Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12690/15
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:07/05/2017
Relator:CRISTINA DOS SANTOS
Descritores:FUMUS NON MALUS IURIS
INSTRUMENTALIDADE
PERICULUM IN MORA
Sumário:1.Na tutela cautelar administrativa a apreciação do fumus boni iuris requer não apenas a emissão de um juízo sobre a aparência da existência de um direito ou interesse do particular a merecer tutela, como também da probabilidade da ilegalidade da actuação administrativa lesiva do mesmo.

2. Nas providências conservatórias em que esteja em causa a paralisação dos efeitos de uma actuação administrativa, o critério de apreciação da necessidade da tutela cautelar há-de assentar num juízo sumário de procedibilidade da pretensão, cumprindo aferir o chamado fumus non malus iuris da pretensão do requerente, isto é, que não seja evidente a improcedência da pretensão de fundo formulada no processo principal – cfr. artº 120º nº 1 b) CPTA.

3. Atenta a relação de instrumentalidade do processo cautelar ao processo principal, os limites juridicamente atendíveis da tutela cautelar em sede de periculum in mora concretizados pela alegação de prejuízos de difícil reparação, são balizados em função do objecto da causa principal,

4. O decretamento da providência requerida depende da verificação cumulativa dos três requisitos legais gerais enunciados no artº 120º CPTA, pelo que o decaimento em sede periculum in mora envolve a prejudicialidade de conhecimento da ponderação dos interesses concretos em presença e importa a improcedência da causa.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: G.......... S........ International (GSI), com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue:

(a) A douta Decisão Recorrida resultou, salvo o devido respeito, de um equívoco fundamental sobre o impacto negativo e directo que a Deliberação suspendenda produz na esfera jurídica da Recorrente, e bem assim, a uma menor compreensão da actividade financeira e de conceitos e realidades essencialmente técnico-fmanceiras, como sejam a natureza e os efeitos dos contratos denominados Total Return Svraps ("TRS"};
(b) Tal levou a que o Tribunal a quo, apesar de ter entendido, e bem, que a O....... Finance não actua, nem nunca actuou por conta da Recorrente, tenha dai concluído que a Deliberação suspendenda não afectou minimamente a ora Recorrente, o que não é verdade e inquina todo o raciocínio subjacente às decisões tomadas relativamente, quer à matéria de excepção, quer quanto à (não) verificação dos pressupostos para concessão da providência cautelar requerida;
(c) No que respeita à pretensa ineptidão do Requerimento Inicial, ficou demonstrado, em primeiro lugar, nestas alegações (subalíneas a e b da alínea A do ponto II, para onde se remete), que, ao contrário do que erroneamente entendeu o Tribunal a quo, a junção de documentos rasurados e a data de produção de alguns dos documentos juntos (que supostamente não se coadunariam com a tutela cautelar) não podem constituir fundamentos para considerar nulo todo o processo por ineptidão do Requerimento Inicial;
(d) É que, na verdade, nos termos do disposto no artigo 186.° do CPC - e como explicitado pela nossa melhor jurisprudência e doutrina -, a ineptidão da petição inicial apenas ocorre em situações taxativamente determinadas por efeito da falta de formulação do pedido ou de indicação da causa de pedir ou, em alternativa, quando o pedido ou a causa de pedir, embora aparentemente existentes, são referidos de modo tão obscuro que não se entendem ou, então, a causa de pedir é referida de forma tão genérica que não constitui a alegação de factos;
(e) Ficou também demonstrado (ver subalínea c da alínea A do ponto II das presentes alegações que aqui se dá por reproduzida) que o Requerimento Inicial não é inepto por falta de causa de pedir;
(f) Com efeito, conforme resulta do alegado nos artigos l.° a 22.°. 35.°, 73.° a 276.°, 447.° a 520.° do Requerimento Inicial - e conforme sumarizado no n.° 25 destas alegações -, a mencionada peça processual contém todos os factos que permitem caracterizar o objecto do processo e que permitem ao Mino. Tribunal a quo pronunciar-se sobre o mérito do procedimento cautelar;
(g) Aliás - pese embora o Mmo. Tribunal a quo tenha entendido que o Requerimento Inicial é inepto por pretensa falta de causa de pedir -, a verdade é que os factos constantes dos artigos do Requerimento Iniciai supra referidos são expressamente por si reconhecidos, seja com a descrição sumária da posição de cada uma das Partes (ctr. pág. l a 21 da Sentença recorrida), seja na matéria de facto dada como provada (cfr. factos provados n.°s 8, 19, 20, 21, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 50 e 51 da Sentença recorrida);
(h) Por outro lado, fica patente que o Tribunal a quo não alcançou alguns dos factos alegados atenta a especificidade técnico-financeira dos mesmos - remetendo-se aqui para tudo o que ficou alegado nos n.° s 28 a 32 destas alegações;
(i) O mesmo sucedendo quanto a alguns dos documentos juntos ao requerimento iniciai e que, como se demonstrou nos n.°s 33 e 35 destas alegações - e ao contrário do considerado pelo Tribunal a quo —, têm tudo a ver com os factos alegados e com a causa de pedir da providência cautelar requerida pela ora Recorrente;
(j) Do mesmo modo, demonstrou-se também na subalínea d) da alínea A) do ponto H destas alegações - que igualmente se dá por reproduzida -, que o Requerimento Inicial não padece de inintelegibilidade da causa de pedir, conforme foi considerado, erroneamente, na Sentença recorrida;
(k) Na verdade, demonstrou-se que a factualidade invocada no Requerimento Inicial, não é ambígua, nem confusa, nem obscura, tendo sido, aliás, bem compreendida, quer pelo Banco de Portugal quer pelo N...... Banco nas suas Oposições;
(l) Nem essa inintelegibilidade poderia resultar da apresentação de alguns documentos rasurados por parte da ora Recorrente, e no que se refere à identidade de certas entidades ou partes terceiras, por razões de confidencialidade, devidamente explicadas no Requerimento Inicial, dados esses que foram, posteriormente, revelados na resposta às excepções;
(m) É que como resulta da compilação de posições doutrinárias e jurisprudência supra referidas nestas alegações, a causa de pedir consiste em factos ou circunstâncias concretas e individualizadas alegados na petição inicial e não, nos documentos que são ou deixam de ser juntos. Estes importam, tão-somente, para a prova e procedência da acção, não para a aptidão da petição inicial;
(n) Por último, errou ainda o Tribunal a quo ao considerar que o Requerimento Inicial seria inepto por alegada insusceptibilidade de os Requeridos interpretarem convenientemente essa peça processual, conforme demonstrado na subalínea e) da alínea A) do ponto II das presentes alegações;
(o) Em primeiro lugar, porque o que os Requeridos arguiram a este propósito (neste caso apenas o N...... Banco, que arguiu esta excepção de ineptidão na sua Oposição), foi unicamente que a rasura de alguns documentos - ou seja, a rasura quanto às informações relativas aos clientes institucionais da Requerente (por força dos deveres de confidencialidade a que se encontra adstrita) -, supostamente o impediam de exercer adequadamente os seus direitos de defesa. Nada mais;
(p) Acresce que os Requeridos nunca alegaram que a causa de pedir do Requerimento inicial era obscura ou ambígua impedindo-os de conhecer os efeitos que a Requerente procurava acautelar, sendo certo também que, analisadas as Oposições apresentadas, se pode verificar que ambos entenderam e interpretaram convenientemente o Requerimento inicial;
(q) Do exposto resulta, assim, que a Sentença a quo deve ser revogada e substituída por outra que considere que o Requerimento Inicial não é inepto;
(r) Igualmente ficou demonstrado, nas presentes alegações (cfr. alínea B do ponto II, que aqui se dá por integralmente reproduzida), o manifesto erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo ao considerar que a ora Recorrente carece de legitimidade activa para a interposição da providência cautelar aqui em causa;
(s) É que, na verdade, como se demonstrou, com o apoio de doutrina autorizada e da Jurisprudência dos Tribunais Administrativos, a legitimidade processual afere-se nos estritos termos em que o Autor, no articulado inicial, delineou o interesse directo e pessoal em impugnar o acto (e em recorrer complementarmente a meios cautelares), pelo que a ocorrência deste pressuposto é independente da existência real dos factos constitutivos do interesse alegado. Ou seja, a legitimidade constitui um pressuposto processual e não uma condição de procedência (como erroneamente se considerou na Sentença recorrida);
(t) Ora, tendo em conta a forma como a Recorrente configurou a acção no Requerimento Inicial -e o teor do acto cuja suspensão de eficácia se requereu! -, resulta evidente que a mesma é destinatária da Deliberação suspendenda;
(u) Além disso, a Recorrente alegou e justificou de forma clara o seu interesse directo e pessoal, ou seja, ser titular do interesse em nome do qual se move o processo e com o qua! pode retirar, para si própria, uma utilidade concreta, quer na suspensão de eficácia do acto impugnado, quer na sua anulação ou declaração de nulidade (na acção principal);
(v) Com efeito, resulta de forma clara do Requerimento Inicial essa mesma utilidade, tendo a Recorrente alegado e demonstrado os prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais., que para si decorrem da execução da deliberação em causa, nomeadamente um prejuízo directo de aproximadamente 222 milhões de dólares norte-americanos (cfr. alínea b do artigo 21.° e artigos 139.°, 453.° a 476.°, 477.° a 504,° e 505.° a 520.°, todos do Requerimento Inicial);
(w) E mesmo que os prejuízos alegados pela Recorrente no Requerimento Inicial da providência fossem meramente conjecturais - como erroneamente entendeu o Tribunal a quo - ainda assim, sempre subsistiria a legitimidade activa da ora Recorrente, nos termos em que a mesma se encontra configurada na lei e que constitui também entendimento unânime da Jurisprudência dos Tribunais Administrativos, como se referiu acima;
(x) Padece assim a Sentença a quo de erro de julgamento, em violação do disposto nos artigos 9.°. n.° 1, 55.°, nº 1 alínea a) e 112.°, n.° 1 do CPTA e deve, por isso, ser revogada também nesta parte, considerando que a Requerente, ora Recorrente é parte legítima;
(y) Igualmente incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento ao considerar aplicável no caso a restrição contida no n.° 2 do artigo 145.°-N do RG1CSF, entendendo que a ora Recorrente não preenchia o pressuposto de legitimidade activa "qualificada" previsto nesse preceito legal;
(z) Na verdade, e a este propósito, demonstrou-se na alínea C) do ponto II das presentes alegações, em primeiro lugar, que a mencionada restrição apenas se aplica aos procedimentos cautelares relativos a decisões do Banco de Portugal que adoptem medidas de resolução;
(aa) Sendo certo que a Deliberação suspendenda não constitui nenhuma das "medidas de resolução” categorizadas no capítulo VI do RGICSF - mais concretamente nas alíneas a) e b) do do seu artigo 145.°-C -, mas antes um acto administrativo pelo qual o Banco de Portugal determinou a não transferência de responsabilidades do BES perante a O....... F……. Luxemburg S.A. para o banco de transição (N...... Banco);
(bb) Do mesmo modo, não pode colher o argumento de que o acto em causa constitui medida adoptada ao abrigo do artigo I45.°-H, n.° 5, alínea b), do RGICSF, que prevê que após a transferência operada no quadro das medidas de resolução adoptadas, o Banco de Portugal pode vir a transferir outros activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão para a instituição de crédito originária;
(cc) Com efeito, em lado algum da Deliberação suspendenda o Banco de Portugal veio invocar que estaria a proceder a uma retransferência de passivos, nem sequer invocou essa norma legal - como pode ver-se na reprodução da Deliberação, feita no artigo 35.° do Requerimento Inicial;
(dd) Em conclusão, não se tratando a deliberação aqui em causa, claramente, de uma medida de resolução, só pode concluir-se que a restrição do n.° 2 do artigo I45.°-N do RGÍCSF não é aplicável no caso concreto e que a ora Recorrente dispõe de legitimidade activa para o presente procedimento cautelar, pelo que a Sentença recorrida incorreu em erro de julgamento e deve ser revogada também nesta parte;
(ee) Além disso, ao decidir como decidiu, considerando que o acto aqui em causa se tratava de uma medida de resolução, a Sentença Recorrida fez também uma interpretação e aplicação do artigo 145º-N, n.° 2, do RGICSF que é manifestamente inconstitucional, violando o disposto no artigo 268.°, n.° 4, da CRP;
(ff) É que, na verdade, constituiria uma restrição desproporcionada da garantia de tutela jurisdicional efectiva prevista no n.° 4 do artigo 268.° da CRP vedar o acesso de terceiros à tutela cautelar perante actos administrativos individuais e concretos que, no contexto da adoção de uma medida de resolução, tenham por objeto determinar, de modo individualizado, a situação em que ficam colocadas as situações jurídicas de que esses terceiros eram titulares no âmbito das suas relações com o banco visado por aquela medida, como também concluiu Mário Aroso de Almeida em parecer que se juntou ao Requerimento Inicial (cfr. pág. 20 do referido parecer);
(gg) Por outro lado, tendo em conta que a norma do n.° 2 do artigo 145.°-N foi entretanto suprimida pela Lei n.° 23-A/2015 (de 26.111), sempre deve a referida alteração do RGICSF ser considerada aplicável retroactivamente no caso concreto, o que redunda em considerar que mesmo que se entendesse que a deliberação suspendenda constituía uma medida de resolução, deixaria de relevar qualquer participação específica no capital social do banco objecto de resolução para efeitos de legitimidade no recurso a procedimentos cautelares contra medidas de resolução, com a consequência de, também com este fundamento, dever ser revogada a Sentença recorrida nesta parte;
(hh) Tendo a Recorrente demonstrado de forma clara o seu interesse directo e pessoal na demanda (conforme se pode ver do alegado na alínea B do ponto II destas alegações), fica também demonstrado o seu interesse em agir;
(ii) Com efeito, resulta de forma clara do Requerimento Inicial que a Recorrente, para além de outros aí alegados, poderá sofrer um prejuízo efectivo e directo de aproximadamente 222 milhões de Dólares norte-americanos, a menos que a presente providência cautelar requerida seja decretada:
(jj) Para além disso, mesmo que os prejuízos alegados fossem meramente conjecturais, sempre se deveria ter em conta que, como referido nesta peça, o pressuposto processual da legitimidade activa tem que ser aferido nos estritos termos em que o Autor delineou o interesse directo e pessoal, e de que, portanto, a ocorrência desse pressuposto processual é independente da existência real dos factos constitutivos do interesse alegado:
(kk) 0 que implica considerar que a Sentença recorrida, ao entender que a ora Recorrente não justificou o seu interesse em agir, padece de novo erro de julgamento e deve, por isso, ser revogada nessa parte;
(ll) Tendo o Tribunal a quo considerado não verificado o requisito autónomo ao fumus bom iuris previsto na alínea a) do n.° l do artigo 120ºp do CPTA, nos mesmos termos e fundamentos com que decidiu a excepção dilatória de ineptidão do requerimento inicial por falta de causa de pedir, e revogada a Sentença recorrida nessa parte (como se espera), deve o Tribunal voltar a apreciar tudo o que ficou alegado no Requerimento Inicial no que toca à verificação do mencionado pressuposto autónomo de concessão da providência requerida;
(mm) Quanto à impugnação da matéria de facto constante da douta Sentença recorrida - e como demonstrado na alínea C) do ponto III destas alegações, que aqui se dá por integralmente reproduzido -, devem os factos alegados sob os artigos 477.° a 504.° e, bem assim, os factos alegados sob os artigos 453.° a 476.° e 505.° a 520.°, todos do Requerimento Inicial, ser julgados também provados ou, em alternativa, caso este Alto Tribunal entenda que não existem ainda condições para tanto, deve, então, ser revogada a decisão recorrida e devem os autos baixar à primeira instância para efeito de abertura de audiência de discussão e julgamento e produção de prova testemunhal relativamente aos mencionados factos;
(nn) Adicionalmente, considerando que os danos em causa foram efectivamente alegados, não tendo o Mmo. Tribunal a quo exercido qualquer pronúncia sobre os mesmos, deve a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que aprecie a matéria de facto alegada pela Recorrente para efeito de posterior apreciação do periculum in mora'.
(oo) Dá-se por integralmente reproduzido o invocado no ponto IV destas alegações no que respeita aos lapsos materiais de escrita da douta Sentença a quo decorrentes dos pontos considerados provados 8, 19, 20, 25, 27, 51 e pág. 92, cuja correcção se requer;
(pp) Com a procedência do presente recurso, deve ser revogada a Sentença recorrida - bem como a segunda parte do despacho de 9 de Julho de 2015 -, devendo os autos prosseguir para marcação da audiência de discussão e julgamento para produção de prova testemunhal e posterior decisão sobre a verificação dos pressupostos legais para concessão da providencia cautelar requerida.
Termos em que, com o douto suprimento dos Venerandos Desembargadores, deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional e, consequentemente, serem julgados procedentes os erros de julgamento da Sentença a quo invocados nas presentes alegações de recurso com todas as consequências legais;

