Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:10346/13
Secção:CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:04/21/2016
Relator:CONCEIÇÃO SILVESTRE
Descritores:INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO
Sumário:I - O incidente de liquidação destina-se a uma mera quantificação dos danos já apurados na acção anteriormente intentada, não podendo o autor peticionar o pagamento de quantia destinada a indemnizar outros danos; ou seja, o âmbito e o objecto do incidente de liquidação mostra-se balizado pelos termos da decisão liquidanda.

II - Apurando-se, na sequência da dedução de incidente de liquidação, que o valor indicado na acção não corresponde à utilidade económica do pedido, deve proceder-se à sua correcção
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL:


RELATÓRIO

1. A SOCIEDADE ……………………, SA e a SOCIEDADE AGRÍCOLA ……………….., SA instauraram no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa acção ordinária contra o ESTADO PORTUGUÊS (EP), o INSTITUTO DAS ESTRADAS DE PORTUGAL (IEP), o INSTITUTO PARA A CONSTRUÇÃO RODOVIÁRIA (ICOR) e o INSTITUTO PARA A CONSERVAÇÃO E EXPLORAÇÃO DA REDE RODOVIÁRIA (ICERR), pedindo a condenação dos mesmos a pagarem-lhes: a) “a quantia correspondente aos danos provocados nos terrenos em causa e nos prédios em que se integram, nomeadamente os lucros cessantes da sua exploração agrícola, pelo período que já decorreu e enquanto se mantiver a sua ocupação, a liquidar em execução de sentença”, b) “todas as despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários que [as autoras] despenderam a despenderão, a liquidar em execução de sentença”, c) “a quantia correspondente ao valor das parcelas de terreno propriedade da Sociedade Agrícola …..............., SA, acrescida dos juros legais que se venceriam sobre esse montante, desde a data da declaração de utilidade pública da expropriação ou, pelo menos, desde a tomada de posse pelos RR até efectivo pagamento e a liquidar em execução de sentença”, d) “as quantias correspondentes aos juros que se venceriam sobre o produto da venda dos imóveis em causa, desde a tomada de posse pelos RR ou, pelo menos, desde a data da declaração de utilidade em execução de sentença”, e) “os juros legais relativos às quantias peticionadas nas alíneas anteriores, acrescidas, a partir do trânsito em julgado da sentença de condenação que vier a ser proferida, de juros à taxa anual de 5%, nos termos do disposto no art. 829º-A/4 do Código Civil”.

Alegaram, para tanto e em síntese, que (cfr. fls. 2/13 dos autos):
- A 1.ª autora é proprietária do prédio denominado “Herdade do ………..”;
- A 2.ª autora é proprietária dos prédios denominados “Herdade da Aldeia …………….”, “Herdade …………..” e “Herdade ……………”;
- As autoras desenvolveram diversas explorações agrícolas nos referidos prédios, nomeadamente a cultura do olival e o montado, até inícios de 1994;
- Nessa altura, os mesmos foram parcialmente ocupados por empreiteiros e trabalhadores por conta da Junta Autónoma das Estradas - que foi extinta pelo Decreto-lei n.º 237/99, de 25/06, tendo-lhe sucedido o Instituto das Estradas de Portugal, o Instituto para a Conservação Rodoviária e o Instituto para a Construção e Exploração da Rede Rodoviária -, os quais deram início a operações de terraplanagem, aterros, destruição de árvores e culturas, escavações e outros trabalhos;
- No dia 21/11/1995 foi publicada no Diário da República, II Série (Suplemento), a declaração de utilidade pública da expropriação de diversos prédios destinados à construção do lanço da EN 18 - Rectificação e alargamento entre a EN 256 e ............, designadamente:
15.213 m² do prédio denominado “Herdade do ……………..”;
52.120 m² do prédio denominado “Herdade da Aldeia …………….”;
57.106 m² do prédio denominado “Herdade dos …………..”;
21.318 m² do prédio denominado “Herdade da ……………”;
- Além dessas áreas, a JAE ocupou cerca de 30.000 m² dos prédios das autoras sem que essa área tenha sido abrangida pela declaração de utilidade pública de expropriação e sem que as mesmas tenham sido notificadas da ocupação;
- A declaração de utilidade pública caducou em 21/11/1996;
- Os réus ocuparam os terrenos da 2.ª autora até à data da instauração da presente acção e o terreno da 1.ª autora até 6/05/1998, sem qualquer título que os legitime;
- As obras levadas a cabo pelos réus destruíram totalmente as árvores e culturas existentes e degradaram irremediavelmente o solo, inviabilizando totalmente a exploração agrícola;
- As autoras têm direito a ser indemnizadas pelos prejuízos sofridos, concretamente, pela ocupação ilegal dos prédios em causa, pela privação dos rendimentos que teriam obtido se não se tivesse verificado a lesão do seu direito de propriedade, pelas despesas judicias e extrajudiciais e honorários de advogados que despenderam na defesa dos seus direitos.

Regularmente citados, todos os réus apresentaram contestação.

Por despacho de fls. 295/296 foram as autoras convidadas “a reformular os pedidos que deduziram por forma a que seja eliminada a contradição” que se considerou verificar entre os pedidos formulados sob as alíneas a), c) e d).

Em cumprimento desse despacho, as autoras reformularam os pedidos de condenação dos réus nos seguintes termos (cfr. fls. 307/309 dos autos):
“a) A pagar às AA a quantia correspondente ao valor das parcelas de terreno propriedade da Sociedade Agrícola …………………….., SA, acrescida dos juros legais que se venceriam sobre esse montante, desde a data da declaração de utilidade pública de expropriação ou, pelo menos, desde a tomada de posse pelo RR até efectivo pagamento e a liquidar em execução de sentença; b) A pagar às AA a quantia correspondente aos juros que se venceriam sobre o produto da venda dos imóveis em causa, desde a tomada de posse pelos RR ou, pelo menos, desde a data da declaração de utilidade pública em execução de sentença; ou, subsidiariamente; c) A pagar às AA a quantia correspondente aos danos provocados nos terrenos em causa e nos prédios em que se integram, nomeadamente os lucros cessantes da sua exploração agrícola, pelo período que já decorreu e enquanto se mantiver a sua ocupação, a liquidar em execução de sentença; d) Em qualquer dos casos, os RR deverão ainda ser condenados a pagar às AA todas as despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários que estas despenderam e despenderão, a liquidar em execução de sentença; bem como e) A pagar às AA os juros legais relativos às quantias peticionadas nas alíneas anteriores, acrescidas, a partir do trânsito em julgado da sentença de condenação que vier a ser proferida, de juros à taxa anual de 5%, nos termos do disposto no art. 829º-A/4 do Código Civil”.

Por despacho de fls. 325, foi considerado ter sido “transmitida para a EP a posição processual, com a totalidade dos inerentes direitos e deveres, que os primitivos réus detinham nos autos”.
Foi proferido despacho saneador-sentença que, além do mais:
(i) Considerou “o R. Estado Português parte ilegítima, absolvendo-o da instância”;
(ii) Julgou “parcialmente improcedente a presente acção e em consequência absolv[eu] a R. EP - Estradas de Portugal, EPE: a) do pedido das AA de condenação no pagamento de qualquer indemnização devida pela ocupação da parcela n.º 70; b) do pedido de condenação em indemnização pelos danos causados no prédio onde esta se integrava, em consequência da declaração de utilidade pública; c) do pedido de condenação em indemnização pelos danos causados pela ocupação de uma parcela de terreno não incluída na declaração de utilidade pública, verificados até 27.01.1998; d) do pedido de condenação às AA de todas as despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários”;

As autoras interpuseram recurso jurisdicional para o STA do despacho saneador-sentença, “na parte em que considerou o réu Estado Português parte ilegítima, julgou procedentes as excepções de prescrição e caso julgado e julgou improcedente o pedido de condenação dos RR no pagamento de despesas judiciais, extra-judiciais e honorários” (cfr. fls. 355, 377/401 dos autos).

Realizada a audiência de julgamento, foi proferido acórdão sobre a matéria de facto e posteriormente sentença que julgou “a acção parcialmente procedente e, em consequência: a) condeno[u] a ré a pagar à respectiva A. proprietária o valor das parcelas referidas supra em II.1.e), por referência a 21.11.1995, actualizado pelo valor mais baixo que vier a ser apurado, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor ou em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais, em ambos os casos desde a mesma data e até integral pagamento; b) condeno[u] a ré a pagar às AA. o valor da área de terreno referida supra em II.1.i), por referência a 21.11.1995, actualizado pelo valor mais baixo que vier a ser apurado, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor ou em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais, em ambos os casos desde a mesma data e até integral pagamento”.

Inconformadas com a sentença, as autoras interpuseram recurso jurisdicional para o STA na parte em que ficaram vencidas (cfr. fls. 736 dos autos), o qual foi julgado deserto por falta de apresentação de alegações (cfr. fls. 745 dos autos).

Por acórdão de 4/03/2009, o STA (i) concedeu “parcial provimento ao recurso jurisdicional do despacho saneador e, em consequência, revog[ou] aquele despacho, na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação das AA. formulado sob a alínea d) do petitório” e (ii) condenou “a ré EP no pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado pagas pelas AA. após a propositura da presente acção e tendo em conta a sua procedência parcial, a liquidar em execução de sentença” (cfr. fls. 775/803 dos autos).

2. As autoras deduziram incidente de liquidação contra a EP - Estradas de Portugal, SA, peticionando:
“b) [que seja decidido], “de acordo com a sentença de 2008.02.08 deste douto Tribunal e com o acórdão do Venerando Supremo Tribunal Administrativo de 2009.03.04:
i) Fixar em € 803.306,04 o valor das parcelas 112, 114 e 115 da 1.ª requerente, referidas na alínea e) dos FA, actualizado até efectivo pagamento em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor;
ii) Fixar em € 209.025,64 o valor do terreno ocupado das ora requerentes, com 30.000 m², referido na alínea i) dos FA, actualizado até efectivo pagamento, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor;
iii) Fixar em € 127.056,93 o valor das despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários efectuadas desde a propositura da acção até ao presente, às quais acrescerão as que se revelarem necessárias até ao termino do presente processo.
c) As quantias que vierem a ser liquidadas em i) e ii) deverão ser devidamente actualizadas até integral e efectivo pagamento, de acordo com o decidido na douta sentença de 2008.02.08, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor”.

Alegaram, para tanto e em síntese, que (cfr. fls. 884/902 dos autos):
- O valor das parcelas ocupadas pela requerida deve ser calculado tendo em conta os seguintes factores: valor do terreno tomando em consideração o seu “rendimento efectivo”, valor da depreciação da parte não expropriada e encargos/prejuízos resultantes da expropriação e valor do prejuízo da interrupção da actividade das requerentes;
- Em 1994 o valor do terreno das parcelas 112, 114 e 115, tendo em conta o seu rendimento efectivo era de € 219.370,37;
- Em 1994 o valor do terreno com 30.000 m² ocupado pela requerida tendo em conta o seu rendimento efectivo era de € 56.260,20;
- Relativamente às parcelas 112, 114 e 115, a depreciação das partes não ocupadas e outros prejuízos nela causados, ascende a € 109.685,18;
- Relativamente aos 30.000 m² do terreno ocupado, a depreciação das partes não ocupadas e outros prejuízos nela causados, ascende a € 28.130,10;
- No ano de 2009 os prejuízos pela interrupção da actividade das requerentes nas parcelas 112, 114 e 115 ascendem a € 185.463,41;
- No ano de 2009 os prejuízos pela interrupção da actividade das requerentes nos 30.000 m² do terreno ocupado ascendem a € 49.491,00;
- O valor total devido pela ocupação, em 1994, das parcelas 112, 114 e 115 é de € 514.518,96;
- O valor total devido pela ocupação, em 1994, do terreno de 30.000 m² é de € 133.881,30;
- O valor total devido pela ocupação das parcelas 112, 114 e 115 actualizado em função da aplicação do índice de preços no consumidor, até Outubro de 2009, ascende a € 803.306,04;
- O valor total devido pela ocupação do terreno com 30.000 m² actualizado em função da aplicação do índice de preços no consumidor, até Outubro de 2009, ascende a € 209.025,64;
- O valor total devido pela ocupação das parcelas 112, 114 e 115 actualizado em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais, até Outubro de 2009, ascende a € 1.519.839,39;
- O valor total devido pela ocupação do terreno com 30.000 m² actualizado em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais, até Outubro de 2009, ascende a € 395.472,45;
- Após a propositura da presente acção as requerentes efectuaram despesas judiciais, extrajudiciais e pagamentos de honorários ao mandatário, nos montante de, respectivamente, € 466,87, € 48,60 e € 126.541,46.

A EP deduziu oposição pugnando (i) pelo indeferimento liminar do incidente de liquidação na parte em que vêm reclamados os lucros cessantes (cfr. artigos 48º a 72º do requerimento inicial) e (ii) pela improcedência dos demais pedidos.

Foi proferido despacho saneador que (cfr. fls. 1066/1082 dos autos):
- Fixou o valor da causa em € 1.169.388,62;
- Julgou “procedente a excepção de nulidade do processo no que respeita ao pedido de condenação da ré no pagamento às autoras das despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários que se revelarem necessárias com o presente incidente de liquidação e, em consequência, absolve[u]-se a ré da instância quanto a este pedido”;
- Julgou “procedente a excepção de falta de título judicial na parte referente ao pedido de condenação da ré no pagamento de indemnização pelos prejuízos relativos à interrupção da actividade (artigos 48º a 72º da petição inicial) e, em consequência, absolve[u]-se a ré da instância quanto a este pedido”.

