Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08736/15
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:07/10/2015
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:NULIDADE DA CITAÇÃO NÃO CONSTITUI FUNDAMENTO DE OPOSIÇÃO A EXECUÇÃO FISCAL.
ERRO PARCIAL DA FORMA DE PROCESSO.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO.
FALTA DE NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO ENQUANTO FUNDAMENTO DE OPOSIÇÃO A EXECUÇÃO FISCAL.
A NOTIFICAÇÃO RELEVANTE PARA EFEITOS DE OBSTAR À CADUCIDADE DO DIREITO DE LIQUIDAÇÃO É A RELATIVA AO SUJEITO PASSIVO ORIGINÁRIO DO TRIBUTO.
DÍVIDAS DOS CÔNJUGES.
BENS COMUNS DO CASAL. REGIME DA RESPONSABILIDADE POR DÍVIDAS.
DÍVIDAS DA RESPONSABILIDADE DE AMBOS OS CÔNJUGES. ARTº.1691, Nº.1, AL.D), DO C.CIVIL.
Sumário:1. A nulidade da citação não constitui fundamento possível de processo de oposição a execução fiscal (ressalvado o seu conhecimento a título incidental), antes sendo causa de pedir a examinar no âmbito de reclamação de decisão do órgão de execução fiscal, espécie processual prevista no artº.276 e seg. do C.P.P.Tributário.

2. Deve concluir-se que nos encontramos perante erro parcial na forma de processo, assim não sendo possível configurar a eventual convolação da forma de processo. Nestes casos, a solução que se extrai do tratamento dado a uma questão paralela no artº.186, nº.4, do C.P.C., é a de considerar sem efeito o pedido ou pedidos para o qual o processo não é adequado, prosseguindo o processo apenas para apreciação do pedido que deva ser apreciado em processo do tipo escolhido pelo interessado. Essa consequência é uma aplicação da regra do artº.193, do C.P.C., segundo a qual, no caso de erro na forma de processo, é nulo todo o processado que não puder aproveitar-se para a tramitação de acordo com a forma estabelecida na lei. Nesses casos de erro parcial da forma de processo, como este tem de prosseguir para apreciação do pedido para que é adequado, a consequência relativamente ao outro pedido será a de nulidade parcial do processo, na parte a ele respeitante, o que se reconduz a que o processo prossiga como se esse pedido não tivesse sido efectuado.

3. Pode definir-se a caducidade como o instituto através do qual os direitos que, por força da lei ou de convenção das partes, se devem exercer dentro de certo prazo, se extinguem pelo seu não exercício durante o mesmo período. O instituto da caducidade tem por fundamentos vectores como a certeza e a ordem pública, vistos no sentido de que é necessário que, ao fim de certo lapso de tempo, as situações jurídicas se tornem certas e inatacáveis. Esta prevalência de considerações de ordem pública constitui a razão explicativa para que o prazo de caducidade corra sem suspensões e interrupções e, em princípio, que só o exercício do direito durante o mesmo impeça que a caducidade opere.

4. No que diz respeito ao direito tributário, o regime da caducidade do direito à liquidação de impostos, matéria que não é de conhecimento oficioso, encontra actualmente consagração genérica no artº.45, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12, norma que vem consagrar um prazo de caducidade de quatro anos (cfr.anterior artº.33, nº.1, do C.P.Tributário, o qual consagrava o prazo de cinco anos). Face à redacção do aludido artº.45, da L. G. Tributária, é claro que, quer o exercício do direito à liquidação, quer a notificação do seu conteúdo ao contribuinte, e não apenas aquele primeiro acto, têm que ocorrer dentro do mencionado prazo de quatro anos contados do facto tributário, sob pena de operar a caducidade de tal direito. O prazo de caducidade em análise justifica-se por razões objectivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos.

