Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:521/12.2BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:11/08/2018
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:ATIVIDADE SINDICAL
HORÁRIO DE TRABALHO
HORAS DE TRABALHO DIÁRIO
ENFERMEIRO
Sumário:I. Segundo a alínea b), do n.º 1 do artigo 241.º do Regulamento do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11/09, os trabalhadores candidatos a corpos gerentes de associações sindicais gozam do direito à dispensa de serviço pelo período máximo de seis dias úteis, com possibilidade de utilização de meios dias.
II. Essas dispensas de serviço são equiparadas, para todos os efeitos legais, a trabalho efetivo, segundo o n.º 4 do artigo 241.º do RCTFP.
III. Sendo as dispensas de serviço equiparadas, para todos os efeitos legais, a serviço efetivo, não pode a Administração atribuir a esses dias de dispensa legal de serviço tratamento diferente de quaisquer outros dias de trabalho efetivo do trabalhador, segundo o horário ou duração que deveria realizar.
IV. Em consequência, não pode ser alterado o horário que normalmente está atribuído a esse trabalhador, pretendendo imputar-lhe um horário de trabalho diferente daquele que normalmente realiza e que realizaria se efetivamente não gozasse as dispensas de serviço, seja para que efeitos for.
V. A lei prevê a dispensa de serviço pelo período máximo de seis dias úteis, não se referindo a qualquer período diário de trabalho, devendo entender-se que tal período de trabalho diário deve corresponder ao horário de trabalho diário que corresponde normalmente ao trabalhador, nos termos definidos pela entidade patronal.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – RELATÓRIO

O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, em representação do seu associado D...., devidamente identificados nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 30/11/2015, que no âmbito da ação administrativa, instaurada contra o Centro Hospitalar Tondela/Viseu, E.P.E., julgou a ação improcedente, de anulação da deliberação do Conselho de Administração da Entidade Demandada que considerou que o associado do autor se encontra em débito em 7H30 de trabalho, indeferindo a pretensão que lhe havia sido dirigida.


*

Formula o aqui Recorrente, Sindicato dos Enfermeiros Portugueses nas respetivas alegações (cfr. fls. 95 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem:

“a) Face ao artº 266º, nº 2 da Constituição, os serviços e Estabelecimentos da Administração Pública estão obrigados a actuar em conformidade com o “princípio da legalidade”, sendo que, constitucionalmente “não existe um princípio de unicidade mas sim um princípio de pluralidade de administrações públicas” (cf. acórdão do Tribunal Constitucional nº 155/2004 – in D.R., I-A, nº 95, de 22/Abril/2004, a págs. 2461). E,

b) Consoante assinala o aresto acabado de citar, “a Administração Pública, ainda quando se serve de instrumentos de direito privado, não é um empregador como outro qualquer. Está sempre subordinada aos princípios da prossecução do interesse público e da legalidade...”.

c) O “princípio da legalidade” impõe à Administração Pública uma obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhe estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhe foram conferidos.

d) Ou, nas palavras do Prof. Freitas do Amaral, “a lei não é apenas um limite à actuação da Administração: é também o fundamento da acção administrativa. Quer isto dizer que, hoje em dia, não há um poder livre de a Administração fazer o que bem entender, salvo quando a lei lho proibir; pelo contrário, vigora a regra de que a Administração só pode fazer aquilo que a lei lhe permitir que faça” (in “Curso do Direito Administrativo”, Vol. II, págs. 42-43).

e) A Constituição e a lei deixam de ser apenas limites à actividade administrativa para passarem a ser fundamento dessa actividade.

f) Sufragando a doutrina recenseada, o Supremo Tribunal Administrativo consigna: “A Administração está obrigada a actuar em conformidade com o princípio da legalidade, não podendo invocar como fundamento das suas decisões factos que a lei não previu como podendo servir de suporte ao decidido” (acórdão de 3/Março/2004, Procº nº 1522/03 – disponível em http://www.dgsi.pt).

g) E o Tribunal Constitucional., incisivamente, fala da submissão da Administração ao princípio constitucional da legalidade administrativa (cf. artº 266º, nº 2, da Constituição), salientando que ele se desdobra em dois sub-princípios:

a) O da precedência da lei (ou da preferência da lei ou da compatibilidade ou da não contradição) – os actos da Administração não devem contrariar as normas legais que se lhe aplicam;

b) O da reserva de lei (ou da conformidade) – a prática de um acto pela Administração exige a prévia estatuição de uma norma jurídica (como se pode ver no acórdão nº 155/2004 – in D.R., I-A, nº 95, de 22/Abril/2004, a págs. 2457).

