Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:11557/14
Secção:CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:07/09/2015
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores: INSTRUÇÃO
Sumário:I - O juiz pode decidir na fase do saneador a causa ou um dos pedidos, com base em documentos entretanto por ele obtidos logo após os articulados.

II - O inquisitório do juiz, logo após os articulados, não exige prévia base instrutória ou prévia fixação dos “temas da prova” (ou temas da instrução).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

JOAQUIM …………………….., entretanto substituído nesta AAE por HABILITAÇÃO de Eduarda …………………….., de Teresa …………………………….. e de Margarida………………………………………., intentou em 6-11-2012 no T.A.C. de Sintra

Ação administrativa especial contra

· MUNICIPIO DE CASCAIS.

Por despacho interlocutório de 8-1-2014, emitido após a contestação de 9-7-2013 e antes do saneador (de 31-10-2014), o referido tribunal decidiu apreciar do seguinte modo um requerimento feito na p.i.:

«A Autoridade Demandada detém o dever de remeter ao Tribunal os elementos que disponha relativos ao procedimento administrativo (art. 8º, nºs 3 e 4, e 84º, nº1 do CPTA). Acontece que as informações pretendidas pelo Autor se destinam, como alega, para aferir da "alegada fundamentação" do ato impugnado, que segundo o mesmo padece de falta de fundamentação, o que configura vício do ato, não sendo esta ação o meio processual para colmatar eventuais "correções ou aperfeiçoamentos" de atos administrativos. Pelo que se indefere o requerido».

Na p.i. havia sido feito o seguinte requerimento:

Uma «Relação com a identificação do número de polícia dos Imóveis edificados no Quarteirão em causa e adjacentes, de construção ilegal e do conhecimento da CMC, como resulta dos Pareceres/Informações exaradas pela Srª Arqtª Margarida………........, devendo-se indicar na aludida Relação o número de Processo de obra dos requeridos Imóveis, requerendo-se igualmente junção dos respetivos Processos Camarários, para se aferir da "ALEGADA", mas inexistente fundamentação, que só será possível alcançar, como medida de recurso, através de uma análise comparativa, das decisões com as respetivas fundamentações, naqueles Processos Camarários».

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Inconformada, a a. recorreu em 27-1-2014 para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:



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O Ministério Público foi notificado para se pronunciar como previsto na lei de processo.

Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência.

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II. FUNDAMENTAÇÃO

Estamos ante um despacho, anterior ao saneador mas posterior aos articulados, sobre um requerimento de prova. O recurso foi, sem mais (cf., no entanto, o art. 641º NCPC), mandado subir por despacho de 30-9-2014.

Para o recorrente, tal despacho só poderia ser emitido durante ou após a fase prevista nos arts. 87º a 90º do CPTA e viola o art. 429º NCPC, segundo o qual

«1 - Quando se pretenda fazer uso de documento em poder da parte contrária, o interessado requer que ela seja notificada para apresentar o documento dentro do prazo que for designado; no requerimento, a parte identifica quanto possível o documento e especifica os factos que com ele quer provar.

2 - Se os factos que a parte pretende provar tiverem interesse para a decisão da causa, é ordenada a notificação».

1º)

Ora, quanto ao 1º ponto, findos os articulados o juiz está em condições de julgar da importância e utilidade de certo meio de prova.

Pelo que o ora recorrente não tem razão, quando faz depender o momento do facto de haver ou não base instrutória. Com efeito, mesmo sem esta, o juiz pode decidir no saneador-sentença com base em documentos entretanto obtidos.

2º)

Quanto ao 2º ponto, o do interesse dos documentos para a decisão da causa, teremos de apurar o objeto da ação, conformado pelo pedido e pela causa de pedir, atendendo ainda à contestação. Assim veremos se o despacho recorrido violou ou não o nº 2 do art. 429º NCPC.

Ora, o que resulta da p.i. é que o autor considera (algo confusamente), entre outras ilegalidades, que houve violação do princípio da igualdade, sendo que estas informações documentais serviriam para aquilatar disso no caso concreto. Note-se que há elementos para se afirmar ou concluir que o A., aqui, pretende beneficiar da mesma ilegalidade “concedida” a outros. Do teor da p.i. é possível concluir precisamente isso, bem como do próprio requerimento recusado: «identificação do número de polícia dos Imóveis edificados no Quarteirão em causa e adjacentes, de construção ilegal e do conhecimento da CMC».

Daqui concluímos que, além do referido no despacho recorrido quanto à fundamentação do ato administrativo, os documentos solicitados não têm interesse probatório (lícito), porque o autor necessita deles para demonstrar que poderia beneficiar, ele também, de uma ilegalidade administrativa concedida a outros pelo réu. Só que não há, evidentemente, tutela da igualdade dentro da ilegalidade, porque a ação serve para tutelar a legalidade administrativa, a juridicidade.

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III. DECISÃO

Por tudo quanto vem de ser exposto e de harmonia com os poderes conferidos no artigo 202º da Constituição, acordam os Juizes do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo a cargo do recorrente.

Lisboa, 9-7-15

(Paulo H. Pereira Gouveia - relator)

(Nuno Coutinho)

(Carlos Araújo)