Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:748/15.5BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:12/16/2020
Relator:ANTÓNIO ZIEGLER
Descritores:IVA.
DETERMINAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL POR MÉTODOS INDIRECTOS; PRESSUPOSTOS; CRITÉRIOS DA SUA QUANTIFICAÇÃO.
Sumário:I) A liquidação de IVA com base em métodos indirectos de determinação da matéria tributável;

II) Aplicação do disposto nos artºs 87º a 89º, da LGT, quanto aos pressupostos de avaliação indirecta por impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável e critérios para a sua quantificação, nos termos do artº 90º, da mesma lei- cfr nº1, do artº 90º, do CIVA.

III) Ónus de prova por excesso na referida quantificação.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório

H....., LDA., com os sinais nos autos, veio interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, a qual julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra as liquidações de IVA dos períodos de Janeiro a Junho e Agosto a Dezembro de 2011 e respetivos juros compensatórios, no montante total de € 21.137,81, e que em consequência absolveu a Fazenda Pública do pedido, tendo para o efeito apresentado as seguintes conclusões :

a) O sujeito passivo discorda da Douta Decisão do Tribunal a quo que, no seu entendimento, não valorizou devidamente a impugnação apresentada.

b) Com efeito, nos termos do artº 75º da LGT, presumem-se de veracidade e boa-fé as declarações dos contribuintes efectuadas de acordo com a lei comercial e fiscal.

c) A realização de avaliação indirecta só pode efectuar-se nos casos definidos nos artos. 87º e 89º da LGT e nomeadamente quando exista a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à determinação da matéria tributável de qualquer imposto e/ou a matéria tributável do sujeito passivo se afastar, sem razão justificada, mais de 30% para menos, ou durante 3 anos seguidos 15% para menos, da que resultaria da aplicação dos indicadores obiectivos de actividade de base técnico-científica, referidos na presente lei e desde que o contribuinte, não apresente, de acordo com o nº do artº 89º justificação para os afastamentos verificado. Nos termos do artº 89º é expresso que os indicadores de base técnico-científica são definidos anualmente pelo Ministro das Finanças.

d) Os pressupostos invocados pela AT não cumprem, no entendimento do sujeito passivo, as condições para a aplicabilidade de métodos indirectos, como foi expresso ao longo destas Alegações de recurso, tendo sido apresentada fundamentação insuficiente.

e) Mas admitindo, sem conceder, que fosse permitida a aplicação de métodos indirectos, foram aplicados critérios e cálculos nas correcções sem ter em conta a realidade concreta da empresa, conduzindo a dúvidas sobre pressupostos incorrectos, erros de recolha das quantidades adquiridas, erros de quantificação dos produtos que foram objecto de transformação e de critérios errados de imputação dos produtos à confecção, dúvidas e objecções em parte satisfeitas por acordo com a AT que reduziu as correccões em cerca de 119.000 euros, mantendo-se porém dúvidas provadas ou indiciadas sobre parte das correcções efectuadas que devem merecer a anulação nos termos do artº 100º do CPPT.

f) Por outro lado, atendendo à especificidade do IVA, não pode a Administração Fiscal operar alterações à base tributável deste imposto, sem que fique demonstrado terem sido praticadas omissões ou inexactidões no registo de compras e vendas do sujeito passivo em causa. (Acórdão do TCAS de 13/3/2014 no processo 07216/13 -CT 2º Juízo), prova não efectuada.

g) Nos termos do Acórdão do STA de 24/4/02 proferido no processo nº 026679, no caso de aplicação de métodos indiciários, o próprio método de quantificação, baseado em presunções e estimativas, nunca pode garantir a correspondência entre a matéria tributável quantificada e a realidade, pelo que, pela sua própria natureza, não pode deixar de conduzir a uma situação de dúvida sobre aquela quantificação. Nestas condições é de concluir que, no caso de utilização de métodos indiciários. só se estará numa situação de fundada dúvida, para efeitos do artº 100º do CPPT, quando positivamente se prove que tal quantificação é errada, ou pelo menos, quando haja indícios de que o seja.

III - DOS FACTOS EM SEDE JUDICIAL

Apontam-se nos termos legais as seguintes normas violadas:

- Artº 104º nº 2 da CRP

-Artº 75º da LGT.

- Artº 77º nº 4 da LGT.

- Artº 87º e 89º da LGT.

- Artº 90º da LGT.

- (Acórdão do TCAS de 13/3/2014 no processo 07216/13 -CT 2º Juízo).

- (Acórdão do STA de 24/4/02 proferido no processo nº 026679)

- Artº 100º do CPPT.

TENDO EM CONTA A DEFICIENTE INTERPRETAÇÃO DOS FACTOS E DA APLICAÇÃO DO DIREITO, DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E SER REVOGADA A SENTENÇA DO TRIBUNAL A QUO, SENDO SUBSTITUINDA POR OUTRA QUE CONTEMPLE A PRETENSÃO DA RECORRENTE E O CUMPRIMENTO DA LEI, ANULANDO A LIQUIDAÇÃO OFICIOSA REFERENTE AO IVA DE 2011 E ACRESCIDO, NÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA E OBTIDA POR VIA DE MÉTODOS INDIRECTOS NÃO CUMPRIDORES DOS CRITÉRIOS DEFINIDOS NOS ARTIGOS 77º Nº 4 E 90º DA LGT, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!


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Não foram apresentadas contra-alegações.


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O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto Parecer no qual refere que:

Analisando os autos, entendemos que o presente recurso não deverá proceder. O exposto na douta sentença mostra-se-nos correcto.

A douta sentença encontra-se bem fundamentada de facto e de direito. Entendemos ter feito uma correcta e suficiente análise da matéria de facto e correcta foi a sua subsunção

jurídica.

A douta sentença em recurso não sofre de qualquer vício, nomeadamente de erro de julgamento, deficiente apreciação dos factos considerados provados ou violação das normas aplicáveis ao caso.

Neste sentido desde já se renova aqui o parecer do M°P° que consta de fls. 80 e seg. que seguiu de perto a douta sentença recorrida.

De facto, em causa neste recurso está o facto de a douta sentença em recurso ter considerado como adequado o recurso a métodos indirectos de determinação da matéria colectável e não ter considerado ter ocorrido erro na quantificação da matéria colectável.

A recorrente considera que a douta sentença incorreu em erro de julgamento, mas sem razão.

No que respeita à prova da factualidade dada como provada, não podemos esquecer que no processo judicial tributário vigora o princípio da livre apreciação da prova, pelo que o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g. força probatória plena dos documentos autênticos - cfr. art° 371° do C. Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

A prova produzida levou o Tribunal a formar a sua convicção como deixou expressa nos factos provados.

No que respeita ao facto de a douta sentença em recurso ter considerado como adequado o recurso a métodos indirectos de determinação da matéria colectável há que ter em conta que, como é sabido, no nosso ordenamento jurídico fiscal vigora o princípio da verdade declarativa, que coloca na esfera de actuação dos contribuintes a iniciativa no procedimento de apuramento, fixação e pagamento dos impostos, como decorre do disposto no art. 75° n° 1 da LGT.

A AT está vinculada a liquidar os impostos tendo por base a declaração e os elementos contabilísticos dos contribuintes, sem prejuízo do direito que lhe assiste, de proceder à sua verificação, à posteriori, se assim o entender.

A tributação por métodos indirectos assenta na tributação presumida, tem carácter excepcional e é subsidiária da tributação real ou efectiva.

Este tipo de tributação está regulamentada na LGT, seus art. 87° e seg., e aplica-se a situações de incumprimento imputáveis aos contribuintes, quando não for possível apurar, de forma directa e exacta a matéria tributável, de acordo com as regras de cada tributo.

A tributação por métodos indirectos baseia-se na utilização do procedimento da avaliação indirecta, por parte da AT, ou seja na aplicação de mecanismos alternativos à determinação da matéria tributável com base nas declarações dos contribuintes e dos elementos contabilísticos que lhes servem de base. Estes, não constituem portanto, um modo de apuramento do valor real dos rendimentos ou bens sujeitos a tributação, dado que, a sua determinação não foi possível, efectuando-se aquela, a partir de indícios, presunções ou outros elementos.

A avaliação indirecta só se aplica em casos em que exista uma impossibilidade ou uma dificuldade grave em determinar a matéria tributável através da avaliação directa, não se devendo a ela recorrer sem a verificação plena desse requisito.

No caso dos autos, a A.T. teve necessidade de utilizar a avaliação indirecta, por entender que os elementos fornecidos pelo próprio contribuinte eram insuficientes para determinar a matéria colectável, sendo certo que a impugnante que não rinha disponível os elementos contabilísticos necessários e exigíveis.

No que respeita, agora, ao alegado erro na quantificação da matéria colectável há que ter em conta o disposto no art. 90° n° 1 da L.G.T.

No caso dos autos, a determinação da matéria colectável fundamentou-se nas alíneas do art. 90° da L.G.T., nomeadamente nas margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros, nos elementos e informações declaradas à administração tributária, incluindo os relativos a outros impostos e, bem assim, os relativos a empresas ou entidades que tenham relações económicas com o contribuinte e nos custos presumidos em função das condições concretas do exercício da actividade.

Porém, o método usado, falível, como qualquer outro, teve em conta a realidade concreta do contribuinte, realidade essa susceptível de ser entendida pela A.T. no que se refere ao consumo de vários tipos de produtos.

O método utilizado pela A.T., que teve em conta a situação concreta do contribuinte, não violou os princípios da legalidade e da proporcionalidade, pelo que não merece censura.

Por outro lado, a prova apresentada pela recorrente, a documental, não foi suficiente para convencer o tribunal da bondade dos argumentos por si apresentados.

De tal modo, bem julgou a douta sentença sob recurso improcedente a impugnação apresentada pela recorrente.

Pelo exposto, somos do parecer que o recurso deve improceder, devendo manter-se o julgado por a decisão sob recurso não padecer de quaisquer vícios, nomeadamente os que lhe vêm imputados.”


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Atento a necessidade de celeridade no julgamento do recurso e obtendo a anuência dos Adjuntos, vão dispensados os vistos legais, cabendo apreciar e decidir. –cfr nº4, do artº 657º, do CPC.

Na sentença proferida nos autos a Mª Juiz apurou os seguintes factos:

“A. A sociedade J....., Lda., cessou a actividade com data reportada a 31 de Dezembro de 2013, por fusão por incorporação na Impugnante (cf. certidão permanente a fls. 233 e segs. do processo de reclamação graciosa apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

B. A mesma sociedade J....., Lda., dedicava-se à exploração de um restaurante de tipo tradicional, localizado na cidade de Almeirim, junto à Praça de Touros, sendo o nome comercial “Restaurante Pinheiro” [cf. fls. 1 e 2 do Relatório de Inspecção Tributária (RIT) constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido];

C. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.° ....., de 10 de Dezembro de 2012, a referida sociedade J....., Lda., foi alvo de uma acção inspectiva, inicialmente de âmbito parcial IRC e IVA, tendo sido alterado para âmbito geral, que incidiu sobre o exercício de 2011 e teve início em 6 de Fevereiro de 2013, tendo sido assinada a nota de diligência em 11 de Junho de 2013 (cf. fls. 1 e 2 do RIT constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

D. Em 15 de Julho de 2013, foi elaborado o respectivo RIT, com destaque para os seus pontos IV e V, em que se fez constar, entre o mais, o seguinte (cf. fls. 8 e segs. do RIT constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):

IV - MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUÊ IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS

a. Inspeção ao exercício do ano de 2004 - Margens praticadas

O sujeito passivo no ano de 2005 foi alvo de uma inspeção ao exercício do ano de 2004, tendo sido efetuada uma recolha das bases de dados do sistema informático de faturação. Pela análise das referidas bases de dados apurou-se inequivocamente que os ficheiros informáticos foram alterados, o que implicou uma falta de contabilização de proveitos no montante total de € 196.588,73 e falia de entrega de IVA liquidado, não declarado e não entregue no montante total de € 23.438,56.

A referida inspeção também abrangeu parte dos exercícios dos anos de 2003 e 2005, onde se detetou o mesmo tipo de omissões/infrações por parte do sujeito passivo.

O sujeito passivo confrontado com as conclusões daquela ação inspetiva procedeu à regularização declarativa e efetuou o pagamento de todos os impostos que se mostraram devidos. Daqui concluímos que efetivamente o sujeito passivo adulterava a informação constante dos ficheiros produzidos pelo programa de faturação para assim entregar ao Estado menos IVA do que aquele que recebeu dos clientes e pagar menos imposto sobre os lucros obtidos.

No ano de 2004, o sujeito passivo declarou inicialmente uma Margem Bruta sobre as Vendas (MBV) de 42,3% [(Prest. Serviços – Custo Matérias Consumidas)/Prest. Serviços x 100].

Após a inspeção e a regularização por parte do sujeito passivo a MBV do ano de 2004, por si declarada, e mais próxima da realidade, foi de 53,06%.

A atividade do sujeito passivo caracteriza-se por uma atividade de carater continuado, sendo que a qualidade dos serviços prestados aos clientes e a relação qualidade preço não sofre alterações ao longo dos anos, conforme declarado pelo sócio-gerente.

Relativamente ao período do ano de 2011 o sujeito passivo declarou uma MBV de 39,41%. O que indicia que também no ano de 2011 o sujeito passivo terá omitido proveitos e não terá declarado e entregue ao Estado todo o IVA liquidado e recebido dos seus clientes.

b. inexistência de informação relativa ao detalhe das vendas - ficheiros informáticos (documentos fiscalmente relevantes)

Conforme assumido pelo sócio-gerente, o sujeito passivo não facultou informação relativa ao detalhe das prestações de serviços, nomeadamente a informação constante das faturas, vendas a dinheiro ou talões de venda.

O sujeito passivo, nos termos do nº 4 do artigo 52.° do código do IVA, estava autorizado a arquivar em suporte eletrónico as feiuras ou documentos equivalentes emitidos por via eletrónica, desde que garantisse o acesso completo aos dados e assegurasse a integridade da origem e do seu conteúdo.

O sujeito passivo no período em causa, ano de 2011, emitia faturas ou documentos equivalentes com recurso a programa informático, arquivava os mesmos em suporte informático mas não garantiu o acesso completo aos dados.

Note-se que, independentemente de ter ocorrido uma avaria no disco do computador onde era armazenada a informação, o sujeito passivo não cumpriu o determinado nos artigos 8.º e e 9.° da portaria 1370/2007 de 19 de outubro, a seguir transcritos:

Artigo 6.º - Cópias de segurança - 1 - Os sujeitos passivos são obrigados a possuir cópias de segurança do suporte eletrónico.

