Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:211/23.0BEBJA
Secção:CT
Data do Acordão:02/15/2024
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:RAOEF
CONTRADITÓRIO/ RÉPLICA
TRÂNSITO EM JULGADO
DILAÇÃO DO TRÂNSITO EM JULGADO
Sumário:I - Pese embora o CPPT não preveja, para o processo de reclamação regulado nos artigos 276.º e seguintes, o articulado de resposta à contestação da Fazenda Pública, tal não obsta à necessidade de observância do princípio do contraditório sempre que nesta seja suscitada questão que obste ao conhecimento da reclamação e que o reclamante não tenha tido possibilidade de contraditar.

II – Uma decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação – art.º 628º, do CPC.

III - No caso de acórdão do TCA, sendo o mesmo suscetível de recurso de revista, o trânsito em julgado depende do esgotamento do prazo para tal – 30 dias, de acordo com o artigo 282º, nº1 do CPPT, ou, nos casos previstos no artigo 283º do CPPT, para os processos urgentes, de 15 dias.

IV - Quanto à dilação do trânsito em julgado, (…) há efeitos que forçosamente se produzem mesmo quando o recurso é rejeitado, tendo em conta a necessidade de aguardar a definitividade do despacho de não admissão, sujeito a reclamação para o tribunal superior, nos termos do artigo 643º.

V - Não obstante os autos em que o acórdão proferido, em 16/03/23, pelo TCA Sul, no âmbito do processo nº 4…/22.7BEBJA, terem sido remetidos ao SF em 12/04/23, levando o órgão da execução fiscal a pressupor o trânsito em julgado do mesmo, a verdade é que de tal acórdão veio ser interposto, em 19/04/23, recurso de revista para o STA.

VI - Quando, em junho de 2023, foi emitida a ordem de penhora da conta bancária nº09…, pelo SF de Évora, no âmbito do processo de execução fiscal nº0914…, não tinha transitado o acórdão que confirmou a decisão de indeferimento do pedido de pagamento da dívida executiva em 150 prestações mensais, indeferimento este que é pressuposto da penhora aqui em causa.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção de execução fiscal e de recursos contra-ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I – RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA, dizendo-se inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Beja, datada de 25/10/23, que julgou procedente a reclamação judicial intentada, ao abrigo do artigo 276º e ss. do CPPT, pela sociedade S..................., LDA., contra a ordem de penhora da conta bancária nº....................., emitida pelo Serviço de Finanças de Évora, no âmbito do processo de execução fiscal nº .....................036, dela veio recorrer.

Nas suas alegações, o recorrente formula as seguintes conclusões:

«A) Vem o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nestes autos, que julgou procedente a RAOEF deduzida pela reclamante e que determinou a anulação do ato de penhora reclamado, por vício de violação de lei.

B) Esse ato reclamado respeita à ordem de penhora de conta bancária nº……………., emitida no âmbito do PEF nº ………………036 e concretizada pelo montante de € 6.685,18.

C) Sobre o mesmo PEF tinha antes recaído uma outra RAOEF que incidiu sobre a decisão de indeferimento do pedido para pagamento em 150 prestações dessa dívida.

D) Essa reclamação deu origem ao RAOEF nº 430/22.7BEBJA, que correu termos no TAF Beja, que veio a julgar improcedente o pedido da reclamante.

E) Dessa sentença do TAF Beja, a reclamante apresentou recurso para o TCA Sul, que veio a proferir o competente acórdão, negando provimento ao recurso e mantendo a sentença recorrida.

F) Este acórdão do TCA Sul transitou em julgado no dia 05/04/2023, tendo os autos sido remetidos ao TAF Beja em 12/04/2023 e devolvidos definitivamente ao SF Évora em 18/04/2023.

G) Em 01/06/2023, foi emitida pelo SF Évora a ordem de penhora supra identificada, para penhora de valores mobiliários e contas bancárias da executada, tendo a mesma sido concretizada em 02/06/2023, pelo montante de € 6.685,18.

H) Em 12/06/2023, no âmbito do RAOEF nº 430/22.7BEBJA, deu entrada no TAF Beja um recurso de revista para o STA, enviado por email ao TCA Sul em 19/04/2023.

I) Em 22/06/2023, foi apresentada a presente reclamação judicial (RAOEF nº211/23.0BEBJA), intentada contra a referida ordem de penhora de conta bancária.

