Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:9814/16.9BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:01/14/2020
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:IMPOSTO SOBRE SUCESSÕES E DOAÇÕES (ISSD),
PARTILHA,
TRANSMISSÃO REAL DE BENS.
Sumário:I. O imposto sobre sucessões e doações (ISSD) apenas incide sobre as transmissões gratuitas que sejam reais e efectivas de bens móveis e imóveis, e nessa medida, a determinação da matéria colectável é liquidada pelo valor dos bens transmitidos (art. 20.º e ss do CIMSISD);

II. No caso, como no dos autos, em que do acervo hereditário que foi concretamente objecto de partilha homologada por sentença judicial, do qual não fazem parte as verbas relativas à quota societária e suprimentos, então, essas verbas não podem fazer parte da matéria tributável em sede de ISSD, uma vez que não originaram na esfera jurídica dos herdeiros um enriquecimento do seu património, e assim sendo, não ocorreu a transmissão real e efectiva de bens nos termos e para efeitos do art. 1.º e 3.º corpo do artigo e §1.º do CIMSISD.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA, com os demais sinais nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial apresentada por I....... e P....... das liquidações relativas ao Imposto Sucessório datadas de 2001, no montante de € 6.149,93 e € 6.529,85.

A Recorrente, apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:
«CONCLUSÕES:
I - Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, ora recorrida, julgou procedente a impugnação à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, porquanto decidiu que o valor da quota e os suprimentos não só não faziam parte do acervo hereditário como não tinham qualquer valor económico, em virtude da falência da sociedade e da incobrabilidade dos créditos I suprimentos apurados, por isso, tais bens não originaram na esfera jurídica dos herdeiros um enriquecimento do seu património e não o tendo havido não se pode considerar que tenha ocorrido a transmissão real e efectiva de bens, nos termos do art.ºs 1.º, 3.º e 20.º do CIMSISD, requisito cujo preenchimento constitui conditio sine qua non para a Administração Tributária iniciar o processo de determinação do valor dos bens transmitidos e proceder à liquidação do imposto sucessório.
Na douta sentença do Tribunal a quo foi considerado que a posição da Administração Tributária não colhia porque não logrou demonstrar se tinha ou não ocorrido a transmissão real e efectiva dos bens em apreciação.
O que implica a inexistência parcial do facto tributário e determina que os actos de liquidação de imposto sucessório objecto da presente impugnação sejam anulados, na parte resultante do excesso de matéria tributável considerada, referente aos valores da quota societária e dos suprimentos, nos termos e para os efeitos do disposto nos art.s 1.º, 3.º e 20.º do CIMSISD
II - Salvo o devido respeito, face ao probatório supra não se poderá subsumir o que o Tribunal a quo considerou uma vez que, não se pode fazer tábua rasa da herança e os impugnantes aceitaram a herança, com todos os activos e os passivos, não podendo excluir as verbas do passivo porque não têm existência face à declaração de falência da sociedade S........
III - Neste pendor, o thema decidendum, assenta em saber se, pelo facto de os impugnantes terem recusado as verbas n.º 1e 2 constantes do mapa de partilha, ou seja, os impugnantes são herdeiros mas como a sociedade S....... tem créditos incobráveis, os quais ficaram elencados no processo de falência, aqueles afastaram aquelas verbas por não se traduzirem em qualquer existência, recusando-as na partilha e, se mesmo assim, sem ter renunciado ou repudiado à herança a Administração Tributária poderia, em reforma de liquidação, anular a liquidação não considerando nem avaliando a sociedade nem os suprimentos.
IV - O imposto sucessório incide sobre as transmissões a título gratuito quer sejam bens móveis ou imóveis, considerando-se transmissão a transferência real e efectiva dos bens, nos termos dos art.º 1.º e §1 e corpo do art.º 3.º, ambos do Código do Imposto Municipal da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, doravante CIMSSID.
V - Sendo um imposto sobre as sucessões e doações trata-se de um imposto sobre o património, podendo concluir-se que tal imposto tem por base tributável bens patrimoniais, ou seja, constituem património de uma pessoa.
VI - O património é em sentido amplo o conjunto de direitos e deveres avaliáveis em dinheiro pertencentes em certo momento a um titular, sendo o momento da transmissão o da abertura da sucessão, nos termos do art.º 2031.º do Código Civil, doravante CC, isto é, no momento da morte do seu autor e no lugar do último domicílio deles, art.º 10.º do CIMSSID.
