Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:3035/06.6BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:02/16/2023
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:IRC – PROVISÕES
CORRECÇÕES
Sumário:As provisões são registos contabilísticos de verbas destinadas a fazer face a um encargo imputável ao exercício, mas de comprovação futura, ou já comprovado, mas de montante incerto.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. RELATÓRIO

M......., S.A., com os sinais nos autos, veio, em conformidade com o n.º 3, do artigo 282.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, interpor recurso da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, a qual julgou parcialmente procedente a impugnação judicial, por aquela intentada, do ato de liquidação adicional de IRC n.º …….267 relativa ao exercício de 2003, no valor total de 377.699,17€, incluindo juros compensatórios, no montante de 23.704,49€, com vista à sua anulação parcial e que, em consequência: (i) anulou a liquidação de IRC n.º …….267, na parte em que resulta da correção ao lucro tributável emergente da não consideração como custo fiscal dos encargos com o Sorteio Eurocobranças, no valor de 8.076,93€; e (ii) anulou a liquidação de juros compensatórios, na parte em que reflete o resultado da correção ao lucro tributável da Impugnante relacionada com o Sorteio Eurocobranças. Mais, aquela sentença, fixou à causa o valor de € 196.130,50 e condenou ambas as partes nas custas na proporção do decaimento, que fixou em 2/3 para a Impugnante e em 1/3 para a Fazenda Pública.

A Recorrente termina as alegações de recurso formulando as conclusões seguintes:
“A- A sentença recorrida julgou improcedente a impugnação da liquidação adicional de IRC do exercício de 2003 no que se refere às correcções efectuadas pela AT à matéria colectável tendo considerado como provisões fiscais não dedutíveis, entre outros, os seguintes custos e encargos:
a) Patrocínio concedido à Câmara Municipal de Oeiras, pelo montante de € 15 000,00;
b) Comissões à M..., pelo montante de € 12 000,00;
c) Encargos de Auditoria, pelo montante de € 15 355,50;
d) "Profit Comission/2003", pelo montante de € 99 795,19;
e) "Over Comission/2003", pelo montante de € € 34 000,00;
f) Incentivos ao pessoal, pelo montante de € 450 000,00
B- Todas as despesas e encargos anteriormente enumerados foram lançados pela impugnante nas demonstrações financeiras do período a que respeitavam com independência de o seu pagamento ser ou não efectuado naquele período temporal - o exercício de 2003 - em obediência ao princípio da especialização;
C- O art.º 18.º do CIRC dispõe que "Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica'';
D- O Plano Oficial de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 410/89, de 21 de Novembro determinava no seu ponto 2.º., que a constituição de provisões "....deve respeitar apenas às situações a que esteiam associados riscos e em que não se trate apenas de uma simples estimativa de um passivo certo";
E- O encargo suportado com o patrocínio à Câmara Municipal de Oeiras, em 2003, fazia parte de um contrato de seguro celebrado pela impugnante com aquela entidade após concurso e era calculado pela aplicação de uma percentagem de 6,5% sobre o valor dos prémios de seguros pagos, dos quais 5% a suportar pela seguradora e os restantes 1,5% pelo mediador, sendo que os prémios de seguro a considerar para o efeito constavam de caderno de encargos anteriormente aprovado.
F- O custo com o patrocínio à Câmara Municipal de Oeiras, em 2003, era certo e conhecido à data do respectivo lançamento, pelo que outro tratamento não lhe poderia ser dado que não o directamente decorrente do art.º 18.º do CIRC, não sendo o mesmo afectado por qualquer imprevisibilidade ou indeterminação que por alguma forma justificasse o seu tratamento como provisão.
G- O facto de a impugnante ter vindo a suportar posteriormente os encargos de 1,5% dos prémios pagos que, prima facie, incumbiriam ao mediador, não induz um caracter de indeterminação/ imprevisibilidade a um custo que era certo à data da sua consideração pela impugnante, pelo que a adoptar um entendimento contrario o tribunal a quo violou a lei e designadamente o disposto no art.º 18.º do CIRC que impõe o tratamento, como custo do exercício, os 5% do patrocínio de 2003 devidos pela impugnante à Camara Municipal de Oeiras H- A M... era uma cliente da seguradora que promovia a celebração de contratos e cobrança de prémios de seguros e, em contrapartida, a impugnante comparticipava em 10% nos encargos do co-seguro, o que lhe permitia obter proveitos, nomeadamente prémios de seguro.
I- Os aludidos prémios de seguro eram angariados e cobrados no próprio exercício, sendo por isso determinável de antemão o valor das cobranças e desde logo da co-relativa comparticipação nos encargos do co-seguro.
J- Sendo o custo a suportar pela impugnante certo e conhecido à data do respectivo lançamento, pelo que outro tratamento não lhe poderia ser dado que não o directamente decorrente do art.º 18.º do CIRC, sendo irrelevante para a sua imputação como custo do exercício o facto do pagamento correspondente ocorrer durante ou após o termo do exercício.
K- O tribunal a quo errou na apreciação da prova produzida ao afectar de um caracter de indeterminação/ imprevisibilidade um custo que era indiscutivelmente certo à data da sua consideração, em razão de, posteriormente, se apurar um erro/desvio de € 54,08 face ao valor contabilizado nas demonstrações financeiras.
L- Tem assim de se haver como violadora de norma expressa e designadamente do art.º
18.º do CIRC, a desconsideração como custo dedutível à matéria colectável de 2003 do montante de € 12 000 suportado pela impugnante a título de comissões devidas M..., eventualmente corrigido da diferença do erro posteriormente apurado.
M- A auditoria externa da impugnante era contratada pelo Grupo M......., sendo estimado determinado número de horas para cada empresa de auditoria, a que o Grupo dava o seu acordo e informava as várias empresas que a ele pertenciam acerca das horas contratadas.
N- Em razão das horas extraordinárias e seu apuramento a posteriori, o custo estimado e o total pago por encargos de auditoria divergem.
O- Da indeterminação de algumas horas extraordinárias, não é possível inferir - sob pena de erro na apreciação da matéria de facto - que os custos lançados pelo montante € 15 355,50 (que não incluíam as horas não apuradas) não eram certos e determináveis à data do lançamento.
P- Não pode deixar assim, também aqui, de se haver como violadora de norma expressa e designadamente do art.º 18.º do CIRC, a desconsideração pelo Tribunal a quo como custo dedutível à matéria colectável de 2003 do montante de € 15 355,50 suportado pela impugnante a título de honorários de Auditoria/2003.
Q- As comissões pagas pela impugnante a titulo de Profit Comission e de Over Comission têm a natureza de prémios atribuídos aos agentes da impugnante e estão associados ao seu desempenho em determinado exercício nas diversas vertentes da sua actuação tais como as de cobranças, domiciliação bancária e prémio médio de cobrança de prémios, sendo que à data do encerramento das contas do exercício, não só o custo ou encargo é certo como o seu montante é determinável por que atribuído "em função de objectivos pré-definidos e acordados para o ano" resultando "o valor desses incentivos (...) da aplicação duma percentagem fixa sobre o valor das cobranças realizadas pelo agente...".
R- Para o efeito da aplicação do disposto no art.º 18.º do CIRC é absolutamente irrelevante a circunstância de tais comissões só serem processadas e pagos aos agentes no exercício seguinte, pelo que ao acolher um entendimento diferente o tribunal a quo violou a lei e designadamente o disposto no art.º 18.º do CIRC.
S- A impugnante atribuiu ao seu pessoal prémios/incentivos por objectivos atingidos no ano de 2003 e de acordo com uma matriz pré-determinada, idêntica à do ano anterior;
T- A circunstância de apenas ser processável no ano subsequente àquele a que se refere em nada afecta tal custo como custo certo incorrido no exercício.
U- O custo de mão-de-obra era determinável à data do fecho das suas contas uma vez que tinha por base uma matriz de imputação, constante ao longo dos anos, eram conhecidos o grau de cumprimento de objectivos dos diversos sub-grupos de beneficiários - administrativos, direcção, comerciais e atendimento - e contava, para efeitos de comparabilidade e confirmação, com os apuramentos de anos anteriores; pelo foi possível à impugnante estabelecer uma estimativa de um passivo certo.
V- O desvio que se verificou para o valor estimado, até por se situar em cerca de 5% do valor total dos incentivos, confirma não só a validade e a consistência da estimativa como afasta qualquer elemento de risco associado à projecção do valor do custo imputável ao exercício.
W- Os valores considerados pela impugnante a título de incentivos ao pessoal pelo montante de € € 447 368,63 constituem custos certos, incorridos no exercício, não havendo fundamento legal para o seu enquadramento como provisões, tanto mais que, a anulação da divergência apurada, veio a concorrer, em 2004, para a formação da matéria colectável da impugnante, com o que a desconsideração, como provisão do custo incorrido em 2003, redundaria numa duplicação de tributação do mesmo rendimento que a lei não consente; ao acolher um entendimento diferente o tribunal a quo violou lei expressa e designadamente o disposto no art.º 18.º do CIRC