2 – Os originais e as cópias de segurança devem ser armazenados em locais distintos e em condições de conservação e segurança necessárias de modo a garantir a impossibilidade de perda dos arquivos.

Artigo 9.º - Acesso à informação arquivada – 1 – Os sujeitos passivos devem facultar à administração tributária, no exercício da ação de inspeção, cópias dos respetivos suportes, reproduções legíveis em papel dos documentos arquivados, bem como permitir a realização de quaisquer tipo de análises e ou pesquisas ao arquivo a se refere o artigo 1.º.

2- Para efeitos do disposto no número anterior, devem os sujeitos passivos assegurar a disponibilidade do equipamento que serviu para gravação dos seus documentos e de pessoal técnico habilitado para manuseamento do sistema utilizado.

Não tendo a inspeção tributária acesso à informação relativa ao detalhe das prestações de serviços, è informação contida nos documentos (faturas), não é possível comprovar a veracidade do valor das prestações de serviços declaradas. Torna-se impraticável testar consumos de matérias primas versus prestações de serviços. For exemplo, no valor total das prestações de serviços declaradas não é possível saber quantos cafés estão iá incluídos e comparar com os quilos de grão de café adquiridos. Bem como, não é possível saber as doses de peixe servidas, incluídas naquelas prestações de serviços, e comparar com as quantidades de peixe adquiridas peio sujeito passivo.

Foram solicitadas verbalmente ao sujeito passivo as tabelas de preços praticados durante o ano de em 2011, ao que respondeu que não possuía essas tabelas de preços, declarando que os preços praticados em 2011 tiveram poucas alterações em relação aos praticados atualmente, fornecendo as tabelas de preços atuais. Posteriormente quando interpelado para lavrar auto de declarações, dada a impossibilidade de comprovação dos factos através de documentos, por inexistência de informação detalhada das vendas, indicou alterações para todos os preços. Se o sujeito passivo tivesse cumprido as normas supra referidas, a informação relativa aos duplicados das faturas, arquivada eletronicamente, estaria disponível, e nessa informação era possível verificar os preços efetivamente praticados.

e. Fragilidades da contabilidade

Nos termos do artigo 17.° do código do IRC o lucro tributável das pessoas coletivas é determinado com base na contabilidade e esta deve estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o setor de atividade. A contabilidade do sujeito passivo, para o ano de 2011, não cumpre algumas das regras básicas da referida normalização contabilística, conforme passamos a concretizar,

> Inexistência de extratos de fornecedores

Da contabilidade do sujeito passivo não é possível extrair extrato de qualquer fornecedor com informação válida. A título de exemplo, para o fornecedor A....., NIF ....., foi extraído, a partir do ficheiro SAF-T, o seu extrato na contabilidade do sujeito passivo (cópia em anexo). Verificamos que desse extrato apenas consta o lançamento de abertura, apesar de, na realidade, o sujeito passivo ter contabilizado, todos os meses, compras provenientes desse fornecedor (fornecedor quase exclusivo de bacalhau), em montante superior a €70.000,00.

Apesar de o sujeito passivo ter mais de uma centena de fornecedores não tem extratos com informação completa e fiável, assim não ê possível validar se as compras a um determinado fornecedor foram todas contabilizadas, comparando com extrato de cliente facultado pelo fornecedor,

É mais difícil a localização de qualquer fatura.

> Lançamentos dos pagamentos sempre na conta 111 caixa, mesmo quando os pagamentos são através de cheque

Apesar de a maior parte dos pagamentos, efetuados pelo sujeito passivo aos seus fornecedoras, ser efetuado por meio de cheque, a contabilização desses pagamentos tem sempre como contrapartida a conta 111 caixa, quando corretameme deveria ser contabilizado nas subcontas da conta 12 Depósitos à ordem.

> Inexistência de conciliação bancária

No final de cada mês quando é recebido o extrato bancário na contabilidade, simplesmente são somados todos os valores da entrada «saída do banco, e são feitos lançamentos na contabilidade de forma a que o saldo das subcontas da conta 12 Depósitos à Ordem, seja o mesmo que o saldo da conta bancária constante do extrato bancário, por contrapartida da conta 111 caixa.

Não existe qualquer preocupação da contabilidade, em associar os movimentos das contas bancárias aos movimentos da atividade do sujeito passivo.

Nos termos da normalização contabilística a conta 12 Depósitos à ordem debita-se pelos depósitos efetuados e operações equivalentes e credite-se com a emissão de cheques, de ordens de transferência e ordens da pagamento a favor de terceiros, O sujeito passivo efetua depósitos e emite cheques para pagamento aos fornecedores e estas operações não estão refletidas na contabilidade com movimentos nas subcontas da conta 12 Depósitos à Ordem,

> Falta de contabilização da distribuição de resultados e dos empréstimos dos sócios à sociedade da sociedade aos sócios

É possível verificar por consulta aos extratos bancários, quer das contas bancárias em nome da sociedade, quer aos extratos bancários de contas em nome do sócio-gerente, que existem transferências de dinheiro das contas da sociedade para as contas do sócio e das contas do sócio para as contas da sociedade, não existindo qualquer movimento correspondente na contabilidade da sociedade,

Através da análise dos extratos bancários das contas tituladas pelo sócio-gerente são identificados diversos depósitos em numerário. Existem fortes indícios de que esse dinheiro tenha como proveniência as receitas da sociedade, uma vez que não é conhecida outra fonte de rendimentos do sócio-gerente.

d. Divergência do anexo P da IES

O sujeito passivo apresenta diversas divergências nos valores por si declarados no anexo P da IBS2. O sujeito passivo declara valores inferiores aos declarados pelos seus fornecedores, inclusivamente para os fornecedores C....., NIF .....e L..... LDA, NIF ....., o sujeito passivo não declara, no referido anexo, ter-lhes comprado qualquer valor, sendo que aqueles declararam ter-lhe vendido mercadorias nos valores de € 25.116,00 e € 25,292,00, respetivamente.

Esta situação não deverá corresponder a uma omissão efetiva de contabilização de compras por parte do sujeito passivo, mas deve estar relacionado com o que já foi referido no ponto “Inexistência de extratos de fornecedores".

e. Existência de um TPA associado a uma conta bancária em nome do sócio-gerente

A sociedade utiliza o TPA3 nº .....para receber dos seus clientes, pelos serviços prestados, através de cartões de débito ou crédito. Esse TPA está associado à conta da Caixa de Crédito Agrícola Ribatejo Sul n.° ....., cujo titular é J....., sócio-gerente da sociedade. O sócio-gerente, pontualmente efetua transferências da referida conta para a conta n.º ....., do mesmo banco, que está em nome da sociedade, mas não existe uma correspondência exata entre os valores recebidos pelo sócio, via TPA, & os valores por si transferidos para a sociedade. Estas transferências não são evidenciadas na contabilidade, conforme já referimos.

f. Empresa familiar

O sujeito passivo, .....Lda, trata-se de uma empresa familiar em que os sócios são casados entre si. São trabalhadores da sociedade uma filha e um genro dos sócios.

As instalações (restaurante e armazém) onde a empresa exerce atividade são da propriedade dos sócios, não sendo debitado qualquer valor relativo a compensação pela utilização do espaço. Isto é, o sujeito passivo não paga qualquer importância a título de renda aos proprietários do Imóvel, e consequentemente não suporta esse custo.

Não estando esses custos, inerentes à atividade desenvolvida, considerados na contabilidade do sujeito passivo, o lucro tributável declarado pelo sujeito passivo está influenciado positivamente por essa realidade.

Se esses custos inerentes à atividade estivessem completamente refletidos na contabilidade, o sujeito passivo estaria a declarar uma rentabilidade fiscal inferior.

g. Inventários irreais

A atividade do sujeito passivo caracteriza-se por ser uma atividade de carater continuado, com uma elevada rotatividade dos stocks de produtos e matérias primas adquiridas, justificada com o facto de grande parte desses bens ter um prazo de validade reduzido. Nesse sentido o valor total desses stocks nunca pode sofrer grandes alterações, salvo alguma compra em maiores quantidades de vinhos ou bebias espirituosas, o que não foi ocaso, no ano em análise.

Como foi admitido peto sujeito passivo, em auto de declarações, o inventário reportado a 31/12/2011, no valor total de € 4,612,38, não foi corretamente elaborado, não constando desse inventário determinados produtos e matérias-primas que o sujeito passivo tem que ter sempre em stock, tais como refrigerantes, águas, batatas, arroz, feijão, açúcar, café, etc.

Atendendo ao anteriormente exposto, ficam desta forma postas em causa as asserções contidas nas demonstrações financeiras do ano em causa, pondo em crise o principio da verdade declarativa,

O potencial dos proveitos em função dos consumos é manifestamente superior aos valores declarados pelo sujeito passivo, conforme se demonstra no capítulo seguinte.

Assim face a tudo o que foi relatado resulta a evidência que os valores declarados pelo sujeito passivo nas respetivas declarações fiscais do ano de 2011 não são verdadeiros. Mais resulta evidenciado que os valores das prestações de serviços/vendas contabilizados / declarados, são inferiores aos valores das prestações de serviços/vendas efetivamente realizados na sua atividade.

Pelo que é de todo impossível comprovar e quantificar de forma direta e exata a matéria coletável do sujeito passivo do ano de 2011.

Estão assim reunidas as condições previstas na alínea b) do artigo 87° e da alínea d) do artigo 88.° da Lei Geral Tributária (LGT) para se proceder à determinação da matéria tributável com recurso a métodos indiretos.

Nestes termos propõe-se a determinação de matéria tributável com recurso a métodos indiretos, para o ano de 2011, em sede de IRC, ao abrigo disposto no artigo 57.º do Código do IRC, e em sede de IVA, ao abrigo do disposto no artigo 90º do Código do IVA.

V - CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS

V -1. CRITÉRIOS:

Para efetuarmos os cálculos dos valores corrigidos, ou seja para determinarmos o valor total das prestações de serviços do sujeito passivo durante o ano de 2011, vamos tomar por base as quantidades de produtos e matérias-primas consumidas durante o ano de 2011.

Como a atividade do sujeito passivo tem um carácter de continuidade, os stocks normalmente não têm alterações significativas em termos de quantidades e, como ficou provado no capítulo anterior que o inventário reportado a 31/12/2011 não foi corretamente elaborado, vamos considerar que as quantidades de produtos e matérias-primas consumidas foi equivalente às quantidades compradas desses produtos e matérias-primas.

Com base na recolha de informação das faturas de compras, efetuadas pelo sujeito passivo, constantes da contabilidade complementada com a informação que nos foi remetida petos seus fornecedores, foi possível elaborar as tabelas que se juntam em anexo, com a identificação do fornecedor, do documento e data da compra, com a descrição dos bens e com as quantidades, ordenadas por classes de produtos.

Com base naquela informação, em relação aos bens adquiridos e vendidos sem qualquer transformação ou divisão, aplicando-se o preço de venda às quantidades adquiridas, determinamos facilmente os proveitos.

Relativamente aos bens sujeitos a transformação ou divisão, por estimativa e com a colaboração do sujeito passivo, manifestada no auto de declarações, com base nas quantidades compradas foi possível determinar as unidades vendidas, que multiplicadas pelos respetivos preços de venda, chegamos ao montante de proveitos respetivo.

Embora o sujeito passivo processe subsídio de alimentação nos recibos de vencimento dos seus colaboradores- estes fazem refeições no total de trabalho fornecidas gratuitamente. Assim, ao valor do volume de negócios determinado com base nos critérios referidos, refiramos o valor correspondente a uma refeição completa por cada colaborador e por cada dia de trabalho. O valor de uma refeição consumida por cada empregado indicado pelo sujeito passivo foi de €12,00. O número de colaboradores durante o ano de 2011 o restaurante abriu em 283 dias. Portanto o montante, com IVA incluído, a desconsiderar pelo facto de o sujeito passivo fornecer alimentação aos seus colaboradores é de € 74.712,00.

Atendendo à falta de veracidade dos vaiares declarados para efeitos fiscais, relativamente aos inventários, situação confirmada pelo sujeito passivo, e já anteriormente referida no ponto g. inventários irreais, do capítulo anterior, vamos considerar a variação dos mesmos nula, ou seja, o valor das compras de produtos e matérias-primas é idêntico ao Custo das Mercadorias Vendidas e Matérias Consumidas, cumprindo assim com o determinado no n.º 1 do artigo 23.º do código do IRC.

V- 2. CALCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSOS A MÉTODOS INDIRETOS:

V – 2.1 I.R.C.

De acordo com os critérios já referidos vamos determinar o valor das vendas / prestações de serviços com base nas quantidades de bens comprados para servir aos clientes. Separamos esses produtos por grupas de acordo com as tabelas anexas.

1. Bebidas incluindo café

Na seguinte tabela encontram-se os valores relativos a águas, café, cervejas, refrigerantes e vinho vendido a jarro.

Notas explicativas:

· Relativamente ao café, foram considerados 130 cafés por cada quilo de grão de café ou descafeinado adquirido. Para confecionar cada café são necessárias aproximadamente 7 gramas de café, assim um quilo daria para produzir aproximadamente 143 cafés (1000g/7g). Ao considerarmos 130 cafés por cada quilo de grão estamos a considerar uma diferença de 10% para compensar eventuais quebras na confeção. Foram comprados 1067 quilos de café ou descafeinado;

· As garradas de refrigerante de 1 litro, 1,5 litros e 2 litros foram todas consideradas vendidas ao mesmo preço das garrafas de água de 1,5 litros.

· O sujeito passivo comprou 16.839 litros de vinho a granel ou Bag-in-Box, segundo as suas estimativas consome em temperos cerca de 10 litros por semana, o equivalente a 480 litros por ano (10 x 48 semanas). O sujeito passivo vende vinho a jarro com capacidades de 1 litro, 0,5 litros ou 0,25 litros. A venda de vinha em jarros com a capacidade de 1 litro é a que apresenta menor rentabilidade, conforme se demonstra na tabela seguinte (considerados os preços atuais e 16.359 litros de vinho):

Na seguinte tabela encontram-se os valores relativos a garrafas de vinho:

· Relativamente a todas as garrafas cuja marca de vinho não consta das tabelas de preço consideramos como se tivessem sido vendidas ao preço de vinho branco ou tinto da região que é o preço mais baixo das tabelas, dando assim vantagem ao sujeito passivo.

Totalizam assim as vendas de Bebidas incluindo café €426.775,55 (317.380,45 + 109.395,10), com IVA incluído.