J) A douta sentença, ora recorrida, determinou, em síntese, que:

i) O Órgão de Execução Fiscal (OEF) atuou no pressuposto de que a decisão judicial do RAOEF nº 430/22.7BEBJA havia transitado em julgado, e que, dessa forma, o efeito suspensivo que a mesma tinha imposto no respetivo PEF, havia terminado;

ii) A convicção do OEF sobre este pressuposto, é suportada em elementos objetivos, uma vez que a ordem de penhora aqui reclamada foi determinada em 01/06/2022, sendo que a aquela RAOEF lhe havia sido remetida definitivamente em 18/04/2023;

iii) Não há nenhuma evidência de que no momento em que determinou a penhora, o OEF tivesse conhecimento, ou fosse exigível que tivesse conhecimento, de que a Reclamante havia apresentado um requerimento de interposição de recurso de revista da decisão proferida no acórdão do TCA Sul;

iv) Esse recurso de revista, apresentado na RAOEF nº 430/22.7BEBJA, não foi ainda admitido pelo Tribunal competente, tendo, no entanto, o mesmo sido objeto de uma decisão, proferida pelo TAF Beja, da sua não admissão com fundamento na extemporaneidade na sua apresentação;

v) Concluindo, que o acórdão proferido pelo TCA Sul não transitou, pois foi objeto de uma reclamação que se encontra em apreciação no STA, e, por isso, também não transitou em julgado a decisão judicial proferida sobre a decisão do órgão de execução fiscal que indeferiu à Reclamante o pedido de pagamento em prestações da dívida em cobrança coerciva no PEF nº…………..036.

vi) Acabando por afirmar que o efeito suspensivo provocado neste PEF pela RAOEF nº430/22.7BEBJA, se mantém ainda hoje, como se mantinha na data da prática do ato de penhora reclamado, que, por isso, padece de vício de violação de lei, o que determina a sua anulação;

vii) E decidindo julgar procedente o presente RAOEF (211/23.0BEBJA), e por consequência, anular o ato reclamado.

K) Não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, porquanto considera existir erro de julgamento, dado que da prova produzida, e levada aos autos na presente reclamação judicial, não se podem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida.

L) Antes de mais, porque a reclamante apresentou a sua defesa num articulado espontâneo, sem que para o efeito tenha sido determinado previamente pelo Juiz competente, designado de “Réplica”, que não é admissível no processo judicial tributário, e que deve ser desentranhado dos autos.

M) Mas fundamentalmente porque a douta sentença alicerça a sua decisão na circunstância de que o acórdão do TCA Sul proferido no Processo nº 430/22.7BEBJA não transitou em julgado.

N) Ora, tal não corresponde à verdade dos factos, conforme bem se demonstrou nas alegações constantes nos pontos 29 a 39 supra, em concordância com o determinado pelo art.º 628º do CPC.

O) Com efeito, até à presente data, não há nenhuma evidência processual que contrarie o efeito do trânsito em julgado daquela decisão, ocorrido em 05/04/2023, que assim produziu os seus devidos efeitos nos termos do art.º 619, nº 1 do CPC.

P) E não poderá ser, certamente, a douta sentença do Tribunal da 1ª instância (TAF Beja), proferida no presente Processo nº 211/23.0BEBJA, a determinar que o acórdão do Tribunal de 2ª instância (TCA Sul), proferido no Processo nº 430/22.7BEBJA, não transitou efetivamente em julgado, contrariando assim o próprio Tribunal, hierarquicamente superior, que prolatou aquela decisão. (cf. art.º 13º, nº 1 do CPPT)

Q) Para além de que, o Meritíssimo Juiz do TAF Beja já tinha antes esgotado o seu poder jurisdicional quanto à matéria da causa com a prolação da sentença, nos termos do art.º 613º, nº 1 do CPC.

R) Nem sequer a apresentação extemporânea de um recurso de revista para o STA, ainda não admitido sequer naquele Tribunal, pode produzir quaisquer efeitos imediatos nos presentes autos.

S) Pelo que, ao invés de ter prolatado a douta sentença, ora recorrida, deveria o Tribunal a quo, ter suspendido a presente instância até decisão do Tribunal competente sobre a admissão do recurso e/ou a decisão do seu mérito.

T) Acresce ainda que o Processo de Execução Fiscal (PEF nº ……………………036) sobre o qual foram intentadas ambas as reclamações das decisões do órgão da execução fiscal (Processo nº 430/22.7BEBJA e Processo nº 211/23.0BEBJA), é exatamente o mesmo.

U) Sendo certo que o ato de penhora de conta bancária reclamado nos presentes autos, não enferma de qualquer ilegalidade ou erro imputável ao órgão de execução fiscal, porquanto o facto que suspendia a prática de atos no PEF, cessou em 05/04/2023, com o trânsito em julgado da decisão do TCA Sul, favorável à RFP.

V) Assim, concordando com o acima descrito, não pode o OEF ter violado o art.º 278º, nº8 do CPPT, porquanto, à data da prática do ato de penhora reclamado, já havia decisão do pleito, transitada em julgado, e o SF Évora tinha na sua posse o Processo nº 430/22.7BEBJA, que lhe tinha sido remetido definitivamente pelo TAF Beja.

W) Pois que, após ter recebido os autos em definitivo do tribunal de 1ª instância, com decisão favorável à Fazenda Pública, o OEF concluiu, e bem, que tinha cessado o efeito suspensivo da referida execução, dando assim cumprimento ao mesmo art.º278º, nº 8 do CPPT.