Termos em que, com o douto suprimento de V.as Ex.as deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a aliás douta sentença recorrida, nos concretos pontos dos segmentos decisórios recorridos, substituindo-a por outra que, naqueles pontos julgue procedente a impugnação judicial, com todas as consequências de lei.
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A Fazenda Pública, aqui Recorrida, notificada, não apresentou contra-alegações.
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Notificado, o Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu douto parecer no sentido da manutenção da posição plasmada no parecer do Ministério Público em primeira instância, a qual é no sentido da improcedência da impugnação.

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Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que a recorrente remate a sua alegação (art. 639º do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal.
De outro modo, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.
Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, a questão fundamental a decidir é a de saber se a sentença recorrida errou no seu julgamento quando considerou como provisões fiscais não dedutíveis, determinados custos e encargos que foram lançados pela impugnante nas demonstrações financeiras do exercício de 2003.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. De facto

A sentença recorrida deu por provados os seguintes factos:
“ 1. A Impugnante é uma sociedade anónima de seguros enquadrada no regime de tributação geral em sede de IRC, e no regime normal de periodicidade trimestral em sede de IVA, tendo como atividade principal “seguros não vida”, encontrando-se enquadrada no CAE 66030;
(cfr. PAT a fls. 409);
2. Em 13.12.2005, iniciou-se ação de inspeção externa de âmbito geral, reportada ao exercício de 2003 da Impugnante, que incidiu nas áreas do IRC, IRS, IVA e I.SELO, em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI200500547, de 23.11.2005;
(cfr. PAT a fls. 389);
3. Em 7.4.2006, foi exarado pelo Sr. Chefe de Divisão por delegação de competências o despacho “concordo. Notifique-se o sujeito passivo” sobre o Relatório de Inspeção Tributária elaborado na sequência da ação inspetiva levada a cabo relativamente à Impugnante, que se dá por reproduzido e do qual se decalca o seguinte teor:
«I – 2.1 – Correções à matéria tributável – IRC
Provisões não dedutíveis (Ponto III – 1.1 do Relatório de Inspecção Tributária)
- 1.022.727,62 €
Provisões associadas a despesas de funcionamento cujas constituições não são aceites para efeitos fiscais, nos termos do art.º 34.º do CIRC.
Mais-Valias Fiscais – Imobilizações Corpóreas (Ponto III – 1.2 do Relatório de Inspecção Tributária)
- 2.201,16 €
Apuramento das mais-valias fiscais, provenientes da troca de imobilizações corpóreas, segundo o previsto no n.º 2 e na alínea a) do n.º 3 do art.º 43º do CIRC;
Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais – Imposto do Selo (Ponto III – 1.3 do Relatório de Inspeção Tributária)
- 869,72 €
Não aceitação como custo do exercício do imposto de selo que constituiu encargo de terceiros, pelo que foi efectuada a respectiva correcção de acordo com o previsto no n.º 1 do art.º 23º do CIRC.
Benefícios fiscais – Criação de empregos para jovens (Ponto III – 1.2 do Relatório de Inspeção Tributária)
- 9.691,33 €
Correcção ao cálculo do benefício para a criação de empregos para jovens, aplicação dos pressupostos inerentes ao mesmo, efectuado de acordo com o disposto no art.º 17º do EBF conjugado com o art.º 23º do CIRC.
(…)
III – Descrição dos factos e fundamentos das correcções à matéria tributável e apuramento do imposto em falta
As áreas contabilístico-fiscais inspeccionadas de acordo com os procedimentos em uso e com a profundidade considerada adequada nas circunstâncias, deram origem, no exercício de 2003, às seguintes correcções:
III – 1 – Correcções à matéria tributável – IRC
III – 1.1 – Provisões não dedutíveis
Da análise efectuada ao extracto da conta “4839000000 – Outros acréscimos de custos” constatou-se a existência da contabilização de despesas de funcionamento, cujo valor era desconhecido no momento do seu reconhecimento como custo do exercício, no montante de 1.022.727,62 €. – Anexo 1 (1 fl.)
Assim, estamos perante o reconhecimento como custos do exercício de meras expectativas/estimativas, relevados contabilisticamente nas contas “630 – Custos de Exploração – Custos de aquisição”, “680 – Custos por natureza a imputar – Custos com o pessoal”, “681 – Custos por natureza a imputar – Fornecimentos e serviços externos” e “691 – Outros custos – Não técnicos”, isto é, de provisões do exercício, termo, aliás, utilizado pelo Sujeito Passivo no descritivo dos referidos lançamentos contabilísticos.
De referir que quando existe a efectivação do custo estimado/provisionado, o lançamento contabilístico referido anteriormente é anulado e relevado contabilisticamente o custo efectivo devidamente documentado, nos termos do art.º 23º do CIRC.
De acordo com o previsto no n.º 1 do art. 34º do CIRC, são dedutíveis para efeitos fiscais, nomeadamente, as provisões:
· Que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que no fim do exercício possam ser considerados de cobrança duvidosa;
· Que se destinarem a cobrir as perdas de valor que sofrerem as existências;
· Que se destinarem a ocorrer a obrigações e encargos derivados de processos judiciais em curso por factos que determinariam a inclusão daqueles entre os custos do exercício;
· Que no âmbito da disciplina definida pelo Instituto de Seguros de Portugal, e por força de uma imposição de carácter genérico e abstracto, tiverem sido obrigatoriamente constituídas pelas empresas de seguros submetidas à sua supervisão, incluindo as provisões técnicas legalmente estabelecidas.
Assim sendo, dado que estamos perante custos previstos, os mesmos assumem a natureza de provisões não dedutíveis para efeitos fiscais, dado não terem enquadramento no disposto no art.º 34º do CIRC, pelo que se efectuou o respectivo acréscimo ao resultado fiscal declarado, no montante acima mencionado.
Paralelamente, são ainda devidos juros compensatórios, conforme estabelecido no art. 94.º do CIRC, à taxa e nos termos previstos no artigo 35º da LGT.
III – 1.2 – Mais-Valias Fiscais – Imobilizações Corpóreas
Da confrontação efectuada entre as mais-valias e menos-valias fiscais – Imobilizações corpóreas demonstradas no mapa 31- Mapa das Mais-Valias e Menos-Valias Fiscais entregue com o processo de documentação fiscal, de acordo com a Portaria n.º 259/2000, de 20 de Junho, e as evidenciadas na contabilidade, verificou-se existir ganhos em imobilizações corpóreas provenientes de trocas, relevadas na conta “7910360010 – Por Trocas de Maqui e Ferramentas” sem que fosse apurada a respectiva valia para efeitos fiscais.
De acordo com o n.º 2 do art.º 43 do CIRC as mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o respectivo valor de aquisição, sendo que, no caso das trocas considera-se valor de realização o valor de mercado dos bens ou direitos recebidos, acrescido ou diminuído, consoante o caso, da importância em dinheiro conjuntamente recebida ou paga, nos termos do previsto na alínea a) do n.º 3 do artigo mencionado anteriormente.
Contudo, nos termos do n.º 1 do art.º 44º, igualmente do CIRC, o valor de aquisição histórico é actualizado mediante aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda para o efeito publicados em portaria do Ministério das Finanças, sempre que à data da realização, tenham decorrido pelo menos dois anos desde a data de aquisição.
Assim, e de forma a dar cumprimento ao disposto nos referidos artigos, procedeu-se ao apuramento das valias para efeitos fiscais, tendo em consideração os seguintes dados:
i) Valor de Aquisição: 5.074,64€;
ii) Data de Aquisição: Abril/2002;
iii) Amortizações Praticadas e aceites para efeitos fiscais: 2.114,41€;
iv) Valor Troca (Valor de Realização): 5.161,39 €.
Este apuramento deu origem a uma mais-valia para efeitos fiscais 2.201,16 € (5.161,39 € - (5.074,64 € - 2.114,41 €) x 1), o que se traduziu numa correcção a favor da Administração Fiscal, efectuada nos termos do preceito legal anteriormente mencionado.
Paralelamente, são ainda devidos juros compensatórios, conforme estabelecido no art.º 94º do CIRC, à taxa e nos termos previstos no art. 35.º da LGT.
(…)»
(cfr. PAT a fls. 385 a 399);
4. Em anexo (n.º 1) ao Relatório aludido no ponto anterior, consta o seguinte quadro:
«Provisões não dedutíveis – Exercício de 2003»
Conta
Data
Descrição
Valor
6910000000 31-Dez-03 Prov. Patrocínio C.M Oeiras 15.000,00
6301000001 31-Dez-03 Prov. Com Armadores Pesca Arrasto
12.000,00
6811800002 21-Jul-03 Prov. Auditoria/2003
15.355,50
6301600003 22-Mai-03 Prov. Euro Cobranças (sorteio 2004)
8.076,93
6301600002 19-Fev-03 Prov. Convenção / 2003
175.000,00
6301000006 19-Fev-03 Prov. Profit Commission / 2003
99.795,19
6301000007 19-Fev-03 Prov. Over Commission / 2003
34.000,00
6806000002 31-Mar-03 Prov. Almoço de Natal e Cabazes
38.500,00
6807000003 19-Dez-03 Prov. Formação
50.000,00
6801100000 19-Dez-03 Prov. Incentivos
450.000,00
6807000000 19-Dez-03 Prov. Indemnizações
125.000,00
Total Provisões não Dedutíveis… 1.022.727,62