Inconformadas, as autoras interpuseram recurso jurisdicional do despacho saneador, culminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões (cfr. fls. 1091 e 1135/1157 dos autos):
“1.ª - O douto despacho recorrido violou o disposto no art. 119º da CRP, nos arts. 305º, 306º, 316º e 378º/2 do CPC e nos arts. 5º e 7º da Lei 15/2002 de 22 de Fevereiro, pois:
a) O presente incidente de liquidação renovou a instância da acção declarativa principal em que se integra (v. art. 378º/2 do CPC; cfr. despacho de fls. 930 dos autos), e não tem utilidade económica própria (v. art. 305º/1 do CPC), pelo que, face ao princípio da “imutabilidade do valor da causa” (v. Alberto dos Reis, Comentário ao CPC, III/649), deverá ser mantido o valor do presente processo (v. arts. 313º/1 e 316º/1 do CPC, aplicáveis ex vi do art. 1º da LPTA);
b) O pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e de retribuições de honorários que as AA terão de despender com o presente incidente não eram determináveis à data da respectiva propositura, “não tendo influência na fixação do valor da causa” (v. Ac. STJ de 2009.01.14, Proc. 0852469, in www.dgsi.pt);
c) Os arts. 31º, 32º e 34º do CPTA, invocados no douto despacho recorrido, nunca seriam aplicáveis ao presente processo declarativo iniciado em 2001, ex vi do disposto nos arts. 5º e 7º da Lei 15/2002, de 22 de Fevereiro (v. arts. 12º e 13º do C. Civil), como se reconheceu no douto despacho do Tribunal a quo de 2011.03.07, que admitiu o presente recurso, ao abrigo do disposto no art. 102º da LPTA - cfr. texto n.ºs 1 a 6.
2.ª - As decisões judiciais liquidandas, nomeadamente a douta sentença do Tribunal a quo de 2008.02.08 e o douto Ac. STA de 2009.03.04, transitaram em julgado (v. arts. 677º do CPC) e assumem força vinculativa no presente processo, não podendo deixar de ser respeitadas, reeditando-se agora a discussão dos respectivos pressupostos e de questões já decididas (v. arts. 671º e segs. do CPC) - cfr. texto n.º 7.
3.ª - No douto despacho recorrido, desconsiderando-se o decidido nos referidos arestos, decidiu-se absolver o recorrido EP relativamente ao pedido de pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e de retribuições de honorários que as ora recorrentes terão que suportar com o presente incidente por, alegadamente, o referido direito não se encontrar reconhecido judicialmente no presente processo e absolver igualmente o recorrido da instância quanto ao pedido de pagamento de indemnização pelos prejuízos relativos à interrupção da actividade das ora recorrentes, por alegada falta de título judicial (v. fls. 1071 a 1081 dos autos) - cfr. texto n.º 7.
4.ª - O despacho recorrido enferma de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente o caso julgado das decisões judiciais liquidandas (v. art. 205º/2 da CRP e arts. 671º e segs. do CPC; cfr. art. 1º da LPTA) - cfr. texto n.ºs 7 e 8.”

A ré contra-alegou, formulando as seguintes conclusões (cfr. fls. 1168/1175 dos autos):
“1. O douto Acórdão do STA de 2009.03.04, não consagrou ou reconheceu o direito ao pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e honorários que as exequentes tiveram que efectuar com o presente incidente de liquidação.
2. O objecto desse acórdão não integra nem nunca poderia integrar tal pedido uma vez que é anterior ao referido incidente.
3. Essa excepção só poderia levar à absolvição da instância não havendo assim desrespeito pelo caso julgado do Acórdão do STA de 2009.03.04.
4. Também a decisão que absolveu a executada relativamente ao pedido deduzido em sede de liquidação nos artigos 48º a 72º da PI não violou o caso julgado, uma vez que decidiu conforme a sentença declarativa.
5. A decisão que aceitasse esse pedido seria ela sim violadora do caso julgado material.
6. Andou assim bem o douto tribunal nas decisões objecto do presente recurso.
7. Razões pelas quais devem ser mantidas.
8. Negando-se provimento ao recurso das recorrentes.”

Foi proferido despacho que fixou os “Factos assentes” e a “Base instrutória” (cfr. fls. 1092/1104 dos autos).

Realizada a instrução da causa, foi proferido despacho sobre a matéria de facto (cfr. fls. 1682/1711 dos autos).

Em 14/03/2013 foi proferida sentença que julgou o incidente de liquidação parcialmente procedente e, em consequência, (i) condenou a ré a pagar “a) à autora F……….. o montante de € 277.173,26 - correspondente ao valor das parcelas 112, 114 e 115, em 31.12.2012 - actualizado em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor, desde 31.12.2012 e até integral pagamento; b) às autoras o montante de € 68.599,89 - correspondente ao valor dos 30.000 m², em 31.12.2012 - actualizado em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor, desde 31.12.2012 e até integral pagamento; c) às autoras a quantia de € 343,65, a título de despesas judiciais e extrajudiciais pagas pelas mesmas” e (ii) absolveu a ré dos demais pedidos.

Inconformadas, as autoras e a ré interpuseram recurso jurisdicional da sentença do TAC de Lisboa de 14/03/2013 (cfr. fls. 1827 e 1831).

As alegações do recurso apresentado pelas autoras terminam com as seguintes conclusões (cfr. fls. 1865/1905 dos autos):
“A - DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
1.ª No n.º 9 dos FP considerou-se provado que “na parcela 115 existiam, em 1994, pelo menos cerca de 139 oliveiras” - cfr. texto n.ºs 1 e 2.
2.ª O n.º 9 dos FP deverá ser alterado, face aos documentos de fls. 162, 1281 e 1283 dos autos e ao constante dos relatórios periciais, a fls. 1238 e 1325, passando a ter a seguinte redacção:
- “Na parcela 115 existiam, em 1994, pelo menos cerca de 154 oliveiras” - cfr. texto n.º 2.
3.ª No n.º 11 dos FP deu-se como assente que “tendo em conta a factualidade dada como assente na sentença descrita em 2), bem como em 7), 8), 9) e 10), em 1994 o valor do terreno das parcelas 112, 114 e 115 era de € 179.491,47” - cfr. texto n.º 3.
4.ª Face à redução em 45% do valor do terreno, pela aplicação de factor K2, em violação frontal das decisões judiciais liquidandas e ao teor contraditório da determinação do valor da área de olival da parcela 115, à qual, apesar de se reconhecer no n.º 9 dos FP, a existência de “pelo menos cerca de 139 oliveiras” - que são, pelo menos, 154 -, foi atribuído um valor “para uma parcela em que não estivessem plantad(a)s quaisquer” árvores (v. fls. 20 e 21 do despacho de 2012.07.05), o n.º 11 dos FP deverá passar a ter a seguinte redacção:
- “Tendo em conta a factualidade dada como assente na sentença descrita em 2), bem como em 7), 8), 9) e 10), em 1994 o valor do terreno das parcelas 112, 114 e 115 era de, pelo menos, € 219.370,37” - cfr. texto n.º 3.
5.ª No n.º 13 dos FP considerou-se provado que “tendo em conta a factualidade dada como assente na sentença descrita em 2), bem como em 12), em 1994 o valor do terreno com 30.000 m² ocupado e referido na alínea i) dos factos assentes dessa sentença, era de € 44.423,82” - cfr. texto n.º 4.
6.ª O n.º 13 dos FP deverá ser alterado, tendo em conta as alterações ao n.º 11 dos FP, de cujo valor o Tribunal a quo fez depender a avaliação dos 30.000 m², passando a ter a seguinte redacção:
- “Tendo em conta a factualidade dada como assente na sentença descrita em 2), bem como em 12), em 1994 o valor do terreno com 30.000 m² ocupado e referido na alínea i) dos factos assentes dessa sentença, era de € 56.260,20” - cfr. texto n.º 4.
7.ª Face aos documentos juntos pelas ora recorrentes, nas audiências de julgamento de 2012.02.29 e de 2012.03.12 (v. fls. 1391, 1392 e 1404 a 1413 dos autos), e ao decidido no douto acórdão liquidando do STA de 2009.03.04, deverá ser considerado provado o quesito 12º da BI, com a seguinte redacção:
- “Após a propositura da acção a que se referem as decisões descritas em A) a C), as ora autoras efectuaram pagamentos de honorários ao respectivo mandatário no montante de € 126.541,46, relativas ao trabalho desenvolvido nessa acção até ao trânsito do acórdão do STA referido em C)” - cfr. texto n.ºs 5 e 6.
B - DA VIOLAÇÃO DO CASO JULGADO
8.ª O incidente de liquidação destina-se a fixar concretamente as quantias devidas pela parte vencida, já determinadas qualitativa e juridicamente nas decisões liquidandas e transitadas em julgado (v. arts. 378º a 380º-A e 471º do CPC; cfr. art. 1º da LPTA e art. 5º/1 da Lei 15/2002 de 22 de Fevereiro) - cfr. texto n.º 7.
9.ª Na fixação dos valores em causa no presente incidente tem assim de respeitar-se o caso julgado das decisões judiciais liquidandas, in casu, do douto Acórdão do Venerando Supremo Tribunal Administrativo de 2009.03.04 e da sentença deste douto Tribunal de 2008.02.08 (v. fls. 717 a 728 e 775 a 803 dos autos) - cfr. texto n.º 7.
10.ª A referida sentença, de 2008.02.08, condenou a EP a pagar às AA o valor das parcelas em causa “por referência a 21.11.1995, actualizado pelo valor mais baixo que vier a ser apurado, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor ou em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais, em ambos os casos desde a mesma data e até integral pagamento” (v. fls. 728 dos autos) - cfr. texto n.ºs 7 e 8.
11.ª No acórdão liquidando do Venerando Supremo Tribunal Administrativo de 2009.03.04, decidiu-se “condenar a Ré EP no pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado pagas pelas AA, após a propositura da presente acção (…) a liquidar em execução de sentença” (v. fls. 783 dos autos) - cfr. texto n.ºs 7 a 9.
12.ª As referidas decisões judiciais transitaram em julgado (v. arts. 677º do CPC) e assumem força vinculativa no presente processo, não podendo reeditar-se agora a discussão dos respectivos pressupostos e de questões já decididas (v. arts. 671º e segs. do CPC) - cfr. texto n.ºs 7 a 9.
13.ª Na douta sentença recorrida alteraram-se os critérios de fixação da indemnização a atribuir às ora recorrentes, que foram definitivamente fixados nos doutos arestos liquidandos, nomeadamente os respectivos pressupostos factuais constantes das alíneas o), p), q), r) e s) do n.º 2 dos FP, reduzindo-se significativamente o valor a pagar pela ora recorrida - cfr. texto n.º 8.
14.ª A douta sentença recorrida enferma assim de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente o caso julgado das decisões judiciais liquidandas (v. art. 205º/2 da CRP e arts. 671º e segs. do CPC; cfr. art. 1º da LPTA) - cfr. texto n.ºs 7 a 10.
C - DOS ERROS DE JULGAMENTO
15.ª Contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, o valor das parcelas 112, 114 e 115 e dos 30.000 m² de terreno ocupado pela EP, determinado, de acordo com o critério do rendimento possível, nos termos do art. 26º do CE 91, e com a prova produzida no presente processo, ascende, respectivamente, a € 219.370,37 e a € 56.260,20- cfr. texto n.ºs 11 a 17.
16.ª “O valor mais baixo apurado, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor ou em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais” é o que resulta da aplicação da variação do índice de preços no consumidor, pelo que o valor do terreno ocupado pela EP, actualizado de acordo com o decidido na douta sentença liquidanda de 2008.02.08, até 2013.12.31, ascende a € 408.507,55 - cfr-. texto n.º 18.
17.ª Contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, às quantias que vierem a ser definitivamente fixadas no presente incidente, deverão acrescer ainda juros de mora vincendos e sanção pecuniária compulsória, até integral pagamento (v. arts. 102º do C. Comercial e 806º do C. Civil) - cfr. texto n.ºs 19 e 20.
18.ª De acordo com a prova produzida no presente processo e, subsidiariamente, à aplicação de critérios ex aequo et bono, a indemnização devida pela EP às ora recorrentes, relativamente às “despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado pagas pelas AA após a propositura da presente acção” não pode ser fixada em valor inferior a € 100.515,47 (v. docs. de fls. 914 a 923, 1391, 1392 e 1404 a 1413 dos autos) - cfr. texto n.ºs 21 a 24.
19.ª Contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, o valor da indemnização devida às ora recorrentes nunca poderia ser inferior a € 509.023,02, correspondente à soma do valor do terreno ocupado, devidamente actualizado - € 408.507,55 -, e do montante das despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado pagas pelas ora recorrentes após a propositura da presente acção, em montante não inferior a € 100.515,47 - cfr. texto n.ºs 11 a 25.
20.ª A douta sentença recorrida enferma assim de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente, além do mais, o disposto nos arts. 20º, 62º e 205º/2 da CRP, arts. 378º a 380º-A, 471º, 566º/3 e 671º e segs. do CPC, no art. 1º da LPTA, no art. 26º do CE 91, no art. 102º do C. Comercial, nos arts. 806º e 829º-A do Cód. Civil.”

