Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:223/05.6BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:05/22/2019
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IVA;
DEDUÇÃO;
ELEMENTOS A INCLUIR NO DENOMINADOR DA RESPECTIVA FRACÇÃO.
Sumário:I. Tendo a Administração Tributária calculado o pro-rata com englobamento no denominador dos dividendos auferidos pela recorrente - SGPS- o cálculo desse pro-rata ofende o disposto no artigo 23º, nº 4 do CIVA, pelo que as liquidações posteriormente efectuadas com base naquele cálculo são ilegais, devendo, por isso ser anuladas.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 1ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I.RELATÓRIO
A FAZENDA PÚBLICA veio interpor o presente recurso jurisdicional da sentença do TRIBUNAL TRIBUTÁRIO DE LISBOA que julgou procedente a impugnação judicial apresentada por « ESTABELECIMENTOS J................, SGPS, S.A.», na sequência do indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra a liquidação adicional de IVA e respectivos juros compensatórios, referente ao ano de 1997, no montante global de €39.013,77.

São as seguintes as CONCLUSÕES da recorrente:

«I-Pelo elenco de razões acima arroladas, ressalvando-se sempre melhor entendimento e, o devido respeito, infere-se que a sentença proferida pelo Tribunal “ad quo” julgou procedente o pedido da impugnante com visível déficit instrutório e, lavrando em erro no que concerne à apreciação da matéria de facto.

II-Todavia, se devidamente analisados os factos pertinentes à apreciação e formação da decisão da causa, prevaleceria uma fundamentação diferente, afastados que foram determinados factos da selecção sendo outros objeto de uma análise crítica deficiente.

III-No presente caso foi entendido que a questão controvertida consiste em apreciar e decidir ”- Se a dedução de IVA efectuada pela impugnante deve observar o cálculo do pro rata efectuado pela inspecção Tributária, imputando no denominador da fracção, os dividendos distribuídos pelas sociedades filiais à impugnante (SGPS) que está sujeita a imposto (IVA), relativamente a outras actividades que fornece a estas filiais, serviços de gestão”.

IV-Nessa senda, decidiu-se o Tribunal Tributário pela procedência do pedido, entendendo que:

“Quer isto dizer que tendo a inspecção Tributária procedido à correcção da contabilidade da impugnante no que respeita à dedução do IVA para o exercício de 2007, não obstante o entendimento da impossibilidade do método da utilização do método da afectação real utilizado pela impugnante, ao ter efectuado a correcção do cálculo pro-rata, incluindo os dividendos percebidos pela impugnante no denominador da fracção definida no nº4 do artº23º do CIVA, violou o entendimento jurisprudencial comunitário atinente a esta matéria”

V-Contudo neste conspecto, a jurisprudência europeia, não é unânime acerca da matéria, contrariamente ao proferido pela decisão recorrida; pois que, com o devido respeito há que ter em atenção que ao analisar as decisões do TJUE, nunca se deve perder de vista que o Tribunal se debruça sobre casos concretos que lhe são submetidos e que os factos subjacentes a esses casos têm uma importância primordial na motivação da decisão do Tribunal.

VI-A verdade é que as operações sobre acções e obrigações (dividendos, juros, transacção de acções e obrigações) embora em regra não confiram direito à dedução apresentam, nalguns casos, excepções.

VII-A propósito refira-se o caso Floridienne/Berginvest, onde a questão prejudicial era a de saber se os dividendos de acções (e os juros dos empréstimos) devem ser sempre excluídos do denominador do prorata na hipótese de a sociedade holding que os recebe interferir na gestão das participadas e, se os dividendos recebidos podem ser considerados contrapartida de serviços prestados pela sociedade às participadas.

VIII-Como se concluiu a “intervenção de uma holding na gestão das suas filiais apenas constitui uma actividade económica na acepção do artigo 4º, n°2, da Sexta Directiva, na medida em que implique transacções sujeitas a IVA nos termos do artigo 2° dessa directiva” (Welthgrove, resposta à primeira questão).
Considerando-se “como actividade económica na acepção do artigo 4°, n°2, da Sexta Directiva a intervenção na gestão das filiais, na medida em que implique transacções sujeitas ao IVA, nos termos do artigo 2° dessa directiva; tais como: o fornecimento de serviços administrativos, contabilísticos e informáticos pela Floridienne e Berginvest às suas filiais.” (Floridienne /Berginvest , nº19).

IX-Em suma, o TJCE respondeu já que, para que os dividendos pudessem entrar no âmbito de aplicação do IVA, necessário seria que pudessem ser considerados contrapartida de actividade económica, o que pressupõe a existência de um nexo directo entre a actividade exercida e o contravalor recebido.

X-O TJCE também já concluiu competir sempre ao órgão jurisdicional de reenvio apurar, se, no processo principal, as operações de empréstimo são de natureza tal que devam ser excluídas da actividade económica.

XI-E, a “intervenção de uma holding na gestão das suas filiais apenas constitui uma actividade económica na acepção do artigo 4º, n°2, da Sexta Directiva, na medida em que implique transacções sujeitas a IVA nos termos do artigo 2° dessa directiva” (Welthgrove).

