Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:839/19.3BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:11/19/2020
Relator:ANTÓNIO ZIEGLER
Descritores:O ARRESTO DE BENS AOS DEVEDORES PRINCIPAIS E SUBSIDIÁRIOS EM SEDE DE EXECUÇÃO FISCAL: PRESSUPOSTOS GERAIS E ESPECÍFICOS DA SUA DETERMINAÇÃO JUDICIAL.
PRESUNÇÃO DO “PERICULUM IN MORA”: LIMITES SUBSTANTIVOS QUANTO ÀS SITUAÇÕES DE IMPOSTO REPERCUTIDO A TERCEIROS E NÃO ENTREGUES NOS COFRES DE ESTADO (CASO DO IVA).
GARANTIA DOS CRÉDITOS DO ESTADO: SUFICIÊNCIA DE BENS DO PATRIMÓNIO DE QUALQUER RESPONSÁVEL PELAS DÍVIDAS.
Sumário:A) Apenas será de decretar o arresto em bens do devedor originário e do devedor subsidiário após a instauração da execução fiscal, quando se verifique uma situação de justo receio a que se refere o nº1, do artº 214º do CPPT, ou da regra geral do “periculum in mora” relativa á diminuição ou insuficiência do património daqueles devedores para assegurar o pagamento da divida exequenda e acrescido, ínsito no nº 1, do artº 392º do CPC.
B) A presunção de tais circunstâncias verifica-se sempre que se trate de tributo que os devedores tenham repercutido o imposto a terceiros e não o entreguem ao Estado, nos termos do disposto no nº 2, do artº 214º, do CPPT, mas já não assim nos casos em que falte tal autoliquidação do tributo devido pelo devedor.
C) Existindo a probabilidade, suficientemente sustentada, de o responsável subsidiário ser chamado á execução pelas dívidas tributárias do devedor originário, consubstanciando tal possibilidade legal uma forma de garantia pessoal dos créditos tributários, e verificando-se que o património do mesmo é suficiente para pagamento da divida exequenda e acrescido, não se encontra legitimado o decretamento de tal arresto por deixar de se verificar tal perigo que o fundamentava.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

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Relatório

Os recorrentes devidamente identificados nos autos, inconformados com a decisão proferida em 1º Instância, que lhe indeferiu a pretensão suscitada na oposição deduzida ao arresto decretado por aquele Tribunal “A Quo”, vem apresentar as seguintes conclusões recursivas:
“A. O tribunal conhece dos factos através das provas produzidas no processo.
B. As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos, conforme artigo 341º do Código Civil.
C. Cada uma das partes tem o encargo de provar os factos de que depende a aplicação das normas que lhe são favoráveis, conforme artigo 342°, n°s 1 e 2, do Código Civil.
D. Assim, impende sobre a Requerente (a Fazenda Pública) o ónus da prova dos factos constitutivos do direito subjacente ao pedido,
E. Que no caso sub judice seria, e quanto à Requerida D….., haver fundado receio da diminuição da garantia de cobrança de créditos tributáveis, e o tributo em causa estar liquidado ou em fase de liquidação,
F. E quanto ao Requerido R….., enquanto alegado responsável subsidiário, e de forma cumulativa, que se verificam, os requisitos previstos no art.153°, n° 2, do CPPT, relativos à inexistência de bens penhoráveis do devedor originário ou à fundada insuficiência do património do mesmo devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido,
G. E ainda que, se verificam os requisitos previstos no art. 24°, da L.G.T., relativos ao exercício do cargo de gerente da sociedade devedora no período da constituição do facto tributário ou no período de entrega ou pagamento dos impostos em dívida.
H. Sendo que recai sobre os Requeridos, ora Recorrentes, a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse mesmo direito,
I. Nomeadamente, a alegação de novos factos, a apresentação de meios de prova ainda não tidos em conta e a realização de outras diligências probatórias, para além das já efectuadas, com vista a demonstrar que não se verificam os fundamentos da providência ou que esta deve ser reduzida.
J. A regra que governa a ponderação das provas é da livre apreciação, enunciada, entre outros, no artigo 607, n° 5, do Código de Processo Civil “O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.".
K. Sem embargo, estão consagradas exceções à prova livre, conforme descrito na segunda parte da referida norma: “a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.".
L. Entende contudo, e salvo o devido respeito pelo Tribunal " a quo", que é muito, que a prova produzida impunha ao julgador decisão diversa da tomada.
M. O Tribunal “a quo” entendeu que nos autos subjudice, a devedora originária, a Requerente D….., foi alvo de diversos procedimentos inspectivos que culminaram em liquidações adicionais de IVA, que o imposto se encontra liquidado, que já decorreu o prazo para o pagamento voluntário, que já se encontram instaurados os competentes processos executivos, e que aquela não possui bens, para além da conta bancária.
N. Entendeu ainda o Tribunal “a quo”, no que respeita ao fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis, que estando perante uma dívida de IVA este se presume,
O. Encontrando-se assim reunidos os pressupostos para decretar o arresto do único bem conhecido da devedora originária.
Sucede porém, que,
P. A Requerente, Fazenda Nacional, não logrou provar e demonstrar que existe “um justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens” por parte dos Requeridos, quer seja da devedora originária, quer seja do alegado responsável subsidiário.
Pelo contrário,
Q. A prova documental junta aos autos, aponta em sentido diverso, vide documentos 1, 2, 3, 4 e 5 juntos com à oposição deduzida.
Acresce dizer que,
R. E sem prejuízo “do justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens”, se presumir, no caso de dividas de impostos que o executado tenha retido ou repercutido a terceiro e não o tenha entregue nos prazos legais,
S. Tal presunção pode ser ilidida, tendo-o sido no caso sub judice, porquanto, e pese embora a divida em execução diga respeito ao IVA, o mesmo (o IVA) não foi retido, ou repercutido a terceiro.
