Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:10109/13
Secção:CA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:09/26/2013
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS, ORDEM DOS ADVOGADOS, REJEIÇÃO LIMINAR.
Sumário:I. O processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias é um processo principal a que só é legitimo recorrer, de acordo com o princípio da tipicidade dos meios processuais, ínsito no artº 2º, nº 2 do CPC, e de acordo com os pressupostos materiais previstos no nº 1 do artº 109º do CPTA, quando esteja em causa a lesão ou a ameaça de lesão, de um direito, liberdade ou garantia ou de um direito fundamental análogo, cuja protecção se revele indispensável à célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa, por não ser possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar, inclusive segundo o disposto no artº 131º do CPTA.
II. Estando em causa a tutela do direito de admissão dos Autores à 2ª fase de estágio na Ordem dos Advogados, sem precedência da realização de provas de aferição e da redução do período de estágio de 24 meses, para a duração máxima de 18 meses, fundado na aplicação do regime previsto na Lei nº 2/2013, de 10/01, encontrando-se agendadas essas provas para certas datas próximas, mostra-se meio processual próprio e adequado, a presente intimação, prevista e regulada no artº 109º e seguintes do CPTA.
III. Não se verificando os pressupostos previstos no nº 1, do artº 234º-A e no nº 4, do artº 234º, ambos do CPC, mostra-se ilegal a decisão de rejeição liminar da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Os 3º, 7º, 8º, 9º, 10º, 18º, 21º, 26º, 27º, 29º, 30º, 36º, 38º, 39º, 40º, 41º, 42º, 44º, 47º, 48º, 49º, 50º, 51º, 57º, 69º, 72º, 75º, 77º, 78º, 79º, 80º, 81º, 82º, 85º, 89º, 94º, 100º, 102º e 105º Autores, melhor identificados nos autos, na presente intimação para a defesa de direitos, liberdades e garantias, tendo ficado vencidos na sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 24/03/2013, que os opõe à Ordem dos Advogados, vieram interpor recurso jurisdicional e, na respectiva pendência do recurso, mediante a apresentação de requerimentos autónomos, vieram desistir da presente instância, nos termos e para os efeitos dos artºs 295º, nº 1 e 296º, nº 1, do CPC.

Destes requerimentos lograram notificar o ilustre mandatário da contraparte, o qual nada disse em juízo.


*

Porque o efeito pretendido pelos Autores, ora Recorrentes tem efeitos equivalentes ao da desistência do recurso jurisdicional, a qual é livre, por estar na sua disponibilidade, admito o pedido de extinção da instância, deferindo o requerido, nos termos do disposto nos artºs 295º, nº 2 e 296º, nº 1 do CPC (artºs. 285º, nº 2, 286º, nº 1 do CPC revisto), extinguindo-se a instância quanto aos Autores supra identificados.

Sem custas – alínea b), do nº 2 do artº 4º do RCP.

Notifique.


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Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

A...e Outros, devidamente identificados nos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 24/03/2013 que, no âmbito do processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, instaurado contra a Ordem dos Advogados, rejeitou liminarmente a presente intimação, por erro na forma do processo e impossibilidade de convolação no meio processual.

Formulam os aqui recorrentes nas respectivas alegações (cfr. fls. 384 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que se reproduzem:

A. A sentença recorrida ao indeferir liminarmente a presente intimação proferiu uma decisão inquinada por erro grosseiro de julgamento e em violação das normas constantes do arts. 1, 81 e 110 do CPTA e, bem assim, dos arts. 234-4 e 234-A-1 do CPC, razão pela qual deverá ser substituída por outra que ordene o normal prosseguimento dos autos com a consequente citação do Requerido para apresentar contestação.

B. Com efeito, não se enquadrando a presente intimação num dos casos em que lei processual administrativa e civil admite o indeferimento liminar em sede de prévio despacho judicial com fundamento na manifesta improcedência do pedido, é forçosa a conclusão de que o Tribunal a quo nunca poderia ter proferido um despacho de indeferimento liminar absolvendo o Requerido do pedido.

C. A sentença recorrida é, também, nula por omissão de pronúncia, na medida em que apenas se pronunciou sobre a inconstitucionalidade material das disposições finais e transitórias, quando interpretadas no sentido de aplicar as normas estatutárias e regulamentares que contrariam regime da Lei 2/2013, com fundamento na violação do princípio da igualdade.