XII-Para tal, deve considerar-se “como actividade económica na acepção do artigo 4°, n°2, da Sexta Directiva a intervenção na gestão das filiais, na medida em que implique transacções sujeitas ao IVA nos termos do artigo 2° dessa directiva, tais como o fornecimento de serviços administrativos, contabilísticos e informáticos” pela holding às suas filiais.” (Floridienne/Berginvest, nº19).

XIII-A sentença recorrida, partindo do princípio de que fora considerada a inclusão dos dividendos no denominador da fracção para o cálculo do pro-rata (pontos I, K e M do probatório) não apurou a factualidade imprescindível para suporte da decisão de direito que tomou, caindo em erro de julgamento.

XIV-Padecendo de déficit instrutório face à insuficiência da matéria de facto porque não contém os factos pertinentes à decisão da causa, deve a sentença ser anulada (cfr. art.662º do CPC, por força do art.º 2.º alínea e) do CPPT).

XV-Ao apurar-se que a liquidação não é ilegal, não serão devidos juros indemnizatórios.

XVI-Pelo que, o douto Tribunal “ad quo”, não este ou a sua fundamentação de facto e de direito nem de acordo com a prova constante nos autos falhando na selecção dos factos, nem conforme já exposto, ampliando a base instrutória para boa interpretação e aplicação da lei e, nessa medida, a decisão deve ser afastada da ordem jurídica.

Porém, V. EXAS DECIDINDO FARÂO A COSTUMADA JUSTIÇA.»


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A Sociedade Recorrida apresentou contra-alegações, propugnando pela improcedência do recurso, mantendo-se integralmente a sentença recorrida, por não merecer qualquer tipo de censura e formulou as seguintes CONCLUSÕES: [por nós renumeradas a partir da 4ª]:

«1.ª A recorrente entende que o Tribunal ad quo julgou procedente o pedido da impugnante com visível deficit instrutório e lavrando em erro no que concerne à apreciação da matéria de facto.

2.ª Todavia, sobre este ponto, a recorrente apenas afirma que "se devidamente analisados os factos pertinentes à apreciação e formação da decisão da causa, prevaleceria uma fundamentação diferente, afastados que foram determinados factos da selecção sendo outros objeto de uma análise crítica deficiente".

3.ª Já quanto à questão que identifica como sendo a questão controvertida a apreciar e decidir - a de saber se a dedução de IVA efectuada pela impugnante deve observar o cálculo do pro rata efectuado pela inspecção Tributária, imputando no denominador da fracção, os dividendos distribuídos pelas sociedades filiais à impugnante (SGPS) que está sujeita a imposto (TVA), relativamente a outras actividades que fornece a estas filiais, serviços de gestão - a recorrente afirma, ao contrário do que vem dito na sentença recorrida e sem mais materialização, que "a jurisprudência europeia, não é unânime acerca da matéria, pois que, com o devido respeito há que ter em atenção que ao analisar as decisões do TJUE, nunca se deve perder de vista que o Tribunal se debruça sobre casos concretos que lhe são submetidos e que os factos subjacentes a esses casos têm uma importância primordial na motivação da decisão do Tribuna!.

4.ª Em jeito de concretização, a recorrente refere, com respeito às operações sobre acções e obrigações (dividendos, juros, transacção de acções e obrigações) que o "TJCE também já concluiu competir sempre ao órgão jurisprudencial de reenvio apurar, se, no processo principal, as operações de empréstimo são de natureza tal que devam ser excluídas da actividade económica” e que "a intervenção de uma holding na gestão das suas filiais apenas constitui uma actividade económica na acepção do artigo 4 º, nº 2, da Sexta Directiva, na medida em que implique transacções sujeitas a IVA nos termos do artigo 2º dessa directiva".

5.ª Para tal, defende a recorrente, "deve considerar-se como actividade económica na acepção do artigo 40, nº2, da Sexta Directiva a intervenção na gestão das filiais, na medida em que implique transacções sujeitas ao IVA nos termos do artigo 2º dessa directiva, tais como o fornecimento de serviços administrativos, contabilísticos e informáticos pela holding às suas filiais. ".

6.ª A este respeito e sobre a decisão recorrida, a Fazenda Pública acusa-a de não ter apurado a factualidade imprescindível para suporte da decisão de direito que tomou, caindo em erro de julgamento, de não ter saneado a factualidade susceptível de preencher as condições impostas pela jurisprudência comunitária de modo a considerar legal a dedução do imposto realizada -nomeadamente, a existência de um nexo direito entre a actividade exercida e o contravalor recebido -, sustentando, com efeito, que a mesma seja anulada por vício de julgamento.

7.ª Entende a recorrida, contudo, que a decisão de que vem interposto o presente recurso não merece censura na apreciação que faz dos factos provados por via documental e no direito mobilizável, não lhe sendo imputável qualquer erro de julgamento de facto e de direito, por a mesma se encontrar em conformidade com as exigências de fundamentação impostas pelo artigo 123º do CPPT e pelos nº 2 e 3 do artigo 659º do CPC, ou, bem assim, qualquer nulidade das previstas no artigo 125º do CPPT e no artigo 668º do CPC.