(cfr. PAT a fls. 400);
5. Em 7.6.2006, foi emitida a demonstração de liquidação, referente à liquidação n.º …… 267, de 17.4.2006, no âmbito da compensação n.º …..790, de 7.6.2006, para o ano de 2003, que se dá por integralmente reproduzida e onde constam os seguintes valores corrigidos:

Descrição Valores Liq. Anteriormente Valores Corrigidos
Matéria Coletável
7.444.269,72
8.479.759,55€
Matéria Coletável – Red Taxa
0,00
0,00
Colecta
2.233.280,91
2.543.927,86 €
Colecta - Red Taxa
0,00
0,00
Colecta à Taxa RA Açores
0,00
0,00
Coleta à Taxa RA Madeira
0,00
0,00
Dupla Tributação Económica
0,00
0,00
Dupla Tributação Internacional
0,00
0,00
Contribuição Autárquica
0,00
0,00
Benefícios Fiscais
0,00
0,00
Pagamento Especial por Conta
0,00
0,00
Total das Deduções
0,00
0,00
Resultado da Liquidação (art. 86.º)
0,00
0,00
Retenções na Fonte
22.295,11
22.295,11
Pagamentos por Conta
1.121.553,00
1.121.553,00
IRC a pagar
1.089.432,80
1.400.079,75
IRC a recuperar
0,00
0,00
IRC de exercícios anteriores
0,00
0,00
Derrama
223.328,09
254.392,79
Tributações Autónomas
13.948,49
13,948,49
Juros compensatórios
0,00
23.704,49€
Juros indemnizatórios
-
0,00
Juros de Mora
0,00
0,00
Pagamento de Autoliquidação
-
1.314.426,35
Valor a pagar €:
– 377.699,17