5. De acordo com a interpretação jurisprudencial do quadro normativo existente, à qual se adere, fica aberta, na fase executiva, pelos meios legais de oposição, a discussão da falta ou de eventuais vícios da notificação, designadamente por inexigibilidade da dívida, ao abrigo do disposto no mencionado artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário). Em resumo, o regime processual de defesa do contribuinte, nestas situações será o seguinte:
A-Se é instaurada uma execução fiscal e não foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, o sujeito passivo pode sempre opor-se à execução ao abrigo da alínea i), do nº.1, do artº.204, do C.P.P.T., invocando a ineficácia do acto, que impede que a dívida seja exigível, sendo indiferente, para este efeito, que o acto de liquidação enferme de qualquer vício, inclusivamente o de extemporaneidade da liquidação;
B-Já se foi instaurada uma execução e efectuada notificação válida do acto de liquidação, mas a notificação foi realizada fora do prazo de caducidade previsto no artº.45, nº.1, da L.G.T. (ou outro prazo especial que for aplicável), o contribuinte pode opor-se à execução ao abrigo da alínea e), do nº.1, deste artº.204, do C.P.P.T. (trata-se de situação que, no seu teor literal, poderia caber na mencionada alínea i), pois não se engloba nela a apreciação da legalidade da própria liquidação nem é matéria da exclusiva competência da entidade que emite o título, mas que era dela afastada à face do entendimento jurisprudencial referido formado na vigência do C.P.T., reconduzindo-se a utilidade da alínea e) ao afastamento da aplicabilidade deste entendimento; a possibilidade de oposição ao abrigo da alínea e) existirá independentemente de a própria liquidação ser extemporânea, isto é, de ela própria ser ilegal, pois não está em causa no processo de oposição à execução fiscal a apreciação da legalidade da liquidação, mas a sua oponibilidade ao seu destinatário);
C-Por último, se foi efectuada uma liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo, mas não foi ainda instaurada execução, o contribuinte pode impugnar judicialmente a liquidação, invocando a ilegalidade da sua extemporaneidade, porém, se o não fizer e não pagar a quantia liquidada, não ficará impedido de se opor à execução, ao abrigo da alínea e) referida, visto que, além da ilegalidade da liquidação, ocorrer também a sua inexigibilidade por falta de tempestiva notificação.

6. A notificação relevante para efeitos de obstar à caducidade do direito de liquidação (natureza receptícia do acto tributário) é a relativa ao contribuinte, o sujeito passivo originário do tributo, e não a dos outros responsáveis solidários ou subsidiários.

7. A distinção fundamental em matéria de dívidas dos cônjuges separa as dívidas que responsabilizam ambos os cônjuges (cfr.artºs.1691, nºs.1 e 2, 1694, nºs.1 e 2, do C. Civil) daquelas que apenas responsabilizam um dos cônjuges (cfr.artºs.1692, 1693, nº. 1, e 1694, nº.2, primeira parte, do C.Civil).

8. A determinação da eventual responsabilidade dos cônjuges deve aferir-se pela data do facto que deu origem às dívidas pelos mesmos contraídas (cfr.artº.1690, nº.2, do C.Civil).

9. Ao mesmo tempo que constituem, quanto ao processo de contitularidade dos seus sujeitos, uma forma de propriedade colectiva (distinta da compropriedade), os bens comuns formam, no que respeita ao regime da responsabilidade por dívidas, um património de afectação especial. A autonomia deste património, em face dos bens próprios pertencentes a cada um dos cônjuges, consiste no facto de os bens comuns responderem apenas pelas dívidas de interesse comum do casal, ou seja, pelas dívidas que responsabilizam ambos os cônjuges, e ainda no facto de, por estas dívidas, só responderem outros bens, quando não haja bens comuns ou estes sejam insuficientes (cfr.artº.1695, nº.1, do C.Civil). A autonomia dos bens comuns não é, todavia, completa. Há casos em que os bens comuns respondem, igualmente e de forma imediata, por dívidas da responsabilidade exclusiva de um dos membros do casal (cfr.artº.1696, nº.2, do C.Civil).

10. Nos termos do disposto no artº.1691, nº.1, al.d), do C.Civil, são da responsabilidade de ambos os cônjuges as dívidas contraídas por qualquer um deles no exercício do comércio, a menos que se prove que não foram contraídas em proveito comum do casal, ou se vigorar entre ambos o regime de separação de bens. Com estes pressupostos, não pode proceder a oposição deduzida pelo cônjuge daquele que consta do título executivo como devedor e que foi citado como co-executado se o fundamento na sua invocada ilegitimidade consiste em não constar do título executivo.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
PAULA …………………, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Beja, exarada a fls.76 a 91 do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedente a presente oposição, intentada pelo recorrente, na qualidade de executado, visando a execução fiscal nº………….., a qual corre seus termos no Serviço de Finanças de ……………….., propondo-se a cobrança coerciva de dívidas de I.V.A., relativas a Janeiro de 2008 e no montante total de € 65.553,92.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.124 a 147 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-A presente oposição, teve em vista opor-se à liquidação adicional de IVA e respectivos juros compensatórios respeitantes ao mês de Janeiro de 2008 e logo que foi citada em 10/11/2013;