*
O Banco de Portugal contra-alegou , concluindo como segue:

1. O Tribunal a quo julgou o Requerimento Inicial inepto, por falta de causa de pedir e/ou ininteligível, tendo determinado, consequentemente.a nulidade de todo o processo.
2. A Recorrente GS1 parte do pressuposto - errado - de que o Tribunal a quo teria tido uma compreensão menos conseguida de factos de natureza técnico-financeira.
3. Nada de mais errado.
4. Conforme resulta da leitura do Requerimento Inicial, a Recorrente GSI optou por apresentar ao Tribunal a quo um intrincado arrazoado de factos, acompanhado, porém, de documentos rasurados e de omissões de factos com fundamento num alegado dever de confidencialidade.
5. Com esse comportamento processual, a Recorrente GSI tomou ininteligíveis os factos que suportam o seu pedido, o que levou o Tribuna! a quo a considerar procedente a excepção arguida pelo N...... banco.
6. O Tribunal a quo considerou que a Recorrente GSÍ carecia de legitimidade activa.
7. A Recorrente GSI considera que o Tribunal teria incorrido em erro de julgamento uma vez que: i) não leria apreciado a sua falta de legitimidade à luz da sua causa de pedir, ii) não teria considerado devidamente a existência de um TRS nos termos do qual assumiu parte do risco económico das notes nem a consequente c alegada (mas não provada) transferência de parte das notes para a sua titularidade, tudo aspectos que na sua tese lhe confeririam legitimidade.
8. Nada mais errado, uma vez que o Tribunal efectivamente apreciou a sua falta de legitimidade à luz precisamente dos elementos por si aportados dado que de acordo com o precisamente invocado, no que não se concede, não controlaria a O....... Finance nem teria assumido o seu risco económico, salvo na estrita medida dos TRS e da alegada, mas não provada, transferência de parte das notes,
9. Tal significa que a Recorrente GSI não é juridicamente afectada pelo acto e apenas pode sofrer um prejuízo reflexo, económico ou de facto, por força de paralela relação contratual alheia à esfera do acto em causa.
10. Tal alegado prejuízo não é suficiente para lhe conferir legitimidade,
11. Alega ainda a Recorrente GSI que não se lhe deve aplicar a regra do RGICSF que exige como factor de legitimidade para a suspensão da eficácia a detenção de 10% do capital social da entidade objecto de resolução, por considerar que a Deliberação de 22 de Dezembro não constitui medida de resolução.
12. Não tem razão, uma vez que a referida deliberação consubstancia simultaneamente uma medida de resolução para efeitos do direito português, acto administrativo e executório adoptado no quadro do 145º/1 do RGICSF, e também medida de resolução para efeitos da Directiva europeia e dos seus objectivos, à luz da qual deve ser interpretado o direito português.
13. Por razões similares às razões pelas quais contesta a falta de legitimidade decretada na sentença do Tribunal a quo, contesta a Recorrente GSI a falta de interesse em agir também decretada pelo mesmo tribunal.
14. Para o efeito, tenta demonstrar o seu alegado prejuízo económico com a decisão, o que não se verifica pelas razões apontadas supra quanto à legitimidade,
15. Relevando ainda afirmar que inexiste ainda interesse em agir dado que o efeito útil pretendido com a suspensão nunca seria alcançado pelo facto de o acto estar totalmente executado - inscrição do empréstimo da O....... F………… nas contas do BES.
16. Por outro lado, e embora a sentença não tenha decidido esse ponto, a providência sempre seria inadmissível pelo facto de versar sobre acto de conteúdo negativo, que se traduz no indeferimento de pretensão e na recusa da prática de um acto.
17. Por último, a Recorrente GSI não indicou contra-interessados relevantes na providência, como seja o BES (cujas contas teriam de ser corrigidas incorrendo em contingências fiscais e regulatórias) e o Banco do Médio Oriente, o Fundo de Pensões da Ásia-Pacíflco, o Fundo de Pensões Europeu I e o Fundo de Pensões II, o que não é sanável nesta fase processual (como resulta do aresto do STA, processo 01357/13).
18. Para a Recorrente GSI o Tribunal a quo não fundamentou a decisão quanto à falta do requisito do fumus boni iuris uma vez que não será possível, no seu entender, apreender o sentido da decisão ou o caminho lógico seguido pelo Tribunal.
19. Também neste aspecto não colhe a alegação da Recorrente GSI, uma vez que a Primeira Instância considerou faltar a causa de pedir e, nessa medida, os factos dos quais poderia resultar a aparência do direito.
20. Essa aparência de direito não se encontra, por outro lado, verificada, conforme resulta, aliás, do alegado nos artigos 170° a 193° da Oposição do banco de portugal, que acima se deu por reproduzido.
21. O Tribuna! a quo julgou ainda que o requisito do periculum in mora não se encontra verificado, entendimento não perfilhado pela Recorrente GSI.
22. Com efeito, esta sustenta neste recurso ter alegado e provado o referido requisito consistente em prejuízos actuais que não seriam mais do que a incapacidade manifesta de pagamento do empréstimo pelo BES atenta a sua situação financeira.
23. Desta alegação resulta, assim, claro que estamos perante uma lesão já consumada e, nessa medida, a providência requerida pela Recorrente GSI só pode ser condenada ao insucesso.
24. O foro cautelar não serve para discutir lesões consumadas, dispondo a Recorrente de acções principais para tal desiderato.
25. Sustenta ainda a Recorrente GSI que o Tribunal a quo não relevou, nem para efeitos de matéria provada, nem para efeitos de matéria não provada, factos por si alegados no Requerimento Inicial.
26. Sucede, porém, que a Recorrente GSí desconsidera o excerto da Sentença a quo em que, a propósito do mérito da providência, o Juiz a quo remeteu para o elenco de factos tidos por provados (e, consequentemente. por não provados) em sede de conhecimento das excepções.
27. Da leitura do Requerimento Inicial resulta que a Recorrente GSI não alegou factos concretos dos quais se retire o periculum in mora, mas apenas juízos hipotéticos, conjecturas e suposições,
28. Sem conceder, ainda que se pudesse considerar suficiente a alegação da Recorrente GSI (e não meramente hipotética, como se disse), os danos invocados por aquela são reparáveis e, nessa medida, o foro cautelar é novamente inadequado para apreciar a pretensão da Recorrente.
29. Os factos alegados nos artigos 477° a 504°, 453° a 476° e 505° a 520° do Requerimento Inicial não deverão ser julgados provados atento o teor da alegação da Recorrente GSI nesse articulado inicial e atenta a manifesta falta de prova acerca dos mesmos,
30. Pelo que nada impõe ou justifica a abertura de uma audiência de inquirição de testemunhas.
31. A Recorrente GSI nada alegou no seu recurso a propósito da ponderação de interesses, o que é bem revelador da sua falta de convicção nesta providência.
32. Nem nada poderia alegar em sua defesa, dado que a Recorrente GSI, no seu Requerimento inicial, pretende confrontar o interesse público subjacente à situação sub judice com interesses alheios (logo inatendíveis) ou, quando próprios, meramente hipotéticos ou inexistentes (e, nessa medida, igualmente inatendiveis).
33. Para além do exposto, sempre seria aplicável a presunção do artigo 12.°, n.°2 do RGICSF, nos termos da qual existe grave lesão para o interesse público.
34. O Despacho de 9 de Julho de 2015 não constitui um acto derivativo da Sentença a quo, pelo que não a eventual revogação da Sentença que não se admite, nem concede que venha a ocorrer, não conduz à revogação do referido Despacho.
35. Com efeito. o Despacho goza de autonomia, não podendo ser considerado dependente do juízo feito sobre a matéria da excepção, conforme resulta do facto de o Tribunal a quo o ter fundamentado na suficiência dos autos e não apenas numa eventual procedência da defesa por excepção.
36. Pelo que não poderá este Despacho ser sindicado nesta instância porquanto a Recorrente GSl não interpôs recurso do mesmo e não alegou quaisquer vícios que o inquinem e que pudessem conduzir à sua revogação.
Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Excelências, se deverá julgar improcedente o presente recurso e, em consequência, se deverá manter a Sentença recorrida, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.