X) Desta forma, o ato de penhora reclamado não padece do vício de violação de lei, por violação do art.º 278º, nº 8 do CPPT, conforme afirmado na douta sentença, e consequentemente, não deve ser determinada a sua anulação.

Y) Pelo que, por todo o acabado de expor, ao decidir como decidiu, o douto Tribunal a quo incorreu, a nosso ver e salvaguardando o devido respeito por melhor entendimento, em ERRO DE JULGAMENTO, em matéria de Direito, violando, nomeadamente, o disposto nos artigos 6.º, nº 1, 613.º, nº 1, 619.º, nº 1 e 628.º do CPC, e nos artigos 13.º, nº 1 e 278.º, nº 8 do CPPT.

Termos em que,

Com o Douto Suprimento de Vossas Excelências, deverá o presente recurso ser admitido e apreciado, concedendo-lhe o merecido provimento e, em consequência, deverá a Douta Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja em 25/10/2023 ser revogada e substituída por acórdão que julgue a Reclamação de Atos do Órgão de Execução Fiscal nº 211/23.0BEBJA totalmente improcedente.

Assim, Vossas Excelências por certo farão justiça!»


*


São as seguintes as conclusões das contra-alegações:

a) Bem ao contrário do sustentado pela Recorrente não ocorreu qualquer caso julgado que legitimasse a penhora efectuada pela AT e nos termos em que ocorreu.

b) Como consta da Douta decisão ora escrutinanda, o OEF quando actuou, efectuando a penhora, fê-lo desconhecendo a existência do recurso de revista interposto por aquela Recorrida, isto até por o processo de execução lhe haver sido devolvido, mas tal processo voltou a ser pedido ao OEF e nesse momento tal Entidade tinha o dever de saber que algo se passaria, isto, claro está, levando em consideração que os Tribunais não pedem os processos ao OEF de acordo com o seu livre alvedrio e sem causa justificante.

c) Havendo sido o processo pedido novamente ao OEF tinha tal Entidade por dever funcional e de ofício, de aquilatar da razão de ciência do pedido formulado, mas não só não o fez como se apresenta agora a Recorrente, disparatadamente diga-se, a sustentar que teria ocorrido, em 05/04/2023, o trânsito em julgado no processo nº 430/22.7BEBJA.

d) Como também resulta documentado nos autos, e até aceite expressamente pela Recorrente no seu Douto articulado recursivo, a decisão de não admissão do recurso de revista foi alvo de reclamação em relação ao assim decidido.

e) Uma sentença apenas se considera transitada em julgado quando não é susceptível de recurso ordinário ou de reclamação, é o que respiga do artigo 628º do CPC.

f) Quer tal significar que não se tendo esgotado o prazo de interposição do recurso ordinário ou de reclamação, da decisão em relação à qual se pretende reagir, esta não transitou em julgado

g) E não tendo transitado em julgado, como sem qualquer dúvida não transitou, tal faz desmoronar como um baralho de cartas toda a argumentação de sentido contrário da Recorrente.

h) Bem ao contrário daquilo que revela ser o entendimento da Recorrente a 1ª instância não contrariou qualquer decisão de Tribunal Superior pois que o que a 1ª instância fez foi verificar se a decisão já havia transitado em julgado e tendo o cuidado de na mesma se dizer que se houvesse transitado a penhora teria sustentáculo legal e se não houvesse não o teria.

i) Sendo que o Tribunal Superior não havia decidido sobre qualquer trânsito em julgado nesta concreta matéria.

j) É sabido que a decisão judicial vale nos exactos limites em que julga, pelo que axiomático será dizer que a Douta Sentença escrutinanda não violou qualquer decisão de Tribunal Superior, assim como não violou o princípio do esgotamento do poder jurisdicional com a anterior decisão tomada.

k) Interposta reclamação da não admissão do recurso o trânsito em julgado só se verifica após a confirmação do despacho do relator no sentido da não admissão e até esse momento processual a interposição do recurso de revista excepcional produz os efeitos suspensivos que a Recorrente sustenta não se produzirem.

l) Pelo que também por aqui a pretensão recursória da Recorrente naufraga.

Nestes termos e nos melhores de Direito deverá o presente recurso ser declarado totalmente improcedente e, em consequências, confirmada a Douta Sentença sob escrutínio, tudo o mais com as consequências legais.*

O Digno Procurador-Geral Adjunto junto deste TCA Sul, emitiu pronúncia no sentido de ser negado provimento ao recurso.


*


Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente dos autos, vem o processo submetido à conferência desta Subsecção do Contencioso Tributário para decisão.