T. Neste sentido, veja-se a sentença proferida no passado dia 17/07/2020 no âmbito do processo 197/20.3BEALM, na Unidade Orgânica 2, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada,
U. E, na qual se pode ler que: “Resulta do probatório que as liquidações de IVA em cobrança coerciva assentam em procedimento inspectivo que considerou que a Reclamante (D…..) deveria ter apurado imposto no regime geral e não no regime especial de tributação da margem. Procedendo, em consequência, ao apuramento dos valores de imposto que a Reclamante terá deixado de liquidar nas facturas emitidas. Que não liquidou, bem ou mal para o caso não releva, mas que igualmente não repercutiu aos seus clientes, nos termos do artigo 37.° do Código do IVA.”, vide 3.°, 4.° e 5.° parágrafos da pagina 27 da sentença proferida. Sublinhado e negrito nosso.
V. E, assim sendo, à Requerente, Fazenda Publica, competia demonstrar e provar “o justo receio de insolvência , de ocultação e de alienação dos bens”, o que não fez.
W. Quanto ao alegado responsável subsidiário, entendeu o Tribunal “a quo” que resultou indiciariamente provado que R….. sempre agiu como sendo o gerente de facto da sociedade,
X. E que, resultou provado o “'periculum in mora” porque, sendo a dívida resultante do IVA, - presume-se -.
s
Y. Também aqui, e quanto ao alegado responsável subsidiário, os Recorrentes não partilham do douto entendimento do tribunal “a quo”,
Z. Porquanto, e salvo o devido respeito, que reitera-se, é muito, não resultou, ainda que indiciariamente, do probatório produzido, que o ora Recorrente R….. sempre agiu como sendo o gerente de facto da sociedade Requerida.
Pelo contrário,
AA. Resultou, do probatório produzido, que o pai do ora Recorrente R….. — M…..- sempre agiu como sendo o gerente de facto da sociedade Requerida,
BB. Resultando também, que o ora Recorrente R….. foi, e, é, apenas gerente de direito, e não de facto,
CC.Tal qual, resulta da prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento, e ainda das declarações prestadas pelo ora Recorrente R…...
DD. Quem exercia e exerce a gerência de facto da Requerida D….. era/é o pai do Requerido R….., e não o Requerido.
EE. Neste sentido, os depoimentos das testemunhas J….., Contabilista Certificado da Requerida D….., de C….. e de L…..,
FF. Sendo que C….. é a pessoa responsável pelos procedimentos internos de promoção comercial dos veículos, de compra dos mesmos no mercado intracomunitário,
GG. E de C….., fornecedor da Requerida D….., pessoa a quem os veículos são entregues para limpeza, reparação, conservação e embelezamento dos mesmos, para venda e entrega ao cliente final.
s
HH. De igual modo o depoimento da testemunha M….., pai do Requerido R….., que em sede de audiência e julgamento, assumiu que era ele quem geria de facto a Requerida D…..,
II. Admitindo mesmo, que todos os documentos comerciais e outros, referentes à gestão e comércio da Requerida D….., eram por si assinados com o nome do filho, R…...
JJ. De realçar que em sede de audiência e julgamento, não foi demonstrado ou ficou provado, que foi R….., quem tomou as deliberações, quem administrou, quem representou , ou quem realizou negócios, em nome da D…..,
KK. Mas sim o contrário. Ficou sobejamente demonstrado, que, quem tomou as deliberações, quem administrou, quem representou, quem realizou negócios e o comercio da D….. foi, M…...
LL. Em suma, não ficou provado que o Requerido R….., ora Recorrente, é quem exterioriza ou exteriorizou a vontade social da Requerida, ora Recorrente, D….. perante terceiros,
MM. Que é, quem exerce a gerência de facto daquela; nem poderia, porquanto R….., apenas “cedeu” o seu nome para constituir uma sociedade que na verdade é do seu pai, e na qual a gerência de facto é exercida por este.
NN. E fê-lo porque “o pai tinha uns problemas e não podia ter nada em seu nome situação que é confirmada, indiciariamente, pelas certidões prediais dos bens imoveis arrestados,
OO. Nas quais se constata existir registada sobre os bens imoveis arrestados, e previamente ao registo do arresto, uma acção de impugnação pauliana, provisória por natureza,
s
PP. A qual na presente data já se encontra convertida, conforme Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça. Vide documento 2, junto com as alegações.
QQ. Em suma, e tal qual resulta do douto Parecer do Procurador da Republica, “Sem quebra do muito devido respeito por posição contrária, afigura-se-nos que relativamente a R….. não se mostram preenchidos os pressupostos que permitam reverter a execução contra ele.”
RR.Da conjugação das normas previstas nos artigos 136.° e 214.° ambos do CPPT, havendo justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens, pode a Fazenda Publica, requerer o arresto de bens suficientes para garantir a divida exequenda e o acrescido,
SS. Circunstancias que se presumem no caso de dividas de impostos que o executado, tenha retido ou repercutido a terceiro e não tenha entregue nos prazos legais, conforme artigo 214.° n.°s 1 a 3 do CPPT.
TT. No caso sub judice, e pese embora o imposto em execução seja o IVA, o mesmo não foi retido ou repercutido a. terceiro, nos termos do artigo 37.° do Código do IVA.
UU. Pelo que a Fazenda Publica tinha que demonstrar e provar que existe justo receio de insolvência ou de ocultação de bens, por parte do devedor, o que não aconteceu.
Termos em que,
VV. A situação dos ora Recorrentes não é subsumível à previsão e presunção contida no artigo 214.° n.°s 1 a 3 do CPPT, porque ilidível e ilidida, face ao exposto que antecede.
Acresce que,
WW. O facto de a D….. Lda, não ser proprietária de quaisquer bens imóveis,
s
XX. “E no que respeita aos veículos automóveis se verificar que esta apenas tem dois veículos”, conforme documento 1 junto com a petição inicial,
YY. Tal não importa de per si, que a Requerida D….. Lda, não vai pagar os seus tributos, nomeadamente as quantias exequendas de que é devedora,
ZZ. Tanto é que, mantem a sua atividade comercial até ao dia de hoje, e tem cumprido sempre com o pagamento de todos os impostos que lhe são imputados e da sua responsabilidade.