8.ª Na verdade, não pode deixar de reconhecer-se que, não só a sentença é eximia no modo como identifica o objecto de litígio, sintetiza a pretensão da impugnante e a posição do representante da Fazenda Pública e os respectivos fundamentos, como o é no modo como fixa a questão que ao tribunal cumpre solucionar e no modo como fundamenta - de facto e de direito - as suas decisões.

9.ª Em rigor, o tribunal, depois de proceder, como sempre se lhe imporia, a uma avaliação da aptidão dos factos para integração de normas mobilizáveis na discussão das questões jurídicas suscitadas, criou uma convicção probatória que verteu - de um modo, de resto, não contestado pela Fazenda Pública nas alegações de recurso apresentadas -, no capítulo que destinou à factualidade provada. Uma vez dado este passo, o tribunal recorrido concretizou a sua motivação numa exposição de direito fundamentada e rigorosamente balizada pelos factos que deu como estabilizados quanto ao seu valor probatório em capítulo autónomo e prévio.

10.ª A motivação apresentada pelo tribunal na sentença recorrida corresponde, de facto, a todas as exigências de clareza e transparência da justiça, permitindo a todos os interessados o acompanhamento linear da forma como se desenvolveu o raciocínio que culminou com a sua decisão sobre a matéria de facto e, também, sobre a matéria de direito.

11.ª Aliás, em rigor, não chega a ser sequer esta a razão do inconformismo da recorrente, porquanto não é possível identificar, em todo o seu articulado de alegação, uma única crítica ao modo como a sentença se encontra fundamentada, ao modo como a matéria de facto se encontra valorada ou, finalmente, ao modo como é a mesma fundida no itinerário cognoscitivo percorrido pelo tribunal na tomada de decisões em matéria de direito.

12.ª A recorrente não foi, de facto, capaz, nas suas alegações, de especificar qual o facto ou quais os factos mal valorados pelo Tribunal ou insuficientemente considerados e quais deles poderiam ter contribuído para uma decisão de sentido oposto.

13.ª Com efeito, quando, nas suas alegações, a AT refere que o Tribunal ad quo julgou procedente o pedido da impugnante com visível deficit instrutório e lavrando em erro no que concerne à apreciação da matéria de facto, ter-lhe-ia sido exigível que identificasse em que consiste, em concreto, o referido deficit instrutório, quais os factos sobre que o Tribunal decidiu com erro, quais aqueles de que se deveria ter prevalecido e não prevaleceu, qual o sentido certo que deles deveria ter sido extraído.

14.ª A alegação da recorrente a este respeito é meramente conclusiva, não se encontrando minimamente demonstrada, pelo que não poderá ser atendida.

15.ª Além de não existir qualquer erro de julgamento de facto, na Sentença não é, além disso, possível identificar um qualquer erro de julgamento de direito, susceptível de gerar a sua anulabilidade.


ASSIM:

16.ª As holdings "puras" são as que se limitam a receber dividendos das suas participadas, sem se imiscuir na respectiva gestão e as holdings "mistas", em contrapartida, são as que se não limitam à mera detenção de participações sociais, exercendo alguma actividade de gestão ou prestação de serviços às sociedades suas afiliadas.

17.ª As primeiras não são sujeitos passivos de IVA, por a simples tornada de participações em outras sociedades não constituir uma actividade económica, na acepção dos n.ºs 1 e 2 do artigo 4º da Sexta Directiva, e assim não preencher a hipótese de incidência subjectiva do imposto.

18.ª Os dividendos não constituem, neste caso, contrapartida de uma actividade económica; a sua recepção é uma mera consequência passiva da propriedade das participações, que não envolve um mínimo de actividade, de decisão económica, de emprego de bens e serviços sujeitos a IVA que a exploração de um bem supõe.

19.ª É por isso que, de acordo com o nº1 do artigo 20º do Código do IVA, e com o nº2 do artigo 17º da Sexta Directiva, as holdings puras não estão autorizadas a deduzir ou recuperar qualquer imposto suportado a montante.

20.ª Já, pelo contrário, se deve entender que as holdings "mistas" são sujeitos passivos de IVA.

21.ª Nestes termos, não faz sentido tratar as SGPS como se lhes correspondesse uma isenção subjectiva - que, de resto, não existe na mecânica do IVA -, capaz de estender-se a todas e quaisquer operações por elas praticadas.

22.ª É esta, aliás, a posição unânime da actual Jurisprudência Comunitária.

23.ª De acordo com os termos da sua actividade identificados na petição inicial, a Impugnante afigurava-se, à data a que se reportam os factos, indubitavelmente, como uma holding "mista". Com efeito, a sua interferência na gestão das sociedades participadas era reiterada e relevante, nomeadamente através da cooperação na definição da sua estratégia e na prestação de serviços remunerados, para o que frequentemente necessitava, por sua vez, de adquirir de terceiros fornecimentos e serviços da mais variada natureza, por exemplo nas áreas da auditoria, da comunicação institucional e da assessoria legal, fiscal e financeira.

