Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1029/16.2BELRA
Secção:CA
Data do Acordão:05/23/2019
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:ATRASO NA ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA EM MATÉRIA FISCAL
Sumário:I)- Seguindo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem nos termos expostos supra, considerando a generalidade das matérias e abrangendo a 1ª e 2ª instância, tem-se como padrão referencial de razoabilidade de duração média global do processo, o período de 4 a 6 anos.

II) - O valor de indemnização atribuído pelo TEDH a título de danos morais cifra-se, em média, em menos de EUR 1.000,00 por ano de atraso no processo, montante este que corresponde a uma média aritmética e não poderá, como tal, ser aplicado tout court, sem mais. Diversamente, e ainda que possa servir como um referencial a atender pelo julgador, sempre poderá este aumentá-lo ou diminuí-lo, em função dos danos concretamente sofridos, segundo critérios de equidade.

III) -No dever de indemnizar por danos não patrimoniais, importa atender ao regime legal do art. 496.º do C. Civil que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito [n.º 1], sendo o montante fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494.º, isto é, tomando em consideração o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso [n.º 3], tudo com o objectivo de, após a adequada ponderação, poder concluir a respeito do valor pecuniário que considere justo para, no caso concreto, compensar o lesado pelos danos não patrimoniais que sofridos com a lesão do seu direito a uma decisão judicial em prazo razoável, sendo que segundo a jurisprudência firme e consolidada do STA os danos não patrimoniais que segundo o conhecimento comum sempre atingem os demandantes, isto é, ocorrem em praticamente todos os casos de atraso significativo na actuação da justiça, merecem, em princípio, a tutela do direito, não sendo de minimizar na respectiva relevância, sem prejuízo de prova em contrário, ou de diferente causalidade, em cada caso, na certeza de que se a parte que invoca a lesão alegar e procurar provar mais danos do que os comuns, mas não conseguir provar que os sofreu, nem por isso fica prejudicada no direito à indemnização que resulta da presunção natural de um dano moral relevante, salvo quando se provar que em concreto, mesmo este, não ocorreu.

IV) - Provando-se que o A. padeceu de ansiedade, depressão, incerteza, tristeza, inquietude e irritabilidade, os quais decorreram - ainda que não exclusivamente - do facto omissivo ilícito e culposo que é imputado ao R. e que se traduz na não prolação de decisão judicial em tempo razoável; que, por outro lado, e ainda que se reportasse a créditos fiscais, o litígio a decidir na acção visada pelos presentes autos respeitava exclusivamente a uma questão de natureza pecuniária, sendo certo que, o valor em execução não era consideravelmente elevado, ao abrigo do regime do artº 12º Lei 67/2007, 31.12, considera-se adequado o valor arbitrado de indemnização a título de danos não patrimoniais causados pelo funcionamento anormal dos serviços de administração da justiça, o valor global de 1,710, 00€ (mil setecentos e dez euros).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no 2º Juízo da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul

I – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional por SANDRA ................., visando a revogação da sentença de 20-09-2018, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou parcialmente procedente a acção administrativa intentada contra o ESTADO PORTUGUÊS - na qual peticionou:
1. Se declarasse que o R. violou o artigo 6.°, n.°1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e o artigo 20.°, n.°s 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa (CRP) no seu segmento “direito a uma decisão em prazo razoável”;
2. A condenação do réu ao pagamento à A. de:
a) Uma indemnização por danos não patrimoniais ou morais nunca inferior a dez mil euros, pela duração do processo n.°1653/10.7BELRA;
b) Uma indemnização de dois mil euros por cada ano de duração do presente processo agora instaurado, após o decurso de dois anos, até ao seu termo, também a título de danos morais.
c) Juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento sobre as verbas em a) a b.
3. A condenação do Estado Português ao pagamento de despesas de abertura de dossier, despesas administrativas e de expediente, taxas de justiça pagas pela Autora, despesas de certidões, todas as despesas de tradução de documentos e, 4. A pagar os honorários a advogado neste processo nos Tribunais Administrativos em quantia a fixar equitativamente conforme consta desta petição inicial ou a liquidar, oportunamente, fixados de acordo com o Estatuto da Ordem dos Advogados.
5. Que a todas as verbas peticionadas acresçam quaisquer quantias que, eventualmente, sejam devidas a título de imposto que incida sobre as quantias recebidas do Estado;
6. Se condene o Estado Português a pagar uma sanção pecuniária compulsória de quinhentos euros por dia, por cada despacho, decisão do tribunal ou ato dos funcionários que ultrapasse os prazos legais, ou caso o processo dure mais de dois anos, incluindo liquidação de honorários.
7. Se condene o Estado Português em custas e demais encargos legais, como o reembolso de taxas de justiça inicial e quaisquer outras pagas pela Autora.

Em sede de dispositivo final decisório, e atendendo ao peticionado pela A., pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria foi determinado:
a) condenar o Réu a pagar à Autora a quantia de €1.710,00 (mil setecentos e dez euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, decorrentes da violação do artigo 6.º, n.º 1, da CEDH e do artigo 20.°, n. °s 1 e 4 da CRP no segmento “direito a uma decisão em prazo razoável” fruto da duração excessiva do processo n.º1653/10.7BELRA, acrescida dos respetivos juros legais aplicáveis, desde a prolação da presente decisão, até efetivo e integral pagamento e de todas as quantias devidas a título de imposto que incidam sobre os montantes a pagar pelo Réu.
b) condenar o Réu a pagar à Autora os honorários do advogado nos presentes autos, na parte em que comprovadamente sejam superiores às despesas ressarcidas através da aplicação da legislação de custas, a liquidar em momento posterior à respetiva conta.
c) absolver o Réu de todos os restantes pedidos e quantias indemnizatórias peticionados pela Autora.

Irresignada, nas suas alegações, formulou a recorrente SANDRA ................. as seguintes conclusões:

“ 1 – Ficou provado nos presentes autos que é imputável ao Estado Português, enquanto juiz, toda a duração da tramitação do processo nº 1653/10.7BELRA, desde a instauração do processo até ser proferida decisão, ou seja, desde 28/10/2010 e até 24/11/2015, o que perfaz um total de 5 anos, e 14 dias;
2 – Dos factos assentes resultou também que a Recorrente acreditava que o processo em causa se resolveria mais rapidamente e a demora causou-lhe desgaste, preocupação, nervosismo e desgosto, até à sua resolução, ou seja, durante 5 anos, e 14 dias dias da duração do processo;
3 – De acordo com entendimento jurisprudencial aceite sem reservas, as normas de Direito interno respeitantes à responsabilidade civil do Estado Juiz, devem ser objecto de interpretação conforme à Convenção Europeia dos Direitos do Homem e devem ser aplicados tomando em consideração a jurisprudência do TEDH;
4 – De acordo com a Jurisprudência do TEDH, existe um núcleo de processos em que a indemnização por cada ano de demora do processo pode subir do patamar de € 1.000,00 a € 1.500,00 para € 2.000,00;
5 – De acordo com o Acórdão Apicella C. Italie de 10/11/2004, considerando nº --, “O montante global será aumentado até 2.000€ se o que estiver em causa for importante, nomeadamente em matéria de direito do trabalho, estado e capacidade das pessoas, pensões, processos particularmente importantes relativamente à saúde ou à vida das pessoas.”;
6 – No caso concreto, a Recorrente intentou oposição à execução fiscal no valor de €6.883,89;, sendo a indemnização por danos morais fixada, de forma tabelar, em cerca de um quarto desse valor, ou seja, em €1.710,00, critério esse peregrino e que não encontra eco na Jurisprudência do TEDH ou Nacional, sendo o montante inaceitável e desfasado dos parâmetros daquelas duas Jurisprudências;
7 – No processo 1653/10.7BELRA inexistiu julgamento, nem foram ouvidas quaisquer testemunhas, ou deduzidos incidentes e recursos, não se tendo verificado comportamento da parte, nem complexidade da causa ou da tramitação justificação para tamanha demora, desde a data de entrada da Petição Inicial até à prolação da decisão final, a não ser a falha do sistema judicial;
8 – Ora, o Tribunal a quo afastou-se, de forma escandalosa, dos critérios indemnizatórios da jurisprudência do TEDH e Nacional, dado que o caso sub judice possui todos os requisitos para que lhe seja fixado, por cada ano de duração do processo, uma indemnização não inferior a € 1.500,00, num total de €7500,00 euros para cada um dos Autores;
10 – O Tribunal a quo também se distanciou dos critérios de determinação da razoabilidade da duração processual, porquanto não se pode considerar aceitável a duração de um processo por três anos, quando em causa estava a simples apreciação de uma oposição à execução fiscal, tendo sido determinado e não ser realizada audição de testemunhas, alegando as partes por escrito.
11 – A apreciação e integração do conceito obtenção de decisão em “prazo razoável” constitui um processo de avaliação a ter de ser aferido “in concreto”.
12 – Pelo que, analisando o caso concreto, o processo 1653/10.7BELRA nunca devia ter ultrapassado um ano.
13 – A ser de outro modo, o Recorrido teria um imerecido prémio, dado que este tipo de decisões tem e deve assumir um carácter penalizador no sentido de se evitar a repetição de práticas que levem a que, um processo desta natureza, demore a mais de cinco anos a ser resolvido.
14 – As exigências do artigo 6º do TEDH, do artigo 20º, nº 2 da CRP e 2º do CPC, foram completamente demovidas do caso concreto, em benefício do infractor, atendendo a que a indemnização fixada atribui a mísera quantia anual de cerca de €342,00 por cada ano de duração do processo, o que é uma indemnização miserabilista, violadora do direito à justiça em prazo razoável e que tem que ser acolhida pelos nossos Tribunais, sob pena do Estado acabar por ser condenado no TEDH, esgotadas que sejam todas as etapas recursivas possíveis nos Tribunais Nacionais;
15 – Mostram-se violados os preceitos contidos nos artigos 9º alínea b), 20º e 22º da CRP; 6º do TEDH; 2º do CPC.
16 – A decisão deve ser revogada e substituída por outra que atribua uma indemnização adequada à A.;
A finalizar ainda se impetra o douto suprimento de V. Exa. para as deficiências do nosso patrocínio, clamando-se JUSTIÇA!!!!”