h) Ora, não existe no nosso ordenamento jurídico qualquer estatuição que permita reconduzir as não comparências ao serviço, legalmente fundadas, a “sete horas/dia” – ficando o pessoal de enfermagem “devedor” relativamente ao horário programado.

i) De resto, e como melhor se sabe, a letra da lei é o ponto de partida e o limite da interpretação – por isso é que não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso (cf. artº 9º, nº 2, do Código Civil).

j) Sendo que, também, na fixação do sentido e alcance da lei o intérprete está obrigado a presumir encontrar-se perante um legislador razoável que consagra as soluções mais acertadas e que sabe exprimir o seu pensamento em termos adequados (cf. artº 9º, nº 3, do Código Civil).

k) Ora, o substantivo “dia” tem, na nossa língua, contornos e sentido precisos: período de vinte e quatro horas (cf. “Dicionário da Língua Portuguesa”, Porto Editora, 6ª edição, pág. 540).

l) E, como não poderia deixar de suceder, é assim que ele é empregue e tratado pelo legislador, como se pode ver do art.º 279º, d), do Código Civil: é de um dia o prazo fixado em vinte e quatro horas. De outra banda,

m) O Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de Novembro, “aprova o regime legal da carreira de enfermagem” (cf. Art.º 1.º, n.º 1) e o seu Capítulo VII é dedicado aos “regimes de trabalho e condições da sua prestação” (art.ºs 54.º a 56.º) e foi mantido em vigor pelo Decreto-Lei n.º 248/2009, de 22 de Setembro. Assim é que,

n) O art.º 56.º do Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de Novembro, ocupa-se das “regras de organização, prestação e compensação de trabalho” e o n.º 11 deste preceito postula que “são aplicáveis a todos os enfermeiros, independentemente dos estabelecimentos ou serviços em que prestem funções, as disposições contidas no Decreto-Lei n.º 62/79, de 30 de Março, que não colidam com o presente decreto-lei” (na “rearrumação” do art.º 1º do Decreto-Lei n.º 412/98, de 30 de Dezembro).

o) O Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de Agosto, “estabelece os princípios gerais em matéria de duração e horário de trabalho” (cf. Art.º 1.º, n.º 1). E, o art.º 38.º deste Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de Agosto, postula, no que para aqui interessa, que “mantêm-se em vigor os regimes de trabalho e condições da sua prestação fixadas em legislação especial para o pessoal... da saúde...”.

p) E a legislação mais recente sobre a matéria também não alterou este entendimento.

q) Aliás, o art.º 184.º do RCTFP (Lei n.º 59/2008, de 9 de Setembro) define a falta como “a ausência do trabalhador no local de trabalho e durante o período em que devia desempenhar a actividade a que está adstrito”.

r) Sublinha-se a formulação: “regime de trabalho e condições da sua prestação” quer na epígrafe do Capítulo VII do Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de Novembro, quer na estatuição do art.º 38º do Decreto-Lei nº 259/98, de 18 de Agosto, quer no art.º 184.º do RCTFP.

s) Pois, a ver do recorrente., e salvo o merecido respeito, bem evidencia o propósito de manter incólumes os “regimes de trabalho e condições da sua prestação” do pessoal de enfermagem. Aliás,

t) E como melhor se sabe, na fixação do sentido e alcance da lei o intérprete está obrigado a presumir encontrar-se perante um legislador razoável, que consagra as soluções mais acertadas e que sabe exprimir o seu pensamento em termos adequados (cf. Art.º 9º, n.º 3, do Código Civil).

u) Ora, por outro lado dispõe, no que para aqui interessa, o art.º 55.º, n.º 6, da Constituição da República Portuguesa, que “os representantes eleitos dos trabalhadores gozam do direito … à protecção legal adequada contra quaisquer forma de condicionamento, constrangimento ou limitação do exercício legítimo das suas funções”. E,

v) Este preceito está, sistematicamente, inserido no Capítulo III (“Direito, liberdades e garantias dos trabalhadores”) da Constituição da República Portuguesa.