D. Na verdade, os Recorrentes alegaram a referida inconstitucionalidade material, não só com fundamento na violação do princípio da igualdade, mas também com fundamento na violação do direito e liberdade de acesso e escolha de profissão e no princípio da legalidade, inconstitucionalidades materiais essas que o Tribunal a quo estava obrigado a conhecer e não conheceu, proferindo, por essa razão, uma decisão nula por omissão de pronúncia, nos termos do art. 668-1-d) do CPC, e em violação dos arts. 95-1 do CPTA e do art. 660-2 do CPC.

E. Nulidade essa que deve ser declarada com todos os efeitos legais.

F. Ultrapassadas as questões prévias sempre se diga que o Tribunal quo mal andou ao indeferir liminarmente com fundamento aparente na manifesta improcedência da pretensão dos Recorrentes, incorrendo em gravíssimo erro de julgamento, porquanto o direito dos Recorrentes existe e embora se possa discutir – no limite em que tudo é passível de discussão – se este foi ou não violado, nunca poderia o Tribunal a quo concluir pela improcedência sem pelo menos citar a Ré.

G. Ao fazê-lo proferiu uma sentença em clara denegação de justiça e em violação dos princípios de acesso ao direito e aos tribunais e do direito à livre escolha de profissão, proferindo, ademais, uma decisão inconstitucional na interpretação que faz, desde logo, do art. 234-A-1 do CPC e das disposições finais e transitórias da Lei 2/2013, por violação do art. 20 e 47-1 da CRP, inconstitucionalidade essa que se invoca para efeitos do art. 280 da CRP.

Mais grave ainda,

H. Não só não se verifica a manifesta improcedência do pedido dos Recorrentes, como a sua pretensão tem que ser julgada manifestamente procedente, tendo o Tribunal a quo decidido erradamente ao julgar tratar-se de um regime legal futuro potencialmente mais favorável, violando, desta feita, os arts. 47-1, 18-1-2 e o 204 todos da CRP, os arts. 8-2/a), 24-5-6, 52 e 55 da Lei 2/2013 e, bem assim, os arts. 9-2 e 7-2 do CC, razão pela qual deve ser substituída por outra sentença que julgue a pretensão dos Recorrentes totalmente procedente.

Senão vejamos,

I. Em primeiro lugar, Ordem dos Advogados incumpriu, por omissão, o prazo de 30 dias de que dispunha (e que, como aliás sublinha a sentença recorrida, terminou a 09.02.2013) para apresentar a proposta de alteração de Estatutos conforme ao novo regime geral das Associações Públicas Profissionais aprovado pela Lei 2/2013 – o que, nos termos do art. 53-6 da Lei 2/2013, e por se verificar a condição resolutiva nele prevista, determina a imediata revogação das normas estatutárias desconformes com o disposto no novo regime geral das associações públicas profissionais, assim como dos normativos regulamentares corporativos de execução daquelas normas (ou, se assim não se entender, a sua inconstitucionalidade superveniente, por falta de base legal em matéria de direitos, liberdades e garantias).

J. Em segundo lugar, o novo regime legal não é futuro e o Ilustre Julgador acolheu uma interpretação que não tem acolhimento na letra da lei e que, na verdade, vai mais além do que aquilo que a mesma expressa no art. 55 da Lei 2/2013, violando, assim, o disposto no art. 9-2 do CC: na verdade, a Lei 2/2013 é clara ao dispor no referido artigo a sua entrada em vigor 30 dias após a sua publicação, ou seja, no dia 09.02.2013 – isto sem prejuízo de os prazos de 30 e 90 dias que, respetivamente, as associações profissionais e Governo têm (tinham) que observar, se contarem da data da publicação da presente lei, ou seja, sem prejuízo de a contagem daqueles prazos se iniciar antes da entrada em vigor da lei.

K. Em síntese, todas as normas do referido regime têm uma vacatio legis de 30 dias, com excepção dos prazos previstos no art. 53-3-4 da Lei 2/2013, cuja contagem se inicia no dia seguinte ao da publicação; ou, se se preferir, cuja contagem não se sujeita à vacatio legis das restantes normas.