AAA. Quanto ao alegado responsável subsidiário, dir-se-á que, pode ser requerido e decretado o arresto em bens suficientes para garantir a divida exequenda e o acrescido, em bens dos responsáveis solidários ou subsidiários,
BBB. Desde que, ocorram, simultânea e complementarmente, além das circunstancias presumidas (cuja presunção se encontra ilidida nos presentes autos):
a) - Haver fundado receio da diminuição de cobrança de créditos tributáveis,
b) - O tributo estar liquidado ou em fase de liquidação,
E
c) - Ser exigível aos responsáveis subsidiários, a existência dos pressupostos para a efetivação do mecanismo de reversão, nomeadamente, se encontrem verificados os requisitos de reversão positivados nos artigos 24.° da Lei Geral Tributária e 153.° n.° 2 do CPPT,
CCC. O que, não aconteceu no que diz respeito aos requisitos preceituados no artigo 24.° da LGT, quanto à responsabilidade subsidiária do ora Recorrente R…...
DDD. Assim, e face ao exposto que antecede, e salvo o devido respeito, que como se disse é muito,
EEE. Não se encontram reunidos todos os requisitos e pressupostos legais exigidos, para que seja dado provimento ao pedido de arresto formulado pela Fazenda Pública, contra R….., pelos motivos apontados e que antecedem.
FFF. Entendem assim os Recorrentes que o Tribunal "a quo" não respeitou, tendo violado o preceituado nos artigos 136.°, 214.°, 153.° todos do Código de Procedimento e de Processo Tributário e nos artigos 51.° e 24.° da Lei Geral Tributária.
TERMOS EM QUE,
E nos melhores de Direito, e sempre com o douto suprimento de V.Exas, concedendo-se provimento ao presente recurso, deverá ser a sentença recorrida, revogada.”
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Não foram apresentadas contra-alegações pela recorrida.
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O Magistrado do Ministério Público ofereceu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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As questões invocadas pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir são as seguintes:

_ Erro de julgamento de facto por errónea valoração da prova produzida (conclusões a) a q)) , p) e q), z) a nn);
_ Erro de julgamento de direito na parte em que se entendeu que se havia demonstrado os pressupostos do decretamento da providência de arresto, enquanto meio de defesa judicialmente determinada dos direitos de crédito como forma de conservação patrimonial do credor, concretizada através da apreensão de bens susceptíveis de responder pelas dívidas tributárias, em razão da pretensa liquidação do imposto, assim como o “periculum in mora” que sustenta a decisão recorrida, e da sua extensão ao devedor subsidiário daquela dívida e em bens a si pertencentes. – cfr conclusões l) a EEE), do petitório recursivo, com exclusão dos pontos incluídos na questão supra suscitada.
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Na sentença sub judice, fundamentou-se a decisão revidenda nos seguintes factos:
“1). A sociedade D….., Lda. foi matriculada em 18/03/2015, possui um capital social de € 500,00 e o seu único sócio e gerente é R….. (facto que se retira do doc. de fls. 12 a 15 do doc. de fls. 18, numeração do SITAF - Certidão da Conservatória do Registo Comercial );
2. Dos documentos intitulados "Rechnung und Kaufvertrag, datados de 21/04/2015, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n. °9 e Doc. n. °10 com a p.i.)
3. Dos documentos intitulados "Automobile weichselgartner Gmbh”, datado de 19/11/2015, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n. °11 com a p.i.)
4. Do documento depósito da CA Crédito Agrícola datado de 05.11.2015, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 12 com a p.i.)
5. Dos documentos proveniente de "A…..”, em 08.01.2016, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 13 com a p.i.)
6. Do documento intitulado "Faufvertrag” datado de 12.01.2016, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 14 com a p.i.)
7. Do documento proveniente de "SAS -Stern -AutoSalon”, datado de 16.02.2016, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 15 com a p.i.)
8. Do documento datado de 09.05. 2016 consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 16 com a p.i.)
9. Do cheque n.° …..da Instituição Bancária CA Crédito Agrícola datado de 25.05.2016, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 17 com a p.i.)
10. Do documento proveniente de "R…..”, datado de 01.08. 2016, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 18 com a p.i.)
11. Do documento intitulado "A…..”, datado de 13.09.2016, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 19 com a p.i.)
12. Na Declaração Aduaneira de Veiculo -DAV datada de 20.09.2016, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 20 com a p.i.)
13. No documento intitulado "A…..” datado de 03.01.2017, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 21 com a p.i.)
14. Na fatura n.° ….., datada de 07.02.2017. (Cfr. Doc. n.° 22 com a p.i.)
15. Na fatura n.° ….., datada de 08.03.2017, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 23 com a p.i.)
16. Do documento intitulado "KS -AUTOMARKTGMBH”, datado de 09.03.2017, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 24 com a p.i.)
17. Do documento intitulado "EURODECARS” datado de 25.09.2017, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 25 com a p.i.)
18. Na Declaração Aduaneira de Veiculo -DAV datada de 11.10.2017, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 26 com a p.i.)
19. Na Ordem de Serviço do Procedimento de Inspeção Externa, datada de 14.06.2018, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 6 com a p.i.)
20. Do documento de procedimento de inspeção externa, datado de 21.01.2019 consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 27 com a p.i.)
21. Da notificação do projeto de relatório da inspeção tributária em 23.05.2019,consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 28 com a p.i.)
22. Da nota de diligência, datada de 13.06.2019, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 29 com a p.i.)
23. Do relatório de inspeção Tributária e termo de diligência, datado de 13.06.2019, consta a assinatura de R….. (Cfr. Doc. n.° 7 com a p.i.)