Houve contra-alegações em que o recorrido ESTADO PORTUGUÊS, representado pelo Ministério Público, conclui da seguinte forma:

“A sentença judicial recorrida não violou, por conseguinte, qualquer preceito legal ou constitucional, antes tendo feito uma correta aplicação do direito aos factos, revelando-se estes corretamente apreendidos, valorados e juridicamente enquadrados, assim como ajustada, senão excessiva, a indemnização aplicada, donde resulta que o recurso não merece provimento e, consequentemente, deve aquela decisão ser integralmente mantida.”
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Os autos vêm à conferência corridos os vistos legais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

1. Em 28/10/2010 a Autora deu entrada no Serviço de Finanças de Abrantes de uma petição inicial de oposição à execução fiscal dirigida ao processo de execução fiscal n.º .................. [cf. carimbo com registo de entrada do requerimento de oposição no Serviço de Finanças de Abrantes a fls. 1 a 42 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
2. A oposição referida no ponto anterior foi remetida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, onde deu entrada em 10/11/2010, dando origem ao processo de oposição a que foi atribuído o n.º 1653/10.7BELRA, com o valor de € 6.833,89 [cf. registo de entrada do requerimento de oposição no SITAF a fls. 1 a 42 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
3. Em 13/04/2011 a oposição referida no ponto anterior foi objeto de contestação [cf. acordo constante da ata da audiência prévia e registo de entrada da contestação a fls. 49 a 77 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
4. Em 26/04/2011, a Autora juntou requerimento a impugnar documentos juntos pela Fazenda Pública no processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. acordo constante da ata da audiência prévia e requerimento a fls. 82 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
5. Em 02/06/2011 de 2011 a representante da Fazenda Pública apresentou requerimento de resposta relativamente a documentos juntos ao processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. acordo constante da ata da audiência prévia e requerimento a fls. 85 a 87 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
6. Em 08/06/2011 o processo n.º 1653/10.7BELRA foi concluso ao juiz [cf. conclusão a fls. 88 e 89 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
7. Em 09/06/2011 o juiz proferiu despacho no processo n.º 1653/10.7BELRA a determinar a desnecessidade de produção de prova testemunhal e a abertura de vista ao Ministério Público. [cf. despacho a fls. 90 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA apenso aos presentes autos cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
8. Em 13/06/2011 as partes foram notificadas do despacho referido no ponto anterior. [cf. notificações a fls. 91 a 94 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
9. Em 13/06/2011 foram oficiados os serviços do Instituto da Segurança Social, IP. para se pronunciarem sobre o pedido de apoio judiciário deduzido pela Autora no processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. ofício a fls. 95 e 96 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
10. Em 22/06/2011 os serviços do Instituto da Segurança Social, IP. informaram ter sido deferido o pedido de apoio judiciário apresentado pela Autora para o processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. ofício a fls. 97 a 99 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
11. Em 30/06/2011 foi aberta vista ao Ministério Público no processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. fls. 100 e 101 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
12. Em 30/06/2011 o Ministério Público emitiu parecer no âmbito do processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. fls. 102 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
13. Em 04/07/2011 foi aberta conclusão no processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. conclusão a fls. 104 e 105 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
14. Em 24/10/2011 foi lavrada cota no processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. conclusão a fls. 106 e 107 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
15. Em 24/10/2011 foi aberta conclusão no processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. conclusão a fls. 108 e 109 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
16. Entre 24/10/2011 e 12/09/2013 o processo n.º 1653/10.7BELRA não teve tramitação [cf. acordo constante da ata da audiência prévia e tramitação do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, (cf. registo da tramitação no SITAF cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido)].
17. Em 12/09/2013 foi proferido despacho no processo n.º 1653/10.7BELRA determinando a notificação das partes para alegarem por escrito. [cf. despacho a fls. 110 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA apenso aos presentes autos cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
18. Em 18/09/2013 o despacho referido no ponto anterior foi notificado às partes para alegarem por escrito, no prazo de trinta dias. [cf. acordo constante da ata da audiência prévia e notificações a fls. 111 a 114 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
19. Em 21/10/2013 a Autora apresentou as suas alegações. [cf. acordo constante da ata da audiência prévia e alegações a fls. 115 a 118 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
20. O processo foi concluso ao juiz em 31/01/2014. [cf. conclusão a fls. 119 a 120 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
21. Em 31/01/2014 foi proferido despacho determinando a remessa dos autos ao Ministério Público para parecer complementar no processo n.º 1653/10.7BELRA caso o entendesse. [cf. despacho a fls. 121 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
22. Em 05/03/2014 foi aberta vista ao Ministério Público no processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. vista a fls. 122 e 123 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
23. Em 06/03/2014 o Ministério Público deu parecer no processo no processo n.º 1653/10.7BELRA. [cf. vista a fls. 124 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
24. Em 21/03/2014 o processo n.º 1653/10.7BELRA foi concluso ao juiz. [cf. conclusão a fls. 125 e 126 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
25. Entre 21/03/2011 e 24/11/2015 o processo n.º 1653/10.7BELRA não teve tramitação. [cf. acordo constante da ata da audiência prévia e tramitação do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, (cf. registo da tramitação no SITAF cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido)].
26. Em 24/11/2015 foi proferida sentença no processo n.º 1653/10.7BELRA, que decidiu o seguinte:
“(…)
I. Julgo procedente a presente oposição, e, em consequência, determino a extinção do processo de execução fiscal n.º ................. e apensos, quanto à oponente Sandra ..................
II. Custas pela Fazenda Pública.
III. Fixo o valor da presente oposição em EUR 6833,89, [valor da execução; cf. arts. 296.º, n.ºs 1 e 2 e 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi do art. 2.º, alínea e) e artigo 97-ºA, n.º1 do CPPT].
IV. Registe e notifique. (…)” [cf. sentença a fls. 127 a 137 (numeração do SITAF) do processo n.º 1653/10.7BELRA, apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido].
27. Entre outubro e dezembro de 2011, a pendência processual no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em matéria fiscal, por juiz, variou entre 483 e 493 processos. [cf. acordo constante da ata de audiência prévia e o ¯ Mapa do Movimento Mensal do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria em matéria fiscal junto como Doc. n.º 2 à contestação apresentada nos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido]
28. Entre janeiro e agosto de 2012, a pendência processual no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em matéria fiscal, por juiz, variou entre 493 e 423 processos. [cf. acordo constante da ata de audiência prévia e o ¯Mapa do Movimento Mensal do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria em matéria fiscal junto como Doc. n.º 2 à contestação apresentada nos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido]
29. Entre setembro e dezembro de 2012, a pendência processual no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em matéria fiscal, por juiz, variou entre 552 e 564 processos. [cf. acordo constante da ata de audiência prévia e o ¯Mapa do Movimento Mensal do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria em matéria fiscal junto como Doc. n.º 2 à contestação apresentada nos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido]
30. Entre janeiro e agosto de 2013, a pendência processual no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em matéria fiscal, por juiz, variou entre 564 e 578 processos. [cf. acordo constante da ata de audiência prévia e o ¯Mapa do Movimento Mensal do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria em matéria fiscal junto como Doc. n.º 2 à contestação apresentada nos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido]
31. Entre setembro e dezembro de 2013, a pendência processual no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em matéria fiscal, por juiz, variou entre 524 e 530 processos. [cf. acordo constante da ata de audiência prévia e o ¯Mapa do Movimento Mensal do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria em matéria fiscal junto como Doc. n.º 2 à contestação apresentada nos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido]
32. Entre janeiro e dezembro de 2014, a pendência processual no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em matéria fiscal, por juiz, variou entre 530 e 650 processos. [cf. acordo constante da ata de audiência prévia e o ¯Mapa do Movimento Mensal do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria em matéria fiscal junto como Doc. n.º 2 à contestação apresentada nos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido]
33. Entre janeiro e novembro de 2015, a pendência processual no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em matéria fiscal, por juiz, variou entre 650 e 693 processos. [cf. acordo constante da ata de audiência prévia e o ¯Mapa do Movimento Mensal do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria em matéria fiscal junto como Doc. n.º 2 à contestação apresentada nos presentes autos, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido]
34. No processo n.º 1653/10.7BELRA a Autora não lançou mão de nenhum mecanismo legal dirigido ao Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais requerendo a celeridade na decisão ou a aceleração na tramitação do processo que correu termos sob o n.º1653/10.7BELRA. [cf. acordo e processo n.º1653/10.7BELRA apenso aos presentes autos]
35. A Autora, acreditava que o processo se resolveria mais rapidamente do que sucedeu.
36. A demora na resolução do processo criou constrangimentos financeiros à Autora.
37. Por força dos constrangimentos referidos no ponto anterior e da demora no desfecho do processo que correu termos sob o n.º1653/10.7BELRA a Autora viveu preocupada e nervosa, até à resolução do mesmo.
38. A Autora deu entrada da petição inicial que deu origem aos presentes autos em 05/09/2016. [cf. registo da Petição Inicial que deu origem aos presentes autos no SITAF]
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Inexistem factos não provados com relevância para a decisão a proferir.
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Em face do disposto nos artigos 396.º do Código Civil (CC) e 607.º, n.º 5 do CPC aplicáveis ex vi artigo 1.º, do CPTA, a formação da convicção do Tribunal acerca de cada facto baseou-se essencialmente numa apreciação livre da prova testemunhal, em conjugação com a prova documental e elementos do processo n.º 1653/10.7BELRA apenso aos presentes autos, e no acordo obtido quanto à demais matéria, nomeadamente em sede de audiência prévia, tudo atento o onus probandi que impendia sobre as partes.