2-Esta sua citação foi-o no entendimento vertido pelo senhor Chefe das Finanças de 30/10/2013 - em face do não pagamento da quantia exequenda - atenta a sua opinião que a oponente era solidariamente responsável, não obstante o título em causa e que sustenta a execução o ser exclusivo em nome do executado António ………………………;
3-Com efeito, e conforme decorre dos factos assentes..." Em 12/07/2013, perante o não pagamento da quantia exequenda, foi prestada nos autos de execução citados a seguinte informação: "Em complemento da informação retro cumpre-me informar que à data da constituição das dívidas de fls. 2 a 15 dos autos, o executado era casado sob o regime de comunhão de adquiridos com Paula ………………, NIF …………., pelo que a responsabilidade da dívida é comum, a dissolução da sociedade conjugal ocorreu em 21/02/2008";
4-Em 10/11/2013 a ora oponente foi citada para a execução fiscal n.° …………………., com a menção singela de que esta estava a ser efectuada, ao abrigo do disposto no art. 189 do CPPT! ( efeitos e funções da citação);
5-A petição inicial, que deu origem aos presentes autos, deu entrada no Serviço de Finanças de ……………… em 20/11/2013;
6-Foi pois assim, em face da notificação feita à oponente-recorrente, ter esta e em tempo deduziu a presente oposição, alegando nulidade da citação, caducidade da dívida, e ilegitimidade e com os fundamentos melhor constantes do requerimento inicial, e porquanto em face da citação era este o seu único meio de reacção (cfr. n°1 do art° 189 do CPPT);
7-Foi proferida douta decisão considerando que não estaríamos na presença das citadas excepções e nos termos que melhor constam da douta decisão recorrida, e em consequência julgada improcedente a oposição e a oponente parte legítima;
8-Ora, e salvo naturalmente melhor opinião, a verdade é que se crê que a mesma decisão proferida não fez o devido enquadramento adjectivo e processual, pois numa corruptela jurídica, considerou bastante para sustentar a sua responsabilidade executiva, o facto conclusivo do mesmo título configurar uma dívida da responsabilidade de ambos os cônjuges, por ter sido contraída na constância do matrimónio e em proveito comum do casal, à data;
9-Ora, tal consideração afigura-se incorrecta e indevida, não só porque na verdade aquela presunção deve poder ser ilidida, aquando da citação, como por jamais a AT a haver considerado parte e ou devedora originária, e daí ao não só não a ter notificado em tempo validamente consagrado na LGT, como, ao não tendo procedido e comunicado a sua reversão, esta alegada reversão concluiu na base da singela presunção da AT, sem observância dos respectivos trâmites e tempestivamente;
10-Porém, e salvo o devido respeito por melhor opinião, uma coisa é a presunção de uma dívida resultante do exercício do comércio, e contraída na constância do matrimónio, ser da responsabilidade de ambos os cônjuges, atento estar em causa o mencionado exercício do comércio e a presunção de proveito comum das dívidas contraídas nesse exercício: coisa distinta porém é considerar-se perentoriamente, e sem margem para quaisquer duvidas, e sem comunicação e ou citação ao demais cônjuge;
11-Ora, no caso dos autos, não obstante essa presunção tardia, (mais de quatro anos após), certo é que ao aludido cônjuge não foi sequer dado qualquer conhecimento da mesma dívida, sua execução, e não figurando sequer no título executivo, e pois esta tem direito a opor-se também para efeitos de ilidição da presunção, quando conhecer a mesma dívida;
12-Daí que, e num entendimento diverso se considere em face da ausência de qualquer citação até essa data, a citação em causa tem que respeitar os ditames do CPPTA, e pois assim referir-lhe nessa citação os motivos de tal pretendida dívida fiscal sob pena da anulação da mesma citação;
13-Assim, e porque a presente reclamação teve por objecto a anulação da citação efectuada à reclamante no âmbito do processo da execução fiscal em apreço, e pela circunstancia das certidões de dívida que acompanharam o ofício de citação serem as mesmas que serviram para a instauração daquele processo, em nome do seu ex-marido António Custódio Pastor Danado, e em parte alguma constar qualquer referência à aqui reclamante, nomeadamente, em que qualidade é parte naquele processo;
14-Como é invocado o artigo 189 apenas do CPPT, como fundamento para a citação, aquela deve ser declarada nula, por consubstanciar um vício de violação da lei, e por inobservância do dever de fundamentação consagrado no art° 268 n° da CRP; art° 125 do CPA e art 5 e 77° da LGT;
15-Deve também considerar-se qua a liquidação adicional de IVA, do ano de 2008 é inválida, relativamente à oponente, por vício de violação da lei, pela circunstância da aqui reclamante não ter sido devidamente notificada dentro do prazo de caducidade estabelecido no art. 45 da L.G.T., no processo de execução fiscal n.° ………………., pela circunstância da liquidação adicional de IVA, do ano de 2008, nunca lhe ter sido previa e validamente comunicada e ou notificada, não devendo por isso produzir quaisquer efeitos em relação a si (artigo 77 n.°6 da LGT e artigo 36, n.°1 CPPT);
