depois de 5 anos da data da liquidação (em 07/09/2009) e, por conseguinte, nos termos do art. 48.º, n.º 3, da LGT a interrupção do prazo de prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos relativamente aos Oponentes, tendo já decorrido o prazo de prescrição de 8 anos previsto no n.º 1, do art. 48.º da LGT.

Vejamos, então, relativamente a todas as dívidas de impostos, nomeadamente, dívidas de IVA do período de 2000/06T, 2000/09T e 2001/06T a 2001/12T, IRC dos exercícios de 2001 e 2002.

Vigorava, à época da constituição das dívidas, a Lei Geral Tributária (LGT) que estabelece o prazo de prescrição de 8 anos (art. 48.º, n.º 1) regime que foi corretamente considerado e aplicado ao caso dos autos na sentença recorrida:

“Quanto às dívidas de IVA e IRC, considerando os períodos a que respeitam, o regime prescricional das dívidas tributárias que estava em vigor era o que constava do artigo 48. ° da LGT.
A LGT - entrada em vigor em 01.01.1999, por força do artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 398/98, de 17 de Dezembro - disponha na sua redacção inicial o seguinte:
“1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu.
2 - As causas de suspensão ou interrupção da prescrição aproveitam igualmente ao devedor principal e aos responsáveis solidários ou subsidiários.
3 - A interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efectuada após o 5° ano posterior ao da liquidação.”.
Por sua vez, o artigo 49.° da LGT - que dispõe sobre a suspensão e interrupção do prazo de prescrição na sua redacção inicial, estabelecia que:
“1 - A reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.
2 - A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
3 - O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento ou prestação legalmente autorizada, ou de reclamação, impugnação ou recurso”.
A Lei n.° 100/99, de 26 de Junho, procedeu à alteração do n.° 1, passando a prever a citação para a execução como nova causa de interrupção da prescrição, dando-lhe, assim, a seguinte redacção:
“1 - A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição”.

Posteriormente, a Lei n.° 55-B/2004, de 30 de Dezembro, alterou o n.° 1 daquele artigo 48.° da LGT, o qual ficou com a redacção seguinte:
“1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano ci vil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.”

A Lei n.° 53.°-A/2006, de 29 de Dezembro, veio alterar o citado artigo 49.° da LGT, passando a redacção desse preceito a prescrever o seguinte:
“1 - A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.
2 - Revogado.
3 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.
4 - O prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida.”
Feito este enquadramento legal, será agora de proceder à sua aplicação ao caso concreto, tendo em atenção que, como tem sido entendimento dominante do Supremo Tribunal Administrativo, aos factos interruptivos/suspensivos do prazo prescricional aplicam-se as normas que vigorarem no momento da ocorrência de tais factos - cfr., entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 06.04.2011 (processo n.° 0234/11) e de 28.03.2012 (processo n.° 02 13/12).
Começando por estabelecer o termo inicial da contagem do prazo de prescrição, nos termos do n.° 1 do artigo 48.° da LGT, o prazo de prescrição começa a contar- se, quanto ao IRC, enquanto imposto periódico, no início do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, sendo que, quanto ao IVA, ainda que seja um imposto de obrigação única, a contagem do prazo de prescrição relativamente ao mesmo inicia-se a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto - dado que é de aplicação imediata a alteração dada ao n.° 1 do artigo 48.° da LGT pelo artigo 40.° da Lei n.° 55-B/2004 (veja-se acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 08.02.2012, processo n.° 033/ 12).
Assim, quanto ao IVA dos períodos de 2000/06T e 2000/09T, a contagem do prazo de prescrição inicia-se em 01.01.2001, enquanto, relativamente ao IVA dos períodos de 2001/06T a 2001/12T e ao IRC do exercício de 2001, inicia-se em 01.01.2002, e quanto ao IRC do exercício 2002, inicia-se em 01.01.2003.
Assim, na ausência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição, esta ocorreria em 31.12.2008 quanto ao IVA dos períodos de 2000/06T e 2000/09T, em 31.12.2009 quanto ao IVA dos períodos de 2001 /06T a 2001/ 12T e ao IRC do exercício de 2001, e em 31.12.2010 quanto ao IRC do exercício 2002.”