2. Bebidas Brancas e Aperitivos

Notas explicativas:

· Relativamente a todas as garrafas de 70 ou 75 centilitros foram consideradas 13 doses por garrafa. Considerando 5 centilitros por dose, 13 doses são 65 centilitros, é dada assim margem para eventuais quebras ou doses mais bem servidas. Da mesma forma em garrafas de litro apenas consideramos 18 doses;

· Foram consideradas apenas doses e não meias doses dando assim vantagem ao sujeito passivo.

3. Entradas e Sobremesas, incluindo pão

Notas explicativas:

· Relativamente às azeitonas foram considerados 120 gramas de azeitonas por cada taça;

· Relativamente ao pão: o sujeito passivo produz o pão que venda, para isso comprou no ano de 2011, 16.700 quilos de farinha. Considerando 5% da farinha para tender e 5% como desperdício ficam 15.030 quilos de farinha que foi transformada em pão. Cada quilo de farinha, com a incorporação do sal, fermento e água, dá para produzir 1,3 quilos de pão. Portanto 15.030 quilos de farinha deram origem 19.539 (15,030 x 1,3) quilos de pão. Cinco caralhotas (do dia anterior, com memos humidade) pesavam 0,925kg, portanto em média cada caralhota pesa 0,185 quilos. Dividimos os 19.539 quilos de pão por 0,185, deu origem a 105.616 caralhotas. Considerando que 2% sobraram e não foram vendidas, obtém-se o resultado de 10.504 caralhotas vendidas.

· Os preços dos gelados considerados são os preços indicados pelo fornecedor com referência ao ano de 2011;

· Relativamente ao doce de amêndoa e à mousse de chocolate consideramos as pesagens indicadas pelo sujeito passivo, 175 e 140 gramas, respetivamente. A mousse de manga consideramos 150 gramas, mais 10 gramas em relação à mousse chocolate;

· Em todos os bolos dividimos pelo número de fatias indicadas pelo sujeito passivo;

· Relativamente às sobremesas produzidas pelo sujeito passivo foram considerados os ingredientes comprados conforme consta da tabela seguinte. Foram considerados 7980 ovos para a produção de sobremesas que pesam 478,8Kg (7980/10*0,6), consideramos perda de 10% na confeção para o peso da casca do ovo. No açúcar consideramos 90 Kg para as maçãs assadas e peras bêbedas. No leite consideramos 80% do leite comprado de uma perda, de 15% na confeção, por evaporação. Chegamos assim a um total de 2.112,604 Kg de sobremesas produzidas. O doce da casa pesa 135 gramas e o pudim flan pesa 180 gramas, o peso médio de 157,5 gramas. Consideramos o peso de 160 gramas por sobremesa. Assim obtivemos as 13.204 sobremesas (2.112,604/0,16).

· No abacaxi consideramos 400 gramas de abacaxi por cada dose, já considerando o desperdício da coroa e da parte inferior do abacaxi;

· No melão consideramos 400 gramas;

· Relativamente à maçã assada, foram consideradas apenas as compras de maçãs Reinetas (1234Kg). Consideramos que cada maçã crua pesa em média 270 gramas;

· Consideramos que as mangas pesam 440 gramas;

· Na salada de frutas consideramos que o ananás e o pêssego em calda são utilizados exclusivamente para a salada de frutas (1008 kg (504 + 504)]. Consideramos ainda que numa salada de futas 50% é ananás e pêssego em calda é 50% são outras frutas. Portanto para a salada de frutas são 2016 Kg;

· As restantes frutas 1391 Kg (2399 – 1008) são consideradas como se todas fossem vendidas individualmente ao preço de €0,90, e consideramos 300 gramas por cada peça de fruta. Com este peso é dada uma margem de pelo menos 50 gramas por cada peça de fruta para eventuais quebras.

4. Sopas, Carne, Peixe e Bacalhau

Notas explicativas:

· Consideramos 1 quilo de frango por cada dose. Uma dose corresponde a um frango e cada frango pesa aproximadamente um quilo.

· Relativamente à sopa de pedra: Para confecionar uma panela de sopa, que dá para 100 doses de sopa bem servidas (com margem para eventuais sobras), são necessários 12kg de enchidos e 27,5kg de carne de porco. O sujeito passivo 3.663 Kg de enchidos. De todos os enchidos comprados, apenas 5 chouriços por dia são destinados à confeção de outros pratos. O restaurante esteve aberto 283 dias, durante o no ano de 2011, e considerando que 15 chouriços pesam 4 kg (conforme pesagem efetuada pelo sujeito passivo dia 09/05/2013), foram destinados cerca de 377 kg de enchidos para outros pratos (283x5/15x4). Donde forma destinados a confeção de sopa da pedra 3.286 Kg de enchidos (3663-377). Considerando a relação de 12 kg de enchidos e 27,6kg de carne de porco, foram destinados à confeção de sopa da pedra 3283 kg de enchidos e 7530 kg de carne de porco, durante o ano de 2011. Pelo que, no total, foram gastos 10.816 kg de enchidos e carne de porco para a confeção da sopa. Como para confecionar 100 doses de sopa da pedra são necessários 38,5 kg (12+27,5) de carne de porco e enchidos, em média, por cada dose, são necessários 0,395 kg (39,5/100) daqueles ingredientes. Deste modo, calculamos que os 10.816 kg dos referidos ingredientes permitiram confecionar e servir, 27.392,28 doses de sopa e pedra (10816/0,395).

· Carne de porco: O sujeito passivo comprou 41.128 Kg de carne de porco. Como 7530 Kg foram destinados à confeção de sopa da pedra, foram destinados à confeção de pratos de carne de porco 33598 kg (41128-7530) de carne. Considerando 0,600 kg de carne para confecionar cada dose, foram confecionadas e servidas 55996,67 doses de carne de porco.

Note-se que o peso de 0,600 Kg de carne por dose é um peso elevado, e não foi aqui considerado o chouriço (377kg) e as amêijoas (110kh) que foram utilizados na confeção de alguns pratos de carne de porco. Foi considerado o preço médio de venda das doses de carne de porco de €9,33 [(10,80 + 10,80 + 8,80 + 10,50 + 9,50 + 9,80 + 10,08 + 11,50 + 10,80) / 10 – 1.00].

· Carne de Borrego: o sujeito passivo comprou 4.895,20 kg de carne de borrego e cabrito (4889+6,2). Considerando os 660 gramas de carne por dose, temos 8.158,67 doses (4895,20/0,6).

· Picanha: o sujeito passivo comprou 2.418,86 kg de picanha. Considerando os 600 gramas de picanha por dose, temos 4.024,77 doses (2.418,86/0,6).

· Carne de vaca: o sujeito passivo comprou 10.564,19 kg de carne de vaca. Consideramos o peso médio de carne de vaca necessário para a confeção dos pratos e o preço médio de venda, conforme tabela seguinte:

· Bacalhau: o sujeito passivo comprou 7.240 kg de bacalhau. Considerando os 670 gramas de bacalhau por dose, temos 10.805,97 doses (7420/0,67).

· Robalo de Mar: o sujeito passivo comprou 159,1 kg de robalo do mar e este é vendido ao peso.

· Robalos, douradas, salmão e peixe espada: foi considerado o peso de 800 gramas por dose, o peso máximo de peixe em bruto (antes de amanho), conforme declarado pelo sujeito passivo em auto de declarações.

· Cherne Garoupa e Mero: Consideramos que este peixe foi todo vendido ao preço de venda da cabeça, que é vendida ao peso. Fica, desta forma, considerada margem para o desperdício relacionado com o amanho do peixe.

· Chocos e lulas: foi considerado o peso de 800 gramas por dose, o peso máximo de peixe em bruto (antes de amanho), conforme declarado pelo sujeito passivo em auto de declarações.

· Potas: foi considerado 500 gramas de potas por dose, mais gambas, nas espetadas de lulas, conforme declarado pelo sujeito passivo.

· Polvo: foi considerado 1 kg de polvo por cada dose;

· Camarão Tigre: é vendido ao quilo;

· Sopa de peixe: conforme declarado pelo sujeito passivo foram considerados como ingredientes da sopa de peixe a pescada, corvina, miolo de camarão e miolo de amêijoa comprados. E ainda o peixe extraído dos rabos da garoupa, do cherne e do mero, bem como das cabeças do salmão. Para tal consideramos 5% do peso daqueles peixes. Chegamos assim ao total de 3.102.258 Kg de peixe. Para determinar o número de doses foram consideradas 150 gramas de peixe por dose de sopa, atendendo ao declarado pelo sujeito passivo.

· Sopa de hortaliça: foram consideradas 5% das doses de sopa da pedra e sopa de peixe [(27.382,28 + 20.681,72) x 5%].

5. Valor global presumido das prestações de serviços

Chegamos assim aos seguintes valores globais presumidos:

Uma vez que o sujeito passivo declarou prestações de serviços no montante de € 1.839.165,65, há lugar à correção àquele valor em € 271.106,06 (2.110.271,71 – 1.893.165,65).

Dado que o valor das prestações de serviços foi presumido com base nas compras, o valor do Custo das Matérias Consumidas, a considerar para efeitos de determinação do lucro tributável, é igual ao valor das compras declarado, que foi no montante de € 1.041.054,26. Neste termos há lugar a correção ao valor do Custo das Matérias Consumidas em €73.246,18 (1.114.300 – 1.041.064,26).

Assim, nos termos do artigo 57.º do código do IRC, propomos a correção ao Lucro Tributável para € 608.115,52, conforme demonstrado no quadro seguinte:

Note-se que chegamos a um valor presumido de Prestações de Serviços e a um Custo das Matérias Consumidas, a que corresponde uma Margem Bruta sobre as Vendas (MBV)4, consideravelmente inferior à declarada pelo sujeito passivo para o ano de 2004 após ação inspetiva e regularização por parte dele, conforme referimos no capítulo anterior.

A AT, dados os fundamentos para aplicação de métodos indiretos, descritos no capítulo anterior, poderia ter adotado como critério de cálculo dos valores corrigidos, a aplicação da mesma MBV declarada pelo sujeito passivo no ano de 2004. Tal critério apesar de aplicável seria menos benéfico para o sujeito passivo.

V – 2.2 I.V.A.

Como o sujeito passivo durante o mês de julho esteve fechado para férias do pessoal, estando aberto apenas 2 dias nesse mês, vamos distribuir equitativamente pelos restantes meses as correções às prestações de serviços determinadas acima. Assim, resumidamente, propõe-se a liquidação adicional de IVA, nos termos do artigo 90º do Código do IVA, nos montantes seguintes por períodos de imposto:

(…)

IX – DIREITO DE AUDIÇÃO

O sujeito passivo foi notificado para exercer o direito de audição, previsto no artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT) e no artigo 60.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), através do nosso ofício n.º 3795 de 2013-06-25.

No dia 11 de julho deu entrada nesta Direção de Finanças, requerimento do sujeito passivo através do qual o mesmo vem exercer o direito de audição.

No parágrafo 3º do referido requerimento o sujeito passivo afirma que no capítulo II do relatório a inspeção descreve os critérios e indicadores que utiliza para corrigir, por métodos indiretos, os valores declarados pela empresa. Na verdade, no capítulo II, sub ponto 3.2 Atividade desenvolvida, apenas são apresentados alguns dos valores declarados pelo sujeito passivo nos últimos anos. Os critérios utilizados para propor correções por métodos indiretos estão descritos no Capítulo V.

No parágrafo o sujeito passivo alega que não é possível, no prazo concedido para o exercício do direito de audição, analisar os indicadores utilizados pela inspeção e determinar os erros de quantificação praticados, porque o estabelecimento se encontra encerrado durante o mês de julho.

O facto de o estabelecimento se encontrar encerrado, em nada influencia a capacidade do sujeito validar os cálculos efetuados e as quantidades consideradas, bem como os critérios utilizados. A maior parte dos critérios utilizados já foram aceites pelo sujeito passivo com as suas declarações do dia 9 de junho.

A inspeção para propor correções não utilizou indicadores, apenas com base nos consumos de produtos e matérias primas, calculou unidades de venda às quais aplicou os preços praticados pelo sujeito passivo, considerando desperdícios, quebras e autoconsumos.

No parágrafo , vem o sujeito passivo informar que nenhum dos pressupostos enunciados no Relatório de Inspeção preenche os requisitos contemplados na alínea b) do artigo 87.º e alínea a) do artigo 88.º da LGT.

O que se afirma no projeto de relatório é que estão reunidas as condições previstas na alínea b) do artigo 87.º e na alínea d) do artigo 88.º da LGT. Ou seja, foram identificados factos através dos quais é patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada.

Por outro lado, os elementos da contabilidade são insuficientes na medida em que os únicos documentos de suporte da contabilização dos proveitos e do IVA liquidada são os apuros diários extraídos do sistema informático de faturação, cuja informação é apenas o valor total diário (base tributável e IVA). Não foi facultada informação do detalhe de todos os documentos de venda emitidos pelo sujeito passivo, elementos indispensáveis à comprovação e quantificação, direta e exata, da determinação da matéria coletável do IRC e do IVA.

Relativamente ao parágrafo 10º, as “inúmeras dozes de bens e serviços estimadas pela inspecção” estão devidamente fundamentadas nas quantidades de bens adquiras pelo sujeito passivo. O sujeito passivo afirma terem havido pressupostos errados, mas não identifica qualquer desses pressupostos, ou seja, não identifica nenhum erro.

Dado o informado, mantenho as correções propostas.

E. Em 16 de Agosto de 2013, foi apresentado pedido de revisão da matéria colectável fixada por métodos indirectos, nos termos dos artigos 91,° e segs. da LGT, com destaque para o seu ponto 5.2, em que se fez constar o seguinte (cf. fls. 107 e segs. do processo de reclamação graciosa apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):

5.2 As divergências aparadas ao relatório de inspecção entre o valor das prestações de serviço declarado e o valor presumido pela AT resultam de pressupostos incorrectos, erros de recolha das quantidades adquiridas, erras de quantificação dos produtos que foram objecto de transformação e de critérios errados de imputação dos produtos à confecção.

129°

Como se demonstra e prova no capítulo 4 desta petição, as divergências apuradas entre o valor das prestações de serviço declarado e o valor presumido peia AT resultam de:

· Pressupostos e critérios incorrectos;

· Erros de recolha e de quantificação dos te que foram objecto de transformação;

· Critérios errados de imputação dos produtos à confecção; Etc.

130*

No ponto 4.1 da petição, demonstra-se que os pressupostos e critérios estabelecidos no relatório de inspecção para a determinação do valor da sopa da pedra estão errados, desajustados da realidade e constituem um factor muito importante na errada quantificação do valor presumido das prestações de serviço de carne de porco.

Na confecção da sopa da pedra os principais ingredientes são: Chispe, orelheira e enchidos (chouriço de carne, morcela e farinheira). O relatório fala no consumo de 27,5 kg de carne de porco e 1.2 kg de enchido.