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O N...... Banco SA contra-alegou , concluindo como segue:

A. A Sentença recorrida não padece de qualquer vício, tendo feito um correcto julgamento dos factos e do Direito, quer no que toca à matéria de excepção, quer quanto ao mérito.
B. O recurso e as alegações da GSI estão suportados em dois pressupostos que as condenam ao insucesso: (i) o primeiro decorre das constantes insinuações da GSI a uma alegada falta de capacidade de compreensão do Tribunal a quo relativamente aos contratos e aos esquemas financeiros que suportam a sua posição nestes autos; (ii) o segundo a total desnecessidade de tutela cautelar da GSI quanto à providência cautelar em causa porque a mesma ainda no fecho das contas relativas ao primeiro semestre de 2015 teve o melhor resultado dos últimos cinco anos (mais precisamente, um lucro líquido de 9,07 biliões de dólares norte americanos), e porque a Deliberação BP de 22.12.2014 é válida e aceite por todos os actores do sistema financeiro, com destaque para o Banco Central Europeu.
C. A Sentença recorrida ao decidir pela ineptidão do r.i. fez um correcto julgamento, tendo o Tribunal a quo justificado por que razão considerou que a GSI não indicou nem explicou a causa de pedir subjacente ao r.i., constando da Sentença recorrida os elementos de facto e de Direito que justificam a decisão tomada. Note-se a este respeito, que é a própria GSI que confessa não ter contado ao Tribunal o quo toda a história, nem apresentado todos os elementos, ao não se importar de não revelar as partes nos contratos que apresenta, de não querer entrar em detalhes, etc.
D. A Sentença recorrida julgou correctamente quando entendeu que a GSI não tem legitimidade activa para a providência cautelar, seja por não ter concretizado (e muito menos demonstrado) a existência de qualquer interesse pessoal e directo na Deliberação BP de 22.12.2014, seja por não ser titular da legitimidade activa qualificada a que se refere a norma do artigo 1452 - N do RGICSF.
E. O Tribunal a quo ao decidir que a GSI carece de interesse em agir ajuizou bem, pois, como a própria GSI confessa no ponto 22 das suas Alegações, o seu prejuízo é meramente hipotético, eventual ou incerto, o que manifestamente não merece qualquer tutela cautelar.
F. No que toca ao julgamento do mérito e na parte que respeita ao requisito do "fumus boni iuris", bem andou o Tribunal a quo ao julgar o mesmo não preenchido, na medida em que a GSI não demonstrou a existência de qualquer manifesta ilegalidade que afecte a validade da Deliberação BP de 22.12.2014.
G. No que se refere ao requisito do "periculum in mora" a GSI não demonstrou qualquer prejuízo que realmente tenha ou venha a ter com a Deliberação BP de 22.12.2104 e a alegada perda financeira de 222 milhões de dólares norte americanos é uma mera probabilidade, assim como os ficcionados danos de imagem ou de quebra de confiança, como, aliás a própria GSI desmente quando informa (Doe. 1) que no primeiro semestre de 2015 o melhor resultado financeiro dos últimos cinco anos (com um resultado líquido de 9,97 biliões de dólares norte-americano).
Nestes termos e nos demais que Vs. Exa. tenham por adequados, requer-se que seja julgado improcedente o recurso apresentado pela GSI e, em consequência, confirmada a Sentença recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA.

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Com substituição legal de vistos pela entrega das competentes cópias aos Exmos. Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência.

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Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte matéria de facto:

1. Em 03.08.2014, pelas 20 horas, foi celebrada a Reunião Extraordinária do Conselho de Administração do Banco de Portugal, cujo teor abaixo se reproduz (cfr. Doe. l junto com o r.i., e admissão por acordo):

"Reunião Extraordinária do Conselho de Administração do Banco de Portugal
3 de agosto de 2014 20 horas Presenças:
Senhor Governador Dr. Carlos ………………….
Senhor Vice-Governador Pró f. Doutor Pedro ………………..Duarte Neves
Senhor Vice-Governador Dr. …………. …………………..
Senhores Administradores Dr. José ………………………………… e Dr. João
……………………………………..

Agenda:
l .Constituição do N...... Banco, SA.
.
' 2. Transferência de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banco E.......... S.........., SA, para o N...... Banco, SA.

3.Designação de uma entidade independente para avaliação dos ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão transferidos para o N...... Banco, SA.

4.Nomeação dos membros dos órgãos de administração e de fiscalização do Banco E.......... S.........., SA.

Nos termos do n.º l do artigo 146.° do RGICSF, e em face da necessidade premente das medidas agora tomadas para a salvaguarda da solidez financeira do Banco E.......... S.......... e do interesse dos seus depositantes, bem como para a manutenção da estabilidade do sistema financeiro português, as presentes deliberações são consideradas urgentes nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º l do artigo do artigo 103º do Código de Procedimento Administrativo, não havendo lugar a audiência prévia dos interessados.


DO DIREITO

1. ineptidão da petição inicial;

De acordo com o regime dos artºs. 186º nº 1 e nº 2 a), 576º nº 2 e 577º b) CPC, há lugar a absolvição da instância com fundamento na nulidade de todo o processo em caso de ineptidão da petição inicial derivada de falta ou ininteligibilidade do pedido deduzido ou da causa de pedir, consistindo a causa de pedir no elenco da matéria de facto alegada, de modo suficiente, para individualizar o facto genético do direito ou da pretensão que o Autor faz valer em juízo.
O que significa que, em ordem a afastar o vício adjectivo de ineptidão da petição inicial, a lei não exige, nem nas acções principais e muito menos nas acções cautelares, que o Tribunal formule um juízo completo e exaustivo de correlação entre o elenco de matéria de facto alegada na petição inicial e a previsão constante do bloco normativo alegado pelo Auto como gerador da causa de pedir, isto porque tal juízo exaustivo é próprio de uma fase mais adiantada da instância, que não na fase liminar do processo - seja ele principal ou cautelar – fase essa, por regra, depois da fase instrutória e em via de exercício do juízo de certeza na acção principal ou juízo de verosimilhança na cautelar, sobre a existência do direito invocado.
Não se acompanha, pois, o entendimento sufragado em sede de sentença no sentido da nulidade do processo por ineptidão da petição cautelar.


2. legitimidade activa – interesse em agir – pressupostos processuais;

A questão da legitimidade traduz-se, fundamentalmente, na circunstância de as partes configurarem os sujeitos da relação material controvertida, isto é, quem vem a juízo é o titular do direito que se arroga (legitimidade activa) e correlativa obrigação de quem é demandado (legitimidade passiva), mas, sempre, tendo o Tribunal como suposto que o direito e a obrigação na verdade existam.
A averiguação pelo Tribunal, em juízo concreto e efectivo, da existência do direito e correlativa obrigação segundo o direito aplicável no domínio dos factos, atento o acervo de provas carreadas para o processo pelas partes, “(..) constitui o conteúdo da tutela de mérito, e objecto, portanto, da tutela realizada através do processo (..)” (1)matéria que extravasa o âmbito dos pressupostos processuais porque, claramente, contende com a matéria da procedência da acção.
Como no diz a doutrina processualista “(..) A legitimidade não é, portanto, uma qualidade pessoal das partes (como a capacidade) mas uma certa posição delas em face da relação material litigada (..) É o poder de dispor do processo – de o conduzir ou gestionar no papel de parte. (..)”(2).
Com ressalva dos regimes especiais, em sede administrativa o regime estabelecido no artº 9º nº 1 CPTA consagra o critério comum próximo do regime processual civil do artº 30º nº 1 CPC (ex 26º nº 1), em que “(..) a legitimação processual é aferida pela relação jurídica controvertida tal como é apresentada pelo autor. (..)” (3).
O interesse em agir configura a necessidade de tutela judiciária, traduzida em recorrer ao processo, que parte da doutrina qualifica como condição da acção “(..) pois a falta de interesse processual significa não ter o demandante razão para solicitar e conseguir a tutela judicial pretendida. Resta, todavia, a eventual possibilidade de este requisito ser incluído no artigo 26º (..)” (4)
Assente que ambas as possibilidades de disposição do processo se aferem tendo por referência a relação material litigada nos exactos termos vazados pelo Autor na petição, não pode acolher-se o discurso jurídico fundamentador da sentença na parte em que se refere que “(..) a requerente não é destinatária da deliberação suspendenda e não são produzidos efeitos directos da deliberação na sua esfera jurídica (..)” para concluir pela ilegitimidade e falta de interesse em agir, na medida em que tal conclusão passa necessariamente pela discussão do fundo da causa, apreciando, digamos assim, a legitimidade substancial e não processual, com a consequente improcedência da causa.
Pelo exposto procedem as questões trazidas a recurso nos itens c) a q) e r) a kk) das conclusões.


3. fumus boni iuris em matéria administrativa;

Pela circunstância de as providências cautelares se limitarem a fornecer uma composição provisória que se destina a ser substituída por aquela que resultar da acção principal, relativamente à qual são dependentes em termos de acessoriedade visando garantir a sua utilidade prática.
Tal implica, primeiro, a distinção de objectos entre o meio cautelar e a acção principal que lhe corresponda, posto que não há identidade de pedidos nem de causas de pedir, na medida em que “(..) a dependência das providências cautelares do meio principal, pela própria natureza e relativa autonomia das primeiras, não pode equivaler a uma coincidência do direito que se pretende tutelar nem à alegação do mesmo circunstancialismo fáctico integrador da causa de pedir de ambos os meios. Mas implica, pelo menos, que o facto que serve de fundamento ao requerimento da adopção de uma providência cautelar, integra a causa de pedir da acção principal (..)”. (5)
Segundo, precisamente em razão da provisoriedade e instrumentalidade da tutela cautelar, no domínio deste meio adjectivo a lei limita-se a exigir a prova sumária da situação de facto (summario cognitio) e a suficiência da mera justificação do direito alegado (fumus boni iuris), circunstâncias que têm por consequência a insusceptibilidade de a decisão proferida em processo cautelar produzir qualquer efeito de caso julgado na acção principal, ou seja, não tem efeitos de caso julgado material erga omnes - cfr. artº 383º nº 4 CPC. (6)
Temos, pois, em síntese, que a acessoriedade da tutela cautelar, além da limitação de eficácia temporal da sentença proferida em sede de providência, eficácia subordinada à prolação da sentença no processo principal, tem como vector consequencial a sumariedade de cognição efectuada em sede de apreciação dos requisitos de concessão da providência.
O que significa que o Tribunal se limita a exercer o que se designa por summario cognitio, no sentido de que a apreciação da factualidade carreada para efeitos decisórios relativamente aos requisitos da aparência da existência do direito e provável ilegalidade da actuação administrativa (fumus boni iuris) faz-se por recurso a um juízo de verosimilhança ou mera previsibilidade e razoabilidade dos indícios, sendo que a apreciação dos perigos de retardamento ou infrutuosidade (periculum in mora) se faz em moldes mais exigentes, de “fundado receio” diz a lei, isto é, de probabilidade mais forte e convincente da gravidade ou difícil reparabilidade dos danos, salvo se já se tiverem verificado na prática e se pretenda sustar a continuidade de superveniência de novos danos, tal como no tocante à ponderação de interesses contrapostos em presença.
Ainda relativamente ao pressuposto da aparência do bom direito alegado, cumpre ter presente que em sede cautelar administrativa “(..) a apreciação do fumus boni iuris requer não apenas a emissão de um juízo sobre a aparência da existência de um direito ou interesse do particular a merecer tutela, como também da probabilidade da ilegalidade da actuação lesiva do mesmo (..)” isto é a apreciação do fumus boni iuris estende-se sobre a aparente ilegalidade da actuação administrativa assacada pelo particular como lesiva de um direito que lhe assiste. (7)


4. fumus boni iuris incontroverso, patente e irrefragável; artº 120º nº 1 a) CPTA;

A qualidade de cognição exigida pelo artº 120º nº 1 a) CPTA para o fumus boni iuris traduzida na expressão “evidente procedência da pretensão formulada” mede-se pelo carácter incontroverso (que não admita dúvida), patente (posto que visível sem mais indagações) e irrefragável (irrecusável, incontestável) do presumível conteúdo favorável da sentença de mérito da causa principal, derivado da cognição sumária das circunstâncias de facto e consequente juízo subsuntivo na lei aplicável, efectuados no processo cautelar.
Ou seja, no tocante à invalidade ostensiva configurada no artº 120º nº 1 a) CPTA o pressuposto do fumus boni iuris toma configuração distinta, pois a decisão cautelar deixa de derivar da “probabilidade de existência do direito alegado” para sê-lo “quando seja evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal”.
Em via de coerência com a afirmação de que o artº 120º nº 1 a) não configura a convolação da tutela cautelar em tutela final, há-de concluir-se que a hipótese do artº 120º nº 1 a) exige um critério de fumus boni iuris qualificado, independentemente de a pretensão do requerente se subsumir na hipótese de providência antecipatória do artº 120º nº 1 c) e nº 2 CPTA ou em outro enquadramento doutrinário pelo qual se opte, para além dos normativamente assumidos.
Dito de outro modo, tenha ou não o requerente em vista a manutenção do statu quo (providência conservatória) ou a sua alteração (providência antecipatória) – o que se decide com base na factualidade alegada que determina os contornos do caso concreto –, é de decretar a providência desde que a determinação e valoração probatória suporte um juízo jurídico de evidente procedência do pedido formulado ou a formular na acção principal.