A ré apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões (cfr. fls. 1964/2000 dos autos):
“I - O número de oliveiras existente na parcela 115 e consequente alteração do valor dos terrenos ocupados pela R., aqui recorrida
1.º Quanto a esta matéria, vêm as AA., ora recorrentes, invocar que os factos n.ºs 2, 4 e 6 da Matéria de Facto devem ser alterados.
2.º Relativamente ao Facto 2, o Tribunal a quo entendeu resultar provado apenas que na parcela 115 existiam, em 1994, pelo menos 139 oliveiras.
3.º Ora, não se vislumbra que tal alteração faça qualquer sentido, atendendo antes de mais à própria fundamentação invocada pela Meritíssima Juiz a quo no seu douto despacho de resposta à matéria controvertida.
4.º Quanto ao alegado pelas recorrentes, não existe qualquer contradição entre o decidido na douta sentença recorrida e o que consta dos relatórios periciais.
5.º De facto, o que a Meritíssima Juiz a quo fez foi partir desses elementos e chegar à sua própria conclusão.
6.º O raciocínio efectuado pela Meritíssima Juiz a quo, na sua douta resposta à matéria controvertida, nomeadamente a fls. 5 e 6 desse despacho, não merece qualquer censura.
7.º Daí que, relativamente a esta questão não assiste qualquer razão às recorrentes.
8.º No que concerne ao Facto 4, o Tribunal a quo entendeu resultar provado apenas que, tendo em conta a factualidade dada como assente na sentença descrita em B), bem como em G) dos factos assentes e os factos 1, 2 e 3, em 1994, o valor do terreno das parcelas 112, 114 e 115 era de € 179.491,47.
9.º Quanto a este ponto também a R., aqui recorrida, discorda da decisão constante da douta sentença recorrida, mas em termos totalmente distintos dos expostos pelas recorrentes.
10.º Na verdade, o que não havia sido considerado no Relatório Colegial foi a idade dos sobreiros existentes nessas parcelas. Mas transparece no mesmo Relatório que, para apuramento da indemnização devida, os senhores peritos subscritores sempre consideraram a média de 80 sobreiros por hectare.
11.º Assim, ao contrário do alegado pelas recorrentes, não se está a fazer uma avaliação das parcelas como se lá não existissem quaisquer árvores plantadas, mas precisamente o inverso, ou seja, esse item foi considerado duas vezes nos cálculos finais a que chegou a Ilustre Meritíssima a quo, o que constitui erro notório na apreciação da prova e contradição na fundamentação da decisão, de acordo com o alegado pela recorrida.
12.º Também a resposta ao Facto 6, entendem as recorrentes que deve ser alterada.
13.º O Tribunal a quo entendeu resultar provado apenas que, tendo em conta a factualidade dada como assente na sentença descrita em B), bem como o facto 5, em 1994 o valor do terreno com 30.000 m² ocupado referido na alínea i) dos factos assentes dessa sentença era de € 44.423,82.
14.º Seguindo os mesmos parâmetros de avaliação, e conforme o supra alegado pela recorrida, o valor relativo à parcela de terreno de 30.000 m² seria de € 27.348,00 e não o que consta do despacho em causa (a págs. 22 e 23 da resposta à base instrutória).
15.º Salvo melhor opinião, o valor total a indemnizar seria então de € 140.351,91, relativamente às quatro parcelas e não o que consta na resposta aos factos 4 e 6 da Base Instrutória.
16.º Quanto a estes três factos (n.ºs 2, 4 e 6) constantes da matéria controvertida, alegam ainda as recorrentes que existe violação do caso julgado.
17.º A douta sentença recorrida assentou a sua decisão nos factos que dera como assentes, entre eles a sentença declarativa proferida em 08.02.2008.
18.º E, no que concerne aos dois aspectos agora apontados pelas recorrentes, nem as próprias perícias realizadas ignoraram tais factores na elaboração dos vários cenários nos seus relatórios, pelo que muito menos se poderá dizer que a Ilustre Meritíssima a quo o tenha feito, pelo que também aqui não assiste qualquer razão às recorrentes.
II - A actualização do referido valor
19.º No que concerne a esta questão, a sentença liquidanda, de 08.02.2008, tinha já decidido que o valor das parcelas 112, 114 e 115 e da área de 30.000 m² de terreno ocupado pela R., deveria ser “actualizado pelo valor mais baixo que vier a ser apurado, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor ou em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais, em ambos os casos desde a mesma data e até integral pagamento”.
20.º A douta sentença recorrida apurou que o valor mais baixo é o que resulta da aplicação da variação do índice de preços no consumidor, pelo que é esse o aplicável.
21.º Contudo, alegam igualmente as recorrentes que ao montante indemnizatório ora apurado, devem ainda acrescer juros de mora vincendos e sanção pecuniária compulsória até integral pagamento (artigo 102º do Código Comercial e artigo 806º do Código Civil).
22.º Estabelecida a indemnização em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor, nenhuma outra cabe às AA., nem mesmo pela mora no atraso no pagamento da indemnização, na medida em que esta deve ser actualizada nos termos referidos.
23.º No que concerne ao pedido de condenação da R., aqui recorrida, no pagamento de sanção pecuniária compulsória, traduzida em juros à taxa de 5% ao ano, desde a data do trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida, também este foi julgado totalmente improcedente pelo Tribunal a quo.
24.º Decisão perfilhada integralmente pela recorrida, uma vez que a disposição legal utilizada pelas AA., ora recorrentes, para fundamentarem tal pretensão não é aplicável no processo administrativo.
III - Montante de despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários de advogado, pagos pelas recorrentes com o presente incidente de liquidação
25.º As recorrentes vêm em sede de recurso, impugnar a matéria de facto considerada provada pela Meritíssima Juiz a quo, alegando, no que concerne a este tema, que deverá ser considerado provado o quesito 12º da Base Instrutória.
26.º De facto, tal quesito versa precisamente sobre o alegado pagamento de honorários efectuado pelas AA., aqui recorrentes, ao respectivo mandatário, relativas ao trabalho desenvolvido na acção declarativa, até ao trânsito do acórdão do STA referido na alínea C) dos factos assentes.
27.º Contudo, tal facto foi considerado como não provado pelo Ilustre Tribunal a quo, que considerou a prova produzida quanto a este facto insuficiente.
28.º De facto, também a recorrida entende que não se pode concluir que a documentação apresentada pelas AA., aqui recorrentes - de fls. 1391, 1392 e 1404 a 1413 - faça prova da matéria quesitada.
29.º Acresce que as AA., aqui recorrentes, nem trouxeram aos autos elementos de prova que, em 2006 - data do recibo de fls. 1392 dos autos - estavam integradas no “Grupo Amorim”.
30.º Ora, tais informações são manifestamente insuficientes e não são de todo discriminativas dos serviços prestados como se exige que o sejam as contas de honorários apresentadas por todos os profissionais do foro, incluindo as Sociedades de Advogados, ao abrigo dos respectivos Estatutos.
31.º Alegam igualmente as recorrentes existir violação do caso julgado, quanto à questão ora em apreço, uma vez que, na fixação dos valores em causa no presente incidente tem de se respeitar o caso julgado das decisões judiciais liquidandas, in casu do douto Acórdão do Venerando Supremo Tribunal Administrativo de 04.03.2009 e da sentença de 08.02.2008.
32.º Contudo, se a liquidação visa concretizar em prestação determinada, o montante da indemnização devida, mas as AA., aqui recorrentes, não lograram provar a verdade do alegado, como seria até relativamente simples de demonstrar, então a pretensão das recorrentes só pode deixar de decair!
33.º De facto, o Ilustre Tribunal a quo apenas não atendeu ao pedido de pagamento dos honorários de advogado, suportadas pelas AA., porquanto as mesmas, sobre quem impendia essa demonstração, não o fizeram, não obstante a advertência atempada por parte do tribunal para essa insuficiência probatória.
34.º Tudo isto, não obstante a desenvolvida fundamentação supra reproduzida, levou a que o facto 12 fosse dado como não provado, pelo que não existe quanto a esta matéria qualquer contradição na matéria de facto dada como provada, ou neste caso, não provada, como não existe erro de julgamento e muito menos qualquer violação do princípio do caso julgado.
35.º Em consequência, o montante devido a título de pagamento de honorários pagos ao respectivo mandatário das recorrentes só pode ser julgado improcedente por não provado, devendo manter-se inalterada, nesta parte, a douta sentença recorrida.”

Também a ré interpôs recurso jurisdicional da sentença do TAC de Lisboa de 14/03/2013, concluindo da seguinte forma:
“1. Tendo julgado parcialmente procedente o incidente de liquidação deduzido pelas recorridas o Tribunal recorrido condenou a ora recorrente a pagar:
a) à ............ o montante de € 277.173,26 - correspondente ao valor das parcelas 112, 114 e 115, em 31.12.2012, - actualizado em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor, desde 31.12.2012 e até integral pagamento;
b) às AA. o montante de € 68.599,89 - correspondente ao valor dos 30.000 m², em 31.12.2012 - actualizado em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor, desde 31.12.2012 e até integral pagamento; e
c) às AA. a quantia de € 343,65, a título de despesas judiciais e extrajudiciais pagas pelas mesmas,
a douta sentença recorrida fez errada apreciação da prova produzida.
Com efeito,
2. Estabelece o artigo 26º, n.º 1 do Código das Expropriações, aprovado pelo DL 483/91, que: o valor dos solos para outros fins será calculado tendo em atenção os seus rendimentos efectivo ou possível no estado existente à data da declaração de utilidade pública, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influírem no respectivo cálculo.
3. Nos presentes autos foram realizadas várias perícias a fim de apurar o montante mais exacto quanto possível relativamente ao valor a atribuir às parcelas em apreço.
4. Aliás, dir-se-á até que, raramente num processo constam tantos elementos elaborados por técnicos e peritos que levaram à elaboração de vários Relatórios, na nossa perspectiva determinantes para um bom julgamento da causa.
5. Atentas as diversas quantias aqui peticionadas, por uma questão de facilidade de esquematização, a recorrente debruçou-se relativamente a cada uma delas individualmente, leia-se ao valor atribuído às parcelas 112, 114 e 115, e ao valor atribuído aos 30.000 m² referidos na alínea i) dos factos assentes da sentença constante de fls. 717 a 728 dos autos, uma vez que aceita o valor apurado na douta sentença recorrida quanto às despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários do advogado suportadas pelas AA.
6. Como sustentamos em devido tempo, nomeadamente em sede de alegações de facto, a convicção da Ilustre Meritíssima a quo quanto a esta matéria deveria ter sido a que resultasse do Relatório Colegial apresentado pelos senhores peritos (supra referido na alínea F) bem como dos demais relatórios juntos aos autos.
7. Contudo, não obstante o Relatório da Perícia Colegial de fls. 1186 a 1283 ter sido aquele que no essencial ajudou a formar a convicção do Tribunal a quo, os valores apurados pelo mesmo afastam-se da génese desse mesmo relatório como se demonstrou nas alegações supra.
8. Da análise dos documentos juntos aos autos constata-se que os relatórios periciais enunciados nos números 1), 3) e 4) supra chegaram a valores muito semelhantes na ordem de grandeza.
9. Tendo em conta que o resultado final destes Relatórios não foi posto em crise por testemunhos credíveis, o valor a atribuir às parcelas deveria ser o valor da peritagem efectuada nos presentes autos - 4) - ou, pelo menos, um valor aproximado dos que resultam da maioria das perícias juntas aos autos e enunciadas nos números 1), 3) e 4) supra.
10. Acresce que, no despacho de resposta aos factos constantes da Base Instrutória proferido pelo douto Tribunal a quo, no que concerne à fundamentação sobre a resposta dada ao facto 4, pode ler-se que: “A convicção do tribunal quanto a este facto fundou-se no relatório colegial - completado pelos esclarecimentos prestados pelos peritos que o subscreveram em audiência de julgamento - conjugado com os documentos de fls. 105 e ss. e 1360 a 1380 (completado a fls. 1453 a 1456) dos autos, e a prova testemunhal, e uma vez que o relatório singular não se mostrou credível (…)” - sublinhado nosso.
11. O Tribunal a quo acrescenta que considerou o método de cálculo adoptado no relatório colegial mais completo e preciso, ou seja, mais fidedigno, pelo que o utilizou para calcular o valor das parcelas em causa (pág. 8 do despacho de resposta à Base Instrutória).
12. Contudo, salvo melhor opinião e com o devido respeito, a opção da Meritíssima Juiz a quo de atribuir às parcelas um valor médio resultante da construção de várias simulações posteriores ao Relatório Colegial - 4) -, levadas a cabo em diversas sessões de audiência de julgamento, além de desvirtuar o próprio Relatório conduziu a uma sobrevalorização das parcelas em questão.
13. Nesta perspectiva, e tendo em consideração que o valor da Peritagem indicado no relatório suscitado nos presentes autos, assinado pelo senhor perito nomeado pelo tribunal e pelo perito indicado pela R., aqui recorrente, não anda longe dos valores indicados nos outros dois relatórios, considera-se que a resposta a este quesito deveria ter valorado as parcelas em € 102.375,00 (como decorre da fundamentação dada no facto 4, pág. 6 do despacho de resposta à Base Instrutória) a que acresceria o valor hectare apurado relativamente aos 30.000 m² que o tribunal deu como provado.
14. Sobre o valor apurado apenas haveria então que corrigir de 3.000$00/arroba para 4.000$00/arroba (€ 19,95) - atento o disposto na alínea r) dos factos assentes da sentença constante de fls. 717 a 728 dos autos - e proceder à diminuição dos custos de extracção (que o tribunal concordou ascenderem pelo menos a € 2,50), passando a considerar-se como valor de referência da arroba o montante de € 17,50 (€ 19,95 - € 2,50 = € 17,50), de acordo com o que se afirma a págs. 16 e 17 do despacho de resposta à Base Instrutória.
15. Ora, o que não se entende, e transparece erro notório na apreciação da prova e contradição na fundamentação é que se afirme de seguida em tal despacho que: “De todo o modo, nas sessões de esclarecimentos de 20.06.2012 e de 2.7.2012, sobretudo nesta última, o perito José …………………., esclareceu que estes valores eram adequados caso as parcelas não tivessem quaisquer sobreiros, ou seja, tendo as parcelas, como ocorria no caso em apreciação, sobreiros, o seu valor deveria ser superior, devendo atender-se à idade dos sobreiros para cálculo do valor das parcelas” (sublinhado nosso).
16. Esta afirmação exarada no douto despacho afigura-se-nos contraditória com o teor do próprio Relatório e das considerações do douro Tribunal a quo segundo a qual para todos os cenários foram sempre considerados 80 sobreiros/hectare.
17. O que nos leva a crer que esse item foi considerado duas vezes nos cálculos finais a que chegou a Ilustre Meritíssima a quo, e que constitui erro notório na apreciação da prova e contradição na fundamentação da decisão.
18. Na verdade, e como também se afirma nessa parte da fundamentação, o que não havia sido considerado no Relatório foi a idade dos sobreiros existentes nessas parcelas. Mas transparece no mesmo Relatório que, para apuramento da indemnização devida, os senhores peritos subscritores sempre consideraram a média de 80 sobreiros por hectare.
19. Expurgada esta dúvida e seguindo o raciocínio do Ilustre Tribunal a quo, o valor dos cenários seria o indicado a págs. 18 do mesmo despacho, apurando-se a média em € 9.116,00 por hectare a que corresponderia o valor de € 119.003,91 relativamente às parcelas 112, 114 e 115.
20. Também a resposta dada ao Facto 6 deveria ter sido outra, tendo em consideração o apuramento do valor da peritagem indicado no relatório suscitado nos presentes autos, assinado pelo senhor perito nomeado pelo tribunal e pelo perito indicado pela R., aqui recorrente - melhor identificado em 4) supra.
21. Seguindo o mesmo critério, o valor relativo à parcela de terreno de 30.000 m² seria de € 27.348,00 e não o que consta do despacho em causa (a págs. 22 e 23 da resposta à Base Instrutória).
22. Salvo melhor opinião, o valor total a indemnizar seria então de € 140.351,91, relativamente às quatro parcelas e não o que consta na resposta aos factos 4 e 5 da Base Instrutória.
23. De todo o modo, e sempre com a reserva de que o parágrafo da fundamentação do despacho a págs. 18 tenha dito mais do que queria (isto porque o valor apurado para os quatro cenários corrigidos, já continham 80 sobreiros por hectare e os valores ali apurados nunca poderiam ser só do solo sem nada), certo é que foi outro o entendimento do Ilustre Tribunal a quo.
24. Sendo certo que a aqui recorrente, nas alegações de direito que apresentou, invocou de imediato a existência de erro na apreciação da prova, relativamente a esta questão em particular.
25. Ora, considerando o exposto, deveria a douta sentença recorrida ter dado provimento à pretensão da recorrente, ou seja, ter corrigido o erro e alterado o valor das parcelas. Com efeito,
26. Aquando da elaboração da sentença, o Tribunal a quo, mesmo se entendesse não corrigir os valores dados como assentes, deveria ter esclarecido a aqui recorrente quanto à aparente oposição da decisão com a própria fundamentação utilizada.
27. Não o tendo feito, apenas se pode concluir pela nulidade da sentença recorrida, por não ter especificado os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão e por os fundamentos utilizados estarem em oposição com a decisão tomada nos presentes autos, nos termos do artigo 668º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPC.
28. Bem sabemos que a prova pericial está sujeita ao princípio da livre apreciação da prova, o que significa que o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida (cfr. artigo 655º, n.º 1 CPC e artigo 389º do Código Civil).
29. Contudo, no caso concreto o que houve foi erro de julgamento de facto, que ocorre quando um juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação sub judice que não revista natureza jurídica.
30. Tal erro de julgamento pode ser banido por via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida, conforme conclui o douto Acórdão deste Venerando Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 16/04/2013, disponível in http://www.dgsi.pt.
31. Razão pela qual atrás se explanou os pontos de facto que a recorrente considera incorrectamente julgados - leia-se pontos 4) e 6) - bem como os meios probatórios que impunham decisão diversa (relatórios periciais juntos aos autos e melhor identificados na listagem documental acima descrita, dando especial relevância ao Relatório Pericial elaborado no decurso dos presentes autos de liquidação, constante a fls. 1186 a 1283 dos autos, subscrito pelos peritos indicados pela recorrente e pelo Ilustre Tribunal a quo).
32. Face ao exposto, ora se requer a este Venerando Tribunal que dê provimento à pretensão da recorrente, alterando a resposta dada aos factos 4) e 6) da Base Instrutória e, em consequência, sejam também alterados tais valores na sentença proferida pelo Tribunal a quo, quando se procede à sua actualização, por referência a 21.11.1995, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor.”