O fabrico da sopa da pedra acarreta grandes quebras de peso que foram completamente ignoradas nas quantificações efectuadas no relatório de inspecção. Tais como:

· Quebras de peso por enxugo - O chispe, a orelheira, os enchidos sofrem quebras de peso por enxugo que variam em função do tempo decorrido entoe a pesagem que consta da factura e o momento de serem cozinhados m empresa.

· Quebras de peso resultantes da cozedura e do arrefecimento até ao momento da divisão - a cozedura do chispe, da orelheira e dos enchidos seguida do arrefecimento e estadia nas camaras frigoríficas acarretam significativas quebras de peso. Durante a cozedura da carne e dos enchidos são libertadas as gorduras e outras componentes destes carnes que são a principal característica da sopa da pedra;

· Quebras de peso resultantes da descarna dos chispes - Á descama dos chispes acarreta, uma perda de peso muito grande. O peso dos ossos corresponde a cerca de 40% do peso do chispe arrefecido.

Nas condições de fabrico utilizadas na empresa, é tecnicamente impossível confeccionar 27.382,28 doses de sopa da pedra com 7.530 kg de chispe e orelheira (peso do factura), mesmo que se considere uma incorporação média de carne e de enchidos de 0,395 kg por dose, como se refere no relatório de inspecção.

131º

No ponto 4.2 da petição, demonstra-se e prova-se que a utilização do peso bruto dos produtos facturados para base de cálculo da presunção do valor das prestações de serviço este errado, pois, não teve em consideração as quebras de peso e os desperdícios resultantes da preparação da carne e do amanho do peixe.

Tendo por base os documentos de inutilização comunicados m Serviço de Finanças de Almeirim, quantificam-se as quebras de peso e os desperdícios ocorridos na preparação da carne e do peixe e determina-se a influência destas reduções de peso na presunção das prestações de serviço.

A titulo exemplificativo, determinou-se que as quebras e os desperdícios provocam uma redução de € 64.999,80 no valor das prestações de serviço resultantes da confecção dos seguintes produtos.

Q.3 – Influência das quebras e desperdícios na presunção do valor das prestações de serviços

132º

No ponto 4.3.1 da petição identificam-se alguns dos erros cometidos na recolha das quantidades de carne de porco facturadas (ponto 4.3.1 da petição) que serviram de base à presunção do valor das prestações de serviço resultantes da confecção da carne de porco.

No ponto 4.3.2 da petição identificam-se alguns dos erros cometidos na afectação da carne de porco à confecção dos pratos, nomeadamente, o englobamento do chispe, orelheira e toucinho na quantificação das doses que serviram de base à presunção do valor das prestações de serviço resultantes da confecção da carne de porco, pois:

· O toucinho – não é servido à dose. É utilizado como gordura na preparação de assados no forno, estufados, etc.

· O chispe e a orelheira – todo o chispe e orelheira adquiridos pela empresa tiveram como destino a confecção da sopa da pedra, pois, a empresa não fornece no restaurante, chispalhada, cozido à portuguesa ou outros pratos onde estes ingredientes sejam utilizados.

Estes erros de recolha e de afectação da carne de porco à confecção, de acordo com os critérios de quantificação definidos no relatório de inspecção provocam uma redução de € 209.458,56 no valor das prestações de serviço resultantes da confeção da carne de porco.

133º

No ponto 4.4 da petição identificam-se alguns dos erros cometidos na quantificação dos kg de garoupa, cherne, mero e salmão que serviu de base à presunção do valor das doses (pratos de ementa) facturadas aos clientes.

E, demonstra-se que a quantidade desde peixe que considerada no fabrico da sopa de peixe foi igualmente considerada na quantificação das doses (pratos da ementa) facturadas aos clientes.

Estes erros de quantificação do peixe, de acordo com os critérios de quantificação definidos no relatório de inspeção provocam uma redução de € 13.361,54 no valor das prestações de serviço presumidas.

134º

No ponto 4.5 da petição demonstra-se que os pressupostos e critérios seguidos pela AT para quantificar o valor das refeições consumidas pelo pessoal estão errados, desfasados da realidade e são distintos dos seguidos para presumir o valor das prestações de serviço fornecidas aos clientes.

É do conhecimento geral que os trabalhadores, por necessidades física, fazem mais de uma refeição por dia no local de trabalho, pois:

o Ao iniciarem o serviço, os trabalhadores tomam o que poderíamos considerar “o pequeno ao almoço” – sandes, sumo e café;

o No final das prestações de serviço inerentes aos almoços, os trabalhadores fazem a sua refeição principal – almoço;

o No final das prestações de serviço inerentes aos jantares, os trabalhadores fazem outra refeição – jantar;

o Durante o período de trabalho, como é natural, os trabalhadores fazem outros consumos, principalmente líquidos (agua, refrigerantes, cafés, etc.);

Para além do número de refeições quantificadas como auto consumo do pessoal estar errado, a determinação do seu valor não foi efectuada tendo por base os mesmos critérios e indicadores que a AT utilizou para presumir o valor das prestações de serviço facturadas aos clientes, isto é, multiplicando as doses ou quantidades consumidas pelos respectivos preços de ementa;

O valor da refeição consumida por todos os trabalhadores é muito superior a 12 euros utilizados pela AT. Como se demonstra no ponto 4.5 da petição, o valor da refeição aos preços de ementa é de € 16,74 e o montante global de uma refeição completa consumida após o almoço dos clientes é de € 104.223.24 – 283 x 22 x 16,74€

Considera o signatário que, os restantes consumos (alimentos e bebidas) efectuados pelos trabalhadores (ao pequeno almoço, durante o dia e ao jantar), valorizados com base nos preços de ementa, têm um valor médio superior ao da refeição consumida ao almoço.

Nestes termos, tendo por base os critérios de cálculo utilizados pela AT para presumir o valor das prestações de serviços realizadas no ano de 2011, o montante global do autoconsumo dos trabalhadores a desconsiderar no valor presumido das prestações de serviço não poderá ser inferior a 208.446,48 euros.

135º

No ponto 4.6 da petição demonstra-se que os pressupostos e critérios seguidos pela AT para quantificar o valor do pão facturado aos clientes estão errados, pelos seguintes factos:

· O coeficiente de conversão da farinha em pão é diferente do indicado no relatório. Segundo a Circular nº 26/99 da AIPL, “considerando as percentagens de humidade permitidas por Lei é a seguinte a conversão técnica de 1 kg de farinha em pão:

Pão de farinha de trigo tipo 65 até 0,250 kg…… 1,221 kg de pão

· Efectuado o controlo do peso do pão, após a fornada, verificou-se que o peso do pão varia entre os 0,190 kg 0,220kg, logo, um peso médio de 0,205 kg.

· Na determinação das quantidades de pão facturado aos clientes não foi tido em consideração:

o O pão utilizado nas bifanas, pregos e sandes, cujo preço de venda já engloba o pão. Valor não inferior a 3% do pão produzido.

o O autoconsumo de pão pelos empregados;

o As sobras de pão, variáveis diariamente, e superiores a 2% do pão fabricado.

De acordo com os cálculos descritos no ponto 4.6, o valor estimado para o pão facturado nas entradas é de 46.772,63 euros. A divergência para o valor presumido pela AT é de € 10.154,57 = (56.927,20 – 46.772,63).

136º

No ponto 4.6 da petição demonstra-se que os pressupostos e critérios utilizados pela AT para transformar o grão do café no valor das vendas de café estão errados e não tiveram em consideração a especificidade da empresa, pois, trata-se de um restaurante e não de um café.

Considera o signatário que nas condições existentes no restaurante, será uma óptima rentabilidade conseguir um aproveitamento de 115 cafés por kg de grão.

Para além disso, temos a referir outros factos que não foram tidos em consideração na presunção do valor dos cafés facturados aos clientes:

· Inutilizações: O tempo que decorre entre a extracção do café na máquina e o serviço à mesa leva a que muitos cafés sejam inutilizados

· Ofertas: É normal a empresa oferecer uma bebida, onde incluímos o café, a fornecedores, visitantes ou convidados especiais.

· O autoconsumo interno do pessoal. Não será exagerado afirmar que, em média, o pessoal toma três cafés no restaurante: ao iniciar o período de trabalho, ao almoço e à tarde.

Por todos estes factos, a presunção do valor do café facturado aos clientes é de 60.943,80 euros e a divergência para o valor presumido pela AT é de € 22.282,20 = (83.226,00 – 60.943,80).

137º

Como se refere na petição, é impossível analisar em detalhe todos os elementos recolhidos e cálculos efectuados pela AT para presumir o valor das prestações de serviço de 2011. Por isso, optamos por controlar os elementos que consideramos de maior relevo e reflexo nas presunções efectuadas.

138

Demonstra-se na petição que:

· Os registos contabilísticos das prestações de serviço estão suportados pelos resumos do dia do programa informático de facturação certificado pela AT e por esse facto, merecem credibilidade;

· De tais registos foram extraídos os valores expressos nas declarações mensais de IVA enviadas, atempadamente, por transmissão electrónica de dados e, por esse facto, os valores declarados merecem credibilidade;

· O facto do sistema informático da empresa ter avariado e não permitir a consulta dos detalhes das vendas não retira credibilidade aos valores registados na contabilidade com base nos resumos diários de um programa informático certificado;

· As divergências apuradas no relatório de inspecção entre o valor das prestações de serviço declarado e o valor presumido pela AT resultam de pressupostos incorrectos, erros de recolha das quantidades adquiridas, erros de quantificação dos produtos que foram objeto de transformação e de critérios errados de imputação dos produtos à confecção, como ficou demonstrado e provado na petição;

· O erro de quantificação e valorização do stock final de 2011, referido no relatório de inspecção, não justifica a avaliação indirecta, pois:

o Este erro pode ser corrigido através de avaliação directa, com a colaboração da empresa.

o O erro cometido no inventário final de 2011 (traduzido no aumento do Custo das Matérias-primas consumidas em 2011) tem reflexos de sentido inverso no apuramento dos resultados de 2102 (traduzido numa redução idêntica do Custo das Matérias-primas consumidas em 2012). Logo, o possível erro cometido na liquidação do IRC de 2011 foi regularizado com a entrega da declaração de rendimentos e liquidação de IRC de 2012.

139º

Julgamos assim ter demonstrado e provado que:

· Não existe fundamento para proceder à determinação da matéria tributável por métodos indirectos em sede de IRC e IVA, relativamente ao exercício de 2011;

· Existem erros nos pressupostos e na quantificação da matéria tributável que serviu de base à fixação notificada;

· As correções propostas aos valores declarados para efeitos de IRC e IVA baseadas na avaliação indirecta devem ser anuladas.

Termos em que se solicita a revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos, devendo suspender-se a liquidação dos referidos tributos.

F. Dá-se por integralmente reproduzido o teor dos anexos ao pedido de revisão referido na letra anterior, a fls. 152 e segs. do processo de reclamação graciosa apenso;

G. Em 12 de Setembro de 2013, foi lavrada a acta n.° 2/2013 da reunião entre os Peritos da Impugnante e da Administração Tributária, da qual consta, entre o mais, que os mesmos Peritos decidiram a realização de nova reunião no dia 19 de Setembro de 2013 (cf. fls. 143 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

H. Em 19 de Setembro de 2013, foi lavrada a acta n.° 2-A/2013, da qual consta,relativamente ao montante da matéria tributável a fixar, pelo que cada um deles apresentou o respectivo parecer, juntos à mesma acta (cf. fls. 160 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

I. Dá-se por integralmente reproduzido o parecer da Administração Tributária, a fls. 139 e segs. do PAT apenso;

J. Dá-se por integralmente reproduzido o parecer do Perito da Impugnante, a fls. 163 e segs. do PAT apenso;

K. Por decisão de 29 de Janeiro de 2014, o Director de Finanças de Lisboa considerou que cabia na mesma decisão a proposta da perita da Autoridade Tributária acrescida da rectificação fruto deste parecer e respeitante às considerações tecidas sobre o toucinho fumado e toucinho de porco preto, nos seguintes termos essenciais (cf. fls. 181 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):

Vejamos, pois, o que se nos oferece dizer, começando por efetuar um breve enquadramento jurídico do instituto da tributação com recurso a métodos indiretos.

Importa reter que, no ordenamento jurídico-português tributário, vigora o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, o qual se encontra plasmado no art. 75º, n.º 1 e n.º 2, al. a) da LGT, aí se dispondo que, “presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal”, cessando tal presunção quando, entre outras razões, aquelas declarações, contabilidade ou escrita revelem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem a matéria tributável real do sujeito passivo ou se apresente de uma forma que impeçam precisamente o conhecimento dessa mesma realidade tributável.

Acresce que, em conformidade com o preceituado no art. 81º, n.º 1 da LGT, a matéria tributável deve ser avaliada ou calculada diretamente, segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder à avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstos na lei, constituindo, assim, a avaliação direta o princípio regra a seguir pela Administração tributária e a avaliação indireta um mecanismo de determinação da matéria tributável meramente subsidiário.

Ora, foi precisamente tendo em conta a natureza subsidiária do instituto e os pressupostos de facto de que há, necessariamente, que partir, que o legislador entendeu impor à Administração Tributária um especial dever de fundamentação sempre que a mesma lance mão desse mecanismo – Vide art. 77º, n.º 4 da LGT.

Por isso a AT, quando recorra à tributação por métodos indirectos, está obrigada a demonstrar que estão verificados os pressupostos legitimadores dessa forma de determinação da matéria tributável, ou seja, que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contribuinte e que o recurso àquele método se apresenta como a única forma de calcular o imposto, externando os elementos que a levaram a essa conclusão.

Feita essa prova, recai, então, sobre o sujeito passivo, a obrigação ou ónus de demonstrar que houve manifesto excesso na quantificação da matéria tributável (cfr. art. 74º, n.º 3 da LGT).

Quanto aos pressupostos

Passando para a análise de todo o processado nos presentes autos, começar-se-á por realçar o declarado pelo sócio-gerente, J....., quanto à inexistência de elementos de suporte ao registo dos serviços prestados: “no início do mês de Janeiro do ano de 2012 perdemos toda a informação relativa ao detalhe das vendas dos períodos anteriores a essa data, porque o disco, onde era armazenada toda a informação, avariou e, segundo o informático não foi possível recuperar a informação… Portanto, relativamente ao ano de 2011 e a anos anteriores a única informação existente relativa às vendas/prestações de serviços é a que consta da contabilidade, que é apenas o valor total diários”.