A valoração dos documentos e dos elementos juntos autos foi feita atendendo ao seu teor e aos factos que os mesmos comprovam, conforme indicado acima em relação aos factos elencados como provados.

Quanto à valoração dos depoimentos prestados pelas testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento, cumpre referir que os mesmos pouco contribuíram para esclarecer acerca da tramitação processual do processo que correu termos sob o n.º 1653/10.7BELRA, apenas tendo servido na parte em que à mesma as testemunhas se referiram, para corroborar o teor dos documentos e elementos do processo judicial juntos aos autos.

A prova testemunhal produzida foi, sim, relevante para dar como provados os factos constantes dos pontos 35. a 37. atinentes às convicções da Autora quanto ao desfecho do processo que correu termos neste tribunal sob o n.º 1653/10.7BELRA e repercussões para a vida e para o estado de espírito da Autora decorrentes da duração do mesmo.

Nesse sentido concorreram os depoimentos das testemunhas António ................. e de Isabel ................., que, não obstante as relações familiares com a Autora, respetivamente de marido e mãe, prestaram testemunhos credíveis e com razão de ciência especificamente por força da relação familiar com a Autora, tendo o seu depoimento concorrido para se darem como provados os factos constantes dos pontos 35. a 37. do elenco dos factos provados visto que souberam referir que a Autora acreditava num desfecho mais célere da oposição apresentada e conseguiram descrever, ainda que em traços gerais, os constrangimentos e o estado de preocupação e nervosismo da Autora provocados pela demora na resolução do processo judicial em apreço.

Nada mais se deu por provado por não ter sustentação nos elementos probatórios produzidos nos autos.

