Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:458/21.4BELLE
Secção:CA
Data do Acordão:03/19/2024
Relator:MARA DE MAGALHÃES SILVEIRA
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL
MATÉRIA DE FACTO
CONDENAÇÃO À PRÁTICA DE ATO DEVIDO
LIMITES DA DECISÃO
INTERPRETAÇÃO DAS PEÇAS DO PROCEDIMENTO
Sumário:I - Não há que aditar à factualidade provada, conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos, que não constituem acontecimentos ou factos concretos.
II - Os processos de condenação à prática de atos administrativos podem conduzir a pronúncias: (i) de condenação à prática de um ato com um determinado conteúdo, nas hipóteses de este resultar estritamente vinculado do quadro normativo aplicável ou, envolvendo a sua prática o exercício de poderes discricionários, reconhecer-se apenas uma solução como legalmente possível; (ii) envolvendo a prática do ato o exercício de poderes discricionários, sem que se esteja perante a redução da discricionariedade a zero, na explicitação das vinculações a observar pela Administração na emissão do ato; (iii) na condenação da Administração a praticar um qualquer ato administrativo, sem conter especificações quanto ao seu conteúdo.
III - A resposta quanto a saber perante qual das hipóteses se encontra o Tribunal, e até onde podem ir os seus poderes de pronúncia, encontra-se na análise da situação concreta trazida a juízo à luz do quadro normativo definido pela lei e pelas peças do procedimento adjudicatório aplicável ao ato devido, aferindo-se se este envolve a formulação de valorações próprias da função administrativa, e em que grau ou medida se desenvolve a margem de livre apreciação da Administração, ou se o ato devido apresenta um conteúdo vinculado.
IV - Ainda que perante um quadro regulatório que aparenta ser vinculado, a atividade procedimental da Administração, concretamente no exercício dos poderes de análise e avaliação de propostas em sede de procedimentos concursais, envolve o ajuizamento sobre os elementos que são submetidos à sua apreciação, que integra a sua margem de livre apreciação e à qual o Tribunal não se pode substituir.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de CONTRATOS PÚBLICOS
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa, subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

N..... – S...... Lda. (doravante Recorrente ou A.) intentou, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a presente ação de contencioso pré-contratual contra a Sociedade de Instrução e Beneficência “A.........” (doravante Recorrida, R. ou VO), indicando como contra-interessadas P......, Lda., G...... – C......, S.A., I......, S.A. e a E........., Lda., peticionando (i) a declaração de invalidade do ato, notificado em 29.01.2020, que, no âmbito do concurso público para aquisição de serviços de confeção e fornecimento de refeições nas cantinas, a funcionários e utentes da ré, revogou a decisão de contratar e (ii) a condenação da ré à prolação de ato que adjudique a proposta por si apresentada no concurso em apreço.
Por sentença de 30 de outubro de 2020 o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa julgou a presente ação parcialmente procedente e, em consequência, anulou a decisão de não adjudicação e consequente revogação da decisão de contratar e condenou o R. a retomar o procedimento concursal a partir da fase de audiência prévia dos concorrentes quanto ao relatório preliminar.
Inconformada, a autora interpôs recurso jurisdicional para este Tribunal Central Administrativo Sul dessa decisão, na parte em que decidiu não condenar a R. a adjudicar a sua proposta. Nas suas alegações, concluiu nos seguintes termos:

“1.ª Como se retira da leitura da Douta Sentença e da Petição Inicial dos autos que correram termos no TAC de Lisboa, a acção proposta pela ora Recorrente tinha essencialmente duas partes, e dois pedidos distintos: o primeiro, de declaração de invalidade do acto que, pondo termo ao procedimento, decidiu não adjudicar e revogou a decisão de contratar; e o segundo, de condenação da entidade adjudicante na prática do acto devido, em concreto, da adjudicação da proposta da N..........
2.ª Destes dois pedidos, o primeiro foi julgado procedente, tendo o Meritíssimo Tribunal a quo considerado bem fundada a argumentação da A., ora Recorrente, e em consequência, o acto da Recorrida que decidiu pela não adjudicação do procedimento e pela revogação da decisão de contratar foi anulado pelo Tribunal.

3.ª Não é deste segmento da Douta Sentença que agora se recorre: esse segmento encontra-se totalmente fora do âmbito do presente recurso jurisdicional, o que se refere nos termos e para os efeitos do artigo 635.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA.

4.ª O presente recurso incide, antes, sobre a decisão tomada em relação ao pedido constante da alínea b) do petitório da PI – o pedido de condenação na prática do acto de adjudicação (para mais fácil identificação: trata-se do segmento decisório correspondente às pp. 46-48 da Douta Sentença).

5.ª Delimitado desta forma o âmbito do recurso, há que começar por referir que o primeiro ponto de divergência face à Douta Sentença se prende com a decisão da matéria de facto, que em parte se impugna.

6.ª Com efeito, à Douta Sentença faltou levar aos factos dados como provados dois factos que são essenciais à boa decisão da lide, e que resultam bastamente provados pela instrução da causa, o que aqui se invoca nos termos e para os efeitos dos artigos 640.º, n.º 1, e 662.º, n.º 1, do CPC.

7.ª Esses dois factos, que se requer sejam acrescentados aos factos provados por esse Venerando Tribunal Central Administrativo, pelos motivos melhor desenvolvidos na presente alegação, são os seguintes: em primeiro lugar, “A proposta da P...... propõe, nos lotes 2, 4, 5 e 6, preços superiores aos preços base parcelares constantes, para cada um desses lotes, da “Lista de Lotes” anexa ao Programa de Procedimento”; e em segundo lugar, “De entre as propostas que não violam o preço base global ou os preços base parcelares fixados pelo Programa de Concurso, a proposta da A. foi a que apresentou o preço mais baixo, de 53.044,00€”.

8.ª Conforme se explicitou, é convicção da Recorrente que estão reunidas condições para ser praticado um acto de adjudicação da sua proposta, verificando-se, assim, no seu entender, erro de julgamento na Douta Sentença recorrida.

9.ª É inequívoco, em primeiro lugar, que o dever de adjudicar constante do artigo 76.º do CCP obriga a entidade adjudicante, uma vez iniciado o procedimento, a concluí-lo com uma decisão de adjudicação, caso não se verifique uma causa de não adjudicação, e exista, pelo menos, uma proposta adjudicável, quer dizer, uma proposta que não preencha qualquer causa de exclusão. Nesse mesmo sentido se pronunciou a Douta Sentença (na parte de que não se recorre aqui).

10.ª No presente caso, existiu uma pluralidade de concorrentes. Neste caso concreto, isso não origina, porém, qualquer discricionariedade na determinação da proposta a adjudicar, por força de um elemento específico deste concurso: o critério de adjudicação, que é, neste procedimento, o do mais baixo preço – artigo 14.º, n.º 1, do Programa de Procedimento – o que, embora fosse objecto de dúvidas injustificadas da Recorrida, foi decidido, sem margem para dúvidas, na Douta Sentença (cf. p. 46 da Douta Sentença).