As autoras contra-alegaram, concluindo da seguinte forma:
“A - DAS CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES DA EP
1.ª As conclusões das alegações de recurso apresentadas pela EP não integram qualquer individualização das questões ou resumo do corpo daquela peça processual, limitando-se a repetir “os pormenores argumentativos próprios da alegação” (v. Ac. STJ de 1996.07.10, Proc. 965069, in www.dgsi.pt), pelo que a ora recorrente deverá ser convidada a sintetizá-las (v. art. 690º do CPC; cfr. art. 1º da LPTA) - cfr. texto n.ºs 1 a 3.
B - DA INEXISTÊNCIA DE NULIDADES DA SENTENÇA RECORRIDA
2.ª A douta sentença recorrida, de 2013.03.14, especificou devidamente os respectivos fundamentos de facto e de direito, considerando, neste particular, a matéria já assente nas decisões judiciais liquidandas, pelo que nunca seria nula, como pretende a EP, tanto mais que só a falta absoluta e nunca a alegada, mas inexistente insuficiência de fundamentos podia determinar a sua nulidade (v. art. 668º/1/b do CPC; cfr. art. 666º/3 do CPC) - cfr. texto n.ºs 4 e 5.
3.ª A douta sentença recorrida não enferma ainda de qualquer nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão (v. arts. 660º/2 e 668º/1/c do CPC) - cfr. texto n.ºs 6 e 7.
C - DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
4.ª A ora recorrente impugna a decisão da matéria de facto no que concerne aos n.ºs 11 e 13 dos FP, relativos ao valor das parcelas de terreno em causa, de forma manifestamente improcedente e contraditória, pois:
a) Reconhece que, face aos esclarecimentos prestados pelos Senhores Peritos e aos factos provados no presente processo, era necessária a correcção do relatório dos Senhores Peritos do Tribunal e da EP, cujo método de cálculo foi seguido na douta sentença recorrida, relativamente ao valor da arroba de cortiça, à diminuição dos custos de extracção e à consideração da idade dos sobreiros (v. conclusões 14.ª e 18.ª), defendendo, ao mesmo tempo, que os esclarecimentos prestados pelo próprio Perito da EP (v. art. 587º/4 do CPC), relativos às referidas questões “desvirtuar(am) o próprio relatório” e que a avaliação das parcelas “deveria ter sido a que resultasse do relatório Colegial apresentado pelos Senhores Peritos” (v. conclusões 6.ª e 12.ª).
b) Afirma que a existência de “80 sobreiros/hectare” teria sido “considerada duas vezes nos cálculos finais”, quando tal não sucede, tendo o douto Tribunal a quo apenas determinado, de forma fundamentada, que “tendo as parcelas, como ocorria no caso em apreciação, sobreiros, o seu valor deveria ser superior, devendo atender-se à idade dos sobreiros para cálculo do valor das parcelas” (v. conclusões 15.ª e 17.ª).
c) Fundamenta o valor que defende para as parcelas em causa em relatórios periciais relativos a outras herdades e que visavam apenas a fixação do valor tributário de outros processos (v. conclusões 7.ª a 10.ª); e
d) Apresenta cálculos errados na determinação do valor das parcelas em causa, em claro prejuízo das ora recorridas (v. conclusões 19.ª a 22.ª) - cfr. texto n.ºs 8 a 13.
5.ª A decisão do Tribunal a quo, relativamente aos concretos pontos da matéria de facto impugnados pela EP, foi alicerçada no contexto da imediação da prova e da oralidade e “fundou-se no relatório colegial - completado pelos esclarecimentos prestados pelos peritos que o subscreveram em audiência de julgamento -, conjugado com os documentos juntos a fls. 105 e segs. e 1360 a 1380 (completado a fls. 1453 a 1456), dos autos e a prova testemunhal” (v. despacho de 2012.07.05), nada justificando a alteração da matéria de facto agora pretendida pela ora recorrente, sendo certo que “mais do que uma simples divergência em relação ao decidido, é necessário que se demonstre, através dos concretos meios de prova que foram produzidos, que existiu um erro na apreciação do seu valor probatório” (v. Ac. RC de 2001.11.13, CJ 2001/V/85, www.dgsi.pt; cfr. Ac. RC de 2003.11.25, Proc. 38/58/03, in www.dgsi.pt), o que não sucedeu in casu. - cfr. texto n.ºs 10 a 14.”

O Ministério Público pronunciou-se sobre o mérito do recurso, concluindo pela sua improcedência.
*

São as seguintes as questões que importa apreciar e decidir:
A. No que concerne ao recurso interposto pelas autoras do despacho saneador:
(i) Erro de julgamento ao fixar o valor do incidente em € 1.169.388,62 (cfr. conclusão 1.ª);
(ii) Erro de julgamento ao absolver a ré do pedido de pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e de retribuições de honorários que as autoras terão que suportar com o presente incidente por, alegadamente, o referido direito não se encontrar reconhecido judicialmente no presente processo (cfr. conclusões 2.ª, 3.ª e 4.ª);
(iii) Erro de julgamento ao absolver a ré da instância quanto ao pedido de pagamento de indemnização pelos prejuízos relativos à interrupção da actividade das autoras, por alegada falta de título judicial (cfr. conclusões 2.ª, 3.ª e 4.ª).
B. Recurso interposto pelas autoras da sentença:
(i) Erro de julgamento da matéria de facto (cfr. conclusões 1.ª a 7.ª);
(ii) Erro de julgamento por violação do caso julgado das decisões judiciais liquidandas (cfr. conclusões 8.ª a 14.ª);
(iii) Erro de julgamento na fixação do valor das parcelas 112, 114 e 115 e dos 30.000 m² de terreno propriedade das autoras (cfr. conclusões 15.ª e 16.ª);
(iv) Erro de julgamento ao desconsiderar o pagamento de juros de mora vincendos e de sanção pecuniária compulsória (cfr. conclusão 17.ª);
(v) Erro de julgamento na apreciação do pedido de condenação da ré a pagar as despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado despendidas pelas autoras após a propositura da presente acção (cfr. conclusão 18.ª).
C. Recurso interposto pela ré:
(i) Nulidade da sentença por não ter especificado os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão (cfr. conclusões 24 a 27);
(ii) Nulidade da sentença por os fundamentos utilizados estarem em oposição com a decisão (cfr. conclusões 24 a 27);
(iii) Erro de julgamento da matéria de facto (cfr. conclusões 2 a 23 e 28 a 32).
*

Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

FUNDAMENTAÇÃO

A. Matéria de facto

A.1. Com relevância para a apreciação da “excepção de nulidade do processo no que respeita ao pedido de condenação da ré no pagamento às autoras das despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários que se revelem necessárias com o presente incidente de liquidação”, o Tribunal a quo fixou a seguinte factualidade no despacho saneador:
1. Em 7.6.2005 foi proferido o saneador-sentença constante de fls. 330 a 344, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, nos termos do qual foi proferida a seguinte decisão:
“Em face de todo o exposto, julgo parcialmente improcedente a presente acção e em consequência, absolvo desde já a R. EP – Estradas de Portugal, E.P.E.:
(…)
d) do pedido de condenação às AA. de todas as despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários.
(…)” (cfr. fls. 348).
2. As autoras não se conformaram com o saneador-sentença descrito em 1), designadamente na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação da ré no pagamento de despesas judiciais, extrajudiciais e honorários, dele recorreram para o STA, o qual, nessa sequência, proferiu o acórdão de 4.3.2009, constante de fls. 775 a 803, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, onde se exarou nomeadamente o seguinte:
“(…) Ora, no presente caso, a presente acção de responsabilidade civil por facto ilícito não teria sido intentada e as AA. não teriam de constituir advogado, que no contencioso administrativo é obrigatório (artº 5º da LPTA, aqui aplicável e hoje artº 7º do CPTA), se não fosse a actuação ilícita da Administração, que levou a que a Ré EP fosse condenada a pagar às AA as indemnizações fixadas pela sentença proferida nos autos e já transitada em julgado.
Portanto, nesta parte, o despacho saneador não se pode manter.*
IV – DECISÃO
Termos em que acordam os juízes deste Tribunal em:
a) conceder parcial provimento ao recurso jurisdicional do despacho saneador e, em consequência, revogar aquele despacho, na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação das AA. formulado sob a alínea d) do petitório;
b) condenar a Ré EP no pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado pagas pelas AA., após a propositura da presente acção e tendo em conta a sua procedência parcial, a liquidar em execução de sentença.” (cfr. fls. 355).

A.2. Com relevância para a apreciação da “excepção de falta de título judicial na parte referente ao pedido de condenação da ré no pagamento de indemnização pelos prejuízos relativos à interrupção da actividade (artigos 48º a 72º da petição inicial)”, o Tribunal a quo ficou a seguinte factualidade no despacho saneador:
1. Em 8.2.2008 foi proferida a sentença constante de fls. 717 a 728, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na qual se escreveu designadamente o seguinte:
“(…)