(cfr. PAT a fls. 408);
6. No mesmo dia 7.6.2006, foi emitida a nota de cobrança n.º …….760, no valor de 364.679,18€, de IRC do período de tributação compreendido entre 1.1.2003 e 31.12.2003, no âmbito da compensação n.º ……..790, de 7.6.2006, indicando a título de imposto o valor de 340.974,69€, emitido e regularizado, e a título de juros compensatórios o valor de 23.704,49€, emitido e regularizado;
(cfr. PAT a fls. 407);
7. A Impugnante efetuou o pagamento do tributo no prazo de pagamento voluntário;
(cfr. PAT a fls. 381);
8. A Impugnante encerrava as contas do exercício no último dia útil de dezembro, devido à pressão e urgência de ter os números da contabilidade definitivos para consolidar as contas com a casa-mãe da multinacional que a mesma integra;
(depoimento das testemunhas P....... e M.......);
9. As contas da Impugnante apenas eram fechadas após relatório emitido pelos auditores externos, certificando as contas em Portugal, que seriam consolidadas no grupo;
(depoimento da testemunha A.......);
10. Os serviços da Impugnante faziam encerramento de contas no dia do termo do exercício e os documentos de suporte de algumas despesas incorridas só vinham a ser efetivamente recebidos pelos serviços posteriormente àquela data, já no ano seguinte;
(depoimento da testemunha A.......);
11. Nas situações em que as faturas e documentos de suporte eram recebidas após os trabalhos de encerramento, os custos da Impugnante eram certos e contabilizados como pertencentes ao exercício em que eram assumidos embora ainda não estivessem quantificados;
(depoimento da testemunha M.......);
12. Os custos eram na contabilidade da Impugnante imputados ao mês e as faturas recebidas e aceites em janeiro, relativas a encargos e despesas incorridas em dezembro, eram pagas em janeiro ou ficavam valores pendentes e por liquidar;
(depoimento da testemunha A.......);
13. Os incentivos ao pessoal durante o exercício de 2003 eram atribuídos e pagos mensalmente ao pessoal da Impugnante no ano de 2004 e o seu valor tem uma parte variável, que depende de diversos fatores, relacionados com o desempenho no cumprimento de objetivos;
(depoimento da testemunha A....... e docs. 8 a 10 juntos com a petição inicial);
14. O valor dos incentivos devidos era previsto em 2003 pela Impugnante em função de uma estimativa de cumprimento de objetivos nesse ano pelos trabalhadores, a partir do desempenho nos exercícios anteriores e do desempenho registado nos meses já decorridos do exercício;
(depoimento da testemunha A.......);
15. O apuramento do valor exato da despesa com incentivos ao pessoal apenas podia ser feito após o fecho de contas do exercício a que se refere, pois só depois de terminar o processo de produção era possível saber quanto haveria a pagar a título de incentivos;
(depoimento da testemunha A.......);
16. O pagamento dos incentivos de 2003 ocorria nos meses de janeiro, fevereiro e março do ano seguinte, dependendo do resultado registado no ano de 2003, tendo havido um desfasamento entre o valor previsto e o valor depois apurado;
(depoimento da testemunha A....... e docs. 8 a 10 juntos com a petição inicial);
17. Tendo a Impugnante baseado o registo contabilístico do encargo no ano de 2003, na estimativa de 450.000,00€, os pagamentos efetivos dos prémios de incentivos relativos a esse ano decorreram durante o exercício de 2004, atingindo a soma total 408.501,82€;
(cfr. docs. 8 a 10 juntos com a petição inicial);
18. A Impugnante fazia encomendas de cabazes de Natal para doação aos seus funcionários e aos mediadores, cujo valor só posteriormente, no decurso do ano imediato ao da encomenda, era faturado à Impugnante;
(depoimento da testemunha A.......);
19. Por vezes, a empresa fornecedora não conseguia entregar todos os cabazes encomendados, ficando o encargo faturado e debitado à Impugnante aquém do encargo estimado e pré-determinado;
(depoimento da testemunha A.......);
20. Como os cabazes faturados eram inferiores aos encomendados, havia necessidade de a Impugnante proceder a um acerto, pagando menos do que contava pagar e orçamentara;
(depoimento da testemunha A.......);
21. Em 2.2.2004, a Impugnante rececionou a fatura SFN/233331, cujo teor se dá por reproduzido, relativa ao encargo com cabazes de Natal do ano de 2003, que importou em 32.571,00€;
(cfr. doc. 7 junto com a petição inicial);
22. O Profit Comission 2003 e o Over Comission 2003 são incentivos variáveis pagos aos agentes de acordo com o seu desempenho nas diversas vertentes da sua atuação (designadamente, cobranças, domiciliação bancária e prazo médio de cobrança dos prémios) de acordo com objetivos pré-definidos e acordados para esse ano;
(depoimento da testemunha P.......);
23. Cumprindo os objetivos, os agentes recebiam uma percentagem fixa sobre o valor das cobranças, sendo o valor que tinham a receber calculado mensalmente e distribuído;
(depoimento da testemunha P.......);
24. No final do exercício, havia acertos a proceder, e só depois do final do ano em causa e do encerramento das contas é que a Impugnante determinava os valores devidos e procedia ao seu pagamento;
(depoimento da testemunha P.......);
25. Os valores pagos no âmbito do Profit Comission 2003 foram de 112.086,91€ e no âmbito do Over Comission 2003, de 27.979,54€, resultando no valor total de 140.066,45€;
(cfr. docs. 5 e 6 juntos com a petição inicial);
26. O Sorteio Eurocobranças era anual ou trimestral e resultava de campanhas comerciais promovidas em 2003 pela Impugnante para venda de produtos específicos dentro da rede de mediação;
(depoimento das testemunhas P....... e M.......);
27. Dentro desse Sorteio, a Impugnante atribuía aos vinte melhores agentes do exercício prémios pecuniários pré-fixados, apurados em função do grau de realização dos objetivos do período em causa e da sua posição num ranking;
(depoimento das testemunhas P....... e M.......);
28. Os valores a pagar e o número de beneficiários eram à partida conhecidos, apenas podendo variar a pessoa dos beneficiários, e eram liquidados no exercício seguinte;
(depoimento das testemunhas P....... e M.......);
29. Os prémios atribuídos por referência ao Sorteio Eurocobranças de 2003 ascenderam a 8.076,93€;
(cfr. doc. 4 junto com a petição inicial);
30. A auditoria externa era contratada pelo Grupo M......., sendo estimado determinado número de horas para cada empresa de auditoria, sendo que o Grupo dava o seu acordo e informava as várias empresas que a ele pertenciam acerca das horas contratadas;
(depoimento da testemunha M.......);
31. Estava determinado que a auditoria externa pertencia ao exercício em que era realizada, mas no ano de 2003 surgiram trabalhos adicionais e esses casos implicavam o pagamento de valores pela Impugnante (em percentagem de 40% ou 60%), cujo acerto foi feito após o termo do exercício;
(depoimento da testemunha M.......);
32. A auditoria corre em duas fases do exercício (outubro e janeiro) e o seu pagamento era também feito em duas fases, sendo que o pagamento por horas extraordinárias de trabalho que as empresas de auditoria realizaram nesse ano foi contabilizado como remanescente do segundo pagamento;
(depoimento da testemunha M.......);
33. Só no início de janeiro do exercício seguinte foi possível à Impugnante apurar os valores devidos às empresas de auditoria, incluindo por horas extraordinárias, em contrapartida dos serviços prestados em 2003;
(depoimento da testemunha M.......);
34. A despesa da Impugnante com auditoria externa durante o exercício de 2003 é titulada na fatura n.º 0410102020, de 17.2.2004 e na fatura n.º 0400103016, de 22.3.2004, cujo valor totaliza 16.217,32€;
(cfr. doc. 3 junto com a petição inicial);
35. A Impugnante manteve com a M... um protocolo no ano de 2003, relativo a um co-seguro, ficando a primeira obrigada a pagar comissões sobre os encargos desse co-seguro, que lhe permitia obter proveitos (nomeadamente, prémios de seguro);
(depoimento da testemunha P.......);
36. A M... era um cliente comercial da Impugnante que promovia a celebração de contratos e cobrança de prémios de seguro, e em contrapartida, a Impugnante comparticipava em 10% nos encargos do co-seguro;
(depoimento da testemunha P.......);
37. Os prémios referidos no ponto anterior eram angariados e cobrados no próprio exercício, sendo possível saber de antemão o respetivo valor das cobranças por fazer na maior parte dos casos;
(depoimento da testemunha P.......);
38. O pagamento das comissões pela Impugnante à M... era feito no exercício seguinte;
(depoimento da testemunha P.......);
39. O montante das comissões relativas ao ano de 2003, suportado pela Impugnante ao abrigo do Protocolo com M..., foi de 11.945,92€;
(cfr. doc. 2 junto com a petição inicial);
40. O encargo do patrocínio à Câmara Municipal de Loures em 2003, era calculado por via da aplicação de 6,5% sobre o valor dos prémios de seguro pagos, dos quais 5% eram pagos pela Impugnante àquela Câmara Municipal e os restantes 1,5% eram pagos pelo mediador;
(depoimento da testemunha P.......);
41. O patrocínio à Câmara Municipal de Loures fazia parte do contrato de seguro que era celebrado entre esta e a Impugnante após concurso, e a necessidade de assumir essa despesa já era conhecida antes de o negócio se concretizar por constar do caderno de encargos;
(depoimento da testemunha P.......);
42. Os prémios pagos pela Câmara Municipal de Oeiras ascenderam, no ano de 2003, ao valor total de 338.862,24€, a que corresponderia o montante suportar pela Impugnante a título de patrocínio, de 16.943,11€;
(cfr. doc. 1 junto com a petição inicial);
43. Após diferendo com o mediador, eclodido em 2002, a Impugnante acabou por aceitar, já em 2004, suportar a totalidade dos encargos com o patrocínio à Câmara Municipal de Oeiras, no montante correspondente a 6,5% dos prémios por esta pagos;
(cfr. doc. 1 junto com a petição inicial);
44. Em 14.10.2005, a Câmara Municipal de Oeiras recebeu da Impugnante o valor de 71.326,69€, referente à aplicação do coeficiente de 6,5% sobre os prémios pagos durante os anos de 2002, 2003 e 2004, valor que compreendia 22.026,05€ provenientes da aplicação desse coeficiente aos prémios pagos durante 2003;
(cfr. doc. 1 junto com a petição inicial);”
****
No que respeita a factos não provados, refere a sentença o seguinte:
“Não se provou que:
1. O excesso verificado na estimativa dos custos com cabazes de Natal foi anulado no ano de 2004;
2. O excesso registado no pagamento dos valores dos incentivos ao pessoal em 2004, por confronto com os valores estimados pela Impugnante em 2003, foi anulado em 2004 e concorreu para a formação da respetiva matéria coletável;
A factualidade alegada, supra transcrita, não foi demonstrada nos autos, visto que a mesma não resulta de prova documental nem foi suportada pelos depoimentos das testemunhas inquiridas. Assim, não se tratando de factos que não careçam de prova para que deles o Tribunal conheça (art. 412.º do CPC), foram dados como não provados.
Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa.”
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Em sede de motivação da matéria de facto, consta da decisão recorrida o seguinte:
“A decisão da matéria de facto teve por base, essencialmente, o exame dos elementos documentais e informações oficiais constantes dos autos, a que foi sendo feita referência em cada uma das alíneas do probatório, que não foram impugnados e que, pela sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do Tribunal, bem como a livre apreciação da prova testemunhal produzida em sede de audiência contraditória de inquirição de testemunhas.
Em sede de inquirição de testemunhas, foram ouvidas as testemunhas indicadas pela Impugnante, A......., Diretora de Recursos Humanos da Impugnante, P......., coordenador da área de agentes da Impugnante e M......., coordenadora de reporte e controle de gestão da Impugnante.
A razão de ciência das testemunhas instadas entronca na atividade por si exercida ao serviço da Impugnante, durante o ano de 2003, em particular nas áreas de pessoal e de contabilidade. As testemunhas trouxeram um relato convincente e articulado, em vários pontos coincidente com os elementos documentais carreados pelas partes.
Deste modo, pela consistência e coerência evidenciadas nos depoimentos das três testemunhas instadas, e em função da especial razão de ciência que todas revelaram ter sobre os factos considerados controvertidos, os depoimentos prestados mereceram credibilidade e foram valorados como tal pelo Tribunal.”
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II.2. De Direito
Em sede de aplicação de direito a sentença recorrida julgou parcialmente procedente a presente acção e, em consequência:
- anulou a liquidação de IRC nº …..267, na parte em que resulta da correcção ao lucro tributável emergente da não consideração como custo fiscal dos encargos com o Sorteio Eurocobranças, no valor de 8.076,93€;
- anulou a liquidação de juros compensatórios, na parte em que reflete o resultado da correcção o lucro tributável da Impugnante relacionada com o sorteio Eurocobranças.