L. Mais ainda, não só o novo regime legal não é futuro, como entra em vigor com a menção expressa que, a partir desse momento, as normas contrárias com o novo regime [porque com ela não são compatíveis] cedem perante a entrada em vigor da Lei 2/2013, 10.01 – cfr. art. 52 da Lei 2/2013: é desde logo o caso das normas estatutárias constantes da Lei 15/2005, de 26 de Janeiro que estabelecem mais requisitos do que aqueles que o novo regime admite, designadamente aquelas que preveem a realização e a aprovação de provas de aferição e a duração de estágio superior a 18 meses e que são incompatíveis com os arts. 8-2/a) e 24-6 da Lei 2/2013, sendo por isso afastadas pela entrada em vigor deste último, nos termos do arts. 55 e 52-1.

M. Em palavras mais simples, as normas que impõem mais requisitos que os permitidos pela Lei 2/2013 em matéria de acesso e exercício de profissão, designadamente as que preveem a realização e aprovação em provas de aferição e a duração de estágio de, no mínimo, 24 meses, foram tacitamente revogadas pela entrada em vigor do novo regime - pelo que a Recorrida, ao impor mais restrições do que a lei geral em vigor desde o dia 09.02.2013 permite, com a aplicação de normas estatutárias com ela incompatíveis, impôs outras e distintas restrições ao acesso da profissão de advogado relativamente às permitidas pela lei restritiva/concretizadora do art. 47-1 da CRP, violando esta disposição jusfundamental!

N. Em terceiro e último lugar – mesmo que assim não se entendesse – a imposição de mais requisitos aos Recorrentes do que os previstos no novo regime geral põe em causa o direito de livre escolha de profissão dos Recorrentes, por violação do subprincípio da necessidade, segundo o qual se deverá sempre se averiguar se existe outro meio que, podendo produzir sensivelmente o mesmo resultado seja menos gravoso ou agressivo do ponto dos direitos fundamentais.

O. Com efeito, na sua tarefa constitucional de restrição/concretização do direito fundamental de livre escolha de profissão, entendeu o legislador que apenas são admissíveis, apenas são razoáveis quatro requisitos específicos que ficam muito aquém dos requisitos exigidos pela Recorrida até então, para inscrição dos seus membros como estagiários.

P. Por conseguinte, se o legislador considerou serem essas as restrições bastantes para a salvaguarda do interesse público, conclui-se que a Recorrida deveria ter desaplicado, por serem substancialmente inconstitucionais as antigas normas estatutárias que impunham (e imporão ainda) mais requisitos do que os que o legislador hoje entende como admissíveis, em concretização e densificação do disposto no art.º 47.º n.º 1, violando-o na vertente da necessidade – cfr. art. 266-4 da CRP.

Q. De todo o exposto resulta claro que o Tribunal a quo tinha uma obrigação acrescida de decidir diferentemente e, nessa medida, não aplicar nenhuma das normas impositivas de mais requisitos do que os permitidos pela Lei 2/2013, intimando do mesmo passo a Recorrida a não impor mais nenhum requisito para além dos previstos nesse mesmo regime, designadamente a não realizar as provas de aferição e a encurtar o período de estágio – tendo por isso incorrido, ao fazer diferentemente (ao optar pela simples aplicação das exigências impostas pelos Estatutos aprovados na Lei 15/2005, enquanto não forem aprovados os novos Estatutos, sem apreciar a solução alcançada à luz das normas constitucionais) num gravíssimo e indesculpável erro de julgamento que prefere a certeza da aplicação da norma estatutária, à justiça e à defesa da Constituição.

Posto isto,

R. A sentença recorrida incorreu, igualmente, em erro de julgamento ao concluir que a interpretação das normas constantes dos arts. 52, 53 e 55 da Lei 2/2013, no sentido de aplicar aos Recorrentes as normas do anterior Estatuto, não é materialmente inconstitucional com fundamento na violação do princípio da igualdade.

S. E, consequentemente, proferiu uma decisão em violação do art. 13 da CRP, na medida em que tal interpretação determina uma desigualdade de tratamento sem substância material que o justifique e, mais ainda, em prejuízo dos actuais membros, obrigando-os a cumprir mais requisitos, com uma duração de estágio de no mínimo 24 meses, do que os que são impostos aos restantes advogados-estagiários e mesmo aos restantes estagiários das demais ordens, não obstante todos estarem abrangidos pelo mesmo regime legal em vigor.