*

Cabe aplicar o bloco normativo, que vem de ser citado, ao caso em apreço.

A fundamentação da deliberação de 22.12.2014 do Conselho de Administração do Banco de Portugal, ora Recorrido, consta do item 8 do probatório, que a seguir se transcreve.

“(..)
8- Em 23/12/2014, foi elaborado um comunicado do N...... B.........., A informando a responsabilidade contraída pelo B.......... E.......... S.......... perante a O....... Finance Luxembourg, S.A., não foi transferida para o N...... B.......... e cujo teor abaixo se reproduz (cfr. Doe. 6, junto com o r.i e admitido por acordo):
“Para: Conselho de
Número de Documento: NTI/2014/00003441;
Data: 2014/12/22
Assunto: Responsabilidades do B.......... E.......... S.........., SA, perante a O....... Finance Luxembourg SA
EMPRÉSTIMO OBTIDO PELO B.......... E.......... S.........., S.A. JUNTO DA SOCIEDADE O....... FINANCE LUXEMBOURG SA
ENQUADRAMENTO NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ARTIGO 145.° h), nº 2 DO RGICSF-
1. A deliberação do B.......... de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20:00 horas), com as clarificações c ajustamentos introduzidos pela deliberação do B.......... de Portugal de 11 de agosto de 2014 (17:00 horas), doravante a "deliberação de agosto", que determinou a constituição do N...... B.........., S.A. ("N...... B.........."), determinou igualmente a transferência de um conjunto de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do B.......... E.......... S.........., S.A. ("B.......... E.......... S.........." ou "instituição originária"), para o N...... B.........., descritos no anexo 2 à mesma deliberação.
2. Nos termos do disposto na subalínea i) da alínea b) do ponto I do anexo 2 da deliberação de agosto, não foram transferidas para o N...... B.......... quaisquer responsabilidades contraídas pelo B.......... E.......... S.......... perante, entre outros, terceiros que atuem por conta de entidades que, nos dois anos anteriores à transferência, tenham tido participação igualou superior a 2% do capital social do B.......... E.......... S........... Esta subalínea traduz o disposto no artigo 145º-H, nº 2, alínea c) do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras, que proíbe tal transferência.
3. Tendo em conta o supra exposto, foi transferida para o N...... B.........., SA, a generalidade dos passivos do B.......... E.......... S.........., com exceção daqueles expressamente identificados do anexo 2 da deliberação de agosto, tendo-se vindo a admitir que a transferência abrangia as responsabilidades do B.......... E.......... S.......... perante a sociedade O....... F………. Luxembourg, SA.
4. No dia 30 de junho de 2014, o B.......... E.......... S.........., através da sua sucursal no Luxemburgo, celebrou com a sociedade O....... Finance Luxernbourg SA, constituída no Luxemburgo, um contrato de financiamento no valor total de 834 642 768 dólares EUA (ANEXO 1).
5. A liquidação daquele financiamento ocorreu no dia 3 de julho de 2014, constituindo-se o B.......... E.......... S.......... devedor da sociedade O....... Finance Luxembourg SA. Nos termos do contrato, o valor disponibilizado ao B.......... E……….. S.......... na data de liquidação corresponde a 94% do valor nominal do financiamento (784 564 202 dólares EUA). Porém, àquele valor foram deduzidas comissões nos termos descritos no parágrafo 18, pelo que o valor de liquidação correspondeu a 730 312 422 dólares EUA.
6. Tendo em conta que, à data da deliberação de agosto, este era o enquadramento fáctico conhecido, não se admitiu que este crédito da O....... F…………. Luxembourg SA se enquadrasse numa das categorias de passivos que não foram objeto transferência para o N...... B.........., nos termos referidos no ponto 2 desta informação.
7. No entanto, já após a aplicação da medida de resolução ao B.......... E.......... S.........., o B.......... de Portugal tomou conhecimento de indícios que relacionavam o empréstimo da O....... Finance Luxembourg SA ao B.......... E.......... S.......... com a G.......... S........, entidade que, nos dois anos anteriores à medida de resolução, teve participação no capital social do B.......... E.......... S.......... superior a 2%. Essa relação, foi aliás, objeto de ampla cobertura, a nível internacional, na comunicação social ou por comentadores da especialidade, conforme o demonstram os exemplos seguintes:
a. Financial Times: "G.......... lent $835m to B.......... E.......... S.......... before bailout" (ANEXO 2);
b. Bloomberg: "G.......... S........ Loaned B.......... E.......... S.......... Funds in July" (ANEXO 3);
c. Wall Street Journal: "G.......... Made Loan to E.......... S..........: As Portuguese Bank Neared Collapse, Wall Street Lender Helped It Raise Funds, Losing Money in the Process" (ANEXO 4);
d. The Telegraph: "G.......... S........ lent B.......... E.......... S.......... $835m a month before bail­out" (ANEXO 5);
e. Le Figaro: "G.......... S........ mêlé à 1'affaire B.......... Espirito S.........." (ANEXO 6);
f. La Tribune: "G.......... S........ a prêté 835 millions de dollars à B.......... Espirito S.......... juste avant sa faillite" (ANEXO 7);
g. Zerohedge:"G..........'s Special Purpose Tentacle Revealed In Europe's Latest Bank Failure" (ANEXO 8).
8. Assim, o B.......... de Portugal procedeu à recolha de informação mais detalhada sobre a transação em análise, no sentido de verificar se a deliberação de agosto tinha sido executada adequadamente, tendo em conta os seus próprios termos e o disposto na alínea c) do n.° 2 do artigo 145.°-H do RGICSF. Serve a presente informação para analisar, com base na informação recolhida, se c em que medida, o tratamento que tem vindo a ser dado à responsabilidade do B.......... E.......... S.......... perante a O....... Finance Luxernbourg SA se encontra de acordo com os termos definidos na deliberação de agosto e na lei.

A. O empréstimo obtido pelo B.......... E.......... S.......... junto da O....... F…………… Luxemboutg e a intervenção da G.......... S........

9. De acordo com o parágrafo 3.1. da Secção I do contrato de financiamento disponibilizado como ANEXO l, a finalidade do empréstimo concedido pela O....... Finance Luxernbourg ao B.......... E.......... S.......... foi a de financiar operações de trade ftnance no âmbito das relações entre a sociedade Wison Engineering Ud. e a sociedade PDVSA Services BV, com respeito a um projeto de conversão profunda ,. de uma refinaria em Puerto La Cruz, na Venezuela.
10. O recurso a este meio de financiamento foi aprovado pela Comissão Executiva, do B.......... E.......... S.........., em reunião realizada no dia 21 de maio de 2014
(ANEXO 9), na qual se explica que o B.......... E.......... S.......... se encontrava a trabalhar com a G.......... S........ no sentido de encontrar meios alternativos de financiamento depois de o Industrial ……………. Bank of China (1CBC) e a S………………. se terem mostrado indisponíveis para emprestar os fundos previamente acordados no âmbito do financiamento das referidas operações de frade finance.
11. Nessa mesma reunião, equacionaram-se diferentes opções de financiamento, nomeadamente a possível obtenção de um empréstimo junto de um veiculo a constituir para o efeito ou a emissão de obrigações, por parte do B.......... E.......... S.........., ao abrigo de programa de Euro Médium Terrií Notes (EMTN).
12. A decisão da Comissão Executiva do B.......... E.......... S.......... teve por base uma nota, datada de 14 de maio de 2014, elaborada pelo Departamento de International Business and Private Banking (DIBPB) do B.......... E.......... S.......... (ANEXO 10), na qual se referia, nomeadamente que:
a. "o G.......... S........ ("GS")foi introduzida ao BES em 12/03/2014 [vide descrição da proposta apresentada pela G.......... S........ ao B.......... E.......... S.......... TIO parágrafo 23 e seguintes], tendo ambas Entidades Financeiras trabalhado numa solução viável para permitir que o BES, através da sua sucursal em Luxemburgo, atue como I……… Bank e N…………Bank das L/C 's e seja então o responsável pela antecipação dos fundos relativos aos documentos apresentados em conformidade pela Wison ou com divergências aceites pelo Ordenador";
b. "A solução financeira está em fase final de negociação e montagem da documentação jurídica, sendo o DFME o interlocutor principal em representação do SÉS junto ã GS e tratar-se-a de um empréstimo bilateral ao BES Luxemburgo a ser concedido por um SPV (specialpurpose vehicle) estabelecido pela OS também no Luxemburgo (. ..);
c."O SPV irá emitir Private Notes que serão adquiridas pela OS e o fluxo proveniente do recebimento relativo à emissão por parte do SPV, será então direcionado para o empréstimo a efetuar pelo SPV ao BES',
13. A nota do DIBPB era acompanhada de um mapa de cash flows relativos à operação (ANEXO 11), no qual estavam representados os seguintes tipos de fluxo financeiro: "Inflow GS", "Ressarcimento GS" e "Outflow GS", sendo que, conforme explicitado na referida nota do DIBPB, "GS" corresponde a G.......... S......... O "Inflow GS" corresponde a um montante de 730.312.422 dólares dos EUA, que é o valor de liquidação do empréstimo obtido junto da O....... F……………….., conforme referido no parágrafo 5 c melhor explicado no parágrafo 18.
14. A decisão da Comissão Executiva do B.......... E.......... S.......... teve ainda por base uma apresentação (ANEXO 12), na qual se descreviam as duas opções de financiamento referidas no parágrafo 11. Relativamente ao empréstimo a obter junto de um SPV, a apresentação identifica o credor como tratando-se da O....... F…………. Luxembourg SA e o eventual recurso a uma emissão de EMTN era apresentada como a alternativa "caso não se chegue a acordo com a OS relativamente ao financiamento através do SPV.
15. A O....... F………….Luxembourg SA foi constituída no dia 30 de abril de 2014, sob a forma de sociedade anónima qualificada como sociedade de titularização (certidão disponibilizada como ANEXO 13). É detida pela sociedade S……… O....... F………, uma fundação de direito holandês, constituída no mesmo dia 30 de abril de 2014 (certidão disponibilizada como ANEXO14), cujo objeto social consiste exclusivamente na gestão e no controlo da participação na O....... F………… Luxembourg SÁ (escritura de constituição disponibilizada como ANEXO 15).
16. No dia 3 de julho de 2014, i.e. na data em que ocorreu a entrega ao B.......... E.......... S.........., pela O....... F………. Luxembourg SÁ, do montante mutuado, a O....... F………… Luxembourg SA realizou uma emissão de fixed rate secured instalmente notes, no valor global de 784.600.000 dólares EUA.
17. De acordo com o prospero daquela emissão (ANEXO 16), o ativo subjacente às notas de titularização consiste no empréstimo concedido pela O....... F………….. Luxembourg SA ao B.......... E.......... S.......... nos termos do contrato disponibilizado como ANEXO 1. Ainda de acordo com o prospero, as verbas disponibilizadas ao B.......... E.......... S.......... ao abrigo daquele contrato de financiamento correspondem a 94% do valor nominal do financiamento, deduzido de comissões a pagar pelo B.......... E.......... S.......... diretamente à G.......... S.........
18. De acordo com zfee letter dirigida pela G.......... S........ International ao B.......... E.......... S.......... e à O....... F…………… Luxembourg (ANEXO 17), as comissões correspondem a 6,5% do valor nominal do empréstimo concedido pela O....... F……..Luxembourg SA ao B.......... E.......... S.......... (54 251 780 dólares EUA), pelo que o valor líquido efetivamente recebido pelo B.......... E.......... S.......... no dia 3 de julho de 2014 ascendeu a 730.312.422 dólares dos EUA, precisamente o valor indicado sob a designação "Infiow GS" no mapa de cash flows apresentado à Comissão Executiva do B.......... E.......... S.......... no dia 21 de maio de 2014.
19. Nos termos do prospeto da emissão realizada pela O....... F……………. Luxembourg SA, a G.......... S........, e mais concretamente a sociedade G.......... S........ International, desempenha as funções de arranger, dealer, calculation agent, disposal agent e process agent da operação.
20.No mesmo prospeto, é referido que:
a. A própria G.......... S........ se encontra diretamente exposta ao ativo utilizado como garantia patrimonial da emissão (i.e. o empréstimo da O....... F…………… Luxembourg SA ao B.......... E.......... S..........);
b. Que a colocação das notas de titularização irá permitir à G.......... S........ reduzir a sua exposição à garantia patrimonial da emissão;
c. Que a G.......... S........ incorreu na exposição à garantia patrimonial da emissão na perspetiva de a distribuir através da emissão das notas de titularização;
d. Que a colocação das notas de titularização irá permitir à G.......... S........ transferir/distribuir a sua exposição à garantia patrimonial da emissão junto dos investidores nos títulos emitidos pela O....... F………….. Luxembourg SA.