24.ª Consciente de que a realidade apresenta inúmeros exemplos de sujeitos passivos que não podem deduzir integralmente o imposto suportado nos seus inputs, justamente porque uma parte deles se encontra relacionada com actividades não sujeitas ou isentas de IVA (como é o caso, desde logo, das holdings "mistas"), o legislador tratou de deixar expressa uma solução procedimental que permite a esses sujeitos passivos uma dedução parcial.

25.ª De acordo com o nº1 do artigo 23º do Código do IVA, sempre que um sujeito passivo efectue, no exercício da sua actividade, transmissões de bens e prestações de serviços, parte das quais não confira direito à dedução, o imposto suportado nas aquisições é dedutível apenas na percentagem que corresponder ao montante anual de operações que dêem lugar a dedução.

26.ª Desenvolvendo este princípio, estatui o nº4 do mesmo preceito que aquela percentagem de dedução deverá resultar de uma fracção que comporte, no numerador, o montante anual, imposto excluído, das transmissões de bens e prestações de serviços que dêem lugar a dedução nos termos do nº1 do artigo 19º e 20º do Código do IVA, e, no denominador, o montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo, incluindo as isentas ou fora do campo do imposto, designadamente as subvenções não tributadas que não sejam subsídios de equipamento.

27.ª Este procedimento- normalmente designado por pro rata -não é, no entanto, o único que permite a modelação do direito de dedução de IVA dos sujeitos passivos "mistos", prevendo ainda a lei, no nº2 daquele artigo 23º, o método da afectação real, ao abrigo do qual, em resumo, se discrimina na contabilidade das empresas os bens e serviços utilizados nas operações sujeitas e não isentas de imposto, assim obtendo um direito de dedução circunscrito a esses bens e serviços.

28.ª A questão central em discussão no presente recurso prende-se, com efeito, com a admissibilidade da inclusão dos dividendos no denominador da equação usada para efeitos do apuramento da percentagem de dedução do IVA subjacente aos custos comuns aos sectores de actividade sujeitos/não isentos e sujeitos/isentos de IVA, sempre que em causa está - se justifica - a utilização do método do pro rata.

29.ª E, a este respeito, não pode senão a resposta àquela questão ser dada em consonância com as orientações unânimes sustentadas pela jurisprudência nacional e comunitária, segundo as quais no denominador da fracção de cálculo do pro rata "não devem ser incluídos os dividendos e os juros auferidos pelas holdings. 3. Tendo a Administração Tributária calculado o pro-rata com englobamento no denominador dos dividendos e juros auferidos pela recorrente - SGPS- o cálculo desse pro-rata ofende o disposto no artº23º, nº4 do CIVA, pelo que as liquidações posteriormente efectuadas com base naquele cálculo são ilegais, devendo, por isso ser anuladas.".

TERMOS EM QUE DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO IMPROCEDENTE, POR NÃO PROVADO, E A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA INTEGRALMENTE MANTIDA.».


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Foi dada vista ao MINISTÉRIO PÚBLICO e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer a fls.244/245 dos autos, no sentido da improcedência do recurso.

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Foram colhidos os vistos das Exmas Juízas Adjuntas, pelo que vem o processo submetido à Secção do Contencioso Tributário para julgamento do recurso já que nada obsta.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
De harmonia de com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do Recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Assim, e face ao teor das conclusões formuladas a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões:
- défice instrutório face à insuficiência da matéria de facto fixada;
- errada apreciação da matéria de facto;
- errada interpretação e aplicação do artigo 23.º, n.º4 do CIVA.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A. DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:

«A)
A impugnante é uma sociedade gestora de participações sociais de outras sociedades com forma indirecta de exercício de atividade económica, denominada (SGPS), tendo entregue, em 27.04.1995 no serviço de finanças de Lisboa-..., uma Declaração de Alterações, e inscrito no quadro 11 o tipo de operações que iria efetuar, (transmissões de bens e prestações de serviços isentas ou não que confiram, ou não, direito à dedução) e o método de dedução de imposto a adotar (afectação real de parte dos bens e serviços utilizados combinação com a percentagem estimada – pro-rata);
(cfr. fls. 54 dos autos)

B)
Em cumprimento do Despacho n.º109/98 de 28.01.1998, do Ministro das Finanças e nos termos da al. c) n.º1 e n.º3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º249/98 de 11 de Agosto, foi efetuado o exame à escrita da impugnante «J................, SGPS, SA.», pela Inspeção Geral de Finanças, tendo sido efetuadas correções para efeito de Imposto sobre o Valor Acrescentado com o seguinte teor:

«(…)

4. SITUACÃO TRIBUTÁRIA

No quadro da análise promovida às contas da empresa na óptica fiscal, foram encontradas as seguintes irregularidades:

4.1-lmposto sobre o valor acrescentado (IVA)

Como já aludimos anteriormente, a sociedade em análise alterou a sua denominação social e o seu objecto contratual, dando disso, conhecimento, em 95 -04-27, à Repartição de Finanças do …° Bairro Fiscal de lisboa, pela entrega da Declaração de Alterações (Vd. Fls. 37/39.)