T. Quanto ao julgamento de inadmissibilidade do meio processual, comece-se por dizer que o pedido formulado em sede de intimação, a tutela e a proteção do direito fundamental de acesso e livre escolha da profissão de advogado dos ora Recorrentes e os interesses públicos e particular em presença não se compadecem com um tratamento de urgência meramente provisório, impondo-se, a contrario, o tratamento desta questão a título definitivo e imediato.

U. Aliás, este tem sido o entendimento unânime da Jurisprudência do Tribunal Central Administrativo do Sul, no que respeita à resolução de litígios entre os profissionais e as respectivas Ordens Profissionais, onde se inclui a ora Recorrida, v.g. nos acórdãos de 19.1.2011, 01.07.2010, 03.03.2011 todos disponíveis in www.dgsi.pt, entendimento esse que se aplica inteiramente ao caso sub iudice – cfr. doc. 119 junto com o requerimento inicial – razão pela qual é imperiosa a conclusão de que o Tribunal a quo incorreu em clamoroso erro de julgamento, porquanto a intimação para proteção de DLG’s é o único meio processual existente que pode satisfazer a pretensão dos ora Recorrentes, verificando-se o preenchimento de todos os seus pressupostos no caso sub iudice e impondo-se a sua adopção segundo o princípio da tutela jurisdicional efectiva.

V. Ao decidir como decidiu pela inadmissibilidade do meio processual em apreço, o Ilustre Julgador de 1.ª Instância violou os arts. 2-1, 7 e 109, todos do CPTA, e, bem assim, o art. 268-4 da CRP, devendo, por isso, a sentença recorrida ser substituída por outra que julgue admissível o meio processual requerido a título principal.

Sem prescindir,

W. Em relação à não admissão da convolação da presente intimação em providência cautelar, tal como requerido pelos Recorrentes, sempre se diga que o Tribunal a quo incorreu novamente em erro de julgamento por violação dos princípios da tutela jurisdicional efectiva, da adequação formal, da economia processual e da igualdade, violando, assim, o disposto nos arts. 268-4 e 13 da CRP, 2.º, 7.º e 109 do CPTA, art. 265-A do CPC.

X. Acolhendo, ademais, uma interpretação materialmente inconstitucional dos 2.º, 7.º e 109 do CPTA, art. 265-A do CPC, por violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva (art. 268-4 da CRP) e do princípio da igualdade (art. 13.º do CPC), quando interpretadas no sentido de não ser admissível a convolação da intimação em providência cautelar, inconstitucionalidade essa que se invoca para os efeitos do artigo 280.º da CRP.

Y. Na verdade, a convolação era a única solução que permitia que fosse proferida uma decisão de mérito por respeito e em obediência aos referidos princípios, tanto mais que idênticas acções foram propostas neste mesmo Tribunal, tendo sido requerida e ordenada a referida convolação, sem terem sido aduzidos argumentos relacionados com a falta de alternatividade ou a impossibilidade da convolação – cfr. processos n.ºs 961/11.4BEBLS, na 5.ª Unidade Orgânica, e 2819/11.8BELSB que correu termos na 2.ª Unidade Orgânica

Z. É que, se o ordenamento jurídico tolera decisões em sentido contrário proferidas por Tribunais diferentes, o mesmo não se pode aceitar em relação ao mesmo Tribunal, sob pena de aumentar o sentimento de injustiça e desigualdade no tratamento de questões idênticas, ou seja, sob pena de violação do princípio da igualdade, como consagrado no art. 13 da CRP.”.

Pedem a procedência do recurso e a baixa dos autos para citação da Requerida para contestar ou, caso assim não se entenda, deve o recurso ser julgado totalmente procedente e deve ser julgada procedente a intimação.


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A ora recorrida, notificada, apresentou contra-alegações, sem formular conclusões, concluindo pela manutenção do despacho recorrido (cfr. fls. 517 e segs.).

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O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso (cfr. fls. 537-539).

Sustenta que não podia o Juiz a quo indeferir liminarmente a petição, por não ser verificar qualquer das situações previstas no artº 234º nº 4 e 239º-A, do CPC.