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2.2. Motivação de Direito

Como resulta do disposto nos artigos 635º nº 4 e 639º nº 1 do NCPC- sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso- as conclusões da alegação da recorrente servem para colocar as questões que devem ser conhecidas no recurso e assim delimitam o seu âmbito.
Atentas as conclusões de recurso, que delimitam o seu objecto, a questão decidenda consiste em saber se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de direito atinente à verificação dos pressupostos da responsabilidade civil do Estado.
Nesta vertente, sustenta que não pode a Apelante aceitar a não observância pela Mª Juíza das exigências do artigo 6º do TEDH, do artigo 20º, nº 2 da CRP e 2º do CPC, as quais foram completamente demovidas do caso concreto, em benefício do infractor, atendendo a que a indemnização fixada atribui a mísera quantia anual de cerca de €342,00 por cada ano de duração do processo, o que é uma indemnização miserabilista, violadora do direito à justiça em prazo razoável e que tem que ser acolhida pelos nossos Tribunais, sob pena do Estado acabar por ser condenado no TEDH, esgotadas que sejam todas as etapas recursivas possíveis nos Tribunais Nacionais.
É que, afirma, as normas de Direito interno respeitantes à responsabilidade civil do Estado Juiz, devem ser objecto de interpretação conforme à Convenção Europeia dos Direitos do Homem e devem ser aplicados tomando em consideração a jurisprudência do TEDH segundo a qual existe um núcleo de processos em que a indemnização por cada ano de demora do processo pode subir do patamar de €1.000,00 a € 1.500,00 para €2.000,00, pontificando aqui, pelo que diz o recorrente, a doutrina plasmada no Acórdão Apicella C. Italie de 10/11/2004, de acordo com a qual considerando nº --, “O montante global será aumentado até 2.000€ se o que estiver em causa for importante, nomeadamente em matéria de direito do trabalho, estado e capacidade das pessoas, pensões, processos particularmente importantes relativamente à saúde ou à vida das pessoas”.
Aplicando esse critério à situação concreta em que a Recorrente intentou oposição à execução fiscal no valor de €6.883,89, sendo a indemnização por danos morais fixada, de forma tabelar, em cerca de um quarto desse valor, ou seja, em €1.710,00, critério esse peregrino e que não encontra eco na Jurisprudência do TEDH ou Nacional, esse montante é inaceitável e desfasado dos parâmetros daquelas duas Jurisprudências.
Nesse sentido, acentua que no processo 1653/10.7BELRA inexistiu julgamento, nem foram ouvidas quaisquer testemunhas, ou deduzidos incidentes e recursos, não se tendo verificado comportamento da parte, nem complexidade da causa ou da tramitação justificação para tamanha demora, desde a data de entrada da Petição Inicial até à prolação da decisão final, a não ser a falha do sistema judicial pelo que o caso sub judice possui todos os requisitos para que lhe seja fixado, por cada ano de duração do processo, uma indemnização não inferior a € 1.500,00, num total de €7500,00 euros para cada um dos Autores.
Mais aduz que o Tribunal a quo também se distanciou dos critérios de determinação da razoabilidade da duração processual, porquanto não se pode considerar aceitável a duração de um processo por três anos, quando em causa estava a simples apreciação de uma oposição à execução fiscal, tendo sido determinado e não ser realizada audição de testemunhas, alegando as partes por escrito e a apreciação e integração do conceito obtenção de decisão em “prazo razoável” constitui um processo de avaliação a ter de ser aferido “in concreto”.
Sendo assim, conclui que o processo 1653/10.7BELRA nunca devia ter ultrapassado um ano.
Já o Ministério Público, em representação do Estado Português, sustenta o bem fundado da decisão recorrida pugnando pela sua manutenção.
Vejamos.
Como supra já se referiu (ponto I- Relatório) a Autora/Recorrente intentou contra o Estado Português a presente acção administrativa visando efectivar a responsabilidade civil extracontratual do Estado-Julgador por facto ilícito, decorrente da violação do direito a uma decisão jurisdicional em “prazo razoável” no âmbito do processo de oposição à execução fiscal a que foi atribuído o n.º 1653/10.7BELRA, com o valor de €6.833,89 e que correu termos no então Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria.
Responsabilidade essa resultante da violação do disposto nos artigos 20º, nºs 1 e 4 e 22°, ambos da CRP e 12° da Lei n° 67/2007, de 31 de Dezembro (na redacção que lhe foi dada pela Lei nº31/2008, de 17 de Julho) diploma vigente à data em a presente acção foi intentada e artigo 6º§ 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Vejamos então.
O artigo 20º, nº1 da CRP, predispõe que «A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos», acrescentando o seu nº4 que «Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo.».
Como deflui do Acórdão do Tribunal Constitucional de 8 de Abril de 2015, nº220/2015 (Relator Fernando Vaz Ventura), in www.dgsi.pt « (…) A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem entendido que o direito de acesso aos tribunais implica a garantia de uma proteção jurisdicional eficaz ou de uma tutela judicial efetiva, cujo âmbito normativo abrange, nomeadamente: (a) o direito de ação, no sentido do direito subjetivo de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional; (b) o direito ao processo, traduzido na abertura de um processo após a apresentação daquela pretensão, com o consequente dever de o órgão jurisdicional sobre ela se pronunciar mediante decisão funda­mentada; (c) o direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas, no sentido de a decisão haver de ser proferida dentro dos prazos preestabelecidos, ou, no caso de estes não estarem fixados na lei, dentro de um lapso temporal proporcional e adequado à complexidade da causa; (d) o direito a um processo justo baseado nos princípios da prioridade e da sumariedade, no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser aniquilado pela falta de medidas de defesa expeditas (veja-se, neste sentido, entre outros, o Acórdão n.º 440/94) (…).»
O direito de acesso à justiça em prazo razoável constitui uma garantia inerente ao direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efectiva e impõe que a infracção a tal direito, que é extensível a qualquer tipo de processo (cível, penal, administrativo, tributário, laborai, etc.), constitua o Estado em responsabilidade civil extracontratual (artigo 22º da CRP e 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (doravante CEFH) hoje concretizados na Lei n°67/2007, de 31 de Dezembro, concretamente no seu artigo 12°.
Neste ponto relembremos o ensinamento da Professora Isabel Fonseca quando refere, «(...) na medida em que o art.8°. n°2 da CRP consagra uma cláusula geral de recepção plena do direito internacional convencional, a CEDH aplica-se na ordem jurídica interna desde o momento que se realizou a sua regular ratificação ou aprovação e desde que foi publicada. E no plano do direito interno, as normas da Convenção, inclusive as garantias do art. 6.°. § 1, obrigam todas as entidades aplicadoras de direito ao seu cumprimento com a mesma força que as normas nacionais, após a sua publicação e enquanto vincularem no plano internacional o Estado português.
O direito de acesso à justiça em prazo razoável, com o conteúdo e o sentido que lhe decorre do art. 6.° da CEDH, aplica-se, portanto, na ordem jurídica portuguesa e, ainda que a sua autoridade não seja igual às normas da Constituição, pelo menos tem um valor supra legal, prevalecendo sobre as leis internas posteriores ou anteriores. O facto de o direito de acesso à justiça em prazo razoável ter esta natureza de direito internacional não impede que na ordem jurídica portuguesa seja considerado direito fundamental (artigo 16º, nº1 da CRP) e que possa beneficiar de um particular regime jurídico (artigo 17º), isto se tal direito não tivesse consagração constitucional no direito interno português. Mas tem previsão autónoma no art.20.°, n°4 da CRP, desde 1997. (...)» [in, Do Novo Contencioso Administrativo e do Direito à Justiça em Prazo Razoável, Estudos em Comemoração do 10.° Aniversário da Licenciatura em Direito da Universidade do Minho, pág. 353.]
E, o artigo 22° da CRP dispõe que "o Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem".
Sob a epígrafe “Direito a um processo equitativo”, o nº1 do artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, aprovada no nosso ordenamento jurídico pela Lei 65/78, de 13.10, dispõe que: «1. Qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela. (...)»
Ora, tendo presente que a Autora/Recorrente configurou a presente acção como de responsabilidade civil extracontratual fundada em deficiente funcionamento da justiça, importa, pois e de seguida verificar se estão preenchido todos esses pressupostos.
A responsabilidade civil extracontratual do Estado e pessoas colectivas públicas por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos ou agentes assenta nos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil, com as especialidades resultantes das normas próprias relativas à responsabilidade dos entes públicos.
São assim pressupostos deste tipo de responsabilidade civil: (1) o facto, que é um acto de conteúdo positivo ou negativo, consubstanciado por uma conduta de um órgão ou seu agente, no exercício das suas funções e por causa delas; (2) a ilicitude, traduzida na violação por esse facto de normas legais e regulamentares ou dos princípios gerais aplicáveis e os actos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração; (3) a culpa, como nexo de imputação ético-jurídico que liga o facto ao agente, não sendo necessária uma culpa personalizável no próprio autor do acto, bastando uma culpa do serviço, globalmente considerado, que é apreciada nos termos do artigo 487º do Código Civil”, que é o da “diligência de um pai de família, em face das circunstâncias de cada caso”; (4) o dano, lesão ou prejuízo de ordem patrimonial ou não patrimonial, produzido na esfera jurídica de terceiros; e (5) o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