w) Assim, beneficia do “regime” consagrado no art.º 17.º da Constituição da República Portuguesa e tem a “força jurídica” afirmada no art.º 18.º: é de aplicação directa e imediata (ou seja, não necessita de mediação legislativa concretizadora) e vincula as entidades públicas e privadas. E,

x) A tutela desta garantia constitucional é, nomeadamente, concretizada “na consagração de disposições sobre a justificação das ausências ao trabalho e na concessão de créditos de tempo remunerado para o exercício da actividade sindical” (cf., sobre o ponto, o Parecer “P000302009” do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República – disponível em http://www.dgsi.pt), Sendo que,

y) Como no referido Parecer o Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República assinala, “as disposições legais que conferem aos representantes eleitos dos trabalhadores o direito à justificação das faltas ou o direito a crédito de horas podem configurar-se como verdadeiras medidas de garantia do desempenho das suas funções de representação, conexas ao exercício da liberdade sindical”.

z) O associado do recorrente não era, ainda, dirigente sindical, mas era candidato e, assim, beneficia da mesma protecção legal. Por isso,

aa) O art.º 241.º do Anexo II – REGULAMENTO da Lei nº 59/2008, de 11 de Setembro estatui que:

“1- Para a realização de... eleições dos corpos gerentes, os trabalhadores gozam dos seguintes direitos:

a) …

b) Dispensa de serviço para os elementos efectivos e suplentes que integram as listas candidatas pelo período máximo de seis dias úteis, com possibilidade de utilização de meios dias.

2 - ….

3 - As dispensas de serviço previstas no n.º 1 não são imputadas noutros créditos previstos na lei.

4 - As dispensas de serviço previstas no nº 1 são equiparadas a serviço efectivo,

para todos os efeitos legais...”.

bb) Ora, ao associado do recorrente, foram debitadas 7.30 horas correspondentes aos seis dias de dispensa que, legalmente, lhe foi concedida, sob o pretexto de que nos 6 dias de ausência o horário programado era de 8.15 horas e não de 7.00 horas.

cc) E sendo as dispensas a que se refere o art.º 241.º do Anexo II – Regulamento da Lei n.º 59/2008, um crédito ele é, necessariamente, “reportado ao período normal de trabalho e conta para todos os efeitos – designadamente os de remuneração e da antiguidade – como tempo de serviço efectivo” (cf.: - Prof. A. Menezes Cordeiro, “Manual de Direito do Trabalho”, 1997, Almedina, pág. 496).

dd) Com efeito, o crédito de horas é sempre reportado ao efectivo período normal de trabalho diário.

ee) Aliás, assim têm decidido os Tribunais Administrativos, como pode ver-se no discurso jurídico fundamentador do acórdão, de 24/Fevereiro/2005, do Tribunal Central Administrativo Sul: o crédito mensal de quatro dias terá de ser correspondente a quatro vezes o período diário do seu trabalho efectivo, independentemente das horas que o preencham, não sendo lícito … reduzir tal período de trabalho ao período de … horas diárias (Procº nº 04522/00 – disponível em http://www.dgsi.pt). E,

ff) Salvo o merecido respeito, as não comparências ao serviço ao abrigo do citado art.º 241.º do Regulamento do RCTFP, não são recondutíveis a sete horas/dia (cf.: - art.º 184º do RCTFP). Mas,

gg) Isso sim, ao “dia de trabalho”, tal como consta do horário normal de trabalho, independentemente das horas que o preencham.

hh) Pelo que, mal andou o Tribunal a quo ao converter, erradamente, aquilo que, na lei, se traduz num crédito de “dias úteis”, num “crédito de horas”. E,

ii) bem assim, ao dar por assente que «Para compensar o facto de cada turno ter a duração de 8.15 horas, cada enfermeiro goza ainda, numa das semanas seguintes, um dia de descanso adicional». (cf. alínea o) dos Factos Provados).

jj) Ora, é manifesto o erro em que incorre o Tribunal a quo ao dar por provado o transcrito facto. Com efeito,

kk) competindo ao R., no âmbito do seu poder de direcção, organizar os horários dos trabalhadores e, designadamente, o horário do associado do aqui recorrente, ele está, porém, limitado a respeitar o limite das 140 horas em 4 semanas. Aliás, tal é o que decorre do disposto no artigo 56.º do Decreto-lei n.º 437/91, de Novembro, mantido em vigor pelo artigo 28.º do Decreto-lei n.º 248/2009, de 22 de Setembro.

