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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2489/19.5BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:03/18/2021
Relator:JORGE PELICANO
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO
OBRAS DE CONSERVAÇÃO.
Sumário:I. O vício que é imputado ao despacho que determinou a realização de vistoria a edifício com dispensa das formalidades previstas no art.º 90º, n.ºs 2 e 3 do RJUE, na redacção à data dos factos, não é, no caso, susceptível de ser sancionado com o desvalor da nulidade.
II. Tal despacho, assim como o que intimou a Recorrente à realização de obras de conservação no edifício com vista à salvaguarda da segurança das pessoas que ali residiam, encontram-se consolidados na ordem jurídica por não terem sido tempestivamente impugnados.
III. Tendo tais despachos sido notificados à Recorrente e não se verificando qualquer causa justificativa para a não realização das obras, há que concluir que a sentença recorrida não sofre do erro de julgamento que lhe é apontado ao ter mantido a coima de 1.500,00€ e ter decidido que não é aplicável a sanção de admoestação a que se refere o art.º 51.º do RGCO.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I..., instituição particular de solidariedade social, vem interpor recurso da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial do despacho de 26/08/2019 proferido pelo Município de Lisboa no âmbito do processo de contra-ordenação nº 1565/RLU/2014, através do qual lhe foi aplicada a coima de 1.500,00€ por incumprimento da intimação para realização de obras de conservação no imóvel sito na Rua D..., nº 3 a 3F, em Lisboa.

Formulou as seguintes conclusões:

“A. Pela ora recorrida foi instaurado o processo de contraordenação nº 1-152- 2017, que culminou com a decisão condenatória de 26.08.2019, aplicando-se uma coima à ora recorrente, no montante de 1.500,00 €, e nas custas do processo no valor de 51,00 €, nos termos do disposto pelo art.º 98º, nº1, al. s) e nº 4 do DL nº 555/99, de 16 de dezembro, na redação dada pelo DL nº 136/2014, de 9 de Setembro, (Regime Jurídico da Urbanização e Edificação).

B. O fundamento explanado para a prática, pela ali arguida, de uma contraordenação e, consequente, aplicação de uma coima, foi que se tinha verificado o incumprimento da intimação para realização de obras de conservação determinadas para o imóvel, no âmbito do processo municipal nº 1565/RLU/2014, por violação do art.º 98º, nº1, al. s) e nº 4 do DL nº 555/99, de 16 de dezembro, na redação dada pelo DL nº 136/2014, de 9 de Setembro.

C. Impugnado judicialmente tal ato foi alegada a Nulidade do ato e, consequentemente, de todo o processo de contraordenação instaurado, por se verificar que foram preteridos a realização de todos os procedimentos previstos no art.º 90º do RJUE e realização da audiência prévia dos interessados, de acordo com o art.º 100º do velho CPA.

D. Entende o Tribunal a quo que a arguida não alegou e, por conseguinte, não logrou provar que usou dos meios processuais adequados à impugnação de tal ato administrativo e que, o meio processual adequado seria o recurso à ação administrativa regulada no Título II do CPTA.

E. Bem como, o supra referido ato administrativo se tornou eficaz e inimpugnável pelo decurso do prazo, de 3 meses, de que a mesma dispunha para a respetiva impugnação, formando assim caso decidido administrativo.

F. Com o devido respeito pelo douto entendimento do Tribunal a quo, não se conformando a aqui recorrente com o mesmo, porquanto, a nosso modesto ver, deveria o Tribunal recorrido ter declarado, oficiosamente, a Nulidade do ato administrativo e de todo o procedimento administrativo, ao abrigo do disposto no nº 2, do art.º 162º do CPA (artigo 134º do velho CPA).

G. A supra identificada vistoria, ocorrida a 13.10.2014, foi realizada com a preterição das formalidades legais previstas no art.º 90º do RJUE, tal como a própria Câmara Municipal de Lisboa, na decisão que proferiu, admite.

H. Antes de ser proferida tal ordem para realização de tais medidas cautelares de obras e antes de tal intimação à ora recorrente, foram preteridas as formalidades legais prescritas no art.º 90º do RJUE e art.º 100º do velho Código de Procedimento Administrativo, aplicável à altura dos factos.

I. De igual modo, foram preteridos a realização de todos os procedimentos previstos no art.º 90º do RJUE e realização da audiência prévia dos interessados, de acordo com o art.º 100º do velho CPA, o que a autoridade administrativa afirma e reconhece na decisão que ora proferiu.

J. O DL nº 555/99, de 16 de dezembro manda observar determinadas formalidades legais, concretamente as prescritas no art.º 90º do RJUE, que podem ser preteridas quando exista risco iminente de desmoronamento ou grave perigo para a saúde
pública, nos termos previstos na lei para o estado de necessidade, nos termos do nº 8 do referido artigo.

K. A preterição das formalidades prescritas no art.º 90º do RJUE não se encontravam justificadas nos presentes autos.

L. Resultando dos factos assentes que a situação de estado de necessidade era inexistente.

M. Sendo violado o disposto no art.º 90º, nºs. 2 e 3, do DL n.º 555/99, por preterição de formalidades legais, ocorreu a Nulidade do Ato Administrativo.

N. O acto nulo não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade, nos termos do disposto no número 1 do art.º 162º do CPA (artigo 134º do velho CPA).

O. A nulidade é invocável a todo o tempo e pode, também a todo o tempo, ser conhecida e declarada pelos tribunais administrativos, nos termos do disposto no nº 2 do art.º 162º do CPA (artigo 134º do velho CPA).

P. Encontrando-se o ato administrativo que determinou a realização dessas obras ferido do vício de Nulidade e, consequentemente, ferido de nulidade todo o procedimento que culminou com a prolação do despacho do Vereador da ora recorrida, de 31.10.2014, deveria o Tribunal a quo ter declarado, oficiosamente, a Nulidade do supra referido ato e de todo o procedimento administrativo, ao abrigo do disposto no nº 2, do art.º 162º do CPA (artigo 134º do velho CPA).

Q. E, consequentemente, a verificação do supra referido vício inquina o procedimento contraordenacional objeto dos presentes autos que antecedeu a decisão condenatória pelo aqui recorrido, o que determina a anulabilidade do procedimento contraordenacional, nos termos do art.º 135º do velho CPA.

R. Razão pela qual deve o processo de contraordenação instaurado contra a aqui recorrente ser ARQUIVADO.

S. Pelo que, ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou o disposto no art.º 90º, nºs. 2 e 3, do DL n.º 555/99 e o disposto no art.º 162º do Código de Procedimento Administrativo (artigo 134º do velho CPA).

T. No que concerne à gravidade da infração, há que atender aos interesses públicos urbanísticos e aos valores jurídicos acautelados pela norma, como a segurança de pessoas e bens, a saúde pública, a estabilidade e a salubridade das edificações, visando-se obstar a potenciais situações de risco para esses valores e interesses.

U. Pelo que, a fim de se determinar a gravidade da infração há que atender aos interesses públicos urbanísticos e aos valores jurídicos acautelados pela norma, como a segurança de pessoas e bens, a saúde pública, a estabilidade e a salubridade das edificações.

V. Não se verificou nos autos de contraordenação impugnados qualquer estado de necessidade ou urgência, nem a existência de um risco iminente de desmoronamento do prédio objeto dos presentes autos nem um grave perigo para a saúde pública pois nenhuma situação de risco para os valores e interesses, como a segurança de pessoas e bens, de saúde pública, da estabilidade e a salubridade das edificações, se verificou no caso concreto.

W. É reduzida a gravidade da infração praticada pela recorrente, encontrando-se, assim, verificados os pressupostos previstos no art.º 51º, nº 1 do RGCO.

X. Logo a aplicação de uma coima à aqui recorrente é manifestamente desproporcional, desadequada e desnecessária.

Y. Pelo que deveria o Tribunal a quo ter determinado a substituição da coima aplicada à aqui recorrente pela admoestação ao abrigo do disposto no nº 3 do art.º 64º do RGCO.

Z. Ao decidir como decidiu o Tribunal a quo violou o disposto no art.º 51º do RGCO.

AA. Face a tudo o supra exposto, deve a decisão por despacho judicial proferida pelo Tribunal a quo ser revogada e substituída por outra que determine o arquivamento do processo contraordenacional instaurado pela aqui recorrida à aqui recorrente, ou, caso assim não se entende, que determine a substituição da coima aplicada à aqui recorrente pela admoestação, ao abrigo do disposto no nº 3 do art.º 64º do RGCO.”.