24. A sociedade identificada no ponto anterior foi sujeita a uma acção inspectiva da qual resultaram correcções em sede de IVA nos exercícios de 2015 a 2017 (facto que se retira do doc. de fls. 16 a 35 do doc. de fls. 18, numeração do SITAF);
25. Na sequência da acção inspectiva identificada no ponto anterior foram instaurados contra a sociedade melhor identificada no ponto 1 diversos processos executivos para a cobrança da quantia global de € 571.097,23 (facto que se retira do doc. de fls. 1 a 11 e de fls. 36 a 83, do doc. de fls. 18, numeração do SITAF);
26. Em nome da sociedade melhor identificada em 1 não se encontram registados quaisquer imóveis (facto que se retira do doc. de fls. 84 do doc. de fls. 18, numeração do SITAF);
27. Em nome da sociedade melhor identificada em 1 foram encontrados dois veículos automóveis com as matriculas ….. e ….. (facto que se retira do doc. de fls. 85 do doc. de fls. 18, numeração do SITAF);
28. A Fracção autónoma designada pela letra "A”, andar/ divisão: cv do prédio urbano sito na ….., inscrita na matriz predial da freguesia de Alhos Vedros, concelho da Moita, sob o artigo ….., com o valor patrimonial de €71.659,00, inscrito na Conservatória do Registo Predial da Moita, sob o registo n.° ….., encontra-se registada em nome de R….. (cfr. doc. junto a fls. 28 a 31 do doc. de fls. 107, numeração do SITAF);
29. A Fracção autónoma designada pela letra "B”, andar / divisão: rc, do prédio urbano sito na ….., inscrito na matriz predial da freguesia de Alhos Vedros, concelho da Moita, sob o artigo ….., com o valor patrimonial de € 33.445,98, inscrito na Conservatória do Registo Predial da Moita, sob o registo n.° …..encontra-se registada em nome de R….. (cfr. doc. junto a fls. 32 a 34 do doc. de fls. 107, numeração do SITAF);
30. O Prédio urbano sito na …..Moita, inscrito na matriz predial da freguesia e concelho da Moita, sob o artigo ….., com o valor patrimonial de € 223.459, 86, inscrito na Conservatória do Registo Predial da Moita, sob o registo n.° ….., encontra-se registada em nome de R….. (cfr. doc. junto a fls. 35 a 40 do doc. de fls. 107, numeração do SITAF);
31. A Fracção autónoma designada pela letra "A”, andar / divisão: cvFt, do prédio urbano sito na ….., inscrito na matriz predial da freguesia e concelho de Setúbal, sob o artigo ….., com o valor patrimonial de € 127.965,88, inscrito na Conservatória do Registo Predial de Setúbal, sob o registo n.° ….., encontra-se registada em nome de R….. (cfr. doc. junto a fls. 41 a 44 do doc. de fls. 107, numeração do SITAF);
32. A Fracção autónoma designada pela letra "H” andar /divisão: 1 frt, do prédio urbano sito na ….., inscrito na matriz predial da freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, sob o artigo ….., com o valor patrimonial de € 86.782,50, inscrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé, sob o registo n.° ….., encontra-se registada em nome de R….. (cfr. doc. junto a fls. 45 a 46 do doc. de fls. 107, numeração do SITAF);
33. R….. é detentor de uma quota no montante de € 5.000,00 na sociedade por quotas sob a firma A….., Lda. (cfr. doc. junto a fls. 47 a 52 do doc. de fls. 107, numeração do SITAF);
34. Em 17/10/2019 foi proferido despacho de arquivamento do processo de inquérito n° 137/19.2IDSTB que corria termos contra a sociedade D….., Lda. (facto que se retira do doc. junto a fls. 262, numeração do SITAF);
35. Do despacho identificado no ponto anterior consta que o processo deve ser arquivado por o crime de abuso de confiança fiscal não ser passível de punição a título de negligência e ter sido a convicção do Procurador- Adjunto que o mesmo não ter sido cometido a título de dolo. (cfr. doc. junto a fls. 262, numeração do SITAF);
36. M….. assinava pelo seu filho vários documentos da sociedade (depoimento da testemunha M…..);
***
A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
DOS FACTOS NÃO PROVADOS
a) Não ficou provado existir uma procuração que permitisse a M….. movimentar as contas bancárias ou representar a sociedade ou o seu filho R…..;
b) Não ficou provado que fosse M….. a representar a sociedade perante terceiros;
c) Não ficou provado que era M….. quem geria os destinos da sociedade D….., Lda.;
*
Não se provaram outros factos com relevo para a decisão da causa.
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Motivação da matéria de facto
A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, bem como do depoimento das testemunhas arroladas.
De início foi ouvido o Oponente R….., em sede de declarações de parte.
Afirmou ser empresário. Alegou que a empresa foi constituída por si mas para o seu pai trabalhar nela. Era o seu pai quem comprava os carros no estrangeiro. Confirmou que a nota de visita aquando da inspecção da AT foi assinada por si enquanto gerente da sociedade. Mais confirmou que assinou os cheques da sociedade. Afirmou que não sabe se foram aprovadas contas da sociedade. Afirmou que os pagamentos eram todos efectuados por transferência bancária à excepção dos cheques que se encontram juntos aos autos.
A primeira testemunha inquirida, M….., pai do Oponente, afirmou que assinava documentos pelo filho. Mais afirmou que era ele quem geria a sociedade. O depoimento desta testemunha não foi relevado pelo tribunal uma vez que em muitas situações o seu depoimento foi vago, impreciso e muitas vezes a testemunha não se lembrava das situações.
A segunda testemunha inquirida, J….., contabilista certificado, disse ser o contabilista certificado da sociedade “D….., Lda.” desde a sua constituição até ao presente.
Afirmou que sempre lidou apenas com o Sr. M…... Esclareceu ainda que nunca viu cheques da sociedade, nem actas da mesma. Mais afirmou que o Oponente R….. tinha de aparecer sempre que tinha de haver uma vinculação externa da sociedade.
O depoimento desta testemunha foi claro e seguro.
A terceira testemunha inquirida, C….., tendo afirmado que ia buscar veículos para o Sr. M….. à Alemanha e era quem contactava os vendedores dos carros. A testemunha demonstrou ter conhecimento dos factos a que depôs e o seu depoimento foi claro e seguro.
A quarta testemunha inquirida, L….., empresário de oficia automóvel. Conhece a sociedade porque a sua empresa presta serviços de reparação aos carros da "D….., Lda.”. Afirmou que não tem tido automóveis para reparar da empresa, mas desconhece se a empresa ainda mantem actividade.
A última testemunha inquirida R….., inspector tributário, afirmou que sempre falou apenas com o Sr. R….. tendo apenas falado uma vez com o pai do Sr. R….., Sr. M…... Foi afirmado por esta testemunha que ficou convicto que o Sr. R….. sabia do que se passava na sociedade. Mais afirmou que todos os esclarecimentos eram dados pelo gabinete de contabilidade.