Por se afigurar ilustrativo das afirmações precedentes, passamos a citar o seguinte excerto do prospeto:
"A completed offering of Notes may reduce G.......... S........'s existing exposure to the Assets. G.......... S........ incurred this exposure with a vieiv toward distríbuting the exposure by means of an offering pursuant to this Prospectus. An offering pursuant to this Prospectus may effectively transferi distríbute a significant portion of G.......... S........ 's exposure to investors in the Notes."
21. No prospeto também se afirma que a O....... F………….. Luxembourg SA é titular de certas responsabilidades perante a G.......... S........ e que a liquidez obtida pela comercialização das notas de titularização poderá ser utilizada para o reembolso dessas responsabilidades, conforme decorre do excerto que se segue:
"The proceeds received by the Issuer on an offering of Notes may be used to repay obligations of the Issuer to G.......... Sach."
22. No prospeto é ainda referido que é a própria G.......... S........ que se encontra a alienar as notas de titularização que estão a ser colocadas e que dessa venda resultarão perdas ou ganhos diretamente para a G.......... S........, conforme se pode concluir a partir do seguinte excerto:
"G.......... S........ is selling the Notes as principal and will generate revenues as well as a profit or loss from its own account from any offering, depending on the price obtained and other factors ".
23. Acrescente-se que toda a configuração da operação, conforme descrita nos parágrafos anteriores, reflete os termos de proposta apresentada pela G.......... S........ ao B.......... E.......... S.........., em março de 2014 (que corresponde à proposta mencionada na nota do Departamento de International Business and Private Banking do B.......... E.......... S.........., com base na qual a Comissão Executiva aprovou, em 21 de maio, a operação).
24. Naquela proposta da G.......... S........ (ANEXO 18), refere-se expressamente que:
a. "G.......... S........ will set up a newly incorporated Spedal Purpose Vehicle and appoint necessary agents with respect to the transaction";
b. "G.......... S........ will arrange for the incorporation of a bankruptcy remate SPV (...) [and] G.......... S........ will appoint various agents including a Trustee (and loan agent) to act in certain capacities under the transaction";
c. "G.......... S........ 01' its Designees will extend a Loan [of approximately USD 835m] to the SPV [and] the SPV will use the Loan proceedss to pay (. . .) to B.......... E.......... S..........";
d. Um dos fundamentos para o recurso a esta via de financiamento é o facto de que "BES are seeking to preserve maximum conftdentiality both during execution and post issuance [and] an SPV loan would be executed on a private, bilateral basis".

B. Diligências promovidas pelo B.......... de Portugal

25. Para além da recolha dos factos apresentados na Secção A da presente informação, o B.......... de Portugal procurou obter, diretamente junto da O....... F………….Luxembourg SA e do seu acionista, informação sobre o respetivo beneficiário efectivo.
26. Para o efeito, foram remetidas cartas à O....... F……….. Luxembourg SA e à S…………O....... F………….Luxembourg, no dia 12 de dezembro de 2014 (ANEXOS 19 e 20), solicitando resposta até ao dia 18 do mesmo mês.
27. Foi ainda remetida cópia da carta dirigida à O....... F………… Luxernbourg SA à entidade designada como agente da operação de financiamento ao B.......... E.......... S.......... (The Bank of New York Mellon), por mensagem de correio eletrónico de 16 de dezembro (ANEXO 21), bem como, no dia 12 de dezembro, cópia da carta dirigida à S………. O....... F………..Luxembourg SA ao contacto indicado na certidão daquela sociedade (ANEXO 22).
28. Em resposta (ANEXO 23), foi apenas transmitido ao B.......... de Portugal que a O....... F…………..Luxernbourg SÁ é detida integralmente pela Stichting O....... F……….. Luxembourg e que esta sociedade "não tem beneficiário efetivo", tendo sido disponibilizados alguns documentos sobre a S……….O....... F……….., nomeadamente a escritura de constituição (já mencionado como ANEXO 15) e um excerto da certidão de registo (ANEXO 24).

C. A participação da G.......... S........ no B.......... E.......... S.........., SA
.
29. Conforme declarado pela G.......... S........ em comunicação efetuada ao B.......... E.......... S.......... (ANEXO 25), nos termos do disposto no artigo 12.°, n.° l da Diretiva 2004/109/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Dezembro de 2004, e no artigo 11.°, n.° 3 da Diretiva 2007/14/CE da Comissão, de 8 de Março de 2007, a empresa-mãe do grupo (G.......... S........ Group, Inc.) detinha, direta ou indiretamente, uma participação de 2,27% do capital social do B.......... E.......... S.........., da qual 2,05% era detida diretamente pela G.......... S........ International. Naquela comunicação, a G.......... S........ comunica a ultrapassagem do limiar dos 2%, com referência ao dia 15 de julho de 2014, fazendo ainda a seguinte referência "G.......... S........ International (Controlled by G.......... S........ Holdings (U.TL)); 115,403,563 shares: 2.05%".

D. Enquadramento do empréstimo da O....... F……………. Luxemburg SA nos termos previstos na deliberação de agosto e no nº 2 do artigo 145º -H do RGICSF

30. Conforme se referiu no início da presente informação, não podem ser transferidas para um b.......... de transição constituído pelo B.......... de Portugal no âmbito da aplicação de urna medida de resolução quaisquer responsabilidades contraídas pela instituição de crédito originária perante, entre outros, terceiros que atuem por conta de entidades que, nos dois anos anteriores à transferência, tenham tido participação igual ou superior a 2% do capital social da instituição originária.
31. A “deliberação de Agosto” dá cumprimento a este preceito legal, mais precisamente na subalínea i) da alínea b) do seu anexo 2.
32. O financiamento concedido pela O....... F………… Luxembourg SA ao B.......... E.......... S.........., de um valor muito significativo, foi realizado cerca de um mês antes da materialização das condições pelas quais o B.......... E.......... S.......... deixou de cumprir os requisitos para a manutenção da autorização para o exercício da respetiva atividade e se tornou efetivamente impossibilitado de cumprir as respetivas obrigações, sendo-lhe por isso aplicada uma medida de resolução. Ou seja, este financiamento foi concedido num período, portanto, em que o b.......... já enfrentava fortes restrições no acesso ao financiamento devido à incerteza e ao risco que, nessa altura, eram percecionados pelos agentes de mercado.
33. Com efeito, no decurso do mês de junho e de julho de 2014, o B.......... E.......... S.......... sentia fortes restrições no acesso aos normais mecanismos de financiamento de mercado, tornando-se dependente, para efeitos do financiamento da sua atividade, não apenas dos fundos obtidos em operações de política monetária, mas também, e tal era a gravidade da insuficiência de liquidez, do recurso às facilidades do B.......... de Portugal de cedência de liquidez em situação de emergência.
34. Neste contexto, seria inverosímil que o B.......... E.......... S.......... obtivesse um financiamento no valor de 835 milhões de dólares dos EUA em condições normais de mercado cm 30 de junho de 2014, ou seja, dois meses antes da celebração do contrato de financiamento, e sobretudo junto de uma entidade constituída no dia 30 de abril de 2014, e relativamente à qual não se conhecem outras atividades ou outro património.
35. Por outro lado, note-se que os factos descritos na secção A da presente nota, constituem razões sérias e fundadas para justificar a convicção de que, ao conceder ao B.......... E.......... S.......... o empréstimo no montante de 834.642.768 dólares dos EUA, a O....... F……….. Luxembourg SÁ atuou por conta da G.......... S........, e nomeadamente por conta da sociedade G.......... S........ International, relativamente à qual existem também razões sérias e fundadas para considerar que deteve uma participação superior a 2%) no capital social do BES em julho de 2014.
36. Com efeito, do supra descrito é legítimo concluir que:
a.A O....... F……………. Luxembourg SA foi constituída pela G.......... S........ especificamente para efeitos de concessão do empréstimo ao B.......... E………..S..........;
b. A O....... F……… Luxembourg foi, inclusivamente, financiada pela G.......... S........ International, com a finalidade específica de ser concedido ao B.......... E.......... S.......... o empréstimo no montante de 834.642.768 dólares dos EUA; C. A O....... F…………..Luxembourg foi constituída para permitir à G.......... S........ Internatianal distribuir/transferir junto de uma base de investidores o risco decorrente da sua exposição ao B.......... E.......... S.........., decorrente do empréstimo;
d. A G.......... S........ International obteve diretamente proveito económico da concessão do empréstimo ao B.......... E………….. S.........., ao receber uma comissão fixada em percentagem do valor nominal daquele empréstimo (6,5%, conforme explicitado nafee letter);
e. O B.......... E.......... S.........., aliás, tratou o empréstimo como um financiamento obtido junto da G.......... S........, conforme evidenciam os documentos aprovados pela Comissão Executiva do b.......... em maio de 2014 e ainda as mensagens de correio eletrónico trocadas internamente a respeito da execução do financiamento (ANEXO 26).
37. Aliás, conforme se referiu no ponto 7. tornou-se consabido, na comunidade financeira internacional, que, efetivamente, foi a G.......... S........ quem concedeu, de facto, o financiamento ao B.......... E.......... S.......... e que a O....... F……….. Luxembourg SA atuava por conta da G.......... S........, conforme se pode constatar das referências abundantes na imprensa internacional sobre o assunto.
38. Neste contexto, caso se viesse a admitir a transferência da responsabilidade do B.......... E……….S.......... perante a O....... F…………. existiria o risco grave de se permitir uma violação irreparável do disposto na subalínea (i) da alínea b) do n.° l do Anexo 2 à deliberação do Conselho de Administração do B.......... de Portugal de 3 de agosto de 2014 (20:00h), com a redação que lhe foi dada pela deliberação do mesmo Conselho de Administração de 11 de agosto de 2014 (17 :00 horas), e do disposto no artigo 145.°-H, n.° 2, alínea c), do RGICSF.
39. Assim, não deve admitir-se a transferência para o N...... B.......... da responsabilidade do B.......... E.......... S.......... perante a O....... F…………., decorrente do contrato de financiamento de 30 de junho de 2014, continuando o B.......... E.......... S.......... a ser o devedor desta obrigação, como sempre foi e nunca deixou de ser, sem prejuízo de só agora ter sido recolhida a evidência que conduz à presente conclusão.
40. Coloca-se este entendimento à consideração superior." (..)”

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Feita a transcrição da matéria de facto que neste particular importa, relativa à deliberação de 22.12.2014 do Conselho de Administração do B.......... de Portugal, ora Recorrido, cuja suspensão de eficácia vem peticionada, concluímos que o elenco da matéria de facto julgada provada conjugado com a apreciável complexidade de subsunção normativa das diversas questões suscitadas pelas partes, não evidencia em juízo de summaria cognitio uma aparente ilegalidade e, muito menos, uma evidente ilegalidade no agir administrativo traduzido na citada deliberação de 22.12.2014 - artº 120º nº 1 a) CPTA, vd. item ll) das conclusões -, sendo que neste segmento se acompanha o entendimento sufragado pelo Tribunal a quo.
A controvérsia suscitada nos autos reclama um exame e apreciação exaustivos e completos da questão de fundo, que são próprios do juízo de certeza da acção principal – o que é corroborado pela profundidade de análise jurídica da matéria, constante do corpo alegatório das peças de recurso apresentadas.
O mesmo é dizer que não se tem por verificado o fumus boni iuris, porque o juízo de verosimilhança, ainda que de apreciação perfunctória, é totalmente inadequado para emitir pronúncia jurídica de ilegalidade sobre a deliberação que “(..) determinou a não transferência de responsabilidades do BES perante a O....... F………….Luxemburg S.A. para o b.......... de transição (N...... B..........) (..)”, conforme item aa) das conclusões de recurso.
A não verificação da ilegalidade da actuação administrativa, pressuposto atinente ao fumus boni iuris, implica a improcedência da causa, na exacta medida em que a concessão de providências cautelares exige a verificação dos três requisitos gerais enunciados no artº 120º nº 1 b) e c) e nº 2 do CPTA (fumus boni iuris, periculum in mora e ponderação de interesses).

*
No mesmo sentido de a summaria cognitio e o juízo de verosimilhança cautelares se configurarem inadequados em matéria cuja complexidade, vertida nas questões de fundo – de facto e de direito –, remete para juízos de certeza jurídica próprios da acção principal, se pronunciou este TCAS em acção cautelar interposta no âmbito do accionamento do Sistema de Indemnização aos Investidores (SII) consequente à deliberação do Conselho de Administração do B.......... de Portugal de 15 de Abril de 2010, que revogou a autorização para o exercício da actividade bancária do BPP, in rec. nº 7186/11 de 10.FEV.2011, de que fomos relatora.
Pelo exposto, improcede a questão trazida a recurso no item ll) das conclusões, julgando-se, em consequência, prejudicada a sindicabilidade da matéria de facto levada ao probatório nos itens mm) e nn) das conclusões e a requerida revogação da segunda parte do despacho de 09.07.2015 (fls ---- algures do processo) que indeferiu a produção de prova testemunhal requerida.