A tal facto, juntam-se outros como:

No que concerne ao primeiro pressuposto aqui identificado, refere-se ainda que, de facto, o Contribuinte tem a obrigação, imposta por lei, de possuir cópias de segurança do suporte eletrónico, devendo os originais e as cópias de segurança serem armazenados em locais distintos e em condições de conservação e segurança necessárias de modo a garantir a impossibilidade de perda dos arquivos. Desta forma, será possível ao Contribuinte facultar tais elementos, quando solicitados pela AT – vide art. 6º, 7º e 9º da Portaria n.º 1370/2007, de 19 de Outubro.

Mais, encontra-se, igualmente, obrigado a “conservar em bora ordem durante os 10 anos civis subsequentes” tais elementos, conforme disposto no nº 1 do art. 52º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA).

Nesta sede, verifica-se um completo desrespeito pelas normas legais citadas, por parte do Contribuinte.

Relativamente às demais limitações contabilísticas, as mesmas não surgem contestadas pelo S.P. nem foram sugeridas formas fiáveis de as ultrapassar. Ora, são precisamente as circunstâncias supra referidas que justificaram o recurso aos métodos indiretos, dados traduzirem a impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável – Vide art. 87º, nº 1, al. b) da LGT – permitindo pôr em causa o princípio da verdade declarativa, plasmado no art. 75º da LGT e art. 59º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT).

Todos estes fundamentos se encontram devidamente explanados no Relatório de Inspeção, para o qual se remete.

Deste modo, dever-se-á concluir que nada haverá a assacar aos Serviços de Inspeção Tributária, não lhe restando qualquer outra alternativa senão o recurso à avaliação indireta.

Quanto aos critérios

Na segunda reunião realizada entre os peritos, o perito nomeado pelo Contribuinte manifestou acordo com algumas propostas apresentadas pela perita nomeada pela AT, continuando todavia a não concordar com:

· O critério utilizado pela AT quanto ao fabrico da sopa da pedra;

· O valor considerado para os autoconsumos dos trabalhadores;

· E com a correcção efetuada ao custo das matérias-primas, uma vez que o erro cometido na contabilização do inventário, traduzido no aumento do custo das matérias-primas, tme reflexo em sentido inverso no apuramento do resultado do exercício de 2012.

A este propósito importa deixar a apreciação que segue.

É oportuno frisar que os critérios usados traduzem as declarações do próprio sócio-gerente e que tal conduta da AT encontra assento legal na al. d), nº 1 do art. 90º da LGT.

· Concretamente quanto ao valor considerado para determinação dos autoconsumos importa efectuar o seu enquadramento face às normas vigentes em IVA.

Nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do art. 21.º do CIVA, não é possível exercer-se o direito à dedução do IVA contido nas despesas de alojamento, alimentação, bebidas, tabacos e despesas de recepção. Contudo, a alínea b) do n.º 2 do referido artigo estabelece que não se verificará a exclusão do direito à dedução do imposto contido nas despesas relativas a fornecimento ao pessoal da empresa, pelo próprio sujeito passivo, de alojamento, refeições, alimentação e bebidas, em cantinas, economatos, dormitórios e similares.

No entanto, a al. 36) do art. 9.º isenta de IVA os serviços de alimentação e bebidas fornecidas pelas entidades patronais aos seus trabalhadores, embora passível de renúncia nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 12.º do Código do IVA, a comunicar à Administração Fiscal através da declaração de inicio de atividade ou de alteração de início de atividade.

Dado não termos conhecimento da apresentação, por parte do Sujeito Passivo, de qualquer pedido de renúncia nos termos da alínea a), do nº 1 e do art.º 12º do CIVA, tais serviços encontram-se isentos de imposto. Tendo como consequência a não liquidação do IVA, não conferindo, portanto, o direito à dedução, para o que se impunha a utilização de métodos de dedução, por afectação real ou por prorata.

Contudo, pelo facto da entidade patronal ser uma empresa cuja atividade normal é a prestação de serviços de alimentação e bebidas (Restaurante), a mesma pode beneficiar da isenção na prestação do serviço aos empregados e continuar a deduzir IVA das aquisições, sendo necessário que o valor das refeições fornecidas as empregados não ultrapasse 5% do volume total de negócios, conforme consta do Ofício-Circulado n.º 53598 de 11/05/1989 de DSIVA.

No ponto 7 deste documento consta que “Por outro lado, sem prejuízo de aplicação do método de afectação real se o pretenderem, todos os sujeitos passivos que exerçam a título principal uma actividade no âmbito da restauração e hotelaria podem utilizar o método de percentagem ou prorata, considerando-se inexistentes, para efeitos do n.º 9 do art.º 23.º, as refeições isentas nos termos do n.º 40 di art.º 9.º, desde que o seu valor não ultrapasse 5% do volume de negócios.”

Ora, não tendo o S.P. renunciado à isenção nem tendo lançado mão de qualquer daqueles métodos, parece-nos não ter qualquer cabimento o facto de vir exigir, para autoconsumo, sem apresentar qualquer evidência prática, um montante de € 208 446,48, valor que se situa, face ao volume de negócios proposto pela Perita da AT, em cerca de 9% e sem que tenha vindo apresentar qualquer proposta que faça cumprir, pela sua parte, o que se dispõe no art.º 9.º, art. 12.º e art.º 21.º do CIVA.

· Relativamente à correção efetuada ao custo das matérias primas, começar-se-á por referir que foi o próprio sócio-gerente que declarou estar incompleto o inventário: “Relativamente ao inventário reportado a 31/12/2001, no valor total de €4.612,38, esse inventário não está completo”. Com esta conduta foi claramente infringido o princípio da especialização dos exercícios ou do acréscimo, o qual determina que os proveitos e os custos sejam reconhecidos quando obtidos ou incorridos, independentemente do momento do seu recebimento ou pagamento, devendo incluir-se nas demonstrações financeiras dos peritos a que respeitam, não se concordando com o alegado pelo Perito do S.P.

Sendo que, estando o inventário final incorreto, o custo das mercadorias afecta negativamente os resultados de 2011, impondo-se a correção que a IT promoveu. A alegação do S.P. quanto ao efeito contrário no exercício de 2012 nada tem a ver com o que agora e aqui se aprecia. Alias a repercussão favorável ao S.P., em 2012, imporá que, sobre o inventário final de 2012 se faça idêntica análise, no sentido de verificar a sua correcção e fiabilidade. Este concreto aspecto que não é referido pelo Perito do S.P.

· Deve ter-se ainda em conta que, relativamente ao abate de desperdícios e quebras, comunicadas pela entidade no ano de 2013, a verificação pessoal por parte da IT permitiu constatar que tais desperdícios respeitavam a gorduras, espinhas e outros subprodutos resultantes da preparação para fabrico o que, na verdade, não consubstancia a natureza do abate propriamente dito, como acontece, por exemplo, em caso de peças obsoletas e produtos fora da validade.

A este propósito há ainda a referir que o S.P. não apresentou qualquer prova para o nível de desperdícios alegadamente verificados na confeção dos pratos. De facto, relativamente às quantidades e subprodutos comunicados para “abate” e concedendo, o S.P. não fornecer quaisquer indicações que contribuíssem para a determinação de um coeficiente fiável das quebras e desperdícios verificados na actividade, designadamente indicações sobre os motivos de alguns “abates”, seu carácter usual ou excecional, sua expressão percentual face às compras realizadas, período a que respeitam, etc.

Nesta conformidade, entende-se que os desperdícios, a tomar em conta, foram já considerados no peso bruto necessário para a preparação das doses.

· No que se refere a sopa de pedra, parece-nos manifestamente exagerada a quantidade de carnes indicadas pelo S.P. para 100 doses, considerando que uma dose dá para duas pessoas. Alegando o S.P. que os desperdícios não foram considerados, parece-nos ser oportuno referir aqui que os chispes não são totalmente desossados para a preparação da sopa de pedra, estando o eventual desperdício mais do que compensado nas quantidades consideradas pela IT. De facto, o que o S.P. pretende é que se considere a utilização de 667 gr de carne para confecionar um litro de sopa.

Esta questão remete-nos para a discordância do Perito Representante do S.P. quanto à orelheira e chispe incluída na preparação de pratos de carne de porco, pretendendo ver abatida à matéria colectável os proveitos associados, alegando para tal, que a entidade não confeciona quaisquer outros pratos, para além da sopa de pedra, com aqueles ingredientes. Não tendo o S.P. logrado demonstrar, o excesso de quantificação, neste particular, pode acrescentar-se que, de facto, a imputação, às doses de sopa da pedra estimadas, da quantidade de carne de porco aqui objecto de divergência, levaria a que cada dose (para duas a três pessoas) necessitasse deste ingrediente em 0,677kg, o que se apresenta manifestamente exagerado.

Como se pode concluir, o pretendido pelo Contribuinte não tem cabimento na sua actividade. Comparem-se as quantidades agora pretendidas e alegadas, e mesmo as indicadas pelo sócio gerente, com as quantidades de enchidos necessárias à preparação da receita inserta abaixo, para oito a dez pessoas, extraídas do site da CM de Almeirim e cedida por um estabelecimento congénere. Facilmente se conclui que as quantidades utilizadas se afastam, e muito, do pretendido pelo S.P.

As quantidades usadas nada têm a ver com as pretensões do S.P., afastando-se de forma explícita. Tem-se pois que, considerando as indicações dadas pelo S.P. em declarações, caso os 7 722 kg de orelheira e chispe tivessem sido utilizados na confeção de sopa de pedra então existe clara omissão de compras de enchidos e as doses de sopa de pedra seriam muito superiores às estimadas pela IT. Nesta conformidade, considera-se que as correcções propostas pela IT não merecem reparo.

Quanto a toucinho fumado e toucinho de porco preto crê-se que assiste razão ao S.P., porquanto se afigura não existir nenhum prato confeccionado tendo como ingrediente principal estes dois bens. Entende-se que tais produtos constituem matérias-primas secundárias da preparação tal como são o sal, as gorduras, o vinho, as ervas aromáticas, etc.

Assim deve ser afastado da quantificação dos proveitos o seguinte montante:

Total de toucinho fumado e toucinho de porco preto….60,6kg+244,108kg+304,708kg

(304.70kh/0.600kg)*€9,33= €4.738,24 (com IVA incluído)

De notar que, nos cálculos efectuados pela Perita da AT, já havia sido afastado o toucinho gordo. Por este motivo os cálculos apresentados pelo perito do S.P. na página 12 do seu parecer não estão correctos. Aliás a isto alude na página 5.

· Relativamente a erros de recolha de quantidade adquiridas, a Representante da AT reconheceu e aceitou como provados os erros de quantificação da matéria colectável invocados e quantificados no pedido de revisão, apresentado pelo S.P., tendo reformulado os cálculos.

· Igualmente os erros de quantificação e critérios de afectação de carne e peixe aos diversos pratos confecionados, foram corrigidos pela Perita da AT, designadamente para a preparação de peixe, aceitando as alegações do S.P. As situações não aceites, resultam do facto de tais critérios de afetação se apoiarem em informações prestadas pelo próprio S.P. em termo de declarações, não bastando, em nosso entendimento, ao Perito Representante do Contribuinte insistir num mesmo aspecto, travestindo-o de forma diversa e “só porque sim”, sem quaisquer suporte fiável e comprovado.

· Os erros cometidos nos critérios e indicadores utilizados na determinação da quantidade e valor do pão fabricado e vendido a quantidade a valor do café vendido forma rectificados pela Perita Representante da AT que reformulou os cálculos quanto à rendibilidade do quilo de farinha e quilo de café, conforme o Perito do S.P. bem sabe, não se alcançando do seu parecer que aspectos, no relatório da IT, ainda entende como afastados da realidade da actividade, pois pauta-se, em nossa opinião, por introduzir apenas instabilidade na apreciação com cálculos e pretensões que não são minimamente apoiadas e demonstradas.

6. Conclusão

Face ao exposto, importa salientar que o recurso à avaliação indireta se encontra devidamente fundamentado e documentado.

Os indícios de que a contabilidade não revela a realidade da exploração desenvolvida foram extensamente descritos e detalhados na informação da IT.

A IT apontou as limitações de que enferma a escrita do S.P. e enquadrou-as na legislação aplicável, art.º 87.º e art.º 88.º da LGT.

Percepcionado como adequado o critério escolhido, torna-se necessário avaliar a expressão da quantificação alcançada, para aferir da sua justeza, pois prossegue a AT o interesse público, cingido pela imposição da legalidade e pelo respeito pelas garantias e direitos dos contribuintes.

A este respeito, propõe a Perita da Administração Fiscal uma nova quantificação.

Quanto à posição do Perito Representante do Contribuinte cabe-lhe o ónus probatório de que a realidade é completamente distinta do resultado a que conduziu a utilização do critério usado, ou seja, que este conduz a um Resultado Fiscal ostensivamente desadequado e/ou inadmissível e que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada. Ora não foi carreado para o processo prova certa e segura, do alegado excesso. De facto, o Contribuinte não apresenta qualquer prova, qualquer documento capaz de sustentar a sua posição.

Neste sentido, não tendo o S.P. invertido, de forma clara e objectiva, o ónus da prova, quanto ao excesso da quantificação, remeta-se o processo para a Perita da Administração Tributária a fim de serem elaborados os respetivos documentos corretivos, conforme decidido, cabendo na decisão a proposta da Perita da Autoridade Tributária e Aduaneira acrescida da retificação fruto deste parecer e respeitante as considerações tecidas sobre o toucinho fumado e toucinho de porco preto.

L. Dá-se por integralmente reproduzido o teor dos anexos ao RIT, a fls. 199 e segs.

do PAT apenso;

M. Foram elaborados os documentos de correcção e efectuadas as liquidações de IVA dos períodos de Janeiro a Junho e Agosto a Dezembro de 2011, n.°s ....., ....., ....., ....., ....., ....., ....., ....., ....., ....., .....e respectivos juros compensatórios, no montante total de € 21.137,81 (cf. does. 1 a 23, juntos com a p. i. a fls. 16 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido, fls. 50 e segs. e do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido e fls. 182 e segs. do processo de reclamação graciosa apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);

N. A Impugnante apresentou reclamação graciosa contra as liquidações de IVA e respectivos juros compensatórios referidas na letra anterior, a qual mereceu decisão de indeferimento de 31 de Dezembro de 2014, com o seguinte teor essencial (cf. docs. 24, junto com a p. i. a fls. 39 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido e fls. 7 e segs. e 267 e segs. do processo de reclamação graciosa apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):

I – INTRODUÇÃO

O Sujeito Passivo H....., LDA., NIF. ....., com sede na .....Queluz, vem, em nome da sociedade por si incorporada (em fusão) e juridicamente dissolvida J....., LDA., NIF ....., ao abrigo do disposto nos artigos 70.º e 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), com o fundamento em ilegalidade decorrente de violação de lei, ausência ou vício da fundamentação legalmente exigida, errónea qualificação e quantificação dos rendimentos e preterição de outras formalidade legais, deduzir reclamação graciosa, das liquidações adicionais de IVA e Juros Compensatórios, referidas em fls. 7 e 8, 63 a 85 dos autos, respeitantes ao exercício de 2011.