16-Porque, a manter-se a decisão recorrida ocorre pois assim clara violação flagrante do princípio da legalidade e da boa fé, a cujos princípios está vinculada a Administração Fiscal, até porque esta não deve nem pode comportar-se como um mero agente particular, atento o seu dever de soberania;
17-Com o devido respeito por melhor opinião, a AT fez uma corruptela jurídica considerando que estava assente a comunicabilidade da dívida, não obstante a presunção determinada nos citados arts., respectivamente alínea d) do n°1 do artigo 1691 do C. Civil, 1692 do CC e art. 15 do C.Comercial e pois assim a mesma era também da responsabilidade da oponente, sem sequer esta ter sido validamente comunicada;
18-Ora, tal decisão é objectivamente ilegal, pois considerou como irreversível a comunicabilidade da dívida, entendendo que a mesma estava a coberto, do entendimento discutível da presunção, a que alude o art. 15 do C.Com. quando até para defender os princípios constitucionais, a AT deveria ter utilizado o instituto da reversão, e o que não fez, e pois assim sempre deveria assistir, perante o princípio da legalidade, que a oposição em causa era o meio processual adequado para obstar ao prosseguimento da execução de um título onde a oponente não figurava nem figura e pois assim carece tal execução de título válido relativamente a si e suportador da mesma execução;
19-Assim, os alegados argumentos deveriam motivar sempre a procedência da mesma oposição por erradamente terem um entendimento diverso face ao supra exposto do que é curial, normal, adequado e do entendimento vertido nos citados determinativos legais pois, repete-se, não pode ser entendido que a executada - oponente não tem quaisquer direitos de defesa;
20-Mas têm-no; ao não figurar no título executivo, ao não ter sido jamais notificada em tempo; ao não lhe ter sido explicada no mesmo qual a razão de ser de figurar nesse título, ao não ter sido previamente notificada do auto de liquidação, ao presumir-se que a dívida é da responsabilidade comum dos cônjuges, obviamente que a oposição era o meio adequado de reacção e o aí alegado tem que ser considerado procedente e pois declarar-se a nulidade do acto praticado consubstanciado na nulidade da citação feita, para além de caducado o direito da AT em cobrar esse imposto à oponente, e considerar a mesma oponente parte ilegítima nesse processo;
21-Violou pois assim a douta sentença, entre outros, os artigos: 20 n.° 4 e 5, 268 da CRP; art° 804, n°2, 805, n°2 al. c) e 817 al. a) do Código Civil alínea d) do n°1 do artigo 1691 do C. Civil, 1692 CC, 45, n°2, art° 57, 77 n.°6, 95 n.°2 j), e 103 n.°2 da LGT, 15 C. Com; 36, n°4 do artigo 155 , alínea b), n°1, artigo 165, 268 n.°4, 278 do CPPT, e art° 607, 608 e 80 do C.P.Civil, Lei n° 55-B/04, de 30-12 ( OE 2005), Lei n° 60-A/2005, de 30-12, ( OE 2006);
22-Assim sendo, deverá ser julgado procedente o recurso interposto da decisão que julgou improcedente a presente oposição, como se pediu na p.i., anulando-se a douta decisão recorrida, e com todas as suas consequências.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.161 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.82 a 85 dos autos):
1-A coberto da acção inspectiva OI201100003 foi efectuado procedimento de inspecção tributária externa a António ……………… com o propósito de averiguar a sua situação fiscal, designadamente os exercícios de 2008 e 2009 em sede de IVA e IRS;
2-No decurso deste foram efectuadas correcções em IVA, as quais deram origem a liquidações adicionais desse imposto e juros compensatórios;
3-Em data não apurada mas que se situa 30 dias antes de 30/09/2012 foi notificado António ………………….. relativamente à liquidação adicional de IVA e respectivos juros compensatórios respeitantes ao mês de Janeiro 2008;
4-Verificado que foi a falta de pagamento voluntário das aludidas quantias liquidadas foram extraídas as respetivas certidões de dívida em 27/10/2012 e instaurado contra o sobredito contribuinte o respectivo processo de execução fiscal com o n° ……………………….., em 23/10/2013, para sua cobrança;
5-O executado foi citado para a execução em 26/10/2013 (cfr.documentos juntos a fls.20 a 22 do processo administrativo apenso);
6-Em 30/10/2013, perante o não pagamento da quantia exequenda foi prestada nos autos de execução citados a seguinte informação; "Contra o executado António ……………… foi instaurado o processo executivo n° …………………por dívidas de IVA, ano 2008; na presente data o valor da dívida de processo em causa é de € 350.570,50 (...) O contribuinte era casado com Paula ………………. sob o regime de comunhão de adquiridos. O processo de divórcio transitou em julgado em 21/02/2008. Em Janeiro de 2008 Paula ………………… era responsável solidária uma vez que as dívidas de IVA são comuns. Pelo que é também responsável pelas certidões de dívidas n°s …………….., ………. nos valores de € 55.930,76 € 9.623,16. Atendendo à informação sou da opinião que a contribuinte Sra. Paula ……………….. seja citada das certidões de dívida acima referenciadas" (cfr.documentos juntos a fls.84 e 85 do processo administrativo apenso);