O Ministério Público apresentou as seguintes contra-alegações:

1 - Nos presentes autos, a Arguida vem acusada da prática de uma contraordenação prevista e punida no artigo 98º nºs 1 alínea s), e 4, do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, consubstanciada no incumprimento da intimação para realização de obras no imóvel sito na Rua D..., nº 3 a 3F, em infração ao disposto no artigo 89º nº2, do mesmo diploma.
2 - O ilícito contraordenacional tipificado no artigo 98º nº 1 alínea s) do RJUE corresponde à situação em que o proprietário, notificado para realizar obras de conservação necessárias para a correção de más condições de segurança ou de salubridade ou para a melhoria do arranjo estético de um determinado imóvel, não conclui as obras determinadas, no prazo fixado para esse efeito.
3 - Todavia, no recurso que interpôs da decisão administrativa, a Arguida não contrariou o facto de não ter realizado as obras identificadas, pela Comissão de Vistorias, no ponto 4 do parecer constante do Auto de Vistoria nº 1013/AUT/UIT Centro Histórico/G.../2014 que lhe foram determinadas pelo Senhor Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, por despacho de 31/10/2014, notificado em 28/11/2014, como resulta do ofício da CML nº 12930/OFI/UIT Centro Histórico/G.../2014, de 24/11/2014.
4- Não tendo a Arguida utilizado os meios processuais, ao seu dispor, para sindicar a legalidade do despacho do Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, de 31/10/2014, verifica-se que a sua conduta - ao não realizar, no prazo de 30 dias úteis aí fixado, das obras para que foi intimada, em 28/11/2014 - preenche o tipo objetivo do ilícito previsto no artigo 98º, nº 1, alínea s), do RJUE, sancionado, no nº 2 do mesmo artigo, com coima graduada de €1.500,00 até €250.000,00, no caso de pessoa coletiva.
5- A Arguida conhecia não só a obrigação de realização das obras no prazo de 30 dias úteis, a contar do 5º dia útil seguinte à notificação do despacho do Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, de 31/10/2014, mas também que o incumprimento dessa ordem implicaria a prática da contraordenação tipificada no artigo 98º nº 1, alínea s), do RJUE, pelo que é de concluir que a mesma representou o resultado ilícito da sua conduta e atuou, consciente da produção desse resultado, agindo assim com dolo.
6 - No que diz respeito à gravidade da infração, não se afigura que seja diminuta, uma vez que há que atender aos interesses públicos urbanísticos e aos valores jurídicos acautelados pela norma, nomeadamente a segurança de pessoas e bens, a saúde pública, a estabilidade e salubridade das edificações, estando em causa a proteção dos mesmos.

7 – Assim, decidiu bem o Tribunal ao concluir pela não aplicação de admoestação, uma vez que não se encontram verificados os pressupostos previstos no artigo 51º do RGCO.

8 - A aplicação de coima mínima no valor de € 1.500,00 foi corretamente doseada, tendo em conta a gravidade da infração e o grau de culpa.

9 - Em suma, a sentença recorrida não merece censura, devendo manter-se!”.

O processo foi a Vista junto do Digníssimo Procurador-Geral Adjunto que, nos termos do art.º 416.º do CPP, veio dizer que subscreve inteiramente a argumentação apresentada pelo Ministério Público na 1ª instância, devendo declarar-se improcedência do Recurso.


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Objecto do recurso.

Há, assim, que decidir, nos termos do art.º 75.º do RGCO, se a sentença recorrida sofre do erro de julgamento que lhe é imputado por não ter declarado a nulidade do despacho sancionatório e, a título subsidiário, se a graduação da coima aplicada se mostra desproporcional, por dever ser aplicada a sanção de admoestação, por aplicação do disposto no art.º 51.º, n.º 1 do RGCO.

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Dos factos.

Provam os autos os seguintes factos:

1) – Em 15.10.2014, foi emitido, pelos membros da Comissão de Vistorias da Câmara Municipal de Lisboa, o instrumento intitulado “Auto de Vistoria N.º 1013/AUT/UITCentroHistórico/G.../2014”, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
“Processo n.º 1565/RLU/2014
Local: R D..., 3-3F
Freguesia: Santa Maria Maior (Nova Freguesia)
Aos treze dias do mês de Outubro de dois mil e catorze, nesta cidade de Lisboa e na Rua D... n.º 3 a 3F, reuniram os membros da comissão de vistorias, abaixo assinados afim de efetuar uma vistoria ao imóvel, na sequência do contato telefónico estabelecido pela Proteção Civil de Lisboa dando conta do estado em que se encontra o edifício resultado do incêndio aí ocorrido no dia 11 de Outubro de 2014, emitindo por unanimidade o seguinte parecer:
A comissão compareceu no local e verificou tratar-se de um edifício localizado em área de nível II do atual PDM (área de potencial valor arqueológico elevado), integra o Plano de Pormenor da Baixa Pombalina e faz parte dos imóveis classificados pela Direção Geral do Património Cultural como Imóvel de Interesse Publico da Baixa Pombalina e do Conjunto de Interesse Publico da Lisboa Pombalina. -
O imóvel implanta-se no quarteirão limitado pela Praça da Figueira e Poço do Borratem, cuja configuração urbana surge bem definida na cartografia histórica de finais do séc XVIII e inícios do XIX. apresentando volumetria e tipologia de fachada em harmonia com o conjunto urbano do quarteirão pombalino onde se insere, com variantes decorrentes de sucessivas adaptações ao uso, das quais a primeira que surge documentada no processo de obra do edifício, datada de 1909, diz respeito à alteração da fisionomia da cobertura, com a construção da mansarda que marca a sua atual fisionomia (cf. Arquivo Municipal de Lisboa, obra 6476),
Trata-se de um edifício, com cinco pisos, possuindo 1 fração ao nível do r/c e 3 frações por piso ao nível do 1.º, 2.º, 3º e 4º andar com acesso pelo n.º 3 e espaço de logradouro a tardoz, sendo o ultimo em mansarda. Ao nível do piso térreo e com acesso direto e independente pela frente de rua possui 6 frações destinadas a comércio com os números 3-A, 3-B. 3-C. 3-D, 3-E. 3-F, respetivamente,
A fachada principal é rasgada por vãos de peito, limitados por cantarias de verga reta, alternando a ritmo regular com vãos de verga curva, sendo animada a eixo por duas pilastras de cantaria que enquadram vãos de peito com verga recortada. Acima da linha da cornija, a varanda corrida, com guarda em ferro forjado, define o piso em mansarda, recuado face à linha da fachada, com trapeiras de sacada coroadas por frontão de inspiração neoclássica (1909). A fachada tardoz, de linhas simples rasgada por vãos de peito limitados por cantarias retas, apresenta-se descaracterizada com reforços estruturais de betão, nomeadamente nas varandas que servem as primitivas cozinhas, de que restam alguns dos cachorros de sustentação das bacias e uma gaiuta novecentista.
No que respeita aos interiores, que se apresentam já descaracterizados e subdivididos por sucessivas adaptações a uso não habitacional, deixam antever ainda reminiscências dos primitivos tetos de tipo saia e camisa, estuques decorativos, portadas de janelas e portas interiores em madeira, de folha simples e dupla, com bandeira, portas de patim com bandeira engradada e postigos em ferro fundido.
Salienta-se a qualidade arquitetónica, configuração e estrutura da caixa de escada pombalina, que deve ser preservada, estabelecendo a circulação a partir do vestíbulo, demarcado por arco contracurvado e desenvolvendo-se em dois lanços servidos por amplos patamares, iluminados por janelas que abrem para a fachada principal, com pavimento em lajedo, degraus e corrimão em cantaria até ao patim do 2º andar Nas paredes e vãos de janelas são ainda visíveis vestígios de silhares de azulejo pombalino de padrão (azul, branco, manganês e magenta). Nos dois últimos pisos é já visível a adaptação da fisionomia gaioleira resultante das alterações novecentistas, com degraus em madeira, guarda em ferro fundido e claraboia na cobertura.
O espaço de logradouro a tardoz. presentemente subdividido com estruturas murárias e de arrumos, corresponderia a um primitivo jardim em socalco, com acessos desnivelados peto primeiro andar do edifício, nos quais restam ainda vestígios de arcarias de acesso, pilastras em cantaria de revestimento parietal, bem como pavimentos e degraus em lajedo.
Nos fogos comerciais do piso térreo são ainda identificáveis e devem ser preservados todos os elementos estruturais pombalinos, nomeadamente, arcos de volta perfeita, tetos com cruzaria de ogivas, socos e colunas em cantaria, lajedos de soleiras, degraus e pavimentos.
Descritivo de patologias:
Paredes exteriores:

Alçado Principal:
Apresentam-se em muito mau estado de conservação, com tintas empoladas, rebocos fissurados e em desagregação designadamente nas zonas correspondentes aos gateamentos
Os vãos de janela apresentam-se em mau estado de conservação, observando-se que grande parte dos mesmos ao nível do 3º andar e mansarda encontram-se com vidros partidos.
A mansarda, correspondente ao 4º piso, revestida em zinco encontra bastante oxidada e com as tintas a descascar
A guarda metálica da varanda da mansarda encontra-se bastante oxidada.
Alçado Tardoz:
Apresenta-se em muito mau estado de conservação, com zonas extensas de reboco escalavrado, com tintas empoladas, fendas dispersas e manchas de humidade muito escurecidas na zona correspondente ao tubo de queda que se encontra desligado em diversos pontos.
Ao nível do 3.º e 4º andar os caixilhos em madeira encontram-se parcialmente destruídos por ação do incêndio e/ou decorrente do combate ao mesmo.
As marquises constituídas por uma estrutura mista de perfis metálicos, betão e alvenaria encontram-se igualmente em mau estado de conservação com os perfis metálicos bastante corroídos, paramento com fendas e reboco de recobrimento em falta evidenciando a marquise do último andar algum desaprumo. Os vidros desta última encontram-se em grande parte partidos e/ou inexistentes tendo abatido igualmente a cobertura da mesma.
Cobertura:
Constituída por estrutura de madeira, revestida a telha marselha, observa-se. na zona onde ocorreu o incêndio, que grande parte das telhas aluíram colocando à vista o vigamento se suporte em madeira bastante danificado por ação do fogo não existindo qualquer proteção à passagem de águas pluviais para o interior do edifício.
A claraboia, em estrutura metálica, localizada sobre as escadas, encontra-se bastante danificada com a estrutura corroída, remates em zinco parcialmente inexistentes e com total ausência de vidros, permitindo igualmente a passagem de águas pluviais para o interior da caixa de escada.
O guarda corpos em estrutura metálica encontra-se bastante oxidado.
Caixa de escadas: -
Com entrada pelo n.º 3 é constituída por degraus e patins em pedra até ao nível do patim intermédio entre o 2º e 3.º andar, sendo os restantes em madeira.
Os degraus em madeira encontram-se bastante humedecidos pela ação da água encontrando-se os mesmos deformados. O último lanço de acesso ao último piso e o respetivo patim foram bastante afetados pela ação do incêndio, tendo os degraus e soalho de revestimento ardido por completo colocando à vista o respetivo vigamento. este igualmente bastante afetado, com uma perda de seção acentuada, mais se verifica a ausência de corrimão em madeira nesta zona. As paredes neste local encontram-se bastante escurecidas e pontualmente com reboco aluído colocando à vista o fasquiado. Os tetos em estuque aluíram parcialmente, encontrando-se os restantes fissurados, abaulados e com o fasquiado à vista.
Todas as frações do r/c ao 3º piso encontra-se com uso terciário ou destinado ou armazém. Não tendo sido possível verificar os usos do último andar.
Interior das frações:
Nº 3 – 4ºandar (mansarda):
Dado não existiram condições de segurança não foi possível visualizar convenientemente as presumíveis 3 frações deste piso, contudo, do que foi possível observar verifica-se que foram bastante destruídos pelo incêndio tendo parte dos tetos e pavimentos das frações junto à caixa de escada aluído e encontrando-se a restante estrutura de suporte bastante afetada com parte dos elementos carbonizados.
N.º 3 – 3º andar (Arrecadação da “V...- Confeções em pele voltada para o alçado principal):
Tetos em estuque fissurados, parcialmente aluídos e bastante enegrecidos pela ação do fogo. Na zona da verga do vão de janela aluiu parte do reboco.
Paredes bastante escurecidas. Pavimento em madeira revestido a linóleo. A instalação elétrica encontra-se carbonizada.
Verifica-se a existência de diversos componentes inflamáveis, designadamente tintas e outros para o tratamentos de peles, contudo, sem registo de terem sido atingidos pelo incêndio.
Nº 3 - 3.º esquerdo (V... - Confeções em pele):

Este fogo foi menos afetado pela ação do fogo, observando-se contudo a existência tetos em estuque fissurados e parcialmente aluídos colocando à vista o fasquiado que se presume ter ocorrido pela ação da água resultante do combate ao incêndio.
Observa-se igualmente a presença de diverso mobiliário derrubado ao longo dos corredores.
Nº 3 – 3º direito (F… - Escritório):
Tetos em estuque fissurados tendo parcialmente aluído colocando à vista o vigamento de suporte bastante afetado por ação do fogo.
As paredes possuem diversas fendas, nalguns locais bastante manchadas com humidade e com presença de vegetação parasitária.
O pavimento em madeira encontra-se bastante humedecido e empenado pela ação da água. observando-se pontualmente a tardoz o seu total apodrecido.
Nos locais onde os tetos aluíram verifica-se a permanência dos detritos resultantes do desmoronamento parcial do piso superior.
N.º 3 – 2º esquerdo (Armazém da A...): -
Tetos em gesso cartonado manchados por ação da água, pontualmente escurecidos, paredes com manchas de humidade, pavimento em madeira com presença de água abundante.
N.º 3 – 2º Frente (Escritório da A...):
Observam-se pequenas manchas provenientes de escorrências de água nos tetos e paredes.
N.º 3 – 2º Direito (Escritório da C...):
Tetos em madeira, deformados com juntas abertas e bastante manchados por ação da água.
Paredes apresentando fendas diagonais e com manchas de água amarelecidas
O pavimento em soalho flutuante encontra-se deformado e com abundante presença de água
N.º 3 – 1º Esquerdo (A... do 3-E):
Não se visualizam patologias decorrentes do incêndio observando-se somente tintas em destaque nas paredes
N.º 3 -1º Frente: Armazém da L...:
Não se visualizam danos causados pelo incêndio havendo paredes que possuem diversas fendas, nalguns locais manchadas de humidade.
Tetos em estuque fissurados.
N.º 3 – 1º direito (Armazém C...):
Os tetos em estuque apresentam-se fissurados e com manchas de água. As paredes apresentam-se com fissuras e muito manchadas por ação da água, O pavimento em madeira encontra-se húmido e deformado. Esta fração possui um acesso ao logradouro onde se localiza uma construção anexa, que aparentemente não foi afetado pelo incêndio ou pela água de combate ao mesmo
N.º 3 - r/c (C...):
Não se observam patologias.
Estabelecimentos Comerciais com acesso direto pelo arruamento.
N.º 3 - A (L... - Ourivesaria):