Deve notar-se que, foi mencionada a denominação social completa, evidenciando a sigla “SGPS”, que revela o seu objecto social bem como pelo preenchimento do quadro 11, o tipo de operações que iria efetuar (transmissões de bens e prestações de serviços isentas ou não que confiram, ou não, direito à dedução) e o método de dedução de imposto a adotar (afectação real de parte dos bens e serviços utilizados combinação com a percentagem estimada – pro-rata).

Nestes termos, parece-nos que, foram fornecidos à Administração Fiscal os elementos de facto essenciais ao seu enquadramento, em termos de regime de IVA.

Da análise efetuada, verificou-se que em 1997, o contribuinte utilizou no cálculo do IVA dedutível os seguintes procedimentos:

- dedução integral do imposto concernente às aquisições de bens ou serviços que, segundo o critério da empresa (afetação real), estariam relacionadas com a parte sujeita da atividade.

- dedução mediante a aplicação de um pro rata ao IVA inerente a determinados custos associados a gastos comuns (ex. água, eletricidade, artigos de escritório, produtos de limpeza, etc.,), tendo sido calculado em função do número de pessoas adstritas ao departamento financeiro que controla esse tipo de custos e o número de pessoas da SGPS.

- Não dedução do imposto quanto às despesas previstas no artigo 21 do CIVA.

A fls.41, consta o processo de cálculo, efetuado pela empresa, do pro rata definitivo relativo a 1997, bem como o procedimento quento à dedução integral do IVA ou a dedução sujeita ao pro rata.

Assim a SGPS procedeu, em 1997, ao pagamento aos fornecedores de impostos no montante de 9.677.133$00 (vd. Fls. 45), do qual deduziu 9.400.367$00 (9.677.133$00-276.766$00), com base no pro rata provisório de 97,1% (3). No final daquele ano, de acordo com o cálculo do pro rata definitivo, que em termos mensais, variou entre 95,9% e 97,2%, verificou que tinha deduzido a mais a quantia de 59.050$00, pelo que efetuou o respetivo lançamento de correção (vd. Fls. 40/44).

Consequentemente, o imposto deduzido pela sociedade foi de 9.341.317$00 (9.677.133$00 - (376.766$00+59.050$00).

O procedimento descrito parece estar em concordância com o conteúdo mencionado na Declaração de Alterações antes referida, contudo, somo da opinião que a SGPS estava obrigada, para efeitos de cálculo do pro rata, a dar cumprimento ao preceituado no n.º4 do art.º23 do CIVA, isto é, a percentagem de dedução de imposto resulta de uma fração que comporta no numerador, o montante anual, imposto excluído, das transmissões de bens e prestações de serviços que dão lugar à dedução nos termos do artigo 19º e n.º1 do artigo 20º e, no denominador, o montante anula, imposto excluído, de todas as operações efetuadas pelo sujeito passivo, incluindo as operações isentas ou fora do campos do imposto.

Caso a empresa tivesse seguindo o processo de cálculo do pro rata preconizado no n.º4 do art.º23 do CIVA, só teria direito à deduzir imposto no montante de 3.580.539$00 (vd. Fls. 45).

Deste modo, em resultado do incorrecto apuramento do cálculo do pro rata no exercício de 1997, foi deduzido indevidamente imposto no montante de 5.761.778$00 (9.341.317$00-3.580.539$00), que inscreveu nas declarações periódicas de IVA. (…)»

(cfr. fls. 54 a 56 do PA junto aos autos)


C)
Com base no Relatório da IGF remetido aos Serviços de Inspeção Tributária da ….ª Direção de Finanças de Lisboa, foi efetuada, através da Ordem de Serviço nº......... a fim de, em face do entendimento ali descrito serem promovidas as diligências necessárias às correções, em sede de IVA, em referência ao exercício de 1997, cujo teor se dá por reproduzido.
(cfr. fls. 34 a 42 do PA junto aos autos)

E)
Em 29.08.2000, através do ofício n.º 4…, a impugnante foi notificada para exercer o contraditório/direito de audição;
(cfr. fls. 96 do PA junto aos autos)

F)
Em resultado das referidas correções foram efetuadas as liquidações de IVA nº................. no valor de €28.734,64 (5.760.778$00) com data limite de pagamento de 31.07.2001 e de Juros compensatórios n.º................., no valor de €10.279,13 (2.060.780$00) com data limite de pagamento, de 31.04.2001;
(cfr. fls. 30 e 33 do PA junto aos autos)

G)
Em 29.10.2001, a impugnante deu entrada no serviço de finanças de Lisboa-… de Reclamação Graciosa cujo teor se dá por reproduzido;
(cfr. fls. 2 a 28 do PA junto aos autos)

H)
Através do ofício n.º 3…. de 12.02.2002, a impugnante foi notificada para exercer o direito de audição do projeto de indeferimento da Reclamação Graciosa;
(cfr. fls. 184 do PA junto aos autos)