No «enquadramento da pretensão indemnizatória no âmbito da responsabilidade civil extracontratual implica uma consequência importante em relação à repartição do ónus da prova. Nas acções de responsabilidade médica tem aplicação o regime geral do nosso ordenamento jurídico – artº342º, nº 1 C Civil - de acordo com o qual cabe à autora fazer a prova dos factos constitutivos do alegado direito à indemnização, salvo caso de presunção legal – artº344º nº 1 C. Civil – ou quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado – art. 344º, nº 2 C. Civil. (vide neste sentido, MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, “Sobre o Ónus da Prova nas Acções de Responsabilidade Civil Médica”, in “Direito da Saúde e Bioética”, 1996, ed. AAFDL, pp. 130 e segs. e, entre outros, o acórdão STA de 2000.03.09 – recº nº 42 434)» Ac. do Supremo Tribunal Administrativo – veja, de 17.01.2007, prolatado no âmbito do processo nº01164/06.
Para além disso, aplicar-se-á também o regime da lei civil quanto ao pressuposto negativo da não existência de culpa concorrente do lesado (artigo 570º do Código Civil) e quanto ao cálculo e limitação da indemnização.
A norma que estabelece o regime do nexo de causalidade em matéria de obrigações de indemnização é o artigo 563º do Código Civil, que preceitua que «a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão» Como refere, Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, 6ª edição, pág. 852, são condições do dano as circunstâncias que concorreram para a sua produção. Deixará de ser causa deste, sempre que, «segundo a sua natureza geral, era de todo indiferente para a produção do dano e só se tornou condição dele, em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, sendo portanto inadequada para este dano».
É sabido que a obrigação de indemnizar importa a reparação de todos os danos sofridos e a reconstituição, na medida do possível, da situação que existiria se aquela actuação não tivesse lugar e não sendo possível a reconstituição natural – como é o caso- a indemnização será fixada em dinheiro e tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data, se não existissem os danos - v. artigo 566º, nº 1 do C.Civil.
Nessa obrigação de indemnizar abrangem-se os danos patrimoniais e não patrimoniais que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito.
Quanto ao primeiro pressuposto da responsabilidade civil, pode dizer-se que o facto consiste num acto jurídico ou num facto material traduzido num certo comportamento humano voluntário que pode revestir a forma de acção ou de omissão. É necessário, por conseguinte, que haja um agente (não um mero facto natural causador de danos), pois, só o homem, como destinatário dos comandos emanados da lei, é capaz de violar direitos alheios ou de agir contra disposições legais. Por via de regra, o acto jurídico provém de um órgão que exprime a vontade imputável à pessoa colectiva de que é elemento essencial, ao passo que o facto material é normalmente produto ou resultado da execução ou omissão de tarefas, ordens e/ou actividades dos agentes ao serviço daquela mesma pessoa colectiva, in casu, do Estado Português.
No que concerne à ilicitude, a mesma decorre, no caso, da não prolação de decisão num "prazo razoável", entendido nos termos que infra serão expostos, no que constituiria uma violação do disposto nos art.ºs 20° n.°4 da CRP. 6° § 1° da CEDH e 2° n.°1 do CPC, resultando, assim, preenchida a previsão do art.° 9° n°1 da Lei n° 67/2007, de 31 de Dezembro.
A luz desta última norma, consideram-se ilícitas "as acções ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos."
Resulta, portanto, que para a verificação do requisito da ilicitude se exige, pelo menos, que o fim das normas violadas seja também o da defesa do lesado, que haja violação de direitos subjectivos e outras posições jurídicas subjectivas que justifiquem o pagamento duma indemnização.
Para a concretização do requisito da ilicitude, importa aferir e especificar em que se traduz o direito à justiça "em prazo razoável", consagrado na CEDH, na nossa Lei Fundamental, bem como no artigo 12° da Lei 67/2007.
O que seja um “prazo razoável” não se obtém por uma definição em abstracto, a partir dos prazos fixados na lei, mas de uma análise do caso em concreto, pressupõe, outrossim, o reporte a um standard ou padrão médio de funcionamento tido como tal em cada época concreta, fundamentado em graus de eficiência do serviço público da administração da justiça.
Segundo a sentença proferida pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem/1ª Secção, processo nº 30273/07 de 11.02.2010, caso Leonardo da Silva c. Luxemburgo, “(...) a razoabilidade da duração de um processo aprecia-se de acordo com as circunstâncias do caso concreto e segundo os critérios consagrados pela jurisprudência, particularmente a complexidade da causa, o comportamento do Autor e das autoridades competentes, bem como o desenrolar da litigância pelas partes interessadas (…).”
Quanto aos critérios a utilizar para determinar essa razoabilidade escreveu-se do Ac. do TCAN, de 12.02.2012,Proc. 00064/10.9BELSB, o seguinte: « […] a apreciação da razoabilidade de duração dum processo terá de ser feita analisando cada caso em concreto e numa perspetiva global, tendo como ponto de partida a data de entrada da ação no tribunal competente e como ponto final a data em que é tomada a prolação definitiva, contabilizando as instâncias de recurso (incluindo a junto do Tribunal Constitucional) e ainda a fase executiva.
XIX. Para tal tarefa de avaliação e de ponderação afigura-se-nos adequado e útil fazer apelo à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) quanto à metodologia para avaliar a razoabilidade da duração dum processo [cfr. Luís Guilherme Catarino in: ob. cit., págs. 393 e segs.; Isabel Fonseca in: “A garantia do prazo razoável: o juiz de Estrasburgo e o juiz nacional” in: CJA n.º 44, págs. 43 e segs, em especial, págs. 58 a 60, ou in: “A responsabilidade do Estado pela violação do prazo razoável: quo vadis” in: Revista do Ministério Público n.º 115, págs. 16 e segs., ou ainda em “Violação do prazo razoável e reparação do dano: quantas novidades, mamma mia” in: CJA n.º 72, págs. 44 e 45].
XX. Tal jurisprudência, inicialmente, serviu-se apenas de três critérios [1.º - o da complexidade do processo; 2.º - o do comportamento das partes; e 3.º - o da atuação das autoridades competentes no processo], sendo que mais recentemente aquela jurisprudência acrescentou um outro critério (o 4.º) que se prende com o assunto do processo e ao significado que ele pode ter para o requerente (“l’ enjeu du litige”), sendo que todos estes critérios são valorados e aferidos em concreto atendendo “às circunstâncias da causa” [cfr., entre outros, decisões do TEDH no caso Frydlender c. França (P. n.º 30979/96) in: CEDH 2000-VII; no caso Cavelli e Ciglio c. Itália - acórdão de 17.01.2002, CEDH 2002, pág. 23 in: «www.gddc.pt/direitos-humanos/sist-europeu-dh/sumariosTEDH.pdf»; no caso Martins Castro e Alves Correia de Castro c. Portugal (P. n.º 33729/06 - acórdão 10.06.2008, no seu § 38); no caso Ferreira Alves c. Portugal N.º 6 (P. n.ºs 46436/06 e 55676/08 - acórdão de 13.04.2010, no seu § 35) in: «www.gddc.pt/direitos-humanos/portugal-dh/acordaos»; no caso Domingues Loureiro e outros c. Portugal (P. n.º 57290/08 - acórdão de 12.04.2011, no seu § 56) e no caso Chy¿yñski c. Polónia (P. n.º 32287/09 - acórdão 24.07.2012, no seu § 47) ambos in: «www.hudoc.echr.coe.int/»].
XXI. Chamando aqui à colação aquela jurisprudência do Tribunal de Estrasburgo para a definição ou integração de cada um destes critérios, tal como este TCA já havia feito apelo, mormente, nos supra citados acórdãos de 30.03.2006, de 15.10.2009 e de 22.10.2010 [respetivamente, Procs. n.ºs. 00005/04.2BEPRT, 02334/06.1BEPRT e 01357/07.8BEVIS], temos que quanto ao primeiro critério se analisam tanto as circunstâncias de facto como o enquadramento jurídico do processo [mormente, número de pessoas/partes envolvidas na ação; tipo de peças processuais, nomeadamente, articulados; produção de prova e que tipos de prova foram produzidos, incluindo a pericial ou a realização de prova com recurso a cartas precatórias/rogatórias, ou que envolvam investigações de âmbito ou dimensão internacional; sentença (as dificuldades da aplicação do direito ao caso concreto, dúvidas sobre as questões jurídicas em discussão ou própria natureza complexa do litígio); número de jurisdições envolvidas por via de recursos; elaboração da conta].
XXII. É, assim, que o número e a complexidade das questões de facto, a dificuldade das questões de direito, o volume do processo, a quantidade de provas a produzir, devem ser tomadas em conta no cômputo do prazo, sendo que não haverá que levar em conta quanto à complexidade da causa quando o atraso respeite a um ato ou uma fase processual em que ela não tenha incidência.
XXIII. Já quanto ao segundo critério a avaliação do comportamento das partes atende não só ao uso do processo para o exercício ou efetivação de direitos como à utilização de mecanismos processuais [afere-se, nomeadamente, o uso de expedientes ou certas faculdades que obstam ao regular andamento do processo, v.g., a constante substituição do advogado, a demora na entrega de peças processuais, a recusa em aceitar as vias de instrução oral, o abuso de vias de impugnação e recurso sempre que a atitude das partes se revele abusiva e dilatória]. Daí que o TEDH exige que o queixoso, aqui A., tenha tido uma “diligência normal” no decurso do processo, não lhe sendo imputável a demora decorrente do exercício de direitos ou poderes processuais, como o de recorrer ou de suscitar incidentes.
XXIV. Relativamente ao terceiro critério atende-se não apenas aos comportamentos das autoridades judiciárias no processo mas também ao comportamento dos órgãos do poder executivo e legislativo, exigindo-se, assim, que o direito ao processo equitativo se concretize com reformas legislativas ao nível das leis de processo e com reformas estruturais, mormente, com reforço dos meios humanos e materiais.