VII - O valor base para a liquidação do imposto é aquele que os bens tiverem à data da respectiva transmissão, nos termos da conjugação do disposto no corpo dos art.ºs 20.º e 30.º do CIMSSID, sendo este o princípio geral insuficiente quando se trata de concretizar qual o enriquecimento real e efectivo do património da adquirente.
VIII - Na transmissão de quotas determinadas o valor a considerar para a transmissão das quotas ou partes sociais é o valor do último balanço anterior à transmissão.
Quanto ao balanço a impugnante mencionou ao Chefe do Serviço de Finanças que o mesmo era inexistente bem como os documentos de suporte contabilístico.
IX - Na verdade, M....... enquanto responsável subsidiário da sociedade S....... não entregava as mod. 22 de 1995 e 1996, pelo que os elementos contabilísticos de que a Autoridade Tributária disponha diziam respeito ao exercício de 1994.
X - E, nos termos do art.º 69.º al. e) do CIMSSID, quando não existe balanço relativo àquele exercício, apresentar-se-á um inventário adrede organizado, com os valores dos activos e do passivo, com vista a justificar o valor indicado.
XI - Porém, apesar de não ter sido cumprido nenhum dos condicionalismos anteriores, foi cumprido o estabelecido no art.º 77.º do CIMSSID, tendo sido nas regras 3.º e 4.º do § 3 do art.º 20.º do CIMSSID, apurado o valor de 14.021.365$00, que corresponde ao valor de parte do património transmitido e respeitante à quota da sociedade e ainda foi apurado o crédito no montante de 9.291.000$00, apurado por cálculo efectuado com base na proporcionalidade do capital, que por se tratar de um bem do activo, constituía um direito a receber do autor da herança.
XII - Para Pinto Fernandes, E e Nuno, na anotação 2.1 ao art.º 20.º do CIMSSID referem que "quando o passivo dum estabelecimento comercial ou industria/ exceder o valor do activo, o estabelecimento não tem o valor de zero, porque não é um objecto material deteriorado, mas sim valor negativo, como universalidade que compreende tanto os elementos activos como os passivos. Em processo de liquidação do imposto, o passivo do estabelecimento deixado por comerciante em nome individual, que respondia por ele, deve entrar em linha de conta, a par do activo, para o cálculo da matéria colectável, através daquele valor negativo, quando existir, tal como acontece com o valor que for positivo." (Acórdão ín Bol. N.º 89, pág. 288).- vide, Pinto Fernandes, E e Pinto Fernandes, Nuno, Código do Imposto Municipal da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, Anotado e Comentado, 4.ª Edição, Rei dos Livros, 1997, pp 345
XIII - A impugnante entregou a relação de bens no Serviço de Finanças de Lisboa, em Junho de 1997 e nessa constam a quota da sociedade bem como os suprimentos, tendo-o feito na qualidade de herdeira.
Posteriormente, em partilha judicial tornou a elencar quer a quota da sociedade bem como os suprimentos, tendo-os afastado com o argumento de que as mesmas não têm existência, face à falência declarada da firma S.... - S......., Lda.
XIV - Aqui chegados, poderia a impugnante, pelo facto de ter sido decretada a falência da sociedade S......., afastar as verbas n.º 1 e 2 da partilha, as quais correspondem quer à quota da sociedade S....... bem como aos suprimentos se, ainda assim as mesmas teriam de ser tributadas.
XV - A Fazenda alega que sim porquanto temos duas situações distintas, uma as dividas que a sociedade tinha, em que perante tal factualidade a impugnante requereu a falência e, a outra, a qualidade da impugnante, ou seja, a impugnante não repudiou nem renunciou à herança e, na qualidade de herdeira tanto herda o passivo como o activo.
XVI - E, se herda o activo e o passivo da herança, então herda a sociedade tanto com os activos como os passivos, daí não ser possível distinguir e afastar, em sede de partilha que as verbas 1 e 2, as quais-dizem respeito às dívidas de terceiros perante a sociedade e sua incobrabilidade e aos suprimentos, não podem os mesmos não serem considerados pra efeitos de imposto sucessório.
XVII - Quanto a este aspecto, a Fazenda dirá que, independentemente da impugnante ter afastado no mapa de partilha as verbas 1 e 2, não o poderá fazer quanto à liquidação de imposto sucessório uma vez que não renunciou à herança nem a repudiou, pelo que resultando da lei que o valor atribuído, para efeitos de partilha, será o do último balanço e não tendo sido este contrariado nem os valores constantes na Mod. 22 de 1994 que lhe serviu de base, será este o relevante para efeitos da liquidação de imposto sucessório, pelo que a liquidação emitida não padece do vicio assacado na sentença do Tribunal a quo, devendo a liquidação manter-se na ordem jurídica.
XVIII - Nos termos expostos, não padece a liquidação de imposto sucessório do vício assacado pelo Tribunal a quo, devendo a mesma manter-se na ordem jurídica, devendo ser revogada a douta sentença por outra.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a Impugnação improcedente, com as devidas consequências legais.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA»