*
III – Fundamentação
a) Na C.R.P. de ............, sob o n.º ………., a fls. 93 do Livro B-3, da freguesia de ………., encontra-se inscrita a favor da A. “……..” a propriedade do prédio “Herdade do …….”, sito na freguesia de ………….., município de ............, matricialmente inscrito sob o art.º 3, secção K (parcela n.º 70);
b) Na C.R.P. de ............, sob o n.º …………….., freguesia de S……., encontra-se inscrita a favor da A. “……..” a aquisição do direito de propriedade, por compra de 16.12.1994, do prédio “Herdade da …………………..”, sito na freguesia de ............, município de ............, matricialmente inscrito sob o art.º 9 da Secção F (parcela n.º 112);
c) Na C.R.P. de ............, sob o n.º ………………, freguesia de ............, encontra-se inscrita a favor da A. “............” a aquisição do direito de propriedade, por compra de 27.10.1994, do prédio “Herdade dos Alfaiates”, sito na freguesia e município da ............, inscrito na matriz sob o art.º 183 da Secção A (parcela n.º 114);
d) Na C.R.P. de ............, sob o n.° 00981/140994, freguesia de Vilar de Frades, encontra-se inscrita a favor da A. “............” a aquisição do direito de propriedade, por compra de 27.10.1994, do prédio “Herdade da ............”, sito na freguesia de ……………, município da ............, inscrito na matriz sob o art.º 1 da Secção B (parcela n.º 115);
e) Em 95.11.21, foi publicada no Diário da República, II Série (Suplemento), a declaração de utilidade pública da expropriação das seguintes parcelas:
70, com a área de 15213 m², a destacar do prédio referido em a);
112, com a área de 52.120 m², a destacar do prédio referido em b);
114, com a área de 57.106 m², a destacar do prédio referido em c);
115, com a área de 21.318 m², a destacar do prédio referido em d);
f) As parcelas referidas na al. anterior destinaram-se à construção do lanço da EN 18 - Rectificação e alargamento entre a EN 256 e ............, que já se encontra implantada, além do mais, nas parcelas de terreno supra referidas;
g) As AA desenvolveram, até inícios de 1994, diversas explorações agrícolas nos prédios referido em a), b), c) e d), nomeadamente, a cultura do olival e o montado.
h) Em inícios de 1994, as parcelas referidas em e), foram ocupadas por empreiteiros e trabalhadores por conta da Junta Autónoma das Estradas, que deram início a operações de terraplanagem, aterros, destruição de árvores e culturas, escavações e outros trabalhos nos terrenos em causa.
i) Além das áreas referidas em e), a JAE ocupou cerca de 30.000 m² dos prédios referidos de a) a d);
(…)
*
III.2 – O Direito
(…)
O primeiro pedido das AA. consiste em condenar a Ré a pagar-lhes “a quantia correspondente ao valor das parcelas de terreno propriedade da Sociedade Agrícola ………............., S.A., acrescida dos juros legais que se venceriam sobre esse montante, desde a data da declaração de utilidade pública da expropriação ou, pelo menos, desde a tomada de posse pelos RR até efectivo pagamento e a liquidar em execução de sentença”.
Já se viu que em relação à parcela n.º 70 tal pedido foi rejeitado.
E em relação às demais, ou seja, em relação às parcelas n.ºs 112, com a área de 52.120 m², a destacar da Herdade da ……………………, 114, com a área de 57.106 m², a destacar da Herdade ……………, e 115, com a área de 21.318 m², a destacar da Herdade da ............?
A tese da Ré, espelhada nas suas doutas alegações de direito, é de que a ocupação de tais parcelas está autorizada por DUP, de 09.05.1995, revalidada em 06.05.1998; mas a ré também reconhece que a instância nos processos judiciais de expropriação ficou deserta. Ora, essa deserção não pode deixar de ser imputada à entidade expropriante, uma vez que compete a esta o impulso processual necessário à definição do direito em litígio, que é, como se sabe, a atribuição de justa indemnização pela expropriação.
Por outro lado, é manifesto que a declaração de utilidade pública há muito caducou, pelo que actualmente a ré não dispõe agora de título válido para a ocupação de tais parcelas. O que não quer dizer que essa ocupação fosse ilegalmente infundada ab initio, pois como Luís ………………. observa, com a DUP a entidade expropriante entra ipso facto na posse dos bens a expropriar, em resultado da posse administrativa que decorre daquela.
O que não significa que as AA. não tenham direito a serem indemnizadas pela ocupação das referidas parcelas. Mas em que termos?
Em circunstâncias normais a indemnização teria sido arbitrada pelo tribunal judicial competente, fazendo uma adequada restauração da lesão patrimonial sofrida pelas AA. através de critérios de objectividade, incluindo os danos socialmente relevantes sofridos em consequência da expropriação, segundo o princípio da contemporaneidade, numa dupla perspectiva: atribuição imediata do total do montante indemnizatório e atendibilidade das circunstâncias ou condições de facto existentes à data da declaração de utilidade pública, tendo sempre como objectivo o valor exacto do bem expropriado ou atingido pela expropriação.
E embora não pudessem ser integradas no cálculo da indemnização as benfeitorias necessárias ou úteis posteriores à declaração de utilidade pública (4º/5, do CExp/91), já se tornaria relevante para a actualização daquela à data da decisão final do processo a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, ocorrida após a declaração de utilidade pública (23º/1), a depreciação da parte não expropriada em consequência de divisão do prédio, os encargos ou prejuízos resultantes da expropriação (28º/2), o prejuízo decorrente da interrupção da actividade levada a cabo no prédio ou do conjunto da exploração agrícola efectuada directamente pelo proprietário (30º).
Mas como à indemnização por DUP corresponde uma transferência do direito de propriedade, a fase judicial do processo de expropriação litigiosa comportaria também a adjudicação judicial das parcelas expropriadas ao expropriante.
Não foi isto, porém, o que sucedeu, visto que o processo de expropriação não chegou a bom termo, não tendo havido transferência da propriedade privada para a entidade expropriante, embora se mantenha por razões óbvias a utilidade pública que justifica a expropriação.
Em resultado da natureza constitutiva do acto de DUP (tese de Marcello Caetano e Marques Guedes), não é a adjudicação judicial que verdadeiramente marca o momento da transferência do direito de propriedade; nesse momento o tribunal limita-se a verificar se estão reunidos os pressupostos para que essa transferência opere, isto é, a posse administrativa e o pagamento da indemnização.
E daí que se compreenda o pedido principal das AA., de pagamento do valor das parcelas, já que ao formulá-lo aquelas implicitamente renunciam à propriedade sobre as mesmas; e doutro passo compreende-se o pedido subsidiário que deduzem, qual seja o da a Ré ser condenada a pagar-lhes “a quantia correspondente aos danos provocados nos terrenos em causa e nos prédios em que se integram, nomeadamente os lucros cessantes da sua exploração agrícola, pelo período que já decorreu e enquanto se mantiver a sua ocupação, a liquidar em execução de sentença”.
Estando a ré na posse dos terrenos, permanecendo a utilidade publica que determinou a respectiva declaração (que sempre impediria, caso a expropriação se tivesse completado, a aplicação do instituto da reversão), apenas não tendo sido paga a correspondente indemnização, parece-nos evidente que a única solução será atribuí-la tendo em conta os parâmetros legais da sua fixação em processo expropriativo, em que pacificamente se aceita que o princípio basilar é o da justa indemnização «corresponder ao valor comum do bem expropriado ou, por outras palavras, ao respectivo valor de mercado ou ainda ao seu valor de compra e venda», pois como diz Marcello Caetano: “No património onde estava o imóvel, a entidade expropriante põe o seu valor pecuniário". Tendo sempre em consideração, como se disse, o princípio da contemporaneidade.
O que no caso em apreço significa que as parcelas objecto de DUP (112, 114, 115) devem ser valoradas segundo os mesmos critérios que serviriam para determinar o seu valor em sede de processo expropriativo e acima referidos a esse propósito.
E no que toca à parcela adicional referida na al. i), de 30.000 m²? Como não há notícia da mesma ter sido ocupada transitoriamente (e, portanto, devolvida às AA.), parece que a solução será a de a considerar imprescindível, conjuntamente com as demais, para a construção da via rodoviária que esteve na base da DUP. E sendo assim o melhor caminho será, a nosso ver, aplicar à determinação do seu valor o mesmo raciocínio que se entende ajustado à definição do valor das restantes.
Concluindo-se assim, como se concluiu, que no caso sub judice a indemnização a atribuir às AA. deverá ter como bitola o valor das parcelas ocupadas à data da DUP, tendo em conta todas as circunstâncias ou condições de facto existentes nessa data, devidamente actualizada em função da evolução do índice de preços no consumidor, incluindo a eventual depreciação na parte sobrante dos prédios.
Sucede, porém, que as AA. peticionam o pagamento da quantia correspondente aos juros que se venceriam sobre o produto da venda dos imóveis em causa, desde a tomada de posse pelos RR ou, pelo menos, desde a data da declaração de utilidade em execução de sentença, o que parece inculcar a ideia, prima facie, de que não pretenderam ser indemnizadas por tal depreciação.
Mas essa intenção é mais aparente que real. De facto, se pensarmos que um qualquer vendedor avisado e prudente sempre incluiria no preço de venda das parcelas a depreciação que da separação resultaria para os prédios de que eram desanexadas, então a referência ao produto da venda por banda das AA. necessariamente inclui essa realidade.
Como as AA. peticionam o pagamento de juros moratórios sobre o valor dos terrenos, obviamente que a actualização dos respectivos montantes terá de ser feita por uma de duas vias: através da contabilização de juros moratórios, se inferiores ao montante global que resultaria da actualização em função da variação do índice de preços no consumidor (assim se respeitando a dimensão do pedido), ou pelo valor desta, no caso inverso.
Estabelecida a indemnização nestes termos, nenhuma outra cabe às AA., quer por lucros cessantes, quer pela perda de árvores existentes nos terrenos, ou mesmo pela mora no atraso do pagamento da indemnização, na medida em que esta, apurada por referência à data da DUP deve ser actualizada nos termos referidos.
E obviamente que, com esta solução, quaisquer questões relacionadas com prescrição ficam prejudicadas, em função da actualidade da indemnização.
É claro que subsiste um outro problema, que a ré poderia ter evitado se, à cautela, tivesse requerido em reconvenção a condenação das AA. a reconhecer o seu direito de propriedade sobre as parcelas. No entanto, a dificuldade é mais aparente que real, visto que à Ré sempre restará o uso do meio judicial para esse efeito, se não foi possível obter nesse particular uma decisão consensual.
Resta dizer que não tendo o tribunal elementos para condenar una quantia exacta, a definição do valor das parcelas terá de ser relegado para execução de sentença (artº 661º, n.º 2, do CPC).
*
III – Dispositivo
Em face de todo o exposto julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência:
a) Condeno a ré a pagar à respectiva A. proprietária o valor das parcelas referidas supra em II.1.e), por referência a 21.11.1995, actualizado pelo valor mais baixo que vier a ser apurado, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor ou em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais, em ambos os casos desde a mesma data e até integral pagamento;
b) Condeno a ré a pagar às AA. o valor da área de terreno referida supra em II.1.i), por referência a 21.11.1995, actualizado pelo valor mais baixo que vier a ser apurado, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor ou em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais, em ambos os casos desde a mesma data e até integral pagamento;
c) E absolvo a ré do mais peticionado pelas AA.”.