No que respeita aos factos não provados não apresentaram os Oponentes qualquer documento comprovativo da existência duma procuração emitida pela sociedade D….., Lda. a favor de M…... Aliás, notificados para juntarem aos autos tal documento foi afirmado pelos Oponentes que tal documento não existia, bem como inexistia qualquer livro de actas da sociedade. A não existência de livro de actas não permite afastar a presunção judicial de que o único sócio e gerente da sociedade D….., Lda.. De facto, e não obstante a testemunha M….. ter afirmado que assinava documentos pelo filho, e que era quem determinava que veículos automóveis deveriam ser comprados e a quem não significa que fosse o gerente de facto da sociedade. Aliás, sendo R….. empresário, sócio e gerente doutra sociedade, este conhece e tem a obrigação de conhecer os deveres que sobre si impendem enquanto gerente duma sociedade. Mais, tratando-se duma sociedade unipessoal em que R….. é o seu único sócio e gerente, não é credível que tratando-se dum gerente experimentado no âmbito da sua outra sociedade desconhecesse as suas obrigações, designadamente fiscais. Por outro lado, da inquirição do inspector tributário responsável pela acção inspectiva retira-se que foi R….. quem sempre se apresentou como gerente da sociedade, demonstrando conhecer tudo o que se passava na mesma. Aliás, foi afirmado por esta testemunha que o seu pai apenas compareceu numa das reuniões e nunca mais o viu.”
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Conforme resulta dos autos, com base na matéria de facto supra transcrita a Meritíssima Juíza do TAF Almada, julgou procedente o presente arresto dos bens do executado e do responsável subsidiário.
Imputa então o recorrente, erro de julgamento de facto por errónea valoração da prova produzida nos autos.
Vejamos então:
Em 1º lugar importa considerar que tais conclusões recursiva cumprem os pressupostos do disposto no nº 1 e 2, do artº 640º, do CPC, na medida em que se menciona os concretos pontos de facto incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa, e a concreta decisão sobre as questões de facto impugnados, especificamente indicando os meios probatórios que a sustentam e das passagens da gravação em que se funda o seu recurso.
Em concreto , suscita-se, por um lado, que existe erro de julgamento da matéria de facto quanto à alegação de factos que foram submetidos à apreciação do Tribunal “A Quo” e que não foram objecto de decisão e que relevam para a decisão da causa ( deficit instrutório), relativos à inexistência de autoliquidação do IVA nas suas operações activas e concomitante falta de entrega de imposto daí decorrente.
Efectivamente, verifica-se que a recorrida na sua p.i em que requereu o arresto de bens daqueles devedores, juntou relatório da I.T., que apesar de referida no probatório ( cfr ponto 24, do referido segmento da sentença), não especifica que tipo de correcção de imposto foi efectuado ao s.p., e contendo os autos os elementos necessários à sua apreciação, e sendo tal facto relevante para a boa decisão da causa, pelo que, ao abrigo do disposto no nº 1, do artº 662º, do CPC, altera-se a decisão sobre a matéria de facto, sendo acrescentado o ponto 24-A, ao probatório, com o seguinte conteúdo:
“Do relatório da I.T. referida supra consta, como fundamento das correcções ao imposto apurado o seguinte:
- cfr relatório da I.T. de fls 5/13 a 9/13, do Doc. nº 2, junto com a p.i de pedido de arresto, constante dos autos.
Já quanto ao atendimento do alegado relativamente ao erro na apreciação das provas enquanto reportados à demonstração da responsabilidade subsidiária do 2º arrestado nos autos, transcritas as passagens dos respectivos meios de prova testemunhal que demonstrariam a falta de exercício de funções de gerente da sociedade devedora originária, e atento os factos apurados na 1º Instância, entende este Tribunal de Recurso, que , dos factos e dos fundamentos que constam do probatório, referido de 2) a 23), dos factos provados, das alíneas a) a c), dos factos não provados e da motivação da matéria de facto, não resulta qualquer facto incorrectamente julgado, ou que impusessem decisão sobre os mesmos diversa da recorrida, no que tange ao referido exercício de funções de gerente de facto pelo dito responsável subsidiário, sendo que os depoimentos sobre o pretenso exercício de funções de responsável societário na pessoa do progenitor não são convincentes e nada provam, antes resulta que os actos que se incluem nos poderes dos corpos sociais da dita empresa e dados como provados, foram praticados pelo 2º recorrente, pelo que não resulta a pretensa modificabilidade da decisão de facto dada como provada, que assim se mantém na ordem jurídica.- cfr “ a contrario sensu”, o disposto nº1, do artº 662º do CPC
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Vejamos agora os invocados erros de direito imputados à sentença, quanto aos pressupostos do decretamento da dita providência.
Em 1º lugar refira-se que encontrando-se o crédito em causa nos autos a ser exigida em sede de execução fiscal instaurada contra o 1º arrestado ( cfr ponto 25 dos factos provados e mencionado nas conclusões do requerimento recursivo), o seu decretamento já não depende do tributo estar em fase de liquidação ou já liquidado, já que tal pressuposto restringe-se legalmente ao arresto preventivo a quer se refere o artº 136º do CPPT, aqui se aplicando o arresto requerido em conformidade com o preceituado no artº 214º, do mesmo Código, o qual se refere à garantia da divida exequenda e acrescido.
Em 2º lugar , nestes casos, já existindo incumprimento ou mora do devedor, já se encontra vencido o crédito tributário, pelo que o seu decretamento apenas depende do referido “periculum in mora”, ou seja, que se demonstre o justo receio da perda da garantia patrimonial que “… faça antever o perigo de se tornar difícil ou impossível a cobrança do crédito…” nas palavras do Ilte Jurisconsulto “ Lebre de Freitas “, in CPC anotado, Vol.II, pags 124.- cfr nº1, do artº 214º do CPPT.
Em 3º lugar, considera-se, presuntivamente, que tal circunstância se verifica nos casos de dívida por imposto que o executado tenha, ao que ora nos importa, repercutido a terceiros e que não tenha procedido à sua entrega ao Estado nos prazos legais- cfr nº2, do artº 214º, do referido CPPT.