O meio processual escolhido pelos recorrentes não se enquadra em qualquer das alíneas referidas no nº 1, do artº 234º-A do CPC e não se afigura manifesta a falta dos pressupostos previstos no nº 1, do artº 109º do CPTA, tendo sido necessário entrar na apreciação da questão de fundo para aferir se existem esses pressupostos.

Pugna que a falta de pressupostos sempre teria que ser mais ou menos evidente e apreciada de forma sumária sob pena de, ao apreciar a sua existência, se conhecer simultaneamente ou em vez dela, do fundo da causa.

Pelo que vem referido no despacho recorrido, poderá estar implícita uma decisão sobre o fundo da causa no sentido da sua improcedência, o que não pode acontecer em indeferimento liminar.

Deveria ter sido ordenada a notificação da Ordem dos Advogados para contestar ou então ser convolada a presente intimação na forma de processo que se julgasse adequada, nomeadamente, em providência cautelar com decretamento provisório, atenta a urgência na realização das provas, em 8, 10 e 12 de Abril.

Como na actualidade já não se verifica a urgência, deve o processo de intimação prosseguir com a forma prevista para as acções administrativas especiais.

Emite parecer no sentido da procedência do recurso e a baixa dos autos à primeira instância, para o seu prosseguimento.


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O processo vai, sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, n.º 1, todos do CPC, ex vi artº 140º do CPTA.

As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de:
1. Nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d), do nº 1, do artº 668º e em violação do nº 2, do artº 660º do CPC e do nº 1, do artº 95º do CPTA;
2. Erro de julgamento de direito quanto à decisão de indeferimento liminar, por procedência da excepção de erro na forma de processo, em violação dos artºs 1º, 2º, 7º 81º, 109º e 110º do CPTA e dos artºs 234º, nº 4, 234º-A, nº 1 e 265º-A, do CPC, em denegação de justiça, em violação dos princípios de acesso ao direito e aos Tribunais e da tutela jurisdicional efectiva, da adequação formal, da economia processual, da igualdade e do direito à livre escolha de profissão, nos termos dos artºs. 20º, 13º e 47º, nº 1 da Constituição, por ser meio adequado à pretensão, a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias.

III. FUNDAMENTOS

DE DIREITO

1. Nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d), do nº 1, do artº 668º e em violação do nº 2, do artº 660º do CPC e do nº 1, do artº 95º do CPTA

Nos termos suscitados pelos Recorrentes, a decisão recorrida enferma de nulidade, por omissão de pronúncia, por apenas se ter pronunciado sobre a inconstitucionalidade material das disposições finais e transitórias, com fundamento na violação do princípio da igualdade, quando os Recorrentes alegaram a referida inconstitucionalidade material também com fundamento na violação do direito e liberdade de acesso e escolha de profissão e no princípio da legalidade.

Vejamos.

Compulsada a decisão judicial impugnada no presente recurso, denota-se que a mesma traduz-se numa decisão de rejeição liminar da presente intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, fundada na “inexistência, ou mesmo na aparência de existência de um direito actual” e na impossibilidade de convolação do presente meio processual em providência cautelar, decorrente dos “limites da tutela cautelar, impostos pela provisoriedade que a estruturam”.

Considerando a natureza da decisão que foi proferida e que ora se mostra recorrida no presente recurso, isto é, uma decisão de rejeição liminar, proferida mediante invocação do disposto no artº 234º-A, nº 1 do CPC, significa que, em rigor, o Juiz a quo não conheceu ou não deveria ter conhecido do mérito do pedido, traduzido na pretensão material requerida pelos Autores, segundo as causas de pedir alegadas na petição inicial.

Assim sendo, não faz sentido invocar a nulidade da decisão recorrida com fundamento em omissão de pronúncia, pois o que se verifica é que nos termos da decisão proferida, ficou prejudicado o conhecimento das questões que integram o thema decidenduum do processo de intimação.

De resto, como tem salientado abundantemente a jurisprudência dos Tribunais Superiores, não se verifica a nulidade da decisão, por omissão de pronúncia, quando a omissão do conhecimento de certa questão resulte de ter ficado prejudicado por decisão proferida no âmbito da lide.

Adoptando a doutrina vertida no Acórdão do STA, de 19/10/2011, proc. nº 0173/11:

I – Por força do comando ínsito no artigo 660.º nº 2 do Código de Processo Civil incumbe ao julgador a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio, ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras.”.