XXV. A este propósito o TEDH tem considerado que a invocação de excesso de zelo para a realização de prova, a “lacuna na sua ordem jurídica”, a “complexidade da sua estrutura judiciária”, a doença temporária do pessoal do tribunal, a falta de meios e de recursos, uma recessão económica, uma crise política temporária ou a insuficiência provisória de meios e recursos no tribunal, não podem servir como razão suficiente para desculpar o Estado pelos períodos de tempo em que os processos estão parados traduzindo-se em situação de demora excessiva do processo o que constituiria infração ao art. 06.º da CEDH porquanto face à ratificação desta Convenção pelos Estados estes comprometem-se a organizar os respetivos sistemas judiciários de molde a darem cumprimento aos ditames decorrentes daquele preceito.
XXVI. Também a justificação do atraso na prolação de decisão judicial com base no volume de trabalho não tem merecido aceitação, pois, se pode eventualmente afastar a responsabilidade pessoal dos juízes não afasta a responsabilidade dos Estados.
XXVII. Assim, para efeitos de avaliar se houve violação do direito à justiça em “prazo razoável” a conduta negligente ou omissiva do juiz é equivalente à inércia do tribunal ou de qualquer autoridade dependente do tribunal em que corre o processo.
XXVIII. Nessa medida, quer estejamos perante atuação ou omissão de juiz, quer estejamos face a ausência de juiz, de falta de juízes por não haverem sido formados ou por má gestão dos respetivos quadros face ao volume de serviço do tribunal (deficiente definição dos quadros), quer, ainda, quando haja grande volume de serviço e não haja um adequado quadro de funcionários judiciais, como também pela insuficiência de condições físicas e meios colocados à disposição do tribunal [faltas de salas de audiência ou mesmo da falta equipamento ou do seu deficiente funcionamento quanto aquilo que são os meios legalmente previstos e impostos], o Estado responderá civilmente pela desorganização do aparelho judicial.
XXIX. Por fim, quanto ao quarto critério analisa-se ou afere-se a natureza do litígio, assunto objeto de apreciação e tipo de consequências que dele resultam para a vida pessoal ou profissional das pessoas ou sujeitos envolvidos, mormente, a importância que a decisão tem para as partes.
XXX. Este último critério tem desempenhado ou assumido um papel cada vez mais relevante a ponto de ser utilizado na apreciação da razoabilidade da duração dos processos em que se discutem certos direitos, mormente, em áreas como as da assistência social, as do emprego, as dos sinistros rodoviários ou ainda as relativas ao estado civil das pessoas (sua regularização).
XXXI. O critério da finalidade do processo assume importância primordial quando está em causa um processo urgente que vise tutelar situação de alegada ofensa irreparável. Com efeito, o tardar numa decisão judicial para além daquilo que foi o prazo alegado ou reclamado como necessário para evitar tal ofensa poderá tornar inútil o processo decorrido esse prazo, desvirtuando-se por completo o direito à tutela jurisdicional efetiva em sede cautelar.[…]»
Atente-se igualmente ao que foi considerado em acórdão do STA de 09.10.2008, Proc. n.º 0319/08«[…] a este propósito “… o direito à decisão em prazo razoável mediante processo equitativo consagrado no art. 6.º da CEDH e n.º 4 do art. 20.º da Const. remete o aplicador para operar a determinação, apreciando as circunstâncias de cada caso, do que é o prazo razoável. (…) Esta determinação tem de adoptar como primeiro critério o que resulta do elemento textual, isto é, a razoabilidade, o que nos remete para uma análise global, de conjunto da situação processual dos autos em que o demandante se queixa do atraso e não para os seus pormenores e para os prazos de cada fase e momento processual. (…) São de excluir desde logo da possibilidade de servir de esteio à apreciação os atrasos que tenham sido provocados pela própria parte que se queixa da demora. (…) Deve em seguida passar a analisar-se na globalidade o tempo de duração da ação e o seu estado e, se a conclusão que se recolher deste conspecto for clara e seguramente no sentido de que foi ultrapassado o prazo razoável não deveremos perder-nos na floresta dos meandros processuais à procura de saber se foi ou não cumprido religiosamente cada um dos prazos dos atos daquele percurso. Uma situação deste tipo pressupõe evidentemente uma opinião praticamente unânime de um universo de apreciadores que o julgador pode prefigurar e portanto ocorre apenas quando a demora processual seja chocante, inaceitável, para os critérios do homem comum e das suas expetativas ponderadas sobre o andamento da máquina da administração da justiça. (…) É de sublinhar neste ponto que em alguns casos de claro excesso do prazo razoável poderia porventura o método analítico de cada ato processual e respetivo prazo conduzir à conclusão de que não houve atrasos, mas nem assim se pode infirmar a conclusão do excesso injustificado porque a ser assim teria o Estado que prover a criação de outros ou diferentes meios, mecanismos, prazos, organização, para atingir o objetivo de administrar a justiça em prazo razoável …»
E continua-se no referido acórdão que numa «… segunda hipótese vemos aqueles casos em que no conjunto do meio processual e do tempo que tardou, atendendo a aspetos como a complexidade do caso e o enxerto de incidentes indispensáveis, haja de concluir-se que se tratou ainda de um prazo razoável. (…) Também neste caso, como no antecedente se deve evitar conceder relevância, sequer analítica ao que se passou concretamente com os atos atomísticos que preenchem o processo e irreleva se houve um atraso na secretaria ou de um magistrado se ele não determinou a ultrapassagem do tempo razoável para a decisão da causa. (…) Uma terceira hipótese contempla aqueles casos em que é ultrapassada a duração média daquele tipo de processos, mas não existe uma demora que se afaste profundamente daquela média nem do tempo que seria expectável por um destinatário médio bem colocado para esta apreciação e o processo teve relativa complexidade e incidentes de modo que se podem colocar dúvidas quanto a determinar o que seria o prazo razoável naquela situação. (…) Neste grupo de casos parece que, ao lado de outros o critério analítico do cumprimento ou não dos prazos processuais pode desempenhar um papel relevante …”.
Ainda no acórdão de 10.09.2009, Proc. nº083/09, daquele Venerando tribunal escreveu-se que : «… a definição do que seja um prazo razoável não só não é meramente objetiva como também essa qualificação não pode ser atribuída em abstrato antes havendo de ter em consideração as circunstâncias concretas de cada caso, designadamente as relacionadas com natureza e complexidade do processo, a conduta do requerente e o comportamento das autoridades competentes (magistrados, órgãos de polícia e agentes dos serviços de justiça). O que quer dizer que o facto da conclusão do processo ter excedido o prazo legal, pode não ser qualificado como ilícito e culposo - Vd., entre outros, Acórdãos deste STA de 15/10/98 (rec. 36.811) e de 17/03/2005 (rec. 230/03). Ou seja, a violação do direito a uma decisão num prazo razoável só pode gerar a obrigação de indemnizar se as circunstâncias concretas do caso ditarem que ela podia ter sido alcançada num prazo inferior ao que efetivamente foi e que tal só aconteceu por incúria ou negligência dos operadores judiciários …».
Arrimados a esta metodologia e aos critérios supra elencados, impõe-se, agora, aferir se, tendo a sentença recorrida considerado que, em concreto, ocorreu violação do direito à obtenção de decisão em "prazo razoável" por parte da aqui recorrida nos autos de oposição à execução fiscal que correram termos no TAF de Leiria, é adequado e justo o montante indemnizatório atribuído, de forma tabelar, sendo que a recorrente o não aceita por corresponder a cerca de um quarto da dívida exequenda, ou seja, em €1.710,00, considerando peregrino e que não encontra eco na Jurisprudência do TEDH ou Nacional o critério adoptado para com base no qual esse montante é inaceitável e desfasado dos parâmetros das duas Jurisprudências que invoca.
Significa que, numa perspectiva ampla, a recorrente assaca um erro de julgamento por “inaplicar” ou “não seguir” a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Porém, dúvidas não sobram de que, lendo a fundamentação jurídica da sentença, se constata que a decisão foi tomada com base nessa jurisprudência, concordando-se com a solução nela propugnada.
Na quantificação dos danos, já vimos que se deve atender ao disposto no artigo 3.° da Lei n.°67/2007, de 31/12 que, dispondo sobre a “Obrigação de indemnizar" estabelece que:
1 - Quem esteja obrigado a reparar um dano, segundo o disposto na presente lei, deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.
2 - A indemnização é fixada em dinheiro quando a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa.
3 - A responsabilidade prevista na presente lei compreende os danos patrimoniais e não patrimoniais, bem como os danos já produzidos e os danos futuros, nos termos gerais de direito. ”
Já vimos que pelo atraso na prolação de decisão no processo n.° 1653/10.7BELRA a Autora peticiona o pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais ou morais não inferior a dez mil euros, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento sobre essa verba.
Ora, o que se apurou nos autos (vide pontos 35 a 37 do probatório) foi que o decurso do processo causou efectivamente danos à Autora pois ela acreditava que o processo o processo n.° 1653/10.7BELRA se resolveria mais rapidamente do que sucedeu, tendo a demora na resolução do processo criado constrangimentos à Autora, que por força da delonga na resolução do processo viveu preocupada e nervosa com a angústia normal decorrente do atraso na prolação de uma decisão que veio, aliás a dar-lhe razão.
Nesse conspecto e concordando com a asserção vertida na sentença recorrida, considera-se que não resultou provado qualquer quadro de sofrimento de tal modo profundo, que mereça uma especial tutela ao abrigo do disposto no artigo 496.° do Código Civil, pois, sem embargo de o sentimento de preocupação e nervoso correspondentes à normal angústia com o atraso na prolação da decisão da causa não fique também a coberto desta tutela indemnizatória, o que apenas ficou demonstrado foi o normal e compreensivo estado de angústia da Autora com o atraso na composição judicial do litígio.