*


II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:

«Analisada a prova produzida, nomeadamente os documentos juntos aos autos, e a consulta aos autos do processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal n.º430/22.7BEBJA, com relevância para a decisão a tomar, dão-se como provados os seguintes factos:

a) Em 16.12.2022, foi admitida a reclamação judicial apresentada pela ora Reclamante, da decisão do serviço de finanças de Évora, proferida no processo de execução fiscal n.º0914202201102036, que lhe indeferiu um pedido de pagamento da quantia exequenda em 150 prestações mensais; acordo entre as partes, consulta do processo n.º430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT

b) Essa reclamação de actos do órgão de execução fiscal correu termos neste tribunal sob o n.º 430/22.7BEBJA, no qual, em 29.12.2022, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, mantendo na ordem jurídica aquela decisão de indeferimento daquele pedido de pagamento em prestações; acordo entre as partes, consulta do processo n.º430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT

c) Em 13.01.2023, a Reclamante apresentou recurso dessa sentença para o Tribunal Central Administrativo do Sul, para onde os autos subiram em 01.03.2023; acordo entre as partes, consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT

d) Em 16.03.2023, o Tribunal Central Administrativo Sul proferiu acórdão negando provimento ao recurso e mantendo a sentença recorrida, o qual foi notificado às partes através de documento electrónico emitido nessa mesma data; acordo entre as partes, consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT

e) Em 12.04.2023, os autos do processo n.º 430/22.7BEBJA, foram remetidos pelo Tribunal Central Administrativo Sul ao Tribunal Administrativo de Beja, onde foram recebidos em 13.04.2023; consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT

f) Em 18.04.2023, os autos do processo n.º 430/22.7BEBJA, foram remetidos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja ao Serviço de Finanças de Beja; consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT

g) Em 19.04.2023, através de correio electrónico, a ora Reclamante apresentou no Tribunal Central Administrativo Sul, um requerimento de interposição de recurso de revista dirigido à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, tendo por objecto o acórdão daquele Tribunal Central, que havia julgado improcedente o recurso apresentado pela Reclamante da sentença proferida por este Tribunal Administrativo e Fiscal no processo n.º 430/22.7BEBJA; consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT, documentos anexos ao requerimento de página 217 desses autos

h) Em 02.06.2023, na sequência do pedido de penhora n.º …………………253, determinado pelo Serviço de Finanças de Évora em 01.06.2023, foi efectuada a penhora de valores mobiliários e contas bancárias no montante de € 6 685,18, da qual a ora Reclamante foi notificada através de documento emitido em 09.06.2023; cfr doc 1 junto à petição inicial

i) Em 12.06.2023, foi registada a entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, do recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo, que a ora Reclamante havia apresentado no Tribunal central Administrativo Sul; consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT, documentos anexos ao requerimento de página 217 desses autos

j) Em 14.06.2023, foi proferido despacho no processo n.º 430/22.7BEBJA, considerando que esse recurso de revista for apresentado dois dias úteis após o termo do prazo legal, determinando a emissão de guia com vista ao pagamento de multa pela prática do acto no segundo dia posterior ao termo do prazo, relegando a apreciação sobre a admissão do recurso para momento posterior, e determinando a requisição do processo de execução fiscal ao Serviço de Finanças; consulta do processo n.º430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT, despacho de página 236 desses autos

k) Em 14.06.2023, após consulta deste despacho através do SITAF, requereu que a apresentação do recurso de revista apresentado em 19.04.2023, fosse considerada tempestiva, em virtude de o acórdão recorrido lhe ter sido notificado através de documento datado de 16.03.2023, razão pela qual q notificação só deveria ser considerada como concretizada no dia 20.03.2023; consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr. art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT, requerimento de página 240 desses autos

l) Em 15.06.2023, foi proferido novo despacho no processo n.º430/22.7BEBJA, considerando estar em causa um processo de natureza urgente e que, por essa razão, o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo do Sul e notificado à reclamante através de documento datado de 16.06.2023, transitou em julgado em 05.04.2023, concluindo que o prazo para dele interpor recurso já havia terminando quando, em 19.04.2023, foi apresentado pela Reclamante aquele recurso de revista; consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT, despacho de página 243 desses autos

m) Em 03.07.2023, a ora Reclamante apresentou nos autos do processo n.º430/22.7BEBJA, um requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul, daquele despacho de 15.06.2023, que considerou caducado o direito da Reclamante à apresentação de recurso de revista do acórdão de 16.03.2023 daquele Tribunal Central Administrativo; consulta do processo n.º430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT, requerimento de página 249 desses autos

n) Em 14.07.2023, foi proferido despacho no processo n.º 430/22.7BEBJA, convolando aquele requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul do despacho de 15.06.2023, em reclamação para o Supremo Tribunal Administrativo; consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º1 do CPPT, despacho de página 261 desses autos

o) Em 28.08.2023, foi proferido despacho no processo n.º 430/22.7BEBJA, determinando a solicitação do processo de execução fiscal com urgência e a título devolutivo; cfr despacho de página 268 daqueles autos

p) Em 04.09.2023, o Serviço de Finanças de Évora pediu ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja que esclarecesse se pretendia a devolução do processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal, ou do processo de execução fiscal; cfr ofício de página 270 dos autos do processo n.º 430/22.7BEBJA

q) Em 06.09.2023, depois de lhe ter sido esclarecido de que o processo solicitado era o processo de reclamação de acto que correu termos sob o n.º 430/22.7BEBJA, o serviço de finanças de Évora remeteu ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja este processo; consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT, páginas 276 e 277 desses autos

r) Em 07.09.2023, no processo n.º 430/22.7BEBJA, foi proferido despacho a determinar a subida dos autos ao supremo Tribunal Administrativo, para onde os mesmos foram remetidos em 12.09.2023; consulta do processo n.º 430/22.7BEBJA cfr art.ºs 412.º n.º 2 do CPC e art.º 13.º n.º 1 do CPPT, páginas 289 e 292 desses autos


*


Com relevância para a decisão da causa, não resultaram provados quaisquer outros factos.