Assim, considerando a decisão que, em concreto, foi proferida, não tem razão o alegado pelos Recorrentes, sendo de improceder a nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia, a que alude a al. d), do nº 1, do artº 668º do CPC, por o Tribunal não ter deixado de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.


2. Erro de julgamento de direito quanto à decisão de indeferimento liminar, por procedência da excepção de erro na forma de processo, em violação dos artºs 1º, 2º, 7º 81º, 109º e 110º do CPTA e dos artºs 234º, nº 4, 234º-A, nº 1 e 265º-A, do CPC, em denegação de justiça, em violação dos princípios de acesso ao direito e aos Tribunais e da tutela jurisdicional efectiva, da adequação formal, da economia processual, da igualdade e do direito à livre escolha de profissão, nos termos dos artºs 20º, 13º e 47º, nº 1 da Constituição, por ser meio adequado à pretensão, a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias

Os Recorrentes, divergindo da decisão recorrida, de rejeição liminar da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, vêm-lhe assacar um conjunto de erros de julgamento de Direito, nos termos supra invocados.

Vejamos antes de mais o enquadramento da presente lide.

Decorre dos autos que os Autores vêm a juízo instaurar a presente intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, pedindo:

a) a intimação da Ordem dos Advogados, a admitir os Autores à 2ª fase de estágio, sem a realização de provas de aferição, por esse requisito ser inadmissível à luz do artº 24, nºs 5 e 6 da Lei nº 2/2013, de 10/01 e ser inconstitucional, por violação do núcleo essencial do direito de liberdade de escolha e acesso à profissão de advogado, previsto no nº 1 do artº 47º da Constituição;

b) a intimação da Ordem dos Advogados a desaplicar quantos aos Autores, na qualidade de estagiários da 1ª fase, as normas estatutárias que contrariem o regime da Lei nº 2/2013, nos termos do artº 52º do mesmo diploma, não exigindo a realização das provas de aferição e reduzindo a duração mínima do estágio de 24 meses, para a duração máxima de 18 meses, assim como a eliminação de qualquer outro requisito adicional imposto pela Ordem e, ainda

c), a não aplicação das normas constantes das disposições finais e transitórias constantes da Lei nº 2/2013, quando interpretadas no sentido de aplicar as anteriores normas estatutárias e regulamentares que contrariem as normas da Lei nº 2/2013, com fundamento na sua inconstitucionalidade material, por violação do direito de liberdade de escolha e acesso de profissão, do princípio da legalidade e do princípio da igualdade, consagrados nos artºs 47º, nº 1, 3º, nº 3, 266º, nº 2 e 13º, todos da Constituição.

Subsidiariamente, requereram que o processo de intimação fosse convolado em providência cautelar, com decretamento provisório.

Entendeu o Tribunal a quo que a situação descrita pelos Autores apresenta-se lesiva, sendo caracterizada como de ameaça grave e violação do direito fundamental de liberdade de escolha do exercício de uma profissão e que se traduz, sem margem de dúvidas, na invocação de um direito e liberdade fundamental.

Mais se entendeu na decisão impugnada que “a alteração legislativa operada pela Lei nº 2/2013, não implica, por si só, que a aplicação dos diplomas legais então em vigor, passem automaticamente a configurar uma ameaça grave e eminente de lesão ao direito de liberdade de escolha e de acesso à profissão consagrado no artigo 47º, nº 1 da CRP”, que “Da análise dos fundamentos alegados para justificar os pedidos formulados pelos Requerentes, resulta a inexistência, ou mesmo a aparência de existência de um direito actual, mas apenas um regime legal futuro, potencialmente mais favorável decorrente da entrada em vigor da lei nº 2/2013.” e ainda, que se verifica “a inexistência da indispensabilidade do presente pedido intimatório”.

É contra este entendimento que se insurgem os ora Recorrentes, considerando que não poderia a petição inicial ser liminarmente rejeitada, por inexistir fundamento para tanto, além de que se afigura incorrecto o julgamento constante da decisão sob recurso.

Ora, tal julgamento, relativo à procedência da excepção de erro na forma do processo, não se pode manter, por se mostrar incorrecto, inexistindo fundamento legal para a rejeição liminar da presente intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, prevista e regulada no artº 109º e segs..