Inconformada, a impugnante veio interpor recurso da decisão por a mesma, no que se refere às correcções efectuadas pela AT à matéria colectável ter considerado como provisões fiscais não dedutíveis, entre outros, os seguintes custos e encargos:

a) Patrocínio concedido à Câmara Municipal de Oeiras, pelo montante de € 15 000,00;
b) Comissões à M..., pelo montante de € 12 000,00;
c) Encargos de Auditoria, pelo montante de € 15 355,50;
d) "Profit Comission/2003", pelo montante de € 99 795,19;
e) "Over Comission/2003", pelo montante de € € 34 000,00;
f) Incentivos ao pessoal, pelo montante de € 450 000,00

Alega que todas as despesas e encargos anteriormente enumerados foram lançados pela impugnante nas demonstrações financeiras do período a que respeitavam com independência de o seu pagamento ser ou não efectuado naquele período temporal - o exercício de 2003 - em obediência ao princípio da especialização.

Vejamos.
Está em causa nos presentes autos a legalidade das correcções à matéria tributável efectuadas na sequência da ação de inspeção desencadeada sobre o exercício de 2003.
A impugnante, ora recorrente, discorda das correções empreendidas, no que respeita às provisões não dedutíveis, alegando que certas verbas refletidas na sua contabilidade revestem natureza de custos e encargos.

Antes de mais, façamos um breve enquadramento legal.
Importa verificarmos o que a lei em vigor à data dos factos (2003) dispunha sobre a constituição de provisões.
O artigo 23.º, n.º 1, al. h) do CIRC (na redação aplicável aos autos), sob a epígrafe “Custos ou perdas”, considerava custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente as provisões.
Por sua vez, o artigo 34.º do CIRC, sob a epígrafe “Provisões fiscalmente dedutíveis”, circunscreveu o seguinte elenco taxativo de provisões que podem ser deduzidas para efeitos legais:
“ 1- (…)
a) As que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que no fim do exercício possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade;
b) As que se destinarem a cobrir as perdas de valor que sofrerem as existências;
c) As que se destinarem a ocorrer a obrigações e encargos derivados de processos judiciais em curso por factos que determinariam a inclusão daqueles entre os custos do exercício;
d) As que, no âmbito da disciplina definida pelo Banco de Portugal, e por força de uma imposição de carácter genérico e abstracto, tiverem sido obrigatoriamente constituídas pelas empresas sujeitas à sua supervisão e pelas sucursais em Portugal de instituições de crédito e de outras instituições financeiras com sede em outro Estado membro da União Europeia, com excepção da provisão para riscos gerais de crédito, bem como as que, no âmbito da disciplina definida pelo Instituto de Seguros de Portugal, e por força de uma imposição de carácter genérico e abstracto, tiverem sido obrigatoriamente constituídas pelas empresas de seguros submetidas à sua supervisão e pelas sucursais em Portugal de empresas seguradoras com sede em outro Estado membro da União Europeia, incluindo as provisões técnicas legalmente estabelecidas;
e) As que, constituídas por empresas que exerçam a indústria extractiva do petróleo, se destinem à reconstituição de jazigos;
f) As que, constituídas pelas empresas pertencentes ao sector das indústrias extractivas, se destinarem a fazer face aos encargos com a recuperação paisagística e ambiental dos locais afectos à exploração, após a cessação desta, nos termos da legislação aplicável (…)”.

A recorrente alega que todas as despesas e encargos em causa no presente recurso foram lançados nas demonstrações financeiras do período a que respeitavam – o exercício de 2003 – em obediência ao princípio da especialização – art.18º do CIRC que dispõe que:
"Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica'';
Mais alega, que o Plano Oficial de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 410/89, de 21 de Novembro determinava no seu ponto 2.º., que a constituição de provisões "....deve respeitar apenas às situações a que esteiam associados riscos e em que não se trate apenas de uma simples estimativa de um passivo certo".

Apreciando.
As provisões são registos contabilísticos de verbas destinadas a fazer face a um encargo imputável ao exercício, mas de comprovação futura, ou já comprovado, mas de montante incerto.
«Como salienta SALDANHA SANCHES, «o âmbito de escolha das empresas para a decisão sobre a realização das provisões constitui uma das zonas mais densamente regulamentadas no Código do IRC. E bem se compreende que assim seja: a realização de provisões, orientada pelo princípio da prudência e conduzindo sempre a uma redução do lucro distribuível e do lucro tributável é o meio mais simples de obter um adiamento de tributação. E por isso facilmente se pode entender que estejamos numa zona onde a lei, em vez de confiar ao sujeito passivo do imposto uma ampla possibilidade de escolha quanto à realização das provisões, cabendo a este mediante o recurso aos são princípios da contabilidade – conceito impregnado de um conteúdo normativo que ainda hoje pode ser usado – preferiu delimitar cuidadosamente a sua decisão. […]
Contudo, como afirma Freitas Pereira, tem de haver regras claras quanto ao momento de constituição de provisões para que estas não sejam feitas apenas para maximizar as economias fiscais. […]
De igual modo, MARIA DOS PRAZERES LOUSA, salienta que «a constituição das provisões para riscos e encargos é consequência lógica e directa da aplicação dos princípios contabilísticos da «especialização dos exercícios» e da prudência, e por essa razão deve orientar-se segundo duas vertentes: - a 1.ª concretiza-se na necessidade de relevar contabilisticamente e imputar a cada exercício todos os factos ou acontecimentos susceptíveis de afectar no futuro o património e os resultados da empresa, papel atribuído na generalidade dos casos às provisões; - a 2.ª apela para a própria conceptualização do carácter previsional do risco e eventualidade dos encargos futuros e ainda para a determinação do factor gerador que implica a sua imputação a um dado exercício» (Alguns contributos para a revisão fiscal das provisões, Ciência e Técnica Fiscal nºs 331/333, pág. 119.).»(1)