Não se visualizam patologias decorrentes do incêndio ou combate ao mesmo. Somente se observa na parede lateral junto a tardoz mancha de humidade presumivelmente com origem em canalização do piso superior ou edifício confinante.
N.º 3 - B (M...):
Não se observam patologias.
N.º 3 - C (L... - Escritório da Ourivesaria).
Não se visualizam patologias decorrentes do incêndio ou combate ao mesmo. Somente se observa que os tetos em abobadilha e as paredes apresentam fissuração dispersa e tintas empoladas,
N. ° 3 - D (I...-Snack-Bar):
Não se visualizam patologias nesta fração.
N.º 3 - E (S...- Cabeleireiro):
O teto falso em madeira junto à entrada encontra-se deformado por ação da água. Observa-se ainda a presença de alguma água no pavimento em mosaico.
N.º 3 - F (A... - Loja de Telecomunicações):
O teto falso junto â entrada aluiu parcialmente colocando à vista o teto em estuque que se encontra bastante fissurado e com manchas de água.
As paredes neste local encontram-se com móveis expositores não sendo possível observar eventuais patologias.
O pavimento em soalho flutuante encontra-se com presença de água e deformado junto à entrada do estabelecimento.
Este estabelecimento possui um acesso ao logradouro onde se localiza uma construção com 2 pisos.
Parecer
Em face do exposto e do que foi dado a observar, os elementos que efetuaram a vistoria emitem, por unanimidade, o seguinte parecer:
1. – O edifício é recuperável.
2. – Os elementos estruturais que oferecem maior risco são localizados na zona onde deflagrou o incêndio sensivelmente na zona central e direita do edifício, junto à caixa de escadas, são designadamente: a estrutura da cobertura; os pavimentos e tetos do 3º e 4º andar; último lanço das escadas e respetivo patim.
3 – As causas da situação de insalubridade são devidas ao incêndio que ocorreu e respetivo combate ao mesmo.
4 – Medidas cautelares;
4.1. - Colocação de uma cobertura provisória por forma a impedir a entrada de águas pluviais na zona que se encontra desprotegida.
4.2. - A proteção dos vãos de janela que se encontram com vidros partidos ou com caixilharia danificada ou inexistente.
4.3. - A demolição das estruturas afetadas pelo incêndio, designadamente da cobertura e dos pavimentos e tetos do 3.º e 4º andar.
4.4. - A remoção de todo o material decorrente do desmoronamento e abatimento da cobertura e 4º andar, designadamente lixos e entulhos, que se encontram a sobrecarregar os pavimentos 4.5. - O corte de abastecimento de eletricidade e água das frações com acesso pelo nº 3, 3-E e 3-F da Rua D... até que sejam efetuadas as medidas cautelares supra referidas e desde que assegurada a funcionalidade e segurança das mesmas.
4.6. - 0 despejo administrativo imediato temporário de pessoas e bens das frações correspondentes às frações com acesso pelos n.ºs 3, 3-E e 3-F da Rua D... até que sejam executadas as obras necessárias para garantir as condições de segurança e salubridade dos ocupantes.
4.7 - Para além dos trabalhos acima citados deverão ser executados todos os que no decorrer da obra se venham a verificar necessários de modo a garantir a segurança e habitabilidade.”
– Cfr. fls. 6-8 e 12-17do proc. n.º 1-152-2017;
2) – Em 15.10.2014, os serviços da Câmara Municipal de Lisboa emitiram a informação n.º 43462/INF/UITCentroHistórico/G.../2014, que aqui se dá por integralmente reproduzida e onde, entre o mais, se propôs que:
-se procedesse ao despejo imediato temporário de pessoas e bens das fracções com acesso pelo n.º 3, 3-E e 3-F;
-se intimasse a Arguida a da início, no prazo de cinco dias, à realização das obras de conservação, a título de medida cautelar, a fim de garantir as condições de segurança e salubridade dos ocupantes;
-a dispensa de audiência de interessados, nos termos do art.º 103.º, n.º 1, al. a) do CPA;
– Cfr. fls. 9 do proc. n.º 1-152-2017;
3) – Em 31.10.2014, o Vereador da Câmara Municipal de Lisboa exarou, sobre a informação referida na alínea anterior, o seguinte despacho: “INTIME-SE nos termos propostos”. – Cfr. fls. 9 do proc. n.º 1-152-2017;

4) – Em 28.11.2014, a Arguida recebeu o ofício da Câmara Municipal de Lisboa n.º 12930/OFI/UITCentroHistórico/G.../2014, de 24.11.2014, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, e em que se intimou a mesma à realização das obras e de conservação a título cautelar, tendo ainda sido advertida de que a não realização das mesmas importa a prática de contra-ordenação – Cfr. fls. 5 e 8-9 do proc. n.º 1-152-2017;

5) – Em 23.06.2016, a Diretora da Unidade de Intervenção Territorial Centro Histórico da Câmara Municipal de Lisboa exarou despacho de concordância sobre a informação emitida, pelos serviços, em 22.06.2016, referenciada com o n.º
28576/INF/UITCH/G.../2016, cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido e onde, entre o mais, se propôs que se averigua-se se as obras foram realizadas – Cfr. fls. 5 do proc. n.º 1-152-2017;
6) – Em 15.07.2016, foi emitida, pelos serviços da Câmara Municipal de Lisboa, a “INFORMAÇÃO N.º 57543 16.8.4”, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
“Relativamente ao assunto constante em informo V. Exa., que no dia 13 de julho do ano corrente pelas I6h20, quando de serviço na brigada de fiscalização, deslocamo-nos á Rua D..., n.º 3, onde foi apurado que o imóvel não foi sujeito a quaisquer obras. Verificou-se que ao nível do 2º andar as escadas de acesso ao 3º e 4º piso, encontram-se bloqueadas com portas, estantes e outros objetos de modo a impedir o acesso aos pisos superiores.
No entanto acedemos ao 3º piso onde foi verificado a inexistência de quaisquer obras, encontrando-se o local com entulho e madeiras queimadas, não tendo sido dado cumprimento ao Auto de Vistoria.”
– Cfr. fls. 2 e 25 do proc. n.º 1-152-2017;
7) – Em 21.09.2016, deu entrada, no Núcleo de Apoio Geral da Polícia Municipal de Lisboa, o “AUTO DE NOTÍCIA”, referenciado com o n.º PI-3354-2016, cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido – Cfr. fls. 1 do proc. n.º 1-152-2017;
8) – Por despacho da Chefe de Divisão de Contraordenações da Câmara Municipal de Lisboa, de 10.01.2017, foi instaurado, contra a Arguida, com base no auto de notícia referido na alínea anterior, o processo de contraordenação que correu termos, na Câmara Municipal de Lisboa, sob o n.º 1-152-2017. – Cfr. fls. 18 do proc. n.º 1-152-2017; 9) – Em 14.09.2017, foi recebido, pela Arguida, o ofício da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:

“Nossa Ref.: AC-2533-2017 (Correio Registado C/AR)

Assunto: Aviso/Notificação
Data: Lisboa, 12 de Setembro de 2017
Processo de Contraordenação Nº.: 1-152-2017
IDENTIFICAÇÃO DO ARGUIDO
I..., titular do Número de Identificação Fiscal Nº 5... e com sede em Rua A..., 48 - A 1769-007 LISBOA, Portugal.
FACTOS IMPUTADOS
Pela presente notificação, efetuada nos termos e para os efeitos do Artigo 50º do Decreto-Lei nº 433/82 de 27 de Outubro, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 244/95 de 14 de Setembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 109/2001 de 24 de Dezembro, que aprovou o Regime Geral das Contra-Ordenações, fica o(a) arguido(a) nela identificado(a) a saber que foi instaurado procedimento contraordenacional, sendo acusado(a) da prática do(s) facto(s) aqui descrito(s), sancionado(s) nos termos das competentes disposições legais, conforme se passa a enunciar:
Aos 13 dias do mês de Julho de 2016 pelas 16:20 horas, no sitio de Rua D..., 3 freguesia de Santa Maria Maior, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, constatou-se que o arguido acima identificado, praticou a seguinte infração:
Infração 1
1 - Nos termos do Auto de Notícia, PI-3354-2016, elaborado pela Polícia Municipal, no dia, hora e local supra, foi verificado o incumprimento da intimação para realização das obras necessárias à conservação do edifício sito na Rua D..., 3, determinada no âmbito do processo municipal n.º 1565/RLU/20I4.
Com efeito,
2 - Na sequência de incêndio ocorrido no imóvel sito na Rua D..., n.º 3 a 3F em 11/10/2014, foi realizada uma vistoria ao local no dia 13/10/2014, com preterição das formalidades previstas nos termos do disposto no artigo 90.º do RJUE, ratificada por despacho da Chefe de Divisão do Centro Histórico Baixa, Dra. I... de 15/10/2014.
3 - Na sequência da referida vistoria foi elaborado o Auto de Vistoria n.º 1013/AUT/UITCentro Histórico/2014, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, no qual emitiram os técnicos o Parecer no mesmo constante, nomeadamente a necessidade de execução de medidas cautelares, com os prazos de 5 dias úteis para o seu início e de 30 dias úteis para a sua conclusão.
4 - Atendendo à urgência na atuação, com vista à salvaguarda de valores e interesses de ordem pública, como a salubridade e a segurança das pessoas, foram preteridas a notificação prévia de vistoria e todos os procedimentos previstos no artigo 90.º do RJUE, de acordo com o seu n.º 8 e não houve lugar à audiência prévia dos interessados, de acordo com o nº 103º, nº 1 do Código do Procedimento Administrativo.
5 - Por Despacho do Sr. Vereador, Arq. M..., de 31/10/2014, exarado na informação nº 43462/INF/UIT Centro Histórico/G.../2014, foi determinado intimar a proprietária do imóvel para executar as medidas cautelares, descritas no ponto 4. do parecer do auto de vistoria, ao abrigo dos n.ºs 2 e 3 do artigo 89.º do RJUE. com os referidos prazos: 5 dias úteis para início e de 30 dias úteis para conclusão.
6 - A proprietária, ora arguida, foi notificada em 29/11/2014 para executar as obras intimadas e de que, em caso de incumprimento, lhe seria instaurado processo de contraordenação, conforme cópia do oficio de notificação nº 12930/OF/UlTCentro Histórico/G…/2014.
7 - Por forma a promover a publicidade do ato proferido pelo Sr. Vereador e conferir-lhe plena eficácia, foi afixado o Edital nº 2233/EDT/UITCentroHistórico/2014 e publicado o anúncio n° 2234/EDT/UITCentroHistórico/2014.
8- O prazo para a conclusão das obras terminou em 28/01/2015.
9 - Ultrapassado o prazo concedido para conclusão das obras intimadas, em acção de fiscalização realizada ao local, em 13/07/2016, constatou-se que não foram realizadas as obras intimadas, constantes do Auto de Vistoria nº 1013/AUT/UlTCentro Histórico/2014 de 13/10/2014, mantendo-se as condições de insegurança, conforme informação nº 57543.16.8.4 de 15/07/2016, para a qual se remete e se dá reproduzida para todos os efeitos.
10 - A ora arguida, responsável pela realização das obras, devidamente notificado para as executar, bem sabia da obrigatoriedade de corrigir as deficiências descritas no auto de vistoria de forma a dar cumprimento à intimação, bem como as consequências legais decorrentes do incumprimento, mas não as executou.
11 - Consciente da obrigatoriedade legal de realizar as obras, o que não fez, bem como das consequências do seu incumprimento, sabendo tal conduta proibida e punida por lei e que incorria na prática de contraordenaçâo, não se poderá deixar de concluir ter agido com dolo.
Pelo exposto, incorreu a ora Arguida na prática de contraordenação pela não conclusão da operação urbanística intimada, nos prazos fixados para o efeito, prevista e punida nos termos legais infra mencionados:
Enquadramento Legal
Normativo Violado: Artigo 89.º nº 2 do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 136/2014, de 9 de setembro
Normativo Sancionatório: Artigo 98.º n.º 1 al. s) e n.º 4 do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 136/2014, de 9 de setembro