7-Na sequência desta informação foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de ……………….. em que corre termos a execução fiscal no sentido da citação da ex-cônjuge do executado para o processo (cfr.documentos juntos a fls.84 e 85 do processo administrativo apenso);
8-Em 10/11/2013 a ora oponente foi citada para a execução fiscal, com vista ao pagamento da dívida de IVA de Janeiro de 2008, no montante total de € 65.553,92, com a menção de que estava a ser efectuada ao abrigo do disposto no artº.189 do CPPT (cfr.documentos juntos a fls.86 a 88 do processo administrativo apenso);
9-A petição inicial que deu origem aos presentes autos deu entrada ao Serviço de Finanças de …………….. em 20/11/2013 (cfr.data de entrada aposta a fls.6 dos presentes autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte:
“…Não se consideraram provados aqueles que se encontram alegados e em contraposição àqueles que resultam assentes, designadamente por constituírem meras considerações ou conclusões de facto e/ou direito ou ainda porquanto não foi apresentada prova de suporte…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados no teor dos documentos constantes dos autos, designadamente no processo administrativo apenso, ainda que este se mostre insatisfatoriamente instruído porque incompleto quanto ao processo de execução fiscal e procedimento de inspecção que esteve subjacente à liquidação da quantia em execução…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar improcedente a oposição deduzida, devido ao decaimento de todos os seus fundamentos, em consequência do que considerou a opoente parte legítima na execução fiscal.
X
Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O apelante aduz, em primeiro lugar e em sinopse, que a sua citação para a execução padece de vício de violação de lei e de falta de fundamentação, visto não indicar ao recorrente em que qualidade intervém no processo executivo (cfr.conclusões 12 a 14 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Apuremos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
O sujeito cujo direito foi alegadamente violado, pretendendo a respectiva reparação, está obrigado a escolher o tipo de acção que a lei especificamente prevê para obter a satisfação do seu pedido, sob pena de, se o não fizer, o Tribunal nem sequer tomar conhecimento da sua pretensão. Não está, assim, na disponibilidade do administrado a escolha arbitrária do tipo de acção a que pode recorrer na defesa dos seus direitos, visto que a lei, em cada caso, consagra qual o meio processual próprio para atingir aquela finalidade, o qual deve ser seguido. Nestes termos, compete ao demandante analisar a situação que se lhe apresenta e, perante ela, recorrer, dentro do prazo legal, ao meio processual que a lei disponibilizou para obter o reconhecimento do direito ou interesse em questão (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 5/6/2012, proc.5445/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/3/2013, proc.6349/13).
Ora, a nulidade/irregularidade da citação deve ser causa de pedir a examinar no âmbito de reclamação de decisão do órgão de execução fiscal, espécie processual prevista no artº.276 e seg. do C.P.P.Tributário, apenas se ressalvando o seu conhecimento a título incidental no âmbito de processo de oposição a execução fiscal, conforme doutrina e jurisprudência devidamente sedimentadas (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/4/2008, proc. 2273/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/11/2012, proc.5991/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/3/2013, proc.6349/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, 6ª. edição, 2011, pág.369 e seg.).
Por último, deve concluir-se que nos encontramos perante erro parcial na forma de processo, assim não sendo possível configurar a eventual convolação da forma de processo. Nestes casos, a solução que se extrai do tratamento dado a uma questão paralela no artº.186, nº.4, do C.P.C., é a de considerar sem efeito o pedido ou pedidos para o qual o processo não é adequado, prosseguindo o processo apenas para apreciação do pedido que deva ser apreciado em processo do tipo escolhido pelo interessado. Essa consequência é uma aplicação da regra do artº.193, do C.P.C., segundo a qual, no caso de erro na forma de processo, é nulo todo o processado que não puder aproveitar-se para a tramitação de acordo com a forma estabelecida na lei. Nesses casos de erro parcial da forma de processo, como este tem de prosseguir para apreciação do pedido para que é adequado, a consequência relativamente ao outro pedido será a de nulidade parcial do processo, na parte a ele respeitante, o que se reconduz a que o processo prossiga como se esse pedido não tivesse sido efectuado (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/3/2013, proc.6349/13; José Alberto dos Reis, Comentário ao C.P.Civil, Coimbra Editora, vol.III, pág.393; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, 6ª. edição, 2011, pág.92 e seg.).