O que fazem, nos termos e fundamentos expostos na petição em fls. 3 a 60 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

II – PRESSUPOSTOS

A presente Reclamação Graciosa é o meio próprio para a obtenção dos fins pretendidos e a reclamante é parte legítima, tudo nos termos do nº 1 do artigo 9º e do artigo 68.º, ambos do CPPT. A reclamação contra as liquidações acima referidas, é tempestiva nos termos do artigo 70.º conjugado com o n.º 1 do artigo 102.º do CPPT, dado que a mesma deu entrada antes dos 120 dias após a data limite de pagamento, ou seja, em 2014-05-31, 2014-05-15 e 2014-05-12.

III – ALEGAÇÕES DA RECLAMANTE

Na sua petição alega o Reclamante que:

1. A reclamante foi objecto de uma ação inspectiva, resultando correcções por recurso a métodos indirectos – Relatório de Inspecção resultante da ..... – fls. 87 a 94 e 211 a 22) resulta dos factos enumerados nas fls. 52 a 55 dos autos, nomeadamente em relação ao IVA (fls. 221-verso e 222).

2. Não estão reunidos os requisitos legais enunciados nos artigos 87.º e 88.º da LGT para a aplicação de métodos indirectos. A divergência entre o valor declarado e o valor presumido pela AT para as Vendas e Serviços Prestado resulta de pressupostos incorrectos, critérios errados de quantificação e imputação dos produtos à confecção, pressupostos e critérios errados de quantificação e valorização do autoconsumo.

3. As divergências entre os valores declarados para efeitos de IVA e os valores corrigidos por métodos indirectos na decisão a que se refere o artigo 92.º, n.º 6 da LGT, resultam, como se resumiu no ponto 6.6 desta petição (fls. 52 a 55 dos autos), do facto de a AT não ter efectuado as diligências necessárias à descoberta da verdade material e de persistir nos mesmos critérios e indicadores de produção que foram utilizados no procedimento de Inspecção.

4. Efectuou o pedido de revisão da matéria tributável ao abrigo do artigo 91.º e seguintes da LGT (fls. 107 a 152), do qual resultou uma correcção proposta pela Perita de €19.767,14 para as liquidações adicionais de IVA, com o qual não concordou a reclamante, e então foi tomada a decisão do Director de Finanças, por falta de acordo, a que se refere o n.º 6 do artigo 92.º da LGT, em fixar as liquidações adicionais de IVA em € 19.222,03 (fls. 104 e 105).

E vem requerer,

5. A anulação dos actos de liquidação de IVA e respectivos juros compensatórios, respeitantes a 2011, por ilegalidade decorrente de violação da constituição e da lei, falta ou vício de fundamentação exigida e preterição de outras formalidades legais.

IV – ANÁLISE DO PEDIDO/PARECER

Relativamente às questões suscitadas na petição em apreço, cumpre agora, conhecer o mérito da matéria trazida à colação pela ora Reclamante.

Para melhor exposição e esclarecimento, analisaremos as razões de facto e de direito aduzidas pelo sujeito passivo, tecendo as seguintes considerações:

(Argumentos da Reclamante)

6. Solicita que a presente reclamação graciosa seja deferida na totalidade e consequentemente, que sejam anuladas integralmente as liquidações adicionais de IVA, e correspondentes juros compensatórios.

(Análise)

7. Manifestamos a nossa concordância com a decisão do Director de Finanças por falta de acordo – art.º 92.º, n.º 6 da LGT, fls. 97 a 105 dos autos.

8. Neste sentido, os serviços de inspecçao recorreram à aplicação de Métodos Indirectos, nos termos da alínea b) do artigo 87.º e da alínea d) do artigo 88.º da LGT, para a determinação da matéria tributável, por não ser possível essa determinação de forma clara e inequívoca por consulta à contabilidade, tal como refere o Relatório da Inspecção e por isso foi feita uma proposta de liquidação adicional do IVA, nos termos do artigo 90.º do Código do IVA (fls. 221 – verso a 222 dos autos).

9. As irregularidades apontadas não foram justificadas pelo sujeito passivo de forma cabal e convincente com a apresentação de elementos ou documentos comprovativos, tendo ficado provado a existência de omissões e irregularidades na contabilidade do sujeito passivo, restando reunidos os pressupostos para a aplicação dos métodos indirectos na determinação da matéria colectável.

10. A reclamante lançou mão da possibilidade prevista no artigo 91.º e seguintes da LGT, no sentido de contestar a aplicação de métodos indirectos na determinação da matéria tributável; para o efeito, apresentou o pedido de Revisão da Matéria Tributável, tendo-se realizado reunião da Comissão com a presença dos peritos do contribuinte (Laudo do perito do contribuinte – fls. 163 a 161) e da AT; não foi conseguido acordo, relativamente à fixação da liquidação adicional do IVA pela perita em € 19.767,14 (fls. 99 – verso), tendo esta mesma liquidação adicional do IVA passado para € 19.222,03 por Decisão do Director de Finanças (fls. 104 e 105), por não existir nenhum prato confeccionado tendo como ingredientes principais toucinho fumado e toucinho de porco preto e daí ter sido afastado da quantificação dos proveitos o montante de €4.738,24 (com IVA incluído).

11. Neste sentido, o IVA incluído nos € 4.738,24, vai ter de ser subtraído aos € 19.767,14, então € 4.738,24 / 1.13 = € 4.193,13 e, € 4.738,24 - €4.193,13 = € 545,11, logo, € 19.767,14 - € 545,11 = € 19.222,03.

12. Toda a responsabilidade cabe ao sujeito passivo pela forma como apresenta a sua contabilidade, contrariando e violando os princípios geralmente aceites, designadamente os princípios da continuidade, da prudência, da materialidade, da substância sobre a forma e da consistência.

13. Desta forma, não podem ser assacadas responsabilidades à AT pela falta de fundamentação da avaliação levada a cabo, pois é o contribuinte quem deve apresentar a sua contabilidade organizada ou apresentar provas concludentes das suas contestações.

14. Ora, não tendo a reclamante trazidos aos autos, nesta sede, outras provas e/ou alusão a quaisquer elementos factuais ou jurídico-tributários novos que possam condicionar a Administração Tributária a uma nova abordagem da questão, parece-nos não haver mais nada a acrescentar às razões invocadas na Decisão do Director de Finanças, nos termos do n.º 6 do artigo 92.º da LGT para as liquidações de IVA efectuadas e agora em apreço, pelo que continuamos a manifestar a nossa concordância, com a fundamentação e argumentação da Decisão do Director de Finanças, sendo as liquidações de IVA em causa de manter.

15. Em 13.10.2014 foi remetido o ofício n.º ..... (fls. 238 dos autos) à H....., Lda., a solicitar no prazo de 10 dias o envio da escritura de fusão referida na reclamação, não tendo a mesma sido enviada para os nossos serviços.

16. Nos termos do disposto no artigo 74.º da LGT, o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos recai sobre quem os invoca, cabe assim, ao reclamante provar o alegado.

17. Poderá, querendo, o reclamante apresentar em sede do direito de audição, os documentos anteriormente referidos no ponto 13 e 15.

V – INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR

18. Realizada a instrução do processo, foi elaborada a informação e o projeto da decisão acima descrito no sentido de indeferir o pedido, tendo sido dado conhecimento ao reclamante através do ofício n.º 78605 de 2014/12/4 (fls. 243) acompanhado de fotocópia da citada informação.

19. A notificação foi efetuada mediante carta registada em 2014/12/05, conforme registo a fls. 244 para efeitos do exercício do direito de audição prévia no art.º 60º da Lei Geral Tributária, tendo sido concedido à reclamante o prazo de 15 dias.

20. Reportando-se o registo ao dia 2014/12/05, temos, nos termos do n.º 1 do art.º 39º do CPPT, a notificação presume-se efetuada no dia 2014/12/09.

21. Assim sendo, o prazo de 15 dias para exercer o direito audição termina no dia 2014/12/26.

22. A Reclamante exerceu o direito de audição prévia, no dia 2014/12/23, ou seja exerceu o direito de audição dentro do prazo.

23. O reclamante no direito de audição, vem reiterar, por outras palavras, o alegado na petição inicial.

24. O alegado encontra-se devidamente fundamentado no projeto, fls. 240 a 242, que foi devidamente notificado à reclamante.

VI – CONCLUSÃO E DECISÃO

Assim, tendo em conta o anteriormente exposto, e não se provado o alegado por falta de elementos, conclui-se que a presente reclamação seja INDEFERIDA.

O. Em 20 de Janeiro de 2015, a Impugnante a apresentou a p. i. da presente impugnação no Serviço de Finanças de Sintra 4 (cf. informação, a fls. 4 e 5, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).”

*

[Fundamentação de direito 1.ª instância]

“A questão decidenda na presente impugnação consiste na apreciação da legalidade dos actos de liquidação adicional de IVA e respectivos juros compensatórios respeitantes aos períodos de Janeiro a Junho e Agosto a Dezembro de 2011, em decorrência do apuramento correctivo operado pelos Serviços de inspecção tributária.

São vários os vícios apontados pela Impugnante aos actos impugnados. Na ordem por que os mesmos devem ser conhecidos, haverá que observar o disposto no artigo 124.° do CPPT. Assim, porque a Impugnante não estabeleceu uma relação de subsidiariedade entre eles, a apreciação dos vícios haverá que fazer-se nos termos da alínea a) do n.° 2 do referido preceito legal, aplicável ex vi alínea b), ou seja, haverá que conhecer-se primeiro “dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos”.

Significa isto que deverá conhecer-se primeiro do vício de falta de pressupostos para o recurso à aplicação de métodos indirectos

O IVA - e o IRC - são impostos que, não obstante incidirem sobre factos tributários diferentes, são ambos determinados com base na contabilidade (fiável) do sujeito passivo, creditada com a presunção de verdade e boa fé (cf. artigo 75.°, n.° 1, da LGT), a partir da qual se procede :ao cálculo da matéria tributável apurando o valor real dos rendimentos sujeitos a tributação (cf. artigo 83.°, n.° 1, da LGT).

Porém, se as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo, cessa a presunção de verdade e boa fé nas declarações dos contribuintes e nos apuramentos inscritos na sua contabilidade (cf. artigo 75.°, n.°s 1 e 2, alínea a) da LGT).

No caso vertente, resulta do RIT e do parecer do Chefe de equipa aposto no mesmo, que a determinação da matéria tributável de IRC e IVA da Impugnante, relativa ao exercício de 2011, por métodos indirectos, foi efectuada com base nas normas dos artigos 87.°, alínea b) e 88.°, alínea d) da LGT (cf. letra D do probatório).

Entre as situações em que a Administração Tributária pode proceder à avaliação indirecta, encontra-se expressamente prevista no artigo 87.° da LGT a situação de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto, importando salientar que essa impossibilidade de comprovação e quantificação pode resultar da existência de uma manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, se essa discrepância inviabilizar o apuramento da matéria tributável (cf. alínea d) do artigo 88.° do mencionado diploma legal).

Conforme se lê na fundamentação do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 16 de Dezembro de 2015, proferido no processo n.° 06849/13, disponível em www.dgsi.pt, “a avaliação directa tem por fim a determinação dos rendimentos ou bens sujeitos a tributação com base no valor real (n.° 1 do art. 83.° da LGT), já a avaliação indirecta parte de indícios, presunções ou outros elementos de que a Administração Tributária (AT) tenha à sua disposição (n.° 2 do mesmo preceito legal).

Nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 85.° da LGT a avaliação indirecta é uma forma subsidiária da avaliação directa de determinação do lucro tributário dos contribuintes, apenas podendo ser aplicada aquela primeira forma de avaliação nos casos expressamente previstos na lei e quando estejam reunidos os pressupostos legalmente estabelecidos para o efeito (art. 81.°, n.° 1 da LGT).

O recurso a métodos indirectos de determinação da matéria colectável é uma ultima ratio, apenas podendo ser aplicado quando não seja possível que esta avaliação seja feita por via da avaliação directa, em conformidade com o princípio constitucional segundo o qual a tributação das empresas recai fundamentalmente sobre o seu rendimento real (art. 104.°, n.° 2 da CRP).

Ou seja, tendo a avaliação indirecta carácter subsidiário em relação à avaliação directa (cf. o art. 85.°, n.° 1, da LGT) e excepcional (cfr. o n.° 1 do art. 81.° da LGT), cabe à AT a demonstração da verificação dos pressupostos do recurso à avaliação indirecta da matéria tributável, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (art. 74.°, n.° 3, da LGT) [cfr. Ac. do STA de 17/03/2010, proc. n° 01211/09]).

Segundo o art. 87.°, n.° 1, al. b), da LGT, preceito em causa nos autos, uma das situações que determina a possibilidade de se recorrer à avaliação indirecta é “[ijmpossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto”, sendo que essa impossibilidade pode resultar das anomalias e incorrecções previstas nas alíneas a) a d) do art. 88.° da LGT, quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável.

No que diz respeito à fundamentação da decisão de tributação com recurso à avaliação indirecta o art. 77.°, nos seus n.° 4 e n.° 5, estabelece as regras a respeitar em matéria de fundamentação da decisão da AT.

Deste modo, a fundamentação deve especificar «os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directas e exacta da matéria tributável, ou descreverá o afastamento da matéria tributável do sujeito passivo dos indicadores objectivos da actividade de base científica ou fará a descrição dos bens cuja propriedade ou fruição a lei considerar manifestações de fortuna relevantes, ou indicará a sequência de prejuízos fiscais relevantes, e indicará os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável» (n.º 4).

Por outro lado, se estivermos perante o caso de aplicação de métodos indirectos por afastamento dos indicadores objectivos de actividade de base científica, então, «a fundamentação deverá também incluir as razões da não aceitação das justificações apresentadas pelo contribuinte nos termos da presente lei» (n.° 5).

Relativamente à distribuição do ónus da prova, dispõe o art. 74.°, n.° 3 da LGT que cabe à AT a demonstração da verificação dos pressupostos do recurso à avaliação indirecta da matéria tributável, cabendo ao sujeito passivo demonstrar o excesso na respectiva quantificação”.

Regressemos ao caso vertente.