Regime Sancionatório
Coima Mínima: 1500,00 € Coima Máxima: 250000,00 €

(…)
ADVERTÊNCIAS
Fica ainda notificado de que dispõe de 15 dias úteis, a contar da data de receção da presente notificação para, querendo, alegar o que tiver por conveniente, devendo para esse efeito apresentar defesa dirigida à Divisão de Contraordenações da Câmara Municipal de Lisboa, entregando-a naquela Divisão ou remetendo-a por correio para a morada abaixo indicada, podendo indicar testemunhas e constituir advogado, bem como juntar outros meios de prova, solicitando-se que com a apresentação da defesa junte cópia da última declaração de rendimentos ou outros documentos demonstrativos da situação económica.
Mais se informa que, nos termos do disposto no Artigo 18º do Regime Geral das Contra-Ordenações, a medida da coima será determinada em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da situação económica do arguido e do beneficio económico que este retirou da prática da contraordenação.
Em caso de nada vir dizer, decidir-se-á com base nos elementos constantes do processo conforme for de direito.”
– Cfr. fls. 20-22 e 42 do proc. n.º 1-152-2017;
10) – Em 06.10.2017, foi enviado, por correio eletrónico, à Divisão de Contraordenações da Câmara Municipal de Lisboa, o requerimento de cujo teor,
que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte:
“Processo de Contraordenação nº 1-152-2017
V/Referência: AC-2633-2017
I..., (…) vem, nos termos e para os efeitos do artigo 50º do Decreto-lei 433/82 de 27 de Outubro, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 244/95 de 14 de Setembro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 109/2001 de 24 de dezembro, que aprovou o Regime Geral das Contra-ordenações, (doravante designado por RGCO), pronunciar se sobre a contra-ordenação que lhe foi instaurada e sobre a sanção ou sanções em que incorre, apresentando a sua:
DEFESA ESCRITA
O que faz nos seguintes termos e fundamentos:
(…) 6º
Acontece que, o prédio supra descrito, ficou degradado na sequência de um incêndio ocorrido no referido imóvel, a 11.10.2014.

O supra descrito prédio, apesar de danificado por ação do fogo, não apresenta, a nosso modesto ver, necessidade de execução de medidas cautelaras urgentes, nem qualquer tipo de urgência na realização de obras necessárias à conservação do edifício por manifesta existência de perigo ou risco à segurança pública.

É o próprio relatório de Vistoria nº 1013/AUT/UITCentro Histórico/2014 que refere que “O edifício é recuperável”, não apresentando, por outro lado, qualquer elemento que demonstrasse a existência de risco objectivo de queda de partes do imóvel para a via pública, pondo em risco pessoas e bens, e que exigissem uma necessidade de intervenção urgente.

No relatório mencionado no artigo anterior, apesar de referir que o imóvel apresenta-se em mau estado de conservação, classifica o imóvel como estando em mau estado de conservação pela existência de "zonas extensas de reboco escalavrado, com tintas empoladas, fendas dispersas, e manchas de humidade”, entre outras patologias que, salvo o devido respeito por entendimento contrário, não cremos que necessitassem de uma urgência na realização de qualquer intervenção no edifício em crise.
10º
Por outro lado, não nos suscitando a existência de necessidade de intervenção urgente para realização de obras de conservação no referido imóvel, não deveriam ter sido preteridos os procedimentos previstos no art. 90º do Regulamento Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE).
11º
nem, preterida a audiência prévia dos interessados, nos termos do art.º 100°, nº 1 do Código de Procedimento administrativo (CPA).
12º
Donde, enferma o processo de Contraordenação em epígrafe de uma Nulidade, a qual desde já se invoca, para os devidos efeitos legais.
13º
De igual modo, não se entendendo a determinada urgência referida no processo de contra ordenação à margem identificado, sempre se dirá que, apesar de a ora Arguida ter a obrigatoriedade de corrigir as deficiências descritas no auto de vistoria, a mesma não tinha percepção de que as teria de corrigir de forma urgente, pois no seu entender, e face ao supra exposto, não existiam condições de insegurança que impunham uma atuação rápida e urgente.
14º
Pelo que, não praticou a aqui Arguida qualquer facto com dolo, não devendo ser esta punida com qualquer sanção, nos termos do art.º 8º do Decreto-Lei 433/82 de 27 de Outubro,
15º
Face ao exposto, não poderá ser aplicada qualquer sanção já que a Arguida não praticou qualquer facto com dolo, bem como, o processo de contraordenação instaurado contra aquela ser Arquivado.
16º
Sem conceder, caso assim não se entenda, o que apenas por mera hipótese académica se admite, em virtude da reduzida gravidade da alegada-infracção, não tendo ocorrido quaisquer danos para pessoas ou bens, deve ser aplicada a sanção de Admoestação, nos termos do art.º 51º do RGCO, sendo esta sanção a que cumpre, garantidamente, as finalidades de prevenção geral e especial adjacente à aplicação de qualquer sanção contra-ordenacional.
Nestes termos e nos melhores de direito, que Vª Exª doutamente suprirá, devem os presentes autos serem ARQUIVADOS,
ou, sem conceder,
ser aplicada a medida de mera Admoestação, nos termos do artº 51º do RGCO, em virtude de esta medida, salvo o devido respeito por melhor opinião, ser suficiente para cumprir as finalidades de prevenção geral e especial adjacentes à aplicação de qualquer sanção contra-ordenacional.”
– Cfr. fls. 43-50 do proc. n.º 1-152-2017;
11) – Em 26.08.2019, a Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa proferiu, no processo referido em 8), a seguinte decisão:

“Catarina Vaz Pinto, Vereadora com o Pelouro da Cultura e Relações Internacionais, (…), no cumprimento das formalidades legais, tudo visto e considerado, vem decidir:
AUTO/PARTICIPAÇÂO
O presente processo foi instaurado e instruído com base no Auto/Participação PI-3354-2016 proveniente de Polícia Municipal.
Identificação do(a) Arguido(a)
I..., titular do Número de Identificação Fiscal Nº 5... e com sede em Rua A..., 48 - A 1769-007 LISBOA, Portugal.
(…)
DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL
A instrução do presente processo iniciou-se oficiosamente, mediante auto de notícia da Polícia Municipal de Lisboa, n.º PI-3354-2016.
Posteriormente, com base nos factos descritos na participação foi a arguida notificada nos termos e para os efeitos do Artigo 50.º do RGCO, tendo-lhe sido concedido um prazo de 15 dias úteis para, querendo, se pronunciar sobre os factos que lhe foram imputados.
DO DIREITO DE AUDIÇÃO E DEFESA
Em tempo e com legitimidade, a arguida apresentou defesa no dia 16/10/2017, registada sob o nº EX-21438-2017 a fls..
MEIOS DE PROVA DOCUMENTAL
Toda a constante dos autos, designadamente o auto de notícia da Polícia Municipal de Lisboa, n.º PI-3354-2016 e fotografias anexas.
Análise dos documentos constantes do processo municipal n.º 1565/RLU/2014, designadamente o Auto de Vistoria n.º 1013/AUT/UITCentro Histórico/2014, informação nº 43462/INF/U1T Centro Histórico/G.../2014, ofício de notificação nº 12930/OF/UITCentro Histórico/G…/2014, o Edital nº 2233/EDT/UITCentroHistórico/2014, e anúncio nº 2234/EDT/UITCentroHistórico/2014, nº 57543.16.8.4 de 15/07/2016.
FACTOS PROVADOS
Dos elementos constantes dos presentes autos e com interesse para a boa decisão do processo, resultaram provados os seguintes factos:
No dia 13/07/2016 pelas 16:20, na Rua D..., 3, verificou-se o incumprimento da intimação para realização das obras de conservação determinadas para o imóvel, no âmbito do processo municipal n.º 1565/RLU/2014.
Com efeito,
1 - Na sequência de incêndio ocorrido no imóvel sito na Rua D..., n.º 3 a 3F em 11/10/2014, foi realizada uma vistoria ao local no dia 13/10/2014,
2 - A vistoria realizou-se com preterição das formalidades previstas no artigo 90.º de RJUE. ratificada por despacho da Chefe de Divisão do Centro Histórico Baixa, Dra. I... de 15/10/2014.
3 - Na sequência da referida vistoria foi elaborado o Auto de Vistoria n.º 1013/AUT/UITCentro Histórico/2014, que aqui se dá integralmente por reproduzido para todos os efeitos legais, no qual emitiram os técnicos o Parecer no mesmo constante, nomeadamente a necessidade de execução de medidas cautelares, com os prazos de 5 dias úteis para o seu início e de 30 dias úteis para a sua conclusão.
4 - Atendendo à urgência na atuação, com vista à salvaguarda de valores e interesses de ordem pública, como a salubridade e a segurança das pessoas, foram preteridas a notificação prévia de vistoria e todos os procedimentos previstos no artigo 90.º do RJUE, de acordo com o seu n.º 8 e não houve lugar à audiência prévia dos interessados, de acordo com o nº 103º, nº 1 do Código do Procedimento Administrativo.
5 - Por Despacho do Sr. Vereador, Arq. M..., de 31/10/2014, exarado na informação nº 43462/INF/UIT Centro Histórico/G.../2014, foi determinado intimar a proprietária do imóvel para executar as medidas cautelares, descritas no ponto 4. do parecer do auto de vistoria, ao abrigo dos n.ºs 2 e 3 do artigo 89.º do RJUE, com os referidos prazos: 5 dias úteis para início e de 30 dias úteis para conclusão.
6 - A proprietária, ora arguida, foi notificada em 29/11/2014 para executar as obras intimadas e de que. em caso de incumprimento, lhe seria instaurado processo de contraordenação, conforme cópia do ofício de notificação nº 12930/OF/UITCentro H istórico/G.../2014.
7 - Por forma a promover a publicidade do ato proferido pelo Sr. Vereador e conferir-lhe plena eficácia, foi afixado o Edital nº 2233/EDT/UlTCentroHistórico/2014 e publicado o anúncio nº 2234/EDT/UITCentroHistórico/2014.
8 - O prazo para a conclusão das obras terminou em 28/01/2015.
9 - Ultrapassado o prazo concedido para conclusão das obras intimadas, em acção de fiscalização realizada ao local, em 13/07/2016, constatou-se que não foram realizadas as obras intimadas, constantes do Auto de Vistoria nº 1013/AUT/UITCentro Histórico/2014 de 13/10/2014;
10 - Mantendo-se as condições de insegurança.
11 - A ora arguida, responsável pela realização das obras, devidamente notificado para as executar, bem sabia das deficiências descritas no auto de vistoria e da obrigatoriedade de as corrigir, de forma a dar cumprimento à intimação, bem como as consequências legais decorrentes do incumprimento, mas não as executou.
12 - Consciente da obrigatoriedade legal de realizar as obras, o que não fez, bem como das consequências do seu incumprimento, sabendo tal conduta proibida e punida por lei e que incorria na prática de contraordenação, não se poderá deixar de concluir ter agido com dolo, porquanto:
13 - A execução das obras é da responsabilidade da Arguida, a qual é responsável pela sua não execução.
14 - A arguida sabia da existência dos fatores de insegurança e insalubridade existentes no imóvel.
15 - A arguida sabia da necessidade de os corrigir e da obrigação legal de dar cumprimento à intimação.
16 - Sabia do prazo determinado para o efeito.
17 - E, sabia quais eram as consequências do seu incumprimento, designadamente que incorria na prática de uma contraordenação.
18 - A arguida agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que tal conduta era proibida e punida pela lei, agiu com dolo.
19 - A Arguida obteve um beneficio económico não apurado resultante do incumprimento da intimação.
20 - Relativamente à matéria dos autos, a arguida tem antecedentes contraordenacionais registados nesta Câmara, tendo sido condenada no pagamento de uma contraordenação no âmbito do processo 1-690-2016, não obstante os factos ilícitos foram praticados em data anterior aos dos presentes autos, pelo que, não foram tidos em consideração em razão de agravamento da coima.
FACTOS NÃO PROVADOS
Não se provaram quaisquer outros factos com relevância para a boa decisão administrativa dos presentes autos, designadamente:
A) O concreto beneficio económico obtido com a prática da contraordenação.
B) A situação económica da Arguida.
Nada mais ficou provado, não provado ou por provar com relevo para a boa decisão administrativa nos presentes autos.
FUNDAMENTAÇÃO
DA MATÉRIA DE FACTO
A convicção da Autoridade Administrativa fundamentou-se na análise crítica do conjunto dos elementos de prova constantes dos autos, em conjugação com as regras da experiência comum e da normalidade social, maxime do auto de notícia, bem como dos demais documentos constantes dos autos, designadamente da defesa apresentada.
Os factos internos ou subjetivos resultaram provados a partir da análise conjugada de todos os factos objetivos assentes, apreciados segundo as regras da experiência comum e da normalidade social e à luz do princípio da livre apreciação da prova, previsto no artigo 127.º do Código de Processo Penal (CPP), ex vi, artigo 41.º , nº 1 do Regime Geral das Contraordenações.
Por sua vez, os factos não provados resultaram de nenhuma prova ter sido produzida quanto aos mesmos, ou de encerrarem em si matéria conclusiva, juízos de valor ou conceitos de direito.
A factualidade constante dos presentes autos não foi contrariada por nenhum outro meio de prova nem, consequentemente, a convicção que se formou através do auto de notícia elaborado pelos agentes autuantes, os quais descrevem de forma sintética, mas clara e objetiva a situação presenciada, afastando assim qualquer indício que tal não tivesse ocorrido daquela forma.
DA DEFESA
A arguida é uma Instituição Particular de Solidariedade Social.
O imóvel ficou degradado na sequência de incêndio ocorrido em 11/10/2014. Não apresenta qualquer tipo de urgência na realização das obras, sendo o edifício recuperável.
Considerando, por isso, ilegítimo a preterição dos procedimentos previstos no artigo 90.º de RJUE e da audiência prévia, enferma o processo administrativo de Nulidade.
A arguida não tinha a perceção de que teria de corrigir as anomalias de forma urgente, pelo que não praticou a arguida qualquer facto com dolo, não devendo ser sancionada, nos termos do artigo 8.º do RGCO, e em consequência deve ser arquivado o processo de contraordenação.
Caso assim não se entenda, dada a reduzida gravidade da infração, não tendo ocorrido danos para pessoas ou bens, deve ser aplicada a sanção de admoestação.