Os Recorridos, apresentaram as suas contra-alegações, e formularam as seguintes conclusões:
«CONCLUSÕES
A. Vem a Recorrente nas suas alegações, repetindo nas suas conclusões, invocar que a sentença recorrida não teve em consideração que os ora Recorridos, ao não terem renunciado ou repudiado a herança, aceitaram-na com todos os seus ativos e passivos. Consequentemente, não poderiam excluir as verbas 1e 2 do mapa de partilha passivo (por não terem existência em face da declaração de falência da sociedade S.......) da liquidação do imposto sucessório, e, resultando da legislação ao tempo vigente que o "valor atribuído, para efeitos de partilha, será o do último balanço e não tendo sido este contrariado nem os valores constantes da Mod. 22 de 1994 que lhe serviu de base, será este o relevante para efeitos da liquidação de imposto sucessório, pelo que a liquidação emitida não padece do vício assacado na sentença do Tribunal a quo, devendo a liquidação manter-se na ordem jurídica.
B. De referir que, nas suas conclusões a Recorrente não especifica as normas jurídicas e/ou princípios que considera que sentença recorrida violou. Deveres estes que impediam sobre a Recorrente, atento o preceituado nos n°s 2 do artigo 639.º do CPC.
C. Entendem os Recorridos que a sentença em causa não padece de nenhum erro de julgamento, nem de outro qualquer outro vício, apontado pela Recorrente;
D. Por ofícios n.ºs 1….. e 1….. da Repartição de Finanças do antigo 8º Bairro Fiscal de Lisboa, datados de 17 de Agosto de 2001, foram os Recorridos notificados da liquidação do imposto sucessório por falecimento do seu pai M……., com a liquidação de imposto sucessório no valor a pagar de € 6.149,92 (no contravalor em escudos de Esc. 1.232.948$00) e de € 6.529,84 (no contravalor em escudos de Esc. 1.309.115$00). Estes atos de liquidação de imposto sucessório resultam da liquidação e incidência de imposto sobre a quota da falida S....... – S…, Lda., que a Administração fiscal oficiosamente avaliou em Esc. 14.021.365$00, acrescida de Esc. 9.291.000$00 relativo a suprimentos efetuados pelo falecido sócio, considerando a AT que se tratava de um ativo e de um direito de crédito do autor da herança.
E. O imposto sobre as sucessões e doações incide sobre as transmissões, a título gratuito, de quaisquer bens móveis ou imóveis, considerando-se transmissão, para este efeito, a transferência real e efetiva dos bens (cfr. artigos 1º e 3º corpo do artigo e § 1° do CIMSISD). Ou seja, em termos de incidência fiscal, o imposto sobre as sucessões e doações apenas incide sobre as transmissões gratuitas, reais e efetivas, de bens móveis e imóveis, sendo que, na determinação da matéria coletável, o imposto sobre as sucessões e doações apenas será liquidado pelo valor dos bens transmitidos (cfr. artigo 20º e ss. do CMSISD);
F. Isto significa que, para efeitos de tributação do imposto sobre as sucessões e doações, é imperativo que os bens transmitidos por sucessão mortis causa estejam na posse dos herdeiros e que, simultaneamente, originem um enriquecimento do património daqueles, pois aquele imposto visa tributar "o valor da riqueza auferida por aquele a quem sejam transmitidos bens sem qualquer contra-prestação" . Só perante estes pressupostos é que existe facto tributário, à luz das normas e princípios vigentes do CMSISD;
G. Resulta da factualidade assente que, por força da sentença que declarou a falência e fixou a data para extinção da sociedade (i.e. à data do óbito do autor da herança), extinguiu-se a quota societária (por força da falência e extinção da sociedade), pelo que não existia quota ou participação societária transmitida aos herdeiros (muito menos uma transmissão real e efetiva, como é exigido pelos artigos 10 e 30 do CIMSISD, para sujeitar tal transmissão a liquidação de imposto sucessório);
H. Ficou igualmente provado que, por força do passivo da sobredita sociedade, passivo esse reconhecido e fixado por sentença transitado em julgado (sentença de verificação e graduação de créditos), nenhum crédito do autor da herança (ou sequer dos demais credores da falida, que não credores privilegiados), foi ressarcido com o produto da massa falida, ficando ali fixado que o crédito relativo aos suprimentos do sócio falecido -autor da herança - não seria objeto de qualquer pagamento;
I. Resulta da factualidade assente que, os aqui Recorridos procederam a inventário judicial e nesse inventário para determinação e partilha dos bens da herança (nos termos do nº 1 do artigo 2052.º do Código Civil), foi daquela excluída a quota da Sociedade S......., Lda. e o crédito emergente dos suprimentos, por força do mapa de partilha devidamente aprovado e homologado judicialmente;
J. Perante a matéria de facto julgada provada é inequívoco que, como bem decidiu o Tribunal a quo "a herança aberta por óbito de M....... nada recebeu quer relativamente à quota societária, quer quanto aos suprimentos" ;
K. É assim evidente que não existe facto tributário, como bem decidiu o Tribunal a quo, pois, repita-se, por força do inventário judicial nem existe qualquer transferência de quotas da sociedade comercial e do crédito emergente dos suprimentos do autor da herança para a esfera jurídica e património dos herdeiros, aqui Recorridos;
L. Esquece-se a Recorrente que, nos termos do nº 1 do artigo 2052.º, do Código Civil "a herança pode ser aceita pura e simplesmente ou a benefício de inventário", ou seja, existem duas espécies de aceitação da herança. os aqui Recorridos optaram pela aceitação da herança a benefício de inventário, pelos motivos igualmente constantes da matéria de facto fixada, não aceitando assim a herança "com todos os seus activos e os passivos" como erroneamente alega a Recorrente;
M. Como as verbas relativas à quota da sociedade e o crédito emergente dos suprimentos prestados pelo autor da herança não integraram o acervo hereditário (por força do processo de inventário judicial), não se verificou assim qualquer enriquecimento real e efetivo do património dos herdeiros, aqui Recorridos, ao contrário do (erradamente) alegado pela Recorrente, não podendo aqueles bens serem englobados na matéria tributável para efeitos de tributação de imposto sobre as sucessões e doações. Não fazendo assim qualquer sentido, a Recorrente apelar ao "ultimo balanço" da sociedade supra mencionada para efeitos de determinação da matéria tributável, por que, repita-se inexiste qualquer facto tributário, ou seja, não há matéria coletável;
N. Ainda que assim não se entenda, o que não se admite, ou seja, ainda que se considere que tenha existido uma transmissão de quotas da sociedade supra, a verdade é que, por força da declaração de falência da sociedade e da sentença da verificação e graduação de créditos, quer a transferência da quota, quer o direito ao crédito emergentes dos suprimentos supra, não têm qualquer valor económico (a não ser negativo), suscetível de tributação, não podendo a AT em sede de determinação da matéria coletável apurar um valor diferente do que resultou fixado judicialmente, ao contrário do alegado pela Recorrente, em conformidade com o disposto no § 3 do artigo 20.º do CIMSISD. Tanto mais que os aqui Recorridos sempre contestaram tais valores em termos de procedimento tributário;
O. Consequentemente, sendo tais valores nulos (pois a herança nada recebeu dos suprimentos e a quota nada valia), não se verificou qualquer transferência efetiva de riqueza para a esfera jurídica dos herdeiros, aqui Recorridos, inexistindo facto tributário;
P. Por tudo o exposto, a sentença recorrida não padece dos erros de julgamento. Pelo que, bem andou o tribunal a quo ao decidir julgar procedente a impugnação, anulando-se parcialmente as liquidações impugnadas.