11.ª Definir quem é o adjudicatário dependerá apenas de encontrar a proposta com preço mais baixo, que é a da Recorrente, o que se alcança por uma operação puramente vinculada, que o Tribunal pode e deve realizar, por ser de natureza exclusivamente factual, consistindo na constatação de qual o preço global mensal proposto pela Recorrente, que é, como se alcança dos elementos instrutórios dos autos, de 53.044,00€.

12.ª É certo que a proposta de mais baixo valor tem de ser adjudicável, e por esse motivo, não pode estar afectada por uma qualquer causa de exclusão. A determinação da proposta de mais baixo preço só se pode fazer de entre o universo das propostas que possam ser admitidas.

13.ª É precisamente neste ponto, parece-nos, que se cria, no raciocínio que orientou a Douta Sentença (e ao Douto Acórdão do TCA Norte aí citado), uma fragilidade que redundou na conclusão de que o Tribunal não pode condenar a entidade adjudicante no acto de adjudicação. De facto, o ponto central que levou o Tribunal a quo a considerar-se impedido de emitir, neste momento, essa condenação, é, manifestamente, o facto de o Tribunal ter entendido que isso seria substituir-se indevidamente à Recorrida.

14.ª Tal entendimento do Tribunal, a nosso ver, é desconforme com o preceituado na lei acerca dos poderes (que são poderes-deveres) de pronúncia do Tribunal nestes casos, em concreto, dos artigos 66.º, n.º 2, 71.º e 95.º, n.º 5, do CPTA, aqui aplicáveis por estarmos – no pedido que está em causa no presente recurso – no âmbito da condenação na prática de acto devido.

15.ª Quando tenha sido formulado um pedido de condenação na prática de acto devido, o Tribunal não pode invocar a falta de tomada de uma decisão por parte do órgão competente (uma omissão) ou um acto expresso, mas ilegal, para devolver a esse órgão a possibilidade de emitir uma decisão: isso é a própria negação da utilidade da condenação na prática de um acto administrativo devido.

16.ª Se há coisa que o órgão adjudicante já devia ter feito, e teve ocasião de fazer, era decidir este procedimento concursal de acordo com a lei. O prazo para isso ocorrer, decorrente da articulação do artigo 76.º do CCP com o artigo 65.º do mesmo Código, há muito transcorreu: as propostas foram entregues em Dezembro de 2019.

17.ª As questões que o Tribunal a quo quer devolver à Recorrida para decidir, são questões que já foram trazidas aos presentes autos pela Recorrente, estando em condições de ser decididas aqui e agora, sem retardar inutilmente a tutela jurisdicional, sendo precisamente esse o propósito da condenação na prática do acto devido: discutir o cerne da relação material controvertida, em vez de o autor ser mantido no “pingue-pongue” que o obrigue a discutir cada uma das definições contingentes da situação pelo órgão administrativo.

18.ª Considerando o percurso procedimental concreto, a relação material concreta que temos em mãos, vemos que a única causa de exclusão de proposta que o júri equacionou como podendo justificar a hipotética exclusão da Recorrente – e que foi submetida a audiência prévia – foi o facto de, alegadamente (pois nem sequer isso é concretizado), a Recorrente não ter tido o melhor preço em alguns dos lotes do concurso, sugestão que, pelas razões desenvolvidas supra, nesta alegação, deve ser liminarmente rejeitada.

19.ª Pelo que não se pode aceitar o único fundamento que a Recorrida equacionou para excluir a proposta da Recorrente, devendo registar-se que nem na Contestação, nem em qualquer outro momento da presente lide, a Recorrida apresentou qualquer outro fundamento de exclusão que pudesse levar à exclusão da proposta da Recorrente.

20.ª O mesmo tem de dizer-se quanto à exclusão das propostas apresentadas ao procedimento que têm preço acima do preço base, e que obrigatoriamente, sem qualquer margem de livre decisão, terão de ser excluídas, incluindo a proposta da P...... – única que vale a pena mencionar aqui, pois foi a que teve um preço global inferior ao preço global da Recorrente – apresentou, em quatro dos seis lotes (lotes 2, 4, 5 e 6), preços superiores aos preços base parcelares fixados para esses lotes. Por isso, o Júri propôs a respectiva exclusão, em sede de Relatório Preliminar.

21.ª Também não se percebe qual a razão de insistir na audiência prévia, quando a audiência prévia feita sobre o Relatório Preliminar já propunha a exclusão da proposta da P......, não tendo esta empresa expressado qualquer oposição a essa proposta em sede de audiência prévia (como se retira do processo instrutor, nomeadamente do Relatório Final, que refere que apenas a Recorrente e a concorrente E......... apresentaram pronúncia); e também propunha (mal) a exclusão da proposta da Recorrente, tendo a Recorrente demonstrado por completo, em pronúncia em audiência prévia, a inexistência daquele fundamento de exclusão.

22.ª A audiência prévia afigura-se, assim, neste contexto de decisões vinculadas e já previamente submetidas ao contraditório procedimental, como uma formalidade, em concreto, completamente inútil, ao que ainda acresce que todos os participantes no procedimento pré-contratual, sem excepção, foram citados, como contra-interessados, para a presente acção, não tendo um único desses juntado procuração, apesar de conhecerem a totalidade da pretensão que a Recorrente formulou, incluindo o pedido de condenação à adjudicação da sua proposta.

23.ª A decisão recorrida coloca-se em contradição com os já referidos artigos 66.º, n.º 2, 71.º e 95.º, n.º 5, do CPTA, pois o pressuposto de recurso a uma acção de condenação não é que um órgão tenha tomado uma posição expressa sobre uma questão que deve decidir, mas sim que esse órgão tenha um dever de decidir, que não cumpriu, ou cumpriu mal, o que desencadeia a possibilidade de o interessado ir discutir a questão com o propósito de obter uma decisão de plena jurisdição.

24.ª Assim, estão, neste caso concreto, reunidos os pressupostos que permitem tratar a decisão de adjudicação da proposta da Recorrente como um acto administrativo devido, e consequentemente, que habilitam o Tribunal a condenar exactamente na prática desse acto.

25.ª Além disso, mesmo que fosse de considerar – o que apenas por cautela de patrocínio se admite – que o Tribunal estivesse impedido de emitir uma decisão que condenasse plena e completamente, sem condições, na emissão de adjudicação a favor da Recorrente, teria de se reconhecer que há um dever judicialmente exigível de emitir uma (nova) decisão do procedimento. Isto é inequívoco, decorrendo do artigo 76.º do CCP, e é mesmo afirmado, a outro propósito, pelo Tribunal a quo, como se viu.

26.ª E assim sendo, e por ter sido deduzido um pedido de condenação nesta acção, o Tribunal teria de condenar a Recorrida a praticar esse acto, não se limitando a “devolver-lhe a palavra”, mas explicitando os parâmetros vinculados da decisão que a Recorrida terá de tomar, nos termos do artigo 71.º e do n.º 5 do artigo 95.º do CPTA. Trata-se, claramente, de um dever do Tribunal, mesmo nos casos em que o pedido do autor tenha sido de prática de um acto com certo conteúdo, o de condenar mais restritamente, com indicação das vinculações a observar – artigo 71.º, n.º 3, do CPTA.