ll) E, por força de tal normativo, o R. está obrigado a respeitar, em cada período de aferição (4 semanas) um total de 140 horas de trabalho.

mm) Assim, se o R. opta por estabelecer turnos de duração superior à duração média do trabalho (7 horas), naturalmente que daí há-de decorrer que o limite das 140 horas se esgote antes de completadas as 4 semanas, pelo que, em respeito por esse limite, haja dias de “não trabalho”, sob pena de, assim não sendo, o trabalho prestado além das 140 horas terem de considerar-se “trabalho extraordinário”.

nn) Ora, contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo, os dias de “não trabalho” que resultam daquela circunstância não assumem, obviamente, qualquer “dia de descanso adicional” compensatório.

oo) Em face das disposições legais referidas e da factualidade acabada de expor, não podia a sentença recorrida decidir como decidiu, antes se lhe impondo considerar como equiparado a trabalho efectivamente prestado o tempo correspondente à duração dos turnos que não foram efectuados pelo associado do recorrente por força da dispensa concedida ao abrigo do art.º 241º do Regulamento do RCTFP. Pelo que,

pp) a douta sentença recorrida, ao decidir pela improcedência da acção, considerando legal o débito ao associado do A. de 7,30 horas de trabalho, com consequente obrigação de prestação desse tempo de trabalho, fez igualmente errada interpretação e aplicação do direito, violando, assim, o disposto no artigo art.º 241º do Regulamento do RCTFP.

qq) Devendo, em consequência, ser revogada.”.


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O ora Recorrido, notificado da admissão do recursão, não apresentou contra-alegações, nada tendo dito ou requerido.

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Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não foi emitido parecer.

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O processo vai, com vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas pelo Recorrente, resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de:

Erro de julgamento de direito, quanto à interpretação do artigo 241.º do Regulamento do RCTFP, ao reconduzir a não comparência ao serviço para exercício de direitos sindicais ao período de 07 horas, ao invés de reportar ao conceito de dia de trabalho, tal como consta do horário normal de trabalho.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:

“a) O A. trabalha para o R. no Hospital Distrital de Tondela

b) Tem a categoria de enfermeiro

c) Em 10/11/2011, o associado do A. requereu que lhe fosse autorizado ausentar-se do serviço nos dias 14, 15, 17, 18, 21 e 22 de Novembro de 2011, entre as 08.00 horas e as 16.15 horas desses dias por ser candidato aos corpos gerentes do A. e se encontrar em campanha eleitoral - doc. n.º 2 junto com a P.I.;

d) Em 14/1112011, tal requerimento foi deferido - doc. n.º 2 junto com a P.I.;

e) Em consequência, o R. procedeu à alteração do "horário de enfermagem" do serviço onde o associado do A. presta trabalho

f) Tendo ali registado que o associado do A. ficava em débito para com o R. em 7.50 horas de trabalho - doc. n.º 4 junto com a P.I.;

g) O associado do A. apresentou pedido dirigido ao Conselho de Administração do R. a pedir a anulação de tal débito de horas - doc. n.º 5 junto com a P.I.;

h) O que foi indeferido por deliberação do Conselho de Administração do R. - doc. n.º 7 junto com a P.I.;

i) O horário do serviço de enfermagem onde trabalha o associado do A. encontra-se organizado em regime de turnos rotativos, distribuídos por todos os dias da semana, de segunda-feira a domingo, das 08.00 às 16.15 h., das 16.00 h. às 24.15 h. e das 00.00h. às 08.15 h. - docs. 1e 2 juntos com a Contestação;

j) O período normal de trabalho do associado do A. é de 35.00 h. semanais - docs. 1e 2 juntos com a Contestação;

k) Os mapas de horário de trabalho são elaborados tendo em consideração um período de quatro semanas (28 dias) correspondente a 20 dias de trabalho - docs. 1, 2, 3 e 4, juntos com a Contestação;

l) Os 8 dias de descanso correspondem a 1 dia de descanso semanal e a 1 dia de descanso complementar por semana - docs. 1, 2, 3 e 4, juntos com a Contestação;

m) Ocorrendo um feriado, este é descontado (7 horas) ao cômputo das 4 semanas - docs. 1, 2, 3 e 4, juntos com a Contestação;

n) A fixação dos horários de trabalho a prestar ao longo das quatro semanas, atende aos seguintes parâmetros:

- o número de horas de cada turno é de 08.15 h;

- o número máximo de horas de trabalho normal é de 140 horas (35/semana x 4 semanas = 140 horas)

Cfr. docs. 1, 2, 3 e 4, juntos com a Contestação;

o) Para compensar o facto de cada turno ter a duração de 8.15 h., cada enfermeiro goza ainda, numa das semanas seguintes, um dia de descanso adicional - docs. 1, 2, 3 e 4, juntos com a Contestação.”.