Pelo que, nesta parte, este Tribunal concorda com a decisão do Mmº. Juiz “a quo”, assim se julgando improcedente o presente esteio do recurso.
Mais alega o recorrente que a liquidação que constitui a dívida exequenda padece de vício de violação da lei, pela circunstância de não lhe ter sido devidamente notificada dentro do prazo de caducidade estabelecido no artº.45, da L.G.T. (cfr.conclusão 15 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, segundo entendemos, um novo erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão recorrida comporta tal pecha.
Pode definir-se a caducidade como o instituto através do qual os direitos que, por força da lei ou de convenção das partes, se devem exercer dentro de certo prazo, se extinguem pelo seu não exercício durante o mesmo período. O instituto da caducidade tem por fundamento vectores como a certeza e a ordem pública, vistos no sentido de que é necessário que, ao fim de certo lapso de tempo, as situações jurídicas se tornem certas e inatacáveis. Esta prevalência de considerações de ordem pública constitui a razão explicativa para que o prazo de caducidade corra sem suspensões e interrupções e, em princípio, que só o exercício do direito durante o mesmo impeça que a caducidade opere. A necessária brevidade da relação jurídica que comporta um direito caducável determina que o não exercício do mesmo no prazo legal ou convencionalmente definido acarreta a sua extinção. Refira-se, ainda, que a caducidade, determinando a extinção do direito e da correspondente vinculação sem mais, não gera o consequente aparecimento de uma obrigação natural, contrariamente ao que acontece com o instituto da prescrição. Por último, a caducidade deve consubstanciar-se como uma excepção peremptória passível de apreciação oficiosa pelo Tribunal (cfr.artºs.328, 331 e 333, todos do C.Civil; artº.496, do C.P.Civil; Luis A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II, A.A.F.D.L., 1983, pág. 567 e seg.; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª.edição, Coimbra Editora, 1989, pág.372 e seg.; Aníbal de Castro, A Caducidade na doutrina, na lei e na jurisprudência, 3ª.edição, 1984, pág.29 e seg.).
No que diz respeito ao direito tributário, o regime da caducidade do direito à liquidação de impostos, matéria que não é de conhecimento oficioso, encontra actualmente consagração genérica no artº.45, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12, norma que vem consagrar um prazo de caducidade de quatro anos (cfr.anterior artº.33, nº.1, do C.P.Tributário, o qual consagrava o prazo de cinco anos). Face à redacção do aludido artº.45, da L. G. Tributária, é claro que, quer o exercício do direito à liquidação, quer a notificação do seu conteúdo ao contribuinte, e não apenas aquele primeiro acto, têm que ocorrer dentro do mencionado prazo de quatro anos contados do facto tributário, sob pena de operar a caducidade de tal direito. O prazo de caducidade em análise justifica-se por razões objectivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/10/2012, proc.5792/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.7031/13; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e Anotada e comentada, Editora Encontro da Escrita, 4ª. Edição, 2012, pág.359 e seg.; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª.edição, Coimbra Editora, 2007, pág.259 e seg.; Joaquim Casimiro Gonçalves, A caducidade face ao direito tributário, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, 1999, pág.225 e seg.).
A Constituição da República Portuguesa, após a revisão introduzida pela Lei Constitucional nº.1/82, de 30/9, prevê no seu artº.268, nº.3, que os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados na forma prevista na lei (lei ordinária), assim impondo à Administração um dever de dar conhecimento aos interessados, mediante uma comunicação oficial e formal, do teor dos actos praticados, comunicação essa que deve incluir também a própria fundamentação do acto que do mesmo faz parte integrante (cfr.J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4ª. Edição revista, II volume, Coimbra Editora, 2010, pág.824 e seg.).
A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; Alberto Pinheiro Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Almedina, 1972, pág.239 a 242; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.94 e seg.; Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.309 a 311).
No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7443/14).
De acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, há muito se fixou o entendimento de que a falta de notificação da liquidação, enquanto elemento integrante da eficácia externa da mesma, é fundamento de oposição a enquadrar no artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário), dado não colidir com a apreciação da legalidade da própria liquidação, não representar interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título, poder ser provado por documento e constituir facto modificativo posterior à liquidação e anterior à emissão da certidão executiva. Face a esta interpretação jurisprudencial do quadro normativo existente, à qual se adere, fica aberta, na fase executiva, pelos meios legais de oposição, a discussão da falta ou de eventuais vícios da notificação, designadamente por inexigibilidade da dívida, ao abrigo do disposto no mencionado artº.286, nº.1, al.h), do C. P. Tributário (cfr.artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário).