27.ª Neste caso, explicitar os parâmetros vinculados da decisão obrigaria o Tribunal a tomar posição precisamente sobre os aspectos que a Recorrida, durante o procedimento e nestes autos de contencioso pré-contratual, tem considerado (indevidamente, no entender da Recorrente) como obstáculos à condenação no acto de adjudicação da proposta da Recorrente. É a única forma de a decisão de condenação ser útil: não pode tratar-se de um enunciado abstracto de vinculações, mas daquelas que no caso se torne possível ao tribunal conhecer (e sejam relevantes).

28.ª A condenação que sai destes autos não pode limitar-se a dizer algo sobre o reexercício do poder de concluir o procedimento com uma decisão de não adjudicação; tem de dizer, também, algo sobre o modo como a Recorrida deve suprir a omissão, que até aqui existiu, de decisão final de ordenação dos concorrentes de acordo com a lei e o critério de adjudicação.

29.ª Consequentemente, atenta a conduta da Recorrida no procedimento e nestes autos, uma decisão condenatória útil e fiel à ideia de tutela jurisdicional efectiva terá de pronunciar-se no sentido de ser ilegal a pretensão de excluir a Recorrente com o fundamento invocado pela Recorrida; terá de esclarecer que a proposta da Recorrida é, de facto, de entre as que podem ser adjudicadas, a que tem o melhor preço; e referir, ainda, que qualquer que seja o conteúdo do acto de ordenação final, a proposta de preço mais baixo de entre as adjudicáveis será sempre a da Recorrente.

30.ª Podendo todas essas apreciações ser feitas sem lesão do princípio da separação de poderes, elas têm de ser feitas; não o tendo feito o Tribunal a quo, pode, e, no entender da Recorrente, deve, esse Venerando Tribunal Central Administrativo fazê-lo.

Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, e parcialmente revogada a decisão recorrida, na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação da Recorrida na prática do acto de adjudicação da proposta da Recorrente, determinando-se essa mesma condenação na prática do acto de adjudicação da proposta da Recorrente, ou, no mínimo, proferindo-se decisão condenatória que explicite devidamente as vinculações concretas a observar pela Recorrida no novo acto, tudo nos termos legais, com o que se fará a necessária Justiça.”

A Recorrida e as Contrainteressadas não apresentaram alegações.

O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

O Ministério Público junto deste TCA Sul, notificado nos termos e para efeitos do disposto no n.º 1, do artigo 146.º do CPTA, não emitiu parecer.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II. Delimitação do objeto do recurso

Em face das conclusões formuladas, cumpre apreciar se a sentença recorrida padece de,
i. Erro de julgamento de facto, por deverem ser aditados factos à matéria de facto provada;
ii. Erro de julgamento de direito, decorrente de estarem preenchidos os pressupostos para a condenação da Recorrida/Entidade Demandada a praticar o ato de adjudicação à proposta da Recorrente.

III. Fundamentação de facto

III.1. Na sentença recorrida foi julgada provada a seguinte factualidade:

A) Em 2 de Dezembro de 2019 foi publicado no Diário da República o anúncio n.º …../2019, através do qual se publicitou a abertura de concurso público para aquisição de serviços de confecção e fornecimento de refeições nas cantinas, a funcionários e utentes, da ora R. SOCIEDADE DE INSTRUÇÃO E BENEFICÊNCIA “A.........”, e onde consta o seguinte:
“(…)

(…)

(…)


(…)”- cfr. doc. nº 4, junto com a p.i..
B) Constava do Programa do Procedimento o seguinte:
“(…)

- cfr. PA_fls. 16 e s.
C) Em 04 de Dezembro de 2019, na sequência de esclarecimentos solicitados pelos concorrentes N......... e E......... “foi disponibilizada uma versão actualizada do Programa do Procedimento”, e onde consta o seguinte:


(…)




(…)




(…)







(…)


(…)





(…)”– cfr. PA_fls. 29 e s./doc. 1, junto com o req. da Demandada em 01/07/2020.
D) Na mesma data, em 04 de Dezembro de 2019, o júri prestou os seguintes esclarecimentos:
“(…)
2- Programa do Procedimento:
2.1.Artigo 3º
O preço base deste procedimento é o somatório de todos os lotes (54.500,00€) e é relativo a um mês de execução contratual.
2.2. Artigo 13º
A análise e exclusão das propostas, ocorrerá de acordo com o artigo nº 70 do CCP.
2.3.Artigo 14º
Em caso de empate entre propostas, será escolhida a que apresentar em mais detalhe o plano de cumprimento do nº 6 das páginas 5 e 6 do caderno de encargos.
2.4.Artigo 22º
Após o envio do relatório preliminar os concorrentes tem um prazo de cinco dias para se pronunciarem.
3- Esclarecimentos ao Caderno de Encargos:
(…)
3.4- A Adjudicação será para a totalidade dos equipamentos contudo a proposta deverá ser apresentada por lotes.
(…)” – cfr. PA_esclarecimentos a fls. 45.
E) Consta do Caderno de encargos o seguinte:
“(texto integral no original; imagem)”






“(texto integral no original; imagem)”





- cfr. doc. nº 5, junto com a p.i..
F) Apresentaram-se ao concurso os seguintes concorrentes: G...... – C......, S.A., P......, Lda, E........., Lda., I…. – I…., S.A. e N..... – S......, Lda. – cfr. PA_propostas a fls. 50 e s..
G) Em 08/01/2020 o júri elaborou o Relatório preliminar, onde consta o seguinte:




“(texto integral no original; imagem)”



“(texto integral no original; imagem)”