Aplicando tais normas ao caso aqui em análise, a F.P. requereu o arresto de bens suficientes para garantir a dívida exequenda e acrescido, não tendo o recorrente contestado nas ditas conclusões, a extensão da mesma, pelo que apenas cabe apreciar se o decretamento da providência se sustentou na necessária “… alegação e prova, ainda que perfunctória , de um circunstancialismo fáctico que faça antever o perigo de se tornar difícil ou impossível a cobrança do crédito..”, como bem refere o Ilte Juiz Conselheiro A. Abrantes Geraldes” in “Temas da Reforma do Processo Civil”, IV Vol., Ed, 2003, pags 186.Ora,
Atento o facto ora acrescido ao probatório, verifica-se que se torna imprestável à verificação daquele receio a presunção ínsita no referido nº 2, do artº 214º, do CPPT, porquanto as correcções de Imposto sobre o Valor Acrescentado, enquanto tributo repercutido a terceiros e não entregue, não se verifica, porquanto a dita liquidação adicional que resultou da referida acção inspectiva não resulta de um caso de autoliquidação do tributo nos seus “outputs” ( as chamadas operações activas do s.p.) e concomitante entrega do imposto ao Estado , antes derivam de falta de liquidação do mesmo aos respectivos clientes, por haver aplicado às operações tributáveis o regime da margem (vd Dec.-Lei nº 199/96, de 18.10), o que significa que apenas liquidou o tributo pela diferença entre o preço de compra e o valor da contrapartida obtida do cliente – cfr nº1, do artº 4º daquele regime, pelo que não repercutiu o tributo na totalidade sobre terceiros, sendo essa diferença de imposto não liquidado que originou a dita liquidação adicional de imposto.
Assim,
A referência feita na sentença quanto à dita presunção legal carece de suporte legal e é aqui expressamente afastada para efeitos de verificação do referido justo receio ao abrigo da referida norma .- cfr nesse sentido acórdão proferido no processo nº 197/20, de 05.11.2020, do STA, confirmativo desse entendimento.
Resta ainda assim averiguar se se fez a necessária prova de tal circunstancialismo fáctico que fundamente o decretamento do referido arresto.
A sentença sob judicio sustentou a decisão de decretamento da dita providência invocando o seguinte argumentativo fundamentador:
“ A providência cautelar do arresto preventivo, encontra-se especificamente prevista nos artigos 136° a 139° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), sendo-lhe subsidiariamente aplicável o disposto no Código de Processo Civil (cfr. art. 139° do CPPT).
Os requisitos de procedência do arresto, de acordo com a lei processual tributária, são os seguintes (cfr. art. 51° da Lei Geral Tributária e art.136° do CPPT):
1 - Haver fundado receio da diminuição da garantia de cobrança de créditos tributáveis;
2 - O tributo em causa estar liquidado ou em fase de liquidação, sendo que nos tributos periódicos, como é o caso do IRC ou do IRS, a lei considera que se encontra em fase de liquidação a partir do final do ano civil ou de outro período de tributação a que os respectivos rendimentos se reportem, enquanto nos tributos de obrigação única, como é o caso do IVA, o imposto se encontra em fase de liquidação, logo a partir do momento em que ocorre o facto tributário.
O fundado receio de diminuição das garantias de cobrança presume-se, pois estão em causa impostos que o devedor ou responsável esteja obrigado a reter ou a repercutir a terceiros - art. 136°, n° 5, do CPPT.
De facto, a existência de fundado receio da diminuição de garantia de cobrança dos créditos tributários implica que exista “um perigo logicamente justificado, uma probabilidade séria, com fundamentos objectos( sic) baseados em regras de experiência comum, de que os patrimónios dos titulares dos bens que servem de garantia à cobrança dos créditos tributários (devedor originário, responsável solidário e responsável subsidiário) diminuam de valor a ponto de se tornarem insuficientes para cobrança dos créditos tributários” (cfr. Lopes de Sousa, Jorge - Código de Procedimento e Processo Tributários, anotado e comentado, 6a edição, 2011, Áreas Editora, Vol. II, pág. 447).
Por sua vez o artigo 214°, n° 1 do CPPT determina que havendo justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens, pode o Representante da Fazenda Pública junto do competente tribunal tributário requerer o arresto em bens suficientes para garantir a dívida exequenda e o acrescido.
E o n° 2 do mesmo artigo consagra o seguinte: “As circunstâncias referidas no número anterior presumem-se no caso de dívidas de impostos que o executado tenha retido ou repercutido a terceiros e não entregue nos prazos legais".
No caso dos autos estamos perante dívidas de IVA, pelo que estamos no âmbito das presunções previstas no n° 2 do art. 214° e do n° 5 do art. 136°, ambos do CPPT.
Efectivamente, e contrariamente ao que é defendido pelos Oponentes, no caso do IVA, estamos perante um imposto que é repercutido sobre terceiros, pelo que se presume o justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens.
No âmbito do processo tributário o arresto (preventivo) tanto pode ser requerido antes da instauração da execução, como na pendência do processo executivo (artigos 136° e 214°, n° 3, do CPPT), admitindo a lei o pedido de arresto mesmo no âmbito do procedimento tributário de inspecção, enquanto medida cautelar que visa garantir o pleno exercício da função inspectiva da administração fiscal (cfr.art.31° do R.C.P.l.T.).
O arresto pode incidir sobre bens do sujeito passivo originário dos tributos, como sobre bens do responsável solidário ou subsidiário. No caso de se pretender o arresto de bens do responsável subsidiário antes da instauração da execução fiscal ou do chamamento deste à execução por via da reversão, torna-se necessário que o requerente (Fazenda Pública) alegue e prove, ainda que sumariamente (pois que estamos no domínio de um procedimento cautelar), factos tendentes a demonstrar que se encontram reunidos os pressupostos legais para esse chamamento à luz das normas que estabelecem a responsabilidade subsidiária por dívidas tributárias, o que acontece quando, de forma cumulativa, se verificam:
1- Os requisitos previstos no art.153°, n° 2, do CPPT, relativos à inexistência de bens penhoráveis do devedor originário ou à fundada insuficiência do património do mesmo devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido;
2- Os requisitos previstos no art. 24°, da L.G.T., relativos ao exercício do cargo de gerente da sociedade devedora no período da constituição do facto tributário ou no período de entrega ou pagamento dos impostos em dívida.