Portanto, como bem se entendeu na sentença recorrida, com base nas normas jurídicas supra enunciadas, são as seguintes as datas do início do prazo de prescrição e termo do mesmo se não ocorresse qualquer causa de suspensão ou interrupção:

_ IVA de 2000/06T e 2000/09T – início em 01/01/2001, término a 31/12/2008;
_ IVA de 2001/06T a 2001/12T e IRC de 2001 – início em 01/01/2002, e término a 31/12/2009;
_ IRC de 2002 – início em 01/01/2003 e término a 31/12/2010.

No que diz respeito a causas suspensivas, não se verificam no caso dos autos, tal como suprarreferido.

No que diz respeito às causas interruptivas importa ter em consideração a citação dos Oponentes que ocorreu em 07/09/2009 (cf. ponto I e J) dos factos provados), e, portanto, como bem se refere na sentença recorrida, este é o único facto interruptivo que ocorreu, e assim sendo, no caso dos autos o disposto do n.º 3, do art. 48.º da LGT não tem aplicabilidade, porque não se verifica a ocorrência de qualquer efeito interruptivo em relação ao devedor originário.

Na verdade, relativamente à aplicação daquele preceito legal o acórdão do Pleno do STA de 15/06/2016, proc. n.º 01102/14 sumariou o seguinte:
“I - Se o responsável subsidiário só veio a ser citado para a execução depois do 5º ano posterior ao da liquidação, por atenção ao disposto no nº 3 do citado art. 48º da LGT, o efeito interruptivo derivado da instauração de execuções contra a sociedade originariamente executada não produz efeitos quanto a si. II - Isto, sem prejuízo do efeito interruptivo resultante da sua própria citação, enquanto revertido, se esta ocorrer antes do termo do 8° ou 10º ano (conforme seja de aplicar um ou outro prazo de prescrição) a contar do início do prazo de prescrição. III - A citação do responsável subsidiário, se for o primeiro facto interruptivo ocorrido na vigência da Lei nº 53-A/2006, 29/12 (que introduziu a actual redacção ao nº 3 do art. 49° da LGT), interrompe o prazo que, relativamente a ele, ainda estiver em curso.” (sublinhado nosso)

Portanto, em suma, a citação dos Oponentes em 07/09/2009 interrompe o prazo de prescrição que ainda não se tenha completado, como sucede no caso dos autos.

Assim sendo, e tendo em consideração que o término dos prazos de prescrição supra enunciados, temos então que apenas relativamente ao IVA de 2000/06T e 2000/09T, é que o prazo de prescrição de 8 anos terminou antes da ocorrência do facto interruptivo (citação em 07/09/2009), ou seja se completou 31/12/2008.

Portanto, tal como se entendeu na sentença recorrida, relativamente a estas dívidas se completou o prazo de prescrição, não enfermando a sentença, nesta parte, do erro de julgamento de facto e de direito que lhe é imputada pela Fazenda Pública, porque a citação dos Oponente ocorreu em momento posterior àquele em que se completou o prazo de prescrição. Assim, essa dívida se encontra, efetivamente, prescrita, improcedendo os fundamentos de recurso da Fazenda Pública.

Relativamente a todas as demais dívidas de imposto, a situação é diversa, porque a citação ocorreu em momento anterior ao término desse prazo.

Interrompido o prazo de prescrição pela citação fica inutilizado todo prazo decorrido anteriormente (art. 326.º, n.º 1 do Código Civil) sendo que o novo prazo de prescrição de 8 anos previsto no n.º 1 do art. 48.º da LGT não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (art. 327.º, n.º 1 do Código Civil).

Sobre esta questão em particular é esclarecedor o que escreve Jorge Lopes de Sousa a este respeito: “A interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para a prescrição de todo o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único efeito próprio da interrupção, presente em todas as situações (art. 326.º, n.º 1 do CC).
Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (art. 327.º, n.º 1 do CC).(…)
Nas leis tributárias prevêem-se factos a que é atribuído efeito interruptivo da obrigação tributária, pelo que não há que fazer apelo às normas do CC, no que concerne a determinar os factos interruptivos.
Porém, os efeitos da interrupção da prescrição não estão completamente regulados, pelo que há que aplicar subsidiariamente o regime do Código Civil.” (cf. Jorge Lopes de Sousa, Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2008, pp. 51-52) – sublinhado nosso.

E relativamente à citação, escreve ainda Jorge Lopes de Sousa que “No que concerne à citação, não estando previsto um regime especial sobre os seus efeitos, seria de lhe atribuir os que lhe reconhece o CC, subsidiariamente aplicável por força do art. 2.º, alínea d), da LGT. Esse efeito é não só instantâneo de inutilizar o tempo decorrido, mas também o efeito duradouro de obstar ao decurso do prazo de prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo em que a citação é levada a cabo (arts. 326.º, n.º 1 e 327.º, n.º 1 do CC) (cf. Jorge Lopes de Sousa, Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2008, pp. 62) – sublinhado nosso.

Ou seja, no que diz respeito à determinação dos factos interruptivos, não há que aplicar supletivamente as normas do Código Civil, porquanto as leis tributárias preveem quais os factos a que é atribuído o efeito interruptivo, mas já quanto aos efeitos da interrupção da prescrição, essa aplicação subsidiária é necessária, pois, estes não se encontram regulados nas leis tributárias.

Deste modo, são aplicáveis ao processo tributário as normas do Código Civil que regulam os efeitos da interrupção da prescrição, designadamente o disposto no art. 327.º, n.º 1, que dispõe que nos casos aí previstos, nos quais se inclui a citação, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.

Esta tem sido a posição reiterada do Supremo Tribunal Administrativo - cf. Ac. do STA de 19/09/2012, proc. n.º 0883/12, Ac. do STA de 20/05/2015, proc. n.º 01500/14, e mais recentemente, acórdão do STA de 02/09/2020, proc. n.º 0705/19.2BELLE e jurisprudência aí citada).

Efetivamente, como se escreveu recentemente no acórdão do STA de 02/09/2020, proc. n.º 0705/19.2BELLE:

“I - A jurisprudência reconhece à interrupção da prescrição decorrente da citação do executado (n.º 1 do art. 49.º da LGT) um duplo efeito: a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do art. 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do art. 327.º do CC). II - O reconhecimento desse efeito duradouro não viola os princípios constitucionais da legalidade, da certeza e da segurança jurídicas nem as garantias dos contribuintes.”

Em suma, in casu, relativamente às demais dívidas de imposto, a interrupção decorrente da citação do executado inutiliza todo o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo e obsta ao início da contagem do novo prazo enquanto o processo executivo não findar, pelo que, também nesta parte é de confirmar a sentença recorrida, improcedendo todos os fundamentos do recurso dos Oponentes.

Em suma, improcedem ambos os recursos interpostos da sentença recorrida, que é de ser confirmada in totum.

Em matéria de custas o artigo 527.º do CPC consagra o princípio da causalidade, de acordo com o qual paga custas a parte que lhes deu causa. Vencidas na presente causa ambas as recorrentes nos seus respetivos recursos, ambas deram causa às custas do presente processo (n.º 2), e, portanto, devem ser condenadas nas respetivas custas (n.º 1, 1.ª parte).

Sumário (art. 663.º, n.º 7 do CPC)

A jurisprudência reconhece à interrupção da prescrição decorrente da citação do executado (n.º 1 do art. 49.º da LGT) um duplo efeito: a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do art. 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do art. 327.º do CC).

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso a ambos os recursos, mantendo-se a decisão recorrida.
****
Custas por ambas as recorrentes.
D.n.
Lisboa, 22 de outubro de 2020.

A Juíza Desembargadora Relatora

Cristina Flora


A Juíza Desembargadora Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo art. 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Juízes Desembargadores Tânia Meireles da Cunha e António Patkoczy.