Aqui chegados, importa apreciar, individualmente, os custos e encargos invocados pela recorrente.


a) Patrocínio concedido à Câmara Municipal de Oeiras
Alega a recorrente que este encargo fazia parte de um contrato de seguro celebrado pela impugnante com aquela entidade após concurso e era calculado pela aplicação de uma percentagem de 6,5% sobre o valor dos prémios de seguros pagos, dos quais 5% a suportar pela seguradora e os restantes 1,5% pelo mediador, sendo que os prémios de seguro a considerar para o efeito constavam de caderno de encargos anteriormente aprovado.
Mais alega que o custo com o patrocínio à Câmara Municipal de Oeiras, em 2003, era certo e conhecido à data do respectivo lançamento, pelo que outro tratamento não lhe poderia ser dado que não o directamente decorrente do art.º 18.º do CIRC, não sendo o mesmo afectado por qualquer imprevisibilidade ou indeterminação que por alguma forma justificasse o seu tratamento como provisão.
E que o facto de a impugnante ter vindo a suportar posteriormente os encargos de 1,5% dos prémios pagos que, prima facie, incumbiriam ao mediador, não induz um caracter de indeterminação/ imprevisibilidade a um custo que era certo à data da sua consideração pela impugnante, pelo que a adoptar um entendimento contrario o tribunal a quo violou a lei e designadamente o disposto no art.º 18.º do CIRC que impõe o tratamento, como custo do exercício, os 5% do patrocínio de 2003 devidos pela impugnante à Camara Municipal de Oeiras.

Não tem razão a recorrente.
Ao abrigo do contrato de seguro celebrado com a Câmara Municipal de Oeiras, a Impugnante assumiu encargos com patrocínio a esta autarquia, calculado à razão de 5% sobre o valor dos prémios de seguro pagos, sendo já certa tal obrigação quando o contrato foi celebrado.
Tendo a Impugnante inscrito em 2003 a verba, para solver os encargos que a vinculavam por força da execução do contrato nesse ano, acabou por, posteriormente, aceitar pagar não apenas os 5% que inicialmente lhe cabiam, mas também a parte do mediador, calculada em 1,5%.
Por isso, foi sobre o coeficiente de 6,5% que vieram a ser apurados e cobrados os encargos devidos pela Impugnante pelo patrocínio atinente a 2003, já no ano de 2005.
Assim sendo, fácil é concluir que no ano de 2003 a dívida com o patrocínio era já certa e conhecida da impugnante, mas não era o valor preciso que essa dívida assumiria, como supra explanámos.
Essa verba cai, pois, no conceito de provisão, tal como foi decidido na sentena recorrida onde se escreveu:
«Tendo a Impugnante inscrito em 2003 na conta 6910000000 a verba de 15.000,00€, para solver os encargos que a vinculavam por força da execução do contrato nesse ano, acabou por, ulteriormente, aceitar pagar não apenas os 5% que inicialmente lhe cabiam, mas também a parte do mediador, calculada em 1,5%.
Por isso, foi sobre o coeficiente de 6,5% que vieram a ser apurados e cobrados os encargos devidos pela Impugnante pelo patrocínio atinente a 2003, já no ano de 2005 (cfr. pontos 42 a 44 do probatório).
Neste conspecto, fácil é constatar que, ao longo do ano de 2003, a dívida com o patrocínio à Câmara Municipal de Oeiras, calculada a partir de uma percentagem sobre o valor dos prémios de seguro pagos, era já certa e conhecida da Impugnante. No entanto, não o era o valor preciso que essa dívida assumiria, o qual foi, inclusive, determinado com base num diferente coeficiente face ao que era inicialmente conhecido (6,5%, e não os 5% iniciais).
(…)
Esta justificação não é, evidentemente, extensível aos encargos com o patrocínio à Câmara Municipal de Oeiras, cuja verba acautelada na contabilidade de 2003 se destinava a fazer face a encargo imputável ao exercício, já certo nesse exercício, mas de montante indeterminado (e que só nos exercícios seguintes foi determinado e comprovado).
Essa verba adere, pois, ao conceito de provisão, tal como recortado supra. Irreleva, nesta qualificação, saber se a estimativa feita em 2003 do custo foi mais ou menos precisa e próxima do respetivo montante, empós apurado. E, inversamente ao que pretende a Impugnante, a caraterização do encargo registado como de desfecho incerto é inevitável, pois que não era possível prever o montante preciso do custo, ainda que a percentagem de cálculo – que depois foi alterada – estivesse acordada, desde logo porque só depois do termo do exercício em causa se podia saber os valores de prémios pagos pela Câmara Municipal de Oeiras.
Sendo para efeitos de IRC considerada um custo, a sua dedutibilidade ou não dedutibilidade releva no apuramento do lucro tributável. Nem todas as provisões, porém, serão consideradas como custos para efeitos do apuramento do lucro tributável.
(…)
Não pode, pois, a provisão a quo, ser considerada um custo fiscal por via da al. h) do n.º 1 do art. 23.º do CIRC. A consideração em sede de tributação dos custos inerentes aos encargos gerados com o patrocínio à Câmara Municipal de Oeiras apenas se poderia colocar nos exercícios subsequentes, designadamente quando fossem apresentados à Impugnante os documentos comprovativos da despesa, ignorando-se quais os lançamentos efetuados nesses exercícios pela Impugnante.
Concluindo, nenhuma censura pode ser apontada à liquidação adicional na parte em que se apoia na correção aqui em apreço, pelo que improcede nesta parte o pedido.»

b) Comissões à M...
Alega a recorrente que A M... era uma cliente da seguradora que promovia a celebração de contratos e cobrança de prémios de seguros e, em contrapartida, a impugnante comparticipava em 10% nos encargos do co-seguro, o que lhe permitia obter proveitos, nomeadamente prémios de seguro. Os aludidos prémios de seguro eram angariados e cobrados no próprio exercício, sendo por isso determinável de antemão o valor das cobranças e desde logo da co-relativa comparticipação nos encargos do co-seguro. Sendo o custo a suportar pela impugnante certo e conhecido à data do respectivo lançamento, pelo que outro tratamento não lhe poderia ser dado que não o directamente decorrente do art.º 18.º do CIRC, sendo irrelevante para a sua imputação como custo do exercício o facto do pagamento correspondente ocorrer durante ou após o termo do exercício.
Pelo que o tribunal a quo errou na apreciação da prova produzida ao afectar de um caracter de indeterminação/ imprevisibilidade um custo que era indiscutivelmente certo à data da sua consideração, em razão de, posteriormente, se apurar um erro/desvio de € 54,08 face ao valor contabilizado nas demonstrações financeiras.
Tem assim de se haver como violadora de norma expressa e designadamente do art.º18.º do CIRC, a desconsideração como custo dedutível à matéria colectável de 2003 do montante de € 12 000 suportado pela impugnante a título de comissões devidas M... o, eventualmente corrigido da diferença do erro posteriormente apurado.