I)
Através do ofício n.º02… de 12.03.2003 a impugnante foi notificada da emissão de parecer da Direção de Serviços do IVA, da inclusão ou não dos dividendos no denominador da fração para o cálculo do pro-rata, cujo teor se dá por reproduzido;
(cfr. fls. 199 a 204 do PA junto aos autos)

J)
Através do ofício n.º2…. de 29.06.2004, a impugnante foi notificada para o exercício do direito de audição prévia;
(cfr. fls. 209 do PA junto aos autos)
K)
Em 14.07.2004 a impugnante deu entrada de petição na …ª Direção de Finanças de Lisboa, solicitando cópia da informação n.º2… de 17 de Dezembro de 1999 da Direção de Serviços do IVA, bem como do ofício n.º 2… de 12 de Março de 2003 e ainda a informação prestada por esta Direção de Serviços ao referido oficio;
(cfr. fls. 215 a 220 do PA junto aos autos)

L)
Em face desta petição foi notificada novamente para o exercício do direito de audição, através do ofício n.º 3…. de 23.09.2004;
(cfr. fls. 228 do PA junto aos autos)

M)
Através do Oficio n.º 01… de 10.01.2005, a impugnante foi notificada do indeferimento expresso da Reclamação Graciosa, através do Despacho do Diretor de Finanças Adjunto datado de 27.12.2004, de cujos fundamentos se retira:

«(…)

CONCLUSÃO E PROPOSTA DE CORREÇÃO

Assim somo do parecer que deverão anular-se parcialmente as liquidações de Iva e de Juros compensatórios nos montante de €25.938,99 e de €9.279,05, respetivamente, devendo a pretensão da reclamante ser Deferida Parcialmente.


*

Realizada a instrução do processo e apreciada a matéria controvertida, foi prestada a respetiva informação, tendo sido efetuado o correspondente projeto de decisão da reclamação em 05.12.2002;

O mesmo foi comunicado através de notificação efetuada à Reclamante por carta registada no dia 11.12.2002 (ver documento constante a fls. 184 do presente processo) para exercer, por escrito, o direito de audição prévia previsto no art.º60 da Lei Geral Tributária, dando-se assim cumprimento ao estabelecido no citado artigo e lei.

Para o exercício da quele direito, foi estabelecido o prazo de 10 dias contados desde o 3º dia útil, após aquele registo;

A notificação foi efetuada no dia 12.12.2002, nos termos do n.º3 do Art.º39 do CPPT (Fls. 185 dos autos). Assim sendo, o prazo para exercer o direito de audição terminou no dia 26.12.2002, sem que a Reclamante tenha vindo a exercer aquele direito;

Posteriormente à elaboração do projeto de decisão e não obstante a sua notificação à Contribuinte fomos confrontados com a existência d Informação n.º.… de 17.12.1999, da Direção de Serviços do Imposto sobre o Valor Acrescentado que, a pedido do Serviço de inspeção Tributária – Divisão .. da então …ª Direção de Finanças de Lisboa, se pronunciara, para efeito do calculo da percentagem da dedução do Imposto sobre o Valor Acrescentado, sobre a inclusão no denominador do Pro rata dos dividendos percepcionados por Sociedades Gestoras de Participações Sociais, vulgo SGPS, e da qual se junta fotocópia (v. Fls. 190 a Fls. 197).

Reconhecidas as divergências entre o projeto de decisão e a informação supra referenciada, foram os mesmos, a coberto do ofício n.º2… de 12.03.2003, remetidos à DSIVA, para ulterior sancionamento;

É então nos items 10 e 11 da informação prestada pela Direção de Serviços (cuja cópia integral se renete à Reclamante) que se lê o que só por facilidade de exposição se transcreve:

«Parecer

Concordo com as conclusões expendidas no presente Parecer, onde se reconhece que: 1º As disposições do CIVA que regulam o exercício do direito à dedução, designadamente no que se refere ao cálculo da percentagem de dedução, determinam ainda a inclusão no denominador da fração das “operações fora do campo do imposto”. 2º em face das constantes decisões do TJCE sobre a qualificação das operações de percepção de dividendos, à luz do disposto no Art.º 4º da 6.ª Diretiva, e das consequências daí extraídas no atinente à exclusão dos dividendos do denominador da fração que serve para o cálculo da percentagem de dedução, preconiza-se que superiormente seja ponderada a conveniência de um evolução legislativa nesta matéria.

À Consideração superior

29OUT2003

Diretora do Centro de Estudos Fiscais. (…)»

(cfr. doc. 3 junto com a PI)

N)
A impugnante deu entrada nos serviços da Administração Fiscal da Garantia Bancária n.º ..........., no montante de €55.975,66 emitida pelo Banco ................, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ................ instaurado no serviço de finanças de Lisboa-…;
(cfr. fls. 47 a 49 dos autos)
O)
Em 25.01.2005 a impugnante deu entrada neste tribunal da presente ação de impugnação onde tomou o número de registo 21754, conforme carimbo aposto no rosto da petição inicial;
(cfr. fls. 3 dos autos)
Factos não Provados
Não se provam outros factos com relevância para a presente decisão.