Em sede de procedimento inspectivo, a Impugnante informou os serviços, entre o mais, que “no início do mês de Janeiro de 2012 perdeu toda a informação relativa ao detalhe das vendas dos períodos anteriores a essa data, porque o disco onde era armazenada toda a informação avariou e segundo o informático não foi possível recuperar essa informação”; “portanto, relativamente ao ano de 2011 e a anos anteriores a única informação existente relativa às vendas/prestações de serviços é a que consta da contabilidade que é apenas o valor total diário” (cf. letra D do probatório).

Ora, a Impugnante defende que o princípio do inquisitório previsto no artigo 58.° da LGT impunha à Administração Tributária que actuasse no sentido de trazer ao procedimento todas as provas relativas à sua situação tributária e em que fez assentar a decisão administrativa, investigando e calculando as quebras, desperdícios e sobras ocorridas entre a comora e a confecção dos alimentos, tanto mais que, os registos contabilísticos estão suportados pelos resumos diários extraídos dos programas informáticos de facturação certificados pela Administração Tributária, o que determina, na sua perspectiva, a ilegalidade das liquidações de IVA e respectivos juros compensatórios emitidas na sequência da acção inspectiva.

Adiante-se, desde já, que, no entender deste Tribunal, é possível concluir que, do dado da Administração Tributária se recolheram elementos probatórios relevantes que descredibilizam a contabilidade da Impugnante.

Assim e desde logo, a não disponibilização dos elementos da contabilidade, independentemente de ser uma impossibilidade decorrente de avaria do disco do computador, é um dado factual, objectivo e, nessa medida, incontornável.

Basta lembrar que, nos termos do artigo 52.°, n.° 1, do CIVA, “os sujeitos passivos são obrigados a arquivar e conservar em boa ordem durante os 10 anos civis subsequentes todos os livros, registos e respectivos documentos de suporte, incluindo, quando a contabilidade é estabelecida por meios informáticos, os relativos à análise, programação e execução dos tratamentos”.

Afigura-se claro que é o contribuinte (e não a Administração Tributária) que está na posse dos documentos substitutivos e dos conhecimentos que mais facilmente permitem reconstituir a contabilidade, sendo que, antes de os Serviços de inspecção tributária efectuarem as correcções, foi dada à Impugnante a oportunidade de colmatar as faltas, através, designadamente, do exercício do direito de audição (cf. letra D do probatório).

Conforme se lê na fundamentação do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 16 de Março de 2010, proferido no recurso n.° 3543/09, disponível em www.dgsi.pt, “quando a AF solicita informação inequívoca está necessariamente a reportar-se aos elementos que o contribuinte, até no seu próprio interesse no âmbito do direito privado, não pode deixar de possuir, desde logo num critério prudencial, que permitam apurar um resultado com aderência à realidade, seja ele o declarado, seja ele um outro que importe corrigir tecnicamente. Se os não possui, eventual e independentemente de tal não resultar de uma imposição legal expressa, e essa ausência se revelar indispensável ao real apuramento do resultado obtido, é assertivo que se consubstancia em elemento legitimador do recurso à metodologia indiciária”.

Aliás, a Autoridade Tributária efectuou cruzamentos entre os valores contabilizados e declarados pela Impugnante e pelos seus fornecedores principais, tendo constatado que a Impugnante declarou valores inferiores aos declarados pelos seus fornecedores

declararam ter-lhe vendido determinado valor (cf. letra D do probatório).

A Impugnante limitou-se a fazer referência genérica e conclusiva a que os registos contabilísticos estão suportados pelos resumos diários extraídos dos programas informáticos de facturação certificados pela Administração Tributária, sendo de salientar, a este respeito, que a Administração Tributária, ao pôr em causa a conformidade dos valores declarados, também está a pôr em causa o valor dos resumos diários.

A Impugnante também não ensaiou explicar a existência de inventários irreais e o porquê de querer imputar ao exercício seguinte os custos efectivamente suportados no exercício aqui em análise, o que só é admissível, por respeito ao princípio da especialização dos exercícios, em casos como “quando está para acabar, ou para se iniciar, um período de isenção, quando há interesse em reduzir os prejuízos de determinado exercício, para retirar benefícios do seu reporte e quando se pretende reduzir o montante dos lucros tributáveis para reduzir a contribuição industrial” (cf. Manuel Henrique de Freitas Pereira, «A periodização do lucro tributável», in Ciência e Técnica Fiscal, 1986, n.° 349, p. 84, ob. cit. no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 25 de Junho de 2008, proferido no processo n.° 0291/08, disponível em www.dgsi.pt).

Tendo a Administração Tributária logrado evidenciar as referidas (e outras) lacunas graves da contabilidade da Impugnante, em si mesmas inviabilizantes da quantificação directa e exacta da matéria tributável, não tendo as mesmas sido infirmadas por qualquer outra prova concreta, documental ou testemunhal, que objectivamente contrarie os factos descritos no RIT, tem que se concluir que a contabilidade da Impugnante não merece credibilidade e não se vê como a partir dela se possa comprovar e quantificar directamente a matéria colectável.

Quer dizer, os pressupostos para a avaliação indirecta não foram, de modo algum, abalados pela Impugnante, que não colocou em dúvida séria, credível, os indícios fundados, consistentes, recolhidos pela Administração Tributária e vertidos no RIT, que, conjugados uns com os outros, à luz das regras de experiência comum e segundo critérios de razoabilidade, apontam no sentido de se concluir que a sua contabilidade não reflecte o resultado efectivamente obtido.

Termos em que improcede a presente impugnação quanto à questão da falta de pressupostos para o recurso à aplicação de métodos indirectos.

Passemos agora ao invocado excesso na quantificação da matéria tributável.

É certo que, uma vez demonstrada a verificação dos pressupostos para a avaliação indirecta, o sujeito passivo pode opor-se com sucesso à liquidação mediante prova do excesso na sua quantificação (cf. artigo 74.°, n.° 3, da LGT), podendo ainda, a partir da prova realizada, resultar fundada dúvida sobre a quantificação (ou existência) do facto tributário (cf. artigo 100.°, n.° 1, do CPPT).

Porém, a fundada dúvida sobre a quantificação não pode ser uma dúvida de “partida”, mas antes o resultado de um “percurso” probatório empreendido pelas partes, no termo do qual o julgador se confronta com uma dúvida inultrapassável pela prova Isto porque, a norma do artigo 74.°, n.° 3, da LGT, devidamente articulada com o disposto no artigo 100.°, n.° 1, do CPPT e no artigo 414.° do CPC, leva-nos a concluir que, só após o labor probatório do onerado com vista à demonstração do excesso na quantificação se poderá concluir que esta não revela o mínimo de segurança jurídica, por estar desfasada da realidade ou por assentar em pressupostos infirmados ou por o critério usado ser ostensivamente desadequado, concluindo-se então, haver dúvida sobre a quantificação.

No caso vertente, em sede de procedimento inspectivo, a impugnante declarou que “os ingredientes básicos da sopa da pedra são enchidos, carne de porco, feijão, batata, cenoura e água. Cada panela de sopa leva 12 Kg de enchidos e 27,5Kg de came e dá para cerca de 100 doses de sopa (o osso de chispe não é servido na sopa)”.

Relativamente aos auto-consumos, disse que, “apesar de serem processados subsídios de alimentação nos recibos dos ordenados”, os trabalhadores “fazem pelo menos uma refeição diária no restaurante fornecida pela sociedade”. No que se refere aos custos, asseverou que o inventário reportado a 31 de Dezembro de 2011 “não está completo, faltam diversas mercadorias como outras variedades de peixe e carne, batatas, arroz, cebolas, feijão, bebidas brancas, refrigerantes, águas, sobremesas, etc.” (cf. letra D do probatório).

Na realidade, o litígio entre as partes cinge-se ao critério utilizado pela Administração Tributária relativamente ao sistema de fabrico da sopa da pedra e ao valor considerado para auto-consumos dos trabalhadores (cf. letras H a J do probatório).

A respeito dos custos, o problema tange, não com o excesso de quantificação, mas com o princípio da especialização dos exercícios, que surge como corolário do princípio da anualidade dos tributos, sendo ele o garante da tributação real, na medida em que, com a imposição do tributo se visa agravar apenas o fluxo de rendimento gerado num determinado período de tempo, razão pela qual apenas a esse período se deverão imputar os custos nele efectivamente suportados.

Vejamos.

Conforme se aduz o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 2 de Junho de 2009, proferido no recurso n.° 02803/08, disponível em www.dgsi.pt, “(d)esde logo há que não perder de vista que nos movemos no âmbito da aplicação de métodos indirectos para a correcção da matéria tributável da recorrida, o que, por si só e necessariamente, acarreta um juízo de incerteza, na medida em que suportado em parâmetros de avaliação que o que visam é a obtenção de um resultado final que se aproxime, tanto quanto possível, da realidade mas que, por isso mesmo, só por mera casualidade, pode ter uma identidade absoluta com essa mesma realidade”.

Ora, a explicitação dos critérios utilizados decorre do parecer do Perito da Administração Tributária apresentado em sede de comissão de revisão. Aí se consigna que “as quantidades utilizadas para quantificação do número de doses de sopa da pedra foram declaradas pelo sócio gerente e constam do respectivo auto de declarações elaborado”. Aí se pondera, ademais, que não ficou: provada a utilização de 677g de carne para confeccionar 1 litro de sopa, sendo que “o sujeito passivo todos os dias tem pratos do dia, que não constam das ementas apresentadas, desconhecendo a Administração Fiscal quais os pratos do dia que foram confeccionados no ano em causa”, salientando que, “conforme consta do relatório de inspecção, o sujeito passivo não forneceu informação relativa ao detalhe das vendas” (cf. letra I do probatório).

Do mesmo modo, quanto aos autos-consumos, o critério adoptado pela Administração Tributária para a determinação da matéria tributável louvou-se num elemento racional e assente em dados efectivamente apurados ao longo do procedimento, como sejam os elementos declarados à Administração Tributária pelo próprio sócio gerente da empresa, designadamente, que os trabalhadores fazem pelo menos uma refeição diária no restaurante fornecida pela Impugnante, que lhes paga também subsídio de refeição.

Perante esta posição assumida pelo Perito da Administração Tributária, a Impugnante não comprovou factos concretos que permitam concluir que a sua realidade económica, patrimonial e contabilística fosse outra, diversa da que resulta do RIT, não bastando aduzir que, no fabrico da sopa da pedra, “a cozedura e o peso dos ossos do chispe acarretam uma perda de peso superior a 40% do peso facturado”, que “ao iniciarem os serviço, os trabalhadores tomam o que poderíamos considerar o pequeno-almoço - sandes, sumo e café” ou que “no final das prestações de serviço inerentes aos jantares, os trabalhadores fazem outra refeição - jantar” (cf. letra J do probatório).

É que, recorde-se, “não aproveita ao impugnante uma actuação processual e, sobretudo, probatória, direccionada e orientada pelo, simplista e preguiçoso, objectivo de suscitar dúvida, ainda que fundada, sobre a quantificação do facto tributário. É imprescindível um desempenho pautado pela concreta e circunstanciada alegação de factos que, uma vez provados, sejam idóneos a comprovar, a demonstrar, com uma certeza adequada e passível de ampla aceitação, a aduzida errónea ou excessiva quantificação da matéria tributável” (cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 18 de Outubro de 2011, proferido no processo n.º 04335/10, disponível em www.dgsi.pt).

Assim sendo, não se apura que a quantificação da matéria tributável esteja errada, até porque não se provaram outros elementos de facto que conduzam a outra quantificação, tal como era ónus da Impugnante, em face do disposto no artigo 74.°, n.° 3, da LGT.

Motivo pelo qual improcede o invocado erro na quantificação da matéria tributável.

Refira-se, a terminar, a propósito da invocada actuação desproporcionada da Administração Tributária, por, no exercício aqui em análise, ter recorrido à aplicação de métodos indirectos, enquanto nos exercícios de 2009 e 2010 efectuou correcções técnicas, que a aplicação de diferentes metodologias no apuramento do lucro tributável no mesmo ou em diferentes exercícios é não só admissível como uma exigência legal e constitucional, em obediência ao disposto no artigo 104.°, n.° 2, da CRP, na medida em que impliquem uma maior proximidade à realidade a tributar (cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 13 de Março de 2014, proferido no processo n.° 07215/13, disponível em www.dgsi.pt).

Termos em que improcede também o invocado vício assacado aos actos impugnados.”

*

Invocado pelo recorrente erro de julgamento sobre os pressupostos da determinação indirecta da base tributável e da quantificação da matéria tributável por métodos indirectos, importa referir que o cerne da questão reside ainda na alegada verificação da fundada dúvida sobre aquela quantificação a que se refere o nº 1, do artº 100º do CPPT.

Assim delimitado o objecto de recurso, a mesma sustenta-se em duas ordens de razões:

“O facto de não ser possível consultar o detalhe das vendas de 2011 não retira credibilidade aos valores registados na contabilidade.

Não estão verificadas nenhuma das circunstâncias plasmadas no art.° 88° da LGT para recurso à avaliação indireta;

No procedimento de inspeção não foram apuradas as reais quebras de peso, desperdícios, sobras e inutilizações entre as compras e as confecionadas no restaurante; Foram cometidos erros de recolha e quantificação dos bens que entraram como ingrediente principal na confeção dos pratos de carne e peixe, o que implica erro de quantificação.

Foram cometidos erros nos critérios de afetação dos bens que entraram como ingrediente principal na confeção dos pratos enunciados na ementa;

Os critérios utilizados para quantificar e valorizar muitos dos bens fornecidos no restaurante estão errados e desfasados da realidade, nomeadamente, o pão, o café, as sobremesas, as bebidas etc.

Não estão reunidos os requisitos para se proceder à tributação por métodos indiretos.”

Assim,

Por um lado pretende-se questionar da bondade daquela quantificação do lucro tributável de acordo com os critérios utilizados pela ATA para a sua fixação indirecta e, por outro, cabendo o ónus da prova do erro ou manifesto excesso na respectiva quantificação ao recorrente, a demonstração da realidade dos factos alegados para sustentar o pedido cabia a este último. Vejamos se assiste razão ao recorrente.

Sendo o IVA um tributo que se caracteriza por se tratar de um imposto geral sobre o consumo que pretende tributar as operações activas e passivas dos operadores que se inserem num determinado circuito económico e que opera pelo método de crédito de imposto obtido da subtracção das operações sujeitas a imposto das importâncias que oneram as suas aquisições, e portanto não cumulativo , sendo que apenas liquidam e entregam ao Estado o excesso do imposto assim retido aos seus clientes, necessário se torna que da determinação da respectiva base tributária de imposto e do imposto suportado, esteja suportado em elementos contabilísticos e fiscais que permitam o controlo e cumprimento das obrigações tributárias a que se referem os artºs 29º e segs do CIVA, e especificamente as que respeitam aos requisitos da contabilidade mencionado no artº 44º e segs, do mesmo Código, designadamente os registos e documentos de suporte a que se refere o artº 52º, a ser efectuada pelas entidades mencionadas nos artºs 84º e segs, sob pena de a liquidação de imposto ser efectuada por métodos indirectos ao abrigo do disposto no artº 90º , do mesmo compêndio legal, seguindo então as regras do disposto nos artºs 87º e segs, da LGT, e segundo os critérios vertidos no artº 90º, da mesma lei geral. Assim,

Caso a contabilidade cumprir tais desideratos, as respectivas D.P. e tais elementos beneficiam da presunção de se terem como verdadeiras e de boa-fé.