(…)” – cfr. doc. nº 7, junto com a p.i..
H) A aqui A. N......... apresentou pronúncia em sede de audiência prévia, referindo o seguinte:
“(…)
6. A esta proposta de exclusão da N........., falta, desde logo, uma fundamentação de facto suficiente, pois não se sabe quais os concorrentes, que têm preços “mais favoráveis” do que os preços da N........., e em que lotes isso acontece.
7. Por outro lado, falta igualmente fundamentação de direito, pois é manifestamente insuficiente incluir uma referência vaga e genérica aos artigos 70.º, n.º 2, e 146.º, n.ºs 2 e 3 do CCP para uma proposta de exclusão estar fundamentada. Os artigos 70.º, n.º 2, e 146.º, n.ºs 2 e 3 do CCP contêm, nada mais nada menos, do que todas as causas de exclusão de propostas em procedimentos de contratação pública, que vão desde a violação do preço base até às práticas anti-concorrenciais, passando por muitas outras. Qual é, dessas múltiplas e variadas causas de exclusão, aquela que o Exmo. Júri considerou aplicável à N.........? Não se sabe. E porque não se sabe, falta a fundamentação que a lei exige. (…)
8. A falta de fundamentação desta proposta de exclusão é suficiente para, por si só, invalidar a decisão final, nos termos gerais (artigo 163.º, n.º 1, do CPA), bem como o contrato (artigo 283.º, n.º 2, do CCP).
III. Da inexistência, na lei ou nas peças do procedimento, do fundamento de exclusão invocado pelo Exmo. Júri
9. Há, porém, outras, e mais graves, ilegalidades. Com efeito, em vão procurará a entidade adjudicante, no artigo 70.º n.º 2, no artigo 146.º, n.ºs 2 ou 3, do CCP, qualquer fundamento de exclusão de propostas que diga respeito a casos em que um concorrente simplesmente não tem melhor proposta de entre as outras (e, repete-se, não se sabe se é isso que acontece, porque o Exmo. Júri não diz quais são os lotes em que isso acontece).
10. De facto, pode dizer-se que nunca se viu qualquer proposta de exclusão de uma proposta de um concorrente com esse fundamento. Este procedimento é o primeiro em que a N......... assiste a uma situação destas.
11. Não é por acaso: é que, na verdade, não existe, na lei, qualquer fundamento de exclusão de propostas que o permita. O facto de um preço ser melhor ou pior é uma questão de avaliação de propostas, e aplicação do critério de adjudicação. À luz do critério de adjudicação, uma proposta pode não ser a melhor (não é, já se dirá, o que acontece aqui); mas não pode ser excluída por isso. Se uma proposta cumpre o caderno de encargos – como acontece com a proposta da N......... – então ela não pode ser excluída, e tem de ser admitida e ordenada. Pensa-se que isto é evidente, até porque pode perfeitamente acontecer que, por exemplo, o adjudicatário não apresente documentos de habilitação, ou não preste caução, e nesse caso, é obrigatório adjudicar ao concorrente ordenado em lugar subsequente (artigos 86.º, n.º 4, e 91.º, n.º 2, do CCP).
12. Da mesma maneira que não existe, na lei, fundamento para excluir, também não existe esse fundamento nas peças do procedimento. Estas poderiam, em tese, prever outros fundamentos de exclusão, desde que fossem proporcionais, justificados e em geral conformes aos princípios da contratação pública. Mas basta olhar para o artigo 13.º, n.ºs 2 e 3, do Programa do presente Concurso, para se verificar que a entidade adjudicante não acrescentou, neste procedimento, qualquer fundamento de exclusão inovador face aos que já resultam da lei.
13. Ou seja, a proposta de exclusão contida no Relatório Preliminar não encontra qualquer suporte, nem na lei, nem nas peças do procedimento. (…)
IV. Da violação do artigo 14.º do Programa de Concurso e do n.º 1 do Caderno de Encargos pelo Relatório Preliminar. A adjudicação da proposta da N......... como único desfecho válido para o presente procedimento
15. Mas não é tudo, pois verifica-se que a proposta de exclusão da proposta da N......... é afectada ainda por outro grave problema, qual seja, uma patente falta de respeito, por parte da entidade adjudicante, do critério de adjudicação e modo de avaliação das propostas por si fixados.
16. Do artigo 14.º, n.º 1, do Programa de Concurso, resulta, taxativamente, que o critério de adjudicação é o do melhor preço. O melhor preço significa, simplesmente, o melhor preço, quer dizer, o melhor preço global, uma vez que o procedimento não é objecto de adjudicação por lotes.
17. Que o procedimento não é objecto de adjudicação por lotes, decorre do facto de o Caderno de Encargos identificar de forma claramente unitária o objecto do contrato: o n.º 1 do Caderno afirma, taxativamente, que o “Objecto do contrato” (epígrafe do n.º 1) é “Prestação de serviço de alimentação nos equipamentos da S.I.B.A. Voz do Operário”, seguindo-se depois o elenco dos equipamentos, mas nada indica que esses equipamentos são lotes diferentes. Pelo contrário, do n.º 1 do Caderno de Encargos resulta, claramente, que, por exemplo, se um concorrente dissesse que não prestava serviços num dos locais indicados, a sua proposta teria de ser excluída, porque o objecto do contrato é só um.
18. Além do facto de o n.º 1 do Caderno de Encargos referir que o objecto é unitário, também o artigo 14.º do Programa, ao enunciar o critério de adjudicação, só pode ser entendido como dizendo respeito ao preço global das propostas. Se o Programa quisesse ter estabelecido uma aplicação aos preços dos supostos “lotes”, diria que o critério seria o melhor preço em cada lote, ou usaria o plural “melhores preços”, ou qualquer outra forma; da forma como ficou, só há uma leitura possível: ganha quem tiver o melhor preço global.
19. O mesmo resulta, mais uma vez sem margem para dúvidas, do artigo 7.º do Programa de Concurso, que contém indicação dos documentos da proposta. De facto, aí não se encontra qualquer menção aos preços por lote. Apenas se pede a apresentação dos preços unitários por refeição (por razões óbvias: são esses os preços a praticar nas unidades), e a apresentação do “preço total da proposta” (artigo 7.º, n.º 2, alíneas a) e b) do Programa). É totalmente desprovido de sentido ficcionar, como faz o Exmo. Júri, uma qualquer relevância do preço por espaço educativo/unidade para efeitos de avaliação.
20. Por fim, o mesmo resulta, ainda, do artigo 3.º do Programa, que refere que “O preço base deste procedimento é de 56.000,00€”. A referência, aí contida, ao valor “dos lotes” é circunscrita, como o revela a própria norma, à composição daquele preço base, quer dizer, o que a norma se limita a fazer é comunicar aos interessados como é que se chegou ao preço base (global) de 56.000€. Também a existência, num outro documento das peças do procedimento, de preços base para cada “lote”, serve apenas o propósito de balizar as propostas dos concorrentes em cada um dos espaços educativos, e não o propósito de comunicar que por cada lote haveria uma adjudicação e um contrato, que é o único sentido possível daquilo a que a lei chama “adjudicação por lotes”.
21. Daqui resulta que o único atributo das propostas – isto é, o único aspecto das propostas a avaliar, que corresponde ao único factor colocado à concorrência pelo caderno de encargos – é, obviamente, o preço global (mensal) das propostas.
22. Sendo isto assim, uma coisa fica clara considerando as propostas, as peças do procedimento e a lei: não só a proposta da N......... não pode ser excluída, como o único desfecho juridicamente possível para este procedimento é a adjudicação da proposta da N..........
23. Com efeito, confrontando o Relatório Preliminar, pode ver-se que o Exmo. Júri não apenas apresentou o preço do concorrente ICA dividido pelos pretensos “lotes”, como omitiu o preço global do concorrente ICA. Se tivesse incluído esse preço global, ficaria ainda mais patente aquele que é, salvo o devido respeito, o total e completo absurdo da sua posição.
24. Com efeito, somando os valores dos “lotes” (que são irrelevantes, para efeitos de avaliação, e só servem para balizar os valores propostos por cada espaço/unidade) da proposta do concorrente ICA, pode ver-se que o seu preço global – o único que conta para a avaliação – é de 54.001,13€. Ora, o preço global da proposta da N......... – o único que conta para a avaliação – é de 53.044,00€.
25. E portanto, fica claro que o preço global (mensal) da proposta da N......... é bastante mais baixo do que o preço do concorrente ICA, pelo que a proposta da N......... tem de ser adjudicada.
26. Isto é necessariamente assim, pois corrigida a decisão de exclusão da N........., que não tem fundamento legal, a sua proposta tem de ser admitida. Sendo admitida, e considerando as restantes propostas admitidas, a da N......... ficará com o preço mais baixo.
27. Mas note-se que, mesmo admitindo, sem conceder, que a adjudicação fosse por lotes, o que não é (pois para ser, teria de haver algo nas peças que o dissesse), a proposta de ordenação dos concorrentes também estaria errada, pois a N......... tem uma proposta melhor do que a do concorrente ICA no Espaço Educativo da Graça (proposta N......... 23.685,00€, proposta ICA 24.846,25€) e no Espaço Educativo da Baixa da Banheira (proposta N......... 7.963,60€, proposta ICA 7.985,47€), havendo também, nos outros lotes, melhores propostas do que a do concorrente ICA.
28. Ora, isto prova que nem sequer o próprio Exmo. Júri considera que esta adjudicação é por lotes, pois se o achasse, seria forçado a atribuir os diferentes lotes a quem tivesse o melhor preço em cada um dos lotes, e não é isso que faz.
29. O que faz é, pelo contrário, e salvo o devido respeito, particularmente absurdo e indefensável. O Exmo. Júri, por um lado, utiliza os preços dos “lotes” para, sem fundamento, excluir a N.........; mas ao mesmo tempo, acaba por conseguir propor a adjudicação a um concorrente que tem dois “lotes” mais caros do que os “lotes” da N........., que foi excluída; e como se não chegasse, não só o concorrente a quem é proposta a adjudicação tem “lotes” mais caros do que a N......... (que, recorde-se, foi excluída por causa dos lotes…) como, pasme-se, tem preço global mais caro do que o preço global da proposta que foi excluída!
30. Quer dizer, num procedimento sujeito ao critério do mais baixo preço, o Exmo. Júri invoca os “lotes” para excluir a proposta que não só tinha “lotes” mais baratos, mas tinha o preço global mais barato; e propõe a adjudicação ao concorrente que tem vários “lotes” mais caros do que a proposta excluída… e também tem o preço global mais caro do que essa mesma proposta excluída!
31. Não há, com sinceridade, quem consiga perceber como foi possível esta proposta de decisão, que, muito provavelmente, e com o devido respeito, só poderá ser atribuída a um lapso.
32. Há, de facto, razões para crer que o Exmo. Júri confundiu os procedimentos e as peças procedimentais, e apenas por isso elaborou o Relatório Preliminar nos termos em que o fez. Repare-se que, no Relatório, no local destinado a indicar o critério de adjudicação deste procedimento, o júri escreveu, por diversas vezes: “Critério de adjudicação estipulado: a melhor relação qualidade-preço”. Ora, é desnecessário desenvolver que o critério do mais baixo preço não é de todo a mesma coisa que o critério da melhor relação qualidade-preço. São modalidades alternativas de critério de adjudicação. Há, pois, um erro de consequências graves, que tem de levar à reformulação completa do Relatório Preliminar, estando-se, ainda, totalmente a tempo de o fazer.
33. Assim, qualquer outra solução que não passe pela adjudicação do contrato à N......... levará, necessariamente, à inapelável invalidade da decisão final do procedimento, e do correspondente contrato, por violação grosseira das peças do procedimento, em concreto, do critério de adjudicação previsto no artigo 14.º do Programa de Concurso, violando, assim, o princípio da estabilidade das peças do procedimento, que é um corolário dos princípios da concorrência, da igualdade de tratamento e da boa-fé, todos eles mencionados no artigo 1.º-A, n.º 1, do CCP. (…)” – cfr. doc. nº 2, junto com a p.i..
I) Em 24/01/2020 o júri elaborou o Relatório final, onde consta o seguinte:
“(…)
“(texto integral no original; imagem)”