A.3. O Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos na sentença que proferiu:
1. Em 7.6.2005 foi proferido o saneador-sentença constante de fls. 330 a 344, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, nos termos do qual foi proferida a seguinte decisão:
“Em face de todo o exposto, julgo parcialmente improcedente a presente acção e em consequência, absolvo desde já a R. EP – Estradas de Portugal, E.P.E.:
(…)
d) do pedido de condenação às AA. de todas as despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários.
(…)”.
2. Em 8.2.2008 foi proferida a sentença constante de fls. 717 a 728, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na qual se escreveu designadamente o seguinte:
“(…)
*
III - Fundamentação
a) Na C.R.P. de ............, sob o n.º ………, a fls. 93 do Livro B-3, da freguesia de ………….., encontra-se inscrita a favor da A. “………” a propriedade do prédio “Herdade do Rebolar”, sito na freguesia de ………, município de ............, matricialmente inscrito sob o art.º 3, secção K (parcela n.º 70);
b) Na C.R.P. de ............, sob o n.º ………………., freguesia de ............, encontra-se inscrita a favor da A. “............” a aquisição do direito de propriedade, por compra de 16.12.1994, do prédio “Herdade da …………….”, sito na freguesia de ............, município de ............, matricialmente inscrito sob o art.º 9 da Secção F (parcela n.º 112);
c) Na C.R.P. de ............, sob o n.º …………….., freguesia de ............, encontra-se inscrita a favor da A. “............” a aquisição do direito de propriedade, por compra de 27.10.1994, do prédio “Herdade …………”, sito na freguesia e município da ............, inscrito na matriz sob o art.º 183 da Secção A (parcela n.º 114);
d) Na C.R.P. de ............, sob o n.º 00981/140994, freguesia de Vilar …………., encontra-se inscrita a favor da A. “............” a aquisição do direito de propriedade, por compra de 27.10.1994, do prédio “Herdade da ............”, sito na freguesia de Vilar …………., município da ............, inscrito na matriz sob o art.º 1 da Secção B (parcela n.º 115);
e) Em 95.11.21, foi publicada no Diário da República, II Série (Suplemento), a declaração de utilidade pública da expropriação das seguintes parcelas:
70, com a área de 15213 m², a destacar do prédio referido em a);
112, com a área de 52.120 m², a destacar do prédio referido em b);
114, com a área de 57.106 m², a destacar do prédio referido em c);
115, com a área de 21.318 m², a destacar do prédio referido em d);
f) As parcelas referidas na al. anterior destinaram-se à construção do lanço da EN 18 – Rectificação e alargamento entre a EN 256 e ............, que já se encontra implantada, além do mais, nas parcelas de terreno supra referidas;
g) As AA desenvolveram, até inícios de 1994, diversas explorações agrícolas nos prédios referido em a), b), c) e d), nomeadamente, a cultura do olival e o montado.
h) Em inícios de 1994, as parcelas referidas em e), foram ocupados por empreiteiros e trabalhadores por conta da Junta Autónoma das Estradas, que deram início a operações de terraplanagem, aterros, destruição de árvores e culturas, escavações e outros trabalhos nos terrenos em causa.
i) Além das áreas referidas em e), a JAE ocupou cerca de 30.000 m² dos prédios referidos de a) a d);
j) As obras de aterro, compactação e pavimentação dos terrenos das AA., bem como a construção da nova via de comunicação que se encontra implantada nas parcelas referidas na al. e) e na alínea anterior, destruíram totalmente as árvores e culturas existentes, degradando irremediavelmente o solo, cuja exploração agrícola ficou totalmente inviabilizada;
k) A ............ nunca recebeu qualquer indemnização ou compensação pela ocupação dos seus terrenos;
l) A ocupação dos terrenos pelos RR impediu as AA de os vender e de os usufruir;
m) A R. não promoveu a constituição da arbitragem;
n) E recusou-se a pagar os prejuízos que as AA têm vindo a suportar desde inícios de 1994 pela ocupação das parcelas de terreno;
o) Nas parcelas 112, 114 e 115, referidas na al. e), e no terreno referido na al. i), dos factos assentes, existia um número não concretamente apurado de sobreiros, oliveiras e azinheiras, valendo os sobreiros Esc. 7.500$00 e as oliveiras Esc. 6.500$00;
p) Os RR cortaram as referidas árvores e apropriaram-se da respectiva lenha;
q) Cada sobreiro produz em média cerca de 3 arrobas de cortiça/árvore, por novénio;
r) Em 1994 o preço médio da arroba era de cerca de 4.000$00;
s) Na parcela n.º 115 existia, à data da ocupação, um número não concretamente apurado de oliveiras, que em condições normais produziam, cada uma, cerca de 22 kg de azeitona por ano;
t) O preço médio da azeitona é de 55$00/Kg;
u) A A. ............ não se opôs à ocupação das parcelas.
v) A Declaração de Utilidade Pública referente às parcelas referidas supra em e) é de 21.11.1995, revalidada em 06.05.1998;
w) A instância na fase judicial do processo expropriativo de tais parcelas, exceptuando a parcela 70, terminou por deserção.
*
III.2 - O Direito
(…)
O primeiro pedido das AA. consiste em condenar a Ré a pagar-lhes “a quantia correspondente ao valor das parcelas de terreno propriedade da Sociedade Agrícola ………..........., S.A., acrescida dos juros legais que se venceriam sobre esse montante, desde a data da declaração de utilidade pública da expropriação ou, pelo menos, desde a tomada de posse pelos RR até efectivo pagamento e a liquidar em execução de sentença”.
Já se viu que em relação à parcela nº 70 tal pedido foi rejeitado.
E em relação às demais, ou seja, em relação às parcelas n.ºs 112, com a área de 52.120 m2, a destacar da Herdade da Aldeia …………., 114, com a área de 57.106 m2, a destacar da Herdade dos …….., e 115, com a área de 21.318 m2, a destacar da Herdade da ............?
A tese da Ré, espelhada nas suas doutas alegações de direito, é de que a ocupação de tais parcelas está autorizada por DUP, de 09.05.1995, revalidada em 06.05.1998; mas a ré também reconhece que a instância nos processos judiciais de expropriação ficou deserta. Ora, essa deserção não pode deixar de ser imputada à entidade expropriante, uma vez que compete a esta o impulso processual necessário à definição do direito em litígio, que é, como se sabe, a atribuição de justa indemnização pela expropriação.
Por outro lado, é manifesto que a declaração de utilidade pública há muito caducou, pelo que actualmente a ré não dispõe agora de título válido para a ocupação de tais parcelas. O que não quer dizer que essa ocupação fosse ilegalmente infundada ab initio, pois como Luís ……………………observa, com a DUP a entidade expropriante entra ipso facto na posse dos bens a expropriar, em resultado da posse administrativa que decorre daquela.
O que não significa que as AA. não tenham direito a serem indemnizadas pela ocupação das referidas parcelas. Mas em que termos?
Em circunstâncias normais a indemnização teria sido arbitrada pelo tribunal judicial competente, fazendo uma adequada restauração da lesão patrimonial sofrida pelas AA. através de critérios de objectividade, incluindo os danos socialmente relevantes sofridos em consequência da expropriação, segundo o princípio da contemporaneidade, numa dupla perspectiva: atribuição imediata do total do montante indemnizatório e atendibilidade das circunstâncias ou condições de facto existentes à data da declaração de utilidade pública, tendo sempre como objectivo o valor exacto do bem expropriado ou atingido pela expropriação.
E embora não pudessem ser integradas no cálculo da indemnização as benfeitorias necessárias ou úteis posteriores à declaração de utilidade pública (4º/5, do CExp/91), já se tornaria relevante para a actualização daquela à data da decisão final do processo a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, ocorrida após a declaração de utilidade pública (23º/1), a depreciação da parte não expropriada em consequência de divisão do prédio, os encargos ou prejuízos resultantes da expropriação (28º/2), o prejuízo decorrente da interrupção da actividade levada a cabo no prédio ou do conjunto da exploração agrícola efectuada directamente pelo proprietário (30º).
Mas como à indemnização por DUP corresponde uma transferência do direito de propriedade, a fase judicial do processo de expropriação litigiosa comportaria também a adjudicação judicial das parcelas expropriadas ao expropriante.
Não foi isto, porém, o que sucedeu, visto que o processo de expropriação não chegou a bom termo, não tendo havido transferência da propriedade privada para a entidade expropriante, embora se mantenha por razões óbvias a utilidade pública que justifica a expropriação.
Em resultado da natureza constitutiva do acto de DUP (tese de Marcello Caetano e Marques Guedes), não é a adjudicação judicial que verdadeiramente marca o momento da transferência do direito de propriedade; nesse momento o tribunal limita-se a verificar se estão reunidos os pressupostos para que essa transferência opere, isto é, a posse administrativa e o pagamento da indemnização.
E daí que se compreenda o pedido principal das AA., de pagamento do valor das parcelas, já que ao formulá-lo aquelas implicitamente renunciam à propriedade sobre as mesmas; e doutro passo compreende-se o pedido subsidiário que deduzem, qual seja o da a Ré ser condenada a pagar-lhes “a quantia correspondente aos danos provocados nos terrenos em causa e nos prédios em que se integram, nomeadamente os lucros cessantes da sua exploração agrícola, pelo período que já decorreu e enquanto se mantiver a sua ocupação, a liquidar em execução de sentença”.
Estando a ré na posse dos terrenos, permanecendo a utilidade publica que determinou a respectiva declaração (que sempre impediria, caso a expropriação se tivesse completado, a aplicação do instituto da reversão), apenas não tendo sido paga a correspondente indemnização, parece-nos evidente que a única solução será atribuí-la tendo em conta os parâmetros legais da sua fixação em processo expropriativo, em que pacificamente se aceita que o princípio basilar é o da justa indemnização «corresponder ao valor comum do bem expropriado ou, por outras palavras, ao respectivo valor de mercado ou ainda ao seu valor de compra e venda», pois como diz Marcello Caetano: “No património onde estava o imóvel, a entidade expropriante põe o seu valor pecuniário". Tendo sempre em consideração, como se disse, o princípio da contemporaneidade.
O que no caso em apreço significa que as parcelas objecto de DUP (112, 114, 115) devem ser valoradas segundo os mesmos critérios que serviriam para determinar o seu valor em sede de processo expropriativo e acima referidos a esse propósito.
E no que toca à parcela adicional referida na al. i), de 30.000 m²? Como não há notícia da mesma ter sido ocupada transitoriamente (e, portanto, devolvida às AA.), parece que a solução será a de a considerar imprescindível, conjuntamente com as demais, para a construção da via rodoviária que esteve na base da DUP. E sendo assim o melhor caminho será, a nosso ver, aplicar à determinação do seu valor o mesmo raciocínio que se entende ajustado à definição do valor das restantes.
Concluindo-se assim, como se concluiu, que no caso sub judice a indemnização a atribuir às AA. deverá ter como bitola o valor das parcelas ocupadas à data da DUP, tendo em conta todas as circunstâncias ou condições de facto existentes nessa data, devidamente actualizada em função da evolução do índice de preços no consumidor, incluindo a eventual depreciação na parte sobrante dos prédios.
Sucede, porém, que as AA. peticionam o pagamento da quantia correspondente aos juros que se venceriam sobre o produto da venda dos imóveis em causa, desde a tomada de posse pelos RR ou, pelo menos, desde a data da declaração de utilidade em execução de sentença, o que parece inculcar a ideia, prima facie, de que não pretenderam ser indemnizadas por tal depreciação.
Mas essa intenção é mais aparente que real. De facto, se pensarmos que um qualquer vendedor avisado e prudente sempre incluiria no preço de venda das parcelas a depreciação que da separação resultaria para os prédios de que eram desanexadas, então a referência ao produto da venda por banda das AA. necessariamente inclui essa realidade.
Como as AA. peticionam o pagamento de juros moratórios sobre o valor dos terrenos, obviamente que a actualização dos respectivos montantes terá de ser feita por uma de duas vias: através da contabilização de juros moratórios, se inferiores ao montante global que resultaria da actualização em função da variação do índice de preços no consumidor (assim se respeitando a dimensão do pedido), ou pelo valor desta, no caso inverso.
Estabelecida a indemnização nestes termos, nenhuma outra cabe às AA., quer por lucros cessantes, quer pela perda de árvores existentes nos terrenos, ou mesmo pela mora no atraso do pagamento da indemnização, na medida em que esta, apurada por referência à data da DUP deve ser actualizada nos termos referidos.
E obviamente que, com esta solução, quaisquer questões relacionadas com prescrição ficam prejudicadas, em função da actualidade da indemnização.
É claro que subsiste um outro problema, que a ré poderia ter evitado se, à cautela, tivesse requerido em reconvenção a condenação das AA. a reconhecer o seu direito de propriedade sobre as parcelas. No entanto, a dificuldade é mais aparente que real, visto que à Ré sempre restará o uso do meio judicial para esse efeito, se não foi possível obter nesse particular uma decisão consensual.
Resta dizer que não tendo o tribunal elementos para condenar una quantia exacta, a definição do valor das parcelas terá de ser relegado para execução de sentença (artº 661º, n.º 2, do CPC).
*
III – Dispositivo
Em face de todo o exposto julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência:
a) Condeno a ré a pagar à respectiva A. proprietária o valor das parcelas referidas supra em II.1.e), por referência a 21.11.1995, actualizado pelo valor mais baixo que vier a ser apurado, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor ou em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais, em ambos os casos desde a mesma data e até integral pagamento;
b) Condeno a ré a pagar às AA. o valor da área de terreno referida supra em II.1.i), por referência a 21.11.1995, actualizado pelo valor mais baixo que vier a ser apurado, em função da aplicação da variação do índice de preços no consumidor ou em função da aplicação da taxa de juros moratórios legais, em ambos os casos desde a mesma data e até integral pagamento;
c) E absolvo a ré do mais peticionado pelas AA.
Custas por ambas as partes, na proporção de 2/3 para a Ré.”.
3. As autoras não se conformaram com o saneador-sentença descrito em 1), designadamente na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação da ré no pagamento de despesas judiciais, extrajudiciais e honorários, dele recorreram para o STA, o qual, nessa sequência, proferiu o acórdão de 4.3.2009, constante de fls. 775 a 803, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, onde se exarou nomeadamente o seguinte:
“(…) Ora, no presente caso, a presente acção de responsabilidade civil por facto ilícito não teria sido intentada e as AA. não teriam de constituir advogado, que no contencioso administrativo é obrigatório (artº 5º da LPTA, aqui aplicável e hoje artº 7º do CPTA), se não fosse a actuação ilícita da Administração, que levou a que a Ré EP fosse condenada a pagar às AA as indemnizações fixadas pela sentença proferida nos autos e já transitada em julgado.
Portanto, nesta parte, o despacho saneador não se pode manter.
*
IV – DECISÃO
Termos em que acordam os juízes deste Tribunal em:
a) conceder parcial provimento ao recurso jurisdicional do despacho saneador e, em consequência, revogar aquele despacho, na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação das AA. formulado sob a alínea d) do petitório;
b) condenar a Ré EP no pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado pagas pelas AA., após a propositura da presente acção e tendo em conta a sua procedência parcial, a liquidar em execução de sentença.”.
4. A acção, no âmbito da qual foram proferidas as decisões descritas em 1) a 3), foi intentada em 22 de Janeiro de 2001.
5. Nessa acção as autoras pagaram € 178 de taxa de justiça inicial pelo recurso que interpuseram do despacho saneador e € 288,87 correspondente ao valor da conta final da responsabilidade das mesmas.
6. Essa conta consta de fls. 829-830, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
7. Em 1994 a totalidade das parcelas 112 e 114 destinava-se a montado.
8. Nas parcelas 112, 114 e 115 existiam, em 1994, pelo menos cerca de 908 sobreiros.
9. Na parcela 115 existiam, em 1994, pelo menos cerca de 139 oliveiras.
10. Em 1994 a parcela 115 destinava-se, em cerca de 5 909 m², a montado e, em cerca de 15 409 m², a olival.
11. Tendo em conta a factualidade dada como assente na sentença descrita em 2), bem como em 7), 8), 9) e 10), em 1994 o valor do terreno das parcelas 112, 114 e 115 era de € 179 491,47.
12. Em 1994 os 30 000 m² ocupados e referidos na alínea i), dos factos assentes da sentença descrita em 2), destinavam-se a montado.
13. Tendo em conta a factualidade dada como assente na sentença descrita em 2), bem como o facto 12), em 1994 o valor do terreno com 30 000 m² ocupado e referido na alínea i), dos factos assentes, dessa sentença, era de € 44 423,82.
14. Após a propositura da acção a que se referem as decisões descritas em 1) a 3), as ora autoras procederam ao pagamento das despesas extrajudiciais com a mesma - até ao trânsito do acórdão do STA referido em 3) - no montante de € 48,60.