*


A convicção do Tribunal sobre os factos dados como provados resultou da análise crítica aos documentos juntos aos autos e ainda, à consulta dos autos do processo n.º430/22.7BEBJA, tal como se foi fazendo referência em cada uma das alíneas da matéria de facto provada.»

*

Ao abrigo do artigo 662º do CPC, por se mostrar relevante para a decisão e resultar do conhecimento deste Tribunal por dever de ofício (consulta ao SITAF, no processo nº 430/22. 7BEBJA), aditam-se os seguintes factos ao probatório:

s) Em 22/09/23, o EMMP junto do STA pronunciou-se no processo n.º 430/22.7BEBJA nos seguintes termos:

“1. Vem o presente recurso de revista interposto do douto acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 16.03.2023, que confirmou a sentença proferida pelo TAF de Beja que julgou improcedente a reclamação deduzida ao abrigo do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário contra a decisão proferida no âmbito do processo de execução fiscal nº ……………..036, que indeferiu o pedido de pagamento da dívida executiva em 150 prestações mensais.

De tal acórdão vem interposto recurso de revista, nos termos do artigo 285.º do CPPT.

Não cabendo formular parecer nesta fase processual, importará apenas emitir pronúncia sobre a verificação dos requisitos processuais de admissibilidade do recurso.

2. Tal acórdão do TCA Sul foi notificado em 17.03.2023, pelo que o prazo para interposição de recurso se iniciou em 20.03.2023.

Nos termos do disposto no artigo 283º do CPPT, tratando-se de processo urgente o recurso deve ser interposto no prazo de 15 dias a contar da sua notificação.

Pelo exposto, o trânsito em julgado do acórdão do TCA Sul ocorreu em 05.04.2023, ainda que considerada a dilação a que alude o artigo 139º do CPC sempre a mesma findaria em 10.04.2023, pelo que tendo a reclamante interposto recurso em 19.04.2023, o mesmo é intempestivo.

3. Pelo exposto, afigura-se-nos que, por ser intempestivo, o presente recurso não deve ser admitido”.

t) Em 16/11/23, a Juíza Conselheira Relatora proferiu, no processo n.º 430/22.7BEBJA, a seguinte decisão:

“O presente recurso em processo urgente foi deduzido para além do prazo para recurso, como demonstrado no parecer do Ministério Público junto deste STA já notificado às partes.

Daí que se imponha a rejeição do recurso, o que se determina.

Custas do incidente pela recorrente.

Lisboa, 16 de Novembro de 2023”

u) Em 12/12/23, foram os autos nº 430/22.7 BEBJA remetidos pelo STA ao TAF de Beja.


*

- De Direito

Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a reclamação apresentada ao abrigo do artigo 276º e seguintes, a qual visava a ordem de penhora da conta bancária nº ……………..253, emitida pelo Serviço de Finanças de Évora, no âmbito do processo de execução fiscal nº………………036.

Tal ato, de acordo com a sentença, é ilegal e, nessa medida, foi anulado.

A Recorrente, Fazenda Pública, discorda em toda a linha do decidido e pretende que este TCA reverta a situação.

Vejamos, então, por partes.

Em primeiro lugar, importa que nos detenhamos brevemente sobre o teor da conclusão L), da qual consta o seguinte: “L) Antes de mais, porque a reclamante apresentou a sua defesa num articulado espontâneo, sem que para o efeito tenha sido determinado previamente pelo Juiz competente, designado de “Réplica”, que não é admissível no processo judicial tributário, e que deve ser desentranhado dos autos”.

A Recorrente nenhuma razão tem, não obstante ser correta a afirmação segundo a qual a réplica foi apresentada “sem que para o efeito tenha sido determinado previamente pelo Juiz competente”.

Sucede, contudo, que na resposta apresentada pela Fazenda Pública, ao abrigo do artigo 278º do CPPT, a sua defesa foi apresentada por exceção e por impugnação, como a mesma aí indicou expressamente – lê-se no cabeçalho da resposta “vem o Representante da Fazenda Pública junto a esse Tribunal, responder por EXCEÇÃO e IMPUGNAÇÃO nos termos e com os fundamentos seguintes:”.