“(texto integral no original; imagem)”


“(texto integral no original; imagem)”

“(texto integral no original; imagem)”





(…)” – cfr. doc. nº 1, junto com a p.i..
J) Em 28/01/2020 foi a A. notificada do Relatório Final – acordo.
K) A A. “Tendo tomado conhecimento do Relatório Final apresentado pelo Exmo. Júri do Concurso acima referido, vem a N..... – S......, apresentar a sua impugnação administrativa da decisão de revogação da decisão de contratar, que terá sido praticada em 28 de Janeiro de 2020, impugnação essa que é apresentada nos termos dos artigos 267.º e seguintes do Código dos Contratos Públicos (CCP)”, requerendo “ ao órgão competente para a decisão de contratar que seja dado provimento à presente impugnação administrativa, não sendo aceite a proposta, constante do Relatório Final, de revogação da decisão de contratar, que seria manifestamente ilegal. Caso a decisão final já tenha sido proferida pelo órgão competente (como se retira da plataforma electrónica, embora sem notificação da decisão propriamente dita), requer-se seja a mesma declarada inválida por esse mesmo órgão, nos termos gerais dos artigos 161.º e ss. do CPA. Após, requer-se que seja retomada a legalidade deste procedimento, elaborando-se novo Relatório Preliminar que proponha a única solução juridicamente válida para este procedimento, que é a adjudicação da proposta da N........., seguindo-se, depois, os termos do procedimento até à celebração do contrato com esta empresa.” – cfr. doc. nº 8, junto com a p.i..
L) Em 27/01/2020 foi formalizado o pedido de revogação da decisão de contratar, aí constando o seguinte:



- cfr. doc. nº 5, junto com o req. da Demandada em 01/07/2020./print screen do fluxo do procedimento produzido pela plataforma electrónica de contratação.

III.2. Quanto aos factos não provados consignou-se na sentença recorrida:

“Não existem factos relevantes para a decisão, em face das possíveis soluções de direito, que importe referir como não provados.”

III.3. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

A matéria dada como provada resulta da análise dos documentos constantes dos presentes autos e do processo administrativo e das posições assumidas pelas partes nos respectivos articulados, expressamente indicados em cada um dos pontos do probatório.
Quanto à restante matéria alegada, por se tratarem de meros juízos conclusivos, de valor ou considerações de direito não são os mesmos susceptíveis de ser objecto de juízo probatório (pese embora a sua pertinência nos respectivos articulados).”