Ou seja e como diz a Mº Juíza, a tutela que a situação da Autora merece será apenas a correspondente ao dano não patrimonial comum decorrente do atraso na prolação de decisão judicial em prazo razoável, visto que não resultou provado nenhum outro dano não patrimonial especial que mereça tutela ao abrigo do artigo 496.° do Código Civil.
No ponto é pacífico, tal como também o entende a Autora e ora recorrente, que no arbitramento do montante indemnizatório haverá de ter em conta os padrões fixados pelo TEDH, relativos aos parâmetros a considerar na fixação do quantum indemnizatório por violação do direito à prolação de decisão em prazo razoável, sem olvidar a jurisprudência dos Tribunais nacionais superiores, que tem contribuído para a concretização dos mesmos.
Em reforço desse entendimento, a própria sentença o afirma:
“Nesse sentido é de atender à jurisprudência do TEDH referida inter alia no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no processo n° 7472/11, em
12/05/2011 [disponível em www.dgsi.ptl no qual se refere a existência de uma “(...) grelha estabelecida pelo TEDH no “caso Musci C. Itália” (P. 64699/01) variável entre 1000 e 1500 Euros por cada ano de demora do processo, nunca se poderia esquecer que se estava perante uma mera base de partida, suscetível de ser aumentada ou diminuída, de acordo com os danos concretos, a importância dos interesses em jogo e o comportamento do requerente eventualmente justificativo da demora.(...)
E à jurisprudência mais recente sobre a matéria, designadamente o recente acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.° 01004/16, em 11/05/2017 [disponível em www.dgsi.pt. no qual se faz um apanhado da jurisprudência do TEDH e dos Tribunais nacionais superiores referindo-se que: “(...)LI. Assim, e desde já, quanto a este ponto socorrendo-nos nesta sede daquilo que tem sido a jurisprudência do «TEDH» firmada quanto aos fatores que importa atender e considerar no juízo de equidade definidor do valor a arbitrar pelos danos mio patrimoniais extrai-se: i) consideração da duração do processo, que deve ser feita levando em conta os anos que o mesmo esteve pendente, apurando-se no seu conjunto e não isoladamente por cada ano de demora/atraso; ii) a importância do litígio e seu impacto na esfera jurídica da parte /especial relevância para as ações laborais, sobre o estado e capacidade das pessoas, sobre pensões, relativas à saúde ou à vida das pessoas/; iii) o comportamento da parte durante o processo; iv) o levar em consideração o próprio uive! de vida do país; v) e conduz à redução do montante a arbitrar o serem apuradas condutas que hajam importado ou contribuído para o retardamento do processo, o facto da participação no procedimento ter sido curta ou breve, o facto do litísio e sua decisão assumir pouca importância na esfera jurídica e patrimonial da parte, ou ainda o facto desta já ter obtido/recebido quantia em dinheiro destinada a indemnizar a lesão do direito a uma decisão judicia! em prazo razoável [cfr.. entre outros, Ac. do «TEDH» de 10.11.2004 (c. «Musci v. Itália», § 27) J.
LII. (...) quanto aos montantes que concretamente têm sido fixados pelo «TEDH» no quadro de petições dirigidas contra o Estado Português, aqui também, invocando a violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável, ressaltam, nomeadamente, as condenações de:
- 4.000,00 € [no Ac. daquele Tribuna! de 27.10.2009, no c. «Ferreira Araújo do Vale», §§ 22, 24
e 27 - relativo ao atraso verificado em ação (declarativa e executiva) instaurada no Tribunal de Trabalho ainda pendente e que se estendia já por 04 anos e 09 meses para uma só instância];
- de 3.500,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 13.04.2010, no c. «Ferreira Alves n.° 6», §§ 23 e 51 - relativo ao atraso verificado, nomeadamente, em ação de regulação de poder paternal/direito visitas que durou 07 anos e 11 meses, para dois graus de jurisdição];
- de 28.000,00 € [para um A.] [valor final esse correspondente à redução ao montante de 43.000,00 € do que foi o montante arbitrado ao \nesmo na ação indemnizatória interna] e de 11.000,00 € [para outros dois AA.J [valor final esse correspondente à redução ao montante de 21.000,00 € do que foi o montante arbitrado aos mesmos na ação indemnizatória interna] [no Ac. daquele Tribunal de 12.04.2011, no c. «Domingues Loureiro e outros», §§ 55, 60 e 68 - relativo aos atrasos verificados em ação cível (acidente de viação) e na ação indemnizatória fundada no atraso na administração da justiça, que, respetivamente, duraram 14 anos, e 20 dias para três instâncias percorridas, e 12 anos, 06 meses e 19 dias, numa só instância];
- de 1.200,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 20.09.2011, no c. «Ferreira Alves n.° 7», §§ 38 e 53 -relativo ao atraso verificado em ação cível para cobrança de dívida que durou 08 anos, 08 meses e 12 dias para três instâncias percorridas];
- de 7.600,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 04.10.2011, no c. «Ferreira Alves n.° 8», §§ 69/71 e 95 - relativo ao atraso verificado em três ações cíveis que duraram, respetivamente, 10 anos, 06 meses e 28 dias para duas instâncias, 12 anos, 05 meses e 01 dia para duas instâncias, e 09 anos e 14 dias para quatro instâncias];
- de 16.400,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 31.05.2012, no c. «Sociedade C. Martins & Vieira n.° 4», §§ 48/49 e 68/70 - relativo ao atraso verificado em duas ações cíveis (falência/verificação créditos e ação para efetivação de responsabilidade contratual por construção defeituosa de um imóvel) que, respetivamente, duraram 15 anos, 05 meses e 03 dias, para três instâncias, e 04 anos, 03 meses e 28 dias para duas instâncias] [aquele montante corresponde ao valor global arbitrado, resultante da soma duma primeira verba indemnizatória de 14.400,00 € (respeitante aos danos não patrimoniais decorrentes do atraso na ação falimentar) e duma segunda de 2.000,00€ (relativa aos danos pelo atraso na outra ação)];
- de 5.000,00 € [para uns requerentes] e de 4.800,00 € [para outros requerentes] [no Ac. daquele Tribunal de 16.04.2013, no c. «Associação de Investidores do Hotel Apartamento Neptuno e outros», §§ 48/50 e 77 - relativo ao atraso verificado em ações cíveis (de recuperação empresas, de falência, de reclamação e verificação créditos e ação para execução especifica de contrato-promessa) que, respetivamente, duraram 16 anos, 01 mês e 01 dia, para três instâncias, 18 anos, 04 meses e 13 dias para três instâncias, 14 anos, 03 meses e 20 dias em duas instâncias, e 14 anos, 05 meses e 12 dias numa só instância];
- de 15.600,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 30.10.2014, no c. «Sociedade C. Martins & Vieira e outros», §§ 50 e 73 - relativo ao atraso verificado em processo penal que durou 14 anos e 09 meses numa só instância] [quantia essa a ser repartida pelos três requerentes - 5.200,00 €];
- de 3.750,00 € [no Ac. daquele Tribuna! de 04.06.2015, no c. «Liga Portuguesa de Futebol Profissional», §§ 88 e 100 - relativo ao atraso \verificado em ação laborai que durou 09 anos e 07 meses, para três instâncias];
- de 11.830,00 € [no Ac. daquele Tribunal de 29.10.2015, no c. «Vaiada Matos das Neves», §§ 111 e 117 - relativo ao atraso verificado em ação de reconhecimento de direito quanto à existência de contrato trabalho com autarquia que durou 09 anos, 11 meses e 20 dias, num único grau de jurisdição], LIII. Já no plano interno e quanto aos litígios que concretamente têm sido julgados por este Supremo e os montantes fixados nas condenações do Estado Português por violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável resulta, nomeadamente, o seguinte:
- 5.000,00 € [2.500,00 € para cada um dos AA.] [no Ac. do STA de 28.11.2007 (Proc. n.° 0308/07) - relativo ao atraso verificado em ação cível (despejo), que intentada em 18.01.1995 ainda estava pendente em 2003, percorrendo duas instâncias];
- 5.000,00 € [2.500,00 € para cada um dos AA.] [no Ac. do STA de 09.10.2008 (Proc. n.° 0319/08) - relativo ao atraso verificado em execução sentença cível, intentada em 30.01.1997 e que perdurou até 22.02.2002, data em que foi declarada suspensa a instância nos termos do art. 882.° do CPC (na redação à data vigente), percorrendo cluas instâncias];
- 10.000,00 € [no Ac. do STA de 09.07.2009 (Proc. n.° 0365/09) - relativo ao atraso verificado em ação cível (acidente de viação) intentada em 15,07.1983 e que perdurou até 30.10.2003 (data em que se iniciaria a audiência de discussão e julgamento e em que o processo terminou por transação), correspondendo a uma duração superior a 20 anos numa só instância];
- 10.000,00 € [para um A.] e 5.000,00 € [para cada um dos dois outros AA.] [no Ac. do STA de 01.03.2011 (Proc. n.° 0336/10) - relativo ao atraso verificado em ação cível (inventário facultativo instaurado em 13.12.1981), pendente à data da instauração indemnizatória, ia para 26 anos, e sem que tivesse terminado, tendo percorrido duas instâncias];
- 3.550,00 € [para um A.[ e 1.500,00 € [para o outro A.[ [no Ac. do STA de 15.05.2013 (Proc. n.° 01229/12) - relativo aos atrasos verificados em processos tributários (impugnações judiciais - uma relativa a «IVA» e outra a «IRC»), processos que, tendo sido apresentados em juízo em 19.02.2003 só foram julgados em 18.10.2006, isto é, cerca de 03 anos e 08 meses depois da sua apresentação, sem que tivessem ocorrido incidentes anormais e em que os atrasos, fundamentalmente, resultaram de duas «paragens» do processo, a primeira, entre a contestação e a inquirição de testemunhas - mais de um ano - e, a segunda, entre a notificação para a apresentação das alegações finais e o julgamento - quase dois anos -, tendo percorrido apenas uma instância];
- 4.000,00 € [no Ac. do STA de 14.04.2016 (Proc. n.° 01635/15) - relativo ao atraso verificado em processo de menores (regulação do poder paternal), instaurado em 07.07.1999 e concluído em 18.01.2011, sempre na mesma instância, sendo que no valor arbitrado foi considerado apenas o período de duração (de 04 anos) e até ao seu termino |<correspondente ao período que a A. interveio, após ter atingido a maioridade];
- 4.800,00 € [para cada um dos AA.J [no Ac. do STA de 30.03.2017 (Proc. n.° 0488/16) - relativo ao atraso verificado em processo penal, no qual foi deduzida acusação em 30.04.2003 e que após cerca de 12 anos (à data da emissão da sentença na ação indemnizatória - 23.07.2015) ainda estava pendente mercê de suspensão aguardando a decisão dos processos tributários de impugnação judicial instaurados relativamente às liquidações de «IRC» e de «IVA»]. (...) ”