Ora, pese embora o CPPT não preveja, para o processo de reclamação regulado nos artigos 276.º e seguintes, o articulado de resposta à contestação da Fazenda Pública, tal não obsta à necessidade de observância do princípio do contraditório sempre que nesta seja suscitada questão que obste ao conhecimento da reclamação e que o reclamante não tenha tido possibilidade de contraditar. Nestes casos, deve o juiz determinar notificação do Reclamante para se pronunciar, possibilitando-lhe influir ativamente na decisão pela apresentação de argumentos jurídicos que possam contribuir para um real debate contraditório e que possam ser ponderados na decisão.

No caso, apesar de não ter sido proferido despacho para tal fim, a verdade é que a Reclamante se pronunciou por sua iniciativa, o que mais não traduz do que o exercício do seu direito ao contraditório, direito este que a notificação judicial sempre visava assegurar.

Assim sendo, e sem necessidade de mais amplos considerandos, concluímos que pela admissibilidade de tal pronúncia, nada justificando, nessa medida, o requerido desentranhamento da réplica apresentada.


*

Prosseguindo, lembremos que está em causa a reclamação apresentada contra a ordem de penhora da conta bancária nº …………………253, do SF de Évora, no âmbito do processo de execução fiscal nº …………………..036. Dando razão ao Reclamante, a sentença anulou tal ato, reputando-o de ilegal.

A Fazenda Pública discorda do assim decidido, pugnando pela manutenção do ato.

Vejamos, desde já, e no que para aqui releva, o discurso argumentativo alinhado na sentença que aqui nos ocupa. Aí se escreveu:

“(…)

Dito isto, importa então entrar na apreciação da questão determinante para a decisão a tomar na presente acção, e que é a de decidir se aquela sentença proferida no processo n.º 430/22.7BEBJA, já tinha efectivamente transitado em julgado, no momento em que o acto de penhora reclamado foi proferido.

Se esse trânsito em julgado se tiver formado antes da penhora reclamada, não existia qualquer efeito suspensivo a obstar à prática de actos no processo de execução fiscal n.º ……………..036, e, por isso, a ordem de penhora deverá que manter-se na ordem jurídica.

Se antes da decisão de penhora reclamada não se tiver formado aquele trânsito em julgado sobre sentença proferida no processo n.º 430/22.7BEBJA, o efeito suspensivo do processo de execução fiscal n.º ……………….036, mantinha-se, e, por isso, a penhora reclamada não poderia ter sido praticada.

Dispõe o art.º 278.º n.º 6, n.º 8 e n.º 9 do CPPT, com a redacção introduzida pela Lei 7/2021 de 26.02, que, “A reclamação referida no n.º 3 suspende os efeitos do ato reclamado e segue as regras dos processos urgentes.”, e “Com a remessa para o tribunal tributário de 1.ª instância, a execução fica suspensa até à decisão do pleito, desde que a reclamação tenha por objecto matéria que afete a totalidade da execução.”, e, finalmente, “Quando a reclamação incida apenas sobre parte do processo de execução fiscal, o processo suspende-se apenas quanto a esta parte.”

A apresentação de uma reclamação judicial de uma decisão do órgão de execução fiscal de indeferimento de um pedido de pagamento em prestações, suspenderá os efeitos dessa decisão de indeferimento, mas suspende também toda a tramitação subsequente do processo de execução fiscal, impedindo, nomeadamente, a prática de quaisquer actos de penhora, sob pena, aliás, de retirar qualquer efeito útil à decisão judicial que venha a ser tomada sobre aquela decisão de indeferimento.

(…)

Assim, até ao trânsito em julgado da decisão judicial proferida na reclamação judicial de um acto de indeferimento de um pedido de pagamento em prestações, o órgão de execução fiscal está obrigado a abster-se de praticar qualquer acto de cobrança coerciva da dívida em causa no processo de execução fiscal.

O efeito jurídico da suspensão da execução fiscal, provocada pela interposição de uma reclamação de actos do órgão de execução fiscal, tem de manter-se enquanto não houver decisão transitada em julgado nessa reclamação.

Nos termos do art.º 628.º do CPC, ex vi art.º 2.º e) do CPPT, uma decisão considera-se transitada em julgado, logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação,”, sendo que, e sem prejuízo das regras específicas sobre recursos judiciais previstas no CPPT, nos termos do art.º 627.º n.º 2 do mesmo CPC, “os recursos são ordinários ou extraordinários, sendo ordinários os recursos de apelação e de revista e extraordinários o recurso para uniformização de jurisprudência e a revisão.”

(…)

Como decorre da matéria de facto provada, e ainda que o órgão de execução fiscal não tivesse tido, nem lhe fosse exigível que disso tivesse tido conhecimento, desde logo porque a reclamação de actos do órgão de execução fiscal n.º 430/22.7BEBJA já lhe havia sido remetida a título definitivo, na sequência, aliás, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, a Reclamante veio a apresentar um recurso de revista deste acórdão para o Supremo Tribunal Administrativo.

(…)

Embora sendo um recurso apenas admissível a título excepcional, o recurso de revista é ainda um recurso ordinário, cuja interposição adia o momento do trânsito em julgado da decisão de primeira instância, que, sendo objecto de recurso de revista, acaba por acolher, nas condições excepcionais previstas na lei, o acesso a um terceiro grau de jurisdição.