5. Acórdão revogatório do STA; providência conservatória – artº 120º nº 1 b) CPTA;

Em via de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, no regime do artº 150º CPTA, este Alto Tribunal proferiu acórdão revogatório cujo segmento decisório é o seguinte:
“(..) a) julgar procedente o presente recurso de revista, revogando parcialmente a decisão recorrida, devendo os autos baixar ao TCAS a fim de aí prosseguir a apreciação do mérito da providência cautelar, se a tal nada obstar,
b) julgar improcedente o pedido de ampliação do âmbito do recurso. (..)”
Em ordem a delimitar os exactos termos do ordenado, no sentido de “… prosseguir a apreciação do mérito da providência cautelar …”, a fundamentação do julgado no segmento decisório da alínea a) – fls. 47 - é a que, de seguida, se transcreve.
“(..) Em síntese, a decisão recorrida não terá apreciado apenas a providência cautelar à luz da al. a) do artigo 120.° do CPTA, tendo depois avançado para uma apreciação genérica do fumus, da qual concluiu que, dada a complexidade da questão, "porque o juízo de verosimilhança, ainda que de apreciação perfunctória, é totalmente inadequado para emitir pronúncia jurídica de ilegalidade sobre a deliberação....".
A forma como o fez, no entanto, não se mostra clara, sendo passível de várias leituras, designadamente, da da recorrente (de notar que no parecer que acompanha a resposta do recorrido à pronúncia do MP se faz menção, justamente, a uma certa falta de clareza: "3.2. Sobre o fumus boni iuris; 3.2.1. As duas interpretações possíveis do Acórdão do TC A Sul; sequência; "69. Não se desconhece, porém, que do processo cautelar hoje subido ao Supremo Tribunal Administrativo resultem outros elementos interpretativos que façam acrescer a esta hipótese interpretativa uma outra: a de considerar que, naquela rubrica 4., o TCA Sul também teria julgado do preenchimento ao fumus boni iuris à luz da alínea b) do n.° l do artigo 120.° do CPTA").
O que é absolutamente claro é que, contrariamente ao sustentado pelo recorrido - "Em todo o caso, e independentemente da designação dada ao critério da aparência do bom direito da alínea b) do n.° l do artigo 120.° do CPTA, a verdade é que o Tribunal a quo o apreciou de forma expressa" -, a decisão recorrida não apreciou especificamente o fumus boni juris na perspectiva da al. b).
Antes parece ter apreciado, como já afirmámos, o fumus de forma genérica - tanto aplicável à al. b) como à c) — e, concluindo pela inadequação/impossibilidade de emitir pronúncia jurídica sobre a ilegalidade, considerou prejudicado o conhecimento dos restantes requisitos.
Este modus operandi não se mostra consentâneo com a necessidade de apreciação do fumus consoante os seus vários graus de intensidade ou exigência, tal como contemplados nas alíneas a), b) e c) do n.° l do artigo 120.°.
Cumpre, pois, fazer essa apreciação de forma autónoma e, ao fazê-la, será avaliada a fundamentação utilizada pela decisão recorrida para afastar o conhecimento dos requisitos ao periculum in mora e da ponderação de interesses.
Sem necessidade de grandes desenvolvimentos, é sabido que a aparência de bom direito contemplada na al. b) está formulada em termos de menor exigência por comparação com o fumus da al. c).
Assim, se nos termos desta última alínea se exige que se verifique uma probabilidade séria de existência do direito, devendo criar-se no julgador a convicção de que há uma séria probabilidade de, na acção principal, o requerente obter ganho de causa, relativamente ao fumus da al. b), o julgador deve bastar-se com a convicção de que não é manifestamente improvável que, na acção principal, o requerente veja acolhida a sua pretensão.
Daí que haja quem, para dar conta do menor grau de exigência ou de intensidade do fumus da al. b), prefira a expressão fumus non malus juris.
Reportando-nos agora à decisão recorrida, se nela está afirmado que a questão é de grande complexidade, o que não se contesta, bem pelo contrário, apenas podemos concluir que não é manifestamente improvável que a requerente venha a obter ganho de causa na acção principal.
Corrobora-se, deste modo, a asserção contida na declaração de voto junta ao acórdão recorrido, segundo a qual, "só através de uma laboriosa indagação em termos de direito se pode apurar se a acção principal procede ou não, o que é suficiente para se concluir que a sua improcedência não é manifesta, antes exigindo uma análise exaustiva".
Nestes termos, procede a pretensão recursiva da ora recorrente nesta parte, devendo os autos baixar ao TCAS para apreciação dos restantes requisitos do artigo 120.°, salvo se coisa diversa resultar do pedido de ampliação que seguidamente será apreciado. (..)”.

*
Nos termos da fundamentação transcrita, cumpre decidir quanto às seguintes questões:
(i) “… a decisão recorrida não apreciou especificamente o fumus boni juris na perspectiva da al. b). …”,
(ii) “… Reportando-nos agora à decisão recorrida ... apenas podemos concluir que não é manifestamente improvável que a requerente venha a obter ganho de causa na acção principal….”
(iii) “…Corrobora-se, deste modo, a asserção contida na declaração de voto (..), segundo a qual, "só através de uma laboriosa indagação em termos de direito se pode apurar se a acção principal procede ou não, o que é suficiente para se concluir que a sua improcedência não é manifesta, antes exigindo uma análise exaustiva"…”
sem que, à luz do bloco normativo que compete, a referência à “laboriosa indagação em termos de direito” e “análise exaustiva” signifique que se ordene a elaboração de um juízo de certeza próprio da causa principal pendente em 1ª Instância.
Efectivamente, no Acórdão revogatório o Colendo Supremo Tribunal Administrativo expressamente baliza o conhecimento do mérito da acção segundo o regime das providências conservatórias constante do artº 120º nº 1 b) CPTA e consequente critério normativo do fumus non malus juris, nos termos do CPTA anterior à revisão de 2015, ou seja, segundo a formulação de “(..) um juízo negativo de não-improbabilidade (non fumus malus) da procedência da acção principal para fundar a concessão de uma providência conservatória (..)”. (8)
Como nos diz a doutrina, a característica da provisioriedade significa que “(..) não está em causa a resolução definitiva de um litígio e a sumaridade que se manifesta numa cognição sumária da situação de facto e de direito, própria de um processo provisório e urgente. (..)”, ou seja, “(..) a decisão cautelar é uma “apreciação perfunctória”, “sumária” e “provisória da lide”, já que, em termos de prova, sobre a lide cautelar é realizada uma sumaria cognitio e uma apreciação em termos de juízos de verosimilitude ou verosimilhança.(..)”. (9)


6. fumus non malus juris; sumaria cognitio da situação de facto e de direito; juízos de verosimilhança;

De acordo com o disposto no artº 120º nº 1 b) CPTA, anterior à revisão de 2015, o critério de apreciação da necessidade da tutela cautelar há-de assentar num juízo sumário de procedibilidade da pretensão, isto porque “(..) a par da urgência no decretamento da providência, justificada pelo periculum in mora, … há que aferir: - estando em causa a paralisação dos efeitos de uma actuação administrativa, o fumus non malus iuris da pretensão do requerente, ou seja, a não manifesta falta de fundamento desta; (..)” (10)
Para dar como verosímil a formulação negativa da aparência do bom direito, ou fumus non malus iuris, basta que não seja evidente a improcedência da pretensão de fundo formulada, ou a formular, no processo principal. (11)
Acresce que em sede cautelar administrativa “(..) a apreciação do fumus boni iuris requer não apenas a emissão de um juízo sobre a aparência da existência de um direito ou interesse do particular a merecer tutela, como também da probabilidade da ilegalidade da actuação lesiva do mesmo (..)” isto é a apreciação do fumus boni iuris estende-se sobre a aparente ilegalidade da actuação administrativa assacada pelo particular como lesiva de um direito que lhe assiste. (12)

*
No caso trazido a recurso, o juízo negativo de não-improbabilidade da procedência da acção principal, isto é, da verificação do fumus non malus juris para o Tribunal decretar a requerida suspensão de eficácia da deliberação de 22.12.2014 do Conselho de Administração do B.......... de Portugal, no sentido da não transferência para o N...... B.......... do passivo do B.......... E.......... S.......... (B……..) perante a O....... F……………. Luxembourg SA, tem como ponto fundamental a análise de duas questões:
1. a O....... F….. Luxembourg SA ao conceder ao B…… em 30.JUN.2014 um empréstimo no valor de 834.642.768 dólares norte-americanos fê-lo por conta da G.......... S........ International
2. sendo aplicável a esta operação de empréstimo bancário o regime do artº 145º H nº 2 alínea c) do RGICSF
3. a participação da G.......... S........ International no capital social do B…. superior a 2%, conforme comunicações de 21.07.2014 e 29.07.2014 efectuadas pela The G.......... S........ Group (itens 24 e 34 do probatório)
4. sendo aplicável o regime do artº 145º H nº 2 alínea a) do RGICSF
São exactamente, estas, as duas questões que constituem o cerne do litígio cautelar relativamente ao pressuposto da aparência do bom direito, na vertente do fumus non malus iuris (artº 120º nº 1 b) CPTA anterior à revisão de 2015) por parte da ora Recorrente:
(i) a primeira, relativa ao agir da O....... F………… Luxembourg SA, por conta da G.......... S........ International no tocante ao citado empréstimo ao B…….;
(ii) a segunda, da participação da G.......... S........ International no capital social do BES superior a 2%,.

*
No caso concreto, ora Recorrente G.......... S........ International pretende “(..) ver inscrita na contabilidade do N...... B.......... a responsabilidade de que o B.......... E.......... S.......... tinha assumido perante a O....... Finance Luxembourg SA – e, em sede cautelar, obter tal inscrição a título provisório, até que seja decidida a acção principal de impugnação da deliberação do Conselho de Administração do B.......... de Portugal de 22 de Dezembro de 2014. (..)”
“(..) [na deliberação é] assumido (que) o entendimento do Conselho de Admi­nistração do B.......... de Portugal de que, na concessão de um financiamento ao B.......... E.......... S.........., a O....... Finance atuou por conta da G.......... S........ Inter­national se funda numa "convicção" justificada em "razões sérias e fundadas"; que "existem também razões sérias e fundadas para considerar" que a G.......... S........ International está incluída na alínea a) do n.° 2 do artigo 145.°-H do RGICSF; e que é por isso que não pode admitir-se a transferência para o N...... B.........., S.A. da responsabilidade do B.......... E.......... S.......... perante a O....... Finance, "atento o risco grave de se permitir uma violação irreparável" do deliberado pelo Conselho de Administração do B.......... de Portugal em 3 de agosto de 2014, em conformidade com o disposto no artigo 145.°-H, n.° 2, alínea c), do RGICSF.
E a informação interna para a qual remete o transcrito ponto 4. confirma, de facto, que a proposta de decisão que foi assumida pelo Conselho de Adminis­tração do B.......... de Portugal na sua deliberação de 22 de dezembro de 2014 se fundou apenas num conjunto de indícios, quer no que diz respeito à questão de saber se, na concessão de um financiamento ao B.......... E.......... S.........., a O....... F………….. atuou por conta da G.......... S........ International, quer quanto à questão de saber se esta deteve uma participação superior a 2% no capital social do B.......... E.......... S.......... em julho de 2014.
Em resposta a reclamação deduzida pela Consulente, o Conselho de Ad­ministração do B.......... de Portugal, por deliberação de 11 de fevereiro de 2015, assumiu, entretanto, as conclusões de uma informação interna que, confirmando o que precede, ainda o tornou mais evidente.
Com efeito, é assumido na referida informação interna que "os factos demonstrados indiciam que a O....... Finance atuou por conta da GSI no financiamento concedido ao B…….." e que "subsistem razões sérias e fundadas, tanto no plano dos factos como no da interpretação da lei, para manter a convicção firmada na deliberação de 22 de dezembro de 2014, com base nas notificações da GSI, de que esta deteve durante o mês de julho de 2014 uma participação superior a 2% no capital social do BES". (..)” (13)