IV. Fundamentação de direito

IV.1. Do erro de julgamento de facto

A Recorrente insurge-se quanto à decisão proferida sobre a matéria de facto, entendendo que deveriam ser aditados aos factos provados os seguintes,
(i) “A proposta da P...... propõe, nos lotes 2, 4, 5 e 6, preços superiores aos preços base parcelares constantes, para cada um desses lotes, da “Lista de Lotes” anexa ao Programa de Procedimento”, aduzindo que se trata de facto alegado no artigo 123.º da p.i. e provado pelos elementos constantes do processo instrutor, incluindo a Lista de Lotes anexa ao 5 PP, a p. 109 do processo instrutor e a p. 3 do Relatório Preliminar;
(ii) “De entre as propostas que não violam o preço base global ou os preços base parcelares fixados pelo Programa de Concurso, a proposta da A. foi a que apresentou o preço mais baixo, de 53.044,00€”, correspondendo a facto alegado nos artigos 121.° a 123.° da PI, e provado pelo processo instrutor, incluindo a proposta da Recorrente, a pp. 87 desse processo instrutor, e a p. 109 do processo instrutor, o já referido quadro.
Considerando o disposto no art. 640.º do CPC ex vi art. 1º do CPTA, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão.
Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art. 640.º, n.º 1, al. a), do CPC];
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art. 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art. 640.º, n.º 1, al. c), do CPC].
Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se, atento o teor das alegações, que foram cumpridas as exigências legalmente impostas, pelo que se passará à apreciação do requerido.
Prevê-se no art. 94.º do CPTA que a sentença abrange, além do mais, “a exposição dos fundamentos de facto” (n.º 2), sendo que “na exposição dos fundamentos, a sentença deve discriminar os factos que julga provados e não provados” (n.º 3).
Também do art. 607.º, n.ºs 3 e 4 do CPC, que se reporta à estrutura da sentença, resulta que esta integra os fundamentos “devendo o juiz discriminar os factos que considera provados”, isto é, o “juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados”.
Destes normativos resulta que a sentença contempla a fundamentação de facto, na qual o juiz discrimina os factos que reputa provados e não provados.
O que está em causa na fundamentação de facto é, sem prejuízo do pleonasmo, a seleção da matéria de facto, entendendo-se como facto “tudo o que se reporta ao apuramento de ocorrências da vida real e de quaisquer mudanças ocorridas no mundo exterior, bem como à averiguação do estado, qualidade ou situação real das pessoas ou das coisas” , sendo que “(..) além dos factos reais e dos factos externos, a doutrina também considera matéria de facto os factos internos, isto é, aqueles que respeitam à vida psíquica e sensorial do indivíduo, e os factos hipotéticos, ou seja, os que se referem a ocorrências virtuais” (Henrique Araújo, A matéria de facto no processo civil, disponível em https://carlospintodeabreu.com/public/files/materia_facto_processo_civil.pdf, consult. Março 2024).
Retenha-se, ainda, que “[d]evem distinguir-se os factos dos juízos de facto, ou seja, juízos de valor sobre a matéria de facto. Os factos (matéria de facto) abrangem principalmente as ocorrências concretas da vida real. Os juízos de facto situam-se na meia encosta entre os puros factos (que ocorrem na planície terrena da vida) e as questões de direito (situadas nas cumeadas das normas jurídicas)” (Jorge Augusto Pais de Amaral, Direito Processual Civil, 4.ª edição, Almedina, p. 229).
Ademais, a matéria de facto “deve incidir apenas sobre matéria de facto e não conter questões de direito, [d]eve cingir-se às ocorrências da vida real e evitar conceitos jurídicos” (Jorge Augusto Pais de Amaral, ob. cit., p. 219).
Pelo que, “[a]s afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão. Daí que sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas a decidir, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, tal ponto da matéria de facto deve ser eliminado.” (Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 11 de julho de 2018, proferido no processo nº 1193/16.1T8PRT.P1).
Neste sentido, reiterando o Acórdão deste Tribunal de 22 de maio de 2019, proferido no processo 1134/10.9BELRA, disponível em www.dgsi.pt, “[a] seleção da matéria de facto só pode integrar acontecimentos ou factos concretos, que não conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos, sendo que as asserções que revistam tal natureza devem ser excluídas do acervo factual relevante ou indeferido o seu aditamento”.
Quanto a “A proposta da P...... propõe, nos lotes 2, 4, 5 e 6, preços superiores aos preços base parcelares constantes, para cada um desses lotes, da “Lista de Lotes” anexa ao Programa de Procedimento” é patente que estamos perante um juízo conclusivo pois que tal se infere da análise do documento correspondente à proposta da Recorrente à luz de um outro documento, correspondente à “Lista de Lotes” anexa ao Programa de Procedimento, considerando, ainda, conceitos de direito (preço base, art. 47.º do CCP) que emergem do quadro legal aplicável. Ou seja, estamos perante um juízo ou asserção que se alcança da leitura e conjugação do documento que se encontram a fls. 15 do p.a. e com os documentos de fls. 99, 105 e 110 do p.a. (doc. 626965 dos autos), enquadrada pelo acervo legislativo da contratação pública.
As ocorrências da vida real que poderiam, na circunstância de serem relevantes à decisão da causa, ser levadas ao probatório correspondem, na realidade ao que resulta do facto provado C), aditando a este o conteúdo da referida “Lista de Lotes”, e à apresentação pela P...... de proposta ao concurso nos termos em que esta o fez.
De igual modo, no que respeita a “De entre as propostas que não violam o preço base global ou os preços base parcelares fixados pelo Programa de Concurso, a proposta da A. foi a que apresentou o preço mais baixo, de 53.044,00€”, saber se uma proposta não viola o preço base global ou os preços base parcelares fixados pelo Programa de Concurso e/ou se foi a que apresenta o preço mais baixo, traduz um juízo acerca de certa realidade factual no qual estão envolvidos conceitos de direito.
Reitera-se que “preço base” representa um conceito de direito que emerge do art. 47.º do CCP, sendo que aferir quaisas propostas que não violam o preço base global ou os preços base parcelares fixados pelo Programa de Concurso” é o resultado da análise dos documentos que constituem as propostas dos concorrentes, considerando o conceito jurídico de preço base, por referência ao documento que corresponde ao Programa de Concurso e referido no artigo C) dos factos provados. Por seu turno, saber se, entre essas propostas, a da A. foi a que apresentou o preço mais baixo é uma asserção que se extrai da análise das propostas apresentadas.
Neste sentido, não há que aditar aos factos provados as considerações / juízos formulados pela Recorrente referidos em (i) e (ii) supra, improcedendo o erro de julgamento quanto à matéria de facto apontado à decisão recorrida.

IV.2. Do erro de julgamento de direito quanto à não condenação à prática do ato de adjudicação à Recorrente