B. Do direito

1. Passamos então a apreciar as questões acima enunciadas, começando pelas que são suscitadas no recurso interposto pelas autoras do despacho saneador.
1.1. Alegam, em primeiro lugar, as mesmas que o Tribunal a quo errou ao fixar o valor da causa em € 1.169.388,62, para o que aduzem os seguintes argumentos:
- O incidente de liquidação renovou a instância da acção declarativa em que se integra, não tendo utilidade económica própria; assim, face ao princípio da “imutabilidade do valor da causa”, o valor do presente processo deveria ser mantido;
- O pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e de retribuições de honorários que as autoras terão de despender com o presente incidente não eram determináveis à data da respectiva propositura, pelo que não têm influência na fixação do valor da causa;
- Os artigos 31º, 32º e 34º do CPTA, invocados no despacho recorrido, não são aplicáveis ao presente processo declarativo iniciado em 2001.
1.1.1. Entendeu o Tribunal a quo no que a esta matéria concerne: “no caso vertente as autoras pretendem a condenação da ré no pagamento das seguintes quantias: - € 803.306,04; - € 209.025,64; - € 127.056,93, ou seja, no montante total de € 1.139.388,61. Além disso, peticionam ainda a condenação da ré no pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários que as autoras tiverem de fazer com o presente incidente de liquidação, até ao respectivo termo. Quanto a este pedido genérico, e por analogia com o critério supletivo constante do art. 34º, n.ºs 1 e 2 do CPTA, conjugado com os arts. 6º, n.º 4 do ETAF e 24º, n.º 1 da LOTJ, na redacção do DL 303/2007 e 312º do CPC, o seu valor deverá ser de € 30.000,01”.
Concluiu, assim, o TAC de Lisboa que “o presente incidente tem um valor diverso do da causa, devendo ser fixado em € 1.169.388,62 [€ 1.139.388,61+€ 30.000,01]”.
É correcto este entendimento?
1.1.2. Vejamos.
Por regra o autor deve concretizar a prestação debitória que pretende obter do réu; admite-se, contudo, a formulação de pedidos genéricos nas situações enunciadas no n.º 1 do artigo 471º do CPC, designadamente “quando não seja ainda possível determinar de modo definitivo as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569º do Código Civil” [cfr. al. b)].
Nessas situações e não havendo “elementos para fixar o objecto ou a quantidade, o tribunal condenará no que se liquidar em execução de sentença” (cfr. artigo 661º, n.º 2 do CPC, na redacção anterior à introduzida pelo Decreto-lei n.º 38/2003, de 8/03). Com as alterações introduzidas ao CPC por este diploma, a sentença de condenação genérica deixou de condenar no que se liquidar em execução de sentença”, para agora condenar “no que vier a ser liquidado”.
É neste contexto que surge o incidente de liquidação, o qual passou, com o âmbito definido no artigo 378º, n.º 2 do CPC, a ser o único meio para liquidar (exceptuado o mero cálculo aritmético) a obrigação em cujo cumprimento o devedor tenha sido condenado (cfr. José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, “Código de Processo Civil anotado”, volume 3º, 2003, pág. 255).
Desta feita, criou-se uma espécie de incidente da instância posterior ou subsequente à decisão judicial de condenação, enxertado no processo declaratório que nela culminou, e que tem até a virtualidade de determinar a renovação da respectiva instância, já extinta (cfr. Carlos Lopes do Rego, “Requisitos da obrigação exequenda”, Themis, ano IV, n.º 7, 2003 (A reforma da acção executiva), pág. 71 e 72).
Em suma, o incidente de liquidação visa tão só concretizar o objecto da condenação (genérica) contida na sentença, com integral respeito pelo caso julgado.
1.1.3. O artigo 313º, n.º 1 do CPC (actual artigo 304º, n.º 1) dispõe que “o valor dos incidentes é o da causa a que respeitam, salvo se o incidente tiver realmente valor diverso do da causa, porque neste caso o valor é determinado em conformidade dos artigos anteriores”.
A regra nesta matéria é, pois, a de que os incidentes têm o mesmo valor da causa onde são deduzidos.
Só assim não será nos casos em que os incidentes apresentam “valor diferente do da causa, isto é, dever a utilidade económica do incidente computar-se em quantia diversa da que exprime o valor da acção” (Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 3.ª edição, Coimbra Editora, pág. 418). Nestas situações “para a determinação do valor do incidente aplicam-se as regras que servem para a determinação do valor da acção. Quer dizer, considera-se o incidente como uma causa autónoma e fixa-se o seu valor como se fixaria se, em vez de aparecer ligado a uma acção, fosse objecto de processo absolutamente independente” (ob. cit., pág. 418).
Importa ainda atentar no artigo 308º, n.º 3 do CPC (actual artigo 299º, n.º 3), o qual dispõe que “nos processos de liquidação ou noutros em que, analogamente, a utilidade económica do pedido só se define na sequência da acção, o valor inicialmente aceite será corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários”.
Como refere a propósito deste preceito Salvador da Costa, “são processos em que, analogamente, a utilidade económica do pedido só se define no decurso da acção em que se formule um pedido genérico, nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 471º e que venha a ser objecto de liquidação através do incidente a que se reportam os artigos 378º a 380º (…). Todavia (…) deve o autor ou o requerente indicar, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 467º, o valor processual presumido da causa (…) O critério a usar na indicação do valor ilíquido ou indeterminado é o da probabilidade, assente num juízo de prognose póstuma, com apelo a dados de facto disponíveis e às regras da experiência. (…) Logo que o processo forneça os pertinentes elementos, ou seja, após estar definida quantitativamente a utilidade económica do pedido em termos definitivos, proceder-se-á à correcção” (in Os Incidentes da Instância, 3.ª edição, Almedina, págs. 36/37).
Ora, é essa justamente a situação dos autos. As recorrentes/autoras formularam, como vimos, pedidos genéricos e atribuíram à acção o valor de € 5.000.000$00 (€ 24.939,89). Na sequência da condenação da ré, efectuada também em termos ilíquidos, as mesmas deduziram o presente incidente de liquidação, no qual vieram concretizar quantitativamente os danos que suportaram. Fizeram-no da seguinte forma:
- Atribuíram às parcelas 112, 114 e 115 o valor de € 803.306,04;
- Atribuíram ao terreno ocupado pela ré com uma área de 30.000 m² o valor de € 209.025,64; e
- Computaram as despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários efectuadas “desde a propositura da acção até ao presente” em € 127.056,93.
Os danos suportados pelas recorrentes ascendem, assim, a € 1.139.388,61.
A esse montante acresce a importância relativa às despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários suportadas pelas mesmas com o presente incidente, as quais, como veremos de seguida, são também de considerar (ao contrário do decidido no despacho-saneador recorrido).
Os autos fornecem, agora, todos os elementos para aferir da utilidade económica do pedido, a qual há-de corresponder à soma de todas as importâncias peticionadas.
Assim, e concluindo-se que o valor da acção inicialmente indicado pelas recorrentes/autoras não se mostra correcto, por não corresponder à efectiva utilidade económica do pedido, deve proceder-se à sua correcção.
Andou bem, pois, o Tribunal a quo ao assim decidir.
Mas será que o valor fixado se mostra correcto?
Entendemos que não.
Como referimos, o valor da acção corresponde à soma de todos os pedidos formulados. Ora, relativamente às despesas suportadas com o presente incidente as recorrentes/autoras não formularam, como deviam (cfr. artigo 379º do CPC), um pedido de pagamento de quantia certa, pelo que o Tribunal a quo atribuiu-lhe o valor de € 30.000,01. Não é esse, porém, o valor corresponde a tal pedido. Como veremos de seguida, não tendo as autoras deduzido um pedido de pagamento de quantia certa, deverá ser proferido despacho convidando a fazê-lo, ficando então o Tribunal munido de todos os elementos necessários para, com rigor, fixar o valor da causa.
Concluímos, assim, pela procedência parcial da conclusão 1.ª das alegações de recurso.
1.2. Sustentam, de seguida, as autoras, ora recorrentes, que o Tribunal a quo errou ao absolver a ré do pedido de pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e de retribuições de honorários que as mesmas terão que suportar com o presente incidente por, alegadamente, o referido direito não se encontrar reconhecido judicialmente no presente processo (cfr. conclusões 2.ª, 3.ª e 4.ª).
Contrapõe a recorrida que o Acórdão do STA de 4/03/2009 não consagrou ou reconheceu o direito ao pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e honorários que as autoras tiveram que efectuar com o presente incidente de liquidação, tanto mais que é anterior a este.
1.2.1. Considerou o TAC de Lisboa que no Acórdão do STA de 4/03/2009 “não está contida qualquer condenação da ré no pagamento às autoras das despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários que se revelarem necessárias com o presente incidente de liquidação”.
É que, nos termos desse aresto, “a ré foi condenada no pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado pagas pelas AA após a propositura da acção e tendo em conta a sua procedência parcial”, o que “inculca claramente a ideia de que a condenação não abrange as despesas que as autoras venham a ter com o presente incidente de liquidação, conclusão que é confirmada pelos fundamentos invocados para a procedência deste pedido, nomeadamente na parte em que se refere que “a presente acção de responsabilidade civil por facto ilícito não teria sido intentada””.
Conclui o TAC de Lisboa que “o pedido de condenação da ré no pagamento às autoras das despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários que se revelarem necessárias com o presente incidente de liquidação terá de ser formulado numa acção administrativa comum (…), não sendo o presente incidente de liquidação o meio processual adequado para o efeito, pois neste apenas está em causa o apuramento do montante dos danos cuja existência já se encontra reconhecida (…), o que não ocorre com tais danos (…)”, pelo que se verifica “erro na forma do processo quanto a este pedido”, o que determina a absolvição da ré da instância.
1.2.2. Como referimos atrás, o incidente de liquidação visa tão só concretizar o objecto da condenação (genérica) contida na sentença, com integral respeito pelo caso julgado.
Refere-se, a este propósito, no Acórdão da Relação de Coimbra de 4/12/2007, proc. n.º 249/2000.C1, a liquidação de uma sentença destina-se tão só à concretização do objecto da sua condenação, com respeito sempre do caso julgado da sentença liquidanda, não sendo permitido às partes tomar uma posição diferente ou mais favorável do que a já assumida na acção declarativa (cfr., por todos, Ac. do STJ de 18/1/1996, in “CJ, Acs. do STJ., Ano IV, T1, pág. 58”)”.
A existência dos danos terá de resultar provada na acção declarativa que precede o incidente de liquidação, faltando apenas apurar o respectivo valor, o que é relegado para esse momento.
Em suma, a liquidação destina-se a uma mera quantificação dos danos já apurados na acção anteriormente intentada, não podendo o autor peticionar o pagamento de quantia destinada a indemnizar outros danos; ou seja, o âmbito e o objecto do incidente de liquidação mostra-se balizado pelos termos da decisão liquidanda.
Isto posto, vejamos o que sucedeu no caso dos autos.
Na acção declarativa que intentaram, as autoras formularam, além de outros, o pedido de condenação da ré a pagar-lhes “todas as despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários que estas despenderam e despenderão, a liquidar em execução de sentença” (cfr. al. d) do pedido).
Em 1.ª instância foi proferido despacho saneador que julgou “parcialmente improcedente a presente acção e em consequência absolv[eu] a R. EP - Estradas de Portugal, EPE: (…) d) do pedido de condenação às AA de todas as despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários”.
Interposto recurso desse despacho, o STA, por acórdão de 4/03/2009, concedeu-lhe provimento “e, em consequência, revog[ou] aquele despacho, na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação das AA. formulado sob a alínea d) do petitório” e (ii) condenou “a ré EP no pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado pagas pelas AA. após a propositura da presente acção e tendo em conta a sua procedência parcial, a liquidar em execução de sentença”.
É essa decisão judicial - a par da sentença de 8/02/2008 do TAC de Lisboa - que baliza os termos em que deve ser deduzido o incidente de liquidação e formulados os respectivos pedidos, já que, como vimos, através do mesmo visa-se tão só proceder à quantificação dos danos e, consequentemente, ao apuramento das quantias que a ré foi condenada a pagar, as quais respeitam, no que ora importa, às “despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado pagas pelas AA após a propositura da presente acção e tendo em conta a sua procedência parcial” (cfr. acórdão do STA de 4/03/2009);
Com vista a quantificar os danos que resultaram provados no âmbito da acção declarativa e a obter a integral reparação dos mesmos, as recorrentes/autoras deduziram o presente incidente de liquidação, formulando, além do mais, o seguinte pedido: “b) [que seja decidido], “de acordo com a sentença de 2008.02.08 deste douto Tribunal e com o acórdão do Venerando Supremo Tribunal Administrativo de 2009.03.04: (…) iii) Fixar em € 127.056,93 o valor das despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários efectuadas desde a propositura da acção até ao presente, às quais acrescerão as que se revelarem necessárias até ao termino do presente processo”.
O problema coloca-se quanto a este pedido na parte em que as recorrentes/autoras requerem a condenação da ré a pagar-lhes o valor das despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários efectuadas com o presente incidente de liquidação e a questão é a de saber se a condenação que resulta do acórdão do STA de 4/03/2009 abrange tais despesas.
A essa questão o TAC de Lisboa respondeu negativamente, como vimos. Entendemos, porém, que de forma errada.
Recorda-se que as autoras, ora recorrentes, pediram a condenação da ré a “pagar todas as despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários que estas despenderam e despenderão, a liquidar em execução de sentença”. Para tanto, alegaram ter “direito a ser indemnizadas pelas despesas judiciais e extrajudiciais e honorários de advogado que despenderam e despendem actualmente na defesa dos seus direitos” e que “não podem determinar, neste momento e de modo definitivo, o montante dos danos que hão-de pedir aos RR” (cfr. artigos 40º e 41º da petição inicial).
Ou seja, as mesmas não se limitaram a pedir o ressarcimento das despesas (dessa natureza) em que incorreram, mas também as que ainda irão suportar.
E o STA, de forma expressa, condenou a ré, ora recorrida, nesses termos. Com efeito, esse Supremo Tribunal, depois de “considerar o pedido formalmente admissível”, debruçou-se sobre “a questão de saber se as despesas aqui em causa constituem ou não danos indemnizáveis”. E a essa questão respondeu em sentido afirmativo; invocando o Acórdão do STA de 9/06/1999, pronunciou-se nos seguintes termos: “(…) a presente acção de responsabilidade civil por facto ilícito não teria sido intentada e as AA não teriam de constituir advogado, que no contencioso administrativo é obrigatório (art. 5º da LPTA, aqui aplicável e hoje art. 7º do CPTA), se não fosse a actuação ilícita da Administração, que levou a que a Ré EP fosse condenada a pagar às AA as indemnizações fixadas pela sentença proferida nos autos e já transitada em julgado”. E concluiu pela condenação da “ré EP no pagamento das despesas judiciais, extrajudiciais e honorários do advogado pagas pelas AA. após a propositura da presente acção e tendo em conta a sua procedência parcial, a liquidar em execução de sentença”.
Como resulta de forma inequívoca do segmento decisório do acórdão do STA, as despesas e honorários que a ré/recorrida foi condenada a pagar são as que as autoras/recorrentes suportaram após terem instaurado a acção declarativa de condenação. E aí não podemos deixar de incluir as despesas relativas ao presente incidente de liquidação, já que este é dependente daquela, tendo, aliás, sido nela deduzido. Na verdade, o incidente de liquidação não é um processo autónomo relativamente à acção declarativa de condenação, ao invés, está dela dependente; o mesmo só existe porque nessa acção foi a ré condenada a pagar às autoras as quantias que se vierem a apurar em execução de sentença. Daí que se possa afirmar que o incidente de liquidação está funcionalmente dependente da acção declarativa de condenação, constituindo um mero trâmite dela, tanto mais que a sua dedução depois de proferida sentença de condenação genérica tem por efeito a renovação da instância (cfr. artigo 378º, n.º 2 do CPC).
Assim sendo, como é, não colhem os argumentos aduzidos pelo Tribunal a quo para fundamentar a sua decisão. Refere o mesmo que a conclusão de que “a condenação não abrange as despesas que as autoras venham a ter com o presente incidente de liquidação” resulta, por um lado, da circunstância de o STA ter condenado a ré ao pagamento das despesas suportadaspelas AA após a propositura da acção e tendo em conta a sua procedência parcial” e, por outro, do facto de esse Supremo Tribunal ter fundamentado a procedência desse pedido referindo que “a presente acção de responsabilidade civil por facto ilícito não teria sido intentada”. Em rigor, o que o TAC de Lisboa disse foi que o STA reportou as despesas judiciais, extrajudiciais e os honorários do advogado à acção declarativa de condenação, e já não ao presente incidente de liquidação. Porém, esqueceu que não podemos cindir essa acção do presente incidente de liquidação e que, como referimos, este não constitui um processo autónomo, antes está dela funcionalmente dependente, da qual constitui um mero trâmite.
Dúvidas não há, pois, que a condenação operada pelo acórdão do STA de 4/03/2009 abrange as despesas judiciais, extrajudiciais e de honorários que as autoras, ora recorrentes, suportam com o presente incidente de liquidação.
Acontece, porém, que, como se refere no despacho-saneador recorrido, relativamente a essas despesas as autoras/recorrentes não formularam, como lhes é imposto pelo artigo 379º do CPC, um pedido de pagamento de quantia certa. Não nos podemos esquecer que nos situamos no âmbito de um incidente de liquidação, o qual visa justamente tornar líquidos os pedidos genéricos, pelo que não faz qualquer sentido deduzi-lo para nele formular novo pedido genérico. E o certo é que, pelo menos as despesas referentes à taxa de justiça eram conhecidas e determináveis no momento em que as autoras deduziram o presente incidente.
Entendemos, contudo, ao contrário do decidido pelo TAC de Lisboa, que essa circunstância não determina, sem mais, a absolvição da ré da instância relativamente a esse pedido.
Ao invés, e tendo presente que (i) o juiz pode, e deve, providenciar pelo “regular” uso da instância, determinando o suprimento da falta verificada (artigos 265º, n.º 2 e 288º, n.º 3, do CPC), (ii) na condução do processo o juiz deve cooperar com as partes no sentido de contribuir para a breve, eficaz e justa composição do litígio (artigo 266º, n.º 1, do CPC), e (iii) um dos corolários por que se manifesta o princípio do acesso efectivo à justiça, constitucionalmente consagrado no artigo 268º, n.º 4, da CRP, é o princípio “anti-formalista” e “pro actione”, segundo o qual a aplicação e interpretação das normas deve ser feita de modo a favorecer o acesso ao direito e evitar situações de denegação de justiça, designadamente por excesso de formalismo, deveria ter sido proferido despacho a convidar as autoras/recorrentes a aperfeiçoar a petição inicial, formulando pedido de pagamento de quantia certa.
Concluímos, assim, pela procedência das conclusões 2.ª, 3.ª e 4.ª das alegações de recurso, devendo os autos baixar ao TAC de Lisboa a fim de ser proferido despacho nos termos referidos, seguindo-se os demais termos do processo.
1.3. Finalmente, as autoras, ora recorrentes, imputam ao despacho-saneador recorrido erro de julgamento ao absolver a ré da instância quanto ao pedido de pagamento de indemnização pelos prejuízos relativos à interrupção da actividade, por alegada falta de título judicial (cfr. conclusões 2.ª, 3.ª e 4.ª), na medida em que, ao assim concluir, o Tribunal a quo desconsiderou o decidido nos arestos liquidandos.
Diversa é a posição da ré, a qual sustenta que “a decisão que absolveu a executada relativamente ao pedido deduzido em sede de liquidação nos artigos 48º a 72º da PI não violou o caso julgado, uma vez que decidiu conforme a sentença declarativa”.
Vejamos.
1.3.1. Alegando que, “conforme se decidiu na douta sentença de 2008.02.08, o valor das parcelas em causa inclui, de acordo com o disposto no art. 30º do CE 91, “o prejuízo decorrente da interrupção da actividade levada a cabo no prédio ou do conjunto da exploração agrícola efectuada directamente pelo proprietário” (v. fls. 8 da sentença” (cfr. artigo 48º do requerimento de liquidação), as autoras/recorrentes procederam à indicação dos prejuízos que (alegadamente) suportaram com a interrupção da actividade que desenvolviam nas parcelas 112, 114 e 155 (cfr. artigos 55º a 63º do requerimento de liquidação) e nos 30.000 m² ocupados (cfr. artigos 64º a 72º do requerimento de liquidação), prejuízos esses que incluem no valor peticionado a final.
O TAC de Lisboa absolveu a ré da instância relativamente a esse pedido, em virtude de ter julgado “procedente a excepção de falta de título judicial”, o que fez com a seguinte fundamentação:
“As autoras procedem nos artigos 48º a 72º, da petição inicial, à indicação dos prejuízos - procedendo à indicação da quantia em que avaliam os mesmos - pela interrupção da actividade nas parcelas 112, 114 e 115 e nos 30 000 m² ocupados.
Argumentam as mesmas que na sentença proferida em 8.2.2008 foi-lhes reconhecido o direito a serem indemnizados por esses prejuízos, já que na mesma - cfr. fls. 724, dos autos - se afirmou que:
“E embora não pudessem ser integradas no cálculo da indemnização as benfeitorias necessárias ou úteis posteriores à declaração de utilidade pública (4º/5, do CExp/91), já se tornaria relevante para a actualização daquela à data da decisão final do processo a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, ocorrida após a declaração de utilidade pública (23º/1), a depreciação da parte não expropriada em consequência de divisão do prédio, os encargos ou prejuízos resultantes da expropriação (28º/2), o prejuízo decorrente da interrupção da actividade levada a cabo no prédio ou do conjunto da exploração agrícola efectuada directamente pelo proprietário (30º)”(sublinhado nosso), apenas relegando para momento posterior a sua liquidação, razão pela qual nos referidos artigos 48º a 72º procede à concretização do montante da indemnização devida.
Falece a razão às autoras como se passa a demonstrar.
Com efeito, o parágrafo supra transcrito, da sentença proferida em 8.2.2008 - sendo que a autora assenta a sua argumentação na parte em que é invocado o art. 30º, do Código das Expropriações -, apenas está a descrever em termos abstractos a forma de cálculo da indemnização nas expropriações, independentemente da sua aplicação ao caso vertente.
Só alguns parágrafos mais à frente é que a referida sentença explica que danos são indemnizáveis e o modo de cálculo da indemnização devida.
De facto, nessa sentença - cfr. fls. 726 e 727, dos autos - escreveu-se nomeadamente o seguinte:
“(…) Concluindo-se assim, como se concluiu, que no caso sub judice a indemnização a atribuir às AA. deverá ter como bitola o valor das parcelas ocupadas à data da DUP, tendo em conta todas as circunstâncias ou condições de facto existentes nessa data, devidamente actualizada em função da evolução do índice de preços no consumidor, incluindo a eventual depreciação na parte sobrante dos prédios.
(…)
Como as AA. peticionam o pagamento de juros moratórios sobre o valor dos terrenos, obviamente que a actualização dos respectivos montantes terá de ser feita por uma de duas vias: através da contabilização de juros moratórios, se inferiores ao montante global que resultaria da actualização em função da variação do índice de preços no consumidor (assim se respeitando a dimensão do pedido), ou pelo valor desta, no caso inverso.
Estabelecida a indemnização nestes termos, nenhuma outra cabe às AA., quer por lucros cessantes, quer pela perda de árvores existentes nos terrenos, ou mesmo pela mora no atraso do pagamento da indemnização, na medida em que esta, apurada por referência à data da DUP deve ser actualizada nos termos referidos. (…).” (sombreados nossos).
Do exposto decorre que é expressamente afastada, na fundamentação da sentença de 8.2.2008, a indemnização por lucros cessantes alegados pelas autoras - a título de prejuízos pela interrupção da actividade -, sendo que estas apenas têm direito ao valor das parcelas ocupadas à data da DUP, devidamente actualizado em função da evolução do índice de preços ao consumidor (ou em função da taxa de juros moratórios legais, se de valor inferior), incluindo a eventual depreciação na parte sobrante dos prédios, ou seja, a pronúncia condenatória não abarca os prejuízos que as autoras liquidam nos artigos 48º a 72º, da petição inicial.
Ou dito de outro modo, nesses artigos as autoras liquidam danos que não foram apurados - tendo sido expressamente afastados - na sentença proferida em 8.2.2008, isto é, inexiste título judicial que justifique a liquidação de danos constante dos artigos 48º a 72º, da petição inicial”.
Ou seja, o Tribunal a quo entendeu que a pronúncia condenatória contida na sentença de 8/02/2008 abrange apenas a indemnização reportada ao valor das parcelas ocupadas pela ré à data da DUP, actualizada em função da evolução do índice de preços ao consumidor, na qual não se incluem os prejuízos resultantes da interrupção da actividade aí desenvolvida.
1.3.2. Desde já se adianta que o Tribunal a quo não fez uma correcta interpretação do alcance da condenação operada pela sentença liquidanda, incorrendo em erro de julgamento.
Explicitando.
A questão que aqui se coloca é, à semelhança da anterior, a de saber se a condenação que resulta da sentença do TAC de Lisboa de 8/02/2008 abrange os prejuízos alegadamente sofridos pelas autoras/recorrentes em resultado da interrupção da actividade que desenvolviam nas parcelas 112, 114 e 155 e nos 30.000 m² ocupados pela ré.
Tudo passa, pois, por interpretar a sentença liquidanda por forma a determinar o sentido e alcance da condenação nela contida.
Vejamos então.
Admitindo que as recorrentes/autoras têm direito a ser indemnizadas pela ocupação das parcelas em causa, o TAC de Lisboa, na sentença de 8/02/2008, tratou de seguida a questão de saber em que termos é que tal direito deve ser efectivado. E fê-lo da seguinte forma:
“Em circunstâncias normais a indemnização teria sido arbitrada pelo tribunal judicial competente, fazendo uma adequada restauração da lesão patrimonial sofrida pelas AA através de critérios de objectividade (…).
E embora não pudessem ser integradas no cálculo da indemnização as benfeitorias necessárias ou úteis posteriores à declaração de utilidade pública (4º/5 do CExp/91), já se tornaria relevante para a actualização daquela à data da decisão final do processo a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, ocorrida após a declaração de utilidade pública (23º/1), a depreciação da parte não expropriada em consequência de divisão do prédio, os encargos ou prejuízos resultantes da expropriação (28º/2), o prejuízo decorrente da interrupção da actividade levada a cabo no prédio ou do conjunto da exploração agrícola efectuada directamente pelo proprietário (30º).
Mas como à indemnização por DUP corresponde uma transferência do direito de propriedade, a fase judicial do processo de expropriação litigiosa comportaria também a adjudicação judicial das parcelas expropriadas ao expropriante.
Não foi isto, porém, o que sucedeu, visto que o processo de expropriação não chegou a bom termo, não tendo havido transferência da propriedade privada para a entidade expropriante, embora se mantenha por razões óbvias a utilidade pública que justifica a expropriação.
(…)
Estando a ré na posse dos terrenos, permanecendo a utilidade pública que determinou a respectiva declaração (que sempre impediria, caso a expropriação se tivesse completado, a aplicação do instituto da reversão), apenas não tendo sido paga a correspondente indemnização, parece-nos evidente que a única solução será atribuí-la tendo em conta os parâmetros legais da sua fixação em processo expropriativo, em que pacificamente se aceita que o princípio basilar é o da justa indemnização “corresponder ao valor comum do bem expropriado ou, por outras palavras, ao respectivo valor de mercado ou ainda ao seu valor de compra e venda”, pois como diz Marcelo Caetano: “No património onde estava o imóvel, a entidade expropriante põe o seu valor pecuniário”. Tendo sempre em consideração, como se disse, o princípio da contemporaneidade.
O que no caso em apreço significa que as parcelas objecto de DUP (112, 114, 115) devem ser valoradas segundo os mesmos critérios que serviriam para determinar o seu valor em sede de processo expropriativo e acima referidos a este propósito.
E no que toca à parcela adicional referida na al. i) de 30.000 m²? Como não há notícia de a mesma ter sido ocupada transitoriamente (e, portanto, devolvida às AA.), parece que a solução será a de a considerar imprescindível, conjuntamente com as demais, para a construção da via rodoviária que esteve na base da DUP. E sendo assim o melhor caminho será, a nosso ver, aplicar à determinação do seu valor o mesmo raciocínio que se entende ajustado à definição do valor das restantes”.
Ou seja: partindo das premissas de que (i) o processo expropriativo não chegou a bom termo, não tendo ocorrido transferência da propriedade, (ii) mantém-se a utilidade pública que justifica a expropriação, (iii) a ré está na posse dos terrenos e (iv) não foi paga a correspondente indemnização, concluiu o TAC de Lisboa que a determinação do valor das parcelas 112, 114 e 115, bem como da parcela com 30.000 m² deve ser feita por aplicação dos mesmos critérios que serviriam para apurar o seu valor em sede de processo expropriativo anteriormente referidos. Ora, um desses critérios é precisamente “o prejuízo decorrente da interrupção da actividade levada a cabo no prédio ou do conjunto da exploração agrícola efectuada directamente pelo proprietário (30º)”.
Dúvidas não há, pois, que a sentença do TAC de Lisboa, pese embora não tenha procedido ao apuramento quantitativo do valor das referidas parcelas, fixou de que forma o mesmo deve ser efectuado. E fê-lo de maneira assaz explícita ao referir que as parcelas “devem ser valoradas segundo os mesmos critérios que serviriam para determinar o seu valor em sede de processo expropriativo e acima referidos a este propósito”, sendo que entre esses critérios está a indemnização devida pela interrupção da actividade.
É certo que, mais adiante se refere na sentença liquidanda que “no caso sub judice a indemnização a atribuir às AA. deverá ter como bitola o valor das parcelas ocupadas à data da DUP, tendo em conta todas as circunstâncias ou condições de facto existentes nessa data, devidamente actualizada em função da evolução do índice de preços no consumidor, incluindo a eventual depreciação na parte sobrante dos prédios.
(…)
Estabelecida a indemnização nestes termos, nenhuma outra cabe às AA., quer por lucros cessantes, quer pela perda de árvores existentes nos terrenos, ou mesmo pela mora no atraso do pagamento da indemnização, na medida em que esta, apurada por referência à data da DUP deve ser actualizada nos termos referidos”.
Contudo, daí não resulta, como se entendeu no despacho-saneador recorrido, que a sentença liquidanda tenha expressamente afastado a indemnização a título de prejuízos pela interrupção da actividade e estabelecido que as recorrentes/autoras “apenas têm direito ao valor das parcelas ocupadas à data da DUP, devidamente actualizado em função da evolução do índice de preços ao consumidor”.
Não oferece qualquer dúvida que a sentença de 8/02/2008 do TAC de Lisboa, condenou a ré a pagar às autoras o valor das parcelas referidas supra em II.1.e) [parcelas 112, 114, 115], bem como o valor da área de terreno referida supra em II.1.i) [terreno com 30.000 m²]. O cerne da questão está em saber como determinar esse valor, que critérios seguir nessa operação. E a sentença liquidanda não deixa quaisquer dúvidas a este propósito quando refere que as parcelas em causa “devem ser valoradas segundo os mesmos critérios que serviriam para determinar o seu valor em sede de processo expropriativo e acima referidos (sublinhados nossos).
O despacho-saneador recorrido errou, pois, ao concluir que nos artigos 48º a 72º da petição inicial “as autoras liquidam danos que não foram apurados - tendo sido expressamente afastados - na sentença proferida em 8.2.2008, isto é, inexiste título judicial que justifique a [sua] liquidação” e, por isso, que procede a “excepção de falta de título judicial na parte referente ao pedido de condenação da ré no pagamento de indemnização pelos prejuízos relativos à interrupção da actividade”.
Concluímos, assim, que o recurso merece provimento nesta parte, sendo, em consequência, revogado o despacho-saneador recorrido e julgada improcedente a referida excepção.
Significa isto que o pedido formulado a final pelas autoras/recorrentes no presente incidente de liquidação, na parte que contende com a indemnização dos prejuízos relativos à interrupção da actividade, é admissível, pelo que sobre ele deve ser emitida uma pronúncia. Sucede que, os factos relevantes para o efeito - alegados pelas autoras nos artigos 48º a 72º da petição inicial e expressamente impugnados pela ré - não foram considerados pelo Tribunal a quo no momento da fixação dos factos assentes e da elaboração da base instrutória da causa (dado ter julgado procedente a referida excepção) e, consequentemente, sobre os mesmos não foi produzida prova. Deste modo, os autos não fornecem os elementos necessários para a prolação de decisão, pelo que devem baixar ao TAC de Lisboa a fim de se proceder à selecção dos factos relevantes para a apreciação do pedido formulado no incidente de liquidação, à instrução do processo, e à prolação de decisão, considerando a admissibilidade do pedido com referência aos prejuízos alegados nos artigos 48º a 72º da petição inicial, ficando, por ora, prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas.
*