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise do fundamento do presente recurso jurisdicional.

Erro de julgamento de direito, quanto à interpretação do artigo 241.º do Regulamento do RCTFP, ao reconduzir a não comparência ao serviço para exercício de direitos sindicais ao período de 07 horas, ao invés de reportar ao conceito de dia de trabalho, tal como consta do horário normal de trabalho

Nos termos alegados pelo Recorrente, incorre a sentença recorrida em erro de julgamento de direito no que se refere à interpretação e aplicação do disposto no artigo 241.º do Regulamento do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (RCTFP), aprovado pela Lei 59/2008, de 11/09, ao entender que o período máximo de dispensa de trabalho é de seis dias úteis, pelo que, sendo de sete horas o período de trabalho diário, não pode ser considerado o período de 08H15.

Sustenta o Recorrente que as não comparências ao serviço ao abrigo do artigo 214.º do RCTFP não são reconduzíveis a sete horas por dia, mas antes ao conceito de dia de trabalho, tal como consta do horário normal de trabalho do trabalhador, independentemente de quantas horas o preencham.

Tendo o trabalhador direito a seis dias úteis, tal reconduz-se ao horário que pratica, de 08h15 e não às 07h00, não lhe podendo ser exigido 1h15 por cada dia, pretensão que foi pedida e que lhe foi negada.

Vejamos.

Resulta do julgamento de facto da sentença recorrida, o qual não se mostra impugnado no presente recurso, que o associado do Autor, invocando ser candidato aos corpos gerentes do Autor, requereu à Entidade Demandada, ora Recorrida, que lhe fosse autorizado ausentar-se do serviço em certas datas, entre as 08h00 e as 16h15, requerimento que foi deferido.

Em consequência, a Entidade Demandada procedeu à alteração do horário de enfermagem do serviço onde o associado do Autor presta trabalho e registou que este ficava em débito para com o serviço em 07h50 de trabalho, correspondente ao diferencial entre as 07h00 de trabalho diário e as 08h15 de trabalho diário que o associado do Autor normalmente realiza, por corresponder ao seu horário de trabalho.

Mais se encontra demonstrado que o horário do serviço de enfermagem em que trabalha o associado do Autor está organizado por turnos rotativos, distribuídos em todos os dias da semana, entre as 08h00 e as 16h15, as 16h00 e as 24h15 e das 00h00 às 08h15, sendo o número de horas de cada turno de 08h15 e que para compensar o facto de cada turno ter a duração de 08h15 cada enfermeiro goza numa das semanas seguintes, um dia de descanso adicional.

Tendo presente esta factualidade importa agora atender ao que estabelece o disposto no artigo 241.º do RCTFP:

1 - Para a realização de assembleias constituintes de associações sindicais ou para efeitos de alteração dos estatutos ou eleição dos corpos gerentes, os trabalhadores gozam dos seguintes direitos: (. ..)

b) Dispensa de serviço para os elementos efectivos e suplentes que integram as listas candidatas pelo período máximo de seis dias úteis, com possibilidade de utilização de meios dias:

(...)

4 - As dispensas de serviço previstas no n.º 1 são equiparadas a serviço efectivo, para todos os efeitos legais.”.

Considerando os factos apurados e o direito aplicável, tem o Recorrente razão quanto ao erro de julgamento de direito que dirige contra a sentença recorrida.

Mostra-se inequívoco que o associado do Autor tem legalmente direito a seis dias úteis de dispensa de serviço e que essas dispensas de serviço são equiparadas a serviço efetivo, para todos os efeitos legais.

Significa isto que sendo as dispensas de serviço equiparadas, para todos os efeitos legais, a serviço efetivo, cai desde logo o argumento de que o associado do Autor perderia o dia de descanso adicional, ou seja, não podendo a Administração conceder a esses dias de dispensa legal de serviço tratamento diferente de quaisquer outros dias de trabalho efetivo.