Está em causa a tutela dos direitos que os Autores se arrogam, relativos à submissão à 2ª fase de estágio na Ordem dos Advogados, sem a realização de provas de aferição, assim como quanto à duração do estágio, o que exige a definição do regime legal aplicável à sua situação jurídica, designadamente em face do novo regime aprovado pela Lei nº 2/2013, de 10/01, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais.

A pretensão tal como requerida pelos Autores, atenta a sua natureza e contornos, apresenta-se relativa a direitos, liberdades e garantias ou emergente de direito fundamental análogo, o qual, segundo a alegação constante da petição inicial se encontra ameaçado, cuja tutela não se compadece com a adopção de uma medida provisória ou com o recurso aos meios normais, urgentes e não urgentes, antes exigindo uma decisão de mérito.

Assim, se configura a situação existente à data em que o presente processo de intimação deu entrada em juízo, destinado, de entre o mais, a impedir a realização das provas de aferição agendadas para os dias 8, 10 e 12 de Abril de 2013, pelo que, caracterizada estava a situação de necessidade de tutela de mérito urgente.

A pretensão que se mostra deduzida em juízo cai, por isso, no âmbito do meio processual usado pelos Autores, a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, prevista e regulada no artº 109º e segs. do CPTA, pois não só visa a tutela de um direito, liberdade e garantia ou emergente de direito fundamental análogo, decorrente da liberdade de escolha e de acesso à profissão, como se encontrava configurada, à data da instauração da intimação em juízo, a existência de uma situação de especial urgência na sua tutela, nos termos alegados e requeridos pelos Autores.

Segundo o disposto no nº 1, do artº 109º, do CPTA, a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias apenas pode ser utilizada quando se revele indispensável à célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa, para assegurar, em tempo útil, um direito, liberdade e garantia, por não ser possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar, segundo o disposto no artº 131º do CPTA.

O processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias é um processo principal e não um processo cautelar, a que só é legitimo recorrer, de acordo com o princípio da tipicidade dos meios processuais, previsto no artº 2, nº 2 do CPC, e de acordo com os pressupostos materiais previstos no artº 109º, nº 1 do CPTA, quando esteja em causa a lesão ou a ameaça de lesão, de um direito, liberdade ou garantia ou de um direito fundamental análogo, cuja protecção seja urgente e que não é possível obter através da instauração de outro meio processual.

Se no caso concreto a tutela da situação jurídica ficar suficientemente assegurada pela propositura de uma acção principal normal e de um processo cautelar, a acção subsidiária urgente, prevista no artº 109º CPTA, será inadequada.

Conforme supra exposto, no caso dos autos está em causa a intimação da Ordem dos Advogados a adoptar as condutas necessárias para que se concretize a admissão dos Autores e ora Recorrentes à 2ª fase de estágio, sem a realização de provas de aferição, o que, pela sua própria natureza, não permite a respectiva definição do Direito de forma provisória, isto é, o seu reconhecimento “a prazo”, até que o processo principal que decida o mérito da causa se encontre decidido.

Atento o carácter instrumental e provisório das providências cautelares e decorrente de todo o desenrolar da actividade a empreender durante a fase de estágio, verifica-se que não é adequada a tutela requerida através do decretamento de uma providência cautelar.

Por outro lado, sendo invocado um direito, liberdade e garantia, merecedor de tutela urgente, considerando que a realização das provas de aferição se encontravam agendadas para os dias 08, 10 e 12 de Abril de 2013, conclui-se, de acordo com o disposto no nº 1, do artº 109º, do CPTA, que a forma de processo correcta para a tramitação do presente processo é a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias.

Não só está em causa a tutela do exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade e garantia ou de um direito fundamental análogo, como é caracterizada a urgência nessa tutela definitiva e ainda, que existe a indispensabilidade do meio, na óptica de subsidiariedade da presente intimação judicial, isto é, por serem insuficientes os restantes meios processuais.

Assim, ao decidir de outro modo, incorre a decisão recorrida na censura que lhe é dirigida.