Arrola uma testemunha como meio de prova testemunhal, A..., posteriormente veio declarar que prescinde da sua audição, por requerimento de 11/04/2018.
Análise:
A Arguida veio admitir o mau estado de conservação do imóvel, a necessidade de obras de conservação do mesmo e que as mesmas não foram realizadas no prazo fixado para o efeito.
A Arguida põe em causa o cumprimento de uma ordem legitimamente emanada da autoridade administrativa, devidamente fundamentada num parecer técnico, o auto de vistoria, elaborado por profissionais avalizados, com base em critérios de natureza técnica e com as formalidades legais cumpridas invocando razões que em nada vinculam a administração ou poderiam condicionar a decisão.
O que se visa com os procedimentos desta natureza é a defesa da segurança e saúde, entendidos como valores de ordem pública.
A intimação constitui uma verdadeira ordem emanada de autoridade administrativa, um ato impositivo, na medida em que impõe a um particular a adoção de determinada conduta, in casu, a execução de obras de conservação.
A Câmara tomou tal decisão ao abrigo de normas de direito público, no exercício do poder administrativo que lhe cabe para o desempenho da sua atividade administrativa de gestão pública, na prossecução do interesse público que a move.
Como ato administrativo que é, a determinação de intimação é um ato unilateral, uma vez que provém de um autor cuja declaração é perfeita independentemente do concurso de vontade de outros sujeitos.
Constitui, assim, a determinação de intimação um verdadeiro ato unilateral da Câmara ao serviço de um fim administrativo, não dependendo da vontade do destinatário para ser perfeito, válido, eficaz e exequível.
Pelo que, não colhe a defesa apresentada pela arguida.
DA MATÉRIA DE DIREITO
A arguida vem acusada em autoria material, na forma consumada, da prática de uma contraordenação prevista e sancionável pelos artigos 89.º n.º 2 e 98º n.º 1 al. s) e n.º 4 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, com coima mínima de 500,00 € e máxima de 100.000,00 € no caso de pessoa singular e 1.500,00 € a 250.000,00 € no caso de pessoa coletiva.
Vejamos, pois, em concreto, se assim é:
O artigo 89º n.º 2 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, sob a epígrafe "Dever de conservação", prescreve que "Sem prejuízo do disposto no número anterior, a câmara municipal pode a todo o tempo, oficiosamente ou a requerimento de qualquer interessado, determinar a execução de obras de conservação necessárias à correção de más condições de segurança ou de salubridade ou à melhoria do arranjo estético".
O artigo 98.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, por sua vez, sob a epígrafe "Contraordenações", estabelece no seu n.º 1 alínea s), que, sem prejuízo da responsabilidade civil, criminal ou disciplinar, é punível como contraordenação a não conclusão das operações urbanísticas referidas nos números 2 e 3 do artigo 89º nos prazos fixados para o efeito".
Ora, conforme decorre dos factos dados como provados, a Arguida, mantinha o imóvel objeto dos autos sem a realização das obras intimadas, nos prazos previstos para o efeito.
Mais decorre dos factos dados como provados que a sua falta decorre de razões imputáveis à Arguida, que devidamente notificada para a execução de obras de conservação necessárias à correção dos fatores de insegurança e insalubridade descritos no auto de vistoria e consciente da necessidade de as concluir dentro do prazo fixado para o efeito, não o fez.
Estão assim preenchidos todos os elementos objetivos constitutivos do tipo legal da contraordenação em causa, ou seja, a não conclusão das obras de conservação no prazo fixado para o efeito.
Por sua vez, é elemento subjetivo da contraordenações em análise, quer a atuação psicológica dolosa quer a negligente, nos termos do art.º 8º do RGCO.
Com efeito, um dos princípios basilares do Código Penal e do RGCO é o princípio da culpa (não há pena sem culpa e a culpa decide a medida da pena). Assim, para que exista culpabilidade do arguido no cometimento do ilícito acima descrito, toma-se necessário que o mesmo lhe possa ser imputado a título de dolo ou, nos casos especialmente previstos, de negligência.
O dolo, a forma mais elevada da culpa, na sua modalidade direta, supõe necessariamente dois elementos ou momentos: o intelectual, traduzido no conhecimento e consciência da ilicitude do facto, conhecimento de que o facto é proibido por lei e que ofende interesses tutelados pela norma, e o volitivo, que mais não é do que a vontade, o querer praticar o facto apesar de se saber que é ilícito. Age ainda com dolo, aqui na sua forma necessária ou eventual, quem, representando a realização de um facto que preenche um tipo de crime como consequência necessária ou possível da sua conduta, se conformar com a realização do mesmo.
Da prova factual constante dos presentes autos, dúvidas não temos em como a Arguida, na qualidade de proprietária do imóvel estava consciente das obrigações legais a que estava adstrita no âmbito dos seus deveres, até porque disso foi notificada, indicando-se os trabalhos a realizar, as anomalias a corrigir, o prazo para conclusão das obras, bem como as implicações legais decorrentes do incumprimento do ato administrativo, designadamente que incorria na prática de uma contraordenação.
Nas circunstancias descritas, a arguida agiu livre, deliberada e consciente, com intenção de não cumprir com a determinação administrativa, bem sabendo que a sua conduta representava a prática de um facto ilícito e punível nos termos legais, agiu com dolo.
Pelo que, dúvidas não restam que a Arguida preencheu na íntegra, com a sua conduta, os aludidos elementos, quer objetivos quer subjetivos, constitutivos da contraordenação.
DETERMINAÇÃO DA MEDIDA DA COIMA
Nos termos do artigo 18.º do RGCO, a determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da situação económica da arguida e do benefício económico que esta retirou da prática da contraordenação.
DA GRAVIDADE
O art.º 89.º, n.º 1 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, a Câmara Municipal no âmbito dos seus poderes-deveres de fiscalização determina a execução de obras necessárias à conservação do edifício, o que pressupõe uma prévia apreciação técnica, efectuada através de vistoria, que significa que as condições verificadas comprometem os interesses públicos urbanísticos da segurança, salubridade e saúde pública.
Em caso de incumprimento, ou seja, quando o proprietário não conclua as obras que lhe foram impostas pela autoridade administrativa competente, no prazo fixado para o efeito, e em face dos valores de interesse público em causa, que prevalecem sobre os particulares, no caso vertente, a prática da contraordenação reveste-se de uma gravidade elevada.
DA CULPA
Conforme exposto em sede de fundamentação, a culpa da arguida é elevada, não se esboçando qualquer justificação razoável para o facto praticado.
A atitude da arguida é censurável pois, podendo ter agido em conformidade com o Direito, o que estava perfeitamente ao seu alcance, teve uma conduta antijurídica.
O grau de censurabilidade é elevado, atendendo a que assumem já alguma relevância as exigências de prevenção geral que no domínio deste tipo de contraordenação se faz sentir, dado o alto índice de infrações praticadas, com o consequente aumento do desrespeito pela vida em comunidade.
Face ao exposto, não pode deixar de se imputar à ora arguida a prática da contraordenação em apreço e de lhe assacar a responsabilidade dela emergente, aplicando-se uma coima que tem como principal finalidade a proteção dos bens jurídicos e a intimidação para a prática de futuras infrações.
DA SITUAÇÃO ECONÓMICA
Não foi apurada.
DO BENEFÍCIO ECONÓMICO
Não foi apurado.
Assim, dá-se como provada a prática da contraordenação de que a arguida foi acusada e, em consequência:
DA DECISÃO
Considerando o acima exposto, nos termos do Artigo 58.º do Regime Geral das Contra-Ordenações, DECIDO:
Infração 1
Condenar o(a) arguido(a) pela violação do Artigo 89.º nº 2 do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 136/2014, de 9 de setembro, ilícito previsto e punido pelo Artigo 98.º n.º 1 al. s) e n.º 4 do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 136/2014, de 9 de setembro, na coima de 1500,00 € (mil e quinhentos euros).
Condenar o(a) arguido(a) ao pagamento das custas do processo, nos termos do disposto no Artigo 94.º do Decreto-Lei nº 433/82 de 27 de outubro, na redação dada pelo Decreto-Lei nº 244/95 de 14 de setembro, e com as alterações introduzidas pela Lei nº 109/2001 de 24 de dezembro, no montante de 51,00 € (cinquenta e um euros).”
– Cfr. fls. 58-66 do proc. n.º 1-152-2017.