*
Todavia, atenta a conformação normativa do artº 120º nº 1 b) CPTA no tocante ao critério do fumus non malus iuris, temos que concluir que a matéria de facto a que se reportam as citadas comunicações de 21.07.2014 e 29.07.2014, pela sua complexidade probatória e subsuntiva no complexo normativo aplicável de direito societário e bancário, extravasa dos termos de juízos de verosimilitude ou verosimilhança próprios da sumaria cognitio cautelar.
A questão de saber se a The G.......... S........ Group deteve, ou não, mais de 2% do capital social do BES (matéria das comunicações de 21.07.2014 e 29.07.2014, levadas aos itens 24 e 34 do probatório) não passa apenas pela mera comprovação documental de registos contabilísticos societários.
Passa por subsumir essa mesma factualidade no domínio conceptual próprio quer do direito das sociedades comerciais quer do direito bancário.
Só depois de se considerar firme a qualificação jurídica que compete, se pode avançar para o patamar seguinte, a saber,
(i) integrar, ou não, a matéria no domínio da previsão normativa do artº 145º-A nº 2 alíneas a) e c) do RGICSF (na redacção dada pelo DL 114-A/2014, 01.08)
(ii) aferir da conformidade ou desconformidade da deliberação de exclusão do património do b.......... de transição - no caso, o N...... B.......... constituído pelo B.......... de Portugal no âmbito da aplicação de urna medida de resolução ao B.......... E.......... S.......... - com o regime do artº 145º-H nº 2 a) do RGICSF.
Dito de outro modo, aferir da bondade jurídica, ou não, da deliberação de exclusão de responsabilidades contraídas pela instituição de crédito originária (no caso o B…….) perante terceiros (as sociedades O....... F………….. Luxembourg SA e G.......... S........ International), conforme fundamentos da deliberação de 22.12.2014 do Conselho de Administração do B.......... de Portugal, no sentido da não transferência para o N...... B.......... do passivo do B.......... E.......... S.......... (B………) perante a O....... Finance Luxembourg SA, deliberação cuja suspensão de eficácia é peticionada pela ora Recorrente.
Saber se as sociedades O....... F………… Luxembourg SA e G.......... S........ International actuaram por conta própria e não por conta do BES bem como se se pode concluir pela titularidade de participação igual ou superior a 2% do capital social da instituição originária (o B……) configura matéria de facto e consequente subsunção de direito que exige, sem margem para dúvidas, juízos de certeza próprios da acção principal, na medida em que no seu conjunto configuram matéria que está muito para além da previsão da aparência do bom direito na formulação negativa do artº 120º nº 1 b) CPTA segundo juízos de verosimilhança, ou seja, juízos provisórios, próprios do processo cautelar.

*
Sobre o conteúdo das comunicações de 21.07.2014 e 29.07.2014 efectuadas pela The G.......... S........ Group (itens 24 e 34 do probatório) que fundamentam o entendimento fundamentador da deliberação de 22.12.2014 do Conselho de Administração do B.......... de Portugal no sentido da participação da G.......... S........ International no capital social do B….. superior a 2%, o Parecer junto aos autos evidencia a insusceptibilidade de configurar matéria, quer de facto quer de direito, no âmbito cautelar, como se transcreve.
“(..) os técnicos do BdP entendem que a G.......... S........ detinha, direta ou indiretamente, 2,27% do capital social do BES.
Este ponto é controverso.
Segundo a GSI, antes sucedeu o seguinte:
- em 21-jul.-2014, nos termos do Direito aplicável, o The G.......... S........ Group comunicou a titularidade, direta e indireta, de 89.786.320 ações correspondentes a 1,60% do capital social do B…. e ainda, posições económicas longas sobre 37.879.667 ações, equivalente a 0,67% do capital do mesmo banco
- em 29-jul.-2014, reportou a redução dessas suas posições.
Neste último caso, usou um modelo Standard de comunicação que não contém um campo específico para as posições económicas longas relativas a ações do B…, nos termos de instrumentos financeiros que não confiram direitos de aquisição ou direitos de voto sobre essas ações.
Por isso, a comunicação foi feita através do preenchimento do quadro relativo a instrumentos que permitiriam a aquisição de ações e/ou de instrumentos de voto.
V. Em suma: interpretando o financiamento da O....... F………. SA, como sendo da própria GSI e tomando à letra as comunicações de 21-jul.-2014 e de 29-jul.-2014, que atribuiriam, ao GSI, 2,27% do capital do B…….., o BdP regraduou aquele financiamento à categoria dos valores que não passariam para o N...... B........... (..)
“(..) IV. De seguida, cabe analisar o tema da quebra do banqueiro e, mais particularmente, o sistema resultante da reforma de 2012, do Regime Geral das Instituições de Crédito.
Entre as medidas então introduzidas, temos a denominada resolução, diretamente em jogo no presente caso.
Esses dois pontos constituem as duas rubricas que, sucessivamente, nos irão ocupar.
V. A moderna corporate finance dá muito relevo ao tema do levantamento da personalidade.
Na verdade, o privilégio da personalidade coletiva só se justifica nos limites do sistema. O seu abuso deve ser sancionado e da forma mais fácil: ignorando a existência de uma entidade coletiva diversa das que se lhe acolham.
Aparentemente, ao imputar à GSI as posições da O....... F……., SA, o BdP está, precisamente, a levantar a personalidade da O........ Haverá razões para tanto? Vamos, assim, considerar em abstrato, o levantamento.
VI. As dúvidas surgidas em torno da participação do Grupo G.......... S........ no capital do BES têm a ver com a tranche comunicada em 29-jul.-2014: estão em causa valores híbridos, alegadamente comunicados, com lapso, mercê da limitação dos impressos a preencher. Este ponto deve ser esclarecido.
Para já, faremos breves considerações sobre os híbridos.
VII. Tudo visto, a sequência vai ser a seguinte:
1l) a garantia comum e a par condido creditorum;
(2) a reforma do RGIC de 2012;
(3) a resolução;
(4) o levantamento da personalidade;
(5) os instrumentos híbridos.
Os elementos obtidos permitirão responder às grandes questões da consulta, facultando conclusões. (..)” “(..) 28. Instrumentos híbridos
I. Na atualidade, entre os capitais próprios e os alheios, surgem instrumentos híbridos ou financiamentos mezzanine. Temos, como exemplos:
- ações preferenciais sem voto;
- obrigações convertíveis;
- outros valores convertíveis;
- obrigações com warrant;
- empréstimos participantes;
- outros.
II. Em comum, estes instrumentos têm o de combinar algumas características associadas a financiamentos próprios e a alheios.
Grosso modo, diremos que dão corpo a uma posição que, sendo essencialmente uma aportação em dinheiro tipo empréstimo, têm, todavia:
- seja uma ponte para intervir em decisões do ente financiado;
- seja a possibilidade de passar a ações ou a outra manifestação de capital próprio.
III. Perante um híbrido, há que, em concreto, fazer um juízo de ponderação.
Consoante os valores em jogo, assim ele será tratado como capital próprio ou como capital alheio. (..)”
“(..) 31. A O....... F………….. Luxembourg, SA, foi acionista do B……….. ?
I. Os elementos disponíveis dizem-nos que, de acordo com o O....... Repackaging Note Programme de 15-mai.-2014, a O....... F……… emitiu títulos de dívida colocados junto de quatro investidores institucionais..
Os fundos assim obtidos foram redirecionados para a sucursal do B……..SA, no Luxemburgo, através de um mútuo ou loan facility agreement.
No dia 3-jul.-2014, o B….. sacou os fundos correspondentes, os quais se destinavam, designadamente, à PDVSA venezuelana, visando melhoramentos na Refinaria de Puerto de la Cruz.
II. Em suma: a O....... Finance emprestou dinheiro ao B……...
Tecnicamente, trata-se de capitais alheios deste, sem que surja, sequer, qualquer valor mobiliário emitido por aquele ex-banco.
O facto de os fundos terem sido captados, no mercado internacional, através da emissão de títulos, em nada perturba a realidade subjacente. Em caso algum a O....... F……….. pode ser assimilada a acionista do B….. (..)” (14)

*
Em face do transcrito e como já referido, as duas questões que constituem o cerne do litígio cautelar no tocante ao pressuposto da aparência do bom direito, na vertente do fumus non malus iuris (artº 120º nº 1 b) CPTA) por parte da ora Recorrente, fundadas nas citadas comunicações de 21.07.2014 e 29.07.2014, a saber,
(i) a primeira, relativa ao agir da O....... F……….. Luxembourg SA, por conta da G.......... S........ International no tocante ao citado empréstimo ao B……….
(ii) e a segunda, da participação da G.......... S........ International no capital social do BES superior a 2%,.
pela sua complexidade probatória e subsuntiva no âmbito do direito das sociedades comerciais e do direito bancário, extravasam dos termos dos juízos de verosimilitude ou verosimilhança próprios da sumaria cognitio cautelar.
O mesmo é dizer que, em sede de summaria cognitio, a factualidade levada ao probatório não retrata nenhum grau de ilegalidade assacável ao agir administrativo expresso pela deliberação de 22.12.2014 do Conselho de Administração do B.......... de Portugal, no sentido da não transferência para o N...... B.......... do passivo do B.......... E.......... S.......... (B……) perante a O....... F………. Luxembourg SA.

*
Na medida em que o decretamento da providência depende da verificação cumulativa dos três requisitos legais enunciados no artº 120º CPTA, o decaimento em sede de formulação negativa da aparência do bom direito alegado (fumus non malus iuris) importa a improcedência da acção cautelar e envolve a prejudicialidade de conhecimento das demais questões trazidas a recurso (periculum in mora e acréscimo de matéria de facto alegada em sede de outros danos patrimoniais e não patrimoniais ) especificadas nos itens mm) e nn) das conclusões, com reporte aos artigos 146 a 153 do corpo alegatório, bem como a requerida revogação da segunda parte do despacho de 09.07.2015 que indeferiu a requerida produção prova testemunhal.


7. Acórdão revogatório do STA de 18.MAI.2017 - fumus non malus iuris - caso julgado formal;

Em via de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, no regime do artº 150º CPTA, este Alto Tribunal proferiu Acórdão revogatório de 18.MAI.2017, cujo segmento decisório é o seguinte:
“(..) Atento o exposto, acordam em conferência os juizes que compõem este Tribunal em: - julgar procedente o recurso, nos termos supra expostos; - declarar nulo o Acórdão recorrido, na parte objecto do recurso; - determinar a baixa dos autos ao TCAS a fim de aí prosseguir a apreciação do mérito da providência cautelar, se a tal nada obstar. (..)”
Em ordem a delimitar os exactos termos do ordenado, no sentido de “… prosseguir a apreciação do mérito da providência cautelar …”, a fundamentação do julgado é a que, de seguida, se transcreve.
“(..) o Acórdão proferido por este STA em 03/NOV/2016, decidiu de forma clara, em apreciação autónoma, a questão do requisito do fumus non malus iuris previsto na alínea b), do n° 2 do art° 120° do CPTA, pois ao reportar-se de forma concreta ao caso dos autos [à então decisão recorrida], foi peremptório em afirmar, como supra se transcreveu, que «apenas podemos concluir que não é manifestamente improvável que a requerente venha a obter ganho de causa na acção principal. Corrobora-se deste modo, a asserção contida na declaração de voto junta ao acórdão recorrido, segundo a qual "só através de uma laboriosa indagação em termos de direito se pode apurar se a acção principal procede ou não, o que é suficiente para se concluir que a sua improcedência não é manifesta, antes exigindo uma análise exaustiva ".
Daí que, conhecido em definitivo, o fumus na sua vertente mais e menos exigente [negativa], se tenha determinado a baixa dos autos ao TACS para apreciação dos demais requisitos previstos no art° 120° do CPTA.
Assim, o que era pedido e ordenado ao TCAS, em sede de cumprimento do Acórdão deste Supremo Tribunal, era que conhecesse os demais requisitos, que são o periculum in mora e a ponderação de interesses, se esta se justificasse, mas já não o fumus non malus iuris, como veio a suceder, pois sobre esta questão já se havia formado caso julgado formal, impedindo o Tribunal recorrido de voltar a apreciar tal requisito.
Ao fazê-lo, o acórdão recorrido conheceu de questão que não podia ter conhecido, incorrendo assim no alegado vício de excesso de pronúncia (art°s. 140° do CPTA, 615°, l, d), 2a parte, 628°, 666°, n° l e 679° do CPC) o que gera a sua nulidade e prejudica o conhecimento das demais questões. (..)”.

*
Cabe, pois, conhecer do objecto do recurso no tocante ao requisito cautelar do periculum in mora uma vez firmado a favor da ora Recorrente o juízo perfunctório da aparência do bom direito na formulação negativa do artº 120º nº 1 b) CPTA.