No requerimento inicial deve a Fazenda Pública alegar e efectuar prova sumária (“bonus fumus iuris") da factualidade demonstrativa do imposto ou da sua existência provável e dos factos integrantes do fundado receio da diminuição de garantias de cobrança do correspondente crédito, tendo ainda em consideração as referidas presunções no caso de imposto retido ou repercutido a terceiros. Além disso, deverá relacionar e identificar devidamente os bens que pretende ver arrestados, os quais devem ser suficientes para garantir a cobrança do respectivo crédito fiscal (cfr. artigos 136°, n° 4, e 137°, n° 2, ambos do CPPT).
Na fase da declaração do arresto impende sobre o requerente o ónus da prova dos factos integrantes dos respectivos requisitos, não bastando, em consequência, o simples e vago rumor de uma ameaça do requerido de se desfazer dos seus bens, para que se dê como provado que ele se prepara para o concretizar. E isto porque o receio de diminuição de garantias tem de ser fundado, o que vale por dizer, que deve ser apreciado objectivamente e não apenas na óptica pessoal do requerente.
Para que possa ser decretado arresto sobre bens do responsável subsidiário importa apenas verificar se ocorrem os requisitos referidos e ainda se se encontram preenchidos os pressupostos exigidos por lei para poder ordenar -se contra o mesmo a reversão da execução.
Neste mesmo sentido podemos ver diversos Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul, dos quais se destaca o Acórdão de 21 de Maio de 2013, Processo n.° 06620/13, onde é afirmado o seguinte:
“No caso de se pretender o arresto de bens do responsável subsidiário antes da instauração da execução fiscal ou do chamamento deste à execução por via da reversão, torna-se necessário que o requerente (Fazenda Pública) alegue e prove, ainda que sumariamente (pois que estamos no domínio de um procedimento cautelar), factos tendentes a demonstrar que se encontram reunidos os pressupostos legais para esse chamamento à luz das normas que estabelecem a responsabilidade subsidiária por dívidas tributárias, o que acontece quando, de forma cumulativa, se verificam: a) Os requisitos previstos no art°.153, n°.2, do C.P.P.T., relativos à inexistência de bens penhoráveis do devedor originário ou à fundada insuficiência do património do mesmo devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido; b) Os requisitos previstos no art. 24° da L.G.T., relativos ao exercício do cargo de gerente da sociedade devedora no período da constituição do facto tributário ou no período de entrega ou pagamento dos impostos em dívida.”
Questão diferente é a de saber se essa responsabilização se efectivará ou não, mas tal facto prende-se com a acção executiva e não pode, nem deve,ser confundida com a decisão sobre os fundamentos do arresto como medida cautelar preventiva da execução.
De facto, deve considerar-se suficiente que exista receio fundado da diminuição da garantia de cobrança dos créditos e o imposto esteja liquidado, bem como se encontram preenchidos os pressupostos exigidos por lei para poder ordenar-se contra o responsável subsidiário a reversão da execução.
Efectuado o enquadramento jurídico e jurisprudência da questão, cumpre agora verificar se, no caso concreto, se mostram reunidos os requisitos para o decretamento do arresto requerido.
Comecemos pela questão do arresto dos bens da devedora originária.
Decorre do probatório supra que a devedora originaria foi alvo de diversos procedimentos inspectivos que culminaram em liquidações adicionais de IVA.
Decorre também do probatório supra que a sociedade originariamente devedora não possui bens, para além da conta bancária cujo arresto é requerido.
Resulta, ainda, provado que o imposto se encontra liquidado. Aliás, até já decorreu o prazo para o pagamento voluntário e já se encontram instaurados os competentes processos executivos.
Por outro lado, e no que respeita ao fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis, estando nós perante uma dívida de IVA este presume-se, como já referimos acima.
Assim sendo, encontram-se reunidos os pressupostos para decretar o arresto do único bem conhecido da devedora originária.
Aliás, em sede de Oposição nenhuma questão é colocada relativamente ao arresto dos bens da devedora originária, pelo que o arresto se deve manter nesta parte.
Passemos agora ao pedido de arresto do responsável subsidiário.
Como já vimos acima para que se possa decretar o arresto de bens do responsável subsidiário é necessário que a Fazenda Pública alegue e prove factos tendentes a demonstrar que se encontram reunidos os pressupostos legais para esse chamamento à luz das normas que estabelecem a responsabilidade subsidiária por dívidas tributárias, ou seja, que seja alegada e provada a inexistência ou insuficiência de bens penhoráveis da devedora originaria para satisfazer a dívida exequenda, bem como que o alegado responsável subsidiário foi gerente de facto da devedora originária.(arts. 153°, n° 2 do CPPT e 24°, n° 1 al. b) da LGT).
O arresto em bens do responsável subsidiário depende, além do mais, do fundado receio da diminuição da garantia patrimonial. É, de resto, o que resulta do artigo 136.°, n.° 1, alínea a) e 214°, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Havendo vários patrimónios que respondam pela dívida, o fundado receio da perda da garantia patrimonial pressupõe, em princípio, o perigo de diminuição da garantia patrimonial que confere o conjunto desses patrimónios.
Sucede que, nas situações de responsabilidade subsidiária, os patrimónios do responsável originário e do responsável subsidiário não respondem simultânea, mas sucessivamente. Daqui se retira que o risco de diminuição da garantia patrimonial também não pode ser avaliado simultânea, mas sucessivamente. Assim, o receio de perda da garantia patrimonial que confere o património do responsável subsidiário já pressupõe que o património do responsável principal seja insuficiente para garantir a dívida.
É por esta razão que se diz que o arresto em bens do responsável subsidiário pressupõe a demonstração (em summaria cognitio) da insuficiência dos bens do devedor originário. Um juízo semelhante ao que o órgão de execução fiscal é chamado a fazer quando prepara a reversão contra o responsável subsidiário.
No caso dos autos, ficou claramente demonstrado que a devedora originária não possuem bens suficientes para fazer face às dívidas exequendas pelo que temos de considerar que este pressuposto se encontra preenchido.
De facto, ficou provado que a devedora originária não possui outros bens para além duma conta bancária, pelo que somos forçados a concluir que ficou provado pela Fazenda Pública a fundada insuficiência do património do devedor.
Cumpre agora verificar se ficou provado ser o alegado responsável subsidiário o gerente de facto da devedora originária.