Mais uma vez, não assiste razão à recorrente.
Também neste caso era possível conhecer o valor das várias cobranças por fazer no exercício em causa, mas não era possível saber o valor final que seria devido pela recorrente e comissões, cujo pagamento teria lugar no exercício seguinte, isto é, em 2004.
A recorrente alega que só se apurou posteriormente um erro/desvio de € 54,08 face ao valor contabilizado nas demonstrações financeiras.
O que está em causa não é o desvio ser grande ou pequeno, mas sim que não era possível à recorrente conhecer, nesse exercício, o montante exacto que lhe seria cobrado com esse encargo, pelo que a criação desta conta tem implícita uma nota de risco, o que determina o enquadramento desta verba como provisão, tal como foi decidido na sentena recorrida onde se escreveu:
«Ora, no âmbito do Protocolo celebrado com a M..., quanto ao ano de 2003, os custos provisionados e refletidos na contabilidade estão ligados aos proveitos que, em contrapartida dos encargos assumidos, a Impugnante logrou, nesse mesmo ano, obter.
Neste caso, muito embora a Impugnante soubesse que, pelas comissões a que se obrigou no ano de 2003, teria uma despesa, era também sabido que a sua efetivação sucederia tão-somente no exercício seguinte, e que o respetivo montante total era, à partida, incerto.
Dito isto, intervém aqui um dos traços identificadores de uma provisão, traduzida na incerteza da exata quantificação no exercício de 2003 - aquele em que a Impugnante teve conhecimento da despesa em que incorreria - do valor da despesa, que só no exercício seguinte viria a ser em rigor apurada e suportada.
Apesar da estreita diferença entre a verba reservada na contabilidade de 2003 para a futura despesa com comissões (12.000,00€) e o valor da despesa com que a Impugnante efetivamente arcou (11.945,92€), certo é que não lhe era possível conhecer nesse exercício o montante exato que lhe seria cobrado por esse encargo.
A criação desta conta tem, assim, implícita uma nota inconfundível de risco, que determina o enquadramento da verba em causa como uma provisão.»


c) Encargos de Auditoria
Alega a recorrente que a auditoria externa da impugnante era contratada pelo Grupo M......., sendo estimado determinado número de horas para cada empresa de auditoria, a que o Grupo dava o seu acordo e informava as várias empresas que a ele pertenciam acerca das horas contratadas. Em razão das horas extraordinárias e seu apuramento a posteriori, o custo estimado e o total pago por encargos de auditoria divergem. Da indeterminação de algumas horas extraordinárias, não é possível inferir - sob pena de erro na apreciação da matéria de facto - que os custos lançados pelo montante € 15 355,50 (que não incluíam as horas não apuradas) não eram certos e determináveis à data do lançamento. Não pode deixar assim, também aqui, de se haver como violadora de norma expressa e designadamente do art.º 18.º do CIRC, a desconsideração pelo Tribunal a quo como custo dedutível à matéria colectável de 2003 do montante de € 15 355,50 suportado pela impugnante a título de honorários de Auditoria/2003.

Mais uma vez, a recorrente não tem razão.
A recorrente registou contabilisticamente em 2003, uma verba estimada em 15.355,50€.
Uma vez que foram prestados serviços adicionais de auditoria (horas extraordinárias), só no início de Janeiro de 2004 foi possível à recorrente apurar os valores devidos às empresas de auditoria já com as horas extraordinárias, e cujo valor totalizava 16.217,32€ (conforme facturas emitidas em 2004).
Assim, o referido encargo só foi comprovado em 2004, pelo que estamos perante uma provisão.
Não se alcança a alegação de erro na apreciação da matéria de facto por se considerar que estes encargos não eram certos e determináveis.
Na apreciação dos mesmos teve-se em consideração o ponto nº 4, bem como os pontos nºs 30 a 34, todos do probatório.
Sendo que no processo tributário português vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas.
Pelo que se concorda com o decidido que se passa a transcrever:
«A fim de ocorrer aos custos com auditoria do ano de 2003, a Impugnante registou contabilisticamente nesse ano, para o efeito, uma verba no valor (estimado) de 15.355,50€ (cfr. ponto 4 do probatório).
Do acervo de factos provados (pontos 30 a 34), ressalta que o Grupo da Impugnante adquiriu serviços de auditoria externa, para um dado número de horas, e que no ano de 2003 foram prestados serviços adicionais (horas extraordinárias) de auditoria.
Ora, só no início de janeiro do exercício seguinte foi possível à Impugnante apurar os valores devidos às empresas de auditoria, incluindo por horas extraordinárias, em contrapartida dos serviços prestados em 2003, titulados em fatura de 17.2.2004 e em fatura de 22.3.2004, cujo valor totaliza 16.217,32€.
Consabidamente, nas contas de provisão são registadas as verbas destinadas a fazer face a encargo imputável ao exercício, mas de comprovação futura, ou já comprovado, mas de montante indeterminado.
No presente caso, o encargo, malgrado constituído ao longo do ano de 2003, só já em 2004 foi comprovado, pela emissão dos respetivos documentos de suporte (faturas de fevereiro e março desse ano), e se apurou em definitivo o quantum correspondente.
Ou seja, à data de termo do exercício de 2003, não era possível futurar se o encargo com auditoria externa seria titulado, nas faturas que depois seriam de facto emitidas pela auditora, nem o momento em que o seria, ou sequer os valores que seriam objeto de cobrança.
Como tal, em coerência com o que se expôs acerca das verbas já apreciadas, é inequívoco que estamos perante uma previsão, condizente com a concetualização que vem sendo feita pela nossa jurisprudência fiscal.»

d) "Profit Comission/2003"
e) "Over Comission/2003"

Alega a recorrente que as comissões pagas pela impugnante a titulo de Profit Comission e de Over Comission têm a natureza de prémios atribuídos aos agentes da impugnante e estão associados ao seu desempenho em determinado exercício nas diversas vertentes da sua actuação tais como as de cobranças, domiciliação bancária e prémio médio de cobrança de prémios, sendo que à data do encerramento das contas do exercício, não só o custo ou encargo é certo como o seu montante é determinável por que atribuído "em função de objectivos pré-definidos e acordados para o ano" resultando "o valor desses incentivos (...) da aplicação duma percentagem fixa sobre o valor das cobranças realizadas pelo agente...".
Pelo que para o efeito da aplicação do disposto no art.º 18.º do CIRC é absolutamente irrelevante a circunstância de tais comissões só serem processadas e pagos aos agentes no exercício seguinte, pelo que ao acolher um entendimento diferente o tribunal a quo violou a lei e designadamente o disposto no art.º 18.º do CIRC.

A recorrente não tem razão.
As verbas estimadas e registadas para este efeito pela recorrente no exercício de 2003 cifrou-se em 99.795,19€ para o Profit Comission 2003 e em 34.000,00€ para o Over Comission 2003 (cfr. ponto 4 do probatório), num total de 133.795,19€.
Já os valores efetivamente pagos no âmbito do Profit Comission 2003 foram de 112.086,91€ e no âmbito do Over Comission 2003, de 27.979,54€, cuja soma resulta em 140.066,45€ (cfr. ponto 25 do probatório).
Estamos, assim, perante previsões de um custo, eu só posteriormente ao termo do exercício de 2003 seria titulado, pelo que se desconhecia o valor concreto.
Pelo que constitui uma verdadeira provisão al como foi decidido pela sentença recorrida:
«O valor desses incentivos resultada da aplicação duma percentagem fixa sobre o valor das cobranças realizadas pelo agente, sendo que somente após o termo do exercício e o encerramento das contas é que a Impugnante determinava os valores devidos e procedia ao seu pagamento (cfr. pontos 23 e 24 do probatório).
As verbas estimadas e registadas para este efeito pela Impugnante no exercício de 2003 cifrou-se em 99.795,19€ para o Profit Comission 2003 e em 34.000,00€ para o Over Comission 2003 (cfr. ponto 4 do probatório), num total de 133.795,19€.
Já os valores efetivamente pagos no âmbito do Profit Comission 2003 foram de 112.086,91€ e no âmbito do Over Comission 2003, de 27.979,54€, cuja soma resulta em 140.066,45€ (cfr. ponto 25 do probatório).
Abstrai-se dos factos provados que as verbas consideradas na contabilidade da Impugnante para os encargos com incentivos dos dois programas referidos são previsões de um custo, que só seria titulado ulteriormente ao termo do exercício de 2003 e em relação ao qual se ignorava então o concreto montante que importaria.
Constitui uma verdadeira provisão a verba contabilizada em certo exercício para fazer face ao pagamento de dívidas no exercício imediato, quer seja incerta a sua constituição, quer seja de constituição certa, mas desconhecido o valor que, a final, terá de ser despendido.»