(…)

É certo que o recurso de revista apresentado pela aqui Reclamante da decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo Sul, em segunda instância, na reclamação de actos do órgão de Execução Fiscal n.º 430/22.7BEBJA, não foi ainda admitido.

Aliás, esse recurso foi mesmo objecto de uma decisão proferida pelo Tribunal de primeira instância de não admissão do mesmo, com fundamento na extemporaneidade na sua apresentação. (Cfr alínea l) da matéria de facto provada)

Acontece que esta decisão não transitou, pois foi objecto de uma reclamação que se encontra em apreciação no Supremo Tribunal Administrativo (Cfr alíneas m), n), e r) da matéria de facto provada), e, por isso, também não transitou em julgado a decisão judicial proferida sobre a decisão do órgão de execução fiscal que indeferiu à Reclamante o pedido de pagamento em prestações da dívida em cobrança coerciva no processo de execução fiscal n.º ……………….036.

O que significa que o efeito suspensivo provocado neste processo pela reclamação de actos do órgão de execução fiscal n.º 430/22.7BEBJA, se mantém ainda hoje, como se mantinha na data da prática do acto de penhora reclamado, que, por isso, padece de vício de violação de lei, por violação do disposto no art.º 278.º n.º 8 do CPPT, o que determina a sua anulação. Isto, como se disse já, sem prejuízo de não poder ser imputada ao órgão de execução fiscal a invalidade subjacente a esta anulação, pelas razões que de início de enunciaram”.

A Fazenda Pública discorda do decidido, evidenciando, no essencial, que “que o ato de penhora de conta bancária reclamado nos presentes autos, não enferma de qualquer ilegalidade ou erro imputável ao órgão de execução fiscal, porquanto o facto que suspendia a prática de atos no PEF, cessou em 05/04/2023, com o trânsito em julgado da decisão do TCA Sul, favorável à RFP”. Para a Fazenda Pública, “não pode o OEF ter violado o art.º 278º, nº8 do CPPT, porquanto, à data da prática do ato de penhora reclamado, já havia decisão do pleito, transitada em julgado, e o SF Évora tinha na sua posse o Processo nº 430/22.7BEBJA, que lhe tinha sido remetido definitivamente pelo TAF Beja”. Com efeito, prossegue a Recorrente, “após ter recebido os autos em definitivo do tribunal de 1ª instância, com decisão favorável à Fazenda Pública, o OEF concluiu, e bem, que tinha cessado o efeito suspensivo da referida execução, dando assim cumprimento ao mesmo art.º278º, nº 8 do CPPT”. Nestes termos, concluiu a Fazenda Pública que “o ato de penhora reclamado não padece do vício de violação de lei, por violação do art.º 278º, nº 8 do CPPT, conforme afirmado na douta sentença, e consequentemente, não deve ser determinada a sua anulação”.

Como bem se percebe, o ponto fulcral da questão que aqui nos ocupa prende-se com o trânsito em julgado do acórdão proferido em 16/03/23 pelo TCA Sul, no âmbito do processo nº 430/22.7BEBJA.

Vejamos.

Uma decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação – art.º 628º, do CPC.

Em primeiro lugar a lei estabelece como pressuposto do trânsito em julgado que a decisão não seja suscetível de recurso ordinário.

No que ao contencioso tributário respeita, a lei prevê recursos ordinários e extraordinários, sendo ordinários os recursos de apelação e de revista.

No caso de acórdão do TCA, sendo o mesmo suscetível de recurso de revista, o trânsito em julgado depende do esgotamento do prazo para tal – 30 dias, de acordo com o artigo 282º, nº1 do CPPT, ou, nos casos previstos no artigo 283º do CPPT, para os processos urgentes, de 15 dias.

“Podem ocorrer vicissitudes suscetíveis de determinar tanto a antecipação como o diferimento da data do trânsito em julgado.

(…)

Quanto à dilação do trânsito em julgado, (…) há efeitos que forçosamente se produzem mesmo quando o recurso é rejeitado, tendo em conta a necessidade de aguardar a definitividade do despacho de não admissão, sujeito a reclamação para o tribunal superior, nos termos do artigo 643º.

O mesmo ocorre nos casos em que é deduzida alguma reclamação que seja indeferida, enquanto não se estabilizar definitivamente a decisão em causa.” – cfr. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, págs. 311 e 32).

Também Lebre de Freitas e outra, in CPC, anotado, Volume 3º, pág. 20, referem:

“A decisão de não admissão de recurso ordinário pode ainda ser impugnada através da reclamação prevista no art.º 643º, se o recorrente com ela não se conformar, caso contrário transitando em julgado a decisão de que se pretendia recorrer. Sendo interposta a reclamação prevista no art.º 643º, a inadmissibilidade do recurso ordinário só se verifica depois de ser confirmado o despacho de não admissão pelo relator ou, eventualmente pela conferência (abstrai-se da eventual interposição de recurso de constitucionalidade do acórdão proferido pela conferência no tribunal superior, quando tal seja admissível).”