8. duplo tipo de periculum in morarisco de infrutuosidade – aditamento de matéria de facto;

O decretamento da providência depende da verificação cumulativa dos três requisitos legais enunciados no artº 120º nºs. 1 e 2 CPTA, a saber, o receio da lesão (periculum in mora) a aparência do bom direito alegado (fumus boni iuris) e a proporcionalidade da decisão (ponderação de todos os interesses em presença).
O pressuposto do periculum in mora na vertente específica do perigo de infrutuosidade da sentença refere-se ao acervo de prejuízos previsíveis para o requerente cautelar em consequência da impossibilidade de execução da sentença na causa principal favorável ao direito aparente, posto que, embora venha a obter ganho de causa na acção principal, na prática nada fruirá de objectivamente útil para ressarcimento dos prejuízos sofridos, porque os factos do presente enunciam a possibilidade do desaparecimento de quanto tenha existência jurídicamente susceptível de execução no âmbito da esfera jurídica da contra-parte.
Por isso, no tocante ao “(..) periculum di infruttuosità a tutela cautelar tem fundamentalmente uma função cristalizadora, de protecção do status quo ante (..) da decisão da causa principal. (15)
No tocante ao “(..)“pericolo del ritardo”, como lhe chama a doutrina italiana, resulta para o demandante da satisfação tardia do direito, por causa da demora na composição da lide. Perante este prejuízo, a tutela cautelar tem como função solucionar interina e antecipadamente a lide. É o perigo de retardamento, por exemplo, aquele que ameaça o credor de alimentos, já que enquanto aguarda a condenação na prestação de alimentos, pode correr o risco de definhar. (..)”. (16)
De modo que “(..) O artº 120º do CPTA ao exigir para a adopção da providência cautelar que haja fundado receio da (..) produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal [implica que o Tribunal] deva fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil por, entretanto (..) se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deveria beneficiar, que obstam à reintegração específica da sua esfera jurídica. (..)
Como decorre da universalidade de providências admitidas, tanto releva actualmente o periculum in mora de infrutuosidade, que exigirá, em regra, uma providência conservatória, de modo a manter a situação existente, como o periculum in mora de retardamento, que postulará a adopção de uma providência antecipatória, que antecipe parcial ou mesmo totalmente, ainda que em termos provisórios, a solução pretendida. (..)”. (17)

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Firmado o quadro normativo do requisito cautelar do periculum in mora cabe aplicá-lo ao caso trazido a recurso.
O Digno Magistrado do Ministério Público pugna pela não verificação deste pressuposto cautelar pelas razões constantes do discurso jurídico fundamentador exarado no Parecer emitido, conforme segmento que se transcreve:
“(..) Por outro lado, parece-nos que a deliberação não é susceptível de causar prejuízos de difícil reparação ou irreparáveis à requerente dado, a existirem – facto que é meramente hipotético – estarmos perante prejuízos quantificáveis ou seja, passíveis de serem traduzíveis num montante certo, como aliás parece decorrer do alegado pela requerente. (..)” – vd. fls. (não numeradas) do Vol. XVIII dos autos.

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No caso trazido a recurso a ora Recorrente enquadra o quantum de cálculo dos prejuízos de difícil reparação de ocorrência previsível no domínio do perigo de infrutuosidade, no que se concorda, conforme itens (v) e (ii) das conclusões, nos seguintes termos,
§ “(v) Com efeito, resulta de forma clara do Requerimento Inicial essa mesma utilidade, tendo a Recorrente alegado e demonstrado os prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais., que para si decorrem da execução da deliberação em causa, nomeadamente um prejuízo directo de aproximadamente 222 milhões de dólares norte-americanos (cfr. alínea b do artigo 21.° e artigos 139.°, 453.° a 476.°, 477.° a 504,° e 505.° a 520.°, todos do Requerimento Inicial);
§ “( ii) Com efeito, resulta de forma clara do Requerimento Inicial que a Recorrente, para além de outros aí alegados, poderá sofrer um prejuízo efectivo e directo de aproximadamente 222 milhões de Dólares norte-americanos, a menos que a presente providência cautelar requerida seja decretada.”

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Tais USA$ 222 milhões são contabilizados a partir dos contratos de cobertura de risco económico na espécie de total return swap (TRS) e credit default swap (CDS) celebrados pela Recorrente com entidades terceiras (Banco do Médio Oriente e Fundo de Pensões da Ásia Pacífico), cobertura de risco financeiro associado à concessão de crédito titulado pelo empréstimo ao B…. em 30.JUN.2014 de 834.642.768 dólares USA concedido pela O....... F…… Luxembourg SA, empréstimo que constitui objecto da deliberação de 22.12.2014 do Conselho de Administração do B.......... de Portugal, ora Recorrido, no sentido da sua exclusão do âmbito de responsabilidades contraídas pelo B…. (instituição de crédito originária) perante terceiros (as sociedades O....... F……. Luxembourg SA e G.......... S........ International), e transferência para o “b.......... mau” com o fundamento, que ora importa, de que a concessionária O....... F……… Luxembourg SA agiu por conta da G.......... S........ International, consequentemente, sustentando na citada deliberação de 22.12.2014 a aplicabilidade do regime do artº 145º H nº 2 alínea c) do RGICSF a esta operação de empréstimo bancário. (18)
Do exposto resulta que que os prejuízos prováveis calculados pela ora Recorrente em 222 milhões USA$ não derivam directamente da deliberação de 22.12.2014 impugnada na acção principal, antes são equacionados como um resultado provável centrado nos citados contratos de cobertura de risco económico celebrados pela Recorrente com entidades terceiras, nos termos expostos por si alegados.

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Razões por que não se acompanha o juízo sustentado pela ora Recorrente de incluir no acervo de danos patrimoniais decorrentes da deliberação anulanda (22.12.2014) de exclusão do património do banco de transição (N...... B..........) das responsabilidades contraídas pela instituição de crédito originária (B….) perante a sociedade O....... F……… Luxembourg SA.
Efectivamente, trata-se de prejuízos que extravasam dos limites juridicamente atendíveis da tutela cautelar em sede de periculum in mora cfr. artº 120º nº 1 b) CPTA, isto é, dos limites balizados no processo principal por reporte à pretensão anulatória da deliberação de 22.12.2014, função que a doutrina designa por duplo tipo de periculum in mora, que é, “(..) conservar um direito, ou uma situação jurídica e realizar antecipada e provisoriamente o direito controvertido. Assim, em suma, a dupla função cautelar, assegurar ou realizar o direito, que é acompanhada pelo duplo modo de actuar da tutela cautelar, traduzido em manter ou ampliar o status quo referente à causa principal, é revelada no perfil teleológico, pelo “ligamento” não só “genético” como também “final”, ou seja, pela instrumentalidade do processo cautelar ao processo principal.(..)” (19)
Esta relação de instrumentalidade, que tem subjacente a protecção do status quo definido na causa principal, implica tomar por referência o pedido anulatório da deliberação de 22.12.2014 na delimitação do âmbito de prejuízos de difícil reparação de ocorrência previsível alegados no domínio do perigo de infrutuosidade e, donde se conclui que no âmbito do pedido anulatório da deliberação de 22.12.2014 não cabem os eventuais prejuízos derivados em razão da celebração por parte da Recorrente dos citados contratos de cobertura de risco económico, total return swap (TRS) e credit default swap (CDS).
Neste quadro normativo, os prejuízos eventuais decorrentes do agravamento do quadro de risco dos contratos de cobertura de risco económico na espécie de total return swap (TRS) e credit default swap (CDS) constitui matéria que não participa, nem de facto nem de direito, do objecto da causa principal, o que significa que, no domínio da tutela cautelar, o perigo de infrutuosidade da sentença do processo principal não cobre os danos patrimoniais centrados nos citados contratos de swap celebrados pela ora Recorrente.

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A mesma situação ocorre quanto à eventualidade de prejuízos não patrimoniais derivados da lesão reputacional e de imagem no mercado financeiro internacional, que também não se integra no objecto da causa principal, de que a presente providência é instrumental e acessória.
No tocante aos alegados prejuízos decorrentes da venda do N...... B.........., também não se verifica o periculum in mora na vertente do perigo de infrutuosidade da sentença e supondo o efectivo ganho da acção principal, porque a tutela cautelar que a lei pretende se expressa em garantir o status quo com referência concreta à situação patrimonial do Requerido à data da instauração da acção cautelar, sendo o fim legal, a ratio legis, obstar ao desaparecimento de quanto tenha existência jurídicamente susceptível de execução no âmbito da esfera jurídica patrimonial da contra-parte Requerida.
No caso trazido a recurso, o interesse da Recorrente centra-se em garantir a efectiva reintegração creditícia da sua esfera jurídica em função do empréstimo titulado pela sociedade O....... Finance Luxembourg SA, sendo certo que nada foi alegado no sentido do perigo de dissipação ou de inexistência de património a executar, v.g. no tocante ao N...... B...........
O que se alega é no sentido da previsível conformação de “(..) todo um ulterior e extenso litígio entre a Requerente e os terceiros investidores por um lado, e entre aquela, o N...... B.......... SA e o seu adquirente, por outro, com vista a apurar a responsabilidade pelo pagamento do passivo referente à dívida à O....... Finance.(..)”, conforme artigo 472 do articulado inicial.
Todavia o risco de forte e prolongada litigância há-de relevar se enquadrado na alegação e prova da ameaça de infrutuosidade da sentença, isto é, de alegação de factos demonstrativos da previsível inoperância ressarcitória da esfera jurídica do Requerente cautelar por perda do efeito útil da sentença na causa principal, supondo o ganho da causa, imputável a uma previsível perda da integridade patrimonial do Requerido, nos termos supra expostos, o que não é o caso do presente a recurso, nos termos expostos.

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Pelas razões expostas improcedem as questões suscitadas itens (v) e (ii) das conclusões, em sede de periculum in mora, bem como o aditamento do probatório com a factualidade alegada sob os artigos 453.° a 476.°, 477.° a 504.°e 505.° a 520.° do requerimento inicial, constante do item (mm) das conclusões.

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Na medida em que o decretamento da providência depende da verificação cumulativa dos três requisitos legais enunciados no artº 120º CPTA, o decaimento em sede de periculum in mora envolve a prejudicialidade de conhecimento da ponderação dos interesses concretos em presença e importa a improcedência da acção cautelar; mostra-se também prejudicado o conhecimento da requerida revogação da segunda parte do despacho de 09.07.2015 que indeferiu a produção do meio de prova testemunhal oferecido.


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Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e, por fundamentação distinta, confirmar a sentença proferida.

Custas a cargo do Recorrente.

Lisboa, 05.JUL.2017


(Cristina dos Santos) ……………………………………………………

(Catarina Jarmela) ………………………………………………………

(Nuno Coutinho) …………………………………………………………


(1) Anselmo de Castro, Direito processual civil declaratório, Vol. II, Almedina1982, pág. 179.
(2) Manuel de Andrade, Noções elementares de processo civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 84.
(3) Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Legitimidade processual in CJA nº 34, págs. 9 a 23.
(4) Manuel de Andrade, Noções … págs. 82/83.
(5) Ana Gouveia Martins, A tutela cautelar no contencioso administrativo, Almedina/2005, págs. 47/48
(6) Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, LEX/1997, págs. 250 e 569.
(7) Ana Gouveia Martins, A tutela cautelar no contencioso administrativo – em especial nos procedimentos de formação dos contratos, Coimbra Editora/2005, pág.43 nota (40).
(8) Vieira de Andrade, A justiça administrativa, 15ª ed. Almedina/2016, pág.320.
(9)Vieira de Andrade, A justiça administrativa, 15ª ed. pág. 313; Isabel Fonseca, Introdução ao estudo sistemático da tutela cautelar no processo administrativo, Almedina/2002, págs. 98-99.
(10) Carla Amado Gomes, O regresso de Ulisses: um olhar sobre a reforma da justiça cautelar administrativa, CJA/39, pág. 9.
(11) Mário Aroso de Almeida, Carlos Fernandes Cadilha, Comentário ao CPTA, Almedina/2005, pág. 609.
(12)Ana Gouveia Martins, A tutela cautelar no contencioso administrativo – em especial nos procedimentos de formação dos contratos, Coimbra Editora/2005, pág.43 nota (40).
(13)Mário Aroso de Almeida, in Consulta, fls. 28, 31 e 32, VIII volume dos autos.
(14)Menezes Cordeiro in Parecer, fls. 11, 13, 61 e 66, VIII volume dos autos.
(15)Isabel Celeste M. da Fonseca, Introdução ao estudo sistemático da tutela cautelar no processo administrativo, Almedina/2002, págs. 116/117 e 122;
(16)Isabel Celeste M. da Fonseca, Introdução ao estudo …, pág.117.
(17) Vieira de Andrade, A justiça administrativa, Almedina, 5ª edição, pág. 308.
(18) Sobre total return swap (TRS) e credit default swap (CDS) vide Paulo Câmara, Manual de direito dos valores mobiliários, Almedina/2011, págs. 192-194 e 188.
(19) Isabel Celeste M. da Fonseca, Introdução ao estudo …, págs. 82/83 e 121/124.