MOTIVAÇÃO
A matéria de facto, dada como assente nos presentes autos, foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida, segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito e, a formação da convicção do tribunal, para efeitos da fundamentação dos factos, atrás dados como provados, está referida no probatório com remissão para as folhas do processo onde se encontram».

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B.DE DIREITO
Segundo a recorrente a sentença sob recurso padece de uma insuficiência da matéria de facto, por não conter os factos penitentes à decisão da causa, determinante da sua anulação nos termos previstos no artigo 662.º do CPC. Não se desconhece que o preceito legal concede a este Tribunal de recurso amplos poderes para reapreciar, a matéria de facto. Todavia, da leitura das alegações de recurso e respectivas conclusões supra transcritas, constata-se que a recorrente não relaciona a alegada errada apreciação da matéria de facto com qualquer facto ponto concreto dos elencados na decisão da matéria de facto (como provados ou não provados), nem sequer indica qual ou quais os factos que entende por relevantes para a boa decisão da causa e que deveriam constar na matéria de facto.
Face a este, inquestionável “silêncio” e não vislumbrando este Tribunal para além dos factos fixados na sentença, existam outros, que porventura fossem relevantes para a boa decisão da causa segundo as possíveis soluções jurídicas da causa, a implicar a pretendida ampliação da decisão da matéria de facto, ou a eventual anulação da sentença (cfr. artigo 662.º, nºs 2, alínea c), e 3, alínea c) do CPC), sendo assim, improcede, por consequência, o pretendido aditamento à matéria de facto, mantendo-se a fixada na 1.ª instância.
Prosseguindo.
A recorrida foi objecto de exame à escrita que teve por objecto a verificação do cumprimento das obrigações relativas ao exercício de 1997, concluindo os Serviços de Inspecção que o valor dos dividendos não deveriam incluir o denominador da fracção prevista no artigo 23.º, n.º4 do CIVA,
Relembre-se que no presente litígio discute-se a legalidade da liquidação de IVA, relativo exercício de 1997, e respectivos juros compensatórios, colocando-se a questão de saber se a dedução de IVA efectuada pela impugnante deve observar o cálculo do pro rata efectuado pela Inspecção Tributária, imputando no denominador da fracção, os dividendos distribuídos pelas sociedades filiais à impugnante (SGPS) que está sujeita a imposto (IVA), relativamente a outras actividades e fornece a estas filiais serviços de gestão.
Dito de outra forma: os dividendos devem ou não ser considerados no denominador da equação utilizada para feitos do apuramento da percentagem de dedução do IVA?
Enfrentando esta mesma questão, o Tribunal de 1ª Instância acolhendo tanto a doutrina como a jurisprudência dos Tribunais superiores e do Tribunal de Justiça, veio a entender que: «[t]endo a inspeção tributária procedido à correção da contabilidade da impugnante no que respeita à dedução do IVA para o exercício de 2007, não obstante o entendimento da impossibilidade da utilização do método de afetação real utilizado pela impugnante, ao ter efetuado a correção do cálculo do pro rata, incluindo os dividendo percebidos pela impugnante no denominador da fração definida no n.º4 do art.º23 do CIVA, violou o entendimento jurisprudencial comunitário atinente a esta matéria.».
A tese da recorrente Fazenda Pública é a de que « [a] jurisprudência europeia, não é unânime acerca da matéria, contrariamente ao proferido pela decisão recorrida; pois que, com o devido respeito há que ter em atenção que ao analisar as decisões do TJUE, nunca se deve perder de vista que o Tribunal se debruça sobre casos concretos que lhe são submetidos e que os factos subjacentes a esses casos têm uma importância primordial na motivação da decisão do Tribunal [Conclusão V]
Clarifica-se desde já que é deslocada a argumentação da recorrente em torno do conceito de actividade económica (cfr. artigo 4.º, n.º2 da Sexta Directiva). Com efeito, no caso vertente, a fundamentação da correcção centrou-se unicamente na aplicação do artigo 23.º, n.º4 do CIVA, isto é, se no cálculo do pró-rata se mostra efectuado em conformidade com aquele dispositivo legal.
Esclarecido este ponto, passemos à apreciação das questões que integram as conclusões de recurso.
Como já afirmámos no Acórdão deste Tribunal Central de 17.01.2019, proferido no processo n.º 552/17.6BESNT: «Antecipa-se, sem dificuldade, que o Tribunal de Justiça tem sustentado, em jurisprudência constante, que o direito à dedução do IVA, conforme previsto nos artigos 167.o e seguintes da Directiva IVA, constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Este direito é imediatamente exercido em relação à totalidade dos impostos que oneraram as operações efectuadas a montante. (v., neste sentido, por todos, acórdão de 21 de Março de 2018, Volkswagen AG/Finančné riaditeľstvo Slovenskej republiky, disponível em http://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=&docid=200484&doclang=PT).»
Em particular, como o Tribunal de Justiça teve ocasião de salientar, no seu Acórdão de 14.11.2000, Processo n.º C-142/99: «O artigo 19.° da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, deve ser interpretado no sentido de que devem ser excluídos do denominador da fracção que serve de base ao cálculo do pro rata de dedução: — por um lado, os dividendos distribuídos pelas filiais a uma holding que está sujeita ao IVA relativamente a outras actividades e fornece a estas filiais serviços de gestão e, — por outro, os juros pagos por estas últimas a esta holding relativos a empréstimos que esta lhes concedeu, quando estas operações de empréstimos não constituem, na acepção do artigo 4.°, n.° 2, da Sexta Directiva, uma actividade económica da referida holding (https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:61999CJ0142&from=ES)
Seguindo a jurisprudência contida no Acórdão deste Tribunal de 29.05.2007, proferido no processo nº 00833/03 (citado na sentença recorrida): «1. Estando em causa nos autos a dedução de IVA por parte de SGPS, que realiza operações sujeitas e operações não sujeitas a IVA, há que aplicar o cálculo pro-rata, tal como determina o artº 23º, nº 4 do CIVA. 2. O pro-rata é apurado de acordo com uma fracção em que o numerador é constituído pelo valor do montante anual, imposto excluído, das transmissões de bens e prestações de serviços que dão lugar a dedução e o denominador pelo montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo, incluindo as operações isentas ou fora do campo de aplicação do imposto, designadamente as subvenções não tributadas que não sejam subsídio de equipamento. No entanto, e tal como tem vindo a sustentar o TJUE, nesse denominador não devem ser incluídos os dividendos e os juros auferidos pelas holdings. 3. Tendo a Administração Tributária calculado o pro-rata com englobamento no denominador dos dividendos e juros auferidos pela recorrente - SGPS- o cálculo desse pro-rata ofende o disposto no artº 23º, nº 4 do CIVA, pelo que as liquidações posteriormente efectuadas com base naquele cálculo são ilegais, devendo, por isso ser anuladas.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt)
Também o Acórdão deste Tribunal Central de 11.11.2008, proferido no n.º 01897/07, no mesmo sentido, sobre a mesma questão, entendeu que: «para dirimir em definitivo tal controvérsia, evoca-se a doutrina que dimana do Acórdão deste TCAS de 29-05-2007, tirado no Recurso nº833/03, Secção, CT - 1.º JUÍZO LIQUIDATÁRIO, de acordo com a qual no denominador não devem ser incluídos esses valores, na sequência, aliás, do que tem vindo a decidir desde há anos o Tribunal de Justiça da União Europeia, pelo que, ao incluir tais valores no denominador, o quociente pro-rata sofre de erro que inquina as liquidações de IVA com base nele efectuadas.
E isso porque, tal como no citado aresto se fundamenta, “a interpretação formulada pelo TJUE no acórdão de 22.06.1993 vincula não só os Tribunais, como todas as entidades públicas dos Estados-Membros, não devendo, por isso, a Administração Tributária incluir os dividendos naquele denominador.
Acresce, por outro lado, que o mesmo Tribunal e sobre a mesma questão, decidiu em acórdãos posteriores que também os juros recebidos pelas holdings não deveriam ser considerados no mesmo denominador.(V. quanto a esta matéria os Acórdãos do TJUE, de 14.11.2000 – Processo nº C-142/99 e de 20.09.01 – Processo nº C-160/02).”