Ou seja, e como se refere no acórdão da Relação de Guimarães, de 12/10/23, proferido no processo 5613/19.4 T8VNF-A.G3, “ainda que à luz da lei, o Acórdão não seja susceptível de recurso de revista, o apuramento do trânsito em julgado, não prescinde da análise das concretas vicissitudes, sob pena de se desconsiderar a realidade e se cair numa ficção e, nomeadamente, não prescinde de verificar se foi interposto tal recurso, se o mesmo não foi admitido, se houve reclamação dessa decisão, se da decisão do Relator foi pedida a conferência, pois se tal suceder, o Acórdão só se torna definitivo, quando se tornar definitiva a última decisão”.

No mesmo sentido decidiu o STJ, no acórdão de 22/02/2017, processo 659/12.6TTMTS.P2-A.S1. Aí se escreveu o seguinte:

“Efetivamente, não é o facto puro e simples da sentença ou acórdão não admitirem recurso à face da lei, que acarreta o trânsito em julgado na data da respetiva prolação, como entendeu a 1ª instância e defende a recorrente. O trânsito só ocorre depois de esgotados todos os meios de reação legalmente previstos ou o decurso do respetivo prazo, seja a interposição de recurso nos termos gerais ou excecionais, seja a reclamação do despacho de não admissão do recurso, seja o pedido de reforma ou a arguição de nulidades.

(…)

No caso em apreço, tendo sido interposto recurso do acórdão confirmativo da sentença, que não foi admitido, contra o que a recorrente reagiu apresentando a respetiva reclamação, como legalmente estatuído (art. 643º, nº 1 do CPC), o trânsito apenas ocorreu no dia …, ou seja, no décimo dia posterior à notificação do indeferimento da reclamação …, dado que não foi requerida a intervenção da conferência (art. 643º, nº 4 e 652º, nº 3 do CPC).”

Vejamos, agora o caso concreto.

Não obstante os autos em que o acórdão proferido, em 16/03/23, pelo TCA Sul, no âmbito do processo nº 430/22.7BEBJA, terem sido remetidos ao SF em 12/04/23, levando o órgão da execução fiscal a pressupor o trânsito em julgado do mesmo, a verdade é que de tal acórdão veio ser interposto, em 19/04/23, recurso de revista para o STA.

Tal recurso jurisdicional, como documenta a matéria de facto, foi objeto de despacho de não admissão, do qual foi apresentada reclamação para o Tribunal que seria competente para dele conhecer (STA) – artigo 643º do CPC e 282º, nº 6 do CPPT. Em 16/11/23, no STA, a Senhora Juíza Conselheira Relatora decidiu nos termos apontados em t) supra, ou seja, pela rejeição do recurso interposto por intempestividade. De tal decisão não consta que tenha sido interposta reclamação para a conferência, pelo que, em 12/12/23, foram os autos nº 430/22.7 BEBJA remetidos ao TAF de Beja.

Pelas ocorrências que se sucederam nos autos, e que deixámos descritas, fácil é concluir que, na data em que o ato reclamado foi emitido, o acórdão do TCA, proferido no processo nº 430/22.7 BEBJA, não tinha transitado em julgado. Dito de outro modo, quando, em junho de 2023, foi emitida a ordem de penhora da conta bancária nº …………………. , pelo SF de Évora, no âmbito do processo de execução fiscal nº ………………….036, não tinha transitado o acórdão que confirmou a decisão de indeferimento do pedido de pagamento da dívida executiva em 150 prestações mensais, indeferimento este que é pressuposto da penhora aqui em causa.

Portanto, tem razão o Tribunal a quo ao concluir que na data da prática do ato de penhora reclamado se mantinha o efeito suspensivo decorrente da apresentação da reclamação prevista no artigo 278º do CPPT, pelo que a penhora padece de vício de violação de lei, por violação do disposto no artigo 278.º n.º 8 do CPPT.

Com efeito, só após o decurso do prazo de reclamação para a conferência da decisão do Relator que não admitiu o recurso de revista interposto para o STA é que se pode ter como verificado o trânsito em julgado do acórdão proferido no processo nº 430/22.7 BEBJA, o que apenas se verificou já em dezembro de 2023.

Termos em que, fácil se torna concluir que a sentença decidiu com acerto e, nessa medida, confirma-se com a presente fundamentação, ou seja, com apelo às ulteriores ocorrências verificadas nos autos quanto à rejeição do recurso de revista interposto (artigo 611º do CPC).

Improcedem, assim, as conclusões da alegação do presente recurso, negando-se provimento ao mesmo.


*




III - Decisão

Termos em que, acordam os juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar, com a presente fundamentação, a sentença recorrida.


Custas pela Recorrente.

Registe e Notifique.

Lisboa, 15 /02/24


Catarina Almeida e Sousa

Isabel Fernandes


Hélia Gameiro Silva