Como bem se refere ainda na sentença recorrida, “da referida jurisprudência resulta claro que a grelha estabelecida pela jurisprudência do TEDH é meramente indicativa, devendo atender-se na indemnização a fixar em concreto aos contornos do processo em que a mesma é arbitrada e ao enquadramento sistemático fornecido pelas demais decisões proferidas pelo TEDH e pelos tribunais nacionais sobre a matéria, por forma a assegurar a proporcionalidade da decisão.
Tanto mais que o arbitramento de indemnizações por danos não patrimoniais deve atender aos princípios gerais de direito aplicáveis, nomeadamente o princípio da proporcionalidade consagrado constitucionalmente e pela própria jurisprudência do TEDH em sede de aplicação das disposições da CEDH.
Nesse sentido, atente-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de proferido em sede de Revista n.°2613/08, em 09/12/2008 [disponível em www.dgsi.pt e em www.pgdlisboa.ptl. em cujo sumário se refere que: I-A jurisprudência vem definindo alguns orientadores que servem de guia à equidade na compensação dos danos não patrimoniais, cumprindo destacar, entre eles, a ideia da proporcionalidade, a necessidade de uniformização de critérios e o reconhecimento do carácter sancionatório da compensação deste tipo de danos.
II - A ideia da proporcionalidade parte do pressuposto que aos danos mais graves correspondem montantes mais elevados e esses danos mais graves respeitam à maior dignidade do hem jurídico em causa (...) ”
Desta feita e para assegurar uma fixação do quantum indemnizatório dos danos não patrimoniais comuns sofridos por atraso na justiça que seja conforme ao princípio da proporcionalidade cumprirá atender na fixação do mesmo não só ao lapso de tempo decorrido, mas também a aspetos específicos do litígio, designadamente o objeto do litígio (os bens jurídicos em causa), ao valor da ação e ao nível de vida em Portugal.
Isto, porque, por um lado, a medida da angústia que o atraso num o processo causa às partes varia necessariamente consoante o objeto do litígio (o bem jurídicos em causa) e consoante o valor da ação na ação em que ocorre o atraso, assumindo este último especial relevância quando em causa na ação em que se verifica o atraso esteja apenas o pagamento ou oposição ao pagamento de uma quantia certa, como sucede no caso aqui em apreço.
É certo que um juízo conforme ao princípio da proporcionalidade sempre terá que ter em atenção não só o valor objetivo da ação mas o valor subjetivo da mesma, sopesando o que a mesma vale para o lesado atenta a sua situação bio, psico, sócio cultural.
No entanto, há parâmetros objetivos que podem e começam a ser considerados pela jurisprudência.
Desde logo, verificando-se atraso na prolação de uma decisão num processo em que apenas se discute o pagamento de uma quantia certa e determinada, e em que o dano indemnizável seja apenas o dano não patrimonial comum que se presume desse atraso, afigura-se-nos manifestamente desproporcionada a atribuição a título indemnizatório de uma quantia que seja superior à quantia em causa nos autos em que se verificou o atraso.
Nesse sentido cumpre, numa lógica de proporcionalidade das indemnizações atribuídas pelo sistema judicial por danos da mesma índole, ter em atenção o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido no processo n.° 0678/11.0BEPRT, em 04/11/2016 [disponível em www.dgsi.ptl. em cujo sumário se refere que: “(...) Nos presentes autos está em causa indemnização devida pelo atraso na justiça decorrente um processo de impugnação judicial contra um acto de liquidação oficiosa de IRS, de um montante que não pode ser considerado muito elevado, e que terminou com a prescrição da dívida. A duração do processo, de cerca de oito anos, causou ao recorrente aborrecimentos, irritações e ansiedade. Nestes termos, considera-se como adequado o montante articulado pela 1a instância, no montante de €4 000,00, quase um quarto do valor do processo. (...)”.
Concordamos, na parte aqui transcrita, com o entendimento vertido nesse acórdão, que se nos afigura conforme com o princípio da proporcionalidade e com o nível de vida do nosso país.
Sendo que, conforme supra referido, tais fatores devem ser sopesados na atribuição de uma indemnização, especialmente quando apenas estejam em causa os normais danos morais que decorrem do atraso na prolação de decisão em prazo razoável numa ação em que apenas se discute a execução com vista ao pagamento de uma quantia certa, como sucede no caso em apreço em que a ação em que se verificou o atraso se tratava de uma oposição à execução fiscal.
Transpondo esse entendimento para o caso aqui em apreço, uma vez que na ação na qual se verificou o atraso na prolação de decisão (o processo n.°1653/10.7BELRA), estava em causa a oposição à execução fiscal em que a Autora era executada com vista ao pagamento da quantia de €6.833,89 [cf. pontos 1. e 2. do elenco dos factos provados] e atendendo a que a duração do processo foi de 5 anos e 14 dias [cf. pontos 1. a 26. do elenco dos factos provados], julga-se adequada e conforme com o disposto no artigo 566.°, n°s 2 e n.°3 do Código Civil a atribuição à Autora de uma indemnização no montante de €1.710,00, que corresponde, aproximadamente a um quarto do valor em discussão na ação em que se verificou o atraso na prolação de decisão.”
Concordamos, pois, com o fundamentado pela julgadora na sentença recorrida já que o valor da indemnização foi fixado equitativamente pelo Tribunal, de harmonia com o disposto no n.°4 do artigo 496,° do CC, atendendo a todas as circunstâncias que foram apuradas e que relevavam para o efeito.
Seguindo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem nos termos expostos supra, considerando a generalidade das matérias e abrangendo a 1ª e 2ª instância, tem-se como padrão referencial de razoabilidade de duração média global do processo, o período de 4 a 6 anos.
A este respeito, importará salientar que, tal como nos dá conta Isabel Celeste M. Fonseca, in “Cadernos de Justiça Administrativa”, n.°72, página 41, o valor de indemnização atribuído pelo TEDH a título de danos morais cifra-se, em média, em menos de EUR 1.000,00 por ano de atraso no processo (neste sentido, vide ainda os acórdãos proferidos pelo TCA Sul em 12.05.2011 e 21.11.2013, no âmbito dos processos n.ºs 07472/11 e 09424/11, respectivamente).
Contudo, este montante corresponde a uma média aritmética e não poderá, como tal, ser aplicado tout court, sem mais. Diversamente, e ainda que possa servir como um referencial a atender pelo julgador, sempre poderá este aumentá-lo ou diminuí-lo, em função dos danos concretamente sofridos, segundo critérios de equidade.
Ora, no caso dos autos, ficou provado que o A. padeceu de ansiedade, depressão, incerteza, tristeza, inquietude e irritabilidade, os quais decorreram - ainda que não exclusivamente - do facto omissivo ilícito e culposo que é imputado ao R. e que se traduz na não prolação de decisão judicial em tempo razoável.
Por outro lado, e ainda que se reportasse a créditos fiscais, o litígio a decidir na acção visada pelos presentes autos respeitava exclusivamente a uma questão de natureza pecuniária, sendo certo que, o valor em execução não era consideravelmente elevado.
Seguindo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem nos termos expostos supra, considerando a generalidade das matérias e abrangendo a 1ª e 2ª instância, tem-se como padrão referencial de razoabilidade de duração média global do processo, o período de 4 a 6 anos.
De acordo com a doutrina exposta no Acórdão STA 1004/16, 11.05.2017 no dever de indemnizar por “(...) danos não patrimoniais, importa atender ao regime legal do art. 496.º do C. Civil que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito [n.º 1], sendo o montante fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494.º, isto é, tomando em consideração o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso [n.º 3] (..) Tudo com o objetivo de, após a adequada ponderação, poder concluir a respeito do valor pecuniário que considere justo para, no caso concreto, compensar o lesado pelos danos não patrimoniais que sofridos com a lesão do seu direito a uma decisão judicial em prazo razoável. (..)”, sendo que “(..) este Supremo Tribunal tem jurisprudência firme e consolidada no sentido de que os “… danos não patrimoniais que segundo o conhecimento comum sempre atingem os demandantes, isto é, ocorrem em praticamente todos os casos de atraso significativo na atuação da justiça, merecem, em princípio, a tutela do direito, não sendo de minimizar na respetiva relevância, sem prejuízo de prova em contrário, ou de diferente causalidade, em cada caso …”, na certeza de que se “… a parte que invoca a lesão alegar e procurar provar mais danos do que os comuns, mas não conseguir provar que os sofreu, nem por isso fica prejudicada no direito à indemnização que resulta da presunção natural de um dano moral relevante, salvo quando se provar que em concreto, mesmo este, não ocorreu …” [cfr. jurisprudência iniciada pelo Ac. deste Supremo de 28.11.2007 - Proc. n.º 0308/07, seguida e aprofundada pelo seu Ac. de 09.10.2008 - Proc. n.º 0319/08, e sucessivamente reiterada, nomeadamente, nos Acs. de 09.07.2009 - Proc. n.º 0365/09, de 01.03.2011 - Proc. n.º 0336/10, de 15.05.2013 - Proc. n.º 01229/12, e de 14.04.2016 - Proc. n.º 01635/15]. (...)”.
Tudo visto, ao abrigo do regime do artº 12º Lei 67/2007, 31.12, considera-se adequado o valor arbitrado de indemnização a título de danos não patrimoniais causados pelo funcionamento anormal dos serviços de administração da justiça, o valor global de 1,710, 00€ (mil setecentos e dez euros).

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Improcedem, nos sobreditos termos, as conclusões de recurso.

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3- Decisão

Assim, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença na parte recorrida.

Custas pela recorrente sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.
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Lisboa, 23 de Maio de 2019
(José Gomes Correia)
(Paulo Gouveia)
(Sofia David)