A sentença recorrida, julgando procedente o pedido de anulação da decisão de não adjudicação e revogação da decisão de contratar, apreciou o pedido de condenação da Recorrida a proferir decisão de adjudicação a proposta da Recorrente considerando que, não tendo sido praticado um ato de exclusão ou admissão das propostas mas apenas relatório preliminar, impõe-se que o júri do concurso, e depois dele o órgão administrativo competente para a decisão, levem a cabo as tarefas e apreciações da sua competência, cumprir a audiência prévia, elaborar relatório final e decidir sobre as propostas deste nomeadamente para efeitos de adjudicação, concluiu que “a reposição da situação dos factos conforme ao direito impõe apenas que o procedimento pré-contratual prossiga” e, consequentemente, condenou o R. a retomar o procedimento concursal a partir da fase de audiência prévia dos concorrentes quanto ao relatório preliminar.
É quanto a esta parte da decisão, que não condenou a Entidade Demandada a adjudicar à sua proposta o procedimento concursal, que a Recorrente se insurge.
Como resulta do art. 100.º, n.º 1 do CPTA, é admissível no âmbito dos processos urgentes do contencioso pré-contratual a cumulação de pedidos de anulação de um ato de conteúdo positivo em favor de terceiro, com a condenação à sua substituição por outro que dê satisfação ao interesse pretensivo da parte na adjudicação.
No quadro determinado pelos arts. 66.º e 67.º do CPTA “(..) será devido o acto que seja exigido por uma previsão normativa, ditando esta o seu carácter vinculado quanto à sua prática/realização (quanto ao “se”) e quanto ao momento (quanto ao “quando”) da sua verificação – dois elementos essenciais para ser possível a condenação da Administração a agir. A isto acresce que esteja a ser reclamado por quem efectivamente o possa exigir.
Quanto ao conteúdo, o ser um acto vinculado não é imprescindível para ser possível a procedência da acção de condenação, sendo que, nesse caso, a sentença condenatória será proferida com um conteúdo mais limitado. (..)” (Paula Barbosa, A acção de condenação no acto administrativo legalmente devido, aafdl/Lisboa/2007, pág. 90.). Isto é, “a conformação normativa do acto administrativo ilegalmente omitido ou recusado não respeita necessariamente a todos os seus elementos, nomeadamente ao seu quid (conteúdo), podendo cingir-se, até, apenas ao an ou quando da sua actuação, isto é, ao dever de se pronunciar, de tomar uma qualquer decisão sobre uma situação administrativa - caso em que a condenação judicial à prática do acto devido poderá limitar-se (esquecendo por ora a existência de outros limites da discricionariedade administrativa) à imposição de a Administração decidir expressamente sobre tal situação. Em tudo o mais, a determinação do acto em causa pode depender de juízos de avaliação discricionária próprios (e exclusivos) da Administração, pelo que, nestas circunstâncias, ela só será condenada a observar as vinculações a que está submetida na prática desse acto. (..)” (Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, CPTA / ETAF – Anotados, Vol. I, Almedina/2004, págs. 413 e 441)
A questão trazida à nossa apreciação reconduz-se a saber qual a extensão dos poderes de pronúncia de que dispõe o tribunal no âmbito das ações de condenação à prática de ato devido que, como é sabido, não se reveste de facilidade por se encontrar na fronteira “entre o domínio do administrar, que não se pretende dos tribunais, sobrepondo os seus próprios juízos subjectivos aos daqueles que exercem a função administrativa, e o domínio do julgar, em que do que se trata é de verificar a conformidade da actuação dos poderes públicos com as regras e os princípios de Direito a que eles se encontram obrigados e, por isso, de determinar, no exercício da função jurisdicional, em que moldes se deve processar o exercício legítimo dos poderes públicos.” (Sobre as ações de condenação à prática de actos administrativos, Temas e Problemas de Processo Administrativo, 2.ª edição revista e atualizada, coord. Vasco Pereira da Silva, Instituto de Ciências Jurídico- Políticas, disp. https://www.icjp.pt/sites/default/files/media/ebook_processoadministrativoii_isbn_actualizado_jan2012.pdf#page101, p. 107 e ss.).
No que respeita aos poderes de pronúncia do Tribunal o art. 71.º do CPTA, normativo que se encontra inserido na regulação da ação de condenação à prática de ato devido, dispõe que,
1 - Ainda que o requerimento apresentado não tenha obtido resposta ou a sua apreciação tenha sido recusada, o tribunal não se limita a devolver a questão ao órgão administrativo competente, anulando ou declarando nulo ou inexistente o eventual ato de indeferimento, mas pronuncia-se sobre a pretensão material do interessado, impondo a prática do ato devido.
2 - Quando a emissão do ato pretendido envolva a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa e a apreciação do caso concreto não permita identificar apenas uma solução como legalmente possível, o tribunal não pode determinar o conteúdo do ato a praticar, mas deve explicitar as vinculações a observar pela Administração na emissão do ato devido.
3 - Quando tenha sido pedida a condenação à prática de um ato com um conteúdo determinado, mas se verifique que, embora seja devida a prática de um ato administrativo, não é possível determinar o seu conteúdo, o tribunal não absolve do pedido, mas condena a entidade demandada à emissão do ato em questão, de acordo com os parâmetros estabelecidos no número anterior.
Por sua vez, o art. 95.º do CPTA, referente ao objeto e limites da decisão, prevê que,
“5 - Quando no processo tenha sido deduzido pedido de condenação da Administração à adoção de atos jurídicos ou comportamentos que envolvam a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa, sem que a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma atuação como legalmente possível, o tribunal não pode determinar o conteúdo do ato jurídico ou do comportamento a adotar, mas deve explicitar as vinculações a observar pela Administração.”
O que este quadro normativo evidencia é que “os processos de condenação à prática de actos administrativos são processos de geometria variável, no sentido em que não conduzem todos à emissão de pronúncias judiciais com idêntico alcance” (Mário Aroso de Almeida, ob. cit., p. 110), podendo estas consistir,
(i) Na condenação à prática de um ato com um determinado conteúdo, por este resultar estritamente vinculado do quadro normativo aplicável;
(ii) Na condenação à prática de um ato com um determinado conteúdo, pois, embora a sua prática envolva o exercício de poderes discricionários, por força da redução da discricionariedade a zero, reconhece-se apenas uma solução como legalmente possível;
(iii) Quando a prática do ato envolve o exercício de poderes discricionários, sem que se esteja perante a situação referida em (i), na explicitação das vinculações a observar pela Administração na emissão do ato – que, por regra, se traduzirão, nas palavras do autor supra citado, no efeito preclusivo que resulta do accertamento judicial, quanto à identificação e afirmação das ilegalidades em que incorreu o eventual ato de conteúdo negativo, sobre o subsequente reexercício do poder por parte da Administração - mas sem precisar o sentido da decisão (sentenças-quadro, sentenças-indicativas);
(iv) Na condenação da Administração a praticar um qualquer ato administrativo, sem
conter quaisquer especificações quanto ao seu conteúdo.
A resposta quanto a saber perante qual das hipóteses se encontra o Tribunal, e até onde podem ir os seus poderes de pronúncia, encontra-se na análise da situação concreta trazida a juízo à luz do quadro normativo definido pela lei e pelas peças do procedimento adjudicatório aplicável ao ato devido, aferindo-se se este envolve a formulação de valorações próprias da função administrativa, e em que grau ou medida se desenvolve a margem de livre apreciação da Administração, ou se o ato devido apresenta um conteúdo vinculado.