Então, sendo certo que no denominador da fracção determinante do pro-rata foram incluídos elementos que o não deveriam ter sido e viciaram o respectivo quociente, as liquidações subsequentes encontram-se também viciadas por ofensa do disposto no artº 23º, nº 4 do CIVA» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Também a nível do direito da União, a questão foi apreciada no âmbito do Acórdão Satam /Sofitam (processo C-333/91) tendo o Tribunal de Justiça entendido que se os dividendos não são contrapartida de qualquer actividade económica, são estranhos ao sistema do direito à dedução e não devem, por conseguinte, ser incluídos no denominador da fracção representativa do pro rata. (https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/HTML/?uri=CELEX:61991CJ0333&from=PT).
Em face de todo o exposto, e sem necessidade de mais considerações, tendo a Administração Tributária calculado o pro-rata com englobamento no denominador dos dividendos o cálculo desse pro-rata ofende o disposto no artigo 23.º, nº 4 do CIVA.
A sentença que assim decidiu não merece censura, devendo a mesma ser confirmada.
IV.CONCLUSÕES
I.Tendo a Administração Tributária calculado o pro-rata com englobamento no denominador dos dividendos auferidos pela recorrente - SGPS- o cálculo desse pro-rata ofende o disposto no artigo 23º, nº 4 do CIVA, pelo que as liquidações posteriormente efectuadas com base naquele cálculo são ilegais, devendo, por isso ser anuladas.
V.DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da 1ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo da recorrente.
Lisboa, 22 de Maio de 2019.


[Ana Pinhol]

[Isabel Fernandes]
[Catarina Almeida e Sousa]