A lei atribuiu esse direito de seis dias de trabalho de dispensa do serviço e equiparou, para todos os efeitos legais, esses direitos de dispensa a trabalho efetivamente prestado, pelo que, não pode a Entidade Demandada em consequência do pedido de autorização apresentado pelo associado do Autor para se ausentar ao serviço nas datas que indicou, proceder à alteração do horário de enfermagem que normalmente está atribuído a esse trabalhador, pretendendo com isso, imputar-lhe um horário de trabalho diferente daquele que normalmente realiza e que realizaria se efetivamente não gozasse as dispensas de serviço, seja para que efeitos for.

A lei prevê a dispensa de serviço pelo período máximo de seis dias úteis, com possibilidade de utilização de meios dias, não se referindo a qualquer período diário de trabalho, devendo entender-se que tal período de trabalho diário deve corresponder ao horário de trabalho diário que corresponde normalmente ao trabalhador, nos termos definidos pela entidade patronal.

A imputação de 1h15 de débito laboral ao associado do autor, por cada dia de dispensa de serviço autorizada, corresponde a uma violação do disposto na alínea b) do n.º 1 e do n.º 4 do artigo 241.º do RCTFP, por a lei prever a dispensa por dia de trabalho, sem distinguir a duração ou período de trabalho diário realizado e equiparar a dispensa de serviço a trabalho efetivo, para todos os efeitos legais.

A interpretação adotada na sentença recorrida, na senda da atuação da Entidade Demandada, corresponde a uma errada interpretação e aplicação do regime extraído do artigo 214.º do RCTFP, que deve ser removida da ordem jurídica.

Nestes termos, procedem as conclusões do presente recurso, incorrendo a sentença recorrida no erro de julgamento de direito que contra ela vem dirigido, por violação do disposto no artigo 241.º do RCTFP, assistindo o direito ao associado do Autor à dispensa de serviço pelo período máximo de seis dias úteis, considerando a duração de trabalho diário que normalmente realiza, segundo o horário de trabalho previsto pela Entidade Demandada que lhe foi atribuído, isto é, pelo período de 08h15 em cada dia de dispensa, período este que corresponde, para todos os efeitos legais, a trabalho efetivo do trabalhador.


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Em consequência, será de conceder provimento ao recurso, por provados os seus fundamentos, revogando-se a sentença recorrida e, em consequência, em julgar a ação procedente, revogando-se o débito de 7h30 de trabalho ao associado do Autor, pelas dispensas de serviço concedidas.

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Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. Segundo a alínea b), do n.º 1 do artigo 241.º do Regulamento do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11/09, os trabalhadores candidatos a corpos gerentes de associações sindicais gozam do direito à dispensa de serviço pelo período máximo de seis dias úteis, com possibilidade de utilização de meios dias.

II. Essas dispensas de serviço são equiparadas, para todos os efeitos legais, a trabalho efetivo, segundo o n.º 4 do artigo 241.º do RCTFP.

III. Sendo as dispensas de serviço equiparadas, para todos os efeitos legais, a serviço efetivo, não pode a Administração atribuir a esses dias de dispensa legal de serviço tratamento diferente de quaisquer outros dias de trabalho efetivo do trabalhador, segundo o horário ou duração que deveria realizar.

IV. Em consequência, não pode ser alterado o horário que normalmente está atribuído a esse trabalhador, pretendendo imputar-lhe um horário de trabalho diferente daquele que normalmente realiza e que realizaria se efetivamente não gozasse as dispensas de serviço, seja para que efeitos for.

V. A lei prevê a dispensa de serviço pelo período máximo de seis dias úteis, não se referindo a qualquer período diário de trabalho, devendo entender-se que tal período de trabalho diário deve corresponder ao horário de trabalho diário que corresponde normalmente ao trabalhador, nos termos definidos pela entidade patronal.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, por provados os seus fundamentos, revogando-se a sentença recorrida e, em consequência, em julgar a ação administrativa procedente, por provada, revogando-se o débito de 7h30 de trabalho ao associado do Autor.

Sem custas.

Registe e Notifique.

(Ana Celeste Carvalho - Relatora)

(Helena Canelas)

(Cristina Santos)