De todo o probatório supra resulta que R….. sempre agiu como gerente da referida sociedade. De facto, quando a sociedade foi constituída era este o seu gerente. Estamos perante uma sociedade Unipessoal por quotas, com um sócio, e foi nomeado gerente da mesma desde o seu início. Por outro lado, de todos os documentos juntos verifica-se que R….. sempre se apresentou como sendo o gerente da sociedade, assinando cheques, notas de diligência, notificações várias da AT, em nome da sociedade.
Ou seja, resulta indiciariamente provado que R….. sempre agiu como sendo o gerente de facto da sociedade, pelo que também o requisito exigido pelo art. 24° da LGT se encontra reunido.
Vem o Oponente alegar que o gerente de facto da sociedade era o seu pai e que nunca praticou actos de gerência da sociedade.
Vejamos.
De facto, resulta do probatório supra que o pai do Oponente assinava documentos em seu nome, comprava veículos para vender no âmbito da sociedade originariamente devedora. No entanto, como também foi referido, sempre que havia contactos com o exterior da sociedade, ou seja, quer com a AT quer com bancos, quer com outras entidades era, porque tinha de ser, o Oponente quem representava a sociedade e agia em seu nome.
Acresce ainda que, estando nós perante um gerente experimentado, dado que possui outra sociedade que gere, não é credível que desconhecesse as obrigações que sobre si impendiam quando concordou em ser o único sócio e gerente desta sociedade.
Esta circunstância determina que os seus bens possam, ainda que apenas depois de excutidos os bens da sociedade (neste caso a conta bancária da mesma), responder pelas dívidas exequendas por se encontrarem reunidos os pressupostos legais.
Por outro lado, também resulta provado o “periculum in mora”, estando nós perante dívidas de IVA, presume-se, pelo que o arresto deverá também ser decretado contra os bens do presumível devedor subsidiário.
IV - DECISÃO
Em face do exposto e nos termos das disposições legais citadas, julgo totalmente improcedente o Oposição deduzida e, em consequência, mantenho o arresto decretado.”.
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Expostos os factos constantes da sentença, e respectiva fundamentação de direito quanto às questões jurídicas suscitadas nos autos, assim culminando com a decisão que delas conheceu e determinou o decretamento do referido arresto ( cfr artº 607º, do CPC), considerando a alteração da matéria de facto efectuada por esta instância recursiva, e não sendo, como ficou dito supra, mais sustentável a referida presunção legal daquele justo receio, resta aquilatar se se verifica tal perigo, ainda que perfunctoriamente, da dita diminuição de garantias de cobrança da dívida tributária, em razão do deperecimento, da impossibilidade, ou de grave dificuldade na sua cobrança, assim como da eventualidade da insolvência, de ocultação ou alienação dos bens do executado, e “mutatis mutandis” ,do responsável subsidiário- cfr o disposto no nº1 e nº4, do artº 136º, conjugado com o nº 1, do artº 214º, do CPPT e artº 392º, do CPC. Assim
Acolhendo o direito processual civil português uma cláusula geral quanto aos pressupostos normativos do arresto ( artº 392º, do CPC), e densificando a lei adjectiva tributária a expressa tipificação de certas situações em que tal se verifica ( referido nº1, do artº 214º, do CPPT), tanto bastará para se julgar sustentada aquela providência em todos os casos em que se constata uma situação de insuficiência dos bens daqueles devedores para satisfazer o crédito tributário ( cfr nesse sentido o Exmº Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, in “CPPT Anotado”, 4º ed. 2003,pags 601 e segs. Ora,
Nos presentes autos, verificou-se que, efectivamente o património da devedora originária era insuficiente para garantir tais créditos- daí a possibilidade de ser chamado a responder pela dívida o responsável subsidiário e da eventualidade de contra este ser dirigida igualmente idêntica providência cautelar , o que se encontra de acordo com o disposto no nº2 e nº 3, “in fine”, do artº 23º, todos da LGT e nº2, do artº 153º, do CPPT.- vd pontos 26 e 27, do probatório.
Dito isto,
Dever-se-á dizer que tal circunstancialismo não se verifica em relação ao 2º arrestado, porquanto , na eventualidade de o mesmo vir a responder subsidiariamente pela dívida exequenda e acrescido, como ficou demonstrado na sentença sob Júdice e este Tribunal acolheu relativamente aos ditos pressupostos de facto e de direito da referida susceptibilidade de se efectivar o seu chamamento a esse título, já não se constata tal justo receio . De facto,
A própria sustentação da decisão revinda assenta na pretensa presunção do referido “periculum im mora”, o que como observado supra, não se constata nos autos. Por outro lado,
Constata-se que os bens do seu património são mais que suficientes para que se considere que inexiste tal perigo de insuficiência para pagamento de tais créditos tributários, antes a própria eventualidade de efectivar a reversão da execução a que se refere o nº 1, do artº 23º da LGT, constitui-se como uma forma de “… garantir a possibilidade de ulteriormente vir a efectuar, … essa cobrança coerciva…” nas palavras daquele Ilte Autor e obra citada, pags 696. – vd pontos 28 a 33, do probatório.
Assim sendo,
- Verificando-se que inexiste uma probabilidade que aquele património do 2º arrestado venha a se mostrar insuficiente para cobrança dos créditos tributários em razão da falta do pressuposto de qualquer diminuição do respectivo valor que a sustentasse;
- E constatando-se a forte probabilidade de o mesmo vir a ser chamado para a execução fiscal a título subsidiário;
- Sendo que, nesse caso, tais circunstâncias serão suficientes para “… afastar a possibilidade de arresto”, como bem refere o Ilte Conselheiro, in obra citada , pags 602. Assim,
Julga-se como totalmente desajustada tal apreensão judicial dos bens dos ditos arrestados e nos termos determinados pelo Tribunal “A Quo”, pelo que não se pode manter na ordem jurídica por carecer de fundamento legal o seu decretamento, decisão a que se procede na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
Nos termos expostos considera-se totalmente procedente o recurso deduzido pelos recorrentes, sendo assim revogada a sentença quanto à determinação do arresto em bens dos respectivos titulares de tais patrimónios e que serviriam de garantia à cobrança dos créditos tributários, por não ocorrer o fundado receio de diminuição da garantia de cobrança dos créditos tributários.
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Custas pela recorrida em ambas as instâncias.
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Notifique.
[O relator consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores Mário Rebelo e Patrícia Manuel Pires ]