Em resumo, o regime processual da defesa do contribuinte, nestas situações será o seguinte:
1-Se é instaurada uma execução fiscal e não foi efectuada notificação válida do acto de liquidação, o sujeito passivo pode sempre opor-se à execução ao abrigo da alínea i), do nº.1, do artº.204, do C.P.P.T., invocando a ineficácia do acto, que impede que a dívida seja exigível, sendo indiferente, para este efeito, que o acto de liquidação enferme de qualquer vício, inclusivamente o de extemporaneidade da liquidação;
2-Já se foi instaurada uma execução e efectuada notificação válida do acto de liquidação, mas a notificação foi realizada fora do prazo de caducidade previsto no artº. 45, nº.1, da L.G.T. (ou outro prazo especial que for aplicável), o contribuinte pode opor-se à execução ao abrigo da alínea e), do nº.1, deste artº.204, do C.P.P.T. (trata-se de situação que, no seu teor literal, poderia caber na mencionada alínea i), pois não se engloba nela a apreciação da legalidade da própria liquidação nem é matéria da exclusiva competência da entidade que emite o título, mas que era dela afastada à face do entendimento jurisprudencial referido formado na vigência do C.P.T., reconduzindo-se a utilidade da alínea e) ao afastamento da aplicabilidade deste entendimento; a possibilidade de oposição ao abrigo da alínea e) existirá independentemente de a própria liquidação ser extemporânea, isto é, de ela própria ser ilegal, pois não está em causa no processo de oposição à execução fiscal a apreciação da legalidade da liquidação, mas a sua oponibilidade ao seu destinatário);
3-Por último, se foi efectuada uma liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo, mas não foi ainda instaurada execução, o contribuinte pode impugnar judicialmente a liquidação, invocando a ilegalidade da sua extemporaneidade, porém, se o não fizer e não pagar a quantia liquidada, não ficará impedido de se opor à execução, ao abrigo da alínea e) referida, visto que, além da ilegalidade da liquidação, ocorre também a sua inexigibilidade por falta de tempestiva notificação (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/9/2011, rec.473/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/01/2014, proc.7016/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.489 e seg.).
Tanto à face do anterior C.P.T., como da actual L.G.T., o facto que obsta à caducidade do direito à liquidação e consequente inexigibilidade da dívida exequenda é a notificação do contribuinte ou sujeito passivo originário do tributo no prazo determinado na lei. No que respeita ao I.V.A., qualifica-se este como imposto de obrigação única, dado incidir sobre factos tributários de carácter instantâneo, embora o prazo extintivo do direito da Fazenda Pública à liquidação do tributo tenha como termo inicial de cômputo o início do ano civil seguinte àquele em que se verificou o mesmo facto tributário (cfr.artº.45, nº.4, da L.G.Tributária, na redacção introduzida pelo artº.43, nº.1, da Lei 32-B/2002, de 30/12). A referida alteração normativa aplica-se ao caso “sub judice” (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 26/11/2008, rec.598/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.7031/13; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.361 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.491 e seg.).
No caso vertente, de acordo com a matéria de facto provada (cfr.nº.3 do probatório), a notificação da liquidação que constitui a dívida exequenda verificou-se em data anterior a 30/09/2012 e na pessoa do então marido da recorrente, sendo que tal notificação é suficiente para obviar à caducidade do direito à liquidação do tributo em causa, face a qualquer dos cônjuges, responsáveis solidários pelo pagamento do tributo em causa (cfr.artº.21, nº.1, da L.G.T.).
Sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente esteio da apelação e confirma-se a decisão do Tribunal "a quo", também neste segmento.
Por último, aduz o recorrente que a dívida exequenda não é da sua responsabilidade, não obstante a presunção consagrada nos artºs.1691, nº.1, al.d), e 1692, do C.Civil, e artº.15, do C.Comercial. Que tal decisão é objectivamente ilegal, pois considerou como irreversível a comunicabilidade da dívida a coberto da presunção a que alude o citado artº.15 do C.Comercial. Que o recorrente não figura no título executivo, assim carecendo tal execução de título válido relativamente a si (cfr.conclusões 17 e 18 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar um novo erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Apuremos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
A distinção fundamental em matéria de dívidas dos cônjuges separa as dívidas que responsabilizam ambos os cônjuges (cfr.artºs.1691, nºs.1 e 2, 1694, nºs.1 e 2, do C. Civil) daquelas que apenas responsabilizam um dos cônjuges (cfr.artºs.1692, 1693, nº. 1, e 1694, nº.2, primeira parte, do C.Civil).