SUMÁRIO:

I - O incidente de liquidação destina-se a uma mera quantificação dos danos já apurados na acção anteriormente intentada, não podendo o autor peticionar o pagamento de quantia destinada a indemnizar outros danos; ou seja, o âmbito e o objecto do incidente de liquidação mostra-se balizado pelos termos da decisão liquidanda.
II - Apurando-se, na sequência da dedução de incidente de liquidação, que o valor indicado na acção não corresponde à utilidade económica do pedido, deve proceder-se à sua correcção.


DECISÃO

Nestes termos, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar o despacho-saneador recorrido e determinar a baixa dos autos ao TAC de Lisboa a fim de:
a) Proferir despacho a fixar o valor da causa, apurados que sejam os elementos necessários para o efeito (cfr. ponto 1.1.3. supra);
b) Proferir despacho convidando as autoras a aperfeiçoar o requerimento inicial, nos termos atrás referidos (cfr. ponto 1.2.2. supra)
c) Proferir despacho seleccionando os factos alegados nos artigos 48º a 72º da petição inicial relevantes para a apreciação do pedido formulado no incidente de liquidação, (cfr. ponto 1.3.2. supra),
seguindo-se os demais termos do processo.
Custas pela recorrida.

Lisboa, 21 de Abril de 2016


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(Conceição Silvestre)





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(Cristina dos Santos)


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(Paulo Pereira Gouveia)