Antes de se passar a essa apreciação no caso concreto importa, contudo, deixar aqui a nota que se admitem situações em que, implicando a indagação material do conteúdo do ato devido valorações objetivas, o tribunal possa estar, no caso concreto, impossibilitado de proferir uma condenação a praticar um ato com um determinado conteúdo. Com efeito, em abstrato, ponderem-se hipóteses em que a atividade de definição do conteúdo do ato devido envolve conhecimentos técnicos ou especializados, os autos não reúnem os elementos necessários a que se alcance o conteúdo devido do ato, designadamente por deficiente ónus de alegação ou prova das partes, situações de défice instrutório procedimental ou em que se imponha (ainda) o designado princípio da decisão prévia administrativa (no sentido a que se reporta Ana Carla Teles Palma Duarte, A ação de condenação à prática de ato devido: conhecimento e prova dos pressupostos de facto do ato, disponível em https://repositorio.ul.pt/handle/10451/24096).
Nestas hipóteses a condenação consubstanciar-se-á, por regra, na explicitação das vinculações a observar, devendo estas reconduzir-se ao máximo conteúdo (vinculado) que ao Tribunal seja possível alcançar.
Considerando o exposto não acompanhamos a Recorrente quando advoga, em síntese, que, na situação dos autos, à míngua de prévia atividade procedimental, o Tribunal se pode substituir tout court à Administração nas tarefas de análise e avaliação das propostas.
Como decorre dos arts. 70.º e ss., 139.º, 146.º e ss. do CCP, apresentadas as propostas, são estas abertas pelo júri que procede à sua análise e avaliação para posterior ordenação.
A fase da análise das propostas corresponde, em síntese, ao exame de todos os documentos que as constituem e tudo o que contêm quanto aos atributos, termos e condições, documentação e informação que o Programa do Procedimento exige e confrontação com os parâmetros de que depende a admissão das propostas.
A avaliação das propostas consiste na subsunção dos atributos nos fatores que densificam o critério de adjudicação, sendo seguida da ordenação das propostas em função dos resultados obtidos na fase de avaliação.
Em termos de tramitação procedimental, como resulta dos autos, não fora a prática da decisão de não adjudicação, cabia ao júri elaborar relatório final fundamentado, ponderando as observações dos concorrentes efetuados ao abrigo do direito de audiência prévia, podendo manter ou modificar o teor e as conclusões do relatório preliminar e propor a exclusão de qualquer proposta, neste último caso, bem como quando do relatório final resulte uma alteração da ordenação das propostas constante do relatório preliminar, o júri procede a nova audiência prévia.
Mantendo o teor do relatório final ou após audiência prévia ao novo relatório preliminar e elaboração do relatório final, este é enviado ao órgão competente para decidir sobre a aprovação de todas as propostas contidas no relatório final, nomeadamente para efeitos de adjudicação (art. 148.º do CCP).
Ou seja, a lei prevê uma atividade procedimental da Administração que, no caso, não foi levada a cabo.
É certo que, como ficou reconhecido na decisão recorrida, o critério de adjudicação referido no artigo 14.º do Programa de Procedimento correspondia ao do menor preço/custo, o qual se revela de aferição objetiva, sem que a seu respeito se apresentem espaços próprios de discricionariedade administrativa ou de margem de livre apreciação sobre as qualidades das propostas.
Por sua vez, no que respeita à atividade de análise das propostas, da leitura dos artigos 7.º, 3.º e 13.º do Programa de Concurso no qual se preveem, respetivamente, os documentos que constituem a proposta, o “Preço Unitário e Preço Base” e a análise e exclusão das propostas, considerando que estão tipificadas no art. 70.º, n.º 2 e 146.º, n.º 2 do CCP as causas de exclusão das propostas, de natureza formal e material, numa primeira leitura, não sobressaem valorações que se situem na margem de apreciação da Administração.
Contudo, impõe-se dar nota, acompanhando Ana Carla Teles Palma Duarte (in ob. cit., p. 35), que “[a] actividade instrutória da Administração no âmbito do procedimento administrativo configura (…) uma actividade complexa que abarca a determinação das diligências de prova relevantes, de entre todas aquelas permitidas em direito que repute adequadas, a sequência da sua produção, a formulação de um juízo a propósito de cada um dos meios de prova produzidos (que, na maioria dos casos se caracteriza pela liberdade de apreciação), a audiência dos interessados e, por fim, a prolação de uma decisão sobre os factos provados e não provados e a sua subsunção no direito aplicável (cfr. art. 126º do CPA).
Esta decisão ou juízo sobre a prova produzida encerra todas as vertentes da actividade instrutória, a qual envolve espaços de actividade administrativa estritamente vinculados e espaços de autodeterminação, quais sejam, designadamente os respeitantes à direcção da instrução e à formulação de juízos valorativos a respeito de determinados meios de prova.
A actividade administrativa de instrução do procedimento traduz a função cometida à Administração de averiguação da matéria de facto concretamente relevante para a tomada de cada decisão reclamada pela prossecução dos interesses que por lei lhe estão confiados. Configura, assim, uma vertente própria da actividade administrativa enquanto exercício de um dos poderes do Estado e contempla espaços de livre decisão”. Neste sentido, ainda que perante um quadro regulatório que aparenta ser vinculado, a atividade procedimental da Administração, concretamente no exercício dos poderes de análise e avaliação de propostas em sede de procedimentos concursais, envolve ajuizamento sobre os elementos que são submetidos à sua apreciação que se assume, ainda que o possa ser em grau mínimo, uma margem de livre apreciação.
Na situação dos autos, a atividade que a Recorrente reclama do Tribunal passaria pela análise das propostas apresentadas, aferindo (i) se quanto às mesmas se verificam (ou não) causas de exclusão – incluindo outras que não foram consideradas no relatório preliminar -, pela formulação de um juízo de decisório quanto à sua (não) admissão, pela subsunção das mesmas ao critério de adjudicação e pela decisão quanto ao direito à adjudicação. Tarefas que seriam realizadas primariamente pelo Tribunal e sem que, sobre as mesmas, a Administração tenha chegado a pronunciar-se.
Acresce, ainda, que se encontram legalmente reguladas causas de não adjudicação que envolvem juízos próprios da atividade administrativa relativamente aos quais o Tribunal não se pode substituir à Administração, designadamente as que se encontram enunciadas nas alíneas c) e d) do n.º 1 do art. 79.º.
Assim, in casu, se é certo que o procedimento concursal se desenvolve num quadro relativamente vinculado, todavia à atividade procedimental não deixam de estar subjacentes juízos de valoração que, em maior ou menor medida, se situam na esfera de discricionariedade da Administração. Juízos esses que, atento o caráter meramente preliminar das tarefas procedimentais concretizadas até à prática do ato anulado, não foram (ainda) realizados.
Compreende-se, por isso que, nas palavras da sentença recorrida, no caso apenas caiba “assegurar que o júri do concurso, e depois dele o órgão administrativo competente para a decisão, levem a cabo as tarefas e apreciações da sua competência”, não podendo, pois, o Tribunal condenar a Recorrida à prática do ato de adjudicação.
*
Da condenação em custas

Vencida, é a Recorrente responsável pelas custas (arts. 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do RCP e 189.º, n.º 2, do CPTA).


V. Decisão

Nestes termos, acordam os juízes desembargadores da Secção Administrativa, subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Sul, em,
a. Negar provimento ao recurso e, em consequência, manter a sentença recorrida;
b. Condenar a Recorrente em custas.


Mara de Magalhães Silveira
Paula Cristina Oliveira Lopes de Ferreirinha Loureiro (tem voto de conformidade, não assina por motivos técnicos)
Ana Cristina Lameira