*
Direito
Alega a Recorrente que a sentença recorrida sofre de erro de julgamento por não ter declarado a nulidade despacho que lhe aplicou a coima de 1.500.00€, bem assim como a nulidade de todo o procedimento contra-ordenacional.
Para tanto, diz que o acto administrativo que a intimou a realizar as obras de conservação no edifício sito na Rua D..., n.º 3 a 3F, em Lisboa, é nulo e que tal nulidade inquina o despacho que lhe aplicou a referida coima por não ter realizado as mencionadas obras.
Entende que a vistoria realizada ao edifício a 13/10/2014, na sequência do incêndio ocorrido a 11/10/2014, foi efectuada com a preterição das formalidades previstas no art.º 90º, n.ºs 2 e 3 do RJUE, que prevêem que o proprietário seja notificado previamente à realização da vistoria a fim de poder indicar um perito e formular quesitos. Defende ainda que, por não existir risco iminente de desmoronamento nem perigo para a saúde pública, a observância daquelas formalidades não podia ser dispensada à luz do n.º 8 do art.º 90.º do RJUE, na redacção à data dos factos. Invoca ainda a violação do direito de audiência prévia prevista no art.º 100.º do CPA, aprovado pelo DL n.º 442/91, de 15 de Novembro.
Conclui que, por força de tais vícios, a decisão que a intimou a realizar as obras é nula à face do disposto no nº 2, do art.º 162º do CPA e do art.º 134º do anterior CPA, aprovado pelo DL n.º 442/91, de 15 de Novembro, bem assim como a decisão que aplicou a coima de 1.500,00€ a título de contra-ordenação.
Na sentença recorrida decidiu-se que o despacho de 31/10/2014, que ordenou a realização das obras de conservação, se havia consolidado na ordem jurídica por não ter sido impugnado através da interposição da respectiva acção administrativa no prazo de três meses.
Ou seja, contrariamente ao defendido pela Recorrente, entendeu-se que os vícios que a Recorrente aponta ao despacho de 31/10/2014, que a intimou à realização das obras, apenas são sancionáveis com o desvalor da anulabilidade e não da nulidade.
Tal entendimento mostra-se correcto em face do disposto no 135.º do CPA, na redacção em vigor à data dos factos, que determinava que “são anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção”.
Na falta de norma que sancione os vícios imputados ao acto com outro desvalor, há que concluir que estamos perante uma situação de anulabilidade – cfr. Paulo Otero “Direito do Procedimento Administrativo”, vol. I, Almedina, pág. 627.
A Recorrente limita-se a invocar que a nulidade é invocável a todo o tempo, mas não indica qualquer norma que sancione os vícios que invoca com o desvalor da nulidade.
O despacho de 31/10/2014, que a intimou a realizar as obras, foi proferido na sequência da vistoria realizada ao edifício em 13/10/2014, por ali ter ocorrido um incêndio a 11/10/2014, tendo-se concluído naquela vistoria que existia a necessidade de proceder ao despejo imediato e temporário das pessoas e bens das fracções com acesso pelo n.º 3, 3-E e 3-F da Rua D... e que se impunha a realização de obras de conservação, a título cautelar, de forma a garantir as condições de salubridade e de segurança dos ocupantes e respectivos bens, pelo que foi fixado o prazo de cinco dias para o início das obras, as quais deveriam estar terminadas em trinta dias.
Perante tais circunstâncias, não se vê como a inobservância das formalidades previstas no art.º 90º, n.ºs 2 e 3 do RJUE, possa importar a nulidade do despacho de 31/10/2014, nomeadamente face ao disposto do art.º 133.º do CPA em vigor à data da prolação do despacho de 31/10/2014, por não preencher nenhuma das hipóteses aí previstas.
O referido vício de violação de lei, a existir, apenas poderia ser sancionado com o desvalor da anulabilidade.
A Recorrente invoca ainda que o despacho que a intimou à realização das obras de conservação foi proferido com violação do direito de audiência prévia.
No entanto, tal vício, também não é, no caso, gerador de nulidade.
Estamos perante uma situação de intimação à realização de obras de conservação a título cautelar, cujo início deveria ter lugar no prazo de cinco dias a contar da notificação do despacho, tudo de forma a salvaguardar a segurança das pessoas que viviam no edifício antes do incêndio e respectivos bens, cujo despejo imediato foi determinado a título cautelar.
Não se pode dizer que, em tais circunstâncias o vício de falta de audiência prévia que é imputado ao despacho que intimou a Recorrente à realização de obras, a existir, seja sancionável com o desvalor da nulidade.
Sobre a questão veja-se a anotação ao art.º 90.º do RJUE, de Fernanda Paula Oliveira e outras, in “Regime Jurídico da Urbanização e Edificação comentado” Almedina, 2006, pág. 410, que admite que a inobservância das formalidades previstas no art.º 90.º do RJUE são, em regra, anuláveis, só assim não sendo nos casos em que se verifique uma violação grave de princípios fundamentais da actividade administrativa, como o princípio da proporcionalidade ou da protecção da confiança dos particulares.
Na jurisprudência e entre outros, veja-se o ac. do TCA Sul, de 27-05-2010, proferido no âmbito do proc.º n.º 06142/10, in www.dgsi.pt., em que se sumariou: (…) II – O vício de preterição da audiência dos interessados só é gerador de nulidade nos casos em que a própria audiência é elevada à categoria de garantia fundamental, como nos casos dos procedimentos de natureza sancionatória [processos de contra-ordenação ou disciplinares], sendo que, fora desses casos, a sua falta nos procedimentos administrativos comuns é apenas causa de mera anulabilidade.”.
Alega ainda a Recorrente que sentença recorrida errou ao ter mantido a coima aplicada.
Defende que a contra-ordenação que praticou apresenta diminuta gravidade, pelo que entende que não deve ser sancionada. A não se entender assim, diz que a coima aplicada é manifestamente desproporcional e desnecessária e que o Tribunal deveria ter substituído a coima pela sanção de admoestação, por se encontrarem verificados os pressupostos previstos no art.º 51.º, n.º 1 do RGCO.
Alega que não se verificou nenhuma situação de estado de necessidade ou urgência, ou de risco para os valores e interesses envolvidos, como a segurança de pessoas e bens, a saúde pública, a estabilidade e a salubridade das edificações, por o edifício não apresentar um risco iminente de desmoronamento nem constituir um grave perigo para a saúde pública, tratando-se de um edifício recuperável.
Na sentença recorrida entendeu-se manter a coima aplicada, por a infracção não apresentar diminuta gravidade, pelo que se afastou a aplicação do n.º 1 do art.º 51.º do RGCO.
Para tanto, referiu-se que “no que concerne à gravidade da infração, não tendo o legislador procedido à classificação das contraordenações tipificadas nas várias alíneas do artigo 98.º, n.º 1, do RJUE, há que atender aos interesses públicos urbanísticos e aos valores jurídicos acautelados pela norma, como a segurança de pessoas e bens, a saúde pública, a estabilidade e a salubridade das edificações – os quais encontram reflexo na ponderação efetuada na vistoria que serve de fundamentação do despacho do Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, de 31.10.2014 –, visando-se obstar a potenciais situações de risco para esses valores e interesses, pelo que, no caso concreto, não é possível concluir pela diminuta gravidade da infração praticada.
Por conseguinte, atento o grau de culpa doloso com que a Arguida agiu e a gravidade da infração praticada, é de concluir que, no caso, não se encontram verificados os pressupostos previstos na norma do artigo 51.º, n.º 1, do RGCO, não podendo a decisão administrativa impugnada ser substituída por uma decisão de admoestação”.
Tal decisão é de manter, não se encontrando violado o art.º 51.º do RGCO.
A Recorrente teve conhecimento do despacho que a intimou a realizar as obras, tendo ainda sido advertida que a falta da sua realização importava a prática da contra-ordenação por que foi punida, pelo que agiu com dolo.
Não apresentou qualquer causa justificativa para não ter efectuado as obras.
A circunstância do edifício não se encontrar em perigo iminente de derrocada não afasta o juízo efectuado no auto de vistoria sobre a necessidade de as realizar. São obras de conservação e que se impunham a titulo cautelar para salvaguardar a segurança das pessoas que residiam no edifício.
Não estamos perante uma situação em que por força do reduzido grau de culpa se impusesse a aplicação da sanção de admoestação.
Por outro lado, a coima fixada situa-se no limite mínimo legalmente previsto – art.º 98.º, n.º 2 do RJUE.

Decisão
Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul, em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.

Lisboa, 18 de Março de 2021




O relator consigna, nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, que têm voto de conformidade com o presente acórdão os Juízes Desembargadores que integram a formação de julgamento.



Jorge Pelicano


Celestina Castanheira


Carlos Araújo

(em substituição)