f) Incentivos ao pessoal
Alega a recorrente que atribuiu ao seu pessoal prémios/incentivos por objectivos atingidos no ano de 2003 e de acordo com uma matriz pré-determinada, idêntica à do ano anterior. A circunstância de apenas ser processável no ano subsequente àquele a que se refere em nada afecta tal custo como custo certo incorrido no exercício. O custo de mão-de-obra era determinável à data do fecho das suas contas uma vez que tinha por base uma matriz de imputação, constante ao longo dos anos. O desvio que se verificou para o valor estimado, até por se situar em cerca de 5% do valor total dos incentivos, confirma não só a validade e a consistência da estimativa como afasta qualquer elemento de risco associado à projecção do valor do custo imputável ao exercício. Os valores considerados pela impugnante a título de incentivos ao pessoal pelo montante de € € 447 368,63 constituem custos certos, incorridos no exercício, não havendo fundamento legal para o seu enquadramento como provisões, tanto mais que, a anulação da divergência apurada, veio a concorrer, em 2004, para a formação da matéria colectável da impugnante, com o que a desconsideração, como provisão do custo incorrido em 2003, redundaria numa duplicação de tributação do mesmo rendimento que a lei não consente; ao acolher um entendimento diferente o tribunal a quo violou lei expressa e designadamente o disposto no art.º 18.º do CIRC

Mais uma vez a recorrente não tem razão.
No ano de 2003, o valor que foi inscrito relativamente à verba destinada a cobrir os incentivos devidos pela recorrente aos seus trabalhadores, fixa-se nos 450.000,00€ (cfr. pontos 4 e 17 do probatório).
No entanto, foram pagos nos primeiros meses do ano de 2004, prémios de incentivos ao pessoal respeitantes ao desempenho observado no ano anterior, cujo valor variava de acordo com o nível de preenchimento de objetivos pré-estipulados (cfr. ponto 13 do probatório).
Assim, como é bom de ver, não era possível conhecer os valores devidos pela recorrente a título de incentivos no fecho de contas de 2003 pois, ainda, não se encontrava concluído o processo produtivo e não havia dados finais sobre a performance dos trabalhadores –, pelo que, como a própria recorrente reconhece, restava-lhe fazer uma estimativa de custos, baseada no nível de cumprimento dos objetivos do setor a que estavam afetos os trabalhadores em anos anteriores e no desempenho registado ao longo dos meses entretanto decorridos e em que havia informação recolhida (cfr. pontos 14 e 15 do probatório).
Assim, embora fosse certo que a recorrente iria incorrer em despesa com os incentivos por conta do desempenho do seu pessoal, era desconhecido à data do encerramento do exercício o valor exacto, apenas havendo condições para fazer uma estimativa com base em dados provisórios ou recolhidos em outros exercícios.
Tanto assim é, que se veio a verificar uma divergência entre as importâncias pagas em 2004 e as importâncias estimadas em 2003, nesta rubrica, cujo excesso foi de 41.498,18€.
Havendo incerteza quanto ao montante da dívida, justifica-se o enquadramento da conta onde tais verbas foram inscritas como de provisão, tal como foi decidido na sentença recorrida:
«Relativamente à verba destinada a cobrir os incentivos devidos pela Impugnante aos seus trabalhadores, no ano de 2003, o valor inscrito na respetiva contabilidade fixa-se nos 450.000,00€ (cfr. pontos 4 e 17 do probatório).
Encontra-se provado que foram pagos pela Impugnante, nos primeiros meses do ano de 2004, prémios de incentivos ao pessoal respeitantes ao desempenho observado no ano anterior, cujo valor variava de acordo com o nível de preenchimento de objetivos pré-estipulados (cfr. ponto 13 do probatório).
Verifica-se que não era possível, de antemão, conhecer os valores devidos pela Impugnante a título de incentivos – aquando do fecho de contas de 2003 ainda não se achava concluído o processo produtivo e não havia dados finais sobre a performance dos trabalhadores –, pelo que restava-lhe fazer uma estimativa de custos, baseada no nível de cumprimento dos objetivos do setor a que estavam afetos os trabalhadores em anos anteriores e no desempenho registado ao longo dos meses entretanto decorridos e em que havia informação recolhida (cfr. pontos 14 e 15 do probatório).
Na medida em que a estimativa dos valores dos incentivos era feita antes de determinado todo o desempenho dos trabalhadores no ano em referência (2003), podia haver desfasamentos entre o valor previsto e o valor depois apurado, como efetivamente viria a acontecer, tendo sido pago um total de 408.501,82€ (cfr. pontos 16 e 17 do probatório).
Travejado o suporte factual para a apreciação da questão a dirimir, logo se alcança que, na contabilidade de 2003 da Impugnante, foi refletida uma verba com vista a precaver o pagamento futuro de incentivos aos trabalhadores da Impugnante. E, embora fosse certo que a Impugnante iria incorrer em despesa com os incentivos por conta do desempenho do seu pessoal, era desconhecido à data do encerramento do exercício o valor exato desse estipêndio, apenas havendo condições para fazer uma estimativa com base em dados provisórios ou recolhidos em outros exercícios.
Tanto assim é, que se veio a verificar uma divergência entre as importâncias pagas em 2004 e as importâncias estimadas em 2003, nesta rubrica, cujo excesso foi de 41.498,18€.
Bem se percebe, portanto, que se trata de quantias reservadas segundo um princípio de prudência, acautelando um encargo que apenas seria assumido e quantificado no decurso do exercício de 2004, e cujo valor ainda não podia ser determinado com precisão.
Estas verbas que previdentemente a Impugnante reservou integram um vetor de risco, não sendo possível antever o valor que acabará por ser pago a título de incentivos do ano de 2003, neste ano. Logo, existe uma incerteza quanto ao montante da dívida, o que justifica o enquadramento da conta onde tais verbas foram inscritas como de provisão.
Deste modo, avaliadas num contexto de risco sobre o valor preciso dos encargos, as verbas em causa têm de ser absorvidas no conceito de provisão, para todos os efeitos.»

Vem, agora, a recorrente, em sede de recurso, alegar que a desconsideração, como provisão do custo incorrido em 2003, redundaria numa duplicação de tributação do mesmo rendimento que a lei não consente.
Ora, tal alegação é nova e como tal não foi apreciada na sentença recorrida.
«Os conceitos de legais de duplicação de coleta e de dupla tributação não se confundem.»(2)
Uma vez que não estamos perante matéria de conhecimento oficioso - o que só aconteceria se tivesse sido alegada a duplicação de colecta, nos termos do art. 205º, nº 1 do CPPT – também não iremos apreciar o, agora, alegado, pois constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Termos em que improcede na totalidade o presente recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

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III. DECISÃO

Face ao exposto, acordam em conferência os juízes da 1º Subsecção da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe e notifique.
Lisboa, 16 de Fevereiro de 2023

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(Lurdes Toscano)

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(Maria Cardoso)

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(Hélia Gameiro Silva)


(1)Acórdão do STA de 04/09/2013, Proc. 0164/12, disponível em www.dgsi.pt
(2)Acórdão do TCAS de 15/12/2021, Proc. 810/20.2BELRA, disponível em www.dgsi.pt