Por outro lado, dir-se-á que a determinação da eventual responsabilidade dos cônjuges deve aferir-se pela data do facto que deu origem às dívidas pelos mesmos contraídas (cfr.artº.1690, nº.2, do C.Civil; Antunes Varela, Direito da Família, Livraria Petrony, 1987, pág.383; ac.T.T.2ª.Instância, 18/6/86, C.T.F.334-336, pág.469 e seg.).
Refira-se, igualmente, que a recorrente e o executado António Custódio Pastor Danado se encontravam casados segundo o regime de comunhão de adquiridos na data em que se constituiu a dívida exequenda (cfr.nº.6 da matéria da facto provada).
Os bens comuns, especialmente afectados aos encargos da sociedade conjugal, constituem um património autónomo sujeito a regime especial, face ao regime normal de compropriedade previsto no artº.1403 e seg., do C. Civil. Assim e por exemplo, enquanto que o credor de qualquer comproprietário pode executar a quota do devedor no direito comum ou bem indiviso (cfr.artº.743, do C.P.Civil), o credor de um dos cônjuges, por dívida da exclusiva responsabilidade do mesmo, está sujeito a aguardar a separação de bens entre o casal (cfr.artº.741, do C.P.Civil). Em virtude da diferença de regime entre os institutos em análise, afirma a doutrina que os bens comuns do casal constituem objecto, não de uma relação de compropriedade, mas antes duma propriedade colectiva. Sujeitos da mesma são ambos os cônjuges, sem que seja correcto falar, enquanto persiste a comunhão, numa divisão de quotas entre eles. Por isso, se pode dizer que na propriedade colectiva existe um direito uno, enquanto que na compropriedade há um aglomerado de quotas dos vários comproprietários. A propriedade colectiva consubstancia portanto, enquanto persiste, uma comunhão una, indivisível e sem quotas (cfr.Antunes Varela, Direito da Família, Livraria Petrony, 1987, pág.434 e seg.; Pereira Coelho, Curso de Direito da Família, 1977, pág.395 e seg.).
Ao mesmo tempo que constituem, quanto ao processo de contitularidade dos seus sujeitos, uma forma de propriedade colectiva (distinta da compropriedade), os bens comuns formam, no que respeita ao regime da responsabilidade por dívidas, um património de afectação especial. A autonomia deste património, em face dos bens próprios pertencentes a cada um dos cônjuges, consiste no facto de os bens comuns responderem apenas pelas dívidas de interesse comum do casal, ou seja, pelas dívidas que responsabilizam ambos os cônjuges, e ainda no facto de, por estas dívidas, só responderem outros bens, quando não haja bens comuns ou estes sejam insuficientes (cfr.artº.1695, nº.1, do C.Civil). A autonomia dos bens comuns não é, todavia, completa. Há casos em que os bens comuns respondem, igualmente e de forma imediata, por dívidas da responsabilidade exclusiva de um dos membros do casal (cfr.artº.1696, nº.2, do C.Civil; Antunes Varela, Direito da Família, Livraria Petrony, 1987, pág.437).
Revertendo ao caso dos autos, mais se dirá que nos termos do disposto no artº.1691, nº.1, al.d), do C.Civil, são da responsabilidade de ambos os cônjuges as dívidas contraídas por qualquer um deles no exercício do comércio, a menos que se prove que não foram contraídas em proveito comum do casal, ou se vigorar entre ambos o regime de separação de bens. Com estes pressupostos, não pode proceder a oposição deduzida pelo cônjuge daquele que consta do título executivo como devedor e que foi citado como co-executado se o fundamento na sua invocada ilegitimidade consiste em não constar do título executivo (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 29/5/2013, rec.480/13; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/1/2015, rec.876/14; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.604 e seg.).
Concluindo, o recorrente não produziu prova no sentido da dívida exequenda não ter sido contraída em proveito comum do casal, sendo que a sua eventual ilegitimidade somente se poderia basear nesse vector, atento o regime de bens existente no casamento, que não no facto de não figurar no título executivo.
Resta referir que a sentença recorrida não viola as disposições contidas nos artºs.20 n.° 4 e 5, 268 da CRP; art° 804, n°2, 805, n°2 al. c) e 817 al. a) do Código Civil alínea d) do n°1 do artigo 1691 do C. Civil, 1692 CC, 45, n°2, art° 57, 77 n.°6, 95 n.°2 j), e 103 n.°2 da LGT, 15 C. Com; 36, n°4 do artigo 155 , alínea b), n°1, artigo 165, 268 n.°4, 278 do CPPT, e art° 607, 608 e 80 do C.P.Civil, Lei n° 55-B/04, de 30-12 (OE 2005), Lei n° 60-A/2005, de 30-12, (OE 2006), contrariamente ao que defende o recorrente, embora sem concretizar tais alegadas infracções.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 10 de Julho de 2015



(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)