Como bem menciona o Ac. deste TCA- Sul, nº 745/15.7 BESNT , de 30.09.2019 na apreciação dos mesmos factos dos presentes autos ainda que para efeitos de IR, mas relativo ao mesmo ano, afirma-se o seguinte que aqui se respiga e subscreve-se integralmente:

“…Porém, se as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo cessa a presunção de verdade e boa fé creditada às declarações dos contribuintes e aos apuramentos inscritos na sua contabilidade (art.° 7571,2,a) LGT).

E se devido à infidelidade da contabilidade for impossível a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (art.° 87º, alínea b) e 88° LGT) há lugar à avaliação indirecta.

E certo que as omissões, imperfeições ou deficiências da contabilidade, são insuficientes para, por si só, levar à tributação por métodos indirectos. A lei exige ainda que essas «falhas» sejam de tal modo graves que impossibilitem a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (Art.° 87/1,b) e 88 LGT): «Como resulta do preceito legal, a pura e simples verificação das anomalias nele previstas não é, por si só, suficiente para a aplicação de métodos indirectos. E igualmente necessário, no dizer da norma, que essas anomalias “inviabilizem o apuramento da matéria tributável". E o resultado da subsidiariedade da avaliação indirecta perante a avaliação directa» António Lima Guerreiro Lei Geral Tributária Anotada, Rei dos Livros, 2000, pp. 371.

Portanto, se mesmo imperfeita a contabilidade permitir a reconstituição dos elementos indispensáveis à exacta determinação da matéria tributável, não pode a AT lançar mão deste meio de avaliação da matéria colectável e consequente tributação.

Outra particularidade da tributação por métodos indiretos radica na distribuição da carga probatória. Sobre a AT recai a prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação enquanto o sujeito passivo fica onerado com a prova do excesso na quantificação (art.° 7473 LGT, na linha do que dispõe o art.° 34472 do Código Civil).

Traçado este pequeno esboço, vejamos em primeiro lugar se a AT cumpriu satisfatoriamente o seu encargo probatório. Isto é, se demonstrou que a contabilidade da Impugnante enferma de erros e omissões que impedem a exacta determinação da matéria tributável, ainda que com esforço adicional da sua parte.

Assumimos como ponto de partida que a prova deve ser apreciada e valorada «na sua globalidade, estabelecendo conexões, conjugando os diferentes meios de prova e não desprezando as presunções simples, naturais ou hominis, que são meios lógicos de apreciação das provas e de formação da convicção»1

Ou seja, não nos podemos quedar pela avaliação isolada de cada indício. Temos de ir mais longe e avaliar, contextualizar e articular todos os indícios para deles extrairmos a «verdade possível» para esclarecer a situação com que nos deparamos. 

Não se almeja alcançar a verdade «absoluta» mas apenas aquela que processual e empiricamente possa ser validada e aceite genericamente, sem embargo de se lhe reconhecer todas as limitações do conhecimento humano.

Em nosso entender, e considerando tudo o que deixámos exposto, a AT cumpriu devidamente o seu ónus como bem decidiu a MMa juiz "a quo", senão vejamos sinteticamente, os seguintes factos:

Inexistência de informação relativa ao detalhe das vendas - ficheiros informáticos (documentos fiscalmente relevantes).

Conforme assumido pelo sócio-gerente, o sujeito passivo não facultou informação relativa ao detalhe das prestações de serviços, nomeadamente a informação constante das facturas, vendas a dinheiro ou talões de venda.

O sujeito passivo, nos termos do n.° 4 do artigo 52.° do código do IVA, estava autorizado a arquivar em suporte eletrónico as faturas ou documentos equivalentes emitidos por via eletrónica, desde que garantisse o acesso completo aos dados e assegurasse a integridade da origem e do seu conteúdo.

No período em causa, ano de 2011, emitia faturas ou documentos equivalentes com recurso a programa informático, arquivava os mesmos em suporte informático mas não garantiu o acesso completo aos dados.

Mesmo aceitando como verdadeira a informação da avaria no disco do computador onde era armazenada a informação, o sujeito passivo não cumpriu o disposto nos artigos 6.° e 9.° da portaria 1370/2007 de 19 de outubro, que obrigava a manter cópias de segurança, devidamente conservadas e em condições de facultar à AT, todos os documentos de suporte.

Ora, não tendo a inspeção tributária acesso à informação relativa ao detalhe das prestações de serviços, à informação contida nos documentos (faturas), toma-se impossível comprovar a veracidade do valor das prestações de serviços declarados.

Como salientou a AT, “Torna-se impraticável testar consumos de matérias primas 'versus prestações de serviços. Por exemplo, no valor total das prestações de serviços declaradas não é possível saber quantos cafés estão lá incluídos e comparar com os quilos de grão de café adquiridos. Bem como, não é possível saber as doses de peixe servidas, incluídas naquelas prestações de serviços, e comparar com as quantidades de peixe adquiridas pelo sujeito passivo ”.

Também não dispunha de extratos de fornecedores. Não obstante o sujeito passivo ter mais de uma centena de fornecedores não tem extratos com informação completa e fiável, o que impede validar se as compras a um determinado fornecedor foram todas contabilizadas, comparando com extrato de cliente facultado pelo fornecedor.

Lançamentos dos pagamentos sempre na conta 111 caixa, mesmo quando os pagamentos são através de cheque.

Inexistência de conciliação bancária. No final de cada mês quando é recebido o extrato bancário na contabilidade, simplesmente são somados todos os valores de entrada e saída do banco, e são feitos lançamentos na contabilidade de forma a que o saldo das subcontas da conta 12 Depósitos à Ordem, seja o mesmo que o saldo da conta bancária constante do extrato bancário, por contrapartida da conta 111 caixa. 

Não existe qualquer preocupação da contabilidade em associar os movimentos das contas bancárias aos movimentos da atividade do sujeito passivo.

Falta de contabilização da distribuição de resultados e dos empréstimos dos sócios à sociedade e da sociedade aos sócios, embora existam transferências de dinheiro das contas da sociedade para as contas do sócio e das contas do sócio para as contas da sociedade, sem qualquer movimento correspondente na contabilidade da sociedade.

Através da análise dos extratos bancários das contas tituladas pelo sócio-gerente são identificados diversos depósitos em numerário, indiciando que esse dinheiro tenha como proveniência as receitas da sociedade uma vez que não é conhecida outra fonte de rendimentos do sócio-gerente.

Divergência no anexo P da IES

O sujeito passivo apresenta diversas divergências nos valores por si declarados no anexo P da IES2. Declara valores inferiores aos declarados pelos seus fornecedores. Inclusivamente para os fornecedores C....., e L..... LDA, o sujeito passivo não declara, no referido anexo, ter-lhes comprado qualquer valor, sendo que aqueles declararam ter-lhe vendido mercadorias nos valores de € 25.116,00 e € 25.292,00, respetivamente.

A AT admite que esta situação não deva corresponder a uma omissão efetiva de contabilização de compras por parte do sujeito passivo, mas deve estar relacionado com o que já foi referido no ponto "Inexistência de extratos de fornecedores".

Existência de um TPA associado a uma conta bancária em nome do sócio-gerente A sociedade utiliza o TPA n.° .....para receber dos seus clientes, pelos serviços prestados, através de cartões de débito ou crédito. Esse TPA está associado à conta da Caixa de Crédito Agrícola Ribatejo Sul n..° ....., cujo titular é J....., sócio-gerente da sociedade. O sócio- gerente, pontualmente efetua transferências da referida conta para a conta n.° ....., do mesmo banco que está em nome da sociedade, mas não existe uma correspondência exata entre os valores recebidos pelo sócio, via TPA, e os valores por si transferidos para a sociedade. Estas transferências não são evidenciadas na contabilidade, conforme já referimos.

Empresa familiar

O sujeito passivo, J..... Lda., trata-se de uma empresa familiar em que os sócios são casados entre si. São trabalhadores da sociedade uma filha e um genro dos sócios. As instalações (restaurante e armazém) onde a empresa exerce atividade são da propriedade dos sócios, não sendo debitado qualquer valor relativo a compensação pela utilização do espaço.” E mais adiante, conclui o mesmo Acórdão, ao que ora nos importa:

“…Inventários irreais

A atividade do sujeito passivo caracteriza-se por ser uma atividade de caráter continuado, com uma elevada rotatividade dos stocks ele produtos e matérias primas adquiridas, justificada com o facto de grande parte desses bens ter um prazo de validade reduzido. Nesse sentido o valor total desses stocks nunca pode sofrer grandes alterações, salvo alguma compra em maiores quantidades de vinhos ou bebidas espirituosas, o que não foi o caso, no ano em análise.

Como foi admitido pelo sujeito passivo, em auto de declarações, o inventário reportado a 31/12/2011, no valor total de € 4.612,38, não foi correctamente elaborado, não constando desse inventário determinados produtos e matérias-primas que o sujeito passivo tem que ter sempre em stock. Tais como refrigerantes, águas, batatas, arroz, feijão, açúcar, café, etc.

Do acervo factual exposto podemos concluir que a AT cumpriu o seu ónus, demonstrando claramente que a contabilidade da Impugnante contém erros que impedem a determinação exata da matéria tributável, não sendo possível calcular a matéria colectável de outro modo que não seja através da avaliação indirecta.

E assim, consideramos devidamente justificado - e fundamentado - o recurso à avaliação indirecta.

Cumprido este encargo por parte da AT, pode o Sujeito Passivo paralisar a tributação apurada provando que houve excesso na quantificação (art.° 74nº 3 LGT).

Contudo, não deve “limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida a existência e quantificação do facto tributário, cabendo-lhe o ónus da prova de tais factos ” - vd. Acórdão do TCA, de 01/06/2004, proc."06657/02 ”, sendo certo que no caso concreto a Impugnante foi muito contida na alegação factual, como bem salientou a MMa juiz.

Com efeito, não basta a RECORRENTE alegar que continuam “a verificar-se dúvidas sobre os erros de recolha das quantidades adquiridas, erros de quantificação dos produtos que fora, objecto de transformação e de critérios errados de imputação dos produtos à confeção”, ou que houve quebras de peso em função do tempo decorrido entre a pesagem constante da fatura e o momento de serem confecionados, quebras de peso por descama, e quebras de peso resultantes da cozedura, sem provar o alegado. 

Como salientou a MMa juiz “Relativamente aos auto-consumos, não explica a Impugnante como é que suporta duas refeições aos seus trabalhadores e ainda paga subsídio de refeição; no que se refere à correcção aos custos das matérias-primas, foi o próprio sócio-gerente que afirmou que o inventário reportado a 31.12.2011, não estava completo, resultando evidente a violação do princípio da especialização, basilar princípio contabilístico; quanto aos desperdícios e sobras, resulta evidenciado no relatório de inspecção os cálculos efectuados relativamente a cada bem, ou produto confeccionado, enunciado devidamente as diferenças entre os pesos brutos dos bens e o peso necessário para cada prato, relevando assim os possíveis desperdícios, e não tendo a Impugnante demonstrado quais as reais quebras de peso, desperdícios, sobras e inutilizações ocorridas entre as quantidades compradas e as quantidades confeccionadas ou incorporadas nas diversas prestações de serviço realizadas qual a margem.

Relativamente aos alegados erros de recolha de quantidades adquiridas, de quantificação e critérios de afectação de carne e peixe aos diversos pratos confeccionados e erros cometidos nos critérios e indicadores utilizados na determinação da quantidade e valor do pão fabricado e vendido e quantidade e valor do café vendido, considerando que em sede de processo de revisão da matéria tributável todos estes elementos foram corrigidos pela perita designada pela AT, não resulta alegado nem provado pela Impugnante, em que medida a correcções já efectuada não foram suficientes para corrigir o excesso de quantificação alegado.".

Ou seja, concluímos que a prova do excesso na quantificação de modo nenhum foi conseguida pela RECORRENTE, como se constata pelos factos provados, que não foram validamente impugnados, resultando claro que as conclusões de recurso não procedem e que a sentença andou bem, devendo por isso ser mantida.”

Quanto às pretensas dúvidas sobre tal quantificação dos factos tributários, pelo que ficou exposto supra , inexiste qualquer dúvida sobre tal quantificação e cabendo ao recorrente a sua demonstração, não pode prevalecer a seu favor tal falta de correcta determinação da dita matéria colectável. Quanto à susceptibilidade de utilizar tal possibilidade legal nos casos como dos presentes autos, em que se utilizou aqueles critérios legais vertidos no artº 91º da LGT, para efeitos da dita quantificação por impossibilidade de se proceder à sua correcta determinação, tem-se entendido que tal “ … não se verifica …na generalidade das situações indicadas … no artº 88º da LGT … por força das regras de ónus da prova fixada no nº 3, do artº 74º da LGT…. ( casos em que)…não se considera existirem dúvidas sobre a quantificação da matéria tributável…”, nas palavras do Ilte Cº J. Lopes de Sousa, que aqui se acolhem e dão por reproduzidas- cfr “CPPT Anotado, 4ª Ed. 2003, pags 452 e segs.

Tal entendimento foi igualmente sufragado no supra referido Acórdão, no qual se afirma que,

“Por outro lado, sempre deveríamos ter presente o n.° 2 do art.° 100° do CPPT segundo o qual não se considera existir fundada dúvida se o fundamento da aplicação dos métodos indiretos consistir na inexistência ou desconhecimento, por recusa da exibição, da contabilidade ou escrita e de mais documentação legalmente exigidos ou a sua falsificação, ocultação ou destruição, ainda que os contribuintes invoquem razões acidentais, como é o caso dos autos.”- fim de citação.

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Nos termos expostos improcede totalmente a pretensão recursiva, o que vai assim decidido na parte dispositiva do presente Acórdão.

Dispositivo:

Nos termos supra referido vai negado provimento ao recurso, sendo mantida a sentença proferida pelo tribunal “A Quo”, que considerou válido o acto tributário controvertido nos autos.

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Custas pela recorrente nas duas instâncias.

Notifique

[O relator consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores Mário Rebelo e Patrícia Manuel Pires ]