Por outro lado, os fundamentos invocados na decisão recorrida não constituem fundamentos legais para a decisão de rejeição liminar, já que não tem aplicação a norma legal que serviu de substrato à decisão impugnada, o disposto no nº 1 do artº 234º-A do CPC, por não se verificar a situação de o pedido deduzido ser manifestamente improcedente ou ocorrerem, de forma evidente, excepções dilatórias insupríveis, de que o Juiz deva conhecer oficiosamente.

O juízo que precede a decisão recorrida encontra-se incorrectamente formulado, pois perante a configuração do litígio, nos termos decorrentes unicamente da petição inicial – já que não logrou a Ordem dos Advogados ser notificada para responder e apresentar a sua resposta, de forma a contradizer o pedido e os seus respectivos fundamentos – não se pode concluir, sem mais, pela improcedência do pedido e, muito menos, pela sua improcedência manifesta.

Não estão, pois, verificados os pressupostos previstos no nº 1 do artº 234º-A e nº 4 do artº 234º, ambos do CPC, para que tivesse sido proferida decisão de rejeição liminar.

Além disso, como salienta o Ministério Público, foi necessário entrar na apreciação da questão de fundo para aferir se existem os pressupostos, in casu, para a rejeição liminar, sendo que a falta desses pressupostos sempre teria que ser mais ou menos evidente e apreciada de forma sumária, sob pena de, ao apreciar a sua existência, se conhecer simultaneamente ou em vez dela, do fundo da causa.

A fundamentação que preside à decisão sob recurso, de forma mais ou menos explícita, acaba por tomar posição de fundo sobre a pretensão material controvertida ou seja, sobre o cerne do litígio o que não é de conceder em decisão com essa natureza, de rejeição liminar, em que não foi facultada a parte contrária de se pronunciar e de contradizer o pedido.

O disposto no nº 1, do artº 234º-A, do CPC está apenas pensado para situações em que não suscite qualquer dúvida, ainda que razoável, sobre o demérito da pretensão requerida, por ser total e manifestamente infundada, o que de todo não é de configurar no caso configurado em juízo.

Assim, não poderia ter sido proferida decisão de rejeição liminar, pondo termo ao litígio, sem conceder a possibilidade de a contraparte contradizer o pedido, por não se verificarem os respectivos pressupostos de indeferimento liminar, designadamente, quanto a pretensão requerida ser manifestamente improcedente.

Ao decidir de outro modo, incorre a decisão recorria em erro de julgamento, por violação do disposto nos artºs. 7º, 109º e 110º do CPTA e ainda dos artºs 234º, nº 4 e 234º-A, nº 1, do CPC.

Termos em que, perante o exposto, procedem as conclusões do recurso em análise, por provadas, enfermando a decisão recorrida dos invocados erros de julgamento de Direito.


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Será pois, de conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida e ordenando a baixa dos autos para o seu prosseguimento, se nada mais obstar.

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Sumariando, nos termos do nº 7 do artº 713º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. O processo de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias é um processo principal a que só é legitimo recorrer, de acordo com o princípio da tipicidade dos meios processuais, ínsito no artº 2º, nº 2 do CPC, e de acordo com os pressupostos materiais previstos no nº 1 do artº 109º do CPTA, quando esteja em causa a lesão ou a ameaça de lesão, de um direito, liberdade ou garantia ou de um direito fundamental análogo, cuja protecção se revele indispensável à célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa, por não ser possível ou suficiente o decretamento provisório de uma providência cautelar, inclusive segundo o disposto no artº 131º do CPTA.

II. Estando em causa a tutela do direito de admissão dos Autores à 2ª fase de estágio na Ordem dos Advogados, sem precedência da realização de provas de aferição e da redução do período de estágio de 24 meses, para a duração máxima de 18 meses, fundado na aplicação do regime previsto na Lei nº 2/2013, de 10/01, encontrando-se agendadas essas provas para certas datas próximas, mostra-se meio processual próprio e adequado, a presente intimação, prevista e regulada no artº 109º e seguintes do CPTA.

III. Não se verificando os pressupostos previstos no nº 1, do artº 234º-A e no nº 4, do artº 234º, ambos do CPC, mostra-se ilegal a decisão de rejeição liminar da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, em revogar a decisão recorrida e em ordenar a baixa dos autos para o seu prosseguimento, se nada mais obstar.

Custas pela recorrida.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)

(Maria Cristina Gallego Santos)

(António Paulo Vasconcelos)