TERMOS EM QUE, com o sempre mui suprimento de V. Exas. deverá o recurso ser julgado improcedente, mantendo-se a douta decisão, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA.»
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Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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A questão invocada pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir consiste em aferir se a sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito, aferindo se por força da falência decretada, os Impugnantes poderiam ter recusado as verbas n.ºs 1 e 2 constantes do mapa de partilha (quota da sociedade e suprimentos), sem ter renunciado ou repudiado à herança.

II. FUNDAMENTAÇÃO


A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
«Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos constantes dos autos:
A) Em 9 de Abril de 1997, foi instaurado o processo de liquidação de imposto sobre as sucessões e doações nº 2678, por óbito de M…….., falecido em 25 de Janeiro de 1997, tendo-lhe sucedido os seus filhos, ora impugnantes (cfr. fls. 2 a 6 do processo de liquidação de imposto apenso);
B) Em 8 de Junho de 1997, foi apresentado pela 1a impugnante, I……, o instrumento DGCI Mod. 21 - D/3, intitulado "Termo de apresentação da relação de bens'', do qual se extrai o seguinte: "(...) nesta Repartição de Finanças de Lisboa - 8° Bº , compareceu I......., na qualidade de cabeça de casal e disse que a transmissão de M….., domiciliado em Lisboa, constante do processo de liquidação nº 2……, se compõe dos bens que constam da relação junta, escrita em uma folha, devidamente autenticada, compreendendo seis verbas de activo e duas de passivo e da qual consta que não se procede a inventário" (cfr. fls. 7 do processo de liquidação de imposto apenso);
C) Com data de 9 de Junho de 1997, foi apresentado pela 1a. impugnante o instrumento intitulado "Relação de Bens que ficaram por óbito de M……..", do que se extrai o seguinte:
"(...)
I. BENS MÓVEIS
1. (...)
2. Uma quota na Sociedade S....... – S….. Lda., no valor de 13 500 000$00, contribuinte n° 5……, com sede registada na Praça Dr…….., nº 10, Freguesia S. …….. em Lisboa, mas com instalações de facto na Rua da Junqueira, nº 1, 2° Dto., 1300- Lisboa (...).
(...)
III. DIVERSOS
· Procede-se a inventário facultativo o qual corre termos desde 31 de Março de 1997, Processo nº 2232/ 97, no 2° Juízo, 2ª secção do Tribunal Civil de Lisboa" (cfr. fls. 8 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
D) Pelo ofício n° 8….., da Repartição de Finanças do Concelho de Lisboa 8° Bairro Fiscal, recepcionado em 20 de Outubro de 1997, foi dado conhecimento à impugnante do seguinte:
''Fica V. Exa. notificado, na qualidade de cabeça de casal no Proc. supra referenciado, instaurado por óbito de M……., ocorrido em 25/01/ 97, para no prazo de 15 (quinze) dias, contados a partir da data da assinatura do Aviso de Recepção, vir junto desta Repartição identificar correctamente a(s) verbas(s) 5 - quota da soe. S....... sem o que o Proc. será liquidado sem levar em conta a(s) referida(s) verba(s). Apresentar balanço do ano anterior ao óbito, em duplicado e reconhecido pelo notário" (cfr. fls. 25 e 26 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
E) Por carta datada de 20 de Outubro de 1997, dirigida ao Chefe de Repartição de Finanças do 8° Bairro Fiscal de Lisboa, foi comunicado pela la. impugnante o seguinte:
"Acusoa recepção da notificação n° 8912 sobre o processo em epígrafe.
Em relação ao mesmo cumpre-me informar V. Exa. de que não posso apresentar o balanço da empresa S....... por o mesmo não existir.
Efectivamente após o óbito do meu pai, verifiquei que não existiam na empresa elementos contabilísticos que permitissem a elaboração do referido balanço.
Nestes termos e dada a situação em que encontrei a empresa em questão requeri a falência da mesma tendo já sido decretada conforme despacho do Tribunal Civil da Comarca de Lisboa, 2° Juízo - 2ª secção, estando já a decorrer o respectivo processo de liquidação. (...)" (cfr. fls. 27 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
F) O Chefe de Repartição de Finanças do 8° Bairro Fiscal de Lisboa remeteu ao Director Distrital de Finanças de Lisboa - Divisão de Inspecção Tributária, o ofício n° 9177, de 14 de Outubro de 1998, com vista "(...) a enviar a V. Exa. uma quota para avaliar de S....... – S……. Lda, (...)" (cfr. fls. 34 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
G) O Director Distrital de Finanças de Lisboa da Divisão de Inspecção Tributária remeteu ao Chefe de Repartição de Finanças do 8° Bairro Fiscal de Lisboa o ofício nº 1343, datado de 21 de Janeiro de 1999, o qual contém a "informação de que trata o art.º 77° do Código de Imposto Municipal da Sisa e Imposto sobre as Sucessões e Doações, respeitante à determinação do valor da participação que o falecido/a possuía na firma S....... – S…… Lda. relacionada no processo de Imposto Sucessório nº 2678, instaurado nesses Serviços" (cfr. fls. 34 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
H) Consta da Informação mencionada no ofício referido na alínea antecedente o seguinte:
"(...)
4. Avaliação da participação transmitida
Valor nominal.......................................................................13.500.000$00
Valor atribuído provisório/definitivo....................................14.021.365$00
A contabilidade revela ainda a existência dum saldo devedor/ credor a adicionar /subtrair ao valor da herança .............................. 14.151.152$00
(...)" (cfr. fls. 40 a 47 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
I) Pelos ofícios n°s 3….. e 3….., de 1de Março de 1999, foi dado conhecimento à 1a impugnante e ao 20, impugnante, respectivamente, "da liquidação a que se procedeu no processo em referência, no qual figura como herdeiro:
Valores que serviram de base à liquidação:
Bens móveis: Esc. 15 601 529$93; Bens imóveis: Esc. 48$82;
Total: Esc. 15 601 578$75
IMPOSTO APURADO:
Bens móveis: Esc.1 862 247$00; Bens imóveis: Esc. 6$00; Sisa: Esc..$_ ; Juros comp. Esc.$_;
Total: Esc. 1 862 253 $00" (cfr. fls. 48 a 51 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
J) J) Em 18 de Março de 1999, os impugnantes apresentaram, junto da Repartição de Finanças do 8° Bairro Fiscal de Lisboa, "a sua contestação de valores, nos termos do artigo 87° do Código de Imposto de Sucessões e Doações" , requerendo, a final, que: "(...) considerando que os herdeiros ora reclamantes não se conformam com o valor de Esc. 14.021.365$00 atribuído ao bem móvel «quota na sociedade S......., Lda sobre que foi liquidado o imposto, na medida em que tal «Quota» não tem qualquer valor, requer-se seja realizada nova avaliação de tal bem, ponderando-se a declaração de falência ocorrida relativamente à dita sociedade, concluindo­se por fim, pela correcção imperiosa de tal montante atribuindo-se-lhe o valor devido. (...)" (cfr. fls. 53 a 70 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
K) Em 19 de Maio de 1999, os impugnantes requereram, junto da Repartição de Finanças do 8° Bairro Fiscal de Lisboa, "notificados da douta sentença homologatória da partilha judicial dos bens do inventariado, (...) Reforma da Liquidação, o que fazem nos termos do disposto no artigo 83º, in fine e 149º do CIMSISD" requerendo, a final, "porque judicialmente demonstrado que a liquidação provisória notificada aos herdeiros determinou a liquidação e posterior cobrança de imposto sobre sucessões superior ao devido, (...) que se proceda à anulação daquela liquidação provisória. Mais se requer seja liquidado definitivamente o imposto sucessório devido, tendo em conta a determinação da matéria colectável que esteja em harmonia com os valores fixados judicialmente como existentes na massa hereditária e transmitidos mortis causa aos herdeiros"
(cfr. fls. 105 a 114 do processo de liquidação de imposto sucessório e fls. 138 do processo de reclamação graciosa apensos);
L) Em 6 de Fevereiro de 2001, foi elaborado o instrumento intitulado "Termo de Avaliação - Avaliação de Participações Sociais, § 3 Art.º 93º do CIMSISSD", do qual se extrai o seguinte:
"(...) A avaliação foi elaborada seguindo os termos das regras 3ª e 4ª do § 3° do art.º 20° do CIMSISSD, com base na Declaração do Modelo 22 e respectivos anexos relativa ao exercício de 1994, uma vez que o contribuinte por incumprimento fiscal, não apresentou as declarações de 1995 e 1996, e da qual resultou o valor de 14.021.365$00 atribuído à quota sujeita a transmissão. Ocabeça de casal contesta este valor, alegando que foi declarada falência e transitado em julgado em 23/11/ 97, e como tal valor da quota transmitida seria nulo bem como os créditos existentes.
Uma vez que o valor da quota transmitida foi calculado nos termos das regras 3ª e 4ª do artigo 20° do CIMMSISD, o qual impede que o valor atribuído em partilha judicial a uma quota ou parte social se sobreponha ao que resultar do último balanço, segundo despacho de 27/03/64 - P.º 40/04 - L.º 21/ 80/63, considero assim que se deve manter o valor apurado na 1ª avaliação no montante de 14.021.365$00.
Há a referir que existia um saldo credor na conta de empréstimo de sócios à data de 31/12/94, no valor de 14.151.152$00, no entanto, no inventário enviado ao Tribunal Cível da Comarca de Lisboa apresente um crédito à firma no valor de 9.291.000$00, tendo este ficado provado conforme documento que se junta, sentença transitada em julgado reclamação de créditos, graduação de créditos.
Conclusão:
Resultado desta avaliação, valor atribuído ao valor da quota transmitida 14.021.365$00 (...)
Saldo credor da conta empréstimo de sócios a adicionar ao activo da herança 9.291.000$00 (...)" (cfr. fls. 48 e 48v do processo de avaliação de bens apenso);
M) Em 16 de Fevereiro de 2001, os impugnantes "notificados do termo de avaliação que concluiu pela fixação do valor da quota transmitida em Esc. 14.021.365$00 e pela adição do activo da herança do valor de Esc. 9.291.000$00, requereram, junto da Repartição de Finanças do 8° Bairro Fiscal de Lisboa, "a segunda avaliação, nos termos do artigo 96º do CIMSISD", concluindo, entre o mais, que: "Pelo que, evidentemente, recorrer ao critério do último balanço apresentado ao invés de atender ao valor da quota e ao Jacto de o crédito da conta de sócios não ter sido nem nunca poder vir a ser pago, factos esses sobejamente demonstrados e provados em dois processos judiciais distintos, dos quais se juntou prova documental - não pode deixar de constituir uma ilegalidade" (cfr. fls. 53 a 57 do processo de avaliação de bens apenso);
N) Pelo ofício nº 4….., de 22 de Fevereiro de 2001, foi dado conhecimento à ia. impugnante, "da liquidação a que se procedeu no processo em referência, no qual figura como herdeira:
Valores que serviram de base à liquidação:
Bens móveis: Esc. 12 549 519$35; Bens imóveis: Esc. 50$50;
Total: Esc. 12 549 569$85
IMPOSTO APURADO:
Bens móveis: Esc. 1 232 943$00; Bens imóveis: Esc. 5$00;
$__; Juros comp. Esc. $_;
Total: Esc. 1 232 948$00" (cfr. fls. 153 e 154 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
O) Pelo ofício nº 4……, de 22 de Fevereiro de 2001, foi dado conhecimento ao 20. impugnante, "da liquidação a que se procedeu no processo em referência, no qual figura como herdeiro:
Valores que serviram de base à liquidação:
Bens móveis: Esc. 13 184 242$35; Bens imóveis: Esc. 50$50;
Total: Esc. 13 184 292$35
IMPOSTO APURADO:
Bens móveis: Esc.1 309 109$00; Bens imóveis: Esc. 6$00; Sisa: Esc. $_; Juros comp. Esc. $_;
Total: Esc. 1 309 115$00" (cfr. fls. 155 e 156 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso};
P) Em 8 de Março de 2001, os impugnantes "notificados da liquidação de imposto sucessório reformulado" apresentaram, junto da Repartição Finanças do 8° Bairro Fiscal de Lisboa, "contestação da mesma, nos termos do artigo 87º do Código de Imposto de Sucessões e Doações", tendo requerido, a final, "considerando que os herdeiros ora reclamantes não se conformam nem com o valor de Esc. 14.021.365$00 atribuído ao bem móvel «quota na sociedade S......., Lda», nem com a adição ao activo da herança do valor de Esc. 9.291.000$00 sobre que foi liquidado o imposto, na medida em que nem tal «Quota», nem tal crédito têm qualquer valor, concluindo-se por fim pela correcção imperiosa de tal montante atribuindo-se-lhe o valor devido" (cfr. fls. 157 a 170 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
Q) Em 19 de Junho de 2001, foi elaborado o instrumento intitulado "Termo de Avaliação - Termo de Avaliação de Participações Sociais, a que se refere o Artigo 96º do Código de Imposto Municipal do SISA e do Imposto sobre as Sucessões e Doações", do qual se extrai o seguinte:
"(...)
CONCLUSÃO
Analisados os Laudos, do Louvado por parte da Fazenda Pública, e da Louvada por parte dos contestantes, concordo dom o parecer e fundamentos, constantes do Laudo do Louvado por parte da Fazenda Pública, concluindo, com voto de desempate, que SEJAM DE MANTER os VALORES DE ESCUDOS 14.0121 365$00 E 9291000$00 PARA A AVALIAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO TRANSMITIDA ENCONTRADOS NA 1ª AVALIACÃO, realizada, nos termos do § 3 do Artigo 93º do Código de Imposto Municipal de SISA e Imposto sobre Sucessões e Doações, relativos, respectivamente, à quota da participação social transmitida e ao saldo credor da Conta de Empréstimo de Sócios a adicionar ao activo da herança" (cfr. fls. 118 a 121 do processo de avaliação apenso);
R) Pelo ofício nº 1………, de 17 de Agosto de 2001, foi dado conhecimento à 1a. Impugnante, "da liquidação a que se procedeu no processo em referência, no qual figura como herdeira:
Valores que serviram de base à liquidação:
Bens móveis: Esc.12 549 519$35; Bens imóveis: Esc. 50$50;
Total: Esc. 12 549 569$85
IMPOSTO APURADO
Bens móveis: Esc. 1232 943$00; Bens imóveis: Esc. 5$00;
Sisa: Esc. $_; Juros comp. Esc. $_;
Total: Esc. 1 232 948$00" (cfr. fls. 173 e 174 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
S) Pelo ofício nº 1…….., de 17 de Agosto de 2001, foi dado conhecimento ao 20. impugnante, "da liquidação a que se procedeu no processo em referência, no qual figura como herdeiro:
Valores que serviram de base à liquidação:
Bens móveis: Esc. 13 184242$35; Bens imóveis: Esc. 50$50;
Total: Esc. 13 184292$35
IMPOSTO APURADO:
Bens móveis: Esc. 1309 109$00; Bens imóveis: Esc. 5$00;
Sisa: Esc. $_; Juros comp. Esc. $_;
Total: Esc. 1 309 115$00" (cfr. fls. 178 e 179 do processo de liquidação de imposto sucessório apenso);
T) Em 28 de Novembro de 2001, os impugnantes apresentaram "reclamação graciosa" dos actos de liquidação de imposto sucessório identificados em R) e S) que antecedem, requerendo, a final, "seja parcialmente declarado nulo o facto acto tributário de liquidação do imposto sucessório reclamado; se assim não se entender, sempre o mesmo deve ser anulado, realizando-se nova liquidação de imposto, com correcta determinação dos bens sujeitos a incidência fiscal de tal imposto, e consequente determinação da matéria colectável que esteja em harmonia com os bens e valores fixados judicialmente com existentes na massa hereditária e transmitidos mortis causa aos herdeiros" (cfr. fls. 178 e 179 do processo de reclamação graciosa apenso);
U) Em 4 de Fevereiro de 2002, foi elaborada "Informação" pelo Serviço de Finanças de Lisboa 8, da 2a. Direcção de Finanças de Lisboa, no qual se concluiu o seguinte: "(...)
Em conclusão e tendo em conta que
· O imposto sucessório incide sobre as transmissões a título gratuito, de quaisquer bens móveis ou imóveis, considerando-se transmissão, para este efeito, a transferência real e efectiva dos bens (...),
(...)
· O valor base para a liquidação do imposto é aquele que os bens tiverem à data da respectiva transmissão, nos termos da conjugação do disposto no corpo dos art.ºs 20° e 30° do CIMSISSD, sendo este princípio geral insuficiente quando se trata de concretizar qual o enriquecimento real e efectivo do património do adquirente;
· Estamos perante a discussão da determinação do valor das quotas transmitidas, define a regra 3ª do § 3° do artigo 20° (...) que o valor a considerar na transmissão de quotas ou partes sociais em sociedades é o valor do último balanço anterior à transmissão. Não existindo balanço, apresentar-se-ia um inventário adrede organizado, dos valores activos e passivos do estabelecimento, com vista a justificar o valor indicado, conforme dispõe a alínea e) do art.º 69º do CIMSSISSD;
· Apesar de não ter sido cumprido nenhum dos condicionalismos anteriormente referidos; foi cumprido o estabelecido no art.º 77° do CIMSISSD, tendo sido nos termos das regras 3ª e 4ª do § 3 do artigo 20° do CIMSISSD, apurado o valor de 14 021 365 $00, que corresponde ao valor de parte do património transmitido e respeitante à quota na sociedade e ainda apurado o crédito à firma no valor de 9 291 000 $00 apurado para o calculo efectuado com base na proporcionalidade de capital, que por se tratar de um bem activo e constituía um direito de receber do autor da herança;
· Pelo exposto, e dado que se confirma a transferência de património e que o mesmo foi avaliado segundo as regras estabelecidas no Código do Imposto Municipal da SISA e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, pelo que me parece, salvo melhor opinião, que o presente pedido deverá ser indeferido, mantendo-se a liquidação reclamada; (...)" (cfr. fls. 134 a 141 do processo de reclamação graciosa apenso);
V) Em 8 de Fevereiro de 2002, foi proferido o seguinte despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 8, exarado sobre a "Informação" identificada na alínea antecedente: "Concordo na integra com o teor da Informação prestada. Indefiro o pedido. Notifique-se. " (cfr. fls. 134 do processo de reclamação graciosa apenso);
W) Em 19 de Março de 2002, os impugnantes interpuseram recurso hierárquico do despacho de indeferimento da reclamação graciosa identificado na alínea antecedente (cfr. fls. 134 do processo de reclamação graciosa apenso);
X) Por sentença do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, datada de 6 de Outubro de 1997, proferida no âmbito do processo de falência que correu os seus termos sob o nº 2591/97, foi declarada a Falência da S....... -, Lda", por impossibilidade de cumprir pontualmente as suas obrigações (cfr. fls. 36 a 39, 58 a 62 e 72 dos autos);
Y) Consta do instrumento intitulado "Relatório, nos termos do art.º 219° do CPEREF", com data de 9 de Junho de 2000, assinado pelo Liquidatário Judicial e pela Comissão de Credores, a seguinte informação:
"(...)
7 - Conclusões
(...)
e) Os créditos reclamados e reconhecidos pelo liquidatário judicial e pela comissão de credores montam a 117 039 989$30;
f) As receitas da massa falida ascendem a 3 745 808$70 e as despesas 2 711 511$00. O saldo de 1 034 754$70 está depositado na conta (...) CGD -Alfama" (cfr. fls. 53 a 59 dos autos);
Z) Por sentença do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, proferida no âmbito do processo reclamação de créditos que, por apenso aos autos identificados na alínea antecedente, correu os seus termos sob o nº 2591/A/97, decidiu-se, entre o mais, o seguinte:
"(...)
Importa agora graduar todos os créditos, quer os reconhecidos no despacho saneador, quer os ora verificados. Assim:
I -Do produto da liquidação da massa falida saem precípuas as custas da falência e seus apensos, e ainda, atento o disposto no artigo 200.º/3 do DL 192/93, de 23/4, os créditos por custas
a) Que constituem as reclamações nº 16 e 24, respectivamente nos valores de 75.º00$00 e 74.175$00.
b) II -Do produto dos bens apreendidos e que constam dos autos de apreensão juntos a fis. 231 a 239 dos autos de falência, dar-se-á pagamento aos créditos pela ordem seguinte:
1° Ao dos trabalhadores referidos nas reclamações nº 17 (de F……., no valor de Esc. 3.609.º83$00), nº 18 (de A……, no valor de Esc. 2.975.º00$00), nº 23 (de S……, no valor de 1.374.946$00) e nº 25 (de J……., no valor de Esc. 1.669.489$00), nos termos do art.º 747º, nº 1 al f) do CC e "ex vi" do nº 3 al a) do art 12º da L 17/86 de 14.6;
2° Aos restantes créditos, a que correspondem as reclamações 1 a 15, 19 a 22, bem como as dos credores "P……, Lda." e "E….., SA", respectivamente pelos valores de Esc. 129 106$00 e 1457 011$00, rateadamente, por se tratarem de créditos comuns.
(...)
Fixo a data da falência (art.º 200º/1 do DL 132/ 93) em Janeiro de 1997 (mês do óbito do sócio M.......)" ( cfr. fls. 72 e 117 a 123 dos autos e fls. 108 a ns, 149 a 151 do processo de avaliação apenso);
AA) Em 25 de Agosto de 1997, no âmbito do processo de inventário que correu termos no Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, 2° Juízo, 2ª secção, sob o nº 2232/97, a impugnante, enquanto cabeça de casal, apresentou requerimento com a relação de bens a figurar no inventário, do qual se extrai o seguinte:
" 1. Bens Móveis
A -Direitos de Crédito:
Verbanº 1
Suprimentos realizados à S....... – S……., Lda. reclamados no processo de falência nº 2591/ 97 (...), no valor de Esc. 9.291.000$00.
B - Títulos de Crédito:
Verban° 2
Uma quota na Sociedade S....... – S….., Lda. com o valor nominal de Esc. 13.500.000$00. Sociedade Comercial por quotas (...), cuja falência foi requerida em 14/07/97 e corre os seus termos com processo nº 2591/97 (...)" (cfr. fls. 27 a 29 dos autos);
AB) Em 5 de Março de 1998, no âmbito do processo de inventário identificado na alínea antecedente, realizou-se a conferência de interessados, na qual ficou acordado entre os interessados o seguinte:
"(...)
Activo
As verbas nº 1 e 2 (um e dois), constante da relação de bens de fls. 34, os interessados acordam em excluir, uma vez que as mesmas não têm existência, face a falência declarada da firma S....... – S……, Lda. --------" (cfr. fls.30 e 31 dos autos);
AC) Do "Mapa de Partilha" elaborado no âmbito do processo de inventário referido nas alíneas antecedentes, com data de 2 de Junho de 1998, consta o seguinte:
"(...)
BENS DA HERANÇA:
- Móveis - Verbas 3 a s ..............................................100.000$00
- Imóveis - Verbas 6 .................................................. 101$00
TOTAL A PARTILHAR: ............................................ 100.101$00
(...)" (cfr. fls. 32 a 34 dos autos);
AD) O "Mapa de Partilha" identificado na alínea antecedente foi homologado por sentença do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa (cfr. fls. 35 dos autos);
AE) A presente impugnação judicial foi instaurada no extinto Tribunal Tributário de Lisboa em 12 de Setembro de 2002 (cfr. fls. 2 dos autos).»



Com base na matéria de facto supra transcrita a Meritíssima Juíza do TT de Lisboa julgou procedente a impugnação judicial, anulando as liquidações de imposto sucessório impugnadas, na parte resultante de excesso de matéria tributável considerada, referente aos valores atribuídos à quota societária e aos suprimentos.

O tribunal a quo considerou, em síntese, que a quota societária e os suprimentos não fazem parte do acervo hereditário e da partilha judicial de bens e que a herança nada recebeu da quota societária e dos créditos/suprimentos face à falência da sociedade e incobrabilidade desses créditos, concluindo-se que, assim sendo, não houve uma real e efectiva transmissão de riqueza capaz de dar origem à tributação em imposto sucessório nos termos do art. 1.º, 3.º e 20.º do CIMSISD.

A Recorrente Fazenda Pública não se conforma com o decidido e invoca erro de julgamento de facto e de direito. A questão suscitada prende-se com o saber se, por força da falência decretada, os Impugnantes poderiam ter recusado as verbas n.ºs 1 e 2 constantes do mapa de partilha (quota da sociedade e suprimentos), sem ter renunciado ou repudiado à herança.

Entende a Recorrente que relativamente à liquidação de imposto sucessório o valor atribuído para efeitos de partilha é independente do afastamento daquelas verbas pela Impugnante, para efeitos de partilha, e, portanto, o valor atribuído, será o do último balanço, e não tendo sido este contrariado nem os valores constantes da Modelo 22 de 1994 que lhe serviu de base, então esse será o relevante.

Porém, não lhe assiste razão.

Com efeito, resulta da matéria de facto dada como provada que o Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, declarou a “Falência da S....... – S…., Lda", por impossibilidade de cumprir pontualmente as suas obrigações, mais fixando a data da falência considerando a data do óbito do autor da herança (cfr. alíneas X e Z da matéria de facto assente).

De igual modo, resultou provado que o produto da liquidação da massa falida apurado foi insuficiente para o pagamento das obrigações da sociedade e que o crédito que resulta dos suprimentos do autor da herança não seria objecto de pagamento (cfr. alíneas Y) e Z) da matéria de facto assente).

Perante esta factualidade que não foi impugnada pela Recorrente Fazenda Pública, nenhum erro de julgamento de facto é de imputar à sentença recorrida quando conclui que a herança aberta em nome do de cujus nada recebeu quer relativamente à quota societária, quer quanto aos suprimentos.

Ademais, importa ainda considerar que conforme resulta da matéria de facto constante das alíneas AB) a AD) os herdeiros acordaram em excluir do inventário as verbas relativas à quota societária e suprimentos, e poderiam fazê-lo apesar de a terem considerado inicialmente, porque como bem refere a sentença recorrida “justamente por se considerar que tais bens “não têm existência, face à falência declarada (…), não constando, por isso, do mapa de partilha homologado por sentença do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa”.

Com efeito, do acervo hereditário que foi concretamente objecto de partilha homologada por sentença judicial não faz parte as verbas relativas à quota societária e suprimentos, e nessa medida, essas verbas não podem fazer parte da matéria tributável em sede de ISSD, uma vez que não originaram na esfera jurídica dos herdeiros um enriquecimento do seu património, e assim sendo, não ocorreu a transmissão real e efectiva de bens nos termos e para efeitos do art. 1.º e 3.º corpo do artigo e §1.º do CIMSISD.

Deste modo, não assiste razão à Recorrente Fazenda Pública nas suas conclusões XIII a XVIIII. Sublinhe-se ainda que não procede a argumentação da Recorrente Fazenda Pública ao pretender que se faça apelo às regras da avaliação da sociedade e balanço para efeitos da determinação da matéria tributável, porquanto aquelas verbas não podem fazer parte da matéria tributável.

Na verdade, o imposto sobre sucessões e doações (ISSD) apenas incide sobre as transmissões gratuitas que sejam reais e efectivas de bens móveis e imóveis, e nessa medida, a determinação da matéria colectável é liquidada pelo valor dos bens transmitidos (art. 20.º e ss do CIMSISD).

Aliás, consubstancia uma exigência do princípio da capacidade contributiva (princípio que exprime e concretiza o princípio da igualdade fiscal na sua vertente de “uniformidade”) que postula que a incidência e a repartição dos impostos devem atender a “capacidade económica”, “capacidade de gastar” dos contribuintes, afastando o legislador fiscal do arbítrio ao atender-se às manifestações da capacidade tributária, constituindo o pressuposto da tributação.

Repare-se que fazendo apelo ao princípio da capacidade contributiva o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 211/2003, de 28/04/2003, proc. n.º 308/2002 julgou inconstitucional a norma do artigo 26.º do antigo Código da Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações (na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de Novembro), a qual estabelecia uma presunção juris et de jure da existência, na herança, de bens mobiliários de uso pessoal e doméstico em certas percentagens do valor do activo restante da sucessão.

Pese embora este acórdão não verse sobre a matéria em causa dos autos, do mesmo podemos extrair com segurança o ensinamento de que em respeito pelo princípio da capacidade contributiva a determinação da matéria colectável em sede de imposto de sucessões e doações deve assentar no valor dos bens efectivamente transmitidos.

Neste mesmo sentido de transmissão para efeitos de imposto sobre sucessões e doações apenas abranger a transmissão real e efectiva de bens vide acórdão do TCAS de 23/03/2004, proc. n.º 01265/03, e acórdão do TCAN de 23/06/2005, proc. n.º 00121/04, e, portanto, nenhum erro de direito é de assacar à sentença recorrida.

Em suma, e ao contrário do que alega a Recorrente Fazenda Pública, os factos dados como provados na 1.ª instância suportam a decisão proferida pela Meritíssima Juíza a quo, não se verificando qualquer erro de julgamento, nem de facto, nem de direito.

Em suma, improcedem todos os fundamentos do recurso.

Nos termos do artigo 527.º do CPC aplicável ex vi do artigo 2.º alínea e) do CPPT a decisão que julgue o recurso condena em custas a parte a que elas houver dado causa (n.º 1), entendendo-se que dá causa às custas do processo a parte vencida na proporção em que o for (n.º 2). Nos presentes autos é vencida a Recorrente Fazenda Pública, porém, esta se encontra isenta de custas, nos termos do art. 3.º, n.º 1, al. a), do Regulamento das Custas dos Processos Tributários, e art. 9.º, do DL n.º 29/98, de 11 de Fevereiro, que aprovou tal Regulamento, na medida em que a presente impugnação judicial foi proposta em data anterior a 01/01/2014.
****

III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
****
Sem custas.
D.n.
Lisboa, 14 de Janeiro de 2020.

Cristina Flora

Tânia Meireles